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DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL

AZOR, A. (2008)

Aberastury e Knobel. Sindrome da Adolescencia Normal. 1992.

Para Aberastury e Knobel (1992), a adolescência é o momento crucial na vida do homem e


constitui a etapa decisiva de um processo de desprendimento que começou com o nascimento. Para isto,
deve elaborar três lutos. O primeiro, pelo corpo, é duplo pois além da perda do corpo infantil, deverá lidar
com a maturação dos órgãos sexuais. O segundo luto, pela identidade infantil, se dá diante de um
processo de oscilação entre a criança que está deixando de ser e vários personagens representados
pelos adolescentes diante de seus pais e do meio social em que vivem. Estes se apresentam de formas
variadas, provocando simultâneas e contraditórias versões sobre sua maturidade, bondade, capacidade,
afetividade. E, finalmente, o luto pela relação com os pais da infância. Os pais, antes idealizados, devem
receber um tratamento de distanciamento e substituição para novas identificações.
Os pais, por sua vez, vivem uma experiência ambivalente em relação ao crescimento dos
filhos e devem elaborar o luto pelo corpo do filho pequeno, pela sua identidade de criança e pela
relação de dependência infantil. Neste processo, os pais devem cuidar do filho, dando-lhe a liberdade
necessária sem, contudo, abandoná-lo.
Aberastury relacionou o conceito de moratória social de Erikson com a necessidade de um
tempo para os jovens elaborarem um longo processo de lutos. O adolescente precisa aceitar o
próprio corpo, com as funções reprodutoras amadurecidas e as limitações infringidas pela perda da
fantasia de bissexualidade, para aceitar o corpo do outro. Para ela, este tempo não é carregado
apenas de confusões e transtornos, mas também da eclosão de uma grande capacidade criativa e a
conseqüente satisfação que as conquistas possam trazer.
Knobel (1992) parte do princípio de que a adolescência, assim como a infância, não deve ser
vista apenas como uma preparação para a maturidade. É necessário enfocá-la com um critério do
momento atual do desenvolvimento e do que significa o ser humano nesse período de vida. Afirma
que existe um componente universal no processo da adolescência - o re-despertar da sexualidade,
agora direcionado pela maturidade genital - que sofre influências das conotações externas peculiares
de cada cultura. Este componente obriga o indivíduo a reformular os conceitos que tem a respeito de
si mesmo, a abandonar a imagem infantil e a projetar-se no futuro de sua vida adulta. Deste modo, o
adolescente estaria deixando sua condição de dependente dos pais e da família e se lançando na
construção de si como adulto responsável. E este processo seria vivido na e pela cultura e história.
Aberastury e Knobel (1992), apresentam a ‘síndrome normal da adolescência’ e relacionam
dez sintomas que a caracterizam:
1) Busca de si mesmo e da identidade: a conseqüência final da adolescência seria um
conhecimento de si mesmo como entidade biológica no mundo, o seu todo biopsicossocial nesse
momento da vida. As alterações biológicas impulsionam para o estabelecimento de novas formas de
relacionamento, especialmente com seus pais. O processo de individualização requer a condição de
figuras parentais internalizadas, para a possibilidade de distanciamento dos pais externos reais.
Neste processo surgem identidades transitórias, adotadas durante um certo tempo; identidades
ocasionais, que fazem frente a situações novas; identidades circunstanciais são parciais e
transitórias.
2) Tendência grupal: o grupo passa a representar segurança e estima pessoal pois garante ao
jovem uma certa uniformidade. Existe uma superidentificação em massa, onde todos se identificam
com cada um. A busca de um líder auxilia na substituição do poder paterno, caracteriza uma
transferência de dependência. O fenômeno grupal facilita condutas de desafeto, crueldade com o
objeto, de indiferença, de falta de responsabilidade que surgem como mecanismos de defesa frente à
culpa e aos lutos a serem elaborados. Continuamente, o mundo assiste a ações praticadas por
grupos de jovens carregadas de muita violência. Uma delas, no Brasil, marcou uma geração: os
