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Material elaborado por Genesis Honorato

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LEI DO SUPERENDIVIDAMENTO (LEI 14.181/2021) – ASPECTOS


FUNDAMENTAIS:

Conforme Pablo Stolze, chama-se de princípio do crédito responsável a norma que


direciona o ordenamento jurídico em favor de práticas negociais saudáveis abrangentes
das mais variadas formas de crédito.
Trata-se de conceito já admitido pela doutrina e pela jurisprudência.

A Lei parte da premissa de que o crédito deve ser exercido/cobrado de forma SAUDÁVEL.

Afirma Pablo Stolze de Carlos Elias que este princípio é uma norma implícita na
Constituição e foi concretizado pela Lei do Superendividamento mediante alterações no
CDC e no Estatuto do Idoso. Consiste em promover o “crédito responsável”, ou seja, a
prática adotada por credores, por devedores e pelo Poder Público com vistas a evitar o
superendividamento1.

Importante destacar que a norma é endereçada ao Estado e ao poder público, que


devem elaborar políticas públicas para se evitar o superendividamento, sendo
endereçadas a figura do devedor (que deve agir de boa-fé na contratação de prestações
continuadas, deve agir com a devida cautela) e do próprio credor (dever de não levar o
devedor ao superendividamento). Aqui se insere também a figura parcelar da boa-fé
objetiva “duty to mitigate the loss”.
1Pablo Stolze e Carlos Elias: “Comentários à “Lei do Superendividamento” (Lei nº 14.181, de 01 de julho de
2021) e o Princípio do Crédito Responsável: uma primeira análise”. Disponível em:
https://direitocivilbrasileiro.jusbrasil.com.br/artigos/1240597511/comentarios-a-lei-do-superendividamento-lei-n-
14181-de-01-de-julho-de-2021-e-o-principio-do-credito-responsavel-uma-primeira-analise
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Superendividamento, por sua vez, é a situação de um indivíduo de boa-fé que não tem
condições de pagar suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial.
Conforme o art. 54-A, §1º do CDC:
Art. 54-A, § 1º, CDC: Entende-se por superendividamento a
impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-
fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e
vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da
regulamentação.

ATENÇÃO: A Lei aponta para consumidor “PESSOA NATURAL”. Assim, a lei não é
direcionada à pessoa jurídica, mas ao consumidor pessoa natural.

Ainda, dispõe o §2º:


Art. 54-A, § 2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam
quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de
relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo
e serviços de prestação continuada.

Conforme dispõe Carlos Elias, existem 2 técnicas de redação legislativa, sendo uma delas
a cláusula aberta e a outra o conceito jurídico indeterminado, tratando-se na prática de
abordagens que se baseiam em uma indefinição ou incerteza. A cláusula aberta é quando
a incerteza está no resultado e o conceito jurídico indeterminado tem a sua incerteza na
definição. O dispositivo estudado já é considerado autoaplicável pelo professor,
tratando-se de uma NORMA DE EFICÁCIA CONTIDA.
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Quando a lei trata do superendividamento e protege o consumidor que se encontra


abarrotado de dívidas, não significa dizer que ela está protegendo o supérfluo. Assim,
não seria possível invocar a lei para um endividamento atrelado a luxos superficiais.

Vigora no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da proteção simplificada do luxo,


segundo o qual o Direito protege situações de luxo sem o mesmo prestígio de situações
essenciais ou úteis. Esse conceito está atrelado ao conceito de paradigma da
essencialidade, revelado pela Professora Teresa Negreiros. Segundo a jurista carioca, os
direitos devem ser classificados quanto à essencialidade em direitos essenciais, direitos
úteis e direitos supérfluos. Quanto menor o grau de essencialidade do direito, menor
deve ser a intervenção do Direito.

Conforme o que dispõe o CDC:


Art. 54-A, § 3º O disposto neste Capítulo não se aplica ao consumidor
cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé,
sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o
propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou
contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor

No terceiro parágrafo, o legislador afirma que a proteção deferida ao superendividado


não será reconhecida para aquele devedor que tenha atuado de forma dolosa ou
mediante fraude, assim como a proteção não será devida para aquele devedor que se
afogou em dívidas por conta de luxo desnecessário.

