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Direito do

Consumidor
Da Defesa do Consumidor em Juízo

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª M.ª Christiane Cavalcante Marcellos

Revisão Textual:
Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro
Da Defesa do Consumidor em Juízo

• Introdução;
• Da Defesa Individual do Consumidor;
• Da Defesa Coletiva do Consumidor.


OBJETIVO

DE APRENDIZADO
• Conhecer as regras próprias para a celebração de um contrato de consumo.
UNIDADE Da Defesa do Consumidor em Juízo

Introdução
O Código de Defesa do Consumidor, além de criar normas de proteção ao consumi-
dor, também criou mecanismos processuais para a obtenção dessa proteção, sendo esse
nosso tema de estudo da última unidade, “Da Defesa do Consumidor em Juízo”.

Figura 1 – Juíza trabalhando


Fonte: Getty Images

Sempre que pensamos na defesa do consumidor perante o Poder Judiciário, temos


a ideia de defesa individual, ou seja, consumidor X fornecedor. Mas saiba que a “defesa
dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo
individualmente, ou a título coletivo.” (art. 81, caput).

Observe que interessante, a defesa coletiva, como veremos adiante, constitui princi-
pal ferramenta tratada pelo CDC. Isso porque permite a proteção de vários consumido-
res ao mesmo tempo, já que produz efeito não apenas para o consumidor X ou Y, mas
de modo geral atinge todos aqueles que merecem a mesma proteção. Basta uma única
ação e diversos consumidores serão beneficiados, isso é perfeito.

A defesa coletiva é muito utilizada, por exemplo, nas ações propostas contra planos
de saúde e publicidade enganosa, por abusos praticados a diversos consumidores.

Para a defesa dos direitos e interesses individuais ou coletivos protegidos pelo CDC,
são admissíveis todas as espécies de ações (art. 83), não somente aquelas previstas no
CDC, mas também as previstas em outras leis, como o Código de Processo Civil e a
Lei da Ação Civil Pública.

Por razões didáticas, iremos começar nosso estudo pela defesa individual.

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Da Defesa Individual do Consumidor
Primeiramente, é importante lembramos que são direitos básicos do consumidor,
conforme artigo 6º do CDC:

[...]
VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais,
individuais, coletivos e difusos;
VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à pre-
venção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coleti-
vos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica
aos necessitados.

Figura 2 – Consumidor e advogado


Fonte: Getty Images

Como vimos, a “defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas po-
derá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.” (art. 81, caput).

O CDC, no entanto, sob o ponto de vista do processo, não trouxe artigos específicos
para a proteção individual do consumidor, encontramos artigos aplicáveis às duas defe-
sas (individual e coletiva) ou somente e principalmente à defesa coletiva.

A preocupação maior com a defesa coletiva não prejudica em nada o consumidor em


sua defesa individual, pois aplicamos o Código de Processo Civil, que prevê diversas
ações para proteção individual do consumidor em Juízo. O próprio CDC, aliás, estabe-
lece a aplicação do Código de Processo Civil (art. 90).

Para não nos afastarmos do nosso propósito, que é o Direito do Consumidor, não
iremos analisar o Código de Processo Civil, disciplina autônima, presente nas grades do
curso de Direito.

De modo simples, iremos destacar somente os aspectos processuais trazidos pelo


CDC aplicáveis à tutela individual do consumidor. Vejamos:

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UNIDADE Da Defesa do Consumidor em Juízo

Da competência para a propositura da ação


Vamos começar falando sobre o foro competente para a propositura de ação movida
pelo consumidor.

Imagine que um consumidor da capital de São Paulo tenha comprado um produto


com defeito, de um fornecedor sediado em Recife-PE. Caso o consumidor queira ingres-
sar com uma ação, onde ela será proposta?

Temos uma regra geral que estabelece que o local (foro competente) é o domicílio do
réu. No exemplo acima, se não existisse o CDC, o consumidor teria que ingressar com
a ação em Recife (domicílio do réu), mesmo morando em São Paulo. Você concorda
que se essa regra fosse aplicada ao consumidor, com certeza, dificultaria seu o acesso
ao Poder Judiciário e, provavelmente, seria um desestímulo à busca pelos seus direitos?