jovens de Brasília que atearam fogo no índio. O adolescente perde a noção de si, confundindo-se
com a identidade do grupo.
3) Necessidade de intelectualizar e fantasiar: são defesas empregadas pelos adolescentes
frente às renúncias e inabilidades diante da realidade externa. Eles se voltam para o mundo interior
permitindo um reajuste emocional. Segundo Anna Freud, segue-se um autismo positivo, pois o
incremento da intelectualização leva à preocupação por princípios éticos, filosóficos, sociais que,
muitas vezes, implicam na formulação de um plano de vida muito diferente do que se tinha até este
momento.
4) Crises religiosas: quanto à religiosidade, o jovem pode manifestar-se como um ateu
convicto ou como um místico fervoroso, podendo experimentar variadas religiões e oscilar entre o
misticismo e o ateísmo.
5) Desorientação temporal: converte o tempo em presente e ativo para tentar remanejá-lo,
com isto surgem enormes urgências ou infindáveis postergações. Seria na adolescência a apreensão
do tempo existencial, que seria o tempo em si, um tempo vivencial ou experiencial e um tempo
conceitual. Para Knobel, a percepção e a discriminação do temporal seria uma das principais tarefas
da adolescência, levando a reconhecer um passado e formular projetos de futuro com capacidade de
espera e elaboração no presente.
6) Evolução sexual desde o auto-erotismo até a heterossexualidade: a psicanálise assinala o
caráter de revivência simultânea das fases da sexualidade infantil. Observa-se uma permanente
oscilação entre a atividade de tipo masturbatório e o início do exercício genital que, inicialmente, se
dá em forma de contato exploratório e preparatório para, posteriormente, ocorrer a genitalidade
procriativa. O adolescente pode passar por período de homossexualidade transitória como expressão
da bissexualidade perdida. A relação com o pai, quando este não assume seu papel, deve ser
investigada como possível raiz dessa circunstância. A masturbação, como fenômeno normal da
adolescência, permite ao adolescente integrar os genitais a todo conceito de si mesmo, formando
uma identidade genital adulta.
7) Atitude social reinvindicatória: esta característica merece destaque para este estudo, já que
pretende entender como os jovens experimentam a adolescência diante dos fenômenos sociais da
atualidade. A aceitação da identidade é, forçosamente, determinada por um condicionamento entre
indivíduo e meio. Existem bases comuns à todas as sociedades, que são processos naturais do ser
humano, mas as diferentes culturas modificam as manifestações do processo. A compreensão dos
padrões culturais torna-se importante para o manejo do adolescente, entretanto é essencial não perder de
vista o fenômeno da adolescência diante dessa cultura para entender o aparecimento de novas condutas.
A atitude social reivindicatória do adolescente decorre das restrições impostas pela sociedade e pela
cultura à força reestruturadora de sua personalidade. Os comportamentos do adolescente criam um mal-
estar de tipo paranóide no mundo adulto, que se sente ameaçado pelos jovens que vão ocupar o seu
lugar.
8) Contradições sucessivas em todas as manifestações da conduta: a conduta do jovem é
dominada pela ação, forma de expressão típica dessa fase, como se a ação pudesse garantir o
controle do pensamento. Esta instabilidade e permeabilidade constituem um indício de normalidade
na adolescência. A rigidez de conduta não é esperada.
9) Separação progressiva dos pais: seguindo o pensamento de Aberastury (1992), um dos
lutos a serem feitos é pelos pais da infância. Esta função torna-se duplamente difícil, pois requer dos
pais a capacidade de lidar com a destituição de seu poder diante do filho. A presença internalizada de
boas imagens parentais, com papéis bem definidos, facilitará uma boa separação. A vivência da
situação edípica e a maturidade genital impõe a separação, que às vezes é amenizada por relações
fantasiadas com adultos reais ou imaginários como elementos de transição para relações mais
satisfatórias.
10) Constantes flutuações de humor e do estado de ânimo: dois sentimentos básicos -
ansiedade e depressão - acompanham a adolescência. A quantidade e qualidade de elaboração dos
lutos determinarão a maior ou menor intensidade desses sentimentos.

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