OBS: O luxo é algo que vai além e foge do padrão médio de uma sociedade. Essa
referência apresenta variações entre diferentes ambientes sociais.
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ATENÇÃO1: Conforme aponta Carlos Elias, é importante interpretar o conceito de


consumidor de má-fé de forma RESTRITA. A má-fé deve ser atribuída a indivíduos que
agem com o intuito verdadeiro de promover golpes ou prejuízos, intenção que não
poderia, por exemplo, ser atrelada a uma mãe desempregada que utiliza seu limite de
cartão de crédito para comprar alimento para os filhos e não possui renda para a
liquidação posterior da fatura.

ATENÇÃO2: A lei do superendividamento visa a proteção do mínimo existencial (art. 6º,


XII e 54-A, §1º do CDC)
Dispõe o CDC:
Art. 6º (...)
XI – a garantia de práticas de crédito responsável, de educação
financeira e de prevenção e tratamento de situações de
superendividamento, preservado o mínimo existencial, nos termos
da regulamentação, por meio da revisão e da repactuação da dívida,
entre outras medidas;
XII – a preservação do mínimo existencial, nos termos da
regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de
crédito;

Assim, com Pablo Stolze podemos dizer que sob o prisma do elemento finalístico, a
finalidade da lei é a de prevenir o superendividamento para resguardar o mínimo
existencial do cidadão. Esse entendimento guarda conexão com a Teoria do Estatuto
Jurídico do Patrimônio Mínimo (Luiz Edson Fachin).

OBS: É importante destacar que essa lei não é, na verdade, um conceito novo ou inédito
no mundo. Conforme aponta Carlos Elias, na verdade a legislação se inspira no direito
francês e no direito norte-americano. Por exemplo, a França possui a sua própria lei para
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superendividamentos e no país há órgãos administrativos dedicados a atender


consumidores superendividados e a elaborar a intermediação para uma possível
repactuação da dívida.

A doutrina já ponta que as leis de organização judiciária estaduais devem criar varas
especializadas no superendividamento.

DICA:
Pode-se, para firmar uma ideia de mínimo existencial, conforme Pablo Stolze e Carlos
Elias, utilizar como bússola a jurisprudência que gira em torno do “bem de família”.

A lei não se direciona somente ao devedor ou ao credor, mas também ao poder público.
Alguns dispositivos do CDC que tratam do tema:
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo
o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua
dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses
econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a
transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os
seguintes princípios:
(...)
IX - fomento de ações direcionadas à educação financeira e
ambiental dos consumidores;
X - prevenção e tratamento do superendividamento como forma de
evitar a exclusão social do consumidor.
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Art. 5° Para a execução da Política Nacional das Relações de


Consumo, contará o poder público com os seguintes instrumentos,
entre outros:
(...)
VI - instituição de mecanismos de prevenção e tratamento
extrajudicial e judicial do superendividamento e de proteção do
consumidor pessoa natural;
VII - instituição de núcleos de conciliação e mediação de conflitos
oriundos de superendividamento.

Bem lembra Carlos Elias que dentro da estrutura administrativa do direito do consumidor
há o chamado Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, que é uma verdadeira
constelação de órgãos de todos os entes federativos e que também envolve a
participação de entidades da sociedade civil. Dentro desse sistema, há a Secretaria
Nacional do Consumidor, que é um órgão dentro do Ministério da Justiça de onde
precipitam as normas que regulamentam os PROCONs e os demais órgãos que atendem
ao consumidor.
Os PROCONs são considerados a “ponta da lança”, figuras de contato com o consumidor
e que seguem atos normativos que geralmente são baixados pelo Ministério da Justiça
por provocação da Secretaria Nacional do Consumidor. A lei dispõe uma liberdade
incrível para que a Secretaria elabore soluções diversas que possam ajudar os
consumidores, sendo várias as possibilidades de elaboração de políticas públicas nesse
sentido.

