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GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: BREVES REFLEXÕES

Valdineide Campelo Ferreira


Francélia Maria Almeida Sales

RESUMO

Apesar de toda modernidade, discutir sexualidade e gravidez na adolescência ainda


é considerado por muitos um tabu, nos deparamos ainda com comportamentos
preconceituosos em relação a ambas as temáticas. E ainda que muitos dos
adolescentes demonstrem possuir noções adquiridas em casa, em suas vivências,
em suas relações pessoais, e do que recebem pelos meios de comunicação, sobre
sexualidade, relação sexual e formas de evitar a gravidez precoce, a elevada taxa
brasileira de gestantes com menos de 17 anos, que é de 57%, só ficando atrás de
países africanos que é de 60% demonstra o quanto essas informações/noções são
frágeis ou mesmo destorcidas. Diante dessa realidade, optou-se por realizar um
estudo de caráter bibliográfico cujo conteúdo nos proporcionasse uma breve reflexão
sobre a gravidez na adolescência e como a mesma pode ser considerada uma
questão social. O suporte teórico foi construído a partir dos escritos de estudiosos da
temática, dentre os quais se destacam: Bonfim (2012), Dadoorian (2000), Farias
(2020), Louro (2018), Rafat (2020). Constata-se que a informação e o conhecimento
são elementos fundamentais para impossibilitar uma gravidez precoce, assim
formando cidadãos responsáveis e conscientes de suas responsabilidades, e com
isso fazê-los respeitar a diversidade de valores, tabus, crenças e comportamentos
relativos à sexualidade, reconhecendo e respeitando as diferentes formas de atração
sexual e o direito a expressão garantida à dignidade do ser humano.

Palavras-chave: Gravidez. Adolescência. Sexualidade.

INTRODUÇÃO

Apesar de toda modernidade, discutir sexualidade e gravidez na


adolescência ainda é considerado por muitos um tabu e, existindo certo preconceito
em relação a ambas as temáticas, mesmo a abordagem encontrando respaldo em
várias áreas de conhecimento como: biologia, história, medicina, pedagogia,
psicologia, sociologia, entre outras.
De acordo com Louro (2018) a sexualidade é algo dado pela natureza,


Graduada em Pedagogia pelo Centro Universitário Maurício de Nassau – Fortaleza.CE – E-mail:
valdineide.campelo@gmail.com.

Mestra em Educação Profissional em Saúde pela Escola Politécnica Joaquim Venâncio/FIOCRUZ
(RJ). Docente do Centro Universitário Maurício de Nassau – Fortaleza.CE – E-mail:
fran2429@hotmail.com.
1

inerente ao ser humano. Em outras palavras, é uma formação integrada na natureza


do ser humano. Com isso, é percebível que não se pode separá-la de outros
aspectos pertinentes a vida. É compreensível que na adolescência a experiência da
sexualidade seja um dos tópicos mais importantes e problemáticos a serem
abordados, pois, muitas vezes, experiências sem proteção pode colocar o
adolescente diante de uma gravidez precoce.
Ainda que muitos dos adolescentes demonstrem possuir noções adquiridas,
sejam elas advindas do convívio familiar, das suas vivências e relações pessoais, ou
do que absorvem pelos meios de comunicação, sobre sexualidade, relação sexual e
formas de evitar a gravidez precoce, a elevada taxa brasileira de gestantes com
menos de 17 anos, a qual é de 57%, conforme notícia publicada em setembro do
corrente ano, pela Agência Brasil, só ficando atrás de países africanos que é de 60%
(AGÊNCIA BRASIL, 2022), demonstra o quanto essas informações/noções são
frágeis ou mesmo distorcidas.
Nesse sentindo, entendemos que falar francamente com os adolescentes,
transmitindo informações corretas sobre sexualidade e relação sexual antes que se
tornem sexualmente ativos, pode contribuir para minimizar a ocorrência de gravidez
na adolescência. Ainda que alguns prefiram não falar abertamente sobre esse tema,
acreditamos que o mesmo pode e deve ser tratado por família e escola, sem
desconsiderar essa realidade, possibilitando reflexões e debates, sobre essas
questões. Ambas, precisam tratar da sexualidade como algo fundamental na vida
das pessoas, mesmo sendo uma questão ampla e polêmica, marcada pela história,
pela cultura e pela evolução social.
Importante, ainda ressaltar nosso entendimento que a escola ao realizar o
seu processo de intervenção pedagógica relacionada a essa temática, ao apresentar
informações e problematizar questões relacionadas à sexualidade, incluindo
posturas, crenças, tabus e valores a ela associados, deve fazê-lo sem invadir a
intimidade, nem direcionar o comportamento dos alunos, ainda que não se possa
fugir à discussão de diferentes pontos de vista associados à sexualidade, sem a
imposição de valores. Em nenhuma situação cabe à escola julgar a educação que
cada família oferece aos seus filhos.
O exposto até o momento nos incitou a realização de um estudo reflexivo
sobre o assunto, ao tempo que nos fez perceber a relevância de refletir sobre
questões que se encontram ligadas diretamente a temática, partindo do
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questionamento: a gravidez na adolescência deve ser percebida como uma questão


