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PLANEJAMENTO DE ENSINO NA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CRÍTICA: UMA

INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA NA DISCIPLINA DE PRÁTICA DE FORMAÇÃO


NO CURSO DE FORMAÇÃO DE DOCENTES

Gleyde Pereira Freire Bono1


Dra. Nilva de Oliveira Brito dos Santos2

RESUMO

O processo de ensino e aprendizagem envolve professor e educando. Nesse


sentido, inúmeras reflexões devem ocorrer acerca do que se pretende alcançar
exigindo, portanto, um planejamento de ensino. Elaborá-lo significa levar em
consideração princípios (filosóficos, epistemológicos e didático-pedagógicos), uma
vez que este nos remete à organização do trabalho educativo. Diante do exposto,
questiona-se: O planejamento de ensino ao ser elaborado pelos futuros educadores
tem como referência o projeto político-pedagógico e a proposta curricular da
instituição escolar, na qual irão atuar? Em que bases teórico-metodológicas o
planejamento se sustenta? A reflexão sobre essa problemática constituiu o foco da
pesquisa. Tendo como objeto de investigação o planejamento de ensino e
recorrendo à pesquisa-ação, este trabalho buscaevidenciarqueo exercício da prática
pedagógica sustentado por uma teoria crítica, possibilita a construção do
planejamento docente na perspectiva do desenvolvimento do processo de ensino e
aprendizagem, também crítico. A produção apresenta a trajetória de intervenção
pedagógica junto aos alunos da terceira série do Curso de Formação de Docentes
na disciplina de Prática de Formação do Colégio Estadual Ary João Dresch, Ensino
Fundamental, Médio, Normal e Profissionaldo município de Nova Londrina –
Paraná.Na intervenção buscou-se:aprofundar as discussões quanto ao
planejamento de ensino, bem como produzir e executar o Planejamento de Ensino
na Perspectiva Histórico-Crítica. Autores como: Saviani(2008); SCALCON (2002);
GASPARIN (2003) entre outros, fundamentaram os estudos, a pesquisa e a ação
envolvendo o Planejamento de Ensino. Os resultados obtidos retratam a apreensão
dos futuros educadores quanto à necessidade do planejamento para o exercício da
prática educativa e a exigência de que este instrumento esteja articulado ao projeto
político-pedagógico da instituição de ensino, ou seja, saíram do estágio de síncrese
em que se encontravam no ponto de partida, passaram pelo processo de análise,
caminhada desenvolvida e atingiram uma síntese.

Palavras-chave: Pedagogia Histórico-Crítica. Formação de Docentes. Planejamento


de Ensino

1
Professora da Rede Estadual de Educação do Paraná, no Colégio Estadual Ary João Dresch-Ensino
Fundamental, Médio, Normale Profissional, localizado em Nova Londrina – Paraná. Email:
nldarydresch@seed.pr.gov.br.
2
Professora Doutora, orientadora do PDE pela Universidade Estadual do Paraná – Campus de
Paranavaí. Email: nilvaobs@gmail.com
1. INTRODUÇÃO

O processo de ensino e aprendizagem envolve professor e educando. Nesse


sentido, inúmeras reflexões devem ocorrer acerca do que se pretende alcançar.
Seres humanos são entregues ao professor, na perspectiva de que este, por meio
do ensino, transmita-lhes os conhecimentos historicamente produzidos pela
humanidade. Esse processo exige fundamentação teórico-metodológica
e,conseqüentemente,a elaboração de um planejamento do trabalho a ser realizado.
Um olhar enquanto, pedagoga/educadora, sobre a prática pedagógica
desenvolvida no Curso de Formação de Docentes, evidencia que o planejamento
elaborado pelos futuros educadores, na maioria das vezes, vem ocorrendo de forma
mecânica visando atender um aspecto burocrático. Os conteúdos são planejados,
selecionados com o auxíliodo livro didáticooque não atende as expectativas da
disciplina Prática de Formação, uma vez que esta,

[...] deve proporcionar ao aluno em formação a condição de


refletir teórico e praticamente sobre a ação docente.
Considerando que esta reflexão deve partir de elementos
constituintes da prática diária da ação docente, esta disciplina
não deixa de se constituir em um espaço de
pesquisa(PARANÁ, 2008. p. 228).

Segundo orientações gerais estabelecidas,

[...] o encaminhamento da Prática deve proporcionar ao aluno


uma preparação teórico-metodológico de pesquisa que
possibilite o olhar cientifico para o objeto em análise, a
educação, uma vez que a ação educativa é uma intervenção na
realidade que deve se dar de forma consciente, cognoscente e
cientifica (PARANÁ, 2008, p. 229).

Elaborar um planejamento de ensino significa levar em consideração


princípios (filosóficos, epistemológicos e didático-pedagógicos), uma vez que este
nos remete à organização do trabalho educativo. Diante do exposto, questiona-se: O
planejamento de ensino ao ser elaborado pelos futuros educadores tem como
referência o projeto político-pedagógico e a proposta curricular da instituição escolar,
na qual irão atuar? Em que bases teórico-metodológicas o planejamento se
sustenta?
A reflexão sobre essa problemática constituiu o foco desta pesquisa, cujo
objetivo geral está centrado emevidenciar que o exercício da prática pedagógica,
subsidiado por uma teoria crítica, possibilita a construção do planejamento docente
na perspectiva do desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem, também
crítico. Constituem os objetivos específicos: efetuar um estudo das concepções e
tendências pedagógicas que marcaram a educação brasileira historicamente;
caracterizar a Pedagogia Histórico-Crítica e pressupostos que a sustenta enquanto
suporte teórico-metodológico na elaboração e execução do planejamento de ensino;
identificar nos documentos norteadores das práticas educativas: Projeto Político
Pedagógico e Proposta Curricular, suporte teórico que os sustentam e sua
articulação com o planejamento de ensino; elaborar e executar o planejamento de
ensino para atuação docente na disciplina de Prática de Formação, levando em
consideração a Pedagogia Histórico-Crítica.