A boa notícia é que o CDC existe e protege o consumidor, sabe como? Permitindo
que o consumidor possa ingressar com a ação no seu domicílio, por isso falamos que
o consumidor tem foro privilegiado. Lógico que essa regra facilita, em muito, a defesa
do consumidor.

Art. 101. Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e


serviços, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste título, serão
observadas as seguintes normas:
I – a ação pode ser proposta no domicílio do autor.

Da inversão do ônus da prova


Já estudamos sobre a inversão do ônus da prova, lembra? Como vimos, são direitos
básicos do consumidor: “a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão
do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil
a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiên-
cias.” (art. 6º, inciso VIII).

Para facilitação de sua defesa, portanto, o consumidor tem a seu favor um dos prin-
cipais direitos, que é a inversão do ônus da prova.

A regra do “quem alega prova” não se aplica ao consumidor, pois, quando presentes
1 (um) dos requisitos exigidos pelo CDC, a verossimilhança das alegações do consu-
midor OU a hipossuficiência do consumidor, o juiz poderá inverter o ônus da prova, ca-
bendo então ao fornecedor provar que o consumidor não tem razão. Se, por exemplo,
o consumidor adquire uma TV sem som, não é o consumidor que tem que fazer essa
prova, mas sim o fornecedor que tem que provar a inexistência do vício.

Existe um tratamento diferenciado quando a ação for de responsabilidade civil pelo


fato do produto ou serviço (arts. 12 e 14 do CDC), por ser mais grave, ocorre a inversão
do ônus da prova por força de lei, vale dizer que é automática, não depende da análise
do juiz.

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A desconsideração da personalidade
jurídica nas ações de responsabilidade civil
É de conhecimento geral que a pessoa jurídica também possui direitos e deveres. Con-
sequentemente, ela responde pelas obrigações assumidas com seu próprio patrimônio,
não é o patrimônio do sócio que responde. Se, por exemplo, a pessoa jurídica não pagar
um credor, o juiz poderá determinar a penhora dos bens da pessoa jurídica.

Conclusão, os sócios e a pessoa jurídica são pessoas distintas, há entre eles uma
separação de patrimônio (chamamos de princípio da separação patrimonial). O patrimô-
nio da pessoa jurídica é da pessoa jurídica, o patrimônio dos sócios da pessoa jurídica
é dos sócios.

Ocorre que essa regra não é absoluta, existe uma exceção ao princípio da separação
patrimonial, que é a desconsideração da personalidade jurídica.

O CDC permite que o Juiz desconsidere o princípio da autonomia patrimonial da


Pessoa Jurídica para responsabilizar os sócios pela obrigação assumida pela sociedade.
Dessa forma, os bens particulares dos sócios serão objeto de penhora no processo mo-
vido contra a pessoa jurídica.

A desconsideração da personalidade jurídica ocorre nas ações de responsabilidade


civil, tema já estudado, e está prevista no art. 28 do CDC, que dispõe que:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da socie-


dade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito,
excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatu-
tos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando
houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da
pessoa jurídica provocados por má administração.
§ 1º. (Vetado).
§ 2º. As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades
controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decor-
rentes deste código.
§ 3º. As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas
obrigações decorrentes deste código.
§ 4º. As sociedades coligadas só responderão por culpa.
§ 5º. Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que
sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de
prejuízos causados aos consumidores.

Como se verifica, o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade


quando, em detrimento do consumidor, houver:
• abuso de direito;
• excesso de poder;
• infração da lei, fato ou ato ilícito;
• violação dos estatutos ou contrato social;

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UNIDADE Da Defesa do Consumidor em Juízo

• falência, estado de insolvência ou encerramento ou inatividade da pessoa jurídica


provocados por má administração.

Além das causas acima, por força do § 5° do precitado artigo, também “poderá ser
desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma,
obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.”. De acordo com o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça, para a desconsideração da personalidade
jurídica, “basta que o consumidor demonstre o estado de insolvência do fornecedor ou o
fato de a personalidade jurídica representar um obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos
causados.” (STJ, Resp nº 1.766.093 – SP (2018/0234790-9), 3ª Turma, j. 12/12/2019).