social que precisa ser discutida pela família, escola, e, por toda a sociedade?
No decorrer das pesquisas e reflexões foram surgindo outros
questionamentos como: o que é adolescência e quais os seus desafios? O que se
entende por sexualidade? Como deve se processar a relação, escola, adolescência
e gravidez?
Nessa perspectiva, optou-se por realizar um estudo de caráter bibliográfico
tendo como finalidade uma breve reflexão sobre a gravidez na adolescência como
uma questão social.

1 A ADOLESCÊNCIA E SEUS DESAFIOS

O Que é a Adolescência?

Diversas questões surgem quando evocamos esse conceito. Será uma fase
meramente definida pela idade? Um período de indefinições, questionamentos e
confrontos frente à cultura? Ou apenas um processo de mudanças hormonais e
fisiológicas que ocasiona transformações no corpo infantil? É, portanto, perceptível
que o conceito de adolescência perpasse por diferentes aspectos, áreas e contexto.
O senso comum nos ensina que a adolescência é uma fase do
desenvolvimento humano comum a todas as pessoas, independentemente das suas
condições sociais, esse período do desenvolvimento humano é utilizado para
designar a etapa de transição entre vida infantil e a vida adulta. Pais, educadores,
profissionais da área da saúde, apropriam-se do termo adolescente para explicar os
acontecimentos específicos deste período da vida, como se esta fosse vivenciada,
indistintamente, por jovens de quaisquer seguimentos (UNFPA, 2017).
Segundo a Organização Mundial de Saúde, a adolescência compreende um
período entre os 10 e 19 anos, sendo a juventude o intervalo entre os 15 e os 24
anos, ambos desencadeados por mudanças corporais e fisiológicas advindas da
maturação fisiológica. No Brasil o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
reconhece como adolescência o momento que estende dos 12 aos 18 anos – Lei n°.
8.069/1990 (BRASIL, 1990).
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Para Zagury (2009), a partir da adolescência, ocorrem fenômenos de


natureza biológica de grande importância na vida do indivíduo. A reorganização
hormonal e subsequente reestruturação anátomo-fisiológica têm como resultado um
novo corpo de homem ou de mulher, dotado de novas sensações e da capacidade
de reprodução.
Desta forma a adolescência tem um aspecto biológico universal,
caracterizada pelas modificações visíveis, tais como: o crescimento de pelos
pubianos, o aumento da massa corporal, desenvolvimento das mamas, evolução do
pênis, menstruação, etc. Estas mudanças físicas costumam caracterizar a
puberdade, que neste caso seria um ato de natureza biológica natural.
Dentro desse contexto, apesar das características próprias da adolescência
variarem de forma cultural, social e individualmente, apresentam um eixo comum: as
transformações corporais e a aquisição da identidade pessoal, construídas pelas
experiências de autoconhecimento, não se tratando somente de um período
homogêneo. Os adolescentes têm como aspiração maior a satisfação de suas
necessidades fisiológicas, regidas em sua maioria, pela busca de prazeres, sendo
que a percepção do prazer varia de pessoa para pessoa, de acordo com sua história
e seu contexto sociocultural.
Jensen e Nutt (2016), afirma haver muito tempo, uma das principais
áreas de concentração do estudo da puberdade são os hormônios, sendo eles os
responsáveis, na visão de pais e educadores, por tudo de “errado” que ocorre no
comportamento dos adolescentes.
Posto isto, esta divergência dificulta, as relações entre adultos e
adolescentes, sendo comum que os adultos venham a se referir aos adolescentes
como “aborrecentes”, sob a prerrogativa de que eles reclamam só por reclamar ou
por culpa são dos hormônios. Estereótipos esses que contribuem negativamente,
pois, a partir deles, os adultos desqualificam as ideias e opiniões desse grupo,
dificultando ainda mais o diálogo.
A chegada da adolescência, conforme o autor, é um momento de constante
oscilação, marcado por transformações biológicas, psicológicas e das diferentes
formas de inserção social. Essas transformações são experimentadas pelos
adolescentes de diferentes maneiras conforme o contexto social e cultural
(SANTROCK, 2014).
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Sexualidade na Adolescência

