Você está na página 1de 15

GUIA-INTÉRPRETE OU INSTRUTOR MEDIADOR: PERCEPÇÕES DE UMA

PROFESSORA ESPECIALISTA

Autora: Shirley Alves Godoy


Eixo temático: Surdocegueira
Categoria: Comunicação oral

RESUMO:

Este estudo foi desenvolvido por meio de uma entrevista com uma professora
especialista em educação especial na função de guia-intérprete e de instrutora
mediadora atuando junto a uma aluna com surdocegueira em sala de aula do ensino
regular e em um Centro de Atendimento Especializado na área da Surdocegueira
(CAESC) da Rede Pública Estadual de Ensino na região norte do estado do Paraná. O
objetivo foi investigar a percepção da professora quanto às peculiaridades do seu
trabalho, destacando a clareza quanto às funções necessárias a serem desempenhadas:
seja como guia-intérprete ou instrutor mediador, profissionais considerados
fundamentais junto a esse público, tanto no desenvolvimento social quanto no processo
ensino/aprendizagem, buscando um serviço mais efetivo. Os resultados obtidos
evidenciaram a necessidade de clarificar as duas funções devido às dúvidas e
dificuldades que a professora especialista vivenciou dado o fato do atendimento a estes
alunos em classe da rede regular de ensino ser recente na região pesquisada.

Palavras Chaves: Surdocegueira; Instrutor mediador; Guia-intérprete.

1. Introdução
O relato que ora se segue surgiu da necessidade de realizarmos uma
investigação quanto à percepção de uma professora especialista na área da Educação
Especial que atendia uma aluna com surdocegueira em classe da rede regular de ensino
e no contra turno em um Centro de Atendimento Especializado da área da
Surdocegueira (CAESC) da Rede Pública Estadual de Ensino na região norte do estado
do Paraná, quanto ao processo de inclusão da educanda com surdocegueira, a
configuração das práticas desenvolvida e dos saberes adquiridos pela profissional como
também a compreensão do trabalho desenvolvido.

Em 2009, uma família residente no município procurou uma vaga de


matrícula para a 5ª série/6º ano do ensino fundamental em escola da rede estadual para a
filha deficiente visual que também utilizava aparelho auditivo.
Percebendo tratar- se de um caso de surdocegueira, foi necessário
buscar subsídios para a construção de serviços de apoio ao processo de inclusão da
aluna com surdocegueira no ensino regular, sendo então a primeira experiência no
estado.

Dessa forma, foi a partir do atendimento desse caso que se


organizaram os objetivos previstos no presente artigo que consistem no esclarecimento
dos papéis dos profissionais: guia-intérprete e instrutor mediador.

2. Fundamentação teórica

2.1 – Educação Inclusiva


O paradigma da educação inclusiva objetiva fundamentalmente a
construção de uma sociedade pautada nos princípios humanitários, fraternos e
solidários; para tanto minimizando o preconceito sob qualquer forma e a exclusão do
indivíduo que possa ocorrer durante o processo educacional, onde a participação
individual e coletiva seja oportunizada a todos os atores do processo educativo,
independente de condições quer seja de gênero, raça, credos religiosos, situação
socioeconômicas e características pessoais.
Baseando-se nesses princípios, segundo Ferreira (2005, p.40-46) o
processo de inclusão na escola representa:

Há um consenso que inclusão implica em celebrar a diversidade


humana e as diferenças individuais como recursos existentes nas
escolas e que devem servir ao currículo escolar para contribuir na
formação da cidadania. Diversidade e diferenças constituem uma
riqueza de recursos para a aprendizagem na sala de aula, na escola e
na vida.

Quanto ao educando em condição de surdocegueira, quando os


sentidos da visão e da audição encontram-se seriamente comprometidos, dificultando o
processo ensino/aprendizagem.

