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COMO SE PROCESSA
Projeto de Pesquisa
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Autor: Reinaldo da Silva Fernandes
Contatos do autor:
E-mail: Raynolds@dedalus.lcc.ufmg.br
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LEITURA NAS ENTRELINHAS:
COMO SE PROCESSA
Projeto de Pesquisa
INTRODUÇÃO:
Há autores que não classificam explicitamente as questões propostas para os textos, ou seja, as colocam
em um mesmo bloco, independentemente se elas são ou não de tipos diferentes. Analisamos exemplos de
BISOGNIN (1991); ALMEIDA e FERREIRA (1994); TESOTO e DISCINI (1994); CARNEIRO (1995); e
NERY, VIEIRA e AMARAL (1990). Há, por outro lado, aqueles que classificam as questões, ou seja, as colocam
em blocos diferentes — separando em “compreensão e interpretação, por exemplo — como TUFANO (1991);
FARACO e MOURA (1994); e PRATES (1984). Vejamos os que não fazem uma classificação explícita das
questões propostas.
TUFANO (1991), nos manuais de 5a a 8a séries, traz três seções de leitura: “Relendo o
texto”, com questões cujas respostas estão na superfície do texto, bastando ao aluno fazer uma
nova leitura; “Refletindo sobre o texto” e “Dê sua opinião”, em ambos os casos, com questões
para as quais se espera “resposta pessoal”
FARACO e MOURA (1994, p. 67-8) traz exercícios de “compreensão” (com respostas
quase sempre explícitas, tais como responder o número de versos de um poema), de
“interpretação” (com respostas não-explícitas). Como há ainda uma terceira seção, o “Ponto
de Vista” que pede uma “resposta pessoal”, podemos perceber que os autores trabalham com
o pressuposto de que há três níveis de leitura ou, pelo menos, dois.
Os manuais da 6ª e 7ª séries seguem o mesmo modelo. É interessante notar que no
manual da 7ª série, na seção de “compreensão” aparece questão que envolve a relação causa e
conseqüência. No da 5ª, esse tipo de questão aparece na seção “interpretação”. Isso mostra
que há alguma confusão, segundo esses autores, do que seja compreensão e interpretação.
Além disso, há questão que pede para que sejam indicadas causa e conseqüência, exigindo
certo tipo de inferência que não é exigido em outras questões de “compreensão”.
PRATES (1984) divide o estudo do texto em duas seções: 1)“Vamos discutir o texto”,
com respostas que não estão todas explícitas no texto e 2)“A sua interpretação crítica do
texto”, em que se exige do leitor que ele faça inferências com algum nível de complexidade.
Esta seção propõe também questões que permitem “respostas pessoais”, apesar de trazer, “nas
entrelinhas” uma resposta que o autor gostaria de ter.
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respostas explícitas no texto, exigindo do leitor habilidade de raciocínio, capacidade de
relacionar informações de seu conhecimento prévio com informações do texto.
No grupo “2”, o dos autores que trabalham com o pressuposto de que há níveis
diferentes de leitura, nem sempre há convergências. Dos três autores analisados, dois
(TUFANO; e FARACO e MOURA) trabalham com três tipos de questões. Apesar do nome do
exercício ser diferente ( “Relendo o texto” X “Compreensão”; “Refletindo sobre o texto” X
“Interpretação”; “Dê sua opinião” X “Ponto de Vista”), o tipo de exercício é o mesmo. No
primeiro tipo, as respostas estão explícitas no texto. No segundo e terceiro tipos, não há
respostas explícitas, exigindo uma “resposta pessoal” (TUFANO) ou não.
Concluímos que, tanto no caso do primeiro quanto do segundo grupo de autores,
todos, de forma explícita (segundo grupo) ou não (primeiro grupo) trabalham com o
pressuposto de que existem mais de um nível de leitura.
Discutiremos a seguir a opinião de teóricos para, depois discutir a relação entre os
livros didáticos e as teorias.