Cruz (2010) descreve que o conceito de sexualidade é algo maior do que


somente a reprodução, é uma extensão da vida do ser humano, sofrendo grandes
alterações ao longo do tempo. É uma energia vital que nasce e persiste com o ser
humano até a morte. Essa função está responsável pela reprodução da espécie,
transcendendo os aspectos biológicos, como um fenômeno psicológico e social.
Conforme a Organização Mundial de Saúde – OMS (2017) o tema
sexualidade é compreendido como a inclusão de informações adequadas para a
faixa etária de cada indivíduo, na qual estas informações sejam cientificamente
comprovadas e precisas sobre a saúde sexual e a sexualidade, obtendo informações
como um aspecto da vida humana, mas que também informe questões de não
discriminação e sobre tudo equidade, tolerância, segurança e respeito, como direito
de todos. Na adolescência a sexualidade, tem uma dimensão especial, porque é
nessa fase evolutiva que se manifestam à capacidade reprodutiva do ser humano e
a configuração de informações sobre sentimentos e identidades de gêneros (OMS
2017).
Rafat (2020) se refere à sexualidade como um filtro social que limita os
indivíduos, afetado pela intervenção da sociedade, impossibilitando separar o
conceito de sexualidade das expectativas de cada sociedade, sendo esta
responsável por emitir mensagens conflitantes sobre a sexualidade, permitindo que
as crianças e adolescentes sejam bombardeados pelos estímulos erotizantes da
mídia, enquanto os adultos passam a possuir grandes dificuldades em abordar esse
tipo de assunto com os jovens. Portanto, é possível dizer que diante dessa realidade
o adolescente depara-se com uma pluralidade de normas, valores e crenças, muitas
vezes, divergentes entre si.
Os Parâmetros Curriculares nacionais para o Ensino Fundamental (BRASIL,
2001), através dos temas transversais, se propõem a complementar à educação
familiar, contribuindo decisivamente para a superação dos novos desafios que se
apresentam ao adolescente para o exercício de uma sexualidade saudável.
Freud (2011) ao abordar o sentimento de culpa e conflitos sobre a
sexualidade, nas suas investigações acerca das neuroses, descobriu que grande
parte de pensamentos e desejos reprimidos diziam respeito a conflitos de ordem
social e familiar, centrados nos primeiros anos de vida dos indivíduos. Na infância
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estavam centradas as experiências de caráter traumático, reprimidos, que


configuravam como origem dos sintomas atuais. Sendo possível afirmar que as
ocorrências deste período de vida deixam marcas profundas na estruturação da
personalidade sexual dos jovens.
Desde o nascimento, cada pessoa recebe uma educação espontânea dada
continuamente pela família e pelo meio social no qual está inserido. Essa educação
formativa inicia-se com a família, intermediária entre a sociedade e o indivíduo, e
complementada com meio cultural, que contribui na formação das suas atitudes
básicas relacionadas à sexualidade.
Para Ribeiro (2020), a autenticidade e humanização das informações a serem
repassadas para os jovens, depende do cumprimento adequado da tarefa social de
educar crianças e adolescentes, para uma vida sexual plena.
A educação formativa ou informativa se torna muitas vezes insuficiente,
contraditória ou mal assimilada, pelos adolescentes que na maioria das vezes não
se acham preparados para tomar decisões, principalmente relacionadas à sua
sexualidade, desencadeando situações de riscos, tais como: aquisição de doenças
transmitidas sexualmente, experiências pouco prazerosas, e uma gravidez não
desejada. Sendo essa última, uma das situações mais comuns e que na atualidade
defende-se seja discutida na escola, conforme veremos no tópico seguinte.