2. CONCEPÇÕES E TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS: UMA RETROSPECTIVA

Para uma leitura crítica sobre o planejamento de ensino, objetivando


identificar o suporte teórico que o sustenta, há que se recorrer à literatura, buscando
um referencial teórico produzido na área. Nesse sentido, as teorias educacionais e
respectivas tendências pedagógicas que marcaram a educação brasileira, ainda que
de forma sintética, precisam ser retomadas.
O exercício da prática pedagógica passa pela compreensão de Pedagogia,
enquanto uma grande área do conhecimento.

A pedagogia investiga a natureza das finalidades de educação como


processo social, no seio de uma determinada sociedade, bem como
metodologias apropriadas para a formação dos indivíduos, sendo em
vista seu desenvolvimento humano para tarefas na vida em
sociedade (LIBÂNEO, 1993, p. 24).

A partir dessa concepção, pode-se dizer que a prática educativa é intencional


no processo de formação humana.
Desde os primórdios, há indícios de que a educação não se apresentava
sistematizada, mas sim via formas elementares de instrução como os rituais de
iniciação à vida adulta. Contudo, não há a pretensão aqui de se deter sobre “[...]
educação não intencional que se refere às influências do contexto social e do meio
ambiente sobre os indivíduos” (LIBÂNEO, 1993, p. 17, grifos do autor), mas da
educação organizada de forma sistemática e intencional em que há intenções e
objetivos definidos conscientemente, cujo espaço para que ocorra, é a escola.A
educação brasileira,

[...] desenvolveu-se, principalmente, por influência da pedagogia


católica (a pedagogia tradicional de orientação religiosa), com os
jesuítas, que, praticamente, exerceram o monopólio educacional até
1759, quando foram expulsos por Pombal (SAVIANI, 2008b, p. 88).

Saviani (2008a) ao trazer para o centro das discussões a educação, em sua


obra Escola e Democracia o faz retomando as teorias pedagógicas e nessa análise,
a questão da marginalidade3 social.
O autor classifica as teorias educacionais como teorias não críticas, teorias
crítico-reprodutivistas e teorias críticas. No primeiro grupo, as teorias não críticas
agrupa a Pedagogia Tradicional, Pedagogia Nova e Pedagogia Tecnicista. Essas
teorias, segundo o autor, “[...] entendem a educação como um instrumento de
equalização social, portanto, de superação da marginalidade” (SAVIANI, 2008a, p.
04). Um entendimento de que é a educação que vai corrigir as desigualdades
individuais, levando a uma integração destes na sociedade. Os ignorantes, na
vertente tradicional, eram os marginalizados, por isso era preciso transformá-los em
esclarecidos para que fossem incluídos na sociedade (SAVIANI, 2008a).
A partir da Revolução Francesa propõe-se a universalização do ensino para
retirar os indivíduos da condição de súditos e transformá-los em cidadãos
esclarecidos. Sob a ótica de uma educação leiga inspirada nos princípios liberais,
advoga-se uma educação para todos e um dever do Estado. No entanto, mesmo a
educação sendo apregoada como direito de todos, isso não ocorreu, uma vez que,
com a divisão da sociedade em classes sociais, os mais afortunados continuaram a
ser privilegiados. Nessa perspectiva, preparar intelectualmente o educando para
assumir seu lugar na sociedade, adaptando-se a ela, constituía papel da escola.
Que modelo de organização do trabalho pedagógico se delineia nessa
vertente?Organizar o trabalho educativo, ou seja, planejar, tendo como suporte
teórico a Pedagogia Tradicional, constituía em organizar atividades de ensino, a
partir do rol de conhecimentos determinados pelos órgãos competentes.