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PRETORIUS discute brevemente o que ela chama de reinterpretação, associando o conceito a
uma forma pessoal de fazer um reconto (p. 397). Na passagem do seu texto em que a autora
trata de interpretação, não é dito o que se entende pelo termo (p.399).
Aqui também há autores que se aproximam. Assim, TREVISAN, BARBOSA e
SCOTT igualam interpretação à compreensão. KLEIMAN (1993) e ECO estariam em um
mesmo grupo, vendo a interpretação em relação com a produção do texto, com o que o texto
tem a dizer como estratégia.
Uma visão diferenciada é a que postula a interpretação como ‘um jeito próprio de
entender o texto” (KATO), determinada pelos conhecimentos prévios (TREVISAN), na
mesma direção de ORLANDI, e ZILBERMAN e SILVA. Não nos parece ser possível unir os
dois pontos de vista: um jeito próprio de entender o texto pode não ser entendê-lo tal como o
autor o pretendeu através da estratégia textual.
A questão da leitura nas entrelinhas é, entre os três níveis, o que é menos discutido
pelos teóricos2. SMITH, KLEIMAN (1989), BARBOSA, RUPLEY e WILLSON, e
PRETORIUS não discutem o assunto. KLEIMAN (1993) admite que o texto é portador
daquilo que “ não é dito” (p. 13) e associa esse tipo de leitura à intencionalidade do autor,
chamando-o de “interpretação”. Diz que é possível fazer isso “analisando o texto na procura
de marcas lingüísticas dessa intencionalidade.”
Analisando diversos autores que tratam da questão, concluímos que, de modo geral, há
concordância quanto ao fato de a leitura nas entrelinhas ser uma leitura do “não-dito”
(ORLANDI, KLEIMAN). PLATÃO e FIORIN, e DUCROT associam, no nosso entender,
esse tipo de leitura à leitura de subentendido e pressupostos. Para DUCROT, essa leitura pode
“estar ausente do próprio enunciado.”
Outro critério seria o de associar essa leitura nas entrelinhas à intencionalidade do
autor, como o fazem KLEIMAN, DUCROT e SCOTT, e com o que discorda ECO, pelo
menos no que ele chama de “interpretações sociológicas ou psicanalíticas dos textos.” Além
disso, o que ECO chama de “interpretações nas entrelinhas” aconteceria em textos “muito
abertos”— portanto não aconteceria em todos textos.
Os conhecimentos prévios entram como critério fundamental na leitura nas
entrelinhas. Nisso concordam SCOTT, ECO e DELL’ISOLA. Para esta, essa leitura consiste
da integração dos dados do texto com os conhecimentos prévios. Para DELL’ISOLA, o leitor
faz inferências (ou lê nas entrelinhas) de acordo com esses conhecimentos, de acordo com seu
‘background”. A autora faz também uma diferenciação entre leitura nas entrelinhas e outra,
em que o leitor aprecia, deprecia, critica e julga.
Concordamos, em parte, com essas posições sobre leitura nas entrelinhas, e questionamos
outras. Concordamos com a defesa de que a leitura nas entrelinhas é uma leitura do “não-
dito”. Mas postulamos que uma leitura nas entrelinhas pode ser feita também em decorrência
dos conhecimentos prévios, da memória pessoal do leitor, do seu conhecimento sobre o
evento comunicativo, do seu conhecimento histórico socialmente formado ( KINTSCH e
FRANZKE, 1994, citados por VAN DIJK, 1997, in press), além de seus objetivos, intenções,
propostas, relação e afiliação social, sua ideologia (VAN DIJK, 1995). Isso vai além do que
perceber apenas o que está implícito. Mesmo um texto mais explícito pode permitir leitura
nas entrelinhas.
Os conhecimentos prévios, concordamos, exercem papel fundamental na leitura nas
entrelinhas, determinando leituras diferenciadas de leitor para leitor, que, ao fazer perguntas
nas entrelinhas do texto, levantará hipóteses diferentes.
