Você está na página 1de 31

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA "JÚLIO DE MESQUITA FILHO” (UNESP)

FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS, DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA – câmpus


de Assis
CURSO DE GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA (LICENCIATURA)

Disciplina: História Medieval


Professor Responsável: Leandro Alves Teodoro

ALUNO: Thiago Pereira Camargo Comelli

QUESADA, Miguel Angelo Ladero. Espanã a Finales de la Edad Media, 2- Sociedad. Ed.
DYKINSON, S.L. Meléndez Valdez. Imprenta Taravilla, Madrid. 2019

 ESTRUTURA E FUNÇÃO

 Sociedades com estruturas globais, pautas de funcionamento relativamente estáveis.


Grupos sociais (hierarquias, estratificações), importantes na estrutura das continuidades e
trocas culturais. Direitos, status e funções que exercem;

 FUNÇÕES E RELAÇÕES SOCIAIS

 Funções econômicas, diferenças relativas à propriedade e uso dos meios de produção.


Grupos sociais (domínios de renda/riquezas) e profissionais, objetivamente;
 Sociedade estamentais/ordens, organizadas segundo princípios de desigualdade e
privilégios. Poder e coerção, através de leis, administração, prática política, capacidade
militar, heranças de status;
 Clero não pode ser tido casta/classe, haja visto a variedade de procedências sociais de
seus membros (não apenas hereditária) e por não romperem os laços com parentes e
outros membros da sociedade secular (QUESADA, 2019, p.17);
 Grupo socio-profissional, termologia mais adequada do que classe/casta no medievo.
Muitos intelectuais e letrados foram clérigos. Função carismática e direitos e instituições
específicas seriam fatores que aproximaram de uma “Classe/casta’;
 Princípios gerais de relação: 1) Consenso, necessidade de integração e solidariedade
social; 2) Coerção, apoio ao consenso mediante normas (umas em leis, outras implícitas
nas tradições);
 O conflito também seria considerado como um princípio de relação (tensões, guerras),
não se opondo necessariamente ao consenso, visto que pode abrir caminhos para
restaurações e renovações (QUESADA, 2019, p.17-18);
 Trocas sociais, princípio de funcionamento social. Mudanças dentro do sistema,
substituições, mobilidade social. Possibilidades que se abrem para a liberdade individual
dentro de um sistema social (QUESADA, 2019, p.18);
 Desvios e agentes marginais dentro das relações sociais. 1) Marginalização associada à
pobreza e doença, estrangeiros, escravos e cativos, minorias religiosas e étnicas; 2)
marginação referente a delinquência propriamente dita, práticas ilícitas e imorais, sua
incidência na ordem pública e a resposta da justiça (QUESADA, 2019, p.18);

 ESTUDOS SETORIAIS

 História social não se esgota em elementos de estrutura, função e relação. Adoção de


espaços (história rural e urbana), microhistória para atingir uma “história total;
 Comunidade (obrigatoriamente faz parte) e associações (adesões voluntárias). Ambos
oferecem fatores identitários, de coesão e diversificação específicos para os agentes que o
compõem;
 Importância de se estudar o grupo comunitário familiar/doméstico. Regimes de
matrimônio, sucessões, bastardos, clientelas e criados. Especialmente importante no que
tange os grupos aristocráticos. Comunidade que oferece aspectos de socialização,
educação e integração na ordem moral da sociedade (QUESADA, 2019, p.18-19);
 Conhecimentos da vida doméstica/familiar ajuda a entender outras organizações (igreja e
confrarias de outros tipos);
 Sexo e idade, amplia perspectivas de análise. História dos homens adultos, história
própria, todavia pouco cultivada e submersa nos grupos sociais (funcionais, trabalho),
protagonizados apenas os agentes mais visíveis;
 No que toca as mulheres, o autor prefere analisar juntamente com sua integração em
categorias gerais de organização social. Contexto e funções gerais compartilhadas com os
homens (história comum) (QUESADA, 2019, p.19).
 Grupos associativos voluntários florescem na idade média, a partir dos séc.XII e XIII,
tanto os judicialmente formalizados, quantos os informais; públicos e privados, laicos e
religiosos;
 Vassalagem aristocrática, encomenda campesina e outras diversas clientelas familiares;
corporações profissionais, confrarias e entidades assistenciais (ofício ou paroquia),
associações com fins políticos, ordens religiosas de terceira ordem se abrindo para os
membros seculares;
 História das mentalidades, ramo que junta história religiosa, técnicas, instituições. Grande
impacto na antropologia cultural;

 2 CONSCIENCIA E REALIDADE SOCIAL

 Três ordens sociais, percepções e imagens mentais do medievo. Historiadores atuais


estudando o passado como parte de sua realidade, entre outras coisas pelas continuidades
e consequências, trocas (QUESADA, 2019, p.21);
 Pensadores do medievo, funcionalistas: três ordens com funções para cumprir para manter
a harmonia do corpo estatal. Sacerdotes, guerreiros e campesinos. Não antagônicas, mas
imprescindíveis no que tange a complementaridade social (QUESADA, 2019, p.21);
 Consenso, estabilidade e permanências. Cada um no seu lugar, ideia que não incluía em
seu bojo a tensão dialética classicista de modificações e rupturas sistêmicas;
 Perspectiva conservadora (advinda do clero e aristocracia, reforço de desigualdades
jurídicas a seu favor) e reflexo da escassez de possibilidades de transformação
(estabilidade dos fundamentos econômicos e técnicos) (QUESADA, 2019, p.21)
 Pelo menos 80% da população dedicada no setor agrário, 10 a 15% no setor
manufatureiro/comércio; Apenas 5 a 10% poderia exercer habitualmente outras funções
(QUESADA, 1991, p.21). Momento no qual mudanças revolucionárias eram poucas,
ainda que houvessem conflitos e modificações internas, cujo número aumenta no baixo
medievo;
 Tensões e revoltas que tinham como objetivo a redistribuição, dento do sistema, das
hierarquias funcionais e capacidade de participar do domínio dos meios de produção,
poderio militar e político e na tomada de decisões (QUESADA, 2019, p.21);
 Busca por mobilidade social, limite do poderio senhorial e o peso da hereditariedade das
posições;
 Fundamentos remotos para a ordem social funcionalista. Dumézil (L’ideologie tripartite
des indo-européens, Bruselas, 1958) ressalta a ideologia das três funções dos povos de
raiz indo-europeia: Primeira função destina a administrar a soberania política jurídico-
política e “mágica”, na mão dos sacerdotes e reis; segunda função dispõe da força física,
nas mãos de uma aristocracia guerreira; uma terceira, associada a produção de bens,
manutenção da abundância, saúde e vida. Criam com seu trabalho a riqueza econômica,
ordem doméstica e reprodução/continuidade da espécie humana (QUESADA, 2019,
p.22);
 Coincide com a formação do sistema de relações político-sociais e feudo-vassálicas,
dualidade entre senhores e campesinos. Ideia que se expressa em autores medievais com o
anglo saxão Aelfric o Eadmer de Canterbury (séc. X) , ainda que encontre expressão
completa no começo do séc. XI, por escritores franceses (Adalbéron, bispo Laon, Gerardo
de Cambrai). No século XIII, renasce e se afirma por meio das Assembleias
representativas e em novas formas de defesa do poder eclesiástico de suas prerrogativas
frente a aristocracia e Coroa (QUESADA, 2019, p. 22)

