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LIBERDADE DO SER HUMANO FRENTE A PREDESTINAÇÃO EM


GOTTFRIED WILHELM LEIBNIZ

Saúdo a banca avaliadora, composta pelo professor Doutor Padre


Nivaldo Alves de Souza, pelo professor Mestre e Diretor da faculdade
Padre Silvano João da Costa, e pelo professor Doutor Celso Kraemer,
orientador desta pesquisa. Estendo minha saudação (ao padre
Hemerson, formador do seminário filosófico São Francisco Xavier) ao
coordenador do curso de filosofia professor Doutor Padre Aléssio da
Rosa. E a todos que assistem a essa defesa.
O presente trabalho tem por tema a possibilidade da liberdade do
ser humano frente a predestinação na visão do filósofo Gottfried Wilhelm
Leibniz. Para melhor compreender o tema, busca-se em Leibniz as
noções de vontade e a contingência. Elas auxiliam na compreensão da
liberdade. O pensador afirma que existe uma liberdade no ser humano,
definida pela possibilidade no predicado contingente, ou seja, no não
necessário. O presente trabalho tem como pergunta se há possibilidade
de liberdade ao ser humano frente a predestinação? A partir disto o
objetivo geral da pesquisa é compreender a possibilidade da liberdade
do ser humano frente há predestinação em Leibniz. Os objetivos
específicos são: explicitar em que consiste a monadologia de Leibniz;
identificar a predestinação na relação entre a ação de Deus e a ação do
homem; discutir a possibilidade da liberdade do homem a partir da
relação da contingência e predestinação. O trabalho utiliza, como
procedimento metodológico, a análise bibliográfica e documental, com
base nas próprias obras de Leibniz e de comentadores.
Gottfried Wilhelm Leibniz nasceu em Leipzig em 1646, de uma
família de ascendência eslava. Depois dos cursos de filosofia em Leipzig
e de matemática em Jena, em 1666 laureou-se em jurisprudência em
Altdorf, perto de Nuremberg. A partir de 1668 foi introduzido na corte do
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Eleitor de Mogúncia e, de 1672 a 1676, morou em Paris, onde conheceu


os filósofos Arnauld e Malebranche e o matemático Huygens, e
aprendeu perfeitamente a língua francesa, que adotou em seus escritos.
Gottfried Wilhelm Leibniz, seus estudos metafísicos ganham
grande destaque, juntamente com a teologia construída por ele. Leibniz
utiliza muito do tempo para dissertar acerca da mônada e o que a
envolve, como a sua criação divina, a sua composição e seus aspectos.
Por meio do processo da Monadologia, Leibniz explica sobre a
liberdade da mônada humana, que se diferencia das demais, por ter
semelhança com o Absoluto. Em sua exposição, o aspecto livre da
mônada parece ter ficado envolto pela predestinação, visto que os
predicados constitutivos das substâncias (sujeito) dão vida ao seu
passado, dão possibilidade no presente e futuro e, ademais, Leibniz
deixa entender que Deus já tem tudo em seu plano, as realizações do
ser humano já estariam na mente divina.
As mônadas são substâncias desprovidas de partes ou extensão,
portanto não apresentam figura nem divisibilidade possíveis. Desta
forma, ao contrário das substâncias compostas, que provém da ideia de
Descartes e Spinoza. As mônadas só começam ou terminam por
criação ou por aniquilamento.
As ações das criaturas estão inseridas na sua noção enquanto
substância individual. Leibniz define substância. Nominalmente se diz
substância quando se pode atribuir muitos predicados a um único
sujeito, sem que nenhum outro possa ser desta maneira caracterizado.
A melhor definição de substância é que ao atribuir verdadeiramente a
um sujeito requer que os predicados estejam inseridos de alguma forma
nele, sendo propriedade dele. De qualquer forma os predicados definem
o sujeito, e se eles não estiverem claramente enunciados, estarão
compreendidos virtualmente.
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Para entender o sujeito é necessário entender os predicados que


o compõem, senão a compreensão não é perfeita. Leibniz afirma que é
preciso o termo do sujeito conter sempre o do predicado, e só assim
teremos a noção completa, que é a total compreensão dos seus
predicados, o que define essa identidade única.
A noção individual carrega tudo o que pode pertencer à
substância: a sua influência na permanência da harmonia do universo,
todas as suas características extrínsecas e intrínsecas, o porquê de
suas ações e tudo o que lhe aconteceu e acontecerá. Assim, para
conhecer verdadeiramente um indivíduo é necessário conhecer sua
noção individual completa, por esse motivo só há um ser capaz de
conhecer todas as criaturas: o criador.
Para que na substância individual estejam inevitavelmente
incluídos seus predicados deve haver um vínculo intrínseco, onde na
essência da substância está presente seus predicados a priori,
conservando sempre o mesmo “eu”. Deste modo, é inconcebível admitir
mais do que um “eu” atualizado por Deus. E é daí que surge o maior
princípio leibniziano que diz que é preciso que “exista sempre qualquer
fundamento da conexão dos termos de uma proposição, o qual se deve
encontrar nas suas próprias noções”, ou seja, nada acontece por acaso,
há sempre uma razão para cada acontecimento.
Cada substância singular enxerga o mundo da sua maneira,
como “um mundo completo e como um espelho de Deus, ou melhor, de
todo o universo, expresso” (LEIBNIZ, Discurso de Metafísica, 2004,
p.18). Cada substância pertence a um mundo criado por ela mesma,
que só ela enxerga, pois cada uma vê o mesmo objeto a seu modo.
Então, para compreender o mundo seria necessário conhecer a visão de
cada substância, pois é como se o universo fosse multiplicado por
quantas substâncias houvesse. É assim, que somente Deus pode
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compreender o mundo em sua totalidade. A importância de aceitar a


