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Filosofia na Índia (Na Índia encontramos algumas das

manifestações “filosóficas” mais antigas, que deram origem a coisas que conhecemos até hoje, como o
hinduísmo, budismo e o Yoga).

- O Trimürti (A trindade hindu, Trimürti, é formada por Brahmä, Viñëu e Çiva correspondendo aos 3 guëas.
Brahmä representa Rajas, simbolizando o movimento da criação, Viñëu representa Sattva, o poder de
existência, preservação e proteção. Çiva representa Tamas, o poder de dissolução do universo).

Brahman
(Mäyä)
Éçvara
Brahmä Viñëu Çiva
Aspecto criador Aspecto preservador Aspecto transformador
Sarasvaté Lakñmé Pärvaté (Durgä)
(conhecimento) (prosperidade) (matéria)

-Os Vedas: ŖgVeda, Yajur Veda, Säma Veda e Atharva Veda (Os Vedas são um conjunto de quatro partes
divididas pelo sábio Vyäsa em uma tradição milenar. Contém instruções para preces, rituais, magia, hinos a
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deuses e orientações para a vida cotidiana). Cada um desses Vedas é subdividido em Samhitä, Brähmaëa,
Äranyaka e Upaniñad.
Quanto ao ensinamento/busca podemos dividir os Vedas em dois Karma Käëòa e Jïäna Käëòa:

Karma Käëòa (karma, ação, e Käëòa, Jïäna Käëòa (Jïäna, conhecimento, e


capítulo ou parte) Käëòa, capítulo ou parte)
É o nome do conjunto das três primeiras subdivisões É o nome dado aos Upaniñads, que trata de
doe Vedas (Samhitä, Brähmana e Äranyaka), brahmavidyä ou ätmavidyä. Indica como conhecer o
referindo-se às ações que devem ser feitas, as atitudes “eu” e libertar-se da ignorância descobrindo sua
e oferendas corretas para os deuses védicos. O Karma natureza divina. O objetivo é indicar “aquilo que
Käëòa destina-se aos apegados ao mundo, orienta deve ser conhecido”, para chegar-se no Mokña
estas sobre “o que deve ser feito”. (libertação), desenvolvendo: Vairägya (desapego),
Jïäna (conhecimento), Çravaëam (escutar),
Mananam (refletir) e Nididhyäsanam (meditar)
sobre o ensinamento védico.

- Na tradição hindu não existe o termo filósofo ou filosofia, o mais próximo é o termo Darçana. Também são
enumerados os paramartha ou puruñärtha, que são quatro grandes objetivos do homem, que acabam
governando as nossas ações:
Artha _Busca de bens materiais e segurança.
Käma_ Busca de prazer, de amor e satisfação dos sentidos.
Dharma_ Busca do que realmente deve ser feito, para a conquista de uma vida e mundo melhores.
Mokña _ Busca de libertar-se da ignorância sobre si, sobre o mundo e Deus, que são em verdade um.
- Existem quatro Çästras (manuais com histórias e ensinamentos) para guiar os paramarthas ou Puruñärtha,
que são:
Artha çästras, Käma sütra e Natya çästra, Dharma çästra e çästras do Vedänta.

Existe outra classificação, Äçrama, em etapas da vida que também são quatro:
Antevasin, Brahmacäré ou Çiñya _ Estudante.
Gåhastha_Chefe de família, adulto.
Vänaprastha_ Väna (floresta), aquele que vai para a floresta para meditar nela, num açram ou centro de
Yoga, tendo um momento para o autoconhecimento.
Bhikñu ou Sannyäsin_ Renunciante faz a maior renuncia: ao ego.

Existe, ainda, uma última classificação em Varëas (categoria, tipo, ordem), que nos Vedas levam em conta os
guëas (sattva, raja e tamas).
CÄTUR VARËYAM MAYÄ SŖÑÖAM
GUËA KARMA VIBHÄGAÇAÙ
TASYA KARTÄRAM API MÄM
VIDDHY AKARTÄRAM AVYAYAM (BG, Cap4, verso13).
Uma divisão em quatro classes (cäturvarëyam) foi criada por mim, de acordo com os guëas (características da
mente) e os tipos de ação. Apesar de ser o autor desta divisão, conheça a mim como não-agente de ação e
imutável.

Çüdra_ Serviçais, predomina tamas, depois rajas e sattva.


Vaiçya_ Comerciantes e agricultores predomina raja e tamas, em segundo lugar.
Kñatriya_ Guerreiros e governantes, predominam rajas e sattva em segundo lugar.
Brähmaëe_ Sacerdotes, professores e sábios, predominam sattva.
Nos Vedas conta-se que os deuses criaram o mundo por intermédio do sacrifício do gigante Puruña (uma
forma de Brahmä). Seu corpo foi desmembrado, dos pés surgiram os trabalhadores braçais (Çüdras), das coxas
os agricultores e comerciantes (Vaiçyas), dos braços os guerreiros e governantes (Kñatriyas) e da boca os
sábios e santos (Brahmaëes) para serem a voz de todos.