 Imagem orgânica, sociedade como um CORPO. Ideias organicistas, mais ricas de matizes
que a tripartite. Corpo formado por membros para que funcione com equilíbrio;
 Antecedentes dessa teoria nos primeiros séculos do cristianismo, como São Paulo (p.22);
descrição do ordenamento interno da Igreja mediante imagens que representam um corpo
místico (KANTOROWICZ, dois corpos do rei). Metáforas do campo religioso que
inspirariam o campo secular/temporal da sociedade;
 Século XII, governo e administração (João de Salisbury, Policratius). Sacerdotes como
alma da república; príncipe a cabeça; conselho o coração; juízes e governadores, os olhos,
ouvidos e língua; guerreiros, as mãos; cortesãos do príncipe, as costas; arrecadadores e
administradores, o ventre; os agricultores, os pés (QUESADA, 2019, p.23);
 Francesc Eiximenis aumenta e põem mais camadas de matização nessa divisão em seu
regiment de la coisa publica; define três níveis sociais segundo sua capacidade política e
econômica: menores, médios e maiores (QUESADA, 2019, p.23);
 Para Quesada, desde as primeiras teorias sobre os ordenamentos e estratos sociais, denota-
se uma concepção negativa da hierarquia e ordenamento social. Autores como San
Agostinho, San Gregorio Magno e outros, aceitam a necessidade coercitiva do poder
como mal menor: por natureza, os homens seriam iguais em suas dignidades, porém a
necessidade do poder político coativo se deve a necessidade de combater e limitar o mal
que o pecado original introjetou. Assim, com el fin de que la liberdad de obrar mal se vea
restrigida por el poder del que domina (QUESADA, 2019, p.23) (GREGORIO MAGNO,
setentiae, III, 47);
 Dualidades PODER e OBEDIÊNCIA; RIQUEZA e POBREZA. O ser humano anterior ao
poder político, o ideal da humanidade perfeita não precisaria dele. José Bonifácio (século
VIII), noção de uma “orden de los que mandam y um orden de los súbditos, um de los
ricos y un orden de los pobres” (QUESADA, 2019, p.24). Século XVII, Pedro de
Figueroa: “somos todos libres y por natureza y em rázon de exenciones muy iguales. No
hubiera diferencia de superiores y súbditos si no prevaricara el primeiro hombre”
 Na baixa idade média as ideias se manifestam mais claramente, diversificação das fontes
de riqueza e renda dentro de cada estamento ou grupo social. Maior variedade de trabalho
e atividades sociais, especialmente nas cidades (QUESADA, 2019, p.24). Mobilidade
social aumenta pelo esforço ou boa sorte dos agentes. Férnandez de Oviedo: “cada dia
sabemos por experiencia que uno es pobre sabe ganar honor e hacienda, e outro que
nace heredado no sabe vivir com cuanto tiene, e lo pierde todo (QUESADA, 1991, p.24);
o Devido as novas diversificações sociais e conjunturas políticas, as teorias dos três
estados se transformam. Dualidade mando/obediência outorgada como “primeira
ordem”, por razão de sua eficácia e responsabilidade (rei e nobreza seculares, papa
e clero eclesiásticos);
 O segundo aspecto é observável nos exempla morais e tratados de penitência, nos quais os
autores insistem na multiplicidade de situações morais e maneiras de se viver, cada uma
requerendo uma atenção moral específica do agente, guiando as atividades de ofícios e os
respectivos vícios (obras de Don Juan Manuel, Pedro López de Ayala, San Vicente Ferrer)
(QUESADA, 2019, p.24);
 Meios urbanos do séc. XIII, topografia da cidade mostrando a pobreza e as diferenças
entre ricos e pobres. Economia quase totalmente monetária, diversificação profissional,
marginalidades;
 Padrões de vizinhança para a cobrança de impostos diretos ou repartição militar, divisão
dos vizinhos conforme quantias patrimoniais (QUESADA, 2019, p.25);
 Críticas à riqueza mobiliaria, mal uso pela usura. Pecado da avareza e fundamentos
morais. Reprovações aos estados mais abastados pelas atitudes de vangloria e soberba.
Críticas morais, mas nunca aos fundamentos. Havia a crença de que a ordem sempre
poderia recuperar sua harmonia funcional mediante regenerações éticas e bom governo
(QUESADA, 2019, p.25);
 Atenção ao indivíduo. Perfeição moral, cavaleiresca e intelectual. Ideais de eremitismo
(Luis de León);
 Sem condições objetivas ou subjetivas (tomada de consciência) para uma mudança
“global”. Imaginário do medievo e reflexões que tomava considerações alheias e utópicas
ao mundo real. Irreais, porém úteis como crítica ao real. Idade de ouro primitiva
(ucrônicas), evocações cervantinas; fé milenarista no retorno da perfeição do paraíso,
quando ocorreria o fim do tempo presente (Ciudad de Deus agostiniana); outras eram
utópicas, geografia imaginária do Paraiso Terrestre, Pais de Jauja, ordenação do Padre
Juan, isla de Utopia de Tomás Moro desde 1516 (contexto das explorações ultramarinas)
(QUESADA, 2019, p.25-26)

 FALTANDO PAG
 Baixa idade média, Castela. Procedimento do Mayorazgo. Formas mais antigas já vistas
desde o séc. XII. Aumenta no séc. XIII e se generaliza nas casas da alta nobreza da época
Trastamara, a partir do Enrique II (1369-1379) e Leyes de Toro (1505). Separação de
certos bens do patrimônio familiar para formar uma massa de sucessão especial, destinado
ao primogênito e que tende a permanecer na família (QUESADA, 2019, p.35);
 Autorização régia, podendo se ampliar com bens, constituindo melhoras ao titular do
mayorazgo, que era espécie de usufrutuário e gestor, já que não podia alienar os bens;
 Sem filhos, herdavam os parentes de sangue mais próximos (começando dos
ascendentes). Direito de troncalidad. Caso ainda em vida, o titular da terra deveria alienar
a terra pelo preço fixo aos herdeiros (direito de reserva) ou estar sujeito ao direito de
retrato (sob condição suspensiva, alienação imperfeita) se quiser alienar a terra
(QUESADA, 2019, p.35);

 O REINO
 Ordem política e jurídica das sociedade europeias passa por mudanças exponenciais a
partir do séc.XIII, ainda que mantendo certas continuidades e laços com àquilo construído
até então;
 Romanismo, aristotelismo, bem como novos conceitos (universitas, res publica),
plenitude do poder real, tiranicídio. Crise estrutural da baixa idade média, processo de
mudanças no sistema social. Reajuste do sistema de poder e da distribuição de seus
elementos;
 Clero, nobreza e aristocracias locais. Reajuste do sistema de poder, legitimação doutrinal
e simbólicas, jurisdição e administração;

 Natureza: Habitantes do reino como membros da comunidade política pelo que se entende
como “vassalagem natural”, superior a qualquer outra forma de vinculação temporal
(QUESADA, 2019, p.36);
 Território: Estabilidade na segunda metade do séc. XIII, depois de arranjos fronteiriços
entre os reinos hispânicos. Se elabora uma imagem política, na qual se dividem em
circunscrições eclesiásticas, judiciais, militares e fiscais que englobam ou superam as
demarcações municipais ou senhoriais (QUESADA, 2019, p.36)
o Monarquia: Cume do sistema, titular dos instrumentos gerais e mais importantes
do exercício de poder, núcleo de uma forma de estado (res publica) na qual se
hierarquizavam todos os demais poderes institucionais e fáticos do reino,
alimentando-se por sua vez da consciência da identidade pátria (QUESADA,
2019, p.36-37);
 Continuidade que dependia do acordo expresso ou tácito entre os titulares do poder
político para manter continuidade da ordem vigente. Monarquia central na concentração
de poder, mas a sociedade política também promovia e era afetada pelas mudanças e
demandas, gerando desequilíbrios e lutas intestinas. Disputavam-se as articulações e
exercícios de legislação, jurisdição e administração, domínio de recursos financeiros e
militares (QUESADA, 2019, p.37);

 Ideias Políticas: Monarquia que se fundamentava por meio de fundamentos ideológicos e


