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Tribunal de Justiça do Piauí

PJe - Processo Judicial Eletrônico

11/11/2022

Número: 0000306-37.2015.8.18.0140
Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA
Órgão julgador colegiado: 5ª Câmara de Direito Público
Órgão julgador: Desembargador PEDRO DE ALCÂNTARA MACÊDO
Última distribuição : 16/06/2021
Valor da causa: R$ 724,00
Processo referência: 0000306-37.2015.8.18.0140
Assuntos: Ingresso e Concurso, Classificação e/ou Preterição
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? SIM
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO
Partes Procurador/Terceiro vinculado
PRESIDENTE DA COMISSÃO DO NUCLEO DE CONCURSOS
E PROMOÇÃO DE EVENTOS DA UESPI - NUCEPI
(APELANTE)
FUNDACAO UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUI FUESPI
(APELANTE)
GUYLHERME LUIS LIMA ARAUJO LUZ (APELADO) JOHILSE TOMAZ DA SILVA (ADVOGADO)
LIA RACHEL DE SOUSA PEREIRA SANTOS (ADVOGADO)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
87503 07/10/2022 16:57 Acórdão ACÓRDÃO SEGUNDO GRAU
84
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ

ÓRGÃO JULGADOR : 5ª Câmara de Direito Público

Apelação Cível n°0000306-37.2015.8.18.0140 (2ª Vara da Fazenda Pública Comarca de


Teresina/PI)

Apelante: Fundação Universidade Estadual do Piauí

Apelado: Guylherme Luís Lima Araújo Luz

Advogada: Lia Rachel de Sousa Pereira– OAB/PI Nº 7.317

Relator: Des. Pedro de Alcântara da Silva Macêdo

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE


SEGURANÇA – CONCURSO PÚBLICO - ANULAÇÃO DE QUESTÃO DE PROVA OBJETIVA -
ASSERTIVA COM INTERPRETAÇÃO CONTRADITÓRIA À CF/88 E ART. 186 DO CPP - ERRO
GROSSEIRO NA ELABORAÇÃO – EXAME DOS CRITÉRIOS UTILIZADOS PELA BANCA
EXAMINADORA - POSSIBILIDADE - ILEGALIDADE DO ATO COATOR - DEMONSTRADA -
DIREITO LÍQUIDO E CERTO COMPROVADO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE
CONCEDEU A SEGURANÇA VINDICADA - RECURSO CONHECIDO MAS IMPROVIDO.

1. Considerando que o Apelado demonstrou a utilidade e necessidade do provimento judicial para


obtenção de sua pretensão (posição de vantagem, com a consequente realização das demais
fases do certame), e a relação jurídica trazida à baila, impõe-se a rejeição da preliminar de
ausência do interesse processual.

2. Consoante entendimento da jurisprudência pátria, as disposições previstas em Edital de


concurso público estão inseridas no âmbito do poder discricionário da Administração, sendo
permitido ao Judiciário apenas o exame da legalidade e o devido cumprimento das normas pela
Comissão Organizadora;

3. Desse modo, via de regra, mostra-se vedado ao Poder Judiciário realizar o reexame dos
critérios adotados pela banca examinadora na formulação de questões, correção e atribuição de

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notas em provas de concursos públicos, sendo permitido apenas o exame de compatibilidade do
conteúdo exigido com o Edital, que é a lei interna do certame, ou se constatado erro grosseiro na
sua elaboração. Precedente do STF;

4. In casu, ficou demonstrado que a assertiva “4” da questão n°32 contém erro grave insuperável,
pois permite interpretação contrária ao disposto no Art. 5º, inc. LXIII, da Constituição Federal/88 e
art 186 do CPP;

5. Assim, não procedem as alegações apresentadas pelo ente estatal, tendo em vista que ficou
evidente a ilegalidade do ato combatido na ação originária, em decorrência de erro grosseiro na
elaboração da questão sob análise, implicando em vício insanável que justifica sua anulação.

6. Portanto, impõe-se a manutenção da sentença que concedeu a segurança, em face da prova


pré-constituída do direito vindicado.