A desconsideração não extingue a pessoa jurídica, não produz qualquer efeito perante
a sociedade em si, a pessoa jurídica continua existindo normalmente. A desconside-
ração tem sua eficácia apenas naquele determinado processo, em relação aos seus
sócios, nada além disso.

Da ação de obrigação de fazer ou não fazer


O artigo 84 do CDC regula a ação de obrigação de fazer e de não fazer, trata-se de
artigo aplicado às duas defesas (individual/coletiva).

Pela ação de obrigação de fazer o juiz determina que o devedor (fornecedor) cumpra
uma determinada prestação. Na obrigação de não fazer, o juiz irá determinar que o de-
vedor (fornecedor) se abstenha de determinada prestação.

Na verdade, o artigo 84 apenas estabelece regras de efetivação da medida, pois a


ação de obrigação de fazer ou não fazer é uma ação regulamentada pelo Código de
Processo Civil. Leia o que diz o art. 84:

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de


fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou
determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente
ao do adimplemento.
§ 1º. A conversão da obrigação em perdas e danos somente será admis-
sível se por elas optar o autor ou se impossível a tutela específica ou a
obtenção do resultado prático correspondente.
§ 2º. A indenização por perdas e danos se fará sem prejuízo da multa (art.
287, do Código de Processo Civil).
§ 3º. Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado
receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela
liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.
§ 4º. O juiz poderá, na hipótese do § 3° ou na sentença, impor multa
diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou
compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento
do preceito.
§ 5º. Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático
equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como

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busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra,
impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial.

O artigo é longo, mas de fácil entendimento, desde que analisado com muita calma.
A principal ideia é a seguinte, o artigo busca a efetivação da tutela específica ou a ob-
tenção do resultado prático equivalente, que são duas maneiras de atingir a mesma coisa:
a tutela específica da obrigação. Ou seja, primeiro o juiz determina que o fornecedor
cumpra a obrigação (de fazer ou não fazer), não sendo possível, o juiz busca assegurar o
resultado prático equivalente ao do cumprimento.
Entenda que a tutela específica nada mais é que a condenação do devedor ao cum-
primento da obrigação de fazer e não fazer.
Para melhor entendimento, segue exemplo do Professor Rizzato:
se a ação foi proposta para impedir que determinado patrocinador veicu-
le publicidade enganosa (obrigação de não fazer) e se se descobrir que a
fita com o anúncio tenha desaparecido ou tenha sido destruída, ou que o
próprio patrocinador esteja se ocultando para evitar a citação ou intima-
ção, pode, ou melhor, deve o magistrado, para cumprir a pretensão legal,
intimar os veículos de comunicação proibindo-os de veicularem o anúncio
enganoso. Com isso o juiz terá obtido o resultado praticado equivalente
e, claro, eficiente. (RIZZATO, 2019, p. 845)

Para a obtenção da tutela específica requerida ou de meios que assegurem o resultado


prático equivalente, o CDC permite que o Juiz determine algumas medidas necessárias,
tais como: “busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra,
impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial (§5º do art. 84).
Também é possível o pedido de liminar, já que o processo costuma demorar e, às
vezes, não é possível esperar a sentença. O CDC permite que o juiz conceda medida
liminar, caso “relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ine-
ficácia do provimento final.” (§3º do art. 84). É o caso, por exemplo, de ingressar com
ação e pedir a concessão de medida liminar para determinar o custeio imediato de tra-
tamento oncológico. Se concedida a medida e o hospital não cumprir, o CDC também
permite que o juiz fixe multa diária (chamada “astreinte”), independentemente do pedido
do consumidor, conforme § 4° do art. 84.
Importante esclarecer que, quando ingressar com a ação, o consumidor deve deixar
claro se pretende que o fornecedor cumpra a obrigação ou se prefere o equivalente em
dinheiro. Detalhe, se o juiz verificar a total impossibilidade do cumprimento da obriga-
ção (exemplo: perda total do bem pretendido), aí o consumidor não tem escolha, caberá
apenas o valor das perdas e danos (prejuízo em dinheiro).
Estudados os principais pontos trazidos pelo CDC sobre a defesa individual do con-
sumidor, vamos partir para a defesa coletiva.