doutrinais, no medievo, por meio da dimensão religiosa, primazia vassálica e estamental e
o monopólio dos princípios jurídicos e político expressos pelo direito romano;
 Rei cristão latino medieval, figura RELIGIOSA e política. Vigário, com lugar tenente de
Deus no reino para governar temporalmente. Direito de reinar procedente da graça divina,
relação contínua então entre a potestas temporal/regia e auctoritas espiritual/sacerdotal;
 Imagens mentais religiosas, poderosas para como instrumento de propaganda política nos
séculos da Espanha católica (como nas moedas, tuto monta dos reis católicos).
Cerimoniais de coroação ou funerais régios. Crenças apocalípticas, cruzadas, despertar de
sentimentos e emoções (QUESADA, 2019, p.37);
 Atributos morais cristãos de perfeição monárquica, bem como teorias organicistas sobre a
sociedade e governo. Corporificação (KANTOROWICZ), a cabeça era o rei, assim como
Cristo seria a cabeça do corpo místico da Igreja.
 Ideia de realeza, que nas origens germânicas concebia o monarca como chefe militar e
promotor da justiça de seu povo, protegendo status sociais e liberdades de cada grupo.
Séculos depois, a pirâmide de relação feudo-vassálica (topo o rei) proporcionou uma
nítida articulação entre esses princípios, que sobreviveram nos estados monárquicos
baixo-medievais. Para Quesada, seriam a raiz dos pactos aragões, catalães e em Castela,
expressos perante as Cortes e no autogoverno municipal. Modelo de maior poder real,
mediante juramentos régios de respeito a liberdade, exceções e privilégios, bem como a
doutrina do contrato callado do séc. XV;
 Heranças. Cenário no qual ainda não havia triunfado uma diferenciação clara entre poder
político de outras formas de poder. Práticas feundo-vassálicas nas quais o primeiro poder
(politico) não se diferenciava completamente de um conjunto amplo de relações sociais e
expressões ideológicas;
 Poder político e formas de domínio socioeconômicas estavam ligadas entre si direta e
visivelmente. Tendência persistente de um exercício de poder político pelos mesmos
espaços e agentes que exercem o socioeconômico (QUESADA, 2019, p.38);
 Estado monárquico ainda sem uma divisão clara dos poderes e instituições, ainda que
especializações práticas de funções progressivamente aumentassem. Situação de
superposição e multiplicidade de atribuições, pactos e jurisdições na hora de exercer
poderes políticos sobre os mesmos espaços e populações, gerando complexidades e
confusões aos governados;
 Metade do séc.XIII, paulatino renascimento da noção de Estado como a forma mais
complexa e perfeita de organização do poder político, processo que por sua vez se apoiou
nos elementos anteriores, respeitando o princípio agregador das hierarquias de poder que
ordenavam o conjunto do reino;
 Estudos do direito romano tardio (desde a metade do séc.XII) e da politica de Aristóteles
(último terço do século XIII), organização política da sociedade, recuperação do caráter
público do poder político, tido como espaço autônomo e diferenciado, com legitimidade
própria. Glosa eclesiástica de Tomás de Aquino e Egidio Romano citando a noção de bem
comum e lei positiva (resultado de exercer o poder político e seu limite habitual e
instrumento de ação). Harmonia entre lei natural e lei divina como fundamentos da ordem
social (QUESADA, 2019, p.39);
 Conjunto de ideias e tendências políticas presentes, em diversas formas, nos tratados
doutrinais e outros escritos governamentais: Las Partidas de Alfonso X de Castela,
juristas do séc. XIV e XV, catalães e aragonenes (Ramon de Penyafort, Pere Albert),
clássicos medievais (Isidoro de Sevilla);
 João de Salisbury, Tomás de Aquino, Egidio Romano, Álvaro Pelayo, Alonso de
Cartagena, Alfonso Diaz de Montalvo;
 PACTISMO E ABSOLUTISMO

 Duas formas de modalidade teórica no processo de constituição das monarquias


espanholas, de maneira sucessiva e contraditória:
 Pactista: Repartição do poder e suas funções entre o rei e o reino. Como reino, deve-se
entender os estamentos (clero, nobreza, estado pleno), atuando por meio de parlamentos e
Cortes ou separadamente. Compostos por membros dirigentes, verdadeira sociedade
política inserida na sociedade civil. Nessas condições, a monarquia teve capacidade mais
escassa nos mandos e mobilizações políticas, em face aos poderes estamentais, que agiam
sobretudo na defesa de suas liberdades e privilégios (QUESADA, 2019, p.41);
 Absolutismo régio: Concentração do poder na coroa em detrimento aos estamentos. Coroa
dona da soberania, preeminência y senhorio real absoluto. Vale ressaltar que isso não
contradizia a efetiva supremacia social e política dos agentes poderosos do reino, que ou
atuavam bem integrados ao poder real (por ofícios e cargos dependentes diretamente do
rei) ou como titulares de poderes e administrações de caráter subordinado, limitado dentro
de marcos do estado monárquico (senhores municipais) (QUESADA, 2019, p.41);
 Ambos os modelos se manifestaram na Coroa espanhola baixo medieval, com
características e problemas semelhantes dentro do processo de modernização do conceito
emergente de Estado. A monarquia, como se conclui a partir das Cortes castelhanas de
1476, passa a encarnar tais noções de Direito Público, como a inalienabilidade de terras
da Coroa, monopólio régio nos assuntos exteriores, bem como a soberania exclusiva dos
reis, que se proclamavam acima do poder temporal;
 Ambos os sistemas, por caminhos próprios, levaram a uma renovação em diversos setores
da sociedade política, monarquia e o reino no seu conjunto, gerando novos equilíbrios de
doutrinas e bases institucionais. Assim, os grandes desafios a se superar pela monarquia
foram de ordem institucional (melhora dos meios de ação jurisdicionais, políticos e
administrativos; dispor de recursos financeiros e militares mais potentes; novo sistema de
relações internacionais). (QUESADA, 2019, p.41);

 OS PODERES DO REI
 Poder régio exercido de maneiras semelhantes nos reinos do medievo. Mando militar,
capacidade de declarar guerra e paz, acordar medidas de perdões e graça, chamar às
armas,
 Dessas funções derivavam as funções judiciais, governamentais e administrativas
concretas, ou de outros em seu nome. Daí advinha o direito de cobrar determinadas rendas
e direitos fiscais como poder público eminente (QUESADA, 2019, p.42);
 Segundo o ideário romanista, na Baixa Idade Média o rei voltava a corporificar a lex
animata, recuperação de sua capacidade legislativa. No caso de Castela, só a Coroa podia
promulgar ou derrogar leis, como demonstra o Ordenamento de Alcalá de 1348,
exercendo sua prerrogativa legislativa por meio das Cortes promulgado Ordenamientos y
pragmáticas;
 No caso de Aragão e Navarra, as Cortes tiveram capacidade co-legislativa, ainda que o
monarca conservasse a exclusividade da promulgação legal. Conforme Quesada, o rei
podia ir além das leis, no caso de uma modalidade absolutista, partindo da expressão
romana princeps legibus solutus est y et ex certa scientia, usando sua potentia absoluta,
além da ordinária subordinada pela lei (vis directiva). Porém, pouca força coativa tinha
para balizar objetivamente o rei, ainda que uma principiologia colocasse o rei como
servus legis em certo sentido (pai e filho da justiça ao mesmo tempo, KANTOROWICZ);
 Na mesma toada, o poder real se manifestava no exercício de outros direitos soberanos,
definidos pelo direito romano tardio: iuria regalia e regalias, que garantiam à coroa
minas, fontes salinas, bosques, pastos e terras incultas, cuja possessão não pertencia a
outras instituições/particulares. Se englobam também a caça e pesca;
 Outras prerrogativas da coroa compreendiam a cunhagem de moedas, autorização para
celebrar feiras/mercados, seguranças de caminhos públicos. Em suma, manifestações de
sua capacidade de manter a justiça (QUESADA, 2019, p.42);
 Manifestação de uma administração pública, institucionalizando-se cada vez mais em
nome e à serviço da coroa. Inicialmente, sem separação, mas interrelacionados, com um
mesmo órgão institucional “Julgando e governando”, sem que isso implicasse numa
confusão de sua natureza jurídica funcional;
 Instituições flexíveis, sem ordenamentos fixos que delimitassem de seu leque de
competências, de modo que podiam livre e rapidamente adjudicar novas tarefas (ou
modificar antigas) segundo a convencia política do momento pela coroa. Ainda que
houvesse um notável esforço para promulgar ordenanças que regulassem claramente suas
atividades, havia amplo espaço para liberdades de competência (QUESADA, 2019, p.43);
 Comunicação dupla entre coroa e súditos, de maneira ordinária (através da mediação de
instituições públicas) e extraordinárias/direta por meio da apresentação de memoriais ou
cartas (bem como o servicio regio, situação que prescindia das estruturas administrativas,
insólita e condenável, sobretudo se não tivesse êxito de seus objetivos políticos);

 INSTITUIÇÕES DE CASA E CORTE DO REI

 Casa e corte, especialização e criação de ofícios. Afirmação e ampliação do poder real.