2 ESCOLA, ADOLECÊNCIA E GRAVIDEZ

Apesar de todas as transformações físicas que acompanha os adolescentes,


não podemos definir uma idade correta, além do fato de que tais definições
dependerem do momento histórico, do contexto social e da própria trajetória familiar
e individual de cada, apresentam-se aqui diferentes aspectos da condição juvenil
com objetivo de fornecer elementos que contribuam com os professores na criação
de projetos, no qual possam orientar corretamente sobre a sexualidade no âmbito
escolar, sem personalizá-las, facilitando essa fase de turbulência emocional.

A Orientação Sexual na Escola

Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs orientam trabalhar o conteúdo


sobre sexualidade em todo o ciclo escolar. Porém, de acordo com Bonfim (2012), o
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temor de falar sobre sexo revela que a sexualidade é tratada no cotidiano escolar de
forma escamoteada, uma vez que muitas escolas abordam esta temática por meio
de várias disciplinas, ou seja, da transversalidade, assim:

É possível verificar que muitas escolas ensinam somente a constituição


anatômica das genitálias masculina e feminina, com suas funções
biológicas e reprodutivas, acreditando exercer integralmente uma educação
sexual. No entanto, a educação repressiva e culturalmente ligada ao pecado
que nossos antepassados recebiam (e muitos ainda recebem) fez e faz com
que muitas pessoas não vivenciem sua sexualidade de maneira tranquila e
prazerosa, consolidando, ao contrário, uma visão quase que somente
voltada à reprodução da espécie. Os modelos educacionais, dentre os quais
o escolar, ao abordarem em sua maioria apenas a vertente biológico-
higienista, não ficam muito longe desse tipo de educação sexual, muitas
vezes mais confundindo do que orientando, pois não mostram a quão
significativa é a dimensão da nossa sexualidade (BOMFIM, 2012, p. 37).

Ao dialogar sobre a orientação sexual, a escola pode e deve contribuir com a


discussão sobre a sexualidade, orientando e dialogando com os jovens para que
estes assumam um posicionamento próprio. É necessário ressaltar que a
sexualidade é inerente ao ser humano e está presente em todos os atos da vida do
indivíduo, inclusive na escola, expressando-se com singularidade em cada sujeito,
seja nos gestos, comportamento ou ações. Qualquer discussão envolvendo a
orientação na escola deve abordar além da prevenção das DST, da orientação dos
métodos contraceptivos, assuntos como autoestima, afetividade, respeito,
individualidade, identidade de gênero, considerando os interesses dos estudantes.
Os PCN (2001, p. 299), declaram que:

Cabe à escola abordar os diversos pontos de vista, valores e crenças


existentes na sociedade para analisar o aluno a construir um ponto de auto-
referência por meio da reflexão. Nesse sentido, o trabalho realizado pela
escola, denominado aqui orientação sexual, não substitui nem concorre com
a função da família, mas a completa. Constitui um processo formal e
sistematizado que acontece dentro da instituição escolar, exige
planejamento e propõe uma intervenção por parte dos profissionais da
educação.

A orientação sexual deve primar pela problematização e argumentação,


oportunizando ao educando, múltiplas abordagens diante das temáticas escolhidas,
lhe permitindo eleger e construir concepções, coletiva e individualmente. Ao definir
seu projeto educativo, a instituição deve considerar a coerência e identificação com
seus princípios, a condução e o envolvimento de toda a comunidade escolar. Os
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princípios nortearão a postura diante dos assuntos relacionados à sexualidade, as


suas protestações escolares, e as escolhas das temáticas a serem trabalhadas com
os discentes.
A escola, ao conceder informações inteiradas do ponto de vista científico,
possibilita ao estudante desenvolver comportamentos coerentes com os valores que
ele próprio elege como seus (BRASIL, 2001).
É importante que o reconheça as curiosidades manifestadas por parte dos
adolescentes sobre esse tema, estabelecendo uma postura ética e mantendo uma
relação de segurança e respeito ao debater as perguntas expostas em sala de aula,
pois essas informações fazem parte do processamento de evolução.