Faz-se necessário desenvolver procedimentos alternativos de


aprendizagem e adaptação ao meio, neutralizando as limitações decorrentes da ausência
desses sentidos e estabelecendo alguma forma de comunicação com o outro.
2.2 – Caracterização da surdocegueira
A Surdocegueira é uma área que nos últimos anos vem sendo bastante
discutida pelos profissionais da educação e pelos órgãos governamentais que
estabelecem as políticas de atendimento. Ela é definida e aceita pelos especialistas que
atuam na área, pelo Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo Sensorial, uma
rede nacional criada por profissionais, pais e pessoas com surdocegueira em 1997.

É uma deficiência singular que apresenta perdas auditivas e visuais


concomitantemente em diferentes graus, levando a pessoa surdocega a
desenvolver diferentes formas de comunicação para entender e
interagir com as pessoas e o meio ambiente, proporcionando-lhes o
acesso a informações, uma vida social com qualidade, orientação,
mobilidade, educação e trabalho (GRUPO BRASIL, 2003).

2.2 1- Terminologia

O termo hifenizado surdo-cegueira outrora utilizado indicava a


somatória do déficit ocasionada pela surdez e pela cegueira. Salvatore Lagati (1995), do
Serviço da Consultoria Pedagógica em Trento, Itália sugeriu em 1991, que a
nomenclatura surdocego e surdocegueira sem o hífen fosse reconhecida como
deficiência única, o que foi acatada por diversos países de idiomas espanhol, inglês e
português.

2.3 – Classificação da surdocegueira

Quanto à época do surgimento da surdocegueira, podemos classificá-


la como surdocegueira pré-linguística ou congênita e surdocegueira pós-linguística ou
adquirida.

A surdocegueira pré-linguística ou congênita1, como o caso que


abordamos, segundo Maia (2008, p. 12) ocorre quando há perda visual e auditiva antes
da aquisição de uma língua, seja ela oralizada – Língua Portuguesa ou visual espacial –
Língua Brasileira de Sinais/Libras.

1
Surdocegueira pré-linguística é a terminologia adotada para identificar pessoas que nascem
surdocegas ou adquirem a surdocegueira na mais tenra idade, ou seja, antes da aquisição de uma
língua (português ou Língua Brasileira de Sinais). Também conhecida como surdocegueira
congênita, caracterizada pela perda da visão e audição durante a gestação.
A surdocegueira pós-linguística ou adquirida, segundo Maia (2008 p.
12), ocorre em indivíduos que apresentam uma deficiência sensorial primária (auditiva
ou visual) e no decorrer de sua existência adquire a outra após a aquisição de uma
língua (Língua Portuguesa ou Língua de Sinais), como também ocorre à aquisição da
surdocegueira sem outros antecedentes.

2.4.– Caracterização do atendimento aos alunos com surdocegueira

Para atender os alunos com surdocegueira, as escolas necessitam


desenvolver, além do currículo formal baseado nas atividades tradicionais da escola
(conceitos básicos de matemática, leitura e escrita, etc.), um currículo com objetivos
funcionais adequados à faixa etária e às necessidades específicas desses educandos.
Segundo Frederico, (2006, p.12-13):

Os métodos e técnicas para o aprendizado do surdocego são


específicos, pois essa é uma deficiência única, que requer práticas
próprias, metodologias e técnicas diferenciadas que atendam suas
especificidades, diferentes das utilizadas para a cegueira e para a
surdez. Assim, é indispensável que se utilize uma abordagem
curricular apropriada para atender a criança com surdocegueira. O
currículo funcional ou ecológico vem ao encontro do atendimento de
suas demandas diferenciadas de aprendizagem e das necessidades de
cada individuo no tocante à saúde, educação e comunicação, pois sua
abordagem contempla, de forma abrangente, as prerrogativas mínimas
indispensáveis à sobrevivência social do indivíduo surdocego.

Para Maia, os ambientes deverão ser adequados à diversidade dos


alunos, isentos de barreiras arquitetônicas, adaptados em termos visuais e sinalizados
com referências indicativas do local.

Os materiais devem ser apropriados às necessidades do educando, tais


como cores contrastantes, texturas diferenciadas, objetos de referência que facilitem a
identificação dos locais pelos educandos e sua mobilidade nesses espaços.

Organizar a educação de maneira sistemática, utilizando técnicas e


recursos que ajudem o aluno com surdocegueira a formar a imagem mental do mundo,
simbolizar conceitos e estabelecer a comunicação.
Um currículo modificado de acordo com suas necessidades específicas
nem sempre deverá seguir normas acadêmicas do currículo tradicional, mas sim adequar
atividades funcionais de acordo com o desenvolvimento do aluno.

Cabendo aos profissionais que interagem com o educando,


oportunizar contato com os diferentes ambientes e pessoas, respeitando sua
individualidade, seu tempo de elaboração, contribuindo para a construção de sua
identidade e capacidade em exprimir escolhas e decisões.

2.5 – Orientações do MEC quanto ao atendimento ao aluno com surdocegueira

As orientações do MEC podem ser encontradas detalhadamente no


material didático de formação de docentes produzido pelo MEC/SEESP (2006), junto à
série Saberes e práticas da inclusão – Educação Infantil o livro nº 5 “Dificuldades de
Comunicação e Sinalização Surdocegueira Múltipla Deficiência Sensorial”, elaborado
por Cader-Nascimento e Maia, segundo as autoras (2006, p.53)

O processo educativo de crianças surdocegas exige alterações no


currículo, nas estratégias e nos recursos que nem sempre são fáceis de
concretizar em uma sala de aula tradicional. A atuação dos
especialistas se torna significativa quando acontece no cotidiano das
atividades escolares, como apoio à atuação do professor da classe
regular. Incluir crianças surdocegas com necessidades educacionais
específicas nas escolas de ensino regular exige atenção às suas
respostas e ao seu progresso na escola. Assim, a oferta de serviços de
apoio pedagógico especializado constituirá uma alternativa de
qualidade, sobretudo se forem levadas em conta determinadas
características dessa população e as especificidades do seu
atendimento educacional.

Com relação à oferta de atendimento, Cader-Nascimento e Maia


(2006, p.53) indicam os seguintes que:

Em todo o processo, é fundamental assegurar que a criança surdocega


matriculada e frequentando sala de aula no ensino regular tenha o
direito a guia-intérprete; instrutor de língua de sinais; material
adaptado no Sistema Braille ou ampliado em alto relevo; máquina
Braille modelo Perkins; objetos e formas necessárias para sua
comunicação; ampliação do tempo para realização das avaliações
aplicadas pelo professor; frequentar a sala de apoio especializado e a
sala de recursos; participar de ambientes comuns à comunidade surda,
ampliando assim seu universo de contatos com pessoas e ambientes.
2.6 – Características dos profissionais que atendem às pessoas com surdocegueira

A oferta de serviços educacionais que promovem a inclusão do


educando com surdocegueira no sistema regular de ensino, são poucos, visto que há
dificuldades no processo educativo, principalmente no que concerne ao estabelecimento
comunicação com o outro.

Sendo, então necessário capacitar profissionais para atuarem na área,


além de haver fatores que são determinantes quanto ao perfil desses profissionais como:
a ética, a seriedade e o compromisso profissional.

Ao iniciar um trabalho com um aluno com surdocegueira é


fundamental conhecer as necessidades que este aluno apresenta e ter como objetivo a
superação das dificuldades.

Os profissionais que dispõem desses conhecimentos específicos são


poucos na atual realidade brasileira, mas é grande o número de
pessoas com surdocegueira e múltipla deficiência que necessitam de
orientação específica básica para ter condições mínimas de qualidade
de vida, ou seja: comunicação, independência nas atividades de vida
diária (alimentação, higiene e vestimenta) e orientação e mobilidade
visando autonomia para realização dessas ações (MAIA, 2004: p.2).

Segundo recomendações do Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e


“AHIMSA” Associação Educacional para Múltipla Deficiência, instituições
responsáveis pelas orientações dos profissionais da área, os profissionais guia-intérprete
e instrutor mediador.
Para atuar com esse alunado os profissionais necessitam ter formação
de especialista em Educação Especial e realizar cursos específicos para guia-intérprete e
para instrutor mediador, além de, dependendo da condição do aluno, adquirir
conhecimentos próprios da área visual e da surdez.
Nesse caso específico, a docente fez complementação de instrutor-
mediador e guia-intérprete, ofertado pelo Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e
“AHIMSA” Associação Educacional para Múltipla Deficiência.
Apresentaremos as responsabilidades e as especificidades da atuação
desses profissionais citados.
O profissional instrutor mediador atua com pessoas com
surdocegueira pré-linguística ou congênita, ele contribui no processo de ensino
aprendizagem como um elo de comunicação, realizando a mediação entre o educando e
o mundo ao seu redor, capacitando-o quanto a comunicação com seu ambiente de
maneira a receber informações fidedignas, o instrutor-mediador é:

Um profissional que não pode substituir o professor e nem ser


substituído por outros profissionais, pois ele tem conhecimento de um
sistema alternativo de comunicação e formas individuais de
comunicação com o aluno que abrangem a recepção e a expressão;
oferece informações conceituais e adicionais sobre o que ocorre ao
redor do aluno para sua total compreensão. Sua função é de estar
sempre com o aluno em todos os lugares que ele frequenta e, se
necessário, preparar e adaptar materiais para que ele possa entender e
participar das atividades, principalmente as escolares (MAIA, 2008, p.
42).

A essência do seu trabalho é de ser objetivo nas informações dadas,


cuidar para que elas não sejam distorcidas, permitindo que a pessoa com surdocegueira
pré-linguística ou congênita tenha condições para assumir responsabilidades pelos seus
atos.

Outro profissional é o guia-intérprete que atua com a pessoa com


surdocegueira pós-línguistica ou adquirida.

Para exercer a função de guia-intérprete o profissional necessita


apresentar formação complementar específica, ter conhecimento de técnicas e
habilidades de diferentes formas de comunicação para que possa transmitir as
mensagens à pessoa com surdocegueira, facilitando a comunicação e a interação com o
meio, favorecendo o deslocamento e a mobilidade em todos os ambientes, ou seja,
desde o mais restrito até o mais amplo.

Sua ação consiste em passar informações para a pessoa com


surdocegueira pós-linguística ou adquirida fidedignas, sem interferir no conteúdo da
mensagem, mantendo absoluto sigilo das informações, obedecendo à ética profissional.
Sua função é basicamente:

Na transmissão da mensagem, o guia-intérprete pode realizar um


trabalho de transliteração ou interpretação. No caso da transliteração,
o guia-intérprete recebe a mensagem em determinada língua e
transmite à pessoa com surdocegueira na mesma língua, porém usando
a forma de comunicação acessível a essa pessoa, por exemplo, o guia-
intérprete ouve a mensagem em língua portuguesa e a transmite em
Braille tátil. Diferentemente da situação de interpretação, quando o
guia-intérprete recebe a mensagem em uma língua e deve transmiti-la
em outra língua, por exemplo, o guia-intérprete ouve a mensagem em
língua portuguesa e a transmite em LIBRAS tátil.( Grupo Brasil,
2009, p.47).

Com relação à contextualização, o procedimento do profissional guia-


intérprete consiste em:

Na contextualização, o guia-intérprete descreve o que ocorre no


ambiente, às pessoas e os fatos. Isso inclui toda a informação que seja
relevante para a compreensão da situação em que a pessoa com
surdocegueira está inserida, como por exemplo, quem está presente,
sua localização, inclusive expressões faciais, corporais e flexões de
voz, pois apenas a transmissão da mensagem falada não é suficiente
para atender as necessidades comunicativas da pessoa com
surdocegueira para que ela possa compreender e participar
integralmente da situação comunicativa (Grupo Brasil, 2009, p.47).

Na contextualização, o guia-intérprete deverá fazer a descrição visual


dos objetos, ambientes e pessoas, e ficar atento a fatores como a finalidade da descrição
e o tempo disponível para realizá-la, informando o todo e posteriormente os detalhes.

O procedimento desse profissional reside em proporcionar:

[...] que as pessoas com surdocegueira se locomovam com segurança


nas diversas situações, como por exemplo, andar, subir escadas,
caminhar em espaços estreitos, entrar e sair de carros ou transportes
coletivos, usar portas e outros. Isso é feito utilizando as técnicas de
orientação e mobilidade do guia vidente, que no caso e pessoas com
surdocegueira passam por algumas adaptações. (Grupo Brasil, 2009,
p.48).

O guia-intérprete deverá favorecer a pessoa com surdocegueira pós-


linguística ou adquirida a ter acesso a locais variados, intermediando o contato com
outras pessoas, atividades e ambientes, podendo tomar decisões de maneira autônoma e,
assim, poder exercer sua cidadania.

2.7 - Problema
Para esse estudo tivemos como indagação a seguinte questão: O que
diferencia a atuação dos profissionais: guia-intérprete e instrutor-mediador e qual a
importância do trabalho de cada um deles para o desenvolvimento da pessoa com
surdocegueira que se encontra em fase de escolarização?

2.8 - OBJETIVOS
2.8 1- Geral
Analisar as características da atuação dos profissionais: guia-intérprete
e instrutor-mediador e as especificidades do trabalho de cada um deles.
2.8 2- Específico
Identificar as semelhanças e diferenças na atuação dos profissionais:
Guia-intérprete e instrutor-mediador e as especificidades do trabalho de cada um deles
no atendimento educacional especializado à pessoa com surdocegueira em classe
comum e AEE no contra turno.
2.9 – MÉTODO
2.9.1 - Caracterização da pesquisa:
Essa pesquisa constituiu- se em um estudo de caso, em que foram
utilizados como procedimentos para a coleta de dados a entrevista e a observação no
contexto de sala de aula.
2.9.2 - Procedimentos:
A coleta dos dados deu-se no primeiro momento por meio de
observação direta em sala de aula e no CAESC objetivando a identificação da função de
guia-intérprete e de instrutor-mediador em ambos ambientes de atuação da professora.
A técnica escolhida foi o registro contínuo, no período de agosto a
dezembro de 2011, sendo de segunda-feira a sexta-feira, durante as cinco (05) aulas, no
período vespertino sala de aula e matutino CAESC.
No segundo momento, através de uma entrevista concedida pela
professora guia-intérprete ou instrutora mediadora, tendo como local o CAESC, um
ambiente silencioso sem interrupções por parte de outras pessoas.
Para a entrevista foi elaborado um roteiro semiestruturado, constituído
de seis questões que versavam sobre seu trabalho e sua percepção quanto às
peculiaridades da atuação do profissional guia-intérprete e do profissional instrutor-
mediador, a saber: 1) A importância do papel do instrutor-mediador? 2) A importância
do papel do guia-intérprete? 3)As dificuldades enfrentadas pelos professores? 4) As
dificuldade que encontrava em sua atuação? 5) A importância de ambas as funções? 6)
O papel por ela desempenhado em sala de aula: guia-intérprete ou instrutora mediadora?
7) Os aspectos que julgava fundamentais na formação para desenvolver suas funções.
Solicitamos a aquiescência da entrevistada para a utilização de um
gravador, objetivando a maior precisão das informações.

2.10 – Local da realização do estudo


O estudo foi realizado nas dependências de um colégio da rede
estadual de ensino localizado no centro de uma cidade de grande porte na região norte
do estado do Paraná.
2.11 – Público alvo
Os participantes desse estudo foram: uma professora de apoio do
Quadro próprio do Magistério/QPM, realizando a função de guia-intérprete e instrutora
mediadora com formação em pedagogia, especialização em Educação Especial e
formação especifica de guia-intérprete e instrutora mediadora, atuando na Rede
Estadual de Ensino do estado do Paraná há sete anos.

3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO
Apresentaremos inicialmente as percepções da profissional quanto
ambas as funções relatadas por meio da entrevista concedida e posteriormente as
impressões da pesquisadora quanto as ações da docente ocorridas durante o período de
observações ocorrida em sala de aula e no CAESC/AEE.

3.1 Papel do instrutor-mediador segundo a participante


A professora entrevistada apresenta a importância do instrutor-
mediador ao relatar que:
[...] primeiro sobre o instrutor-mediador: a importância dele é claro
que ele faz parte do processo da inclusão principalmente em relação à
aluna surdocega [...] ele estará adaptando materiais, fazendo a ponte
entre professor e aluna, aluna e professor no ambiente escolar.

3.2- Papel de guia-intérprete segundo a participante

Segundo a entrevistada a principal função como guia-intérprete em


sala de aula é a comunicação de maneira fidedigna das aulas para aluna:
[...] os professores vão explicar o conteúdo e eles usam o livro então
aquelas cinco aulas se eles forem explicar oralmente, o guia-intérprete
vai falar as cinco aulas para a aluna e prestando atenção o máximo pra
ser fidedigno. [...] tudo o que ocorre o guia-intérprete tem que falar
para a aluna né, porque muitas vezes se você fica em silêncio, abre-se
a porta [...] ela vai sentir e vai querer saber o que está acontecendo.
Então, você tem que ter o cuidado de falar né. A pessoa entrou, eu falo
o nome, explico o que está acontecendo.

3.3 Às dificuldades dos professores segundo a participante:

Na fala da participante, há relatos do cotidiano que nos possibilitam


identificar o papel do instrutor-mediador, especialmente, quando a aluna com
surdocegueira tem dúvidas em relação aos conteúdos, como também as dificuldades
vividas pelos professores nas ocasiões em que desejam se comunicar com ela.
[...] se o professor está lendo uma história, a aluna não conhece a
palavra, o seu significado [...] aí não consegue compreender o
restante, em primeiro lugar ela pergunta para o instrutor-mediador, se
o instrutor-medidor não conseguir responder, ele chama o professor e
fala que a aluna está querendo saber o significado de tal palavra.

[...] a aluna pergunta, só que às vezes eles não entendem o que ela está
falando, como a minha convivência é maior que a deles, aí eu faço a
fala dela [...] ela fala primeiro do jeito dela, aí eles olham pra mim
assim e diz que não entenderam [...] eu pergunto pra ela é isso aí? A
aluna confirma, e eles respondem para ela [...] nesse sentido de
conteúdo mesmo é eles que vêm explicar.

3.4 – A importância dos dois papéis segundo a participante:


Para a entrevistada é muito importante os dois papeis, relata que:
[...] a responsabilidade é muita então, o guia-intérprete e o instrutor-
mediador faz o processo da aprendizagem com a aluna [...] ele tem a
responsabilidade de buscar, de pesquisar, não só lá na sala de aula [...]
conhecer a aluna, perceber o que ela tem de conhecimento. [...] se não
tem a noção do que o professor está explicando, vai ter que buscar pra
que ela possa ter compreensão daquele conteúdo.

3.5 – Qual o papel desempenhado pela professora em sala de aula:


Segundo a participante, ambas as funções ocorrem em sala de aula em
diferentes ocasiões e em alguns momentos de forma simultânea e exigindo muito dela,
como podemos perceber nos relatos a seguir:
[...] no caso do guia-intérprete porque é assim ora às vezes quem está
lá na sala de aula faz o papel de instrutor-mediador ora guia-intérprete
[...] ora os dois ao mesmo tempo, ora você faz a fala ampliada e do
outro lado está escrevendo no papel.
[...] muitas vezes o professor escreve no quadro, ele fala e aí eu tenho
que fazer a fala ampliada pra aluna e escrever com a outra mão, então
eu fico com a cabeça virada um pouco no ouvido da aluna, me
posiciono e viro um pouco, a coluna né [...] e ao mesmo tempo
escrever e o olho está no quadro anotando para que a aluna não perca
o conteúdo, neste momento é o instrutor mediador e o guia-intérprete
ao mesmo tempo em ação, eu tenho que estar atenta ao que ele fala, e
a minha mão também está lá escrevendo o que ele está fazendo no
quadro.

3.6 - Aspectos importantes na formação de profissionais que atuam com alunos


com surdocegueira.
Segundo a docente os aspectos fundamentais na formação para
desenvolver suas funções são a formação pessoal e a competência técnica.

[...] bom primeiro uma palavra só, paciência (risos). [...] se você não
tiver paciência você não vai conseguir trabalhar com o surdocego.

[...] realizar cursos que eu fiz de instrutor-mediador e guia-intérprete.

[...] Conhecer o Sistema Braille, um pouquinho de Libras. Além do


compromisso, ele tem que ter a ética principalmente quando atua no
ensino regular. [...] O importante é acreditar no potencial do aluno e
favorecer para que o professor regente também acredite. [...] realizar
as adequações necessárias dentro do que os professores precisam e a
aluna necessita.

Ao analisarmos a fala da docente, evidencia-se que a profissional tem


consciência de seu papel desempenhado tanto no contexto de sala de aula quanto no
CAE-Sc/AEE, sendo que, nesses ambientes, uma função sobrepõe-se à outra,
dependendo das necessidades da aluna. Sendo as funções relevantes para que o processo
ensino/aprendizagem ocorra efetivamente.
4 - Observações realizadas pela pesquisadora de ambas as funções
De acordo com as observações de ambas as funções realizadas pela
pesquisadora tanto no contexto de sala de aula como no CAESC/AEE, realizaremos
uma breve explicitação das ações ocorridas na função de guia-intérprete e de instrutor
mediador.
4.1 Atividades da sala de aula na função de guia-intérprete:

As tarefas desempenhadas pela professora de apoio na função de guia-


intérprete no contexto da sala de aula constam de: realizar a comunicação/fala ampliada
da explicação dos conteúdos pertinentes às disciplinas das diferentes áreas do
conhecimento (matemática, português, história, geografia e outras); fazer a fala
ampliada das apresentações dos trabalhos em grupo realizado pelos demais alunos;
realizar a comunicação da explicação das apresentações dos trabalhos realizados pela
aluna; descrição oral de imagens e filmes

Fazer também a fala ampliada de recados dados aos alunos pelos


professores, profissionais do corpo administrativo da escola e das orientações dos
exercícios físicos – movimentos – que são trabalhados na aula de Educação Física entre
outros; realizar a leitura de textos e dos conteúdos que os professores escrevem no
quadro, para que a aluna efetive a anotação utilizando o Sistema Braille;.

4.2 Atividades da sala de aula na função de instrutor mediador:


As tarefas desempenhadas pela professora de apoio na função de
instrutora mediadora: Anotar os conteúdos que os docentes escrevem na lousa; auxiliar
a aluna na realização das atividades dadas em sala, durante o período de aula.
Realizar a transcrição dos conteúdos para o Sistema Braille
desenvolvido em sala de aula (atividade para a aluna); realizar a transcrição das
atividades realizadas pela aluna em tinta para a avaliação dos professores; leitura de
textos e descrição de imagens.

4.3 Atividades no CAESC/AEE na função de guia-intérprete:


Com relação às atividades realizadas no contexto do CAESC as
tarefas desempenhadas pela professora de apoio na função de guia-intérprete foram:
visitas a exposições, museus, igrejas, shopping e outros espaços, objetivando
contextualizar o conteúdo desenvolvido em sala de aula com situações concretas.

4.4 Atividades no CAESC/AEE na função de instrutor mediador:

Quanto às atividades realizadas no contexto do CAESC as seguintes


tarefas foram desempenhadas pela professora de apoio na função de instrutora-
mediadora: aplicar as avaliações, utilizando outro ambiente mais silencioso; realizar a
descrição escrita de imagens contidas nas avaliações e livros; confeccionar materiais em
relevo, utilizando diferentes texturas; auxiliar a aluna na realização das atividades dadas
em sala que não foi possível concluírem durante o período de aula; tarefas escolares,
pesquisas de trabalhos transcrição das atividades realizadas pela aluna em tinta para a
avaliação dos professores.

5.- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Constatamos que no atendimento de apoio pedagógico ocorrido no


contexto de sala de aula a função da profissional como guia-intérprete ficou mais
evidente – principalmente durante as aulas de Geografia, História, Português e Ciências
-, disciplinas que contemplam várias temáticas e cujos conteúdos são ministrados na
forma oralizada pelos docentes e com apresentação de vídeos.
Com relação às outras disciplinas, como Inglês, Artes, Matemática e
Educação Física, os conteúdos também são ministrados oralmente, porém requerem
atividades práticas, sendo então mesclados momentos com exercícios práticos e orais,
alternando ambas as funções.
O trabalho é complexo e árduo, necessitando que a profissional
desempenhe as duas funções em momentos alternados ou, em algumas situações, que
execute ambas as funções, o que acarreta provocando desgaste nas cordas vocais já que
se exige o uso contínuo da fala ampliada próximo à orelha esquerda (melhor audição) da
aluna.
Como também a necessidade de manter a mesma posição corporal
durante o período de cinco horas/aula ocorre grandes desgastes físicos na coluna
vertebral da profissional, pois necessita fazer o registro do conteúdo escrito no quadro, a
dificuldade torna-se maior, pois a professora é destra e a posição em que permanece não
favorece sua ação.
Além do cansaço mental e emocional, como consequência da
sobrecarga provocada pelas transcrições para o Sistema Braille e para a tinta do
conteúdo referente as disciplinas.
Nesse caso específico, a função do Guia-intérprete, principalmente em
sala de aula, ficou mais evidenciado, porém uma situação isolada e pontual mesmo
sendo muito significativa como à relatada nesse estudo, a nosso ver é o primeiro passo
para muitos trabalhos e reflexões a respeito das peculiaridades inerentes a cada uma das
funções no contexto escolar, pois a identificação das ações do professor de apoio em
sala de aula seja guia-intérprete ou instrutor-mediador muito contribui para que o
processo de inclusão da aluna com surdocegueira ocorra.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Educação Infantil
Saberes e Práticas da Inclusão: dificuldade de comunicação e sinalização:
surdocegueira/múltipla deficiência sensorial 4ª Ed. Brasília: MEC/SEESP, 2006.

FREDERICO, C. E. O domínio de atividades da vida autônoma e social referentes à


alimentação de crianças surdocegas com fissura lábio palatal. Dissertação de
Mestrado. Universidade Presbiteriana Mackenzie. Curso de Pós Graduação de
Distúrbios do Desenvolvimento. São Paulo, 2006.
GRUPO BRASIL. Surdocegueira. Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e Múltiplo
Deficiente Sensorial. Folheto Informativo. São Paulo, 2003.

______. Projeto Pontes e Travessias: Formação de Guia-Intérprete. Centro de


Recursos nas áreas da Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial – Programa da
Ahimsa -Associação Educacional para a Múltipla Deficiência. Projeto assistido pelo
Programa Hilton Perkins da Escola Perkins para cegos, Watertown, Mass.U.S.A. O
Programa Hilton Perkins é subvencionado por uma doação da Fundação Conrad N.
Hilton, de Reno, Nevada- U.S.A. Projeto Ahimsa/Hilton Perkins, 2009.

MAIA. S. R. A Educação do Surdocego – Diretrizes Básicas para pessoas não


especializadas. Dissertação de Mestrado. Universidade Presbiteriana Mackenzie. Curso
de Pós Graduação de Distúrbios do Desenvolvimento. São Paulo, 2004.
______...et all. Estratégias de ensino para favorecer a aprendizagem de pessoas com
Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial: um guia para instrutores mediadores.
São Paulo: Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e o Múltiplo Deficiente
Sensorial/Canadian International Development Agency-CiDA, 2008.
______...et all. Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial: sugestões de recursos
acessíveis e estratégias de ensino. São Paulo Grupo Brasil 2010.

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)

Você também pode gostar