Você está na página 1de 6

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2022.0000335616

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº


2035857-10.2022.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que são agravantes
DORALICE TERESINHA CLEMENTINO, AIRTON ADAIL CLEMENTINO e
VÂNIA TERESINHA CLEMENTINO, são agravados ADAIL MARTINHO
CLEMENTINO (ESPÓLIO) e DISNAI CARDOSO DA SILVA
(INVENTARIANTE).

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 4ª Câmara de Direito


Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram
provimento ao recurso, na parte conhecida. V. U., de conformidade com o voto do
relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores MARCIA DALLA


DÉA BARONE (Presidente) E MAURÍCIO CAMPOS DA SILVA VELHO.

São Paulo, 4 de maio de 2022.

ALCIDES LEOPOLDO
Relator(a)
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

AGRAVO DE INSTRUMENTO
Processo nº 2035857-10.2022.8.26.0000
Nº de 1ª Instância: 1003891-78.2016.8.26.0704
Comarca: São Paulo (Foro Regional XV Butantã - 1ª Vara de
Família e Sucessões)
Agravantes:Doralice Terezinha Clementino e outros
Agravado: O Juízo
Juíza: Renata Coelho Okida
Voto n. 26.289
Segredo de Justiça

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO – Inventário –


Base de cálculo do ITCMD – Encaminhamento à via
administrativa ou ao ajuizamento de ação própria - Cálculo
do ITCMD que é matéria afeta ao procedimento do
inventário, como deflui do art. 638 do CPC/2015 – Cabe ao
juízo do inventário decidir, nos termos do art. 612 do
CPC/2015, todas as questões de direito, o que é o caso –
Impossibilidade de supressão de instância para decisão
diretamente em Segundo Grau – Recurso provido na parte
conhecida.

Trata-se de agravo de instrumento, sem pedido de


liminar, nos autos da ação de inventário, da decisão proferida nos autos
de origem às fls. 636, no sentido de que a questão relativa ao cálculo do
ITCMD deve ser discutida no âmbito administrativo ou em ação judicial
própria, pois extrapola matéria adstrita no presente arrolamento.

Sustentam os recorrentes que a inventariante


comprovou o recolhimento do ITCMD, não sendo necessária a anuência
da Fazenda do Estado, não se tratando os presentes autos de diferenças a

Agravo de Instrumento nº 2035857-10.2022.8.26.0000 -Voto nº 26.289 2


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

serem recolhidas e sim da aplicação correta da lei, não podendo o


Magistrado remeter a discussão acerca da lei às vias administrativas, mas
sim, determinar o regular prosseguimento do feito, independentemente
do esgotamento das vias administrativas quanto à discussão de natureza
tributária, sendo que, com a Lei nº 11.441/2007, o recolhimento é feito
sem a necessidade de verificação prévia do Fisco, nos termos do
Comunicado CAT-19 da Fazenda Estadual de São Paulo, de 04 de abril
de 2007, onde o Tabelião poderá lavrar a escritura pública de inventário
somente com a comprovação do recolhimento do imposto, sem a
necessidade de verificação ou manifestação do Fisco, não podendo o
tratamento judicial dos inventários ter procedimento diferenciado.

Pleiteia a reforma para que seja revogada a decisão


agravada, remetendo-se os autos ao contador judicial para verificação
dos cálculos, com o prosseguimento do feito.

A Fazenda do Estado apresentou contrarrazões


sustentando a manutenção da decisão (fls.14/17).

É o Relatório.

A questão a ser conhecida é unicamente acerca da


competência do Juízo do inventário para decidir sobre o cálculo do
ITCMD, sob pena de supressão de instância.

Dispõe o vigente art. 612 do CPC/2015 que: "o juiz


decidirá todas as questões de direito desde que os fatos relevantes
estejam provados por documento, só remetendo para as vias ordinárias
as questões que dependerem de outras provas".