3
“[...] marginalidade cultural e, especificamente, escolar” (SAVIANI, 2008a, p. 05).
Perpassado pelo método expositivo, assentado na proposta de Herbart (1776-1841),
envolvia a preparação; a apresentação, a comparação/assimilação, a generalização
e a aplicação.O professor, enquanto centro do processo é o detentor e transmissor
dos conhecimentos vistos enquanto fragmentos humanistas da cultura erudita,
clássica e universal, considerados verdades absolutas e o educando, um receptor
passivo dos conteúdos, modelos e padrões de conduta moral e intelectual
transmitidos, um ser submisso e subordinado hierarquicamente.
Em contraposição a Pedagogia Tradicional, chega ao Brasil a Pedagogia
Nova,inspirada nas idéias pedagógicas de John Dewey (1859-1952), no momento
em que o país passava de uma sociedade rural para a industrializada, guiada pelo
ideário de uma sociedade democrática. “Dewey e seus seguidores reagem à
concepção herbartiana da educação pela instrução, advogando a educação pela
ação” (LIBÂNEO, 1993, p. 63). Nessa vertente pedagógica, o marginalizado é o
rejeitado, aquele que tem dificuldades e problemas na aprendizagem.
A organização de vivências e experiências a partir de temas geradores,
projetos e centro de interesses, permeiam o planejamento de ensino, na vertente
escolanovista. Apresenta como método a pesquisa, na tentativa de articular o ensino
com o processo de desenvolvimento da ciência: atividade; definição do problema;
levantamento de dados; formulação de hipóteses e experimentação, o professor tem
o papel de orientador, facilitador no desenvolvimento das potencialidades do
educando. Os conteúdos são selecionados a partir do interesse dos educandos. O
foco está no educando que passa a ser o centro do processo, seus interesses e
necessidades definem o processo educativo. Nesse sentido, a função da escola
passou a ser a preparação do educando para vida.
O insucesso da Escola Nova, as reformas do ensino universitário Lei 5540/68
e do ensino médio, Lei 5692/71, decorrentes dos acordos MEC-USAID, tiveram forte
influência para que se instituísse a concepção tecnicista no contexto educacional
(GHIRALDELLI Jr, 2009).
A Pedagogia Tecnicista “[...] inspirada nos princípios de racionalidade,
eficiência e produtividade, advoga a reordenação do processo educativo de maneira
a torná-lo objetivo e operacional” (SAVIANI, 2008a, p. 10). Transporta-se assim para
escola o modelo fabril, com base nos princípios da racionalidade, eficiência e
produtividade. Tendo como foco as técnicas, o marginalizado era o incompetente,
improdutivo.
Planejar passa a ser um processo operacional e de racionalização do ensino
e aprendizagem. Tendo como base o plano curricular e o plano de ensino,
provenientes de esquemas previamente formulados, a ação pedagógica se dá numa
seqüência de estratégias e técnicas de ensino.
Quanto ao professor, o autor ainda afirma que, assim como o educando, este
tem um papel secundário que executa e planeja as atividades pré-definidas pelos
especialistas nos livros didáticos. Os conteúdos são compostos de informações, leis
e técnicas selecionados por especialistas na organização dos livros didáticos.
Lembrando que “[...] boa parte dos livros didáticos em uso nas escolas são
elaborados com base na tecnologia da instrução” (LIBÂNEO, 1993, p. 68).À escola
cabia, portanto, preparar mão de obra eficiente visando ao desenvolvimento
industrial, econômico e social.
Outro grupo, as Teorias Crítico-Reprodutivistas, contemplam as Teorias: do
Sistema de Ensino como Violência Simbólica;da Escola como Aparelho Ideológico
de Estado (AIE) e da Escola Dualista. Essas teorias “[...] entendem a educação
como instrumento de discriminação social, logo, um fator de marginalização”
(SAVIANI, 2008a, p. 04). Coloca a sociedade como determinante em relação à
escola e ainda denuncia ser a educação a reprodutora da marginalização,
reforçando as ideologias postas pelo sistema capitalista. É nesse grupo que o
problema da marginalidade deixa de ser da educação e passa a ser, dos “[...]
condicionantes sociais”, ou seja, da sociedade (SAVIANI, 2008a, p.13). Mas, como
essa teoria não se trata de uma pedagogia, não propõe práticas educativas.
Após realizar uma reflexão acerca das concepções e tendências
pedagógicas, Saviani (2008a), enuncia que o importante é garantir a ênfase nos
conteúdos de ensino. Percebe-se que a classe que domina por meio de ideologias
impostas ao dominado, acaba por não garantir a aquisição desses conteúdos e
ainda diminuem a escolarização. O autor escreve, “[...] o dominado não se liberta se
ele não vier a dominar aquilo que os dominantes dominam. Então, dominar o que os
dominantes dominam é condição de libertação” (SAVIANI, 2008a, p. 45).
Para além dos métodos tradicionais e novos que não valorizam os interesses
populares e que são indiferentes ao que acontece no interior da escola, está a
Pedagogia Histórico-Crítica preconizando métodos de ensino capazes de vincular
educação e sociedade. Tais métodos:
[...] estimularão a atividade e iniciativa dos alunos sem abrir mão,
porém, da iniciativa do professor; favorecerão o diálogo dos alunos
entre si e com o professor, mas sem deixar de valorizar o diálogo
com a cultura acumulada historicamente; levarão em conta os
interesses dos alunos, os ritmos de aprendizagem e o
desenvolvimento psicológico, mas sem perder de vista a
sistematização lógica dos conhecimentos, sua ordenação e gradação
para efeitos de processo de transmissão-assimilação dos conteúdos
cognitivos (SAVIANI, 2008a, p. 56).

A compreensão crítica está na formação de um sujeito que supera a


consciência ingênua e, imbuído de uma consciência crítica, torna-se sujeito de suas
ações.O planejamento de ensino nessa perspectiva teórica possibilita articular
educação, trabalho e sociedade, propiciando ao aluno uma ascensão do senso
comum à consciência filosófica.

3. A PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA: PRESSUPOSTOS TEÓRICO-


METODOLÓGICOS

A Pedagogia Histórico-Críticaconclama uma educação voltada a superar a


corrente crítico-reprodutivista, uma teoria que se revela crítica aos mecanismos
educacionais, contudo, não propõe uma pedagogia.
Quanto à denominação histórico-crítica, o autor a cunhou, procurando “[...]
reter o caráter crítico de articulação com os condicionantes sociais que a visão
reprodutivista evidencia, vinculado, porém, à dimensão histórica que o
reprodutivismo perde de vista” (SAVIANI, 2008b, p. 70). A educação ao mesmo
tempo em que é influenciada, também influencia a sociedade.
Para o autor, a natureza da educação passa pela compreensão da natureza
humana. O que diferencia o homem do animal é o trabalho. O homem mentaliza
antecipadamente a ação. Essa mentalização denomina-se trabalho não material. A
educação, atividade essencialmente humana, constitui trabalho não material, uma
vez que, o produto não se separa do produtor. Saviani (2008b) ao referir-se à aula,
argumenta que esta é produzida (professor) e consumida (educando)
simultaneamente.
Sendo assim, há de que se esclarecer:

[...] a especificidade da educação como referida aos conhecimentos,


idéias, conceitos, valores, atitudes, hábitos, símbolos sob aspecto de
elementos necessários à formação da humanidade em cada
indivíduosingular, na forma de uma natureza, que se produz,
deliberada e intencionalmente, através de relações pedagógicas
historicamente determinadas que se travam entre os
homens(SAVIANI, 2008b, p. 22).

A escola é o local para que a aprendizagem significativa ocorra. Para tanto,


se faz necessário que o professor efetue a transmissão dos conteúdos de forma
crítica e contextualizada, levando o aluno a participar ativamente do processo
democrático social, ou seja, ao professor cabe a realização de um trabalho
educativo, cujo suporte teórico-metodológico recorra a uma concepção crítica de
educação, no caso, a Pedagogia Histórico-Crítica.
Tendo como base teórica, os clássicos da filosofia, Saviani (2008b) enfatiza
estar em Marx, no materialismo histórico-dialético a contribuição fundamental à
constituição da Pedagogia Histórico-Crítica. A dialética trata de movimentos de
transformações. Neste sentido,

[...] materialismo histórico, que é justamente a concepção que


procura compreender e explicar o todo desse processo, abrangendo
desde a forma como são produzidas as relações sociais e suas
condições de existência até a inserção da educação nesse processo
(SAVIANI, 2008b, p. 141).