A Postura dos Educadores Frente à Orientação Sexual

Bonfim (2012) aponta serem necessárias modificações nos cursos de


formação para professores, visando intervenções mais conscientes e esclarecedoras
acerca dessa temática. É indispensável que o docente tenha acesso a formações
específicas sobre a abordagem de temas ligados a sexualidade com os
adolescentes no ambiente escolar, viabilizando uma postura profissional e empática
no contato com o assunto.
Nesse sentido, defende-se que os educadores necessitam de espaços
propícios para o diálogo aberto, onde possam expor as suas próprias dificuldades
diante do tema, questões teóricas, leituras e discussões.
Conforme os PCN (2001, p. 302):

É necessário que os professores possam reconhecer os valores que regem


seus próprios comportamentos e orientam sua visão de mundo, assim como
reconhecer a legitimidade de valores e comportamentos diversos do seu.

Circunstâncias mais adequadas para a disseminação do conhecimento, de


maneira clara e sem a imposição de valores preconceituosos ou preestabelecidos,
permitem que o professor traga para o ambiente de argumentação valores
democráticos e plurais, primando pela equidade em reação as questões ligadas ao
gênero e a valorização da dignidade de cada indivíduo. Consequentemente, os
propósitos coletivos serão obtidos.
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Ao abordar assuntos ligados os órgãos reprodutores, é indispensável à


discussão sobre os devidos cuidados com a higiene pessoal, sendo de grande
relevância agir com responsabilidade, para se precaver das doenças sexualmente
transmissíveis e de uma gravidez precoce.
A sexualidade diz respeito a individualidade de emoções, que precisam ser
compreendidas e respeitadas por todos. Inclui também ideologias e padrões, com
ligação direta com determinado momento sociocultural e histórico, tendo um papel
determinante no comportamento de cada pessoa, não podendo ser dispensado ao
dialogar sobre esse assunto com os adolescentes (BONFIM, 2012).
Partindo dessa realidade, entendemos que ao docente cabe a função de
mediador e contestador nos momentos de debate, nos quais os discentes trarão a
tona os seus preceitos a respeito da sua própria sexualidade com o grupo,
adquirindo consciência do seu papel numa comunidade que integrar a diversidade.

Relação Escola e Familiares

A escola comunicará a comunidade escolar, a todo o corpo docente e aos


familiares dos estudantes a respeito da inclusão de tema relacionado à orientação
sexual no currículo, complementando o ensinamento transmitido por cada família,
esclarecendo os princípios conduzidos pelo projeto (BRASIL, 2001).
É de extrema importância o diálogo entre a escola e as famílias, garantindo
que a temática deixe de ser um tabu e se torne um objeto de argumentação nos
diferentes ambientes, possibilitando uma troca entre os coordenadores e os pais. O
apoio dos familiares aos projetos desenvolvidos junto aos alunos, torna-se
consideráveis para o êxito de uma boa orientação.
Conforme os PCN’s (2001), não compete a escola, em hipótese nenhuma,
julgar como certo ou errado a instrução que cada família oferece. A responsabilidade
da escola é abrir espaço para a diversidade de concepções, princípios e teorias
sobre a sexualidade. Cabendo a ela o cuidado de zelar pelo respeito sobre a
diversidade proposta por cada família.
Diversas famílias constroem as suas histórias e desenvolvem as suas crenças
e valores, decerto muito diferente umas das outras, embora possam receber
influências culturais parecidas. Entender, acolher, respeitar e refletir sobre a
diversidade de pensamentos beneficiará a organização escolar e familiar no
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desenvolvimento de pensamentos críticos relacionados ao processo de orientação


sexual.

