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Sessão 5 - Saúde do trabalhador, Andrezza

OBJETIVOS:

- Compreender trabalho informal, precário e uberização.

Trabalho informal, por definição, é aquele exercido por trabalhadores que não possuem
vínculos com uma empresa, não obtendo, dessa forma, direito aos benefícios e proteções
sociais. Devemos ressaltar que essa forma de contratação é desvantajosa para os
trabalhadores, pois o mesmo fica desprovido de benefícios que são garantidos por lei, como
vale-refeição, vale-transporte dos direitos previstos na CLT – Consolidação das Leis do
Trabalho. Convém acrescentar que dentro dessa modalidade de contratação, não há
carteira assinada, assim como não existe um contrato de trabalho, tal fato acaba por
desamparar o trabalhador de seus direitos.

Destacamos também que uma porcentagem significativa da população brasileira vive na


informalidade. De acordo com dados da PNAD Contínua do IBGE em pesquisa realizada no
ano de 2017, o número de pessoas que trabalham sem carteira assinada, ou seja, por conta
própria, alcança a marca de 34,2 milhões de pessoas, cerca de 37,1% do total de pessoas
ocupadas de acordo com o instituto, que é de 92,1 milhões de pessoas. Trata-se de um
setor em crescimento, cuja atividade é desenvolvida principalmente nas grandes cidades,
visto que elas propiciam essa dinâmica.

Podemos ressaltar também que um dos principais fatores para o surgimento e o


crescimento dessa modalidade de emprego, principalmente nos grandes centros urbanos,
por conta do seu dinamismo, são os altos índices de desemprego. De acordo com o IBGE,
a taxa de desemprego é de 12,7%.

O perfil dos trabalhadores considerados informais não é constante. As pessoas tanto podem
ter menos como mais escolaridade. De acordo com Bettiol (2010), na literatura sobre o
tema, os trabalhadores informais não são valorizadas e podem sofrer preconceito, ou seja,
há a tendência a serem vistos como forma negativa no âmbito da análise econômica, por
esse estar situado a margem do processo, e não ser núcleo estruturante da dinâmica
capitalista. No entanto, devemos destacar que há quem qualifique essas pessoas como
empreendedoras, pelo fato de encontrarem, em algumas situações, oportunidade de
idealizar projetos de forma mais ou menos autônoma.

Trabalho precário:
O crescimento do trabalho precário tem surgido como uma preocupação contemporânea
central no mundo inteiro desde os anos de 1970. Por “trabalho precário” quero dizer
trabalho incerto, imprevisível, e no qual os riscos empregatícios são assumidos
principalmente pelo trabalhador, e não pelos seus empregadores ou pelo governo.
Exemplos de trabalho precário incluem atividades no setor informal e empregos temporários
no setor formal. O trabalho precário não é novidade e existe desde o início do trabalho
assalariado. O trabalho precário tem consequências de longo alcance, atravessando muitas
áreas que preocupam cientistas sociais, bem como trabalhadores e suas famílias, governos
e empresas. Isso criou insegurança para muitos, e afeta de modo difuso e amplo não só a
natureza do trabalho, os locais de trabalho e a experiência dos trabalhadores, mas também
muitos aspectos individuais (estresse, educação) e sociais (família, comunidade) não
relacionados ao trabalho, bem como a instabilidade política. Por isso, é muito importante
entendermos os novos arranjos dos locais de trabalho que geram o trabalho precário e a
insegurança.

No Brasil, a difusão do trabalho precário aconteceu um pouco depois que nos Estados
Unidos, nos anos de 1990, com o aumento da privatização e da desregulação que
acompanharam um comprometimento a uma ideologia neoliberal e ao “Consenso de
Washington”. A pauta neoliberal também apareceu tardiamente no Brasil, em comparação
com o resto da América Latina, talvez porque já houvesse no país uma estrutura industrial
ampla e sofisticada, diferente do que era encontrado nos outros países da América Latina
(Luna e Klein, 2006).

Uberização do trabalho:

A uberização é um termo muito atual e pode ser, dentre outros contextos, atribuído ao
mundo das relações de trabalho.

