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Introdução
baixa escolarização de seus pais, precárias condições de vida dessas famílias. São
apontados, ainda, fatores situados no âmbito das escolas freqüentadas por essas crianças,
como: poucos recursos pedagógicos, baixa qualificação dos profissionais da educação.
Independentemente desses fatores, ou do número deles, diríamos que, nesse ponto, agora
estaríamos em outro nível de conhecimento: o nível explicativo. Com esse exemplo
quisemos mostrar que, ao associarmos dois ou mais fatores entre si, estamos explicando o
fenômeno. Isto é, o fracasso escolar decorre, no exemplo citado, das precárias condições
de vida das famílias das crianças, ou então, das precárias condições das escolas que
freqüentam, ou ainda, de ambos os fatores.
Usualmente os sistemas escolares contentam-se com esses dois níveis de
conhecimento: descritivo e explicativo. Bastaria, então, saber que certo fenômeno ocorre
por causa de certos fatores. Aliás, as escolas, de maneira geral, resumem as suas
atividades pedagógicas a esses dois níveis de conhecimento. Consideram suficiente
apresentar a ocorrência de determinado fenômeno e explicá-lo a partir da associação de
certos indicadores ou fatores.
No entanto, devemos sempre nos perguntar: por que as coisas são assim? Elas
devem ser sempre assim? Ocorrem em todas as sociedades e em todos os tempos? Qual a
sua razão de ser? Quais os princípios ou os fundamentos que as determinam? As
respostas a essas perguntas configurariam outro nível de conhecimento: o nível
compreensivo. Eis o nosso propósito: ultrapassar os níveis descritivo e explicativo ao
estudar determinado fenômeno, até atingir o nível compreensivo, procurando, dessa
forma, examinar a razão de ser do mesmo.
1- O conhecimento e a educação
enfim, daquilo que se transformou em objeto de interesse para nós, podemos afirmar que
há diferentes conhecimentos.
Entretanto, o conhecimento é produto de um processo social coletivo. Cada
indivíduo desenvolve o seu saber no interior de um grupo social, no interior de
determinada classe social, de determinada sociedade. Assim, as classes sociais
desenvolvem práticas sociais distintas. Em conseqüência, não há possibilidade de a
percepção de uma mesma realidade ser idêntica em todas as classes sociais que compõem
determinada sociedade.
Mas quem procura adquirir conhecimento são os homens e são eles, também, que
produzem conhecimento enquanto produzem sua própria vida. Conhecer e existir fazem
parte de um mesmo processo social. Sendo o homem fundamentalmente um ser social,
para existir, tem de conhecer.
Vejamos mais detidamente esse processo. Sabemos que da relação entre um
homem e uma mulher é possível o nascimento de um indivíduo. Dir-se-á, então, que esse
indivíduo é o produto de uma herança biológica. Ele traz consigo a composição genética
oriunda daquela relação. Mas se a composição biológica desse indivíduo lhe assegura a
condição necessária para a sua existência como indivíduo, não lhe assegura, contudo, a
condição suficiente para se tornar humano.
Esclarecendo melhor essa questão, podemos citar os tão conhecidos casos de
crianças isoladas, confinadas, ou até mesmo criadas por animais. O pouco ou nenhum
contato delas com humanos impossibilitou-lhes a passagem, usualmente esperada, da
situação de indivíduo para a de homem.2 Lembremos, aqui, a história de Amala e
Kamala. Conta-se que, em 1920, na Índia, o Reverendo Singh teria confirmado um boato
que circulava entre os camponeses de Midnapore. Tratava-se da existência de crianças
vivendo no meio de lobos. Colocando um posto de observação em cima de uma árvore,
do lado de fora de uma grande caverna, ao cair da noite, pôde observar que entre os lobos
que saíam, um a um, da caverna encontrava-se uma mãe e seus filhotes. E entre os
filhotes, dois deles pareciam homens, apesar de não agirem como tal.
Após ter organizado uma expedição que massacrou os lobos, resgataram-se as
crianças-lobos. Uma delas, quando foi encontrada, denominada Amala, tinha um ano de
2
http://www.feralchildren.com/en/index.php exemplos de vários casos.
