Você está na página 1de 6

28/10/2021 19:11 “Não se faz educação integral em tempos de retirada de direitos”, afirma Jaqueline Moll - Centro de Referências em Educaç…

NOTÍCIAS
REPORTAGENS

PUBLICADO DIA 06/09/2019

“Não se faz educação integral em


tempos de retirada de direitos”,
afirma Jaqueline Moll
POR INGRID MATUOKA

TAGS: POLÍTICAS PÚBLICAS PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO INTEGRAL

Além dos anúncios de cortes de verbas para educação feitos neste ano pelo
Ministério da Educação (MEC), o Governo Federal ainda não fez nenhum
investimento em programas de indução da educação integral. 

Leia + Direitos humanos e educação: uma relação indissociável

Segundo dados obtidos pela Folha de S. Paulo, via Lei de Acesso à Informação,
os programas Mais Educação, Novo Mais Educação, Ensino Médio Inovador e
Novo Ensino Médio receberam 401,6 milhões de reais em 2017. No ano

https://educacaointegral.org.br/reportagens/nao-se-faz-educacao-integral-em-tempos-de-retirada-de-direitos-afirma-jaqueline-moll/ 1/6
28/10/2021 19:11 “Não se faz educação integral em tempos de retirada de direitos”, afirma Jaqueline Moll - Centro de Referências em Educaç…

seguinte, foram investidos 399,70 milhões, e em 2019 não houve nenhum


repasse de verbas. 

Soma-se a esse cenário o estímulo à militarização das escolas, ao ensino


domiciliar e à censura dos professores e de debates sobre gênero e
sexualidade. 

Jaqueline Moll, professora titular da Universidade Federal do Rio Grande do


Sul (UFRGS), que foi diretora de Currículos e Educação Integral da Secretaria
de Educação Básica no MEC de 2007 a 2013, analisa o que há por trás da falta
de investimentos e dos rumos que as políticas educacionais têm tomado.

Centro de Referências em Educação Integral: Como você


avalia a falta de prioridade que os programas de educação
integral têm no atual governo? 

Jaqueline Moll: A construção da agenda de indução da educação integral


parte do princípio de que o Brasil sempre negou escola para sua população. A
escola sempre foi mínima, sobretudo para as classes populares. Mínima em
horários, em espaços e em agenda formativa. 

Essa agenda, expressa principalmente no programa Mais Educação, retomava


sonhos alimentados pelos pioneiros de 1932, como Anísio Teixeira e
Fernando Azevedo, e dos que vieram depois, como Darcy Ribeiro, Paulo
Freire e tantos outros. 

Era uma mudança profunda de paradigma educacional, uma escola ampliando


seus tempos, revisitando sua própria história, saindo dessa feição industrial,
de horas contadas, marcadas por disciplinas diferentes, professores
diferentes, por atividades que não conversavam entre si e nem com o que está
acontecendo no país e na vida desses alunos. Fazendo pontes com a
comunidade e os saberes relacionados a práticas sociais e culturais.

https://educacaointegral.org.br/reportagens/nao-se-faz-educacao-integral-em-tempos-de-retirada-de-direitos-afirma-jaqueline-moll/ 2/6
28/10/2021 19:11 “Não se faz educação integral em tempos de retirada de direitos”, afirma Jaqueline Moll - Centro de Referências em Educaç…

Por isso, educação integral não é um apêndice, não é um programa a mais de


inovação, ela é estrutural nos governos e da educação brasileira. E se é
estrutural, não se executa um projeto em tempos de retirada de direitos, de
retorno de autoritarismo, de cassação da palavra, de fechamento de
possibilidades no campo das artes, de vigilância sobre os debates sobre
orientação sexual, que estão presentes em todas as escolas dos países
desenvolvidos do mundo.

Não só as verbas vão rareando porque há um projeto econômico em curso de


tornar o país muito subalterno, sobretudo aos Estados Unidos, mas também
porque há um projeto de destruição da coisa pública e da educação no Brasil.
A grande pergunta é: educar quem e para quê? Cada vez fica mais claro que
não se quer educar a população. 

Isso está expresso no fechamento de escolas e vagas, e de ampliação de


presídios e escolas militares. O que precisamos são as condições que as
escolas militares têm. Essas escolas contam com professores de 40 horas de
dedicação, escolas de tempo integral, de qualidade dos equipamentos. Mas
não precisamos da disciplina das forças armadas que é específica para tarefas
específicas, e não pode permear a formação de toda a sociedade. 