7. Apelação conhecida, mas improvida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os componentes da Egrégia 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça
do Estado do Piauí, à unanimidade, à unanimidade, em CONHECER do
presente recurso, mas NEGAR -LHE PROVIMENTO, mantendo-se então a sentença na sua
integralidade, em dissonância com o parecer Ministerial Superior. Sem honorários
advocatícios, a teor do art. 25 da Lei nº 12.016/09 e Súmula 105 do STJ5. Transcorrido in
albis o prazo recursal, certifique-se o trânsito em julgado do Acórdão e proceda-se à baixa
do feito na Distribuição, na forma do voto do Relator.”

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pela Fundação Universidade Estadual do Piauí, em face da sentença proferida
pela MMª. Juíza de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Teresina-PI, nos autos do Mandado de
Segurança c/c Pedido de Liminar (n°0000306-37.2015.8.18.0140), impetrado contra ato do Presidente do NÚCLEO
DE CONCURSOS E PROMOÇÃO DE EVENTOS DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ – NUCEPE, em que
figura como litisconsortes passivos a Fundação Universidade Estadual do Piauí – FUESPI e o Estado do Piauí.

Alega o impetrante que se inscreveu no concurso público para provimento de vagas da Polícia Militar do Piauí, regido
pelo Edital nº 05/2013, ficando classificado na condição de excedente em relação ao número de vagas.

Aduz que a banca examinadora do certame incorreu em erro grosseiro na questão de nº 32 da prova objetiva, ao
considerar como resposta correta do quesito a alternativa “a” da referida questão, o que implicou em violação ao direito
líquido e certo de prosseguir na fase seguinte.

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Portanto, requer a concessão da ordem, com o fim de que seja determinado a suspensão do ato lesivo e sua
convocação para a segunda fase do certame, e, caso apto nas demais fases, seja aprovado.

O Estado do Piauí apresentou contestação, aduzindo, dentre outros pontos, a ausência de prova do direito
alegado, pugnando, ao final, pela denegação da segurança.

Após instruir o feito, a MMª Juíza julgou procedente a ação, com o fim de anular a “questão de número 32,
relativa ao certame público Edital n. 005/2013-PMPI, com todas as consequências legais advindas da referida
anulação no âmbito do certame em questão”.

A Apelante, por sua vez, interpôs o presente recurso, alegando que o apelado não comprovou que a anulação
da questão impugnada resultaria na sua aprovação e indevida ingerência do Judiciário na decisão da banca
examinadora para avaliar notas (pontuação) conferidas aos candidatos, indicando precedentes deste Tribunal
acerca da matéria. Ao final, pugna pela reforma da sentença, com o fim de julgar improcedente a ação.

O Apelado rechaça, em sede de contrarrazões, as teses apontadas nas razões recursais, pugnando então pelo
conhecimento e improvimento do apelo, mantendo-se a sentença recorrida na sua integralidade.

O Ministério Público Superior emitiu parecer (Id.5172961), opinando pelo CONHECIMENTO E PROVIMENTO do
recurso, com a consequente reforma da sentença.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade recursal, impõe-se


CONHECER do recurso.

Consoante relatado, a Apelante alega falta de interesse de agir, porque o apelado não teria
comprovado que a anulação da questão impugnada resultaria na sua aprovação no certame e
que a pretensão implica em indevida ingerência do Judiciário na decisão da banca examinadora.
Portanto, pugna pelo conhecimento e provimento do apelo, com o fim de que seja julgada
improcedente a ação.

Antes do exame de mérito, passo à análise da preliminar suscitada pela Apelante.

1. Preliminar de falta de interesse processual.

O Estado do Piauí alega falta do interesse de agir, pois o apelado não comprovou que a
pretendida anulação da questão interferirá na sua esfera jurídica, garantindo-lhe aprovação na
fase posterior.

Contudo, não lhe assiste razão.

Segundo o item 5.3.1 do Edital, “será classificado para a 2ª etapa (Exame de Saúde) o candidato
que, cumulativamente, alcançar pontuação igual ou superior a 60% do total de pontos da Prova
Escrita Objetiva, obtiver, no mínimo, 50% do total de pontos de cada uma das matérias, e que,
estiver dentro do limite de 02 (duas) vezes o número de vagas”, no caso, até 54 (cinquenta
e quatro), visto que foram disponibilizadas 27 (vinte e sete) vagas.