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É comum se associar à suposta invasão ariana a composição da sociedade de castas
Originalmente não foi criado para ser algo fixo, e sim para organizar o corpo social, algo que ocorre em toda a
sociedade; como na capitalista que privilegia pela renda. A ideia era classificar pela inclinação moral, via
observância dos guëas (sattva, raja e tamas), predominantes em cada um, mas com a possibilidade de cada
pessoa se polir e evoluir, ascendendo socialmente pela nova concentração dos guëas, pela via do estudo, ação e
disciplina.
Filosofia x Darçana
Temos aí uma questão complexa, retrata uma diferença de expectativa racional entre culturas e até mesmo
interesses de exploração e dominação do ocidente em relação aos povos orientais. O ocidente identifica a si
como o berço a Filosofia e da Ciência, entendendo o pensamento rotulado “oriental” como ainda preso a
tradições e superstições que constrangem o desenvolvimento plenamente racional do pensamento. A civilização
Sindhus-Sarasvaté, seja no Tantra ou Veda, desenvolveu pensamento racional sem necessariamente romper
com seu universo simbólico tradicional e na maioria das manifestações de conhecimento existe o entendimento
da existência do Absoluto ou ao menos a existência de algo não imediatamente acessível aos sentidos que
corresponde a uma realidade presente no universo sendo sua realidade “última”.
Não existe na “Índia” tradicional o termo Filosofia e sim Darçana, este não tem uma tradução exata, sendo
algo como “ponto de vista da realidade” dividindo-se em Ästika (seguem os Vedas) e Nästika (questionam os
Vedas).
Darçanas
Ästika Nästika
Nyäya Cärväkas ou Lokäyatas
Vaiñeñika Jainas
Säìkhya Bauddhas
Yoga
Karma-Mémänsä
Vedänta

É importante sabermos também de contribuições para o campo da ciência feitos por indivíduos inseridos
dentro da tradição Sindhus-Sarasvaté, pois mesmo as cidades originais da cultura tendo se extinguido a
milênios o conhecimento continua vivo até a atualidade. Existe uma contribuição científica significativa apesar
de muitas vezes ser desconhecida ou desprezada no ocidente. Abaixo alguns exemplos:

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Ciência
Suçruta (século VI a.c.) → Detalhou procedimentos cirúrgicos e doenças, estudou também ossos e tendões.
Kaëäda (século VI a.c.) → Atomismo
Bhäskara (século XII) → Fórmula de Bhäskara
Matemática → Zero* (século III) e algarismos hindu-arábicos
Varähamihira (século VI) → Trabalhos na Astronomia e Trigonometria
Vaimänika Çästra → Sobre os Vimänas (naves voadoras da tradição/mitologia)
Äryabhaöa (século V) → Heliocentrismo, causas dos eclipses, duração do ano*, valor de (correto para as
quatro casas decimais), o sol ilumina os planetas, uma teoria de gravitação, definiu o seno, cosseno, verseno, e
seno inverso e cálculo da circunferência da Terra** (erro de apenas 0,2%).
*Outros povos estão nessa formulação, sendo uma longa elaboração multicultural.
**Desde a Antiguidade é buscado esse cálculo seja com os gregos ou outros povos.

O problema da ignorância
Na obra “A República” Platão (século V a.c.) na Alegoria/Mito da Caverna coloca a ignorância como
obstáculo para o conhecimento, o prisioneiro fugido e reconciliado com a realidade é surpreendido com a
resistência de seus companheiros de prisão ao retornar à caverna e tentar mostrá-los a realidade do mundo
exterior e a ilusão testemunhada por eles. Pior do que não poder ver, diz Platão, é não querer ver. A ignorância
é um obstáculo, um “não-ver”, uma retirada da luz (razão/intelecto). Conhecer é libertar-se, ir além do aparente,
a sabedoria (intelecto) permite o julgamento entre aleteia (verdade/realidade) e a mentira.