No contexto trabalhista, a uberização está relacionada à venda de um serviço para alguém


ou alguma empresa de forma independente e sem o intermédio de outra empresa ou
agente (empregador). Esse modelo de prestação de serviços é tão contemporâneo quanto a
própria revolução digital o qual o mundo percorre.

A partir dos avanços tecnológicos oriundos da criação de smartphones e computadores


mais modernos, verifica-se, cada vez mais, a utilização de aplicativos digitais como fortes
prestadores de serviços que vão desde necessidades básicas, como a alimentação, até
tarefas puramente estatais, como, por exemplo, a emissão de documentos e formalização
de atos administrativos.
O termo uberização nasce justamente de um desses aplicativos, mais especificamente da
empresa Uber, fundada em 2009 e instaurada no Brasil em 2014. Essa empresa buscou
oferecer uma plataforma digital onde um motorista autônomo, chamado de parceiro, era
capaz de se conectar a um usuário do aplicativo – cliente – para prestar-lhe serviços de
locomoção.

No entanto, foi o conceito da prestação do serviço dessa empresa que serviu de pioneirismo
para designar um novo tipo de relação de trabalho.

Sob a alegação de ser uma “economia de compartilhamento”, a empresa Uber deixa claro
que não emprega nenhum motorista e não é dona de nenhum carro resumindo-se à apenas
uma plataforma tecnológica para que profissionais autônomos possam ganhar dinheiro
localizando pessoas que queiram se deslocar pela cidade.

Com o tempo, novas empresas, chamadas de startups digitais, foram sendo criadas ou
migradas para o Brasil em busca de mercados não explorados, vindo a substituir empregos
existentes que possuíssem o mesmo nicho de mercado. Exemplos disso foram a Uber em
detrimento de taxistas e o Ifood em detrimento de motociclistas motofretistas.

O baixo custo oferecido para os clientes, a facilidade na exposição do negócio para a


população e a redução considerável dos custos do serviço foram alguns dos fatores cruciais
para que o mercado passasse a substituir velhas prestações de serviços pelos serviços
tipificados por esses aplicativos intermediadores. Dessa forma, motoristas e entregadores
foram perdendo seus empregos celetistas pois os empresários consideravam mais lucrativa
as relações de trabalho sem vínculos empregatícios.

Além disso, houve forte apelo de marketing sobre os serviços prestados, oferecendo ao
consumidor inovações fáceis, rápidas e baratas. Ocorre que quando se proporciona um
benefício acima do mercado para o cliente, há, de outro lado, um sacrifício para compensá-
lo.

- Conhecer as possibilidades de cuidado para o trabalhador informal.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) esclarece que as desigualdades e