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Na hipótese, o Apelado obteve 63 (sessenta e três) pontos na prova objetiva e foi eliminado
porque se encontrava em posição que excedeu “duas vezes o número de vagas”. No entanto,
comprovou que o último colocado ficou em 47ª (quadragésima sétima) colocação, com 63
(sessenta e três) pontos. Assim, com a anulação da questão impugnada no mandamus, ficaria
classificado no certame, pois estaria em posição superior àquele candidato paradigma.

Portanto, considerando que o Apelado demonstrou a utilidade e necessidade do provimento


judicial para obtenção de sua pretensão (posição de vantagem, com a consequente realização
das demais fases do certame) e a relação jurídica trazida à baila, impõe-se a rejeição da
preliminar de ausência do interesse processual.

2. Do mérito.

Conforme relatado, trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de tutela provisória,


impetrado contra ato do Presidente da NUCEPE, visando obter a anulação da questão de nº32 do
concurso para ingresso no cargo de Oficial da Polícia Militar, regido pelo Edital nº05/2013,
realizado pelo Núcleo de Concursos e Promoção de Eventos - NUCEPE/UESPI.

Inicialmente, cabe tecer breves considerações acerca do manejo do presente remédio


constitucional.

Como se sabe, o art. 1º da Lei nº 12.016/09, que reproduz o conteúdo obrigatório do art.5º, LXIX,
da CF/881, dispõe sobre a concessão do Mandado de Segurança, in verbis:

Art. 1 o - Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não
amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder,
qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de
autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. (grifo nosso).

Extrai-se da norma acima referendada a possibilidade do manejo do mandado de segurança


quando se estiver diante de eventual ilegalidade ou abuso de poder, fato que, por força da
natureza do rito próprio do writ, exige-se a comprovação, de pronto, do direito líquido e certo
alegado.

Acerca do direito líquido e certo, lecionam Helly Lopes Meireles, Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira
Mendes:

“(…) é direito comprovado de plano. Se depender de comparação posterior, não é líquido,


nem certo, pra fins de segurança. (….) Por se exigir situações e fatos comprovados de
plano é que não há instrução probatória no mandado de segurança.2

Constatada a ausência de prova do direito líquido e certo, certamente que implicará no

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indeferimento da exordial, inclusive de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública,
extinguindo-se então o feito, sem resolução de mérito.

Como visto, o cerne da demanda gira em torno da suposta inobservância às normas do


Edital nº05/2013-PMPI, por conta de vício na elaboração da questão de nº32 da prova
objetiva do certame.

A respeito do tema, cumpre destacar que o concurso público rege-se pelas leis e normas
previstas no Edital, sendo, então, dever da Administração observar os critérios de avaliação
previamente estabelecidos.

Portanto, a intervenção do Poder Judiciário restringe-se ao exame da legalidade do ato


administrativo, o que lhe permite examinar a compatibilidade do edital com a lei e o devido
cumprimento das normas pela Comissão Organizadora. Com efeito, inexistindo prova de flagrante
ilegalidade, afasta-se a submissão do caso ao controle jurisdicional, na medida em que é
inadmissível adentrar no mérito administrativo, substituindo a avaliação dada pela comissão
examinadora, sob pena de implicar em violação aos princípios da isonomia e separação dos
poderes.

Desse modo, via de regra, mostra-se vedado ao Poder Judiciário realizar o exame dos critérios
adotados pela banca examinadora na formulação de questões, correção e atribuição de notas em
provas de concursos públicos. Excepcionalmente, é permitido apenas o exame de
compatibilidade do conteúdo exigido com o Edital, que é a lei interna do certame, ou se
constatado erro grosseiro na sua elaboração.

Tal entendimento inclusive foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do
Recurso Extraordinário n°632.853/CE, com Repercussão Geral, tendo a Corta Suprema
firmado a tese de que “não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade,
substituir a banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a
elas atribuídas (…)”, salvo flagrante ilegalidade ou inconstitucionalidade (RE 632.853,
Relator: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 23/4/2015, Acórdão Eletrônico
Repercussão Geral - DJe-125 Divulg 26/6/2015 Public 29/6/2015).

Compulsando detidamente os autos, notadamente, a fundamentação exposta na sentença,


conclui-se que o presente recurso não merece ser provido.

Ao contrário do que assevera o ente estatal, o caso em comento se distingue da tese firmada pelo
STF no Tema n. 485/STF (RE n°632853), em face da constatação de flagrante ilegalidade no ato
impugnado.