OBS: Uma observação importante é que para a lei o superendividado acaba se tornado
um excluído socialmente, dessa forma, a lei possui um escopo também inclusivo,
considerando que o consumidor será sempre por natureza, vulnerável.
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Conforme dispõe o art. 54-C do CDC:


Art. 54-C. É vedado, expressa ou implicitamente, na oferta de crédito
ao consumidor, publicitária ou não:
I – (VETADO);
II – indicar que a operação de crédito poderá ser concluída sem
consulta a serviços de proteção ao crédito ou sem avaliação da
situação financeira do consumidor;
III – ocultar ou dificultar a compreensão sobre os ônus e os riscos da
contratação do crédito ou da venda a prazo;
IV – assediar ou pressionar o consumidor para contratar o
fornecimento de produto, serviço ou crédito, principalmente se se
tratar de consumidor idoso, analfabeto, doente ou em estado de
vulnerabilidade agravada ou se a contratação envolver prêmio;
Parágrafo único. (VETADO).

Aponta Pablo Stolze que a Lei se preocupa consideravelmente com a oferta do crédito
ao consumidor, uma vez que talvez a principal causa de superendividamento sejam
justamente os créditos e financiamentos concedidos.

Importante destacar que o inciso I foi vetado pelo presidente da República, mas tal veto
vem sofrendo críticas da doutrina. Segue as razões do veto presidencial:
"A propositura legislativa estabelece que seria vedado expressa ou implicitamente, na
oferta de crédito ao consumidor, publicitária ou não, fazer referência a crédito 'sem
juros', 'gratuito', 'sem acréscimo' ou com 'taxa zero' ou expressão de sentido ou
entendimento semelhante.
Entretanto, apesar da boa intenção do legislador, a propositura contrariaria o interesse
público ao tentar solucionar problema de publicidade enganosa ou abusiva com restrição
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à oferta, proibindo operações que ocorrem no mercado usualmente e sem prejuízo ao


consumidor, em que o fornecedor oferece crédito a consumidores, incorporando os juros
em sua margem sem necessariamente os estar cobrando implicitamente, sem considerar
que existem empresas capazes de ofertar de fato 'sem juros', para o que restringiria as
formas de obtenção de produtos e serviços ao consumidor.
O mercado pode e deve oferecer crédito nas modalidades, nos prazos e com os custos
que entender adequados, com adaptação natural aos diversos tipos de tomadores, o que
constitui em relevante incentivo à aquisição de bens duráveis, e a Lei não deve operar
para vedar a oferta do crédito em condições específicas, desde que haja regularidade em
sua concessão, pois o dispositivo não afastaria a oferta das modalidades de crédito
referidas, entretanto, limitaria as condições concorrenciais nos mercados”.

O dispositivo dispunha que é vedado, expressa ou implicitamente, na oferta de crédito


ao consumidor, publicitária ou não, fazer referência a crédito “sem juros”, “gratuito”,
com “taxa zero” ou a expressão de sentido ou entendimento semelhante.

ATENÇÃO: Pablo Stolze e Carlos Elias, no mencionado artigo publicado, defendem que
apesar do veto presidencial, a prática vedada no inciso pode ser considerada abusiva
com base em outros dispositivos do CDC.

Conforme lembra Carlos Elias, é importante destacar que a lei do superendividamento


possui basicamente dois grupos de dispositivos, um grupo que se aplica a todos os
consumidores e que tem o intuito de prevenir o superendividamento, que é o caso do
art. 54-C, que exige que o consumidor tenha acesso pleno as informações, tendo
consciência da dimensão do crédito. O segundo grupo se aplica aos consumidores que já
se encontram em uma situação de endividamento avançada. Novamente quanto ao art.
54-C, esse é um dispositivo que possui o intuito de evitar que consumidores caiam em
um “precipício”.
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Contratos coligados são aqueles que possuem uma capilaridade entre eles.
Com relação ao tema, existe um dispositivo que a lei do superendividamento inseriu no
CDC que diz respeito a contratos coligados ou conexos, prática comum inclusive ao
pequeno consumidor que, no intuito de adquirir um bem, entrega ao fornecedor parte
do valor total da compra enquanto “entrada” e financia o restante do montante devido
por meio de um contrato de financiamento (que muitas vezes é realizado pela própria
financeira do varejista).
Assim, temos: contrato de compra e venda + contrato de financiamento.
A Lei se preocupa com essas hipóteses. Conforme o art. 54-F do CDC:
Art. 54-F. São conexos, coligados ou interdependentes, entre outros,
o contrato principal de fornecimento de produto ou serviço e os
contratos acessórios de crédito que lhe garantam o financiamento
quando o fornecedor de crédito:
I – recorrer aos serviços do fornecedor de produto ou serviço para a
preparação ou a conclusão do contrato de crédito;
II – oferecer o crédito no local da atividade empresarial do
fornecedor de produto ou serviço financiado ou onde o contrato
principal for celebrado.