Afonso X de Castela, Partidas por exemplo;
 Corte como centro do poder real, sede de decisões centrais de governo, além de um
espaço dominado por uma elite à serviço da Coroa. Tendência a uma centralização
governamental com base em laços de sangue e clientelismo e mediado pelos agentes
intermediários, das instituições cortesãs, seguindo pautas não formalizadas, baseadas no
segredo e confiança (QUESADA, 2019, p.44); ademais, essa elite cortesã foi responsável
para a cristalização de modelos culturais e pautas de conduta, inspiradoras de ideais e
formas de vida da elite política;
 Muitas dos ofícios da Casa Real tiveram um âmbito de ação mais doméstico e privado,
ainda que alguns titulares alcançassem grande influência política (Camarero Mayor,
Mayordomo Mayor, Contadores Mayores, Almojarife Mayores, gestão da fazenda real,
tesouro da Coroa). Em Aragão, Maestre Mayor e Bayle Mayor. Em Navarra, tribunal de
contas e Cámara de Comptos (1365);
 Dentro da corte, se destacavam também a Canciellería, em todo o reino desde as origens
do séc. XII, bem como secretários do séc. XV, que passariam a cuidar da maior parte do
governo cotidiano do rei (QUESADA, 2019, p.44);
 Quanto as funções religiosas, cabiam a Capilla Real, grupo composto capelães reais,
confessores do rei e outros clérigos, grupo de peso na Casa e Corte no âmbito político e
eclesiástico. Promovia candidatos para o episcopado e outros altos cargos da Igreja, bem
como conselheiros reais e serviços cortesãos diversos (QUESADA, 2019, p.45);
 A corte também dispunha de órgãos jurídicos especializados, como a Justiça Mayor ou
Sobrejuez de la corte (criação de Alfonso X em Castela) bem com Alcaldes de Corte
(prefeitos), que julgavam casos relativos à ruptura da paz e seguridade interiores. Desde
meados do séc. XIV, existia o tribunal de colegiados chamado Audiencia, descrito em
ordenanças entre 1371 e 1489. Se dividiam entre salas de âmbito civil (a cargo dos
oidores) e de penal (dos alcaldes), composto por juristas profissionais e de grande
importância na Corte e Casa real (QUESADA, 2019, p.44);
 Devido sua complexidade, se sedentarizou antes que o restante da Corte. Valladolid foi
sua sede no séc. XV, e no tempo dos reis católicos se dividiu em uma seção na Galícia (La
Coruña) e uma segunda Audiência para os casos ocorridos na metade sul do reino, em
Granada (1505). O desenvolvimento do aparato judiciário da Corte ocorreu de maneira
semelhante nos reinos da Coroa de Aragão e Navarra, com a atuação de juízes
especializados desde os finais do séc. XIII e da Audiência real desde a segunda metade do
séc. XIV, distinta para cada membro da coroa (QUESADA, 2019, p.45-46);
 Em Aragão (apenas) se consolidou uma magistratura original que julgava litígios entre
nobres ou nobres X rei, chamada Justicia Mayor de Áragon desde 1265. Tratava-se de
ofício vitalício e teve espaço jurídico próprio, à margem de atribuições reais, consistindo
em verdadeiro freio político régio, caso fosse entendido que alguma decisão real ia contra
as leis do reino, em especial quando relativas à nobreza. Para QUESADA, se converteu
muitas vezes como o maior obstáculo ao rei na mudança de relações de poder já
estabelecidas (p.46);
 No que toca Portugal, a situação é semelhante nos aparatos institucionais judiciários,
porém com denominações diferentes. Chama atenção a Audiência da Portaria, destinada
a querelas sobre a Fazenda Real e sobre judeus e mouros, estes sobre a proteção pessoal
do rei (QUESADA, 2019, p.46);
 Também estavam à cargo da Corte o Alferes (substituído nos finais do séc. XIV para
Condestable, delegado), chefe do exército real e o Almirante, ofício criado em Castela em
1254, cuja função era dirigir a frota real e a jurisdição do rei em assuntos marítimos;
 Outra instituição fundamental era o Consejo Real, evolução da Curia Régia, instrumento
principal de governo do reino de Castela, com suas origens remontando a Fernando II
(1217-1252), porém se fixando em 1385 (quatro prelados, quatro cavaleiros e quatro
cidadãos). Na Corte dos reis católicos (presidido por um bispo, três cavaleiros e oito ou
nove letrados) era a melhor expressão de poder da monarquia: Um órgão técnico, divido
em seções que se convertiam (conforme a necessidade) em Conselhos especializados, nos
quais se coordenava toda a ação administrativa do reino, além de atuar como tribunal
supremo em nome do rei (QUESADA, 2019, p.47);
 O Conselho teve origens semelhantes em Aragão e Navarra, mas em Castela foi muito
mais significativo, com funções maiores. Segundo as Ordenaciones de Pedro IV,
consistiam num órgão composto pelos principais oficiais da Casa Real, com funções de
coordenação administrativa e alta justiça. Em 1449, Fernando o Católico cria um novo
conselho em Aragão, na Corte, para tratar dos assuntos concernentes aos vice-reis e
tenentes dos países membros da Coroa, porém se trata de órgão distinto da do Conselho
real de raiz medieval (QUESADA, 2019, p.47);

 INSTITUIÇÕES TERRITORIAIS
 Instituições territoriais/locais para garantir a regularidade e eficácia do poder régio.
Delegados e nobrezas territoriais, poderes políticos que podiam resistir delegações régias
(QUESADA, p.47);
 Adelantados mayores (XIII), merinos mayores e Corregidores (séc. XV). Procuradores e
governadores gerais, capacidade administrativa e judiciária;
 Conhecimento imperfeito sobre o pais, habitantes e recursos. Dificuldade para conservar e
manejar agilmente documentos/contas e escrituras. Situações que fizeram reis colocarem
limites na centralização burocrática que mediava o poder régio (QUESADA, p.48);

 RECURSOS DA FAZENDA (ECONOMIA) E MILITARES


 Acumulação de recursos, revolução fiscal. Efeito principal da concentração de poder das
monarquias baixo-medievais;
 Impostos diretos sobre os naturais do reino, negociados nas Cortes e pagos pelo não
privilegiados; Impostos indiretos (circulação, comércio e consumo de bens). Impostos
Comuns e ordinários e extraordinarios;
 Dependia da concessão da Cortes (arrecadação e administração), de modo a serem
empregados para os fins outorgados. (REIS DA NAVARRA E ARAGÃO). Contribuições
indiretas (tráfico e consumo de mercadorias);

 Em Castela, reis mantiveram o controle sobre o novo sistema fiscal (séc. III ao séc.XV,
serviços extraordinários de Alfonso X, concedidos pelas Cortes, um dos pilares da
fazenda real). Rendas de origem eclesiástica, taxas aduaneiras e sobre os ganados (gados,
semoventes) transeuntes;
 Alcabalas, salinas e montazgos (uso de pastos e terra pública). Notável liberdade de ação
financeira com os novos sistemas de impostos. Arrendados de companhias privadas, que
pagavam de antemão. Controle externo sobre o emprego de recursos, aristocracia local
discutiam sobre a repartição, mas não as características da nova fazenda real;
 Debilidade da fazenda e rendas próprias das jurisdições senhoriais e municipais
demonstra o triunfo do estado monárquico castelhano, com reis intervindo habitualmente
até nas rendas eclesiásticas (QUESADA, p.50);
 Recursos financeiros empregados geralmente em gastos militares. Guerras que
afiançavam a identidade e hegemonia, bem como fronteiras. Monopólio da violência,
meios de exercer guerra e paz. Castela com mais recursos para financiar ofensivas bélicas
(QUESADA, p. 50);