Ressalte-se, por oportuno, que a matéria discutida nos autos é distinta daquela citada pelo
Apelante (Apelação Cível Nº 2017.0001.005591-8, julgada pela 3ª Câmara de Direito Público),
porque, apesar de se referir ao mesmo concurso, tratou de questões diversas (n°55 e n°59) da
que foi impugnada na ação originária (questão 32), objeto do presente recurso.

Ao analisar os autos, a MMª. Juíza da 2ª Vara Fazendária desta capital concluiu pela
concessão da segurança, sob o fundamento de que ficou comprovado a ilegalidade do ato
administrativo, consistente na existência de erro grosseiro na questão n°32 (Id.4270978), in
verbis:

“(...)

Em relação à questão nº 32, o impetrante sustenta que houve ilegalidade na elaboração do

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gabarito definitivo, que indica a alternativa a como correta.

Aduz que a redação da alternativa foi mal elaborada, incluindo a alternativa 4 como correta,
quando desde o evento da Constituição de 1988 o silêncio do acusado deixou de elemento para
formação do convencimento do juiz.

Sobre a matéria releva registrar que o art. 186 do CPP, assim dispõe:

Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado
será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e
de não responder perguntas que lhe forem formuladas.

Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado
em prejuízo da defesa.

Da análise do dispositivo falado, têm-se que o silêncio do acusado não permite interpretação que
prejudique a defesa, o que impede, em consequência, ser utilizado como fundamento da decisão,
interpretação que realmente pode trazer confusão e induzir o candidato a erro.

Dessa forma, tendo em vista que esta questão permite entendimento contraditório, indo em
sentido oposto do que determina a lei, vislumbra-se que há vício, maculando sua validade,
estando assim passível de anulação.

Desta feita, se mostra cabível a procedência do pedido, com a consequente procedência dos
pedidos, em favor do autor.

(…)”.

Para melhor elucidação da matéria, convém destacar o inteiro teor da referida questão:

32. Analise as proposições abaixo, a respeito da produção de provas no processo penal.

1) Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios,
a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta.

2) O exame de corpo de delito só poderá ser realizado durante o dia e mediante autorização
judicial.

3) Se o interrogado negar a acusação, no todo ou em parte, poderá prestar


esclarecimentos e indicar provas.

4) O silêncio do acusado não importará em confissão, mas poderá constituir elemento para
a formação do convencimento do juiz.

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Estão corretas, apenas:

A) 1, 3 e 4. (alternativa correta do gabarito da NUCEPE)

B) 1, 2 e 4.

C) 2 e 3.

D) 2, 3 e 4.

E) 3 e 4.

In casu, o pedido foi instruído com os documentos necessários à comprovação do direito


líquido e certo pleiteado, e, sobretudo, demonstrada a ilegalidade da questão impugnada
na ação mandamental.

Como visto, a magistrada singular entendeu que a banca examinadora incorreu em erro
grosseiro ao considerar a resposta constante na alternativa “A”, que inclui a assertiva 4
como sendo correta.

Corroboro com o entendimento da Nobre Magistrada ao concluir que a questão permite


interpretação contraditória à Lei, que traz confusão e leva o candidato a incorrer em erro, tendo
em vista que considera a possibilidade de o julgador se utilizar do silêncio do acusado como
fundamento para sua decisão, o que é inadmissível no ordenamento jurídico, sob pena de
implicar em ofensa ao disposto no Art. 5º, inc. LXIII, da Constituição Federal, que assegura o
direito ao silêncio, e no Art. 186 do Código de Processo Penal, segundo o qual “o silêncio, que
não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa”.

Apesar de o item 4 da questão tratar-se de letra de lei, porque reproduz, ipsis litteris, o artigo 198
do Código de Processo Penal, como bem destacado no parecer ministerial, é de notório saber
que essa norma não foi recepcionada pela Carta Magna, em face da premissa maior de que
o acusado, preso ou não, possui direito ao silêncio.

Evidentemente, a prerrogativa de o réu permanecer calado se sobrepõe a qualquer norma


infraconstitucional que permita interpretação contrária. Além do que a nova lei que incluiu o
parágrafo único do art. 186 (Lei nº 10.792, de 1º.12.2003) implicou em revogação tácita do art.
198 do CPP.