3 GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: UMA QUESTÃO SOCIAL

No Brasil, segundo a Situação da População Mundial do Fundo de População


da ONU, a taxa de fecundidade geral que engloba diversas faixas etárias é baixa, de
1,7 filhos por mulher, se comparada à média mundial que é de 2,5 filhos. Quando
analisamos a fecundidade específica na adolescência, no entanto, o país está acima
da média mundial. São 53 adolescentes para cada grupo de mil gestantes, enquanto
no mundo são 41 adolescentes para cada grupo de mil gestantes. Tais dados
demonstram um rejuvenescimento da fecundidade, à medida que 19 mil
nascimentos ao ano são de adolescentes entre 10 a 14 anos (UNFPA, 2021).
Não por acaso, a gravidez na adolescência tem sido considerada, quase
sempre, como um problema social, marcada por um discurso geralmente alarmante,
associado os aspectos negativos que podem ocorrer com a adolescente e seu bebê.
Apesar da redução dos índices de gravidez na adolescência, no Brasil os números
continuam elevados (UNFPA, 2021).
Nesse sentido, as colocações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP,
2022) ao revelar que no Brasil uma, a cada cinco mulheres será mãe antes do fim da
adolescência, sendo um grande número dessas gestações não desejadas,
confirmam o posicionamento sustentado pelo Fundo de População das Nações
Unidas – UNFPA (2021) de que os índices de gravidez precoce, são mais elevados
entre adolescentes de menor renda e com baixa escolaridade, uma vez que os
adolescentes têm a sua iniciação sexual cada vez mais jovem. Essa evolução leva a
várias consequências nas suas vidas, principalmente a uma gravidez de risco.
Farias et al. (2020) alega que a gestação nessa faixa etária é uma das
principais causas de prematuridade dos partos e do não desenvolvimento adequado
do feto, colocando em risco tanto a vida da gestante quanto a do bebê.
Apesar do governo brasileiro continuar a promover diversos programas
visando melhorar a saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes, com foco nas
adolescentes grávidas (FEBRASGO, 2022), não se tem dúvidas da necessidade de
debater temas como esses para o bem-estar social.
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Importante se faz, ainda, ressaltar a nossa concordância com a UNFPA ao


destacar que a gravidez na adolescência é multicausal, e que a sua etiologia está
relacionada a uma série de aspectos que podem ser agrupados em: fatores
biológicos, de ordem familiar e sociais.

Fatores biológicos

A cada dia mais adolescentes engravidam em faixas etárias cada vez mais
precoces, desde a idade do advento da menarca até o aumento do número de
adolescentes gestantes na população geral. A significativa diminuição da idade na
qual a menarca ocorre tem sido apontada como um dos fatores para o aumento da
fecundidade, fazendo com que as mulheres tenham capacidade reprodutiva
precocemente (UNFPA, 2021).
Ferreira (2013), observa que a idade em que ocorre a menarca tem se
adiantado, marcando o estágio da maturação uterina e anunciando o
desenvolvimento do corpo para a reprodução, mas não indica que o corpo
totalmente desenvolvido para a execução dessa função. Desta forma, muitos
adolescentes necessitam de apoio de adultos, para aprenderem a lidar com as
mudanças que ocorrem no seu corpo, sendo a menarca uma das últimas análises, a
resposta orgânica que reflete a interação dos vários segmentos do eixo
neuroendócrino feminino. Quanto mais precocemente ocorrer, mais exposta estará a
adolescente a gestação.

Fatores de ordem familiar

É nas classes econômicas mais desfavorecidas onde se pode observar um


maior abandono e desinformação, menor acesso à contracepção, por consequência
ocorrendo uma considerável incidência de gestações na adolescência (UNFPA,
2021).
Conforme Dadoorian (2000), o contexto familiar tem relação direta com a
época em que se inicia a atividade sexual. Os adolescentes que iniciam a vida
sexual precocemente ou engravidam nesse período, geralmente vem de famílias
cujas mães também vivenciaram situações semelhantes durante a sua adolescência.
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Nesta circunstância, quanto mais jovens e imaturos os adolescentes, maiores


as possibilidades de desajustes e desagregações, podendo ocorrer no ambiente
familiar, pois esses adolescentes não têm perspectivas para o futuro a longo prazo,
se resumindo apenas a um futuro imediato após o nascimento, como trabalhar para
sustentação do filho (DADOORIAN, 2000).

Fatores Sociais

Para Santos et al. (2018) além dos riscos para a saúde, a gravidez na
adolescência, também apresenta consequências sociais importantes como o
abandono dos estudos, diminuição do padrão de vida, e como resultado alteração no
futuro em relação a projetos profissionais.
A religião tem um grande desempenho na sociedade, pois alguns
profissionais que trabalham com esses jovens, tiveram a impressão de que as
adolescentes que frequentam as igrejas iniciam a prática sexual mais tardiamente
(GUIMARÃES, 2001).
Nesse cenário as atitudes individuais dos adolescentes são condicionadas
concomitantemente pela sociedade e pela família. No entanto, a postura adotada
entre as religiões tem participação importante como prenunciadora de atitudes
sexuais.
Segundo os PCN (2001) a escola tem um papel importante tendo o dever de
informar, problematizar e debater os diferentes tabus, preconceitos, crença e
atitudes existentes na sociedade, buscando não a inserção total. Ressaltando a
importância significativa e eficiente do envolvimento da comunidade, professores e
familiares para buscar, identificar e aplicar meios que favoreçam um diálogo
esclarecedor desse tema aos nossos adolescentes, por meio de uma abordagem
reflexiva, enfatizando as causas e consequências de uma gravidez não programada.
Dentro deste contexto, a discussão do assunto, seja no ambiente escolar ou
familiar, proporcionará avanços progressivos que levam os nossos jovens a entender
os seus riscos e as diversas formas existentes para proteção e prevenção eficazes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
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O presente estudo, ao abordar a temática da gravidez na adolescência, o traz