Quanto à associação dessa leitura à intencionalidade do autor, postulamos idéia um
pouco diferente. Embora concordemos com KLEIMAN (1993) quando essa autora defende
que é possível analisar o texto à “procura de marcas lingüísticas” da intencionalidade do
autor, postulamos que nem tudo que pode ser lido foi intenção do autor de que fosse lido. Essa
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leitura poderá acontecer, inclusive, contra a vontade do autor.
Discordamos de ECO quando esse autor defende a leitura nas entrelinhas apenas para
textos “muito abertos”. Nossa hipótese é a de que mesmo em textos “menos abertos”, é
possível essa leitura. Discordamos, também, de DELL’ISOLA quando a autora separa a
leitura nas entrelinhas de uma outra, em que o leitor “aprecia, deprecia, critica e julga”. Para
nós, ler nas entrelinhas é também apreciar ou depreciar, julgar e criticar.
Postulamos, então, a leitura nas entrelinhas como a leitura do “não-dito”, dos textos
em geral, determinada pelos conhecimentos prévios — incluindo aí a visão de mundo — do
leitor e feita a partir dos objetivos desse leitor.
1.2.2.1- Inferências
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(CLARK), as lógicas e as informativas — excluídas as elaborativas (WARREN, NICHOLAS
e TRABASSO).
A interpretação seria possível através de inferências avaliativas. Isso se tomarmos
interpretação como “um jeito próprio de o leitor entender o texto.”
A leitura nas entrelinhas aconteceria através de inferências extensivas
(FREDERIKSEN, C.; FREDERIKSEN, J.; HUMPHREY e OTTSEN), no que elas prevêem a
ligação do que foi lido a idéias espontâneas e associações; das elaborativas (WARREN,
NICHOLAS e TRABASSO), se considerarmos que são originadas de hipóteses do leitor e
desconsiderarmos o fato delas se referirem apenas a aspectos “irrelevantes”, considerando-as
também para aspectos relevantes.
Outros tipos que possibilitariam essa leitura seriam as avaliativas (WARREN,
NICHOLAS e TRABASSO), considerando o papel dos conhecimentos prévios, crenças e
valores; e as cognitivo-culturais (MARCUSCHI), marcadas pela interferência cultural do
indivíduo.
1.3- Os livros didáticos, as teorias de leitura e os níveis de leitura
Passando da análise dos autores de manuais para a análise dos teóricos, pode-se
perceber que nem tudo é convergente. Há teóricos que consideram apenas a compreensão;
teóricos que só consideram a interpretação; teóricos que consideram compreensão e
interpretação; poucos teóricos que consideram a leitura nas entrelinhas. Ou seja, nem tudo é
claro entre os teóricos.
Ora, se os teóricos não se entendem, o que pensar dos autores de livros didáticos, que,
por hipótese, se baseiam em algum teórico para elaborar sua pedagogia de leitura? Daí a
confusão que fica estabelecida nos manuais: um reflexo da própria confusão presente nas
diversas teorias.
2- OBJETIVO
3- HIPÓTESES
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leitor.
Essa leitura não poderá ser feita se o leitor ficar apenas na superfície do texto, se não
tentar ver o que o texto tem por trás. Ou o que poderia ter. Daí postulamos que essa leitura
depende, dentre outros fatores, dos objetivos do leitor, de sua vontade de ler nas entrelinhas.
Portanto, de objetivos bastante específicos, dependendo de quão profunda o leitor queira fazer
essa leitura.
Explicitando, essa leitura dependerá de:
a) conhecimento e visão de mundo: os conhecimentos acumulados pelo leitor a
respeito da língua e a respeito dos diversos assuntos. A ideologia que o leitor traz consigo, o
que ele defende, suas posições políticas, religiosas.
b)capacidade e vontade de ler nas entrelinhas: esse nos parece um aspecto
fundamental. Diríamos que o leitor precisará, após a compreensão do texto, ter o propósito de
ver além do que o autor quis mostrar, além do que