Da Defesa Coletiva do Consumidor


Como vimos, a proteção coletiva constitui o principal foco do CDC, sendo cada vez
mais utilizada no dia a dia, em razão de crescentes abusos cometidos por fornecedores,
que atingem uma grande escala de consumidores.

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UNIDADE Da Defesa do Consumidor em Juízo

Figura 3 – Coletividade de consumidor


Fonte: Getty Images

O processo tradicional é feito para que cada pessoa ingresse com uma ação, caso se
sinta lesado. Não dá para usar essas mesmas regras para o processo coletivo, por isso
que o CDC teve que estabelecer regras específicas para a defesa coletiva.

Como vimos, na definição de consumidor, o CDC tratou do conceito de consumidor


coletivo no parágrafo único do art. 2º e no art. 29. Para a proteção do consumidor co-
letivo, só as pessoas autorizadas pelo CDC podem ingressar com ação coletiva, quando
se tratar de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos (art. 81).

Não se esqueça de que a ação coletiva existe para a defesa dos direitos difusos, direi-
tos coletivos e direitos individuais homogêneos. Vamos estudar cada um desses direitos
e demais temas relevantes para a defesa coletiva do consumidor no CDC.

Dos Direitos Difusos


Segundo o artigo 81 do CDC:

A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá


ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I – interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste
código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares
pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

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Figura 4 – Diversas publicidades
Fonte: Getty Images

Da leitura, podemos identificar que são elementos dos direitos difusos a transindividu-
alidade e a indivisibilidade, além de os titulares serem pessoas indetermináveis.

Por direito transindividual entenda como um direito de toda coletividade, vai além
do indivíduo.

Esse direito não dá para dividir, pois é impossível dizer que um consumidor tem e
outro não. É o caso de uma publicidade enganosa veiculada em um outdoor localizado
em uma rodovia de grande circulação de veículos, tanto o consumidor que adquiriu o
produto, como todos aqueles que foram expostos pela publicidade têm a mesma proteção.
Se o Ministério Público, por exemplo, em ação coletiva, pedir a retirada da publicidade,
todos serão atingidos (quem comprou e quem apenas foi exposto à publicidade enganosa).

No exemplo acima, não dá para saber o número de pessoas que passaram pela rodo-
via, mas sabemos que todas estão ligadas pelo mesmo fato, a exposição a uma publicidade
enganosa. Por afetar um número indeterminado de pessoas (coletividade), é considerado
um direito difuso.

Para melhor compreensão, leia trecho de um julgamento proferido pelo Tribunal de


Justiça de São Paulo, sobre direitos difusos:

Seus titulares são pessoas indeterminadas e indetermináveis, que não


podem ser identificadas com precisão, e não possuem entre si uma rela-
ção base bem definida, reduzindo-se o vínculo entre eles a fatores gené-
ricos, como, por exemplo, habitar a mesma região, consumir o mesmo
produto, ser investidor no mercado de capitais etc. (TJSP, Apelação Cí-
vel nº 1000058-96.2020.8.26.0450, 25ª Câmara de Direito Privado, j.
31/03/2021)

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UNIDADE Da Defesa do Consumidor em Juízo

Dos Direitos Coletivos


Segundo o inciso II, do parágrafo único do artigo 81, a defesa coletiva será exercida
quando se tratar de:

interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste có-


digo, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo,
categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária
por uma relação jurídica base.

Estão presentes os mesmos elementos que vimos nos direitos difusos, a transindivi-
dualidade e a indivisibilidade. Só que tem uma diferença, nos direitos difusos, os titulares
são pessoas indeterminadas, nos direitos coletivos, os titulares são pessoas determina-
das ou determináveis.