4
idade e veio a morrer um ano mais tarde. A outra, Kamala, de oito anos de idade, viveu
até 1929. Elas se comportavam como lobos e até mesmo sua aparência era de lobo. Não
sabiam andar sobre os pés, mas se moviam rapidamente de quatro, criando, assim, calos
duros nos joelhos e nas palmas das mãos. Mexiam as narinas para cheirar, queriam
apenas comer carne crua, caçavam animais selvagens, tinham hábitos noturnos, evitavam
outras crianças, preferiam a companhia de cachorros e gatos. Ao dormirem, enrolavam-se
juntas no chão. Eram ativas e uivavam como lobos. Nunca choravam ou riam.
A propósito, leia o relato a seguir:
O caso das crianças-lobos leva-nos a concluir que o ser humano não nasce do
útero materno completamente humano. Ao contrário, além da herança biológica,
necessária para o aparecimento de um indivíduo, faz-se necessário, ainda, uma segunda
herança - a herança sociocultural. Só então, o indivíduo se transforma num ser
verdadeiramente humano.
Ora, esse fenômeno de transformação é um processo social. O indivíduo torna-se
humano mediante a interação com outros homens. Somos portadores de uma herança
genética, mas a manifestação dessa herança resultará de um processo social de interação
com outros no interior de determinado contexto social. A esse processo, denominamos
educação.
Nesse processo social, podemos identificar:
• um indivíduo cuja fisiologia humana, plasticidade mental com
capacidades cognitivas facultam-lhe a capacidade de aprender;
• os primeiros agentes educativos – a mãe e o pai – (a família), cada um
deles com o seu próprio sistema ideológico particular;
3
Disponível em: http://www.aprendebrasil.com.br/articulistas/luca_bd.asp?codtexto=220 Acesso em: 03
abril 2007
5
2- A sociedade capitalista
[...]a propriedade de dinheiro, meios de subsistência, máquinas e outros meios de produção ainda
não faz de uma pessoa um capitalista se falta o complemento, o trabalhador assalariado, a outra
pessoa, que é obrigada a vender a si mesma voluntariamente. [...]capital não é uma coisa, mas uma
4
relação social entre pessoas intermediada pelas coisas
Como você pode observar nesse trecho, Marx chama-nos a atenção para o real
significado de capital. Segundo ele, não devemos entender o capital como um bem
material, nem como símbolo monetário, mas, fundamentalmente, como uma relação
4
Marx, Karl – O Capital. Volume I. Livro Primeiro, Tomo 2. São Paulo: Abril Cultural, 1984, p. 296.
8
5
Marx, Karl. Le Capital. Paris: Editions Sociales, 1971. Tome I. Livre Premier, p. 182.
6
Gorz, André. Caracteres de classe de la science et des travailleurs scientifiques. Les Temps Modernes,
Paris, n. 330, 1974.
12
formação dos homens. Podemos dizer que esse mesmo processo social prevalecera até os
primórdios do capitalismo. Por essa razão, examinamos a organização do processo de
trabalho no período da manufatura, período em que as tarefas passaram a ser parceladas,
isto é, distribuídas entre os trabalhadores.
No período da manufatura, conforme já assinalamos, a produção de determinado
bem passou a ser decomposta em uma multiplicidade de tarefas atribuídas a diferentes
trabalhadores. Nesse contexto, o oficial, aquele que conhecia bem o seu ofício, como
define Aurélio, tornava-se um especialista, uma vez que o seu fazer concentrava-se em
apenas uma pequena parte do todo. Nessa época, portanto, tem início o processo de
divisão técnica do trabalho. Adam Smith refere-se, por exemplo, à decomposição do
processo de fabrico de alfinetes em dezenove operações distintas. Em vista disso, os
trabalhadores foram obrigados a desenvolver habilidades, demonstrando capacidade para
realizar atividades que envolviam detalhes, pequenas operações. Ora, para a realização
dessas tarefas, não é necessário saber muito, ou mesmo que se saiba mais que o exigido
para exercer uma tarefa específica, o trabalhador não tem oportunidade de aplicar esse
seu conhecimento extra.7
Pois bem, é justamente nesse período histórico, início do capitalismo, que a classe
dominante, à época, a burguesia, após ter adquirido o controle do Estado, começa a
implantar um sistema nacional de ensino, precursor do que temos hoje. Assim, a escola,
tal como a conhecemos hoje, teve sua origem a partir dessa data. Dever-se-ia, então:
construir escolas em todo o território nacional; preparar indivíduos especializando-os em
determinados conteúdos – os professores -, para nelas atuarem; elaborar currículos,
programas, horários, etc. aos quais todas as crianças deveriam se submeter.