Conforme isso vai se concretizando, vamos afastando cada vez mais a


democracia e a perspectiva de uma sociedade democrática. O escasseamento
de recursos é que o projeto de educação conversa com projeto de país.

CR: E como ficam os programas de educação integral


neste contexto?

JM: Antes tinha o Mais Educação, que incidia na melhoria da qualidade da


aprendizagem de Português, Matemática e outras áreas, mas fazia isso a
partir da consequência do conjunto, desse bem estar na escola, de ser
acolhido, ouvido, fazer parte e ser incluído, construir um pertencimento
institucional. 

https://educacaointegral.org.br/reportagens/nao-se-faz-educacao-integral-em-tempos-de-retirada-de-direitos-afirma-jaqueline-moll/ 3/6
28/10/2021 19:11 “Não se faz educação integral em tempos de retirada de direitos”, afirma Jaqueline Moll - Centro de Referências em Educaç…

Ele também tinha o mérito de ter sido construído a partir de muito diálogo,
algo inédito nas políticas educacionais lá em 2007. Foi a partir dessas
discussões que semeamos nos territórios essa outra perspectiva de educação,
necessária para o mundo contemporâneo.

Já o Novo Mais Educação só usa o nome, sem compromisso algum com a


agenda do que ele significa. Se antes tínhamos a perspectiva de direitos de
aprendizagem e desenvolvimento, vieram as expectativas de aprendizagem, o
que depois gera essa Base Nacional Comum Curricular (BNCC). 

Essa Base, inclusive, não muda nada na escola brasileira, só retira autonomia e
autoria dos professores. Esses educadores passarão a ter novos livros
didáticos guiados por novas provas a serem aplicadas para os estudantes. 

É preciso que a escola retome a perspectiva de qual é seu projeto, de qual


formação humana se almeja, e não é uma lista de conteúdos que desenvolve
isso. Ela pode até dar elementos para o desenvolvimentismo intelectual, mas
o intelectual sem desenvolvimento moral, ético e estético é um desastre.

CR: Vê oportunidades de retomada dos projetos de


educação integral em um horizonte próximo? 

JM: É preciso discutir a renovação do Fundeb, que foi proposto por Anísio
Teixeira nos anos 1940, e que visa diminuir um pouco as diferenças entre os
estados da federação, para garantir algo de base na educação. Também temos
que avançar no Custo Aluno-Qualidade.

Precisamos de um compromisso da reconstrução da democracia, porque


nosso país não vive uma normalidade democrática. E isso passa por
retomarmos essa memória da educação, por dialogarmos com esse passado,
com as pessoas que ajudaram a construir a base da educação integral. 

Mas não tenho nenhuma expectativa de isso aconteça em breve. Ainda vai
piorar muito antes de começar a melhorar. E vai depender de todos, da
https://educacaointegral.org.br/reportagens/nao-se-faz-educacao-integral-em-tempos-de-retirada-de-direitos-afirma-jaqueline-moll/ 4/6
28/10/2021 19:11 “Não se faz educação integral em tempos de retirada de direitos”, afirma Jaqueline Moll - Centro de Referências em Educaç…

capacidade de diálogo, da verdade presente nessa proposta de construir uma


sociedade em que todos caibam.

COMENTÁRIOS COMENTÁRIOS VIA FACEBOOK

CLIQUE AQUI PARA COMENTAR

ANÍSIO TEIXEIRA E A
DEMOCRATIZAÇÃO DA ESCOLA
BRASILEIRA

LEIA MAIS

LEIA TAMBÉM

Novo Mais Educação VEJA MAIS

“Não temos um único método de alfabetização”, diz VEJA MAIS


professora de Sobral (CE)
https://educacaointegral.org.br/reportagens/nao-se-faz-educacao-integral-em-tempos-de-retirada-de-direitos-afirma-jaqueline-moll/ 5/6
28/10/2021 19:11 “Não se faz educação integral em tempos de retirada de direitos”, afirma Jaqueline Moll - Centro de Referências em Educaç…

Livro reúne materiais de formação e mobilização de VEJA MAIS


jovens pelo direito à educação

CENTRO DE REFERÊNCIAS EM EDUCAÇÃO INTEGRAL


Conheça os idealizadores e parcerias da iniciativa aqui.

https://educacaointegral.org.br/reportagens/nao-se-faz-educacao-integral-em-tempos-de-retirada-de-direitos-afirma-jaqueline-moll/ 6/6

Você também pode gostar