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Accorsi et al.
Accorsi etULAKES
al. ULAKES
J Med, 2020
J Med, 2020
1 (EE) 81-87
1 (EE) 81-87
Daniela Xavier Accorsi1, Ingrid Aparecida Mendes dos Santos2, Juliana Xavier Accorsi1,3, Silvia
Bohac1, Chung Man Chin1,2
1
Centro de Pesquisa Avançada em Medicina, Faculdade de Medicina da UNILAGO, União das Faculdades
dos Grandes Lagos, São José do Rio Preto, SP, 2 Lapdesf - Laboratório de Desenvolvimento de Fármacos,
Departamento de Fármacos e Medicamentos, Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unesp, Araraquara,
SP, 3 Faculdade de Medicina - Faceres, São José do Rio Preto, SP, Brasil.
[Autor correspondente. CMC:chung@unilago.edu.br]
RESUMO
A COVID-19, responsável por uma das mais abrangentes pandemias da história, está relacionada
com uma vasta complexidade de manifestações clínicas. A literatura científica demonstrou uma
ampla variedade de sinais e sintomas apresentados por pacientes com COVID-19. Contudo, sabe-se
que alguns sinais e sintomas são mais raros e há escassez de estudos que abordam seus mecanismos
fisiopatológicos. O presente estudo tem por objetivo realizar uma revisão sobre a patogenia da
COVID-19 no sistema nervoso central, com ênfase na teoria da tempestade de citocinas.
Palavras-chave: COVID-19, SNC; SARS-CoV-2; manifestações neurológicas; encefalite;
ABSTRACT
COVID-19, responsible for one of the biggest pandemics in history, is related to a vast complexity
of clinical manifestations. The scientific literature has demonstrated a wide variety of signs and
symptoms presented by patients with COVID-19. However, it is known that some signs and
symptoms are more rarer and there is a scarcity of studies that address their pathophysiological
mechanisms. The present study aims to perform a review on the pathogeny of COVID-19 in the
central nervous system, with emphasis on the theory of cytokine storm.
Key words: COVID-19, CNS; SARS-CoV-2; neurological manifestations; encephalitis.
migrar para o local de inflamação, onde foi tontura, redução do nível de consciência,
observado a indução de super expressão de hiposmia, hipogeusia entre outros.11,12
citocinas pró-inflamatórias e quimiocinas, além
Estudos apontam que as manifestações
disso, quando infectadas, células como
neurológicas do SNC são mais comuns do que
monócitos e macrofágos podem desencadear
as do sistema nervoso periférico (SNP), bem
uma produção de citocinas exacerbada. Por fim,
como são significativamente mais frequentes
no local da inflamação, elas podem mediar o
nos casos mais graves. A hipótese para tal
dano no órgão através da secreção excessiva de
frequência nestes casos estaria na contagem de
proteases e espécies reativas de oxigênio.5,6
linfócitos, uma vez que pacientes com sintomas
Alguns estudos de infecção de SARS-CoV por do SNC em estados clínicos mais graves
via intranasal em camundongos demonstrou a apresentaram um número reduzido de
morte neuronal e up regulation da liberação de linfócitos, o que poderia servir de marcador de
citocinas pró-inflamatórias por astrócitos e comprometimento neurológico.12
microglias (células imunes do SNC). O dano
No quadro 1, Rogers e colaboradores (2020)
tecidual provocado pelo vírus SARS-CoV pode
mostram as manifestações neurológicas mais
induzir o recrutamento de mais células imunes,
intensificando o efeito de tempestade de frequentes ocasionadas pelas infecções por
citocinas.7,8 SARS-Cov, MERS-Cov e SARS-Cov-2.13
Uma relação que pode ser estabelecida entre a ENCEFALOPATIA NECROSANTE
tempestade de citocinas e manifestações AGUDA (ENA)
neuronais durante a COVID-19 é que as
O primeiro caso de encefalopatia necrosante
citocinas inflamatórias podem destruir células aguda decorrente de COVID-19 foi reportado
endoteliais ou induzir um estado de pela equipe do médico Neo Poyadji do
hipercoagulação, provocando problemas Departmento de Radiologia do Henry Ford
vasculares no cérebro. Existem outras doenças Health System, localizado em Detroid,
e quadros clínicos que podem ser Michigan, EUA, em fevereiro de 2020.14
desencadeados por meio de uma produção e
secreção desenfreada de citocinas pró- A encefalopatia necrosante aguda (ENA) é uma
inflamatórias, o que pode explicar o complicação rara da influenza e outras
aparecimento de certas manifestações infecções virais, sendo descrita mais
neuronais em alguns casos de COVID-19 ao frequentemente em crianças do que em adultos.