como uma questão social, que demanda posicionamento em favor de
transformações que garantam a dignidade e a qualidade de vida, previstas pela
Constituição Federal Brasileira.
Assim como indicação por lei, a abordagem da sexualidade no âmbito
educacional precisa ser clara, simples, direta, ampla para não reduzir a sua
complexidade, flexível para permitir o atendimento a conteúdos e situações diversas,
e sistemáticas para possibilitar aprendizagem e desenvolvimento crescente.
Compactuando por meio do diálogo, da reflexão e da possibilidade de
reconstruir as informações, pautando-se sempre pelo respeito a si próprio e ao outro,
o aluno será oportunizado a transformação ou reafirmação de concepções e
princípios, construindo de maneira significativa a sua escala de valores.
As manifestações da sexualidade, diferem em cada etapa do
desenvolvimento, proporcionando excelentes oportunidades para que os professores
desenvolvam um trabalho não previamente programado. A sexualidade gera nos
alunos, grande variedade de sentimentos, sensações e dúvidas. Suas manifestações
são espontâneas e inevitavelmente, exigindo dos professores uma preparação para
lidar com as mais diversas situações.
Os temas polêmicos ligados a sexualidade abrangem uma compreensão
ampla da realidade, demandam estudo, são fontes para reflexão e desenvolvimento
do pensamento crítico, portanto, exigem maior preparo de professores e alunos. É
importante, porém, que a escola possa oferecer um espaço específico dentro da sua
rotina escolar para essa finalidade.
Com isso, a escola estará contribuindo para que os discentes possam
desenvolver e exercitar a sua sexualidade com prazer e responsabilidade. Vinculam-
se as atividades da cidadania enquanto propõe o desenvolvimento do respeito a si e
ao outro, contribuindo para garantir direitos e deveres básicos a todos, como a
saúde, a informação e ao conhecimento. Elementos fundamentais para estruturação
de cidadãos responsáveis e conscientes das suas competências.
A escola deve buscar, junto aos familiares, estratégias para suscitar nos
alunos o respeito a diversidade de valores, crenças e comportamentos relativos à
sexualidade, reconhecendo e respeitando as diferentes formas de atração sexual e o
direito a expressá-las, garantindo assim a dignidade do aluno.
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Deve-se compreender que a busca do prazer é um direito e uma dimensão da


sexualidade humana. Conhecer o seu próprio corpo, valorizando e cuidando da
saúde, é condição primordial para usufruir do prazer sexual.
Orientar sobre a identificação e expressão dos seus sentimentos e desejos,
respeitando a suas próprias sensações e emoções, bem como as dos outros,
reconhecer o consentimento mútuo como necessário para desfrutar do prazer numa
relação, proteger-se do relacionando sexual coercitivo ou explorador, conhecer e
adotar práticas de sexo protegido, desde o início do relacionamento sexual, evitando
contrair ou transmitir doenças sexuais, inclusive o vírus HIV, também é papel da
escola.
Do ponto de vista prático, chegamos à conclusão que o aluno no âmbito
escolar irá identificar e repensar tabus e preconceitos referentes a sexualidade,
evitando comportamentos discriminatórios e intolerantes e analisando criticamente
os estereótipos, reconhecendo como construções culturais as características
socialmente atribuídas ao sexo masculino e ao feminino. Além de evitar uma
gravidez indesejada, procurando orientação satisfatória e recorrendo a métodos
contraceptivos, adquirindo, portanto, uma consciência crítica que lhes permita tomar
decisões responsáveis a respeito da sua sexualidade.

REFERÊNCIAS

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Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Fundamental-Saúde.
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MEC/SEF, 2001.

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