É bem verdade que dissemos, antes, que o desempenho de tarefas na forma
manufatureira de organizar o processo de trabalho demandava muito pouco
conhecimento. Mas, no período da manufatura, a burguesia, então revolucionária, passa a
atribuir à escola novos papéis. O seu lema ,– educação para todos –, em última análise,
era difundir suas idéias e seus ideais de modo universal. Era preciso convencer a todos
que a sua democracia formal, os seus ideais de liberdade, de igualdade e fraternidade
7
Consultar, especialmente, o Livro I, Capítulo 1 Da Divisão do Trabalho, de: Smith, Adam. Uma
Investigação Sobre a Natureza e Causas da Riqueza das Nações. São Paulo: Hemus Editora Ltda., 1981.
14
eram superiores aos ideais vigentes na Idade Média. Para tanto, o conteúdo a ser
distribuído pela escola deveria ser selecionado a partir de certos parâmetros, entre eles, a
necessidade de a escola ser controlada pelo Estado e dissociada de qualquer filiação
religiosa. Assim procedendo, a escola contribuiria, decisivamente, para romper com o
domínio cultural da Igreja católica, considerada como a síntese e a sanção do poderio
feudal. Para tal, o ensino da língua dominante para todos de um mesmo território e a
seleção de determinados conteúdos, conforme os interesses burgueses, passaram a
constituir a matéria escolar a ser transmitida, via pedagogia tradicional, aos alunos, para
que eles assimilassem as exigências dos novos tempos.
Além desse papel, a escola deveria, ainda, seguir outra direção: preocupar-se com
a economia de tempo e voltar-se para as coisas práticas. É sugestivo a esse respeito o
título do capítulo dezenove da Didática Magna de Comênio – Fundamentos para ensinar
com vantajosa rapidez - no qual são estabelecidas as bases para a rapidez do ensino, com
economia de tempo e de fadiga.8 A propósito, o tempo, como vimos de apresentar, é a
substância da relação social que define o capital. É ainda o tempo, o elemento central na
teoria da mais-valia e, ao mesmo tempo, o critério básico para o conceito de
produtividade. Sendo assim, torna-se necessário economizar tempo para acompanhar o
novo ritmo dos processos produtivos. E, além da necessidade de se ensinar de forma
metódica, mais rápida, era necessário ensinar de forma “sólida”, apresentar aos alunos as
próprias coisas, “ao invés das suas sombras”, como afirmava Comênio:
Os mecânicos não fazem para o aprendiz uma conferência a respeito do seu ofício, mas o
põem diante de um profissional, para que ele observe como este procede; colocam, depois, um
instrumento em suas mãos, ensinam-no a usá-lo, e recomendam que ele imite o mestre. Só fazendo
9
é que se pode aprender a fazer, escrevendo, a escrever, pintando, a pintar.
8
Coménio, João Amós. Didáctica Magna. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1985. p. 273.
9
Ponce, Anibal. Educação e Luta de Classes. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1986. p. 128.
15
terceiro papel para a escola. As relações sociais capitalistas passaram a exigir outro tipo
de trabalhador. Agora, o trabalhador deve aceitar trabalhar para o capitalista em troca de
um salário. Deverá executar o trabalho de acordo com as condições estabelecidas pela
nova organização do processo de trabalho. Faz-se necessário, então, que os jovens,
futuros trabalhadores, aprendam, na escola, novos hábitos, novas formas de
comportamento, novas disposições e novos traços de caráter mais adequados à disciplina
da oficina ou da fábrica. O objetivo primordial, da escola, portanto, será contribuir para a
submissão da força de trabalho e, secundariamente, desenvolver conteúdos específicos. A
adaptação às novas formas de trabalho manufatureiras sobrepuja o conteúdo específico. A
ênfase nesses objetivos permitiu a Adam Smith afirmar que os trabalhadores aprendiam a
trabalhar no próprio local de trabalho, trabalhando, e, por isso, a instrução a lhes ser
oferecida poderia ser ministrada em doses homeopáticas.
