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Podcast
Disciplina: Teoria psicanalítica e problemáticas da atualidade
Título do tema: Psicanálise e gênero
Autoria: Allan Waki de Oliveira
Leitura crítica: Carla Priscila da Silva Pereira

Olá ouvinte! No podcast de hoje iremos comentar como a cultura


(contemporânea, no caso) pode “colonizar” o indivíduo, ou seja, influenciar
suas diferentes formas de subjetivação.

Jacques Lacan, psiquiatra e psicanalista francês, propôs uma psicanálise


diferente (e não contraposta) àquela criada por Freud. Este imaginava a
psicanálise como um método de exploração do inconsciente, que se utilizava
de técnicas (como a associação livre e a atenção flutuante, por exemplo) para
buscar as origens do sofrimento do indivíduo.

Lacan, por sua vez, propõe a psicanálise como uma ciência, argumentando (e
atualizando) que o inconsciente é estruturado em linguagem. Nesse sentido,
Lacan orienta o fato de que, antes mesmo do nascimento do indivíduo, a
linguagem é carregada de sentidos sociais e culturais, os quais, são impostos a
ele sem uma possibilidade de anterior aceite ou reflexão.

Suponhamos, então, por exemplo, uma criança nascida dentro de um regime


totalitário teocrático, que imponha, por exemplo, uma superioridade hierárquica
do homem à mulher, bem como determine a esta um padrão cultural e estético
diferente daquele seguido pelos homens (uso de roupas que cubram todo o
corpo, por exemplo).

A referência cultural desta criança (realizada através da linguagem), irá


“colonizar” sua subjetividade, impondo a ela todo um padrão de pensamentos e
comportamentos semelhantes àqueles do lugar em que nasceu. Assim,
vivendo neste contexto, dificilmente o indivíduo terá outra possibilidade de
pensamento crítico ou de subjetivação (a não ser que seja exposto a outras
culturas e formas de pensamento diferentes).

Este é um aspecto cultural que influencia a formação do indivíduo. Mas


poderíamos pensar: e o que fazer com o desejo deste?

Neste contexto, mesmo que a orientação do desejo da pessoa se mostre


desviante dos padrões socialmente aceitos (a homossexualidade, por
exemplo), dificilmente o indivíduo irá exprimi-lo (ou seja, irá demonstrar a
orientação de seu desejo). Essa dualidade de se subjetivar de uma maneira,
encontrando obstáculos sociais à sua forma singular de expressão pode levar
ao sofrimento.

Dessa forma, é possível se verificar a complexidade da origem do preconceito?


Por um lado, temos indivíduos que não conseguem se libertar de um tipo de
discurso dominador (no exemplo dado, do regime totalitário teocrático) e assim,
inconscientemente, oprimem todos aqueles que pensam de forma diferente.

De outro lado, aqueles que manifestam sua orientação desejante de forma


contrária à cultura, sofrem por não poder dizê-lo abertamente.

Freud mesmo dá um exemplo de como isso pode acontecer dentro da cultura


ocidental: em 1935, recebe uma carta de uma mãe, questionando-o sobre a
possibilidade de tratar seu filho homossexual. O psicanalista responde a carta
desta senhora dizendo que a homossexualidade não é uma doença, um crime
ou algo que possa lhe trazer vergonha. Esta carta foi publicada, originalmente,
em 1951 no American Journal of Psychiatry.

Explica que em outras culturas, muitos indivíduos notáveis foram


homossexuais (cita Platão, Michelangelo e Leonardo da Vinci) e diz que se a
ajuda que ela procura era a possibilidade de transformar a homossexualidade
em heterossexualidade, a resposta da psicanálise seria negativa.

O que Freud dizia poder fazer em favor de seu filho era verificar se este era
infeliz, se tinha conflitos, uma vida social inibida, tal como qualquer pessoa e,
nesse caso, talvez a análise pudesse lhe trazer algum conforto e ser pertinente
o tratamento.

Neste caso, não podemos dizer, necessariamente, que a mãe que buscou
Freud era preconceituosa, pois talvez, esse fosse o único pensamento possível
que a cultura permitiu que ela fizesse. Podemos considerar, hipoteticamente,
por outro lado que a mãe tivesse notado algum tipo de infelicidade em seu filho
e buscasse ajuda, mas não fosse capaz de distinguir que o sofrimento do filho
poderia ser algo diferente daquilo que nomeou de homossexualidade.

Este foi nosso podcast de hoje! Até a próxima!

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