 AS CORTES

 Século XIII, autoridade régia aumenta concomitantemente com as três ordens


estamentais, sociedade em transformação e mudança, setoriais sociais dotados de poder
político. Cortes, nas quais os três grupos se juntavam para parlamentar (QUESADA,
p.51);
 Demandas e articulações, na teoria supostamente representando a comunidade baixo-
medieval hispânica. Defesa do iura regni, o que é de todos deve ser discutido e aprovado
por todos (quod omnes tangit ab omnibus tractari et approbari debet);
 Síntese das relações entre monarquia X setores sociais dotados de poder. Originárias de
Leão e Castela. Nasceram da ampliação da Curia Régia extraordinária. Apenas o rei
poderia convoca-las. Bispos e alta nobreza formavam parte como membros, não como
mero braço representativo (QUESADA, p.52);
 Juravam fidelidade a cada novo monarca e herdeiros do trono, em nome de todo o reino,
bem como o juramento régio de respeitar seus respectivos foros. Porém, não outorgavam
legitimidade ao monarca e seus herdeiros, visto que eram prévias ao juramento;
 Cortes como corporação representativa, exercendo deveres de conselho e ajuda ao Rei.
Rei informava dos negócios importantes (interna e externamente) e a Corte trazia petições
e projetos que a Coroa deveria considerar e responder, bem como àquilo referente aos
impostos e extraordinários. Na Corte, o rei promulgava as leis importantes (QUESADA,
p.52);
 Porém, a monarquia nunca compartilhou sua capacidade legislativa ou admitiu limitações
jurídicas de seus poderes perante as Cortes, situação que se esboçou no séc. XV, mas não
se consolidou;
 Espaço político no qual se manifestava o poder de direito de cada grupou ou facção ativa
na vida política do reino. Sua potência efetiva dependia das conjunturas de forças sócio-
políticas: Grandes momentos nos anos de 1282 e 1325 (definição das forças políticas
municipais somada às crises do poder real); 1369 e 1393, consolidação do trono da casa
Trastámara e a gênese de uma nova nobreza;
 Perdem seu peso político próprio no séc.XV, no que pese a frequência de suas reuniões até
1480. Sujeição à membros da Alta Nobreza e monarquia dos reis católicos, que só
convocaram procuradores de 17 cidades, somadas com Granada. Vale destacar que os
ideias de controle e participação no governo régio não desapareceram, voltando a se
manifestar de maneira mais proeminente no movimento das Comunidades (1520);
 Cortes Catalãs, aragonesas, valencianas e navarras organizadas diferente. Compostas de
braços estamentais (eclesiástico/nobre e militar/citadino), estritamente regulamentado
quanto às convocações. Potencial político superior ao castelhano, visto que se alcançaram
pactos jurídicos que limitavam o exercício do poder régio (QUESADA, p.53);
 Ainda que só o rei pudesse convocar, tinha papel importante e Lugarteniente, e suas
demandas deveriam ser resolvidas antes que outras pautas fossem analisadas. O rei só
poderia promulgar novas leis com seu acordo, estando nas mãos da Corte a outorga de
impostos extraordinários (gestão e contabilidade) num sistema de delegacion permanente
(Diputación del General), de modo a assegurar sua continuidade;
 Reis aragoneses não tiveram a mesma liberdade de ação que seus contemporâneos
castelhanos. Cada país da coroa Aragonesa tinha sua própria assembleia, particularmente
conservadoras e defensoras de privilégios próprios das oligarquias políticas em
detrimento aos interesses e reinvindicações sociais
 Dois modelos de evolução política. Castelhano e Português (modelo dominante, tendia ao
Estado Moderno – Monarquia absoluta); aragonês e Navarro (pactismo, estamental).
Coexistência de duas concepções sobre a ordem política e a relação entre monarquia X
reino, ainda que ambas no mesmo sistema social e cultural;
 Legado das instituições de leis e órgãos administrativos que se mantiveram, em linhas
amplas, até o séc. XVIII e até a atualidade;
 Teoria da Coroa, que engloba a imagem do rei e do reino numa comunidade natural.
Maturação de uma consciência histórica ligada a consciências de pátria, tanto da realidade
cultural e histórica da Espanha como um todo, bem como de cada um dos reinos
medievais dentro da monarquia unida a partir dos reis católicos (QUESADA, p.54);

 IGREJA E CLERO NA SOCIEDADE


 Estudos inseparáveis de outros aspectos da realidade histórica (econômica, social, política
e cultural), Sanz Sancho, I, “Para el estudo de la Iglesia, 1998”;
 Instituição essencialmente comunitária, importante na formação e desenvolvimento das
sociedades (QUESADA, p.55);
 Quesada ressalta dois aspectos: 1) Fé e crenças cristãs, expressões devocionais, práticas
morais, desvios e heresias, pagãos, tanto no que toca a história das mentalidades (história
cultural clássica) quanto no que toca o ponto de vista eclesiástico (LADERO, iglesya e
sociedade, 1998), bem como aspectos da ciência geral das religiões (Mircea Eliade);
 2) Igreja no âmbito jurisdicional, clero como grupo estamental da sociedade, suas
diversidades internas, instituições eclesiásticas como proprietárias de patrimônios e
preceptores de rendas. Hierarquias da Igreja como parte do poder constituído
(QUESADA, p.56);
 Depois da queda Império Romano do Ocidente, a Igreja permaneceu como único poder
geral organizado, apoiada em sua condição de religião oficial do Império, e
subsequentemente teceu uma tripla rede institucional de dioceses, paroquias, igrejas
privadas e monastérios, até amadurecer entre a época da Reforma Gregoriana em finais do
século XI e os grandes concílios universais do séc. XIII. Assim, foi a única organização
pan-europeia, se aperfeiçoando na baixa idade media (QUESADA, p.56) (DIAZ IBANEZ
JORGE, La organización institucional de la Iglesia, 1998);
 Igreja medieval que tinha como finalidade e justificação a manutenção e propagação da
boa nova (evangelio) da fé cristã e da cultura teológica e jurídica, num contexto de
integração sociorreligiosa. Cristianismo praticado como parte do entorno social, proposta
de uma Igreja indiscutida enquanto tal. De modo que a missão evangélica sacerdotal se
integrava com a aceitação do sistema social vigente, ainda que se reconhecessem defeitos
que parecessem sempre extirpáveis sem modifica-lo, bem como males obrigatórios que
punham à prova a força da fortaleza cristã (QUESADA, p.56).
 Por conseguinte, a segunda ideia geral a se tomar em consideração é que o cristianismo
latino não se pautava apenas no mistério da redenção e a prática de certos princípios
éticos, mas também a ideologia básica para explicar a razão de ser histórica e a forma de
organização da sociedade, por meio do controle espiritual e institucional da Igreja.
 Batismo que conferia uma espécie de cidadania, fundamental para o desenvolvimento de
uma identidade comum. Fé como parte do patrimônio cultural do indivíduo, desde que
nascia, e se praticava seguindo normas estabelecidas, salvo em casos de dissidência. No
que toca a dissidência, essa mesmo proposta como antítese ao referencial da situação
eclesiástica geral (QUESADA, p.57);
 Comunidade de fieis, inclusão de todos os homens. Sobrenatural e natural, imaginada
frequentemente por meio de metáforas e referenciais familiares para explicar sua
organização, procedentes do Antigo Testamento e específicas da fé cristã: Cristo-Dios
Hijo, María-Madre de Cristo-Dios, Igreja mãe dos filhos-fiéis;
 Alcance simbólico responsável por definir a estrutura ideológica da sociedade.
Transferência da estrutura básica familiar para criar a imagem mental da Igreja como
comunidade universal que integra o todo da humanidade (QUESADA, p.57)
 Clérigos combinavam a defesa de seus interesses e a missão como administradores do
Evangelho juntamente com uma concepção estática de sociedade, cujo ordenamento
interno parecia suficiente para assegurar os fins religiosos da humanidade. Influencia
geral e continua das leis e instituições eclesiásticas nas sociedades medievais
(QUESADA, p.57)
 Mesma substancia entre a potestas secular e auctoritas sacerdotal, monarquia e Igreja
colaborando para organizar a “cidade do mundo” para o advento pleno da “cidade de
Deu”. Missão comum, repartição de funções em que a política secular intervia na
administração eclesiástica (não no que toca o campo doutrinal), no plano normativo e
defesa da fé. Não obstante, o elemento religioso proporcionava elementos fundamentais
de legitimação e dava sentido moral para a ação política, integrando o poder secular à
concepções hierocráticas e providencialistas da realidade social (dois corpos do rei,
Kantorowicz);
 Papado e bispado com proeminências doutrinais e hierárquicas, bem como o exercício
extraordinário da potestas in temporalibus, ainda que na prática o poder régio fosse a
“cabeça” da ordem do reino (p.57);
 Influência política e social do clero por proporcionar os elementos básicos da ideologia
explicativa do ser e do funcionamento da sociedade em conjunto. Religião, alto clero e
poder régio numa relação íntima nos países europeus, especialmente na Espanha pelo
contexto das cruzadas, na secular luta contra o islã. Monarcas simbolizados como
protetores e restauradores da Igreja (QUESADA, p.58);
 Ainda com a crise baixo-medieval do pontificado, o fundamento de coesão social do
cristianismo não havia se debilitado, tampouco a necessidade/conveniência da Coroa em
manter uma relação próxima com Roma, o alto clero do reino e o estamento eclesiástico
como um todo;
 Natureza estamental, oratores, acesso aberto e não hereditário, com jurisdição própria e
hierarquias e diversidades internas autônomas. Seus membros eram como uma família
espiritual dirigida pelo bispo. Não obstante, participavam das situações mundanas da
sociedade, conforme suas funções, origens, procedência familiar, níveis econômicos e
culturais, interesses;
 Exceções do dever militar direto, privilégios fiscais (sem tributações diretas, que podiam
ser estendidas para familiares). Singularidade na forma de obtenção de patrimônio e
renda, mesmo com a crise do séc. XIV. Entidades eclesiásticas contando como as maiores
proprietárias de bens rurais e urbanos, domínios senhoriais e fontes de renda própria
(dízimo sobre a produção agrária), empregados para os números serviços eclesiásticos
requeridos pela sociedade (p.59);
o Obtenção de renda que não implicava num estamento homogêneo. Da repartição
do dízimo, estava excluída boa parte do clero secular e todos os monges e frades.
Muitos capelães e frades dependiam estritamente de esmolas, oferendas e
primícias. No que toca os monastérios e conventos de frades, ainda que exclusos
do dízimo, contavam com rendas de suas propriedades e com o exercício de
jurisdição senhorial. Tais desigualdades na repartição de renda do estamento
eclesiástico, juntamente com outros fatores, devem ser levadas em conta para
conhecer os aspectos internos e a natureza de seus vínculos com outros grupos da
sociedade secular (QUESADA, p.59);
 Primazia de Roma nos assuntos que tocam a nomeação e rendas eclesiásticas. Exercício
habitual da jurisdição episcopal sobre os clérigos, dos presbíteros (que exerciam o
ministério sacerdotal, celebração da missa e sacramento da eucaristia) e dos diáconos e
subdiáconos que exerciam o trabalho sacramental e pastoral, que como os presbíteros
eram de ordem maior (sacra);
 Também cabia a primazia do poder de Roma jurisdicionar sobre as ordens menores
(porteiros, hostiários, leitores do texto bíblico, exorcistas, acólitos auxiliares do altar). A
essas funções, cabiam ao pessoal secular, não obrigados ao celibato, situação que
ampliava as relações sociais de apoio aos interesses eclesiásticos para fora dos muros da
Igreja, ainda que também aumentassem conflitos com jurisdições seculares, haja visto que
esses estavam submetidos a jurisdição eclesiástica (p.59);