A mesma opinião era compartilhada pelo empresário Kula, que fundou uma
escola na Rue dês Epinnettes, em Paris, com o objetivo de formar bons operários.
Finalizemos, pois, este tópico com trecho do depoimento do seu chefe de oficina,
conforme registram Charlot e Figeat:
Outro ponto da educação moral sobre o qual nunca se insistirá demasiadamente é o que
concerne à obediência e à disciplina na oficina. Porque a produção moderna não é
verdadeiramente útil e benéfica senão na medida em que se baseia em uma organização metódica.
Entretanto, na base de toda a organização não é possível substituir a autoridade pela a anarquia. É
preciso, portanto, que o operário aprenda a vencer suas resistências naturais ao dever absoluto de
obedecer, e isto é o que lhe ensinaremos na Epinettes (...). A disciplina na oficina constitui a
dignidade bem entendida do operário; a higiene e a previsão terminam por fazer dele um homem
10
consumado (CHARLOT e FIGEAT, 1985, p. 132).
10
Apud Enguita, Mariano F. A Face Oculta da Escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. p. 115.
16
atividades industriais, eram vistos como incapazes de compreender mais do que uma
operação específica de trabalho. Diante de tal quadro, os trabalhadores se viram
submetidos às exigências do novo cenário: estabelecimento do tempo padrão e do melhor
método de trabalho, obtidos mediante os estudos de tempos e movimentos; receber
incentivos monetários, pagamento por peça produzida, por exemplo; submeter-se à
seleção e ao treinamento de acordo com os padrões definidos pela gerência. Logo, para
sobreviver, eles deveriam, de forma rápida, habituar-se aos ritmos da indústria. Assim, na
nova realidade, na fábrica, aprenderiam a trabalhar com máquinas e a integrar-se à
disciplina da empresa. Em resumo: estruturando-se os cargos, procura-se o indivíduo
certo para o desempenho de cada função. Daí derivam-se, ainda, os sistemas de
treinamento e de remuneração.
Como podemos ver, o taylorismo constituía uma técnica de gestão perfeitamente
adequada aos padrões de acumulação de capital da época. Para organizar o processo de
trabalho, adotava-se uma estratégia de comando/controle cujas partes deveriam ser
integradas verticalmente e de modo hierárquico. Nesse processo, cada agente conhecia
apenas o âmbito imediato de seu trabalho. A definição dessa tarefa específica, realizada
pela direção mediante a análise de tempos e movimentos, provoca abrupta separação
entre o trabalho intelectual e o trabalho manual, entre quem pensa e quem executa, entre
o departamento de planejamento e o chão da fábrica. Somente os gestores, uma nova
classe social capitalista, concebiam, de forma prévia, como se deveriam executar as
operações necessárias a cada posto de trabalho. Somente eles detinham o conhecimento
de todo o processo de trabalho e podiam comandá-lo. Já o trabalhador, cada um deles, era
desprovido desse conhecimento, uma vez que foi transformado em executor de trabalho
simples e repetitivo, facilmente treinável e substituível. Caberia aos supervisores e aos
capatazes, zelar pelo controle e pelo bom andamento dessas operações.
Nesse cenário, os trabalhadores, compartimentados e enclausurados, eram
privados de qualquer iniciativa e explorados em sua atividade muscular. Deveriam, ao
contrário, trabalhar de acordo com o prescrito pelas normas do treinamento. Argumenta o
próprio autor dos Princípios de Administração Científica, Frederick Winslow Taylor,
que, [...] “em quase todas as artes mecânicas a ciência que rege as operações do trabalho
18
é tão vasta e complexa que o melhor trabalhador adaptado à sua função é incapaz de
entendê-la, quer por falta de estudo, quer por insuficiente capacidade mental”.11
Assim, para realizar a tarefa de transportar lingotes de ferro, o escolhido foi
Schmith, um homem estúpido como um bovino.