ATENÇÃO: Conforme o §4º:


§ 4º A INVALIDADE ou a INEFICÁCIA do contrato principal implicará,
DE PLENO DIREITO, a do contrato de crédito que lhe seja conexo,
nos termos do caput deste artigo, ressalvado ao fornecedor do
crédito o direito de obter do fornecedor do produto ou serviço a
devolução dos valores entregues, inclusive relativamente a tributos
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Assim, se o contrato principal de compra for invalidado, o financiamento contratado será


também considerado inválido.
A ideia nesse quesito é deixar claro o chamado “efeito dominó”, em que se o contrato de
compra e venda cair, também será derrubado o contrato de financiamento, que se
torna resolvido. Esse dispositivo está inserido no grupo que se aplica a todos os
consumidores, uma vez que se destina ao objetivo de evitar que o consumidor se torne
superendividado.
Assim, por exemplo, se o consumidor compra um veículo com defeito e se vale do art. 18
do CDC, mas o fornecedor não conserta o veículo no prazo, surge para o consumidor a
possibilidade de o consumidor resolver (eficácia) o contrato.
Diante dessa resolução, acontece o efeito dominó com a queda do contrato de compra e
venda.

OBS: percebe-se que a redação do §4º, utilizando-se dos termos jurídicos adequados,
deixou claro que tal dispositivo abrange TODOS os fenômenos de desligamento
contratual.

ATENÇÃO: Esse dispositivo, conforme Carlos Elias e Pablo Stolze, não se restringe apenas
aos casos de superendividamento, uma vez que, como já dito, se destina a impedir que o
consumidor fique superendividado, ou seja, é uma norma preventiva.

A Lei buscou inserir o inciso XIX no art. 51 do CDC que dispunha:


Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas
contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(...)
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XIX – Prevejam a aplicação de lei estrangeira que limite, total ou


parcialmente, a proteção assegurada por este Código ao consumidor
domiciliado no Brasil.

Todavia, tal inciso foi vetado. São as razões do veto:

"A propositura legislativa estabelece que seriam nulas de pleno direito as cláusulas
contratuais relativas ao fornecimento de serviços e produtos que previssem a aplicação
de lei estrangeira que limitasse, total ou parcialmente, a proteção assegurada por este
Código.
Entretanto, apesar da boa intenção do legislador, a propositura contrariaria interesse
público tendo em vista que restringiria a competitividade, prejudicando o aumento de
produtividade do País, ao restringir de forma direta o conjunto de opções dos
consumidores brasileiros, especialmente quanto à prestação de serviços de empresas
domiciliadas no exterior a consumidores domiciliados no Brasil, o que implicaria restrição
de acesso a serviços e produtos internacionais. Em virtude de a oferta de serviços e de
produtos ser realizada em escala global, principalmente, por meio da internet, é
impraticável que empresas no exterior conheçam e se adequem às normas
consumeristas nacionais."

É importante perceber que quando se está diante de uma empresa estrangeira que
possua filial no Brasil, se uma eventual lei estrangeira prejudicasse o consumidor, então
prevaleceria o CDC.
Todavia, em um mundo globalizado, não seria possível submeter toda e qualquer
empresa ao CDC. Isso pode gerar uma situação em que integrantes do mercado viessem
deixar de vender para o Brasil.

Os professores Pablo Stolze e Carlos Elias concordam com as razões do veto. Assim
afirmam os professores:
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De fato, a previsão normativa poderia ser prejudicial, porquanto


uma interpretação literal do preceito poderia soar perigosa.
A rigor, se um consumidor domiciliado no Brasil comprasse, pela
internet, uma passagem aérea da companhia Iceland Air (sediada
na belíssima cidade de Reykjavik, na Islândia), esse contrato teria
de ser submetido ao CDC, salvo se a lei islandesa fosse mais
favorável ao consumidor.
Não pode, porém, prosperar uma interpretação dessa por três
motivos.
O primeiro é que empresas estrangeiras que não tenham filiais no
Brasil poderiam simplesmente fechar as portas para consumidores
domiciliados em território brasileiro, o que evidentemente não foi a
intenção do legislador.
O segundo é que o consumidor que vai em busca de serviços e
produtos de empresas estrangeiras sem filiais no Brasil está
voluntariamente se submetendo à legislação estrangeira. Sua
liberdade de consumidor fora do País acarreta-lhe também a
responsabilidade de atentar para a legislação estrangeira.
O terceiro é que a Lei de Superendividamento só deve alcançar
empresas estrangeiras que se voltem especificamente ao mercado
de consumo brasileiro, o que se dá quando existem filiais no Brasil.