Agravo de Instrumento nº 2035857-10.2022.8.26.0000 -Voto nº 26.289 3


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Segundo o escólio de Hamilton de Moraes e


Barros2, ainda na vigência do direito anterior: “questão de alta indagação
é a que depende de prova a ser colhida fora do processo em que surgiu,
ou foi apresentada. Porque são questões que reclamam outras
averiguações, são também chamadas de maior indagação”, aduzindo:
“alta indagação não é, assim, uma intricada, difícil e debatida questão de
direito. É o fato incerto que depende de prova aliunde, isto é, de prova a
vir de fora do processo, e ser colhida em outro feito”3.

Colhe-se da lição de Euclides de Oliveira e


Sebastião Amorim4 que: "em questões exclusivamente de direito, o juiz
deve dar a solução adequada, por mais complexa que seja: quando se
tratar de questões de fato, estas só podem ser solucionadas no inventário
se já comprovadas nos autos. Remeterá o juiz para as vias ordinárias,
portanto, o exame, das questões fáticas que pendem de outras provas, a
serem discutidas ou pesquisadas com mais profundidade".

Não destoa Antonio Carlos Marcato5 no sentido de


que: "seja em atenção às finalidades do inventário e partilha (atribuição
dos quinhões aos herdeiros, satisfação de credores do espólio etc.), seja
porque a vedação de produção de provas orais prestigia a celeridade
processual e expurga do âmbito do mérito questões estranhas ao puro
direito sucessório (ou que não possam ser resolvidas exclusivamente por
meio de prova documental), no processo de inventário e partilha não
serão debatidas e solucionadas questões fáticas que exijam a produção

2 BARROS, Hamilton de Moraes e. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. IX. Rio de
Janeiro: Forense, p. 156-7.
3 Ob. cit. p.157-8.
4 AMORIM, Sebastião Luiz. OLIVEIRA, Euclides Benedito de. Inventário e Partilhas: Direito das

Sucessões: Teoria e Prática. 23ª ed. São Paulo: Leud, 2013, p.285.
5 MARCATO, Antonio Carlos. Procedimentos Especiais. 10ª Ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.227.

Agravo de Instrumento nº 2035857-10.2022.8.26.0000 -Voto nº 26.289 4


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

de prova oral, inspeção judicial ou perícia".

É assente perante o Superior Tribunal de Justiça


que: "cabe ao juízo do inventário decidir, nos termos do art. 984 do
CPC, 'todas as questões de direito e também as questões de fato, quando
este se achar provado por documento, só remetendo para os meios
ordinários as que demandarem alta indagação ou dependerem de outras
provas', entendidas como de 'alta indagação' aquelas questões que não
puderem ser provadas nos autos do inventário" (REsp 450.951/DF, Rel.
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
23/03/2010, DJe 12/04/2010).

Sendo a controvérsia a delimitação da base de


cálculo do ITCMD a ser pago, se considerado o valor venal de
referência ou o valor venal do imóvel lançado para fins de IPTU, matéria
que se mostra exclusivamente de direito, razão pela qual cabe ao juiz do
inventário dirimi-la, conforme precedente desta Câmara:

Agravo de instrumento. Inventário. Decisão de


primeiro grau que deixou de decidir a respeito da
base de cálculo ou alíquota do ITCMD sob o
fundamento de que o Juízo não detém competência
para tanto. Inconformismo da inventariante.
Alegação de que o Juízo Sucessório é competente
para apreciar questões afetas à base de cálculo do
imposto causa mortis. Cabimento. Caso em que a
competência para apreciação da matéria envolvendo
a definição da base de cálculo do tributo causa
mortis é do juízo do inventário. Inteligência do art.
638, §2º, CPC. Decisão reformada. Recurso a que se
dá provimento. (AI 2113972-50.2019.8.26.0000,
Relator: Maurício Campos da Silva Velho, j.
06/11/2019).

Agravo de Instrumento nº 2035857-10.2022.8.26.0000 -Voto nº 26.289 5


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Pelo exposto, DÁ-SE PROVIMENTO ao agravo


de instrumento, na parte conhecida, nos termos da fundamentação para
julgamento da questão de direito pelo Juízo de origem.

ALCIDES LEOPOLDO
Relator(a)
Assinatura Eletrônica

Agravo de Instrumento nº 2035857-10.2022.8.26.0000 -Voto nº 26.289 6

Você também pode gostar