A materialidade se dá na organização dos homens em sociedade, que por


sua vez se constrói nos modos de produção para sua sobrevivência e perpetuação.
Cabe ressaltar que a dialética na “Grécia antiga, se apresenta como a arte do
diálogo. Aos poucos, passou a ser a arte de, no diálogo, demonstrar uma tese por
meio de argumentação capaz de definir e distinguir claramente os conceitos
envolvidos na discussão” (KONDER, 2008, p. 07).
A Pedagogia Histórico-Crítica articulada à Psicologia Histórico-Cultural
concebem o homem como um ser social determinado e determinante da sociedade.
A educação é fundamental, nesse sentido, pois, agindo sobre os sujeitos da prática
de forma indireta e mediata, transforma a sociedade. “O movimento dialético parte
da síncrese (uma realidade empírica), por meio da mediação (reflexões, análises e
teorias) chegando à síntese (objeto concreto, sistematizado)” (SAVIANI, 2008b, p.
59).

3.1 ARTICULAÇÃO PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA E PSICOLOGIA


HISTÓRICO-CULTURAL

Visando a estabelecer as bases psicológicas que pudessem contribuir para


Pedagogia Histórico-Crítica, Scalcon (2002) aprofundou seus estudos no que se
refere à perspectiva histórico-cultural, elaborada por Vygotsky e colaboradores,
apontando que nessas duas teorias há uma correlação, o materialismo histórico
dialético.

[...] as concepções de Marx e Engels sobre o trabalho e o uso de


instrumentos, a sociedade e a interação dialética entre o homem e a
natureza que constituem as bases das principais teses da
perspectiva histórico-cultural e, conseqüentemente, de uma
psicologia em que o desenvolvimento humano é fruto da interação do
organismo individual com o meio físico (SCALCON, 2002, p. 51).

Quanto à filosofia e à epistemologia que sustenta a perspectiva histórico-


cultural:

[...] o homem é um ser histórico que se constrói através de suas


relações com o mundo natural e social. Mais do que isso, é um
homem que se diferencia como espécie pela capacidade de
transformar a natureza através do trabalho, por meio de instrumentos
por ele mesmo criado e aperfeiçoado ao longo do desenvolvimento
histórico humano (SCALCON, 2002, p. 51).

Essas observações demonstram que a concepção de homem como produto e


produtor das condições materiais de vida no processo do desenvolvimento humano
reforça que o homem partiu do social para o individual, constituindo-se nas relações
naturais e sociais, explicitando assim a necessidade da mediação. O conhecimento,
portanto, na perspectiva histórico-cultural “[...] é construído na interação sujeito-
objeto a partir de ações socialmente mediadas” (SCALCON, 2002, p. 51).
A Psicologia Histórico-Cultural vê a educação como sua principal
preocupação, no que diz respeito ao desenvolvimento e a aprendizagem, e a escola
é o espaço que oportuniza acesso ao conhecimento cultural e cientifico produzido
pela história social da humanidade. Além disso, o conhecimento científico não é um
processo natural, decorre do desenvolvimento das funções psicológicas superiores4.
Assim, entende-se que o desenvolvimento dos conceitos científicos está ligado à
mediação do professor entre os conceitos espontâneos e as formas superiores de
conhecimento (SCALCON, 2002), caminho que o indivíduo percorre para
desenvolver funções que ainda não consegue realizar de forma autônoma e que
serão consolidadas no nível de desenvolvimento real. Trata-se de “[...] um domínio
psicológico em constante transformação: aquilo que uma criança é capaz de fazer
com a ajuda de alguém hoje, ela conseguirá fazer sozinha amanhã” (OLIVEIRA,
2010, p. 62).
O professor, portanto, tem um papel fundamental, qual seja interferir na zona
de desenvolvimento proximal dos educandos, possibilitando avanços que não
ocorreriam de forma espontânea.Nesse sentido, a escola constitui o espaço capaz
de determinar o desenvolvimento psicológico. O processo educativo, na perspectiva
histórico-cultural:

[...] é determinante do desenvolvimento psicológico do educando.


Não restam dúvidas, então, de que os fenômenos educacionais
sejam analisados numa visão psicopedagógica, logo, numa visão
científica de homem (SCALCON, 2002, p. 51).

Com base nesse entendimento, cabe esclarecer que:

[...] o planejamento de ensino, os objetivos, os conteúdos, a


metodologia, a avaliação, os recursos, a disciplina, a relação
professor-aluno, aluno-aluno e escola e sociedade, quando
agregados numa mesma unidade, devem também ser
consubstanciado pela concepção psicológica histórico-crítica
(SCALCON, 2002, p. 133-134).

Dessas acepções, pode-se concluir que a aprendizagem viabiliza o


surgimento dos processos psicológicos internos e que estes ocorrem graças à
interação do indivíduo com o ambiente cultural, mediatizada pelos instrumentos
históricos do ser humano.

4 “Funções psicológicas superiores são aqueles que caracterizam o funcionamento psicológico


tipicamente humano: ações conscientemente controladas, atenção voluntária, memorização ativa,
pensamento abstrato, comportamento intencional” (OLIVEIRA, 2010, p.23).
4. PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO, PROPOSTA CURRICULAR DO CURSO:
NORTEADORES DO PLANEJAMENTO DE ENSINO