"Podemos facilmente perdoar uma criança que tem medo do escuro; a real tragédia da vida é quando os
homens têm medo da luz" Platão
Na tradição hindu temos também a questão da ignorância, porém sua superação não está limitada à aquisição
intelectual. O problema básico do ser humano é a ignorância sobre si mesmo (avidyä), quando ele não sabe o
que é conclui que é algo que não é em verdade, daí decorre o sofrimento. Somos além do corpo e da mente.
O intelecto conhece por ser iluminado pela consciência (ätmä) que é imóvel, não faz nada, mas tudo ilumina.
Não é necessária “outra luz” para conhecer o ätmä, ou seja, não pode ser objeto de conhecimento de uma mente
puramente racional, a mente deve ser preparada pelo Yoga. Avidyä se desdobra em dois outros obstáculos que
são Mala e Vikñepa. Mala é a “impureza” da mente, a mente deve conhecer, refletir as coisas ao redor e
internas. Tendo a mente confusa a interpretação será equivocada comprometendo o discernimento. É necessário
maturidade emocional para o autoconhecimento. A mente não pode estar tomada de confusão. Vikñepa é a
mente dispersa que oscila de objeto/desejo em objeto/desejo, acaba sendo superficial carregada pelas ondas dos
objetos/desejos.

Yoga
A palavra yoga vem da raiz “yuj” (atrelar, atar, unir, juntar). Tradicionalmente existem duas interpretações, na
primeira Yoga é a união do ser individual (jévätma) e o princípio supremo (paramätman), “Deus”; e na
segunda Yoga é a coordenação, a unificação, o controle dos diferentes elementos da mente comparados a
cavalos fogosos que devem ser domados e atrelados à mesma carroça. Esse duplo sentido é intencional, o
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segundo é reflexo do primeiro no plano manifesto, pois o perfeito domínio de si só surge quando o indivíduo
realizou a junção com o divino, mas na ordem cronológica o segundo antecede o primeiro, a união com o EU
incondicionado (Brahman ou Puruña) pressupõem o domínio do eu condicionado (ego). Com isso o Yoga se
ocupa do homem tal como ele se apresenta habitualmente: mutável, contraditório, incoerente, agitado, disperso
e lhe propõem um ajustamento progressivo, culminando num perfeito domínio de seu corpo e mente; esse
ajustamento, essa integração colocam-no na posse de si mesmo e lhe permite conquistar um estado de
existência superior à sua condição original, com a qual não ousava sequer sonhar, livre de condicionamentos,
livre de todas as limitações; é a libertação (mokña).
A mais antiga exposição sistemática do Yoga, que chegou até nós, é constituída pelo Yoga Sütra, composto
por Patañjali entre os séculos II a.c. e IV d.c. (não se sabe ao certo a data precisa), essa obra, de extrema
concisão, desenvolvida posteriormente por numerosos comentários, forma o texto básico do Yoga e o qualifica
como darçana, possui forte caráter iniciático (não se aprende yoga sozinho é necessário um introdutor, o guru),
sendo uma disciplina essencialmente prática para o controle e tranquilização da mente e consequentemente do
corpo, para o homem poder conquistar o conhecimento de sua natureza divina, não o basta saber é necessário
viver tal fato e uma mente preparada é um pré-requisito. Existem diversos conceitos de yoga, seguem-se agora
alguns da Bhagavad Gétä:
SAMATVAM YOGA UCYATE (BG, Cap2, verso48).
Yoga é (ucyate, é dito, é chamado) o estado da mente controlada constantemente (sama, mesmo, igual e tvam,
equilíbrio).
YOGAÙ KARMASU KAUÇALAM (BG, Cap2, verso50).
Yoga é a estabilidade (kauçalam, estabilidade, equilíbrio no sucesso e na derrota) na ação (karmasu, na ação).

DUÙKHASAMYOGA VIYOGAM YOGA SAMJÏITAM (BG, Cap6, verso23).


É chamado (samjïitam) yoga a separação (viyogam) da ligação (samyoga) com o sofrimento (duùkha,
tristeza, sofrimento).

Linhas de Yoga
Tantra Veda
Vama Tantra Dakñiëa Tantra Åg Veda, Yajur Veda, Säma Veda e Atharva Veda

 
Yoga (o termo surgiu nos Vedas)
Haöha Yoga 
Karma Yoga
Bhakti Yoga
Jïäna Yoga

Patañjali
(Räja Yoga/Yoga clássico/ Kriyä Yoga)

Patañjali, o Yoga Sütra e o Añöäìga Yoga


A exposição mais sistemática sobre Yoga vem de Patañjali (séculos II a.c. – IV d.c. ?), na obra Yoga Sütra
que pela sua clareza/organização é uma importante referência sobre o tema.
Pata (caído) + añjali (mãos postas em prece). Encarnação de Çeña/Çeñanäga/Ädi Çeña criado pela yoginé
Goëikä

Sütra seria algo como fio/linha, indica que a informação/mensagem foi compactada em poucas linhas
(semelhante ao conceito de aforismo), assim diversos sütras em conjunto formam os quatro capítulos da obra
de Patañjali que pelo formato estabelecido recebeu o nome de Yoga Sütra.