Schimidt começou a trabalhar. Durante o dia todo e a intervalos regulares, o homem que
o orientava com um relógio na mão lhe dizia: ‘Agora, levante o lingote e ande. Agora, sente-se e
descanse. Agora, ande; agora, descanse’ etc...
Ele trabalhava e descansava quando mandado e às cinco e meia da tarde tinha colocado
no vagão quarenta e sete e meia toneladas.12
11
Taylor, Frederick W. Princípios de Administração Científica. São Paulo: Atlas, 1970. p. 52
12
Idem ibidem p. 57
19
13
O crescimento do Brasil no século XX, no período compreendido entre os anos 20 e 70, apresentou as
seguintes médias anuais: anos 20: 6,0%; anos 30: 4,3%; anos 40: 5,1%; anos 50: 7,1%; anos 60: 6,1%; anos
70: 8,8%. O crescimento do Brasil no século XX – Folha de São Paulo 26/12/1999.
20
14
Maroni, Amnéris. A estratégia da recusa: análise das greves de maio/78. São Paulo, Brasiliense, 1982
22
15
Ver, a este respeito, os dados disponíveis em The Economist, January 9th de 1999 e, na mesma revista,
em January 27th de 2001
16
Anderson, Sarah and Cavanagh, John. Top 200 – The Rise of Corporate Global Power, Institute for
Policy Studies, http://www.ips-dc.org/downloads/Top.200.pdf
24
17
Talvez um bom exemplo de empresas líderes mundiais, hoje, pelo inusitado de seu comportamento, seja
a Wal-Mart. É hoje a maior varejista do mundo, possui mais de 3.500 lojas espalhadas em 11 países do
mundo (e lidera o mercado em três deles). É o maior empregador privado do planeta (1.600.000
empregados) e tem o maior faturamento do planeta (US$ 256 bilhões em 2003). Tem, como estratégia
empresarial, combater a sindicalização, pagar salários menores que as concorrentes e pressionar os seus
fornecedores para reduzir os preços. Responsável por 10% das exportações da China, está sendo
considerada como destruidora de manufaturas nos Estados Unidos. É rejeitada em várias localidades
americanas. Sobre a questão, consultar:
The Economist, abril-maio 2004 e http://www.terra.com.br/istoedinheiro/347/negocios/347_wal_mart.htm.
25
18
É interessante observar que recente editorial da Folha de São Paulo, denominado Pesquisa Transparente,
informa que alguns dos mais importantes periódicos da área médica decidiram demandar, da indústria
farmacêutica, registro, num banco de dados público, de todas as pesquisas relativas a medicamentos, pois é
crescente a impressão de que os laboratórios só tornam públicos os resultados que lhes interessam,
escondendo o que possa prejudicar suas vendas. Folha de São Paulo, 21/06/2004. Consulte, ainda, sobre
essa mesma problemática, o artigo citado a seguir, que mostra o envolvimento da segunda maior empresa
farmacêutica do mundo, a GlaxoSmithKline (GSK), por ter escondido resultados de experimentações
clínicas com antidepressivo administrado para crianças. Trata-se do Paxil que, além de ser ineficiente,
poderia provocar pensamento suicida. The Economist. 19 de junho de 2004 p. 62.
27
Quando James Womack, Daniel Jones e Daniel Roos escreveram A Máquina que Mudou
o Mundo em 1990, eles não estavam escrevendo sobre um determinado motor de carro. Na
verdade, estavam descrevendo o Sistema Toyota de Produção (STP), o que criou o mais eficiente
sistema de produção de carro do mundo.19 (Grifos dos autores)
19
The Economist. Survey: Manufacturing. June 18th 1998.
29
Além desses traços, vale acrescentar, ainda, um processo descrito pelos autores do
Survey: Manufacturing, citado anteriormente e denominado kaisen. Trata-se do processo
de procurar, continuamente, melhorias no intuito de aumentar a eficiência, melhorar
ergonomia e alta qualidade.
Como podemos observar, no toyotismo, apesar de se reduzir o número de
trabalhadores, a produção não é prejudicada, pois, ao romper com a relação um
homem/uma máquina, própria do taylorismo, ela passa a ser sustentada por um processo
produtivo flexível em que um operário é capaz de operar várias máquinas. É a chamada
polivalência, flexibilidade, ou, no dizer de alguns teóricos, trabalhadores multifuncionais.