vulnerabilidades dos países em desenvolvimento estão diretamente ligadas à elevada
quantidade de trabalhadores informais nesses locais. Assim, quanto mais formalização do
trabalho, maiores as possibilidades de diminuir os índices de desigualdade social, já que
trabalhos desregulamentados são precários devido à escassez de proteção social sobre
eles (Organização Internacional do Trabalho, 2002). No Brasil, os direitos trabalhistas são
estabelecidos por meio de contratos formais de trabalho, na maioria das vezes, inseridos no
regime Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), o maior e mais reconhecido sistema de
direitos no trabalho do país.
Sobre os avanços da informalidade no Brasil, no ano de 2017, foi implementada a “Reforma
Trabalhista”, através Lei nº 13.467/2017. A lei altera 201 pontos da CLT (Brasil, 2017).
Segundo Krein (2018, p. 78), a implantação de tais mudanças teve como principal finalidade
“[...] legalizar práticas já existentes no mercado de trabalho e possibilitar um novo ‘cardápio’
de opções aos empregadores para manejar a força de trabalho de acordo com as suas
necessidades”. A Reforma Trabalhista foi aprovada no governo do presidente interino
Michel Temer, e contribui para a existência de contratos atípicos, intensificando a
precarização do trabalho.
Tradicionalmente, a atuação dos terapeutas ocupacionais junto aos trabalhadores se dá por
meio da inserção na área de saúde do trabalhador, especialmente no Sistema Único de
Saúde. Os terapeutas ocupacionais utilizam saberes e práticas específicas desenvolvidas
durante o processo de formação e compõem equipes de saúde com objetivo de prevenir
doenças nos ambientes de trabalho, realizar ações de vigilância, educação em saúde,
qualidade de vida e reabilitação profissional, privilegiando que as atividades sejam
executadas em conformidade com os desejos e possibilidades do trabalhador (Nascimento
& Souza, 2018). Entretanto, acreditamos que a desregulamentação do trabalho e suas
implicações para os trabalhadores são passíveis de diversos e novos desdobramentos para
a prática da Terapia Ocupacional.
Outras práticas que podem ser citadas são as que buscam pensar e desenvolver
estratégias que auxiliem a tornar mais digna a trajetória de vida de populações com pouco
acesso aos direitos fundamentais. Com relação às intervenções, geralmente são
direcionadas ao Sistema Único de Assistência Social (SUAS), no qual a Terapia
Ocupacional atua desde 1970 (embora suas práticas tenham sido reconhecidas como
importantes pelo Conselho Nacional de Assistência Social a partir de 2011) e às instituições
educacionais (Lopes & Malfitano, 2016). Contudo, apontamos que o trabalho informal não
está vinculado apenas à vida das pessoas de classes consideradas pobres ou minoritárias,
muito embora essas classes sejam as que vivenciam as formas de trabalho informal mais
precárias.
No que se refere aos locais de atuação e às articulações necessárias nas práticas com foco
no trabalho desregulamentado, indicamos a importância de que essas estejam vinculadas à
saúde, educação, previdência e assistência social, mas de forma necessariamente
intersetorial e articuladas com o Ministério Público do Trabalho, sindicatos, associações,
movimentos sociais e outros dispositivos que incluem as particularidades dos trabalhadores
informais como as secretarias e coordenadorias da juventude no caso de trabalhadores
jovens, por exemplo. As intervenções podem se centrar em processos de inserção e
permanência no trabalho; no acesso/informação/compreensão sobre direitos dos
trabalhadores; e na construção de projetos/trajetórias de vida mais dignas, justas e voltadas
aos desejos dos próprios sujeitos (Souza, 2020). As práticas podem ter um enfoque
individual ou coletivo, sendo a estratégia de grupos bastante utilizada neste último caso.
Assim, as entrevistas, técnicas, avaliações e reavaliações se entrelaçam às articulações
realizadas em prol da construção de projetos de vida, “[...] escuta, ao acolhimento, ao
encontro dialógico, à articulação social e em rede” .
Com relação às ações práticas gerais que poderiam ser realizadas para iniciar a construção
de atuações mais voltadas para as especificidades dos trabalhadores informais nesses
dispositivos, aponta-se como importante para as equipes: a) aproximar-se dos locais que
ocorrem esse trabalho (do âmbito privado ao espaço público); b) identificar os tipos de
trabalho informal e suas especificidades; c) identificar os diferentes perfis das populações
envolvidas nessas atividades; d) apreender as trajetórias/histórias de vida dos
trabalhadores, buscando compreender as raízes de sua inserção e permanência em
atividades informais; e) identificar junto aos trabalhadores quais as suas demandas, no
sentido de proporcionar maior bem-estar e trajetórias de vida mais dignas; f) identificar os
setores e profissões envolvidas em acolher as demandas dessa população. Apontamos que
tais questões são fundamentais para que, junto aos trabalhadores, seja possível (re)pensar
novas redes e atuações profissionais, necessárias diante da conjuntura que se apresenta
no Brasil. Entendemos que é desafiador operacionalizar as abordagens de aproximação a
esses trabalhadores, já que o trabalho informal pode não ser vinculado a instituições nem a
setores específicos. Aproximar-se do trabalho informal é aproximar-se também de
ambientes físicos diversos, que podem ser centros comerciais fechados, espaços públicos –
como as ruas da cidade – ou até mesmo casas/salas de trabalhadores que se
autodenominam autônomos, liberais ou empreendedores.
Diante de uma nova conjuntura política, econômica e social, apontamos mais uma vez
como necessário (re)pensar o próprio modo de atuar da rede de cuidado e atenção ao
trabalhador, principalmente no âmbito da saúde do trabalhador, uma vez que os modelos
convencionais não vêm se mostrando suficientes (Uchôa-de-Oliveira, 2020), sobretudo para
atender às demandas de trabalhadores informais. As práticas que alcançam trabalhadores
informalizados só deixariam de ser utópicas a partir de abordagens comunitárias, políticas e
críticas. As equipes de saúde, educação, assistência social e previdência devem estar
preparadas para compreender o trabalho como determinante social, e para se articular
intersetorialmente com o objetivo de proporcionar atuações transformativas em detrimento
das paliativas, que continuam proporcionando a manutenção das desigualdades e a
exploração do homem pelo trabalho.