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Organização/disposição dos quatro capítulos da obra

Prathamo’dhyäyaù (1º capítulo): Samädhi Pädaù ou Sädhya Pädaù (samädhi = contemplação sädhya = objetivo)
Dvitéyo’dhyäyaù (2º capítulo): Sädhanaù Pädaù (sädhana = disciplina)
Tåtéyo’dhyäyaù (3º capítulo): Vibhüti Pädaù (vibhüti = poderes)
Caturtho’dhyäyaù (4º capítulo): Kaivalya Pädaù (kaivalya = liberação)
Obs: Pädaù significa caminho.
Vyäsa em seu comentário sobre o Yoga Sütra de Patañjali esclarece que a mente sendo um dos efeitos da
Prakåti, possui os três guëas (qualidades): sattva (luz, clareza; equilíbrio), rajas (ação; paixão) e tamas
(inércia; escuridão). A agitação dos guëas determina o estado da mente (citta), que forma cinco estados
mentais:
Müdha_ Mente entorpecida, dominada por tamas.
Kñipta_ Mente confusa, perturbada, com predominância de rajas (torna a mente agitada) e tamas (causa a
falta de discriminação).
Vikñipta_ Mente inquieta correndo de um objeto para o outro sem ter constância, com a predominância de
rajas, é um estado mais avançado da mente Kñipta.
Ekägra_ Mente que já possui a capacidade de se concentrar num ponto, num só tema ou objeto, há
predominância de sattva. Também aparece o nome ekägratä.
Niruddha_ Mente altamente controlada, não há perturbação e sim a pura manifestação da energia sattvika, é
o máximo da consciência humana.
O objetivo é chegar nos dois últimos estados de consciência, o último é quando todas as modificações cessam e
o estado de quietude é alcançado, então, Puruña (Ätma ou Brahman, segundo o Vedänta) vê sua verdadeira
natureza imutável, eterno e puro; é o mokña (libertação) do Vedänta e Kaivalya (libertação) segundo
Patañjali.
Patañjali cita (Cap1, Sütra30) nove obstáculos que contribuem para a agitação da mente que podem se interpor
no caminho do autoconhecimento. Essas distrações só ocorrem quando um ou mais dos cinco våttis (Pramäëa,
Viparyaya, Vikalpa, Nidrä e Småti) está presente. São eles:
Vyädhi (doença)
Styäna (apatia mental, indolência, inação)
Pramäda (desatenção, negligência)
Älasya (preguiça, apatia física, falta de esforço)
Avirati (falta de renúncia, apego, deleitar-se)
Bhränti Darçana (falsa visão, equivocada noção de certeza)
Alabdha Bhümikatva (inconstância na prática, não realização das etapas necessárias)
Saàçaya (dúvida, falta de confiança no ensinamento, vacilação no estado de dúvida)
Anavasthitatva (Instabilidade, dificuldade de permanecer no estágio alcançado na prática de Yoga)
O caminho
Vairägya (desapego) e Abhyäsa (estudo/disciplina/repetição)
Añöäìga Yoga
Añöäìga Yoga
Yama
(ahimsä, satya, asteya, brahmacärya e aparigraha)
Niyama
(çauca, santoña, tapas, svädhyäya e éçvarapraëidhäna)
Äsana
Präëäyäma
Pratyähära
Dhäraëä
Dhyäna
Samädhi

Yama vem da raiz “yam” que significa refrear, ter todo controle, refere-se ao domínio dos impulsos naturais do
homem. É uma espécie de código moral para ser aplicado no convívio social, os yamas são num total de cinco
(ahimsä, satya, asteya, brahmacärya e aparigraha).

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AHIMSÄSATYÄBRHMACARYÄPARIGRAHÄ YAMÄÙ (Cap2, Sütra30).
Ahimsä (não-violência), Satya (verdade), Asteya (abster-se do roubo), Brahmacärya (continência, castidade)
e Aparigraha (abster-se da avareza/desapego), são os cincos Yamas (formas de restrição).
Nyama, em um total de cinco, visam à organização da vida interior; são regras de conduta individual. Impor
limites ao comportamento exterior (yama) não é o suficiente, é preciso reestruturar a personalidade por meio
dos cinco nyamas (çauca, santoña, tapas, svädhyäya e éçvarapraëidhäna):
ÇAUCASANTOÑATAPAÙSVÄDHYÄYEÇVARAPRAËIDHÄNÄNI NIYAMÄÙ (Cap2,
Sütra32).
Çauca (pureza física e mental), Santoña (contentamento), Tapas (austeridade, disciplina mental e física),
Svädhyäya (estudo das escrituras e recitação de mantras) e Éçvarapraëidhäna (devoção a Éçvara), são os
Niyamas (observâncias).

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