existência das possibilidades vai além da vaidade, é a base mais sólida
para provar a contingência, pois se têm outra possibilidade sempre
podemos optar por qual nos parece melhor, é daí que vem o que
chamamos de livre arbítrio.
Porém, pela análise da mônada humana, busca-se compreender
as possibilidades de o ser humano encontrar a liberdade, apesar da
predestinação. Parte-se do pressuposto que haja maneiras de
contrapor ao determinismo as noções de possiblidade, contingência e
necessidade, conceitos que estão na história da filosofia e que entram
novamente em cena na filosofia leibniziana.
Toda ação humana visa um bem, sempre estamos em busca da
felicidade, mesmo que seja por alguns instantes. Toda liberdade
depende da ação, pensando assim quanto mais escolhas uma pessoa
faz, mas livre ela é, dessa forma é possível despertar mais suas
opiniões e consequentemente sua essência.
A ideia de perfeição do mundo provém de um Deus sumamente
bom e que busca a harmonia, e esta é atingida a partir das melhores
escolhas, que são mais perfeitas e possuem a melhor combinação das
séries tanto para a mônada individualmente, quanto para sua inserção
no mundo, o mais perfeito. A escolha de algo parte da inclinação da
vontade e, por causa disso a nossa mente é forçada por uma razão
maior a escolher. A escolha é feita a partir do que parece melhor ao
homem e dada a sua imperfeição alguma coisa pode desviá-lo quanto à
clareza. A escolha do mundo é feita a partir da clareza que Deus deu ao
homem, que é uma inclinação em busca do melhor, ou seja, do bem
maior, o que não implica a necessidade do que será feito. Como já foi
explicitado no primeiro capítulo Substância Individual é certo, mas não é
necessário que o homem escolha o melhor. Deus deu a razão para que
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o homem se inclinasse sempre para o melhor; mas não é necessário


porque há outras possibilidades que ele pode optar.
Leibniz nunca escondeu o que entendia por liberdade. De alguma
maneira, desde os seus anos de juventude, ele já tinha em mente o que
seria a melhor definição para ela. Mesmo que seu ponto de partida
tenha sido a noção aristotélica de deliberação, ele desenvolveu uma
ideia peculiar para tal conceito. Antes de chegar à definição consistente
de ações livres, ele se viu obrigado a desenvolver um fundamento
metafísico que se adequasse às suas intenções teológico-morais, e foi
além, ultrapassou as teses de outros pensadores. Como bom filósofo, o
autor da Teodicéia, mais do que se contentar com a simples reprodução
do pensamento dos vários dos seus antecedentes e contemporâneos,
acabou por levar o pensamento destes além do que eles mesmos
poderiam imaginar; isso foi o próprio motor da filosofia leibniziana.
Não custa repetir que a resposta de Leibniz pode ser sintetizada
da seguinte maneira: ser livre é agir por si na direção daquilo que é visto
como um bem, sem que nada interfira na decisão do agente, senão ele
mesmo, e sem que lhe seja proibido fazer diferente. Se nada impedir o
agente, é certo que ele perseguirá o que lhe parece melhor. Todo esse
processo é algo que pertence exclusivamente ao agente, podendo
mesmo ser previsto por um ser que tenha um conhecimento perfeito das
coisas, ou seja, é possível saber para onde uma criatura se dirige
através da natureza desta, que opera em função da necessidade moral.
No caso do criador, ele age conforme o princípio do melhor, pois
sempre persegue o verdadeiro bem. Todo fato, ao final, é absolutamente
inteligível; apenas uma insuficiência de conhecimento impede a
compreensão a priori da ação.
Observando-se a partir do seu sistema, não se pode negar que
Leibniz apresenta argumentos coerentes na sua definição de liberdade.
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Tudo deve ter uma razão para que seja aberto um espaço para o
criador, e toda ação dos espíritos deve ser sustentada em atos livres
para que a responsabilidade destes seja garantida. Mesmo que a
criatura racional permita a previsão divina, sua natureza de substância é
fruto de suas decisões, e não de qualquer outro ser. Entretanto, alguém
ainda pode defender que todo o esforço do autor desemboca na
liberdade como sinônimo de ignorância. Ora, me parece que de alguma
maneira isso ocorre, mas de uma forma que deve ser bem entendida,
conforme o trigésimo artigo do Discurso de Metafísica. Ali, quando
Leibniz questiona “como alguém pode saber se está condenado antes
de agir?”, é algo que merece ser sublinhado. É logicamente impossível
que o sujeito conheça o seu futuro antes de fazê-lo. Ele só o conhecerá
em ato, construindo-o. Neste aspecto, o filósofo alemão entende que
nenhum homem deve preocupar-se com o destino, que este mesmo
constrói. Leibniz ainda parece radicalizar a ação conforme a razão de tal
forma que mesmo se o futuro fosse apresentado previamente a alguém,
este ainda realizaria o seu ato conforme o que já é indicado pela sua
natureza. O principal fundamento da liberdade deveria ser sustentado
principalmente na vontade do sujeito, que também constitui a natureza
deste, e não na simples contingência das coisas, que poderia gerar a
indiferença absoluta.
Gostaria apenas de levantar uma última que estão acerca da
relação entre entendimento e vontade, e sobre a verdadeira Liberdade.
Leibniz mostrou que o agente sempre age em função de um bem,
mesmo que seja aparente; e quem nega isso, apenas dissimula o fato
de estar buscando o que lhe parece mais vantajoso. Por outro lado, ele
não deixou totalmente claro como alguém pode ter suas ações cada vez
mais livres das puras aparências. O foco para a diminuição da
escravidão é o entendimento. Mas foi visto que é preciso uma boa
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vontade para ativá-lo, o que parece indicar um desejo pelo próprio