 MATURAÇÃO, CRISE E REVOLTA (1250-1515)


 CONTINUIDADES E NOVIDADES
 Meados do séc. XIII, cristandade latina cobrindo todo o espaço da Europa Ocidental e
central, fixando suas fronteiras medievais. Pontificado no auge de sua autoridade e muito
bem sustentado pelo madurez do direito canônico, um esboço de sistema fiscal pan-
europeu, intervenções diversas na provisão de benefícios (maiores ou menores, em
especial os bispados, p.60);
 Concílios universais (Latrão IV em 1215, Lyon I em 1245, Lyon II em 1274), fixação de
aspectos da crença e prática religiosa, teologia escolástica definindo critérios e formas
para se refletir sobre a fé cristã e fundamentos. Novas ordens mendicantes, impulso
intelectual renovado. Inquisição, supressão de heresias (que perderam fôlego ao longo do
século);
 Manifestações de uma religiosidade mais introjetada e profunda, pessoal. Agudeza na
sensibilidade sobre a vida e a morte, novas formas devocionais sobre Jesus e Maria. Na
mesma toada, críticas ao poder político e jurídico da Igreja, pobreza voluntária e outras
formas críticas de religiosidade;
 Auge do intervencionismo pontifício, instalação do papado em Avignon. Aumentam as
relações entre o pontificado e os estados monárquicos em construção;
 Cisma de 1417. Restauração da autoridade papal no séc. XV e a relação tensa com teses
conciliarias, bem como o aumento das intervenções régias em assuntos eclesiásticos nos
seus respectivos reinos, especialmente durante e depois do Cisma;

 AMBITO ESPANHOL
 Plena organização territorial e institucional das igrejas hispânica alcançada no segundo
terço do séc. XIII. Após isso, época de dificuldades. Suposta decadência moral da Igreja,
clero e prática religiosa que se tornam agudas no séc. XIV, aspectos de uma crise geral
(p.60-61);
 Projetos de reforma quatrocentistas, com efeitos práticos diversos a longo e médio prazo,
ou limitados. De início, tratava-se de atualizar e aplicar princípios canônicos e
institucionais já existentes, especialmente àqueles elaborados a partir de Latrão IV, ainda
que não imediata. Cenário de crise política e econômica desde 1272 que se agrava.
Situação só passaria a melhorar de Valladolid 1322, mas ainda sobre um cenário de crise
nas relações entre o clero e episcopado, nos tempos de Pedro I (p.61);
 Igreja aragonesa mais receptiva aos cânones de Latrão IV, bem como mais bispos
reformadores. Estimuladas pelos risco das heresias cátaras, valdenses e beguinas, mais
abundantes do que em Castela;
 Importância dos concílios e sínodos. Regulação dos aspectos da vida religiosa, ritmo de
convocatória e celebração que muda segundo épocas e reinos. Atividade conciliar e
sinodal maior em Aragão no séc. XIII, situação que muda progressivamente para Castela
no período dos reis católicos, ainda que no séc.XV castelhano, o mais recorrente tenham
sido sínodos diocesanos. Impulsos de reforma e mudança que variaram, e a suficiência do
cumprimento dependia tanto do empenho pessoal de bispos quanto das colaborações e
eventuais resistências;
 Preocupações dos dirigentes eclesiásticos em diminuir as abstenções e melhorar a ação
pastoral do alto clero, bem como a formação intelectual e letrada dos eclesiásticos.
Fundações de colégios em cidades universitárias, atenção ao funcionamento de escolas
catedráticas. Aumento progressivo de canônicos com graduação universitária nas
dioceses, do séc. XIII ao XV (p.62);
 Intervenções políticas e régias, variada gama de relações com a sociedade em geral e seus
poderes estabelecidos. Relações com a realeza, intervenções organizacionais e Roma;
 Relação entre o pontificado e os reinos, mediante núncios e outros membros
representantes. Centralização administrativa e fiscal do pontificado em Avignon (1309),
influência contumaz na igreja espanhola. Aumento da pressão fiscal, centralizada na
figura dos coletores pontificais em cada reino, que repercutia negativamente no bom
funcionamento pastoral e na riqueza das dioceses, além de despertar resistências tanto do
clero quanto dos monarcas (p. 63);
 Cisma pontifico (1378-1417), tempo propício para aumento de intervenções régias,
buscando uma integração eclesiástica ao aparato da monarquia, imposições da soberania
monárquica sobre as estruturas eclesiásticas de cada reino, baseada na noção de monarcas
como protetores da Igreja e clérigos como naturais do reino (no sentido temporal), sem
intervir nas questões doutrinais/sacramentais e liberdades eclesiásticas. Efetividade
crescente desde o tempo de Alfonso X;
 Papa Martin V, concordatas com naciones europeias, redução durante 5 anos de
intervenções pontifica em matéria de fiscalidade e provisão de benefícios. Consolidação
indireta da intervenção dos reis em assuntos eclesiásticos. Demandas para que os
benefícios eclesiásticos fossem para os naturais do reino, e não para estrangeiros. A
atitude visava promover o clero local, ações pastorais, bem como garantir a fidelidade
política da moeda e seus titulares (p.63);
o Demandas reais quanto a nomeação de candidatos de arcebispados, bispados,
dignidades e outros. Súplicas concedidas pelos papas Benedito XIII, Martin V e
Calixto III. Caminho para a consecução do patronato real pleno, que obrigava a
aceitação dos patronatos propostos pelos monarcas (no caso dos reis católicos,
obtiveram para as sedes episcopais de Granada, Canarias e Indias);
 Outra demanda conquistada foi o controle financeiro procedente das rendas eclesiásticas e
esmolas dos fiéis por parte do poder real. Tercias reales (parte do dízimo eclesiástico)
passam definitivamente a formar parte do ingresso real, com os monarcas podendo contar
com quase a totalidade das décimas e subsídios extraordinários estabelecidos sobre as
rendas da Igreja, bem como das esmolas arrecadadas das predicações de indulgencias
geradas pela cruzada (p.64);
 Facilidade dos reis para realizar reformas eclesiásticas, como Juan I de Castela
assessorado por conselheiros eclesiásticos e Pedro de Luna (futuro Benedito XIII),
promovendo iniciativas monásticas de jerônimos, cartuchos e beneditinos. Proteção de
imunidades e bens eclesiásticos. Tais intervenções régias continuaram no reinado de
Enrique III e Juan II, precedentes do grande impulso reformador levados a cabo pelos reis
católicos desde 1480 (p.64);
 Criação de relações novas e duradouras entre monarquia e episcopado, bem como a
influência de bispos e outros membros da elite eclesiástica na elaboração e legitimação do
modelo de poder monárquico, tanto ideologicamente quanto na forma de
governar/administrar; (p.65)
 Clientela entre monarquia e poder eclesiástico, mediante negociações com Roma,
promoções políticas, formando na Corte grupos de confiança (confessores reais e
membros da Capela Real);
 BISPOS E DIOCÉSES
 Cada bispo dirigia e servia como pastor religioso habitual/ordinário de um território,
compreendido pela diocese. As dioceses se agrupavam em províncias eclesiásticas, com
um arcebispo metropolitano a frente, esses dependentes do Papa. Haviam também
dioceses isentas, cujos titulares estavam vinculados sem intermediários ao papado (p.66);
 Cabia a Roma outorgar o título de primado (grau honorífico, mas que não implicava num
exercício jurisdicional superior tampouco específicos sobre os bispados em seu âmbito) a
um metropolitano, geralmente o titular da sede mais antiga ou de maior significado
histórico. Na Espanha, era o Arcebispo de Toledo, desde 1088;
 Demarcações geográfica, criação de dioceses. Finais do séc. VII e meados do séc. XIII,
conforme avanços dos reinos cristãos. Restauração/continuidades de bispados visigóticos.
Províncias eclesiásticas, metropolitanas: Toledo, Braga, Santiago, Tarragona, Sevilla, bem
como outras à margem (Oviedo, León y burgos, Mallorca, Cartagena);
 Províncias do séc. XIII não se atinham a divisões políticas de fronteiras entre reinos, visto
que essas só terminaram de se precisar no último terço do mesmo século;
 Província de Toledo compreendia a maior parte do território castelhano, com exceção da
dioceses ao Norte. Modificações baixo-medievais cujo intento eram ajustar, conforme
possível, as províncias eclesiásticas para cada território. A época do grande cisma foi
importante para que os reis conseguissem seus propósitos. Grandes divisões eclesiásticas
se aproximando das políticas. Novo patronato real após incorporação de Granada à
Castela. Nos finais do século XV, 7 sedes arcebispais e 41 episcopais nas coroas de
Castela (33), Aragão (14) e navarra (1) (p.68-69);
 Igreja como a única entidade com uma organização desenvolvida da qual os poderes
políticos laicos pudessem tomar como modelo (p.69);