Quem são essas pessoas? São aquelas ligadas por uma mesma relação jurídica de base.
Como diz o CDC, são aquelas pertencentes ao mesmo grupo, categoria ou classe. Por
exemplo, são todas as pessoas usuárias do mesmo seguro saúde, da mesma empresa de
telefonia. São muitos, até milhares, sendo certo que a sentença irá beneficiar, por exem-
plo, todos que contrataram aquele plano de saúde ou aquela mesma empresa de telefonia.

Importante!
“Nos chamados “direitos coletivos” os titulares do direito são também indeterminados,
mas determináveis. Isto é, para a verificação da existência de um direito coletivo não
há necessidade de se apontar concretamente um titular específico e real. Todavia, esse
titular é facilmente determinado, a partir da verificação do direito em jogo.” (RIZZATO,
2019, p. 819).

Dos Direitos Individuais Homogênios


Por último, temos os interesses ou direitos individuais homogêneos, disciplinado pelo
artigo 81 do CDC, inciso III, que diz que são “interesses ou direitos individuais homogê-
neos, assim entendidos os decorrentes de origem comum”.

Os interesses individuais homogêneos possuem sujeitos determinados, como no co-


letivo, mas diferem quanto ao objeto. Em relação aos interesses coletivos, o objeto é
indivisível, já em relação aos interesses individuais homogêneos, o objeto é divisível.

Temos como exemplo de direito individual homogêneo a queda de um avião, em que


a ação coletiva procedente beneficia todas as vítimas. Citamos, ainda, caso julgado pelo
Tribunal de Justiça do Direito Federal e dos Territórios:

Tem-se caracterizado como direito individual homogêneo o reajuste de


mensalidades de academias de ginásticas, oriundas de contratos por ade-
são, em razão da grande repercussão social da questão, já que afeta uma
quantidade considerável de consumidores lesionados por cláusulas con-
tratuais abusivas. (Acórdão n. 924441, 3ª Turma Cível, J. 4/2/2016)

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Quem Pode Propor as Ações Coletivas
Em regra, a pessoa entra com uma ação em nome próprio e a decisão proferida pro-
duz efeitos somente entre as partes envolvidas, autor (consumidor) e réu (fornecedor).
Quando a ação for proposta em nome de vários consumidores, somente quem a lei
autoriza pode ingressar com a ação coletiva.
Assim, a propositura de uma ação coletiva não é para qualquer um. O CDC diz ex-
pressamente quem são as pessoas que podem propor as ações coletivas de interesses
dos consumidores:

Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados con-
correntemente:
I – o Ministério Público;
II – a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;
III – as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta,
ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defe-
sa dos interesses e direitos protegidos por este código;
IV – as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que
incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos
protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear.
§ 1º. O requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas
ações previstas nos arts. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse
social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela rele-
vância do bem jurídico a ser protegido.

Dos citados acima, importante dizer que qualquer um pode entrar com a ação coletiva,
não existe ordem de preferência.
De acordo com a Súmula 601 do Superior Tribunal de Justiça, “o Ministério Público
tem legitimidade ativa para atuar na defesa de direitos difusos, coletivos e individuais
homogêneos dos consumidores, ainda que decorrentes da prestação de serviço público”.
Para a defesa dos interesses individuais e homogêneos, prevê o art. 91 que “os legiti-
mados referidos no art. 82 poderão propor, em nome próprio e no interesse das vítimas
ou seus sucessores, ação civil coletiva de responsabilidade pelos danos individualmente
sofridos.” O Ministério Público, se não ajuizar a ação, atuará sempre como fiscal da lei
(art. 92). Ademais, segundo o art. 93, ressalvada a competência da Justiça Federal, é
competente para a causa a justiça local:

I – no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de


âmbito local;
II – no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos
de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Pro-
cesso Civil aos casos de competência concorrente.

Das Custas e Despesas Processuais nas Ações Coletivas


Você já entrou com algum processo judicial? Quem já entrou sabe o que e o quanto um
processo custa.

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UNIDADE Da Defesa do Consumidor em Juízo

Em se tratando de ações coletivas, o CDC isenta o autor da ação de qualquer paga-


mento, conforme art. 87:

Nas ações coletivas de que trata este código não haverá adiantamento de
custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas,
nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em ho-
norários de advogados, custas e despesas processuais.
Parágrafo único. Em caso de litigância de má-fé, a associação autora e
os diretores responsáveis pela propositura da ação serão solidariamente
condenados em honorários advocatícios e ao décuplo das custas, sem pre-
juízo da responsabilidade por perdas e danos.

