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Fichamento do texto “A questão da educação formal / não-formal”, de Moacir Gadotti.

Júlia Lopes de Oliveira, nº USP 4450299

Colocar a educação não-formal como uma forma possível de garantia do direito à


educação. Há um consenso, na maioria dos países, de que a educação é um direito de
cidadania, um requisito para que os indivíduos tenham acesso à comunidade, no entanto, é
um direito que nem sempre é garantido na prática.
Uma das problemáticas levantadas que apontam para a dificuldade de garantia desse
direito é que, cada vez mais, a educação é vista e tratada como uma mercadoria, um serviço a
ser prestado seja pelo mercado, seja pelo Estado. Assim, presente a lógica do lucro, é feito
um cálculo de investimentos em que busca-se reduzir os custos, baratear os gastos do Estado
transferindo essa responsabilidade para o mercado, como se fosse possível garantir um
direito dentro desse viés.
Outra problemática que o direito à educação (“solução para todos os problemas ou
problema sem solução?”) levanta é que o direito a educação não se restringe ao ensino
obrigatório, é um direito que deve se estender ao longo de toda a vida. Ainda, dentro do
ensino obrigatório, não basta apenas estar matriculado na escola, mas ter garantido o direito
de aprender, tanto dentro quanto fora da escola.
O autor busca, então, definir a educação não-formal como uma metodologia possível
para superar tais obstáculos e contradições. A concepção “clássica” da educação não formal a
define em oposição a educação formal, portanto, a partir de uma ausência, de uma negação:
“toda atividade educacional organizada, sistemática, executada fora do quadro do sistema
formal” (La Belle, 1982:2). O que vai se propor, portanto, é que se defina a educação não
formal por aquilo que ela é, pelos espaços que ocupa, o tempo, seu papel na construção de
cidadania e na garantia do direito à educação.
Começa-se por definir a educação não formal como uma forma mais flexível, em que
o tempo da aprendizagem respeita o tempo de cada um, e os espaços podem ser os mais
variados, criados e recriados. A educação não formal se conecta com a própria noção de
cultura e à aprendizagem política. Se relaciona a possibilidades de formação política dos
indivíduos habitantes das cidades, estimulando sua autonomia enquanto cidadãos e criadores
de possibilidades comunitárias de vida, de bem viver e conviver.
O texto segue problematizando a questão do aprendizado nas tecnologias da
informação, constatando que estas são responsáveis por romper com a ideia de que há um
tempo e um espaço delimitados para a aprendizagem: acontece a qualquer momento, a todo
momento, em qualquer lugar e todo lugar. O professor surge como um mediador do
conhecimento, como alguém que deve filtrar as informações, mas também precisa estar
atento e seguir curioso e aberto para estar em constante formação, “Ele deixará de ser um
lecionador para ser um organizador do conhecimento e da aprendizagem. O professor se
tornou um aprendiz permanente, um construtor de sentidos, um cooperador, e, sobretudo,
um organizador da aprendizagem”.
No entanto, o educador carrega também uma responsabilidade ética e política de
ensinar seus alunos a filtrarem as informações que recebem a todo momento, transformando-
as em conhecimento produzido por elas mesmas, de forma autônoma.
Assim, as fronteiras entre o formal e o não formal estão menos delimitadas nos dias
de hoje. A educação assume um caráter intercultural, ou seja, aberta à diversidade cultural
presente nas práticas sociais. A escola, um espaço de interação com a natureza e o meio
ambiente. Portanto, a informalidade é característica fundamental da “educação do futuro”,
“considera a educação como um processo sempre dinâmico, interativo, complexo e criativo.”
Em contrapartida, o autor traz uma crítica severa a forma como são construídas as
cidades, de forma a dificultar o acesso de crianças, sua participação ativa na construção desse
mundo comum. Também a educação assume um caráter de espoliar a criança de seu mundo e
de seu direito fundamental: brincar. Preparam-se as crianças para um mundo que não é delas,
para, frequentemente, o mercado de trabalho ao qual devem adaptar-se a todo custo.
O brincar, para a criança, é garantia do direito de aprender, pois é brincando que
aprende, constrói a identidade e seus conhecimentos sobre o mundo. O brincar ativo e
construtor das crianças nos ensina que elas precisam estar a todo momento construindo seus