 BISPOS
 Plenitude das funções sacerdotais em sua diocese. Não era superior ao presbítero em
relação a eucaristia, se não num grau de ordem sacerdotal de maior dignidade pelos
poderes exercidos. Aspectos cerimoniais e simbólicos, báculo e mitra, anel e selo
episcopal. Solenidade de entrada e recebimento, bem como honras fúnebres e sepulturas
(p.69).
 Poderes episcopais que são exercidos no âmbito da 1) ordem, 2) magistério e 3)
jurisdição. 1) capacidade de administrar os sacramentos, inclusive a absolvição de
pecados graves, bem como o acesso à vários níveis do clero. Organizava e presidia o culto
e suas manifestações litúrgicas, além do calendário ao longo do ano;
 Dele dependiam não apenas o clero secular, mas também dos monastérios e conventos
situados em sua diocese;
 A prerrogativa de magistério fazia do bispo responsável pela formação intelectual de seus
sacerdotes, que deveriam possuir os conhecimentos necessários para exercer suas funções,
além do dever da prédica, catequese e ensino da doutrina cristão aos fiéis da diocese
(p.70);
 Poder jurisdicional obrigava o bispo a julgar os delitos cometidos contra o direito
canônico em geral, bem como ditar normas complementares para guiar a conduta dos
clérigos e laicos. Fazia por sua própria iniciativa ou por cooperação de sínodos e
assembleias do clero diocesano por ele presidido, no qual elaborava estatutos ou
constituições sobre muitos aspectos da administração eclesiástica e da vida religiosa
(p.70);
 Frequente a reunião de concílios conjuntos das dioceses de uma província eclesiástica,
presididas por um arcebispo metropolitano, além dos concílios plenários de todo o reino
(não convocados diretamente pelo papa, mas com sua aprovação);
 Dependia também da jurisdição episcopal a outorga de ofícios e benefícios eclesiásticas
nas dioceses, começando pelo cabido catedralício, e com ele, a supervisão das práticas
administrativas e a defesa dos bens e rendas pertencentes às instituições dioceses (p.70).
Igrejas de patronato consistiam em caso especiais, ainda que o bispo a opção de confirmar
o cargo proposto pelo patrono. Todos os estatutos de instituições de direito eclesiástico
existentes numa diocese (até confrarias e hospitais) precisavam da sanção de licença
episcopal;
 Para exercer seus poderes com maior proximidade, o bispo deveria efetuar visitas
pastorais, que lhe permitiam conhecer às situações concretas, além de corrigir abusos. As
visitas deveriam ser anuais, tal como os sínodos, segundo disposto desde 1215 pela Igreja,
ainda que o mais recorrente fosse a delegação da visita para arcediagos (arcedianos),
arciprestes ou vicários mais próximos das paróquias que deviam ser inspecionadas (p.70);
 As procuraciones (direitos de visita) e catedrático (pagamento anual dos clérigos de uma
diocese ao bispo) consistiam em formas de se reconhecer seu poderio jurisdicional.
Bispos de rodeavam de uma casa formada por dezenas de sujeitos: familiares (em sentido
figurado), mordomos para a administração de bens e rendas da mesa episcopal, servidores
domésticos. Dispunha também de uma chancelaria e cúria, com vicários gerais que
exerciam poderes episcopais delegados. Em alguns casos, contava com a presença de um
bispo assistente (coadjuntor), e habitualmente atuava um oficial de justiça (provisor) a
frente do tribunal episcopal, além de visitadores diocesanos, também por delegação do
prelado (p.70-71);

 Eleição dos Bispos


 Ato de importância máxima, seja no âmbito eclesiástico quanto na sociedade secular em
geral, devido aos poderes e capacidades que se acumulavam ao cargo, a importância dos
eleitos, o patrimônio capital e as rendas das muitas sedes, bem como a alta probabilidade
de que os eleitos exercessem funções políticas além das pastorais (p.71);
 O candidato a bispo deveria ser homem, com pelo menos 30 anos de idade e presbítero,
com as qualidades morais e intelectuais adequadas. Vale ressaltar que essas condições
nem sempre foram respeitadas, especialmente em casos de designação de filhos de
membros de famílias reais. Nesses casos, os eleitos atuavam por meio de vicários gerais
ou outras assistências (p.71);
 A prática habitual atribuía ao clero e povo da diocese a capacidade de eleição do bispo.
Na realidade, esse princípio se traduziu na eleição pelo cabido catedralício desde o II
(1139) ao IV (1215) Concílio de Latrão. A eleição, por sua vez, deveria ser confirmada
por um bispo metropolitano, que possuía jurisdição delegada pelo Papa para consagração
do novo prelado, ou pelo Papa diretamente, tributário da primazia de jurisdição pontifical
consolidada com a Reforma Gregoriana (p.71);
 Reis também atuavam habitualmente na eleição, visto que se consideravam genericamente
como patronos e protetores da Igreja do reino, defensores da fé (Partidas, I.V.XVIII),
além da importância política do cargo episcopal, de modo que recomendavam ou
propunham candidato ao cabido catedralício, ou diretamente para Roma mediante
postulação ou súplica. As intervenções régias foram mais frequentes desde meados do séc.
XIII, e especialmente no séc. XIV (a partir de 1348) se consolida a tendência em
Castella, graças ao Ordenamiento de Alcalá dispusera que se comunicaria primeiro ao rei
antes que se procedesse a eleição (p. 71);
 Nas dioceses da província eclesiástica de Toledo e outras castelhanas próximas, o cabido
respectivo efetuou (entre 1250-1350) mais de 50 das 100 eleições episcopais, ainda que
34 das 100 fossem nomeações pontificais diretas, havendo recomendações régias em 37
dos 100 casos, especialmente nas sedes de Toledo, Palencia, Sigüenza e Cartagena (p.71);

 Procedência Social dos Bispos:


 Grande parte dos bispos do baixo-medievo nos reinos espanhóis procediam de famílias da
nobreza, ou até da família régia. Para QUESADA, isso se aplicava especialmente às sedes
mais importantes, sendo para muitos contemporâneos natural que a alta aristocracia
eclesiástica (pois assim eram considerados os bispos) correspondia à pessoas de alto
calibre social, que muitas vezes mantinham os símbolos heráldicos familiares como
prelados (p.72);
 Frequentes casos de nepotismo eram aceitos a favor de familiares próximos dos bispos,
porém para se concretizar essas premissas gerais, devem ser analisadas segundo as
características de cada sede e sua relação com a categoria nobiliária dos prelados que a
ocuparam, levando em conta que essa não era a única possibilidade;
 Desde o séc. XII, houve um número expressivo de monges e frades de origem social
humilde que alcançaram o episcopado (em especial no séc. XIV). No entanto, o mais
frequente é encontrá-los frente a dioceses de menor renda. De modo que a
potencialidade econômica e política era muito distinta de sede para sede, fator que
contribui para explicar o fenômeno das transferências de bispos buscando melhores
condições nos últimos séculos medievais, coisa que só havia acontecido em épocas
anteriores na Igreja (p.72);
 Arquidiocese de Toledo, Sevilla e Santiago, as de maior prestígio, nível econômico e
projeção política. Presença de famílias de alta nobreza clerical nas arquidioceses mais
importantes de Castela no séc. XV. Nas menores, bispos da baixa nobreza ou sem
vínculos nobiliários (IBAÑES, Dias J. Iglesia, nobleza e Oligarquias urbanas” 2006, e
La Incorporación de la nobleza, 2005); (p.73)
 Nos findos da Idade Média, foram-se elaborando novas ideias sobre os modelos de bispo,
que tiveram forte influência na prática. Junto aos casos de absentismo, nepotismo e
manutenção das velhas formas de ação, surgiram promoções ao episcopado para
sacerdotes naturais do reino, que residiam em suas sedes, de boa qualidade moral e
dotados de maior cultura teológica e canônica, capacitados não só para atuar no âmbito
eclesiástico como no político, independentemente de suas origens sociais (p.73)
 Em especial, QUESADA ressalta a época dos reis católicos. De 132 nomeações ao
bispado, 32 correspondiam a membros da alta nobreza e 74 a pessoas procedentes da
pequena nobreza e classes médias, incluindo prelados muito relevantes de origem judia
(conversos). (AZCONA, Isabel la Catolica, Madrid, 1964, p.583);

 3) Clero Secular:
 Dentro de sua condição comum, o clero consistia num grupo com grandes diferenças
internas. De um lado, havia um alto/médio clero que dispunha de recursos econômicos
estáveis, graça aos recursos dos cargos de prebenda, suficientes para assegurar um
sustento digno (p.73)
 Benefício, definido como uma entidade jurídica constituída ou erigida perpetuamente
pela autoridade eclesiástica competente, que consiste em ofício sagrado e no direito de
receber os rendimentos vinculados à dotação do ofício (Direito Canônico), também
chamado de prebenda (p.73); (CALVO, El Clero, 2017, Teruh, vocabulário básico, 1993);
 Número de benefícios que era limitado em função das rendas, e não tendeu a crescer. De
modo que havia muitos capelães e clérigos que exerciam seu labor sujeitos a rendas
insuficientes ou a salários. Na Coroa de Castela (com exceção de Canárias e Granada)
havia a finais do séc. XV entre 10.000 a 15.000 beneficíos, incluindo capellanias. Porém,
se aos benefícios dos cabidos catedralícios e colegiadas e aos curas paroquiais se
adicionem os servideros, prestamaras e capellanias mais difíceis de localizar,a cifra de
todo o reino dos reis católicos alcançaria ou superaria 35.000. Dessas rendas vivia o clero
secular, desde os cargos altos e médios, verdadeira aristocracia dentro da sociedade
eclesiástica de cada diocese, até os mais modestos economicamente, visto que os níveis de
ingresso foram variados (p.74);
 Havia também uma clara distinção entre o os clérigos de ordenações maiores/sacras,
obrigados ao ministério sacerdotal e celibato, e clérigos menores, também integrados na
jurisdição eclesiástica, mas que podiam contrair matrimônio, exercer ofícios seculares e
viver de fato como laicos. Estavam inclusos na imunidade eclesiástica, ainda que a
indeterminação de algumas situações concretas e abuso do foro eclesiástico produzissem
situações de enfrentamento com jurisdições seculares, em especial os fueros municipais
(p.74);
 Intervenções pontificais provendo benefícios a favor de clérigos estrangeiros, em geral
absentistas, geraram fortes queixas no séc. XIV dentro das Cortes castelhanas (1329-
1390), querelas que denunciavam a desatenção aos deveres eclesiásticos e capital que ia
para fora do reino. Os reis apoiavam as reclamações, muitas vezes eles mesmos
suplicando aos papas a provisão de benefícios em favor de clérigos naturais do reino. De
modo que as súplicas reais pelos reis à Roma cresceram de importância, ainda que
deslocando a competência bispal e dos cabidos catedralícios (p.74);
 Reis entrando no âmbito eclesiástico (cabido real, benefícios e boas relações do rei,
especialmente Juan II). Monarcas buscando que a maior quantidade de benefícios
recaísse sobre os naturais do reino e sedes episcopais, utilizando procedimentos de
súplicas, buscando um patronato real pleno (p.74);
 Reis exerciam direitos de patronato real, provendo benefícios para algumas colegiadas e
capelas funerárias de fundação régia (reyes viejos e reyes nuevos, da catedral de Toledo)
ou as capelas reais de Sevilla e Córdoba, além de diversas igrejas de patronato laico, no
qual o patrono propunha um clérigo, que dependeria da nomeação bispal (p.74-75);

 3.1) Cabidos Catedralícios:


 Clérigos a serviço de catedrais, desde o séc. VIII, distintos dos canônicos regulares
agrupados em outros tipos de igrejas. A partir do séc. XII, o cabido catedralício passa a ser
plenamente uma corporação ou colégio de clérigos, adscritos a uma igreja catedral e
dotada de personalidade jurídica própria , distinta da episcopal, com patrimônios e rendas
(mensa capitularis) diferentes do âmbito episcopal (mensa episcopalis). Por
desempenharem seus trabalhos no templo principal da diocese e sede bispal, eram
colaboradores mais próximos deste (p.75) de modo que por um lado o bispo presidia o
cabido, e por outra, caso vacante a sede, o cabido elegia um novo prelado;
 Em meados do séc. XIII a configuração dos cabidos (competências, deveres) se completa,
por meio de intervenções de legados pontifícios, oferecendo constituições e normativas
precisas. Os ofícios de maior honra eram as dignidades: Deão (presidia o cabido),
arcediagos (que tinham a seu cargo circunscrições territoriais da diocese), chantre
(diretor de rezas e cantos), mestre-escola (responsável pela instrução e formação
intelectual do clero) dentre outros;
 Canônicos eram o núcleo do cabido, a maioria presbíteros, ainda que houvesse a
possibilidade de canônicos ou clérigos de ordens menores, alguns exercendo funções
especializadas (teólogos, canonistas, predicador, biblista etc.) p. 75-76;
 Abaixo, havia os racioneros, residentes extra vagantes. Somando todo os colaboradores e
servidores, o número de pessoas que se agrupava no cabido era elevado (p.76);
 Capelas funerárias, especialmente importante em algumas catedrais. Além dos cabidos,
haviam as colegiatas, menores de dimensão e importância, com prerrogativas próprias e
subordinadas diretamente ao bispo, ainda que algumas houvessem sido fundadas por
seculares, que conservavam direitos de patronato (p.77). Colegiatas, dirigidas por bispos
e sob patronato de seculares. Âmbito secular e eclesiástico, fundidos pela ocasião;
 A vida comum segundo regra já havia desaparecido na Baixa Idade Média, salvo
situações excepcionais, mas a função principal de dignidades, canónigos, racioneros
seguia sendo a reza e o canto litúrgico das horas canônicas em coro na catedral, junto com
outros atos solenes: missas, festas, procissões, rogativas, memoriais aos defuntos (p.77);
 Canônicos presbíteros deveriam oficiar a missa de 1 a 3 vezes por ano, e todos deveriam
confessar e comungar na mesma frequência. Se adicionava a essas atividades a prática
caritativa e assistencial, imputada a renda capitular, hospitais e escolas capitulares, para
formação de aspirantes ao clero catedralício (dinâmica que se generalizaria desde os sécs.
XII ao XIII); (p.77);
 Cabidos possuíam capacidade administrativa para seus assuntos internos, o que deu lugar
a frequentes reuniões capitulares (3 vezes por semana), bem com a promulgação de
constituições e estatutos, regulando funções jurisdicionais importantes. Correspondia ao
cabido a administração de rendas episcopais, quando vacante. QUESADA afirma que nem
sempre se aplicavam os poderes de maneira pacífica, havendo situações frequentes de
tensões e divisões clientelares, bem como querelas entre bispos e capitulares, gerando
enfrentamentos violentos (p.78);
 Dignidades e canônicos consistiam na elite do clero diocesano (secular, submetidos à
coroa). OBS: clero regular, submetidos ao pontífice/Roma;

Você também pode gostar