O exercício do planejamento na perspectiva crítica, a ser trabalhado com os


futuros educadores e discutido nesse projeto, tem como base a Psicologia Histórico-
Cultural e a Pedagogia Histórico-Crítica, correntes teóricas que se articulam, e
constituem sustentação dos documentos institucionais: Projeto Político-Pedagógico
e Proposta Curricular do Curso.
O PPP5 especifica qual o conhecimento a ser trabalhado na escola, quais as
abordagens e os recortes desse conhecimento devem ser privilegiados para que se
garanta a especificidade da educação escolar. Saviani (2008b) diz que não é
qualquer conhecimento, mas um conhecimento que possa cada vez mais
estabelecer a diferenciação entre a doxa (saber do senso comum, saber
espontâneo), a sofia (saber resultante de uma longa experiência) e a
episteme(conhecimento metódico, sistematizado – ciência).
Com o objetivo de contribuir para o avanço das práticas pedagógicas dos
professores, as Orientações Curriculares6 do Curso de Formação de Docentes,
redefiniram seu currículo, em um contexto voltado para práxis pedagógica, numa
construção permanente em que os sujeitos do processo educativo, ou seja,
professores e educandos são os protagonistas. Contudo, mantiveram os princípios
filosóficos pedagógicos7 que devem ser observados e mantidos nos planejamentos e
ações pedagógicas (PARANÁ, 2014).
O Planejamento de Ensino deve estar embasado no PPP e na Proposta
Curricular do Curso, neste caso, do Curso de Formação de Docentes. A análise
documental desencadeada junto aos futuros educadores evidencia que a instituição
propõe uma organização cujo suporte teórico recorre à Pedagogia Histórico-Crítica.

5
Projeto Político Pedagógico que é “[...] um processo permanente de reflexão e discussão dos
problemas da escola, na busca de alternativas viáveis à efetivação de sua intencionalidade” (VEIGA,
2005, p. 13)
6
“Orientações Curriculares do Curso de Formação de Docentes da Educação Infantil e dos anos
iniciais do Ensino Fundamental, na modalidade Normal em nível médio, que reformulou a Proposta
Curricular do referido Curso”, organizado pelo Departamento de Educação e Trabalho (PARANÁ,
2014, p. 08).
7
“Princípios, de uma forma mais ampla, são leis, são fundamentos gerais que norteiam tomadas de
decisões pautadas na reflexão, na racionalidade. Princípios filosóficos pedagógicos são os que
expressam as orientações e fundamentam as bases das ações pedagógico educativas, com o
objetivo de subsidiar os professores na sua práxis” (PARANÁ, 2014, p. 09).
A prática pedagógica desenvolvida pelos futuros educadores, portanto, estará
respaldada por uma metodologia fundamentada por essa corrente pedagógica, o
que justifica prepará-los quanto à elaboração de um planejamento crítico.
Com relação à corrente pedagógica Histórico-Crítica, Saviani (2008b)
compreende a educação, em seu desenvolvimento histórico, aquela que articula
uma proposta pedagógica que tem como referência o compromisso com a
transformação social. O autor ainda afirma que a referida concepção está
intimamente ligada a realidade escolar, uma vez que são muitas as necessidades
observadas na prática dos educadores.
Uma pedagogia que articula os interesses populares dá real valor à escola,
preocupa-se com o que ocorre em seu interior e é focada em métodos de ensino
eficazes. É nesse quadro que se percebe a real função da escola:

[...] especificamente educativa, propriamente pedagógica, ligada à


questão do conhecimento; é preciso resgatar a importância da escola
e reorganizar o trabalho educativo, levando em conta o problema do
saber sistematizado, a partir do qual se define a especificidade
escolar. (SAVIANI, 2008b, p. 98).

Pode-se dizer que o professor tem um papel fundamental quanto à


especificidade educativa, pois o seu fazer pedagógico deve propiciar instrumentos
que fornecem acesso do educando ao saber erudito, metódico e clássico, ou seja, o
que resistiu ao tempo, extrapolando o momento em que foi proposto (SAVIANI,
2008b). Os conteúdos, por sua vez, não são neutros, mas sim a expressão humana
de um determinado período histórico.
A Pedagogia Histórico-Crítica propõe cinco momentos do processo dialético
da aprendizagem escolar. O ponto de partida é a Prática Social comum ao professor
e ao educando, sendo que o professor detém o saber mesmo que seja precário
inicialmente, pois nesse momento ainda não conhece o nível que se encontra o
educando, faz necessário, portanto, planejar suas práticas educativas, pesquisando
e buscando formas apropriadas para atingir o objetivo primordial que é a
transmissão e assimilação do saber sistematizado. Quanto ao aluno, nesse
momento, situa-se numa visão sincrética, pois seu conhecimento provém da
experiência e do senso comum (SAVIANI, 2008a).
O professor ao preocupar-se com aquilo que o educando já conhece,
demonstra um cuidado preliminar que visa identificar:
[...] as „pré-ocupações‟ que estão nas mentes e nos ensinamentos
dos escolares. Isso possibilita ao professor desenvolver um trabalho
pedagógico mais adequado, a fim de que os educandos, nas fases
posteriores do processo, apropriem-se de um conhecimento
significativo para suas vidas (GASPARIN, 2003, p. 16)

Vale ressaltar que essa prática social não é apenas o que o educando sabe
ou faz com relação ao conteúdo a ser apreendido, essa prática social na verdade
traduz:

[...] a compreensão e a percepção que perpassam todo o grupo


social. Evidentemente, a expressão dessa prática dá-se por um
indivíduo que apreendeu subjetivamente, utilizando filtros pessoais e
sociais. Todavia, essa expressão não é dele, mas do grupo que
manifesta sempre as determinações e apreensões do todo social
maior. Por isso, ela se apresenta sempre como uma prática próxima
e remota ao mesmo tempo(GASPARIN, 2003, p. 22).

É fundamental como tarefa inicial do professor traçar procedimentos para se


trabalhar com o aluno essa primeira fase do método. A Problematizaçãoé o
momento que o professor vai perceber as questões que precisam ser resolvidas e
qual conhecimento se faz necessário para a prática social do seu educando.
Demonstrando de forma elaborada a importância de estudar os conhecimentos
científicos elaborados historicamente e, com isso, a importância da escola (SAVIANI,
2008b).

