Você está na página 1de 9

ALVOS VACINAIS

PARA A COVID-19

Imunologia clínica
• INTRODUÇÃO

No início da pandemia pelo novo coronavírus havia pouca esperança de que


uma vacina poderia ser desenvolvida em menos de três anos. Até agora, a va-
cina desenvolvida de forma mais rápida em toda história foi contra o Ebola, e
mesmo assim levaram cinco anos para desenvolvê-la. Nunca houve tanto in-
vestimento e tantos pesquisadores unidos em busca de um mesmo objetivo, e
fazendo uso de tecnologias nunca antes vistas.

A velocidade nesse desenvolvimento depende de diversos fatores. Como as


técnicas clássicas para sintetizar um antígeno viral envolvem cultivar o vírus em
meios como ovos de galinha ou em cultura celular, o desenvolvimento de uma
vacina é lento. Devido a isso, a maior parte das empresas está voltada para a
síntese de material genético viral recombinante, e não o cultivo do vírus inteiro.
Isso pode ser feito por meio da utilização de informações do genoma viral para
estimular a resposta imune nos indivíduos vacinados.

Imunizações artificiais como as vacinas agem introduzindo microrganismos


atenuados, mortos ou partes destes no corpo humano. Esses antígenos
não causam a doença, mas são suficientes para que o corpo reconheça novos
patógenos similares estruturalmente como estranhos, e desenvolva uma res-
posta imune para destruí-lo mais rapidamente.

• VACINAS

Sendo assim, podemos dizer que uma vacina é uma preparação biológica cons-
tituída por componentes dos agentes patogênicos (podem ser vírus ou bacté-
rias).

Após a geração da resposta imune contra o microrganismo morto ou atenuado,


há o desenvolvimento de células de memória, que em caso de novas infecções
no organismo, geram uma resposta imune acelerada, destruindo o microrga-
nismo invasor antes que a pessoa adoeça.
• FASES PARA A TESTAGEM DE UMA VACINA EM PACIENTES

Tudo começa com a síntese ou cultivo do antígeno ou partícula do mesmo em


laboratório. Após isso, a vacina é testada em animais e, caso os resultados
mostrem segurança e sejam promissores, são feitos testes em seres humanos,
geralmente em três etapas:

Fase 1: A vacina é administrada em um grupo menor de pessoas, testando di-


ferentes concentrações e comparando indivíduos expostos ao composto ou a
uma solução placebo. A finalidade principal dessa etapa é avaliar a segurança
da vacina. Se os benefícios são grandes e os riscos muito pequenos, a mesma
passa para a etapa seguinte.

Fase 2: Nesta etapa aumenta-se o número de participantes, sendo o estudo


realizado de forma randomizada. Outros grupos de pessoas são incluídos, entre
eles idosos e crianças.

Fase 3: Esta fase testa a segurança e a eficácia da sua aplicação em um grupo


maior de pessoas. O número substancialmente maior de participantes dessa
fase ajuda a aprender sobre os possíveis efeitos colaterais da vacina e a avaliar
com se a vacina está funcionando com mais precisão.

Além disso, alguns estudos podem ocorrer com fases sendo testadas simulta-
neamente. Por exemplo, etapas 1 e 2 ou 2 e 3, como estão fazendo a Universi-
dade Oxford, Sinovac, Novavax, BioNTech/Pfizer, na pesquisa de desenvolvi-
mento da vacina contra COVID-19.

• ADJUVANTES

As vacinas podem apresentar substâncias denominadas de adjuvantes. Elas


são sintetizadas em laboratório com a finalidade de aumentar a sua imunogeni-
cidade. Estas substâncias são essenciais na composição de vacinas inativadas
(microrganismo morto) pois ativam APCs e aumentam o efeito depósito, dessa
forma, também aumentam o período em que o antígeno estará em contato com
o sistema imune. Essas características permitem a amplificação da resposta
imune.

• ALVOS VACINAIS PARA A COVID-19

• Vacinas de ácidos nucleicos

• Vacinas com vetor viral

• Vacinas de vírus atenuado ou inativado

• VLP (Viral-Like Particle)

1) Vacinas de ácidos nucleicos

Imunizações que utilizam DNA ou RNA de microrganismos representam uma


alternativa inovadora às abordagens de vacinas convencionais. As vacinas ba-
seadas em ácidos nucleicos apresentam algumas vantagens, como: sua alta
potência; capacidade de iniciar a produção de proteínas sem a necessidade de
entrada incorporação de material genético ao genoma da célula; capacidade de
ser desenvolvida rapidamente; e potencial para fabricação de baixo custo, além
de administração segura.