A isenção foi determinada pelo CDC para facilitar a defesa dos direitos dos consumidores.

Segundo o STJ, “a isenção prevista no art. 87 do Código de Defesa do Consumidor destina-se


apenas às ações coletivas, não se aplicando às ações em que sindicato ou associação buscam
o direito de seus associados ou sindicalizados.” (AgInt no AREsp 681.845/AL, 1ª Turma, j.
13/12/2018).

Dos Efeitos da Sentença nas Ações Coletivas


Primeiramente, temos que ter em mente que a ação coletiva não pode prejudicar o con-
sumidor. É um instrumento benéfico, que visa à proteção do consumidor de forma coletiva.

Para sabermos qual efeito a decisão proferida na ação coletiva produz ao consumidor,
temos que entender o que significa coisa julgada. Dentro de um processo, as partes po-
dem ingressar com diversos recursos, mas existe um momento que isso não pode mais
acontecer e a decisão torna-se imutável. Essa qualidade de tornar a sentença imutável é
a coisa julgada.

Importante!
Segundo o Código de Processo Civil, “denomina-se coisa julgada material a autoridade que
torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.” (art. 502 do CPC).

Os efeitos da coisa julgada são diferentes nas ações coletivas de proteção aos direitos
difusos, coletivos e individuais homogêneos. Nosso estudo tem por base o artigo 103 do
CDC, que será analisado a seguir.

Efeitos da coisa julgada nas ações coletivas de proteção aos direitos difusos
Imagine que o processo chegou ao fim, não cabendo mais recurso (fez coisa julgada).
Vamos começar analisando os efeitos da coisa julgada nas ações coletivas de proteção
aos direitos difusos.

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Desde já saiba que o efeito é erga omnes, significa dizer que a coisa julgada produz
efeitos para todas as pessoas. Melhor explicando:
• Se julgada procedente: todos os consumidores serão beneficiados (art. 103, I);
• Se julgada improcedente, não importa o motivo: o consumidor poderá ingres-
sar com ação individual com o mesmo pedido da ação coletiva (§1º do art. 103).
O resultado negativo não atinge o consumidor, somente o positivo.

Sobre a improcedência da ação, caso tenha se dado por insuficiência de provas, NÃO
produz efeitos erga omnes, podendo ser novamente proposta pelos legitimados do ar-
tigo 82, incluindo aquele que ingressou com a ação, valendo-se de novas provas (art.
103, I).

Você se lembra do exemplo da publicidade enganosa? O resultado positivo da ação


coletiva, como a retirada da publicidade, por exemplo, atinge todas as pessoas que com-
praram o produto, como também aquelas que foram expostas à publicidade enganosa.

Efeitos da coisa julgada nas ações coletivas de proteção aos direitos coletivos
De novo, imagine que o processo chegou ao fim, não cabendo mais recurso (fez coisa
julgada). Vamos analisar os efeitos da coisa julgada nas ações coletivas de proteção aos
direitos coletivos.

A lei fala em efeito ultra partes, significa que só vai produzir efeitos para as pessoas
integrantes do mesmo grupo, categoria ou classe. Assim, temos que:
• Se julgada procedente: todas as pessoas envolvidas pela mesma relação jurídica
(mesmo grupo, categoria ou classe) serão beneficiadas. Por exemplo, todos os usu-
ários de determinado plano de saúde;
• Se julgada improcedente: o consumidor poderá ingressar com ação individual e
fazer o mesmo pedido que foi feito na ação coletiva.

Sobre a improcedência da ação, caso essa tenha se dado por insuficiência de provas,
pode ser novamente proposta pelos legitimados do artigo 82, incluindo aquele que in-
gressou com a ação, valendo-se de novas provas (art. 103, II).

Efeitos da coisa julgada nas ações coletivas de proteção


aos direitos individuais homogêneos
Imagine, agora pela última vez, que o processo chegou ao fim, não cabendo mais
recurso (fez coisa julgada). Agora resta saber quais os efeitos da coisa julgada nas ações
coletivas de proteção aos direitos individuais homogêneos.