Portanto, nesse momento, o professor precisa ter clareza de como fará sua
orientação quanto à aprendizagem, atentando-se para os objetivos traçados
inicialmente, além disso, “[...] seu planejamento deve abordar as diversas dimensões
do tema e evidenciar a importância daquele conhecimento, fazendo-o ter sentido
para o aluno” (MARSIGLIA, 2014, p. 106).
A Instrumentalização, terceiro momento,constitui afase do método que se
encontra a análise, ou seja, uma das operações mentais básicas para a construção
do conhecimento sendo também o momento que o professor vai instrumentalizar
sua prática com o intuito de sanar as questões postas na prática social.
Dessa forma, com os instrumentos culturais produzidos historicamente pela
humanidade, após serem assimilados pelos educandos, estes poderão libertar-se
das condições de exploração em que se encontram (SAVIANI, 2008b).
Aaprendizagem ocorre de forma que o educando incorpora o conhecimento em suas
múltiplas dimensões, superando assim o conhecimento cotidiano. O autor afirma
também que todo esse processo pode ser “[...] comparado a um espiral ascendente
em que são tomados aspectos do desenvolvimento anterior que se juntam ao novo e
assim continuamente” (GASPARIN, 2003, p. 52).
A centralidade da pedagogia é “o problema das formas, dos processos, dos
métodos; certamente, não considerados em si mesmos, pois as formas só fazem
sentido quando viabilizam o domínio de determinados conteúdos” (SAVIANI, 2008b,
p. 75).
A Catarse8contempla o momento da incorporação e da demonstração do
entendimento dos instrumentos culturais. É o ponto culminante do processo
educativo, pois é o momento que ocorre a mediação da análise em todo o processo
de ensino, passando da síncrese a síntese (SAVIANI, 2008a). Esta, não se dá em
um único momento, pois se trata da síntese, que vai ocorrendo de maneira cada vez
mais aprofundada, demonstrando assim que o método é uma interligação entre
todos os momentos, num processo de construção do conhecimento (MARSIGLIA,
2014).
Sendo uma demonstração teórica do nível superior que o educando atingiu,
nesse sentido “[...] os conteúdos tornam-se verdadeiramente significativos por que
passam a fazer parte integrante e consciente do sistema científico, cultural e social”
nesse momento o conhecimento tem como função a transformação social
(GASPARIN, 2003, p. 131).
O quinto momento do método, Prática Social é o ponto de chegada de todo
processo, uma vez que a educação é a mediação da prática social.

[...] o movimento que vai da síncrese (“visão caótica do todo”) à


síntese (“uma rica totalidade de determinações mais simples”)
constitui uma orientação segura tanto para o processo de descoberta
de novos conhecimentos (o método científico) como para o processo
de transmissão-assimilação de conhecimentos (o método de ensino)
(SAVIANI, 2008a, p. 59).
Nesse momento, a escola demonstra sua real função: proporcionar ao
educando o acesso ao saber sistematizado que lhe possibilite expressar de forma
elaborada os conteúdos da cultura popular que corresponde aos seus interesses

8
“[...] elaboração superior da estrutura em superestrutura na consciência dos homens” (GRAMSCI,
1978 apud SAVIANI, 2008a, p. 53).
garantindo que o dominado possa dominar o que os dominantes dominam para,
assim, sair da condição de explorado (SAVIANI, 2008b, p.80).
É importante ressaltar que estes momentos encadeados presentes na
Pedagogia Histórico-Crítica não constituemuma receita a ser seguida nem pode ser
utilizada desvinculada de seus suportes teóricos, a teoria e a prática devem
caminhar juntas.
Considerando que o Curso de Formação de Docentes traz em seu currículo a
Pedagogia Histórico-Crítica como suporte teórico, o encaminhamento metodológico
capaz de instrumentalizar o futuro educador para que possa desenvolver sua prática
docente, também crítica, contextualizada e transformadora, é o planejamento nessa
perspectiva. Nesse sentido, foi proposta na intervenção pedagógica realizada e a
seguir descrita.

5. A INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA MATERIALIZADA

De posse de um referencial crítico, amodalidade pedagógica escolhida para


trabalhar com os alunos foi a Unidade Didática 9, estruturada em momentos
articulados entre si. Esta contemplou uma proposta de intervenção pedagógica,
visando discutir e aprofundar o conhecimento quanto ao planejamento de ensino
naperspectiva histórico-crítica.
Tendo como suporte metodológico a pesquisa-ação, o trabalho envolveu a
docente/pesquisadora e os alunos da terceira série do Curso de Formação de
Docentes na disciplina de Prática de Formação de um colégio da rede pública
estadual, no ano de 2017. Os alunos, futuros educadores10, desde o início
mostraram-se interessados e ávidos em participar do estudo.
Inicialmente, via aula inaugural, foram apresentadas as temáticas de cada
série propostas nas Diretrizes Curriculares do Curso de Formação de Docentes, bem

9
Unidade Didática “elaboração que desenvolve um tema, aprofundando-o de forma teórica e
metodológica. Compreende um ou mais conteúdo da disciplina/área em foco, desenvolvidos sob uma
perspectiva metodológica para o público alvo da implementação do Projeto de Intervenção na
escola”.
http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/pde_roteiros/texto_producao_didatico_pedag
ogica.pdf
10
Os futuros educadores, alunos do Curso de Formação de Docentes, por questões éticas, aparecem
identificados ao longo do texto, pela letra A (aluno) e um respectivo número, atribuído aleatoriamente.
como o despertar para a necessidade de um planejamento de ensino organizado e
sistematizado para exercer a Prática de Formação. Na oportunidade, alguns alunos
foram convidados e relatar suas expectativas quanto aos estudos que seriam
realizados, conforme registro a seguir:

quando sonhamos, devemos nos propor a alcançá-los, ter o


impulso e o empenho para tal, pois as coisas não acontecem por
acaso, desse modo valorizo as coisas e determinados momentos,
pois é essa importância que muitas vezes faz a diferença. Acredito
no Curso de Formação (A 1).

Prosseguindo com a Prática de Formação, o primeiro momento previsto na


Unidade Didática, apresentou o conteúdo “Teorias Educacionais”. Tais teorias e suas
respectivas tendências pedagógicas que marcaram a educação brasileiraforam
retomadas objetivando identificar o suporte teórico que sustenta o planejamento de
ensino em cada momento histórico.