conhecer. É perceptível que não basta uma correção intelectual para
que aconteça uma suposta aproximação com a verdadeira Liberdade.
Mas, e este é o ponto da dificuldade, o bom uso do entendimento já não
pressuporia uma escolha, o que geraria uma espécie de círculo? Afinal,
onde é o ponto de partida para a correção das disposições do agente?
De onde poderia surgir a boa vontade? Não se pode ignorar que Leibniz
também negou que isso seja puro problema de volição, pois não se
pode simplesmente querer fazer um bom uso do querer; ninguém pode
querer, e isso parece aumentar a dificuldade.
Ninguém pode querer melhor. Tudo isso entraria numa esfera
mais profunda da formação da disposição e dos hábitos do agente; mas
seria interessante entender se isso já caracteriza uma decisão ou não.
Mas isso são apenas conjecturas e questões que devem ser
esclarecidas em uma outra oportunidade.
O futuro totalmente predeterminado associado à contingência e
liberdade das ações ainda é algo não livre de complicações.
À pergunta norteadora desse trabalho pauta se na interrogação
se a possibilidade de liberdade ao ser humano frente a predestinação,
no pensamento de Leibniz? Frente a esta questão, o objetivo da
pesquisa foi buscar esclarecer a possibilidade da liberdade ante a
predestinação do ser humano em Leibniz. Para tanto, percorresse um
caminho que buscou atender os objetivos específicos são: explicitar em
que consiste a monadologia de Leibniz; identificar a predestinação na
relação entre a ação de Deus e a ação do homem; discutir a
possibilidade da liberdade do homem a partir da relação da contingência
e da predestinação.
Percorrer estes objetivos específicos possibilitou elucidar os
principais aspectos a problemática da metafísica de Leibniz, e é a
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questão da liberdade ante à onisciência divina. Em tese, esta faz com


que Deus conheça tudo mesmo os efeitos futuros do pensamento e das
escolhas dos humanos. Mas a noção de contingência, mundos
possíveis, ações espontâneas e escolhas permitem esclarecer a
liberdade frente à predestinação em Leibniz, objetivo principal deste
trabalho.
A liberdade é a principal questão que a metafísica leibniziana
encontra. A liberdade é feita da espontaneidade ligada à inteligência.
Tudo o que é espontâneo é contingente, ou seja, ocorre quando o
princípio da ação está no sujeito. Isso é chamado de espontaneidade. A
capacidade de raciocinar diferencia os humanos de outros animais.
Apesar de os humanos também poderem agir impulsivamente, eles se
diferenciam por serem racionais, o que exige conhecimentos e controles
que os irracionais não possuem. O humano é capaz de representar o
mundo, o que lhe dá a liberdade em conhecer suas próprias ações, em
compreender de distintas maneiras o objeto desejado, em entender sua
opção. Essa ação consciente engloba a memória e envolve o
pensamento crítico e prático. Portanto, liberdade é espontaneidade
combinada com inteligência, que ocorre quando uma pessoa é capaz
de ser espontânea ao mesmo tempo em que se emancipa de sua
natureza mais primitiva, resistindo à influência externa, fácil, e tendo a
capacidade de tomar decisões conscientes, selecionando a melhor
opção em busca do bem maior. Não tendo mais nada a declarar,
agradeço a presença e atenção de todos. Assim, devolvo a palavra para
o meu orientador Celso Kraemer.

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