redor do mundo.10 É caracterizada por um quadro neurológico
com progressão rápida e deterioração do estado
de consciência, associado a lesões cerebrais
MANIFESTAÇÕES NEUROLÓGICAS DA multifocais simétricas que envolvem tálamo,
COVID-19 tronco cerebral, substância branca e cerebelo. A
fisiopatologia da ENA está relacionada a
A infecção causada pelo vírus SARS-CoV-2,
tempestades de citocinas intracranianas, que
desde o princípio, tem sido caracterizada pela
resultam em ruptura da barreira
inerente manifestação clínica da síndrome
hematoencefálica, todavia sem invasão viral
respiratória aguda (SRA), um dos principais
direta ou desmielinização parainfecciosa. A
sintomas até então. Entretanto, esta é, de longe,
infecção causada pelo vírus Sars-Cov-2 em
a principal manifestação clínica promovida
grupos de pacientes em estado grave pode
pelo COVID-19. Com os crescentes números
provocar uma resposta hiperinflamatória no
de casos despontando por todo o mundo,
organismo, a qual se caracteriza pela
surgiram relatos de síndromes neurológicas
hiperativação imunológica, em que as células
secundárias à infecção, como meningite,
NK e os linfócitos T citotóxicos não conseguem
encefalite, encefalopatia, acidente vascular
eliminar os macrófagos ativados, resultando em
encefálico (AVE), Síndrome de Giullian-Barré,
uma produção excessiva de citocinas pró-
além de sinais e sintomas como cefaleia,
inflamatórias. Esta produção excessiva de
parênquima cerebral. Esses termos descrevem algumas infecções podem induzir anticorpos a
um processo inflamatório inespecífico, o qual reagirem de maneira cruzada com antígenos
pode ser desencadeado por inúmeros agentes neurais e dessa maneira ocasionar uma
etiológicos, porém apresentam manifestações neuropatia inflamatória, e embora muitos
clínicas semelhantes. Há uma ampla variedade agentes infecciosos como vírus Epstein - Barr,
de etiologias para a meningite e para a citomegalovírus, e vírus Zika tenham sido
encefalite, dentre elas: virais, bacterianas, correlacionados a estas reações cruzadas, há
fúngicas, induzida por drogas, induzida por relatos de associação entre a síndrome de
neoplasia, associada a doenças de Guillain-Barré e infecções pelo vírus SARS-
hipersensibilidade autoimune, entre outras.15 Cov-2. Segundo estudos, a síndrome de
Guillain-Barré ocasionada pelo novo
As meningites e as encefalites virais
coronavírus se apresenta de forma semelhante à
são responsáveis por manifestações clínicas
patologia causada por outros agentes. O
agudas e inespecíficas, que variam de acordo
intervalo entre o início dos sintomas de Covid-
com diversos fatores, incluindo a faixa etária do
19 e os primeiros sintomas da síndrome variou
indivíduo e a associação de fatores de risco. Os
de 5 a 10 dias, sendo os primeiros sintomas
sintomas mais comuns da meningite viral
fraqueza dos membros inferiores, parestesia,
englobam a febre, irritabilidade, cefaléia
diplegia facial e ataxia, evoluindo para
intensa e presença de sinais meníngeos; ao
tetraparesia flácida ou a tetraplegia
passo que as encefalites virais representam um
generalizada.17
maior potencial de gravidade, predominando
um acometimento precoce do sensório e
levando, com mais frequência, ao rebaixamento
CONCLUSÃO
do nível de consciência.15
Nas infecções por SARS-CoV e MERS foram
A ciência tem demonstrado, por meio de relatadas manifestações centrais como ansiedade,
estudos analíticos, que a COVID-19 pode rebaixamento dos níveis de consciência,
acometer o SNC, representado por alucinações, alterações de humor, agitação.
manifestações neurológicas de Entretanto, no caso de SARS-CoV-2, foram
meningoencefalite. A fisiopatologia ainda não observados além dos efeitos centrais já relatados,
está bem elucidada; porém, sabe-se que a outras manifestações neurológicas como meningite,
ruptura da barreira hematoencefálica, associada encefalite, encefalopatia necrosante aguda (ENA),
à expressão da ECA-2 no tecido nervoso, são Síndrome de Giullian-Barré. Estudos demonstraram
que as manifestações neurológicas advindas da
fatores relacionados ao acesso do SARS-CoV-
infecção pelo vírus SARS-CoV-2 estão relacionadas
2 ao SNC.17 Filatov e colaboradores, relataram com a neuroinflamação que evolui com a
um caso de encefalite provocado por SARS- tempestade de citocinas. Não se sabe, até o
CoV-2 em uma mulher de 78 anos, em março momento, qual o paciente de risco para estas
de 2020.16 manifestações centrais graves.