Na caminhada de estudos foi necessário recorrer à leitura dos capítulos (01)


um e (02) dois do Livro Escola e Democracia (SAVIANI, 2008a), sugerido no
Caderno Pedagógico e que culminou com a realização de umabanca 11. Esta etapa
suscitou algumas reflexões, que foram relatadas pelas estudantes e dentre elas
destacamos:

[...] nesse momento compreendi melhor o significado de


burguesia, pois os conhecimentos repassados anteriormente
estavam equivocados. Essa mudança de pensamento, quanto a
(sic) classe dominante começa a despertar em mim um
conhecimento crítico (A 1).

[...] a escola nunca foi neutra, os métodos e a organização muitas


vezes acompanham os interesses da classe dominante (A 2).

[...] devemos ter em vista sempre uma concepção crítica da


educação, para nos tornar (sic) docentes críticos e conscientes de
nossas ações referentes à nossa futura prática docente e a
sociedade (A3).

Observamos a apropriação do conteúdo pelas futuras professoras em


conformidade com aPedagogia Histórico-Crítica, para a qual a função social da
escola é transmitir os conteúdos referentes aos conhecimentos produzidos e
11
Banca neste caso se refere a uma apresentação individual dos alunos à professora de Prática de
Formação e Coordenação Pedagógica da Escola.
acumulados pela humanidade, ou seja, o conhecimento clássico, oportunizando a
socialização e criação de novos conhecimentos. Trabalhar com o aluno munido
deum planejamento de ensino também construído na perspectiva teórica delineada
possibilita-lhe a ascensão do senso comum à consciência filosófica.Elaborar um
planejamento de ensino significa levar em consideração princípios (filosóficos,
epistemológicos e didático-pedagógicos), uma vez que este nos remete à
organização do trabalho educativo.

Nesse sentido, o segundo momento, previsto na Unidade Didática, foi


desencadeado levando os futuros educadores a refletirem que, para a elaboração e
execução do planejamento de ensino se faz necessário compreender os
pressupostos teóricos metodológicos que o sustenta, neste caso, o materialismo
histórico dialético, corrente teórica a qual Saviani (2008b), recorre para estruturar a
Pedagogia Histórico-Crítica.
Quanto às bases psicológicas, capazes de sustentar essa pedagogia, o autor
aponta a Psicologia Histórico-Cultural, pensada por Vygotsky e colaboradores. As
duas teorias, tendo como suporte teórico o materialismo histórico dialético,
possibilitam pensar a prática pedagógica na perspectiva crítica.
Em atividade seqüente, foi realizada a leitura dos documentos oficiais que
norteiam a organização da instituição escolar: Projeto Político-Pedagógico; Proposta
Curricular do Curso. A análise documental evidenciou que a instituição propõe uma
organização, cujo suporte teórico recorre à Pedagogia Histórico-Crítica. Nesse
sentido, a prática pedagógica deve estar respaldada por uma metodologia
fundamentada por esta corrente pedagógica, o que justifica preparar, fundamentar
os alunos, futuros educadores, quanto à elaboração de um planejamento crítico.

Durante os debates, os futuros educadores, de posse dos documentos acima


relacionados, relataram:

[...] é preciso que quando formos trabalhar em uma escola,


devemos primeiro conhecer o Projeto Político Pedagógico [...]
(A4).

De acordo com o que estudamos, sobre a Pedagogia Histórico-


Crítica, vimos que ela está pautada em grandes fundamentações
teóricas[...] que contribuem para o entendimento e o
desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem das
crianças (A1).
[...] a escola é vista como um lugar de oportunidade para a
mediação do conhecimento científico e cultural (A3).

Com base nas reflexões, observamos que os futuros educadores


compreenderam a importância da articulação teoria-práticaem suas futuras práticas
pedagógicas.

Delineou-se, no terceiro momento, o eixo central de discussão, planejamento


de ensinona perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica, uma concepção que
entende a educação como aquela que realiza a mediação na prática social. Prática
esta que é o ponto de partida e o ponto de chegada do processo educativo
(SAVIANI, 2010). Aos futuros educadores, uma vez efetuada a reflexão foiproposto a
apresentação de uma aula piloto com o planejamento de ensino na perspectiva
histórico-crítica.

Para tanto, foi sugerido um conteúdo da Proposta Pedagógica Curricular da


Educação Infantil com aplicação para os colegas da sala. A organização daatividade
suscitou algumas reflexões:

[...] em um contexto geral, realizar o planejamento na perspectiva


Histórico - Critica abordando todo o passo (sic)foi coberta por
muitos desafios (A3).

Uma das dificuldades que tive para fazer o planejamento foi


escrever o objetivo, pois não conseguia encaixar o verbo desse
sentido ao proposto, outro fator relevante foi à catarse tive uma
dificuldade enorme para realizar a escritura, pois é estranho
imaginar o que o meu aluno aprenderia durante a minha aula [...]
(A4).

[...] a grande dificuldade foi como pensar como o meu aluno, vai
aprender a minha aula e depois passar para sociedade. (A5).

Percebo que o planejamento não é algo a ser realizado de


qualquer maneira, pois exige esforços e comprometimento para
executá-lo (A6).

Na oportunidade, fruto do estudo realizado durante o ano, foi possível


observar a compreensão dos estudantes quanto à necessidade do planejamento e a
concepção teórica que o sustenta. Após a elaboração do planejamento de ensino, os
futuros educadores realizaram uma aula piloto, articulando assim
conteúdo/metodologia neste processo. Os enunciados a seguir retratam a posição
dos mesmos quanto ao trabalho realizado.

Quando fazemos um planejamento na perspectiva histórico-crítica


percebo que o importante não é só ter um conhecimento sobre o
conteúdo que irei trabalhar, mas antes de tudo conhecer a turma
percebendo o que eles já sabem, para assim iniciar as discussões
(A1).