Assim como visto nos direitos difusos, a ação beneficia todas as vítimas (efeito erga
omnes). Em resumo:
• Se julgada procedente, beneficia todas as vítimas (consumidores);
• Se julgada improcedente, em regra não atinge as vítimas (consumidores).

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Detalhe importante não visto nos direitos anteriores: para esse tipo de ação coletiva
(proteção de direitos individuais homogêneos), a lei permite a participação da vítima,
que é facultativa.

O interessado fica sabendo da ação coletiva (proteção de direitos individuais homo-


gêneos), pela publicação de editais no órgão oficial e também por outros meios de co-
municação por órgãos de defesa do consumidor. (art. 94). Se quiser fazer parte da ação
coletiva e ela for improcedente, produz efeito negativo para ele, o que significa dizer que
não poderá ingressar com ação individual (§ 2º do art. 103).

Voltando ao exemplo da queda do avião. Mesmo que a ação coletiva tenha sido julgada
improcedente, a vítima pode ingressar com ação individual, salvo se fez parte da ação coletiva.

Ação individual X Ação coletiva


Como vimos, as ações para defesa dos direitos difusos e coletivos beneficiam todos
os consumidores indeterminados expostos aos direitos difusos, bem como todos os de-
termináveis dos direitos coletivos. Isso se resolve pela ação de obrigação de fazer e não
fazer, já estudada.

No caso de ação coletiva para defesa dos interesses individuais homogêneos, o juiz
fixa uma indenização genérica, mas cada consumidor atingido deve individualmente
provar o valor de seu dano.

No caso da queda do avião, podem existir duas ações, uma coletiva (proteção aos
direitos individuais homogêneos e direitos coletivos) e outra individual, proposta pelo
familiar da vítima fatal, com a mesma causa de pedir.

Não tem problema em haver as duas ações, mas, se a vítima quiser se beneficiar dos
efeitos da sentença proferida na ação coletiva, precisa pedir suspensão do seu processo,
no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.
Se não pedir a suspensão, não será beneficiado (art. 104).

Conclusão, se a ação para a defesa de interesses individuais homogêneos for julgada


procedente, atinge todas as vítimas, exceto aquelas que não pediram a suspensão do
processo e tiveram seu pedido negado.

Mais um detalhe importante: se ação coletiva para a defesa de interesses individuais


homogêneos for julgada procedente, o consumidor não é automaticamente indenizado.
Segundo o CDC, no artigo 97, “a liquidação e a execução de sentença poderão ser
promovidas pela vítima e seus sucessores, assim como pelos legitimados de que trata o
art. 82”. Ou seja, os consumidores podem promover o cumprimento da sentença.

Se, “Decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em número


compatível com a gravidade do dano, poderão os legitimados do art. 82 promover
a liquidação e execução da indenização devida.” (art. 100). Nesse caso, o produto da
indenização não vai para o consumidor, vai para o fundo criado pela Lei n.º 7.347, de 24
de julho de 1985 (parágrafo único do art. 100).

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Vídeos
STJ – Superior Tribunal de Justiça
Publicação de condenação em ação coletiva deve ser feita na internet.
https://youtu.be/7HvpnIz1zrg

Leitura
Código de Defesa do Consumidor
Recomendamos a leitura dos artigos 81 ao 100, estudados na presente unidade.
https://bit.ly/3vyLrY0
Direitos do consumidor
https://bit.ly/34riaT3
Superior Tribunal de Justiça
O link irá direcioná-lo ao julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, sobre inte-
resse individual homogêneo. Recomendamos leitura, tenha certeza que será muto proveitosa.
https://bit.ly/34op37K

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UNIDADE Da Defesa do Consumidor em Juízo

Referências
NUNES, R. Curso de direito do consumidor. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. (e-book)

________. O Código de Defesa do Consumidor e sua interpretação jurisprudencial.


5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. (e-book)

THEODORO JUNIOR, H. Direitos do consumidor. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense,


2017. (e-book)

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