Observamos, ainda, que se deve produzir apenas o necessário, manter apenas um estoque
mínimo, que deverá ser reposto após a venda, mediante o kanban, que é a senha a ser
utilizada. Deve-se obter o melhor aproveitamento possível do tempo e aumentar a
qualidade, o que será garantido pelo just in time.
20
In Antunes, Ricardo. Adeus ao Trabalho? Ensaio sobre as Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do
Trabalho. São Paulo: Cortez. 1995. p. 23
30
21
Trata-se de uma declaração anunciada em 1984, por Kasuo Ishikure, presidente da filial norte-americana
da Bridgestone, uma fábrica de pneus. In: Bernardo, João. Democracia Totalitária. São Paulo: Cortez,
2004. p. 84.
22
In Bernardo, João. Idem, ibidem. p. 106.
31
23
Dunninghan, Andréa. Emprego estável é coisa do passado. O Globo, Rio de Janeiro, 16/07/1965 p.57,
Economia.
33
24
Idem ibidem.
34
conhecimentos dos trabalhadores de ensino, dos pais dos alunos e, quem sabe, dos
próprios alunos.
Nesse contexto, um novo professor passa a ser exigido. Não mais aquele professor
tradicional. Torna-se necessário reestruturar também os processos didático-pedagógicos.
Não há lugar para a prática pedagógica impositiva, que prescreve normas a serem
seguidas. O professor deve levar em conta, agora, que o aluno deve ser visto como
sujeito, como ator reflexivo. Terá de prepará-lo para que seja capaz de expressar, saiba
trabalhar em grupo, tenha iniciativas, saiba enfrentar problemas, apresente flexibilidade
mental e força psíquica para suportar as exigências do mercado de trabalho.
E, finalmente, como ponto culminante da lógica capitalista, podemos citar a
necessidade de se avaliar todo o sistema. Há de se averiguar até que ponto cada unidade
escolar atinge os objetivos acadêmicos que dela se esperam. Para tanto, torna-se
necessária a proposição de um sistema nacional de avaliação. Poderíamos perguntar:
quais são os objetivos de tal proposição? Que tipo de avaliação é proposta? Ora, para a
lógica capitalista, o objetivo fundamental é aquilatar se os jovens que ingressam no
mercado de trabalho possuem as competências básicas demandadas pela tecnologia
capitalista. Quanto à avaliação, não serão as realizadas no interior da escola, pois, de um
lado elas podem apresentar certo viés em virtude de interesses específicos, e, de outro
lado, seus resultados, justamente por serem específicos, não permitem análises
comparativas. Conseqüentemente, a única avaliação possível dentro dessa lógica é a
externa ao sistema. Só ela permite equiparar, do ponto de vista quantitativo, trabalhos
qualitativamente diferentes. Para tanto, exige-se a fixação de conteúdos mínimos e de
testes padronizados, aplicados de forma sistemática. A partir da adoção desses testes,
poder-se-á medir o desempenho dos alunos, dos professores, da escola. Os testes
permitirão, ainda, aferir/revisar os planos de qualificação profissional; poderão orientar o
orçamento da escolar e os salários dos professores; poderão estabelecer limites às práticas
pedagógicas; poderão, sobretudo, determinar o prestígio, a eficiência ou a produtividade
de cada escola. Somente esse tipo de avaliação externa é que garante os mecanismos de
controle desse tipo de racionalidade. A racionalidade das diferenças, das hierarquias e da
valorização da concorrência.
37
Considerações finais
maioria das pessoas, reveste-se sob a forma de salário. Assim são constituídas as classes
dos trabalhadores que devem possuir determinado tipo de qualificação, conforme as
exigências do mercado de trabalho. Conseqüentemente, o mercado de trabalho possui
uma força impositiva e a escola não pode fugir do papel que lhe é imposto. Tais
considerações nos levam a perguntar: a escola deve ficar restrita apenas a esse papel? Em
outras palavras: o papel da escola é simplesmente preparar as futuras gerações para o
mercado de trabalho?
Referências Bibliográficas: