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10 passos na semiologia e anamnese

para prescrição em clínica farmacêutica


Por Egle Leonardi

A prescrição farmacêutica está regulamentada pela Resolução 586, do Conselho


Federal de Farmácia (CFF), de 29 de agosto de 2013. É fato que as leis,
decretos, portarias e resoluções cumprem dois aspectos: são disciplinadores
(agindo preservando direitos e deveres) ou são documentos que ensejam um
desafio a ser cumprido. Para o professor de Atenção Farmacêutica na pós-
graduação do ICTQ, Alexandre Massao Sugawara, a Resolução 586 se encaixa
na última classificação: “é o produto histórico de luta dos farmacêuticos e se
configura como uma carta de desafio posta a nós mesmos para a sua plena
execução”. Assim, a Resolução 586 deve ser vista de forma provocativa,
desafiando o farmacêutico para a sua plena capacitação e a plena execução
dessa atividade clínica, que tanto beneficia a população.

Alguns players do mercado varejista já dispõem de consultórios prontos para a


prática de prescrição dentro da farmácia. Para a coordenadora técnica
farmacêutica das Farmácias Pague Menos e responsável técnica pelos
programas Clinic Farma e SAC Farma, Cristiane Feijó, a população entende
perfeitamente a finalidade e o objetivo das clínicas farmacêuticas. Ela diz que o
acompanhamento e a orientação de saúde e do tratamento prescrito são uma
necessidade real da comunidade, e as linhas que separam as competências
devem ser sempre respeitadas e enaltecidas para que a equipe multidisciplinar
possa ajudar a recuperação da saúde e a diminuição dos agravos. “O
farmacêutico, na maioria das vezes, consegue conversar por mais vezes e ter
maior contato com o cliente após a prescrição médica, e os serviços
farmacêuticos; como o Clinic Farma, das Farmácias Pague Menos; ajudam muito
na adesão ao tratamento e na melhoria do quadro de saúde do cliente”, ressalta

Atenção a cada passo

Dentro de um consultório farmacêutico de drogaria, para uma semiologia e


anamnese seguras, responsáveis e documentadas por meio de uma prescrição,
são necessários alguns passos. O Internacional Pharmaceutical Federation (FIP)
elaborou um documento para padronizar as Boas Práticas de Farmácia, que
abrange atividades para incentivar o autocuidado, incluindo o aconselhamento
aos usuários e, quando apropriado, a indicação de tratamentos medicamentosos
para aliviar desconfortos e enfermidades leves.

O farmacêutico deve estar atento ao histórico médico do usuário, para dispensar


medicamentos seguros, eficazes e de qualidade em colaboração com os outros
profissionais para promover saúde. A anamnese, tanto feita por médicos ou por
farmacêuticos segue o mesmo princípio inicial, que é conhecer a história clínica
do paciente. E começa sempre com:
1. Identificação do paciente: nome, idade, data de nascimento, filiação, estado
civil, raça, sexo, religião, profissão, naturalidade, procedência, endereço e
telefone;

2. Queixa principal: descrição sucinta da razão da consulta;

3. História da doença atual: relato do adoecimento, início, principais sinais e


sintomas, tempo de duração, forma de evolução, consequências, tratamentos
realizados, internações e outras informações relevantes;

4. História familiar: doenças pregressas na


família, estado de saúde dos pais, se
falecidos, a idade e a causa, principal
ocupação dos pais, quantos filhos na prole
e forma de relacionamento familiar. Nas
avaliações psiquiátricas é fundamental
registrar a existência de doença mental na
família;
5. História pessoal: informações sobre gestação, doenças intercorrentes da
mãe durante a gestação, doenças fetais, parto, condições de nascimento,
evolução psicomotora com informações sobre idade em que falou e andou;
doenças intercorrentes na infância, ciclo vacinal, aprendizado na escola,
sociabilidade em casa, na escola e na comunidade; trabalho, adoecimento no
trabalho, relações interpessoais na família, no trabalho e na comunidade;
puberdade, vida sexual e reprodutiva, menopausa e andropausa; se professa
alguma religião e qual; doenças preexistentes relacionadas ou não ao atual
adoecimento; situação atual de vida;

6. História médica pregressa: focar em doenças ou medicamentos que podem


causar os sintomas;

7. Revisão por sistemas: outros órgãos que podem ser afetados e que
sinalizem casos de maior gravidade e complexidade;

8. Quais os medicamentos que o paciente está fazendo uso no momento:


• Data em que iniciou a utilização
• Para medicamentos, recomenda-se documentar por princípios ativos, em
vez de especialidades farmacêuticas. Em sessões clínicas, podem-se
• utilizar as especialidades dentro da documentação interna.
• Posologia (por ex. se o paciente toma um comprimido pela manhã e um
a noite, deve-se registrar da seguinte forma 1-0-1).
Após a análise dos dados, o farmacêutico pode chegar a uma das
conclusões:

9. O paciente necessita de atendimento médico;


• Isso acontece se o paciente pertencer a um grupo de risco (gestantes,
lactantes, recém-nascidos, crianças, idosos);
• Se o problema relatado não poder ser tratado pelo farmacêutico com a
utilização de medicamento isento de prescrição (MIP);
• Se estiver ocorrendo reação adversa a outro medicamento que o paciente
utiliza;
• Se os sintomas estiverem associados à outra doença.

10. O paciente não necessita de atendimento médico.


• O farmacêutico deve fazer uso de medidas não farmacológicas ou
tratamento com MIPs.

Uma nova visão clínica

Sugawara faz o alerta aos farmacêuticos de que as farmácias precisam mudar


de uma visão puramente mercadológica para uma visão clínica, entendendo não
como um ponto de venda, mas como um estabelecimento de saúde. “Mudanças
organizacionais, operacionais e estruturais devem ocorrer em toda a farmácia,
onde a tomada de decisão passa a ser mais amplamente baseada não só numa
visão financeira, mas também clínica e humanística. Para fazer cumprir a
demanda da sociedade necessitamos de um farmacêutico forte, clínico e
prescritor”, lembra ele.

No curto prazo, de acordo com Sugawara, a clínica farmacêutica passa pela


sensibilização da classe farmacêutica em busca de sua plena capacitação à
demanda. Ele considera importante a sensibilização dos players do mercado
varejista farmacêutico por esta nova atividade e tudo que ela acarretará em
mudanças organizacionais, operacionais e estruturais na nova farmácia.
Também é fundamental dialogar com várias entidades e outras classes
profissionais para entender sobre o que se trata a farmácia clínica e a prescrição
farmacêutica.

Para Cristiane, a prática farmacêutica requer muito estudo, comprometimento e


cuidado verdadeiro com o outro. O nível técnico será cada vez mais determinante
para valorização e remuneração do profissional e não mais apenas a
necessidade de ter a presença física de um farmacêutico por imposição legal
para evitar multas. O caminho já está sendo construído e não existe volta. O bom
prescritor médico terá no cuidado farmacêutico a certeza de acompanhamento
eficaz e maior probabilidade de adesão ao tratamento prescrito. “Essa parceria
libera o prescritor para novas consultas e o presenteia com os relatórios de
acompanhamento necessários para a melhoria da saúde do cliente realizado
pelo farmacêutico, conforme a RDC 44 pois, a cada consulta farmacêutica o
cliente receberá a declaração do serviço prestado, e as informações devem ser
compartilhadas com seu médico ou outro profissional da saúde que o
acompanhe”, afirma ela.
O farmacêutico precisa resgatar a habilidade de ser um excelente ouvinte e a
entender que o aumento do volume de trabalho e as responsabilidades vêm da
demanda da comunidade e de imposições legais. “Todos os deveres são
compartilhados e, independentemente da função exercida na farmácia, os
profissionais que têm a formação de farmacêutico clínico são corresponsáveis
por tudo que ocorre no ambiente de trabalho e que possa ser um risco sanitário.
Quem acredita, trabalha e cresce!”, finaliza Cristiane.

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