saberes, suas vidas, e precisam tomar decisões no que diz respeito a si. Os adultos estão a
todo momento tomando decisões para e pelas crianças, perderam a relação de alteridade para
com elas, e há poucos ou nenhum espaços de gestão política e pública nas cidades que levem
também em consideração a participação das crianças.
A proposta das Cidades Educadoras leva em consideração essa necessidade de
participação ativa nas cidades, e uma cidade educadora seria aquela em que o aprender e o
ensinar estão presentes em variados espaços com a função de educar para a cidadania. Uma
cidade educadora busca garantir que os indivíduos tomem em suas próprias mãos as decidões
que dizem respeito a cidade, de forma autônoma e organizada.
A concepção de cidadania de que se fala é uma concepção plena, em que há
mobilização constante da sociedade para a conquista de novos direitos e na participação
direta da gestão da vida pública, como por exemplo a discussão do orçamento da cidade.
Cidade e cidadão definem aquele que se apropriou de um espaço ou de um lugar. “Assim,
cidade (civitas) é uma comunidade política cujos membros, os cidadãos, se auto-governam e
cidadão é a pessoa que goza do direito de cidade.”
O Instituto Paulo Freire concebeu a ideia de Escola Cidadã como aquela escola em
constante relação com os espaços da cidade - importa onde a escola está, que relações
estabelece com o que está a sua volta, sejam casas, lojas, restaurantes, teatros. A escola
cidadã é participativa, em constante diálogo com os alunos, educandos e com a comunidade.
“escola apropriada pela população como parte da apropriação da cidade a que pertence.”
Uma escola cidadã e uma cidade educadora se relacionam, dialogam, sendo a escola
um espaço onde aparecem as necessidades da cidade, os interesses públicos dos cidadãos.
Onde se possibilita a “leitura do mundo”.
Tal “utopia das cidades educadoras” é um norte para nossas ações políticas, não se
trata de algo difícil, impossível de se realizar se houver vontade política. Para tanto, é
necessário um rompimento com as formas burocratizadas, clientelistas de se fazer política e
com as elites locais que em geral controlam o fazer político das cidades. O papel da educação
popular é o de contribuir para a construção de um fazer ativo, em que os cidadãos sejam os
sujeitos ativos da construção política. É também o de promover o convívio e a aprendizagem
pela diferença, em contraste com as tentativas de homogeneização da pedagogia neoliberal,
que forma consumidores.
Trata a escola da sociedade da informação de articular a cultura, muito mais do que
somente transmitir conhecimentos prévios aos alunos. O espaço que ocupa a escola é um
espaço de criação de novos conhecimentos sem abandonar a tradição científica, o
conhecimento historicamente produzido pela humanidade. “É uma escola presente na
cidade”, que deveria ensinar a olhar e descobrir a cidade, que é o espaço das diferenças. A
escola neoliberal ensina que o mundo está posto, sem incutir aos alunos a possiblidade de
atuação e transformação do mundo que habitam, numa perspectiva a-histórica e de “fim da
história”. Daí a importância da escola democrática cumprir esse papel. “Os alunos aprendem
dos professores democráticos que o conhecimento tem um peso na vida deles e na sociedade,
mas que é preciso educar o conhecimento para que ele seja transformador. E para que a
democracia seja real na escola é preciso que haja informação. Ninguém participa sem
informação. O livre fluxo de idéias é fundamental. As crianças tem direito de saber sobre
tudo o que lhes diz respeito, direito de expressar suas idéias e seus sonhos.”
Ainda, exemplifica o Orçamento Participativo Criança, iniciativa do Instituto Paulo
Freire, como uma ação possível de materialização de tais ideais, dessa “utopia”, uma forma
de educação democrática, em que as crianças decidem, de forma democrática, a gestão do
orçamento escolar, em diálogo com instâncias municipais.
O autor conclui afirmando que o paradigma da educação popular, tal como
desenvolvida por Paulo Freire, possui uma atuação-chave na construção de um mundo
democrático, uma vez que é nessa continuidade entre o formal e não formal, entre a
complementaridade dos espaços escolares e não escolares, a escola e a cidade. A escola não
deve apenas se dirigir à comunidade, mas estar em sintonia com ela, com a identidade
cultural dos alunos e com seus sonhos e desejos.

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