- Relacionar a educação, assistência social e previdência social com o trabalho informal.

No Brasil, a contribuição previdenciária é obrigatória para a empresa, o empregador


doméstico e o trabalhador que presta serviço à empresa com ou sem vínculo de emprego,
bem como o trabalhador que exerce atividade econômica por conta própria. Entretanto,
apenas para os trabalhadores com contrato formal de trabalho decorrem os benefícios
sociais como o seguro-desemprego, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS),
além da cobertura previdenciária. No caso do empregado doméstico, o recolhimento do
FGTS é facultativo e o trabalhador por conta própria fica restrito à aposentadoria, ao seguro
acidente e a doenças (BRASIL, 2008). Baseada na solidariedade coletiva, a seguridade
social tem como fonte principal as contribuições dos empregadores, constituindo obrigação
trabalhista e previdenciária. A criação de empregos com carteira de trabalho, portanto, é
desejável como garantia de financiamento da proteção social dos trabalhadores e de suas
famílias. O crescimento do trabalho informal sem a filiação previdenciária dos trabalhadores
tem sido apontado como fator que impacta a arrecadação previdenciária.

A importância da proteção social para os trabalhadores foi estudada por Maloney (2003),
quando apresentou razões pelas quais os trabalhadores tornam-se, voluntariamente,
desprotegidos: (1) desvalorização dos benefícios previdenciários por não se submeterem
aos impostos e tributos derivados da relação de emprego, o que não ocorre no trabalho
informal, em que a remuneração é inteiramente monetária; (2) existência de pai ou cônjuge
que tenha emprego e possa garantir proteção para os demais membros da família; (3)
excesso de regulação ao provocar rigidez no mercado de trabalho, estimular a rotatividade
e encorajar os trabalhadores a deixarem seus empregos.
No caso brasileiro, a legislação do trabalho, segundo Pastore (2004), tem se revelado
onerosa e complexa, além de restrita ao trabalhador assalariado com carteira assinada. O
fato de a regulação se restringir apenas ao emprego formal resultaria em desproteção do
trabalho dos informais, bem como no impacto à base de financiamento da previdência. Os
relatos deste estudo indicam situações ilustrativas da dificuldade de adaptar as regras
previdenciárias à realidade dos trabalhadores informais pesquisados. A primeira se refere
às limitações de manter a contribuição em períodos de dificuldade financeira ou de
desemprego, como também em períodos de afastamento por doença ou acidente.
Referências:

Trabalhador informal e Previdência Social: o caso dos trabalhadores por conta própria de
Brasília-DF.
Maria Amélia Sasaki
Ione Vasques-Menezes

BETTIOL, M. T. O Trabalho Informal no Brasil: Um resgate histórico. VII Seminário de


Trabalho da Rede de Estudos do Trabalho.

A Uberização do trabalho no Brasil: desafios e perspectivas: artigo disponível no site da


justiça. JUS.COM.BR

O Trabalho Informal e as Repercussões para a Saúde do Trabalhador: Uma Revisão


Integrativa. Débora Cristina de Almeida Mariano Bernardino*; Marilda Andrade**

Terapia Ocupacional e trabalho informal: reflexões para a prática.Marina Batista Chaves


Azevedo de Souza e Isabela Aparecida de Oliveira Lussi.

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