As vacinas de mRNA (RNA mensageiro) fornecem uma sequência de nucleotí-


deos que codificam os antígenos selecionados, tendo altas chances de induzir
uma resposta imune protetora. Caso mostre resultados positivos, essa aborda-
gem possibilitaria o desenvolvimento de vacinas para doenças nas quais a va-
cinação convencional, não é uma opção viável atualmente.

A ideia é inserir o material genético do vírus no corpo de um paciente para que


sua maquinaria celular produza pequenas partículas semelhantes às proteínas
do vírus. O conceito de uma vacina baseada em DNA é que essa carga genética
deve ser entregue às células do hospedeiro e, com isso, gerar as proteínas de
interesse.
A vantagem das vacinas que empregam ácidos nucleicos é que seu desenvol-
vimento ocorre de forma mais rápida, desde que o fabricante tenha acesso ao
genoma do microrganismo. Esse método funcionou de forma consistente em
modelos animais da doença, sendo um dos alvos candidatos contra a COVID-
19. As desvantagens são a possibilidade de integração do DNA no genoma das
células hospedeira, e a geração de anticorpos anti-DNA, que poderia levar ao
aparecimento de síndromes semelhantes ao lúpus.

2) Vacinas com vetores virais

As vacinas com vetores virais podem ser replicantes e não replicantes. Quando
estes vetores ainda podem se replicar dentro das células são do subtipo repli-
cantes. Aqueles que não podem se replicar, porque os genes principais foram
desativados, são não replicantes.

Um modelo que vem sendo estudado se baseia na utilização de um tipo de


adenovírus modificado que carrega um pedaço do material genético do SARS-
CoV-2. Atualmente, a melhor vacina testada que representa essa classe é a
ChAdOx1 nCoV-19, desenvolvida pela Universidade de Oxford. A mesma ba-
seia-se no uso do adenovírus (vírus do resfriado comum) como vetor, contendo
o material genético da proteína spike Sars-CoV-2. Este vetor foi escolhido para
gerar uma forte resposta imune, mesmo com uma dose única da vacina.

3) Vacina de vírus

Vacinas que utilizam o próprio vírus para induzir a imunidade podem ser dividi-
das entre inativadas e atenuadas.

A vacina inativada contém o vírus neutralizado por agentes químicos ou físicos.


São vacinas sem risco de causar infecção em imunodeprimidos ou em gestan-
tes. Por trabalhar com microrganismos incapacitados de provocar sintomas de
uma doença, as vacinas inativadas tendem a ter esquemas vacinais multidoses.
Pelo fato do microrganismo não ser mais replicativo, estas vacinas não propor-
cionam uma fonte de antígeno duradoura, justificando a necessidade de varias
doses.

Vacinas com vírus atenuado buscam replicar de forma mais fidedigna uma
imunização natural e gerar uma resposta imunológica forte e duradoura. Este
tipo de vacina não pode ser aplicado em pessoas imunocomprometidas e em
alguns grupos específicos, devido ao risco (mesmo que pequeno) do agente
reverter a sua forma selvagem, causadora de doença.

4) VLP (Viral-Like particles)

Vacinas de subunidades utilizam partículas virais purificadas. Tais vacinas não


chegam a imitar a doença como as atenuadas, mas elas “enganam” o sistema
imune, pois ele reconhece estas substâncias como sendo o próprio agente in-
feccioso ou uma partícula dele. Ao interpretar que estes são um perigo real, a
imunidade desencadeia um processo de proteção.

• RISCOS POTENCIAIS ASSOCIADOS AO DESENVOLVIMENTO


DE VACINAS PARA A COVID-19

Apesar de raro, há a possibilidade que os anticorpos que se ligam ao SARS-


CoV-2, sem neutralizá-lo, causem patologias. Tais fenômenos ocorrem devido
a formação de imunocomplexos, que se depositam nos tecidos e ativam as vias
do complemento associadas à inflamação. Algumas vacinas ineficientes tam-
bém podem causar respostas que tendênciam à um padrão de linfócito Th2,
levando ao desencadeamento de certas doenças sem gerar uma memória imu-
nológica adequada.

Há também um fenômeno denominado “Antibody-dependent enhancement”


(ADE). Este fenômeno é conhecido na dengue, onde os anticorpos produzidos
em uma infecção contra um dado sorotipo do vírus facilitam a penetração das
partículas virais do novo sorotipo em células humanas, levando a quadros gra-
ves dessa doença. Estudos mostram que há possibilidades de isso ocorrer entre
os coronavirus.
Tanto o deposito de imunocomplexos quanto as respostas tendenciosas ao
TH2 podem ocorrer na doença respiratória avançada associada à vacina (VA-
ERD), sendo necessários diversos estudos para evitar (mesmo sendo raros) que
estes eventos ocorram nos pacientes vacinados, sobretudo em uma visão de
vacinação em escala global.

• ESTUDO SOBRE A VACINA TRÍPLICE VIRAL (MMR)

Alguns estudos propõem que a vacina tríplice viral possa fornecer certa prote-
ção contra o SARS-CoV-2. Há certas evidências que levam os pesquisadores a
estudar essa linha:

1) Homologia entre a sequência genética do SARS-CoV-2 e os vírus da ru-


béola.

Utilizando uma ferramenta de alinhamento da sequência de aminoácidos das


proteínas do SARS-CoV-2 com os vírus da vacina MMR (rubéola, sarampo e
caxumba), verificou-se que o SARS-CoV-2 possui uma proteína que comparti-
lha 29% de semelhança na sequência de seus aminoácidos com uma proteína
do vírus da rubéola, sendo este domínio conhecido como ‘Macro’. O Macro é um
domínio presente na proteína NSP3 do SARS-CoV-2, com atividade de pro-
tease semelhante a papaína (uma protease encontrada no mamão). O mesmo
domínio está presenta na proteína p150 do vírus da rubéola.

2) Dados epidemiológicos

Foi identificado uma interessante correlação a nível populacional em países


como a Itália, Espanha e Alemanha. Indivíduos mais velhos e homens, têm mai-
or probabilidade de morrer de COVID-19 quanto menor a imunidade específica
a rubéola, com base em programas históricos de vacinação dos três países.

3) Análises sorológicas

Foram verificados níveis mais elevados de IgG para rubéola em pacientes com
quadros mais graves da COVID-19 em comparação com pacientes portando
quadros moderados. Tal fato está de acordo com a hipótese de que pacientes
estão respondendo ao SARS-CoV2 com base na homologia desse vírus com o
da rubéola. Com isso em mente, sugere-se que os títulos de IgG elevem-se com
a gravidade da doença devido a essa semelhança.

A hipótese de que esse domínio Macro do SARS-CoV-2 pudesse ser reconhe-


cido por anticorpos gerados contra a rubéola foi apoiada por dados que de-
monstraram que pacientes com a COVID-19 tiveram níveis de IgG para rubéola
aumentados, assemelhando-se a uma infecção secundária pela rubéola.

Apesar do tríplice viral não prevenir a infecção pelo SARS-CoV-2, a mesma


poderia potencialmente reduzir o percentual de indivíduos que evoluem para as
formas graves. Entretanto, ainda são necessários mais estudos a fim de com-
provar que a vacinação com a tríplice viral melhora a evolução da doença em
pacientes com COVID-19. Estes dados são correlativos e análises futuras aju-
darão a elucidar o papel dos anticorpos com reatividade cruzada entre o SARS-
CoV-2 e o vírus da rubéola.

• REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(20)31252-
6/fulltext

https://science.sciencemag.org/content/368/6494/945.full

https://covid19vaccinetrial.co.uk/participate-trial

https://www.bio.fiocruz.br/index.php/br/noticias/1208-nova-geracao-de-
adjuvantes-para-dar-mais-eficacia-as-vacinas
ZHU, Feng-cai; LI, Yu-hua; GUAN, Xu-hua; HOU, Li-hua; WANG, Wen-juan; LI,
Jing-xin; WU, Shi-po; WANG, Bu-sen; WANG, Zhao; WANG, Lei. Safety, toler-
ability, and immunogenicity of a recombinant adenovirus type-5 vectored
COVID-19 vaccine: a dose-escalation, open-label, non-randomised, first-in-
human trial. The Lancet, [s.l.], p. 1-10, maio 2020. Elsevier BV.

Gouglas, D., Le, T. T., Henderson, K., Kaloudis, A., Danielsen, T., Hammersland,
N. C., ... & Røttingen, J. A. (2018). Estimating the cost of vaccine development
against epidemic infectious diseases: a cost minimisation study. The Lancet
Global Health, 6(12), e1386-e1396.

Você também pode gostar