Bem lembra Pablo Stolze que, assim como para o empresário a lei de recuperação judicial
e falências consagrou um procedimento de recuperação, a lei do superendividamento
consagra o seu próprio procedimento de recuperação do superendividado.
OBS: Não se trata de procedimento de insolvência civil.
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Vejamos os dispositivos relacionados:


Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa
natural, o juiz poderá instaurar PROCESSO DE REPACTUAÇÃO DE
DÍVIDAS, com vistas à realização de audiência conciliatória,
presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a
presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste
Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de
pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o
mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e
as formas de pagamento originalmente pactuadas.
(...)
§ 2º O não comparecimento injustificado de qualquer CREDOR, ou
de seu procurador com poderes especiais e plenos para transigir, à
audiência de conciliação de que trata o caput deste artigo acarretará
a suspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dos encargos
da mora, bem como a sujeição compulsória ao plano de pagamento
da dívida se o montante devido ao credor ausente for certo e
conhecido pelo consumidor, devendo o pagamento a esse credor ser
estipulado para ocorrer apenas após o pagamento aos credores
presentes à audiência conciliatória.

Dessa forma, se o credor faltar a audiência conciliatória do procedimento de repactuação


de dívida do superendividado de forma injustificada, ele estará em uma situação
bastante negativa, uma vez que o débito se torna suspenso, serão interrompidos os
encargos da mora, o plano de pagamento será aceito sem contestações e ainda será
alocado no “final da fila”. A realidade é que a lei do superendividamento aloca um dever
aos credores do banco de ajudar o consumidor a sair do superendividamento, e por isso,
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se um banco não comparece a audiência para discutir o plano de pagamento, de fato


devem haver punições.

OBS: Se todos os credores comparecerem, temos:


§ 3º No caso de conciliação, com qualquer credor, a sentença judicial
que homologar o acordo descreverá o plano de pagamento da dívida
e terá eficácia de título executivo e força de coisa julgada.

ATENÇÃO: Não havendo êxito na conciliação:


Art. 104-B. Se não houver êxito na conciliação em relação a quaisquer
credores, o juiz, a PEDIDO DO CONSUMIDOR, instaurará processo
por superendividamento para revisão e integração dos contratos e
repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
COMPULSÓRIO e procederá à citação de todos os credores cujos
créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado.

Conforme Pablo Stolze, Inspirados no modelo francês, que prestigia o direito do


superendividado em obter um novo recomeço, os preceitos acima estabelecem um
procedimento específico destinado a assegurar ao consumidor superendividado o direito
a renegociar as dívidas.
Vale salientar: frustrado o “processo de repactuação de dívidas” (art 104-A), instaura-se
o “processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e
repactuação das dívidas remanescentes” (art. 104-B), caso em que será apresentado um
“plano judicial compulsório”.

OBS: Do ponto de vista processual, o rito aqui é especial. Seguiremos não o


procedimento comum, mas sim um procedimento especial previsto no CDC.
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Teremos uma petição inicial onde seguirá anexo um plano de pagamento indo para a
primeira fase, que é a CONCILIATÓRIA.
Frustrada a primeira fase, dá-se início à segunda (processo de revisão e integração dos
contratos e dívidas).

Conforme Pablo Stolze: “Apesar de os referidos preceitos fazerem menção a ‘processos’,


parece-nos mais adequado que há apenas um processo com duas fases procedimentais:
uma de ‘repactuação de dívidas’ e outra de ‘revisão e integração dos contratos e
repactuação das dívidas remanescentes’, da qual resultará um plano judicial compulsório.
Essa última iniciar-se-á com mera petição do consumidor no bojo do feito após
frustração, total ou parcial, das tentativas de autocomposição. O próprio caput do art.
104-B do CDC dá suporte a essa interpretação, pois sua redação dá noção da existência
de uma linha de continuidade processual”.

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