[...] apresentar a aula piloto, abordando todos os passos e


conseguir fazer a transposição didática, fazendo assim com que
os alunos saíssem da aula levando consigo um novo aprendizado,
foi ao mesmo tempo um desafio e também gratificante [...] (A3).

O planejamento na perspectiva histórico-crítica é de suma


importância, uma vez que realizei de forma mais dinâmica a minha
aula piloto, na prática social inicial foi possível perceber o que os
alunos já sabiam e o que gostariam de saber mais sobre a
temática que estava sendo apreendida (A4).

A elaboração dos planejamentos de ensino foi de suma importância,


principalmente porque os alunos puderam vivenciar o processo de construção numa
perspectiva crítica.

Outro momento fundamental da Unidade foi o desenvolvimento da prática


docente no Centro de Educação Infantil, para crianças de quatro e cinco anos. A
ação docente evidenciou aos futuros educadores a necessidade de uma
fundamentação teórica, respaldada por uma teoria crítica que os preparasse para
atuar no cotidiano escolar, reconhecendo assim a importância do estudo da
Pedagogia Histórico-Crítica. Na ocasião os alunos realizaram, inicialmente, uma
prática de observação e coleta de dados da turma em que atuariam como docentes.
Nas palavras dos futuros educadores é possível fazer a leitura do que o trabalho
propiciou:

Foi ótimo este momento de observação, já tinha ido (sic) ano


passado, mas só desta vez entendi como a professora se
organizou pra (sic) dar a aula, é que quando estudei nas aulas de
estágio o planejamento na perspectiva histórico-crítica, ficou mais
fácil de entender (A 6).
Prosseguindo os trabalhos, os sujeitos do processo realizaram a tão
aguardada docência. Nos registros a seguir, os futuros educadores enfatizam as
contribuições que o trabalho trouxe para que a prática educativa pudesse ser
efetivada nas escolas estagiadas:

A minha regência em um contexto geral foi coberta por muitos


desafios, primeiro a realização do planejamento na perspectiva
histórico-crítica abordando todos os passos que estudamos e
muito colaborou para eu aprender como realizar o segundo
desafio fazer a transposição didática, em que os alunos saíssem
da aula levando consigo um novo aprendizado(A7).

[...] ao realizar a regência percebi o movimento dialético, pois


quando os alunos têm um conhecimento fundamentado e
contextualizado, haverá mudanças, tanto no aluno como agente
modificador de seu meio(A8).

O planejamento na perspectiva histórico-crítica é uma ferramenta


completa para o trabalho docente. Ao elaborá-lo eu tenho que
pensar sobre a realidade do meu aluno e seus conhecimentos
prévios, valorizando sua cultura e respeitando seu ritmo de
desenvolvimento psicológico. Quando o coloco em prática, posso
constatar se o discente conseguiu compreender significativamente
o conteúdo trabalhado, quando não, poderei realizar uma nova
reflexão, voltada para a minha prática (A9).

No processo da implementação proposto aos futuros educadores, a nova


vivência quanto à realização do planejamento de ensino confirmou a apreensão
destes quanto aos fundamentos teórico-metodológicos da Pedagogia Histórico-
Crítica.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Iniciar as discussões quanto à necessidade do planejamento de ensino e a


possibilidade deste ser construído na perspectiva crítica, conforme proposto nos
documentos oficiais da instituição escolar exigiu recorrer às concepções
pedagógicas, entre elas a Pedagogia Histórico-Crítica.
Para esta corrente pedagógica a função social da escola é transmitir os
conteúdos referentes aos conhecimentos produzidos e acumulados pela
humanidade, dando condições para criação de novos conhecimentos. O
planejamento de ensino nessa perspectiva teórica possibilita articular educação,
trabalho e sociedade, propiciando ao aluno uma ascensão do senso comum à
consciência filosófica.
Pedagogia Histórico-Crítica articulada à Psicologia Histórico-Cultural, com
base no materialismo histórico dialético concebem o homem como um ser social
determinado e determinante da sociedade. Nesse sentido, a educação é
fundamental, pois,agindo sobre os sujeitos da prática de forma indireta e mediata,
transforma a sociedade.
Considerando que o Curso de Formação de Docentes traz em seu currículo a
Pedagogia Histórico-Crítica articuladaà Psicologia Histórico-Culturalcomo suporte
teórico, é preciso considerar um encaminhamento metodológico capaz de
instrumentalizar o futuro educador seja capaz de desenvolver sua prática docente,
também crítica, contextualizada e transformadora, foi proposto na intervenção
pedagógica o planejamento de ensino na perspectiva histórico-crítica, recorrendo
aos momentos do método dialético, conforme pensado por Saviani (2008a) e
organizado didaticamente por Gasparin (2003).
Fundamentar-se teórica e metodologicamente e conhecer o projeto
institucional para pensar a sala de aula enquanto espaço possível para o
planejamento de ensino para além de uma concepção mecânica e burocrática
constituiu passos fundamentais na caminhada investigativa, não somente para os
futuros educadores, bem como para esta docente pesquisadora, uma vez que,
conforme afirma Saviani (2008a), o professor no ponto de partida da prática
pedagógica, ainda que se encontre no estágio de síntese, esta, porém, é precária.
Com a intervenção efetuada, prática de ensino (estágio), realizada, nas
instituições escolares observou-se mudança de postura dos futuros
educadoresquanto à elaboração e execução do planejamento de ensino na
perspectiva histórico-crítica, ou seja, saíram do estágio de síncrese em que se
encontravam no ponto de partida e pelo processo de análise, caminhada
desenvolvida, atingiram a aprendizagem.
A inserção no Programa de Desenvolvimento Educacional contemplando no
primeiro ano: pesquisa, estudos e planejamento e no segundo ano: implementação;
organização do GTR e escrita do presente artigo,propiciou a esta docente e
pesquisadora um crescimento tanto profissional, comopessoal.
O resultado do processo de formação continuada possibilitado pelo PDE se
faz presente no encaminhamento teórico-metodológico empreendido pela docente,
como também nas atividades práticas desenvolvidas pelos futuros educadores

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