Assim, como consequência, torna-se manifestamente inconstitucional admitir que esse ato
(silêncio do acusado) possa servir como elemento para convicção do juiz.

A propósito, cito doutrina de Torinho Filho3 e Nucci4 que discorrem acerca do conflito existente
entre as normas em referência (art.186 e 198 do CPP) e a relevância do direito ao silêncio:

“(…) Se o réu tem o direito ao silêncio, como garantia constitucional, parece-nos evidente
que, se porvertura dele fizer uso, não pode o juiz louvar-se nessa circunstância para a
formação do seu convencimento. (…) As duas disposições, como estão, se contradizem.
Prevalece, contudo, a mais recente, por estar em harmonia com o texto constitucional, que
confere o direito ao silêncio (…)”. [grifo nosso]

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“(…) Silêncio como elemento para o convencimento do juiz: a parte final do art. 198 não foi
recepcionada pela Constituição Federal de 1988, que, expressamente, conferiu ao réu a
possibilidade de manter-se calado (art.5º, LVIII), sem estabelecer qualquer consequência
dessa opção, razão pela qual não pode a lei ordinária fixar conteúdo diverso. Se o acusado
for advertido de que se pode calar, mas o juiz pode levar tal silêncio em consideração, é natural
que não há direito algum, pois existe alternativa real de se prejudicar com tal prerrogativa. (…)”
[grifo nosso]

Frise-se que não cabe no presente recurso discutir o tema com profundidade, nem se pretende
quanto à questão acima que o Poder Judiciário reexamine seu conteúdo ou o critério de correção
para concluir se a resposta dada pelo candidato está adequada ou não, mas reconhecer que a
assertiva “4” da questão n°32 contém erro grave insuperável, pois permite interpretação
contrária à Constituição Federal e art 186 do CPP.

Desse modo, ratificando o posicionamento adotado pela juíza a quo, conclui-se pela anulação da
questão ora impugnada, pois induz o candidato a adotar conclusão contrária ao gabarito oficial.

Nesse sentido, destaco jurisprudência do STF e do STJ, a saber:

MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. ANULAÇÃO DE QUESTÕES DA PROVA


OBJETIVA. DEMONSTRAÇÃO DA INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO À ORDEM DE
CLASSIFICAÇÃO E AOS DEMAIS CANDIDATOS. PRINCÍPIO DA ISONOMIA OBSERVADO.
LIQUIDEZ E CERTEZA DO DIREITO COMPROVADOS. PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DAS
QUESTÕES EM DECORRÊNCIA DE ERRO GROSSEIRO DE CONTEÚDO NO GABARITO
OFICIAL. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO PARCIAL DA SEGURANÇA. 1. A anulação, por via
judicial, de questões de prova objetiva de concurso público, com vistas à habilitação para
participação em fase posterior do certame, pressupõe a demonstração de que o Impetrante
estaria habilitado à etapa seguinte caso essa anulação fosse estendida à totalidade dos
candidatos, mercê dos princípios constitucionais da isonomia, da impessoalidade e da eficiência.
2. O Poder Judiciário é incompetente para, substituindo-se à banca examinadora de concurso
público, reexaminar o conteúdo das questões formuladas e os critérios de correção das provas,
consoante pacificado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Precedentes (v.g., MS
30433 AgR/DF, Rel. Min. GILMAR MENDES; AI 827001 AgR/RJ, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA;
MS 27260/DF, Rel. Min. CARLOS BRITTO, Red. para o acórdão Min. CÁRMEN LÚCIA),
ressalvadas as hipóteses em que restar configurado, tal como in casu, o erro grosseiro no
gabarito apresentado, porquanto caracterizada a ilegalidade do ato praticado pela Administração
Pública. 3. Sucede que o Impetrante comprovou que, na hipótese de anulação das questões
impugnadas para todos os candidatos, alcançaria classificação, nos termos do edital, habilitando-
o a prestar a fase seguinte do concurso, mediante a apresentação de prova documental obtida
junto à Comissão Organizadora no exercício do direito de requerer certidões previsto no art. 5º,
XXXIV, b, da Constituição Federal, prova que foi juntada em razão de certidão fornecida pela
instituição realizadora do concurso público. 4. Segurança concedida, em parte, tornando-se
definitivos os efeitos das liminares deferidas.

(STF - MS: 30859 DF, Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 28/08/2012, Primeira Turma,
Data de Publicação: DJe-209 DIVULG 23-10-2012 PUBLIC 24-10-2012).

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PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. PEDIDO DE ANULAÇÃO DE
QUESTÕES OBJETIVAS E CONSEQUENTE DECLARAÇÃO DO DIREITO DE PROSSEGUIR
NO CERTAME. ILEGALIDADE FLAGRANTE. TEMA N. 485/STF. CONSONÂNCIA DO
ACÓRDÃO COM JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. I - Na origem, trata-se de ação de
anulação de ato administrativo, com pedido de antecipação de tutela na forma cautelar, contra a
recorrente, pleiteando a anulação de questões da prova objetiva do concurso para Procurador da
Fazenda Nacional, com a consequente atribuição, em sua prova, de pontos relativos às
mencionadas questões, reconhecendo-se sua aprovação naquela fase do concurso. A sentença
julgou parcialmente procedente o pedido. O Tribunal a quo manteve a sentença. II - Na hipótese
dos autos, com relação à aplicação do Tema n. 485/STF, tem-se que, conforme a jurisprudência
da Corte Suprema ( RE n. 632.853/CE, submetido ao rito de repercussão geral), embora seja
vedado ao Poder Judiciário o reexame de conteúdo de questões em provas de concurso público,
seus critérios de correção etc., excepcionalmente tal análise é possível nos casos de flagrante
ilegalidade ou inconstitucionalidade. Ora, o Tribunal de origem julgou a lide em consonância com
a jurisprudência desta Corte, ou seja, é possível tal análise excepcionalmente, nas circunstâncias
referidas (ilegalidade/inconstitucionalidade). III - Desta forma, aplica-se à espécie o enunciado da
Súmula n. 83/STJ: "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação
do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida. Ressalte-se que o teor do referido
enunciado aplica-se, inclusive, aos recursos especiais interpostos com fundamento na alínea a do
permissivo constitucional." Nesse sentido: RMS n. 62.040/MG, relator Ministro Herman Benjamin,
Segunda Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 27/2/2020. IV - Sobre a não aplicação da Teoria do
Fato Consumado ao caso em exame, mais uma vez a Corte de origem prestigiou a jurisprudência
do STJ ao concluir, quanto a este que é ponto fulcral da demanda, que o pedido de concessão da
liminar foi deferido em dezembro de 2007, e que a recorrida já tomou posse no cargo pretendido,
já gozando, inclusive, de estabilidade, o que implica na existência de uma situação taticamente
consolidada pelo tempo, cuja desconstituição não se recomenda.? Incide, portanto, mais uma
vez, o Óbice Sumular n. 83/STJ. Anote-se: AgInt no REsp n. 1.256.762/RJ, relator Ministro Sérgio
Kukina, Primeira Turma, julgado em 13/10/2020, DJe 28/10/2020. V - Agravo interno improvido.

(STJ - AgInt no REsp: 1947925 BA 2021/0209401-2, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO,


Data de Julgamento: 28/03/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 31/03/2022)

De igual modo, vem se posicionando os Tribunais Estaduais:

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA COM PEDIDO DE LIMINAR – CONCURSO


PÚBLICO – PROMOÇÃO AO POSTO DE 3º SARGENTO – ALEGAÇÃO DE VÍCIOS NAS
QUESTÕES – POSSIBILIDADE DE O JUDICIÁRIO REALIZAR O EXAME DOS CRITÉRIOS
UTILIZADOS PELA BANCA EXAMINADORA NA CORREÇÃO DA PROVA QUANDO
CONSTATADO ERRO GROSSEIRO EM QUESTÃO – PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL E
DOS TRIBUNAIS SUPERIORES – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Ao Poder Judiciário
somente é dado o exame da legalidade do procedimento administrativo, cabendo
excepcionalmente anular questões incompatíveis com o conteúdo programático previsto no edital
ou em caso de constatação de erro grosseiro em sua elaboração.

(TJ-MS - AC: 08029232220158120004 MS 0802923-22.2015.8.12.0004, Relator: Des. Júlio


Roberto Siqueira Cardoso, Data de Julgamento: 14/02/2020, 4ª Câmara Cível, Data de

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Número do documento: 22100716575257200000008700137
Publicação: 17/02/2020).

E M E N T A – RECURSO DE APELAÇÃO – CONDENAÇÃO EM DEVER DE FAZER –


CERCEAMENTO DE DEFESA – PRELIMINAR REJEITADA – ANULAÇÃO DE QUESTÕES DE
PROCESSO SELETIVO INTERNO PARA SARGENTO – EXISTÊNCIA DE ERRO GROSSEIRO
EM ALGUMAS QUESTÕES – POSSIBILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO REVER OS
CRITÉRIOS DE CORREÇÃO EM CASO DE ERRO GROSSEIRO . 1- Nos termos do artigo 370
do Código de Processo Civil, cabe ao magistrado avaliar a conveniência e a necessidade de
realizar as provas requeridas pelas partes. Nessa hipótese, a realização de perícia é totalmente
desnecessária, por ser tarefa exclusiva do magistrado avaliar a existência ou não de erro
grosseiro ou não em questão de concurso público, na condição de homem médio e julgador da
demanda. 2- O Poder Judiciário só pode rever os critérios de correção da banca examinadora
quando existe violação às regras do edital ou há ilegalidade evidente. Recurso parcialmente
provido.

(TJ-MS - APL: 08162772620158120001 MS 0816277-26.2015.8.12.0001, Relator: Des. Vilson


Bertelli, Data de Julgamento: 23/11/2016, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 25/11/2016)

Assim, não procedem as alegações apresentadas pelo ente estatal, tendo em vista que ficou
evidente a ilegalidade do ato combatido na ação originária, em decorrência de erro grosseiro na
elaboração da questão sob análise, implicando em vício insanável que justifica sua anulação.

Portanto, impõe-se a manutença da sentença que concedeu a segurança, em face da prova pré-
constituída do direito vindicado.

3. Do dispositivo.

Posto isso, CONHEÇO do presente recurso, mas NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se


então a sentença na sua integralidade, em dissonância com o parecer Ministerial Superior.

Sem honorários advocatícios, a teor do art. 25 da Lei nº 12.016/09 e Súmula 105 do STJ5.

É como voto.

Transcorrido in albis o prazo recursal, certifique-se o trânsito em julgado do Acórdão e


proceda-se à baixa do feito na Distribuição.

1. Art.5º, LXIX da CF/88 - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e
certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade
ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições
do Poder Público;

2.Mandado de Segurança, 33. ed., Malheiros:2010;

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Número do documento: 22100716575257200000008700137
3 FILHO, Fernando da Costa Tourinho. Código de Processo Penal Comentado (arts. 1º a 393).
13ªEd. Saraiva: 2010. pág.617.

4 NUCCI, Guilherme de Souza Nucci, código de Processo Penal comentado. 15ªEd. Forense:
2016, pág.505.

5 Colhe-se do entendimento jurisprudencial da Corte Superior (STJ, AgInt nos EDcl no AREsp
1102411/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/11/2017,
DJe 19/12/2017).

DECISÃO

Acordam os componentes da Egrégia 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça


do Estado do Piauí, à unanimidade, em CONHECER do presente recurso, mas NEGAR -
LHE PROVIMENTO, mantendo-se então a sentença na sua integralidade, em dissonância
com o parecer Ministerial Superior. Sem honorários advocatícios, a teor do art. 25 da Lei nº
12.016/09 e Súmula 105 do STJ5. Transcorrido in albis o prazo recursal, certifique-se o
trânsito em julgado do Acórdão e proceda-se à baixa do feito na Distribuição, na forma do
voto do Relator.”

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Desembargadores Des. Sebastião Ribeiro


Martins, Des. Pedro de Alcântara da Silva Macêdo e Des. Haroldo Oliveira Rehem-
Convocado.

Impedimento: Exmo. Des. Edvaldo Pereira de Moura.

Houve sustentação oral: Dr. Yuri Rufino Queiroz (OAB/PI nº 15.768).

Presente a Exma. Sra. Dra. Lenir Gomes dos Santos Galvão- Procuradora de Justiça.

SESSÃO POR VIDEOCONFERÊNCIA DA 5ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO DO EGRÉGIO


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ, em Teresina, realizada no dia 04 de
OUTUBRO de 2022.

Des. Pedro de Alcântara da Silva Macêdo

- Relator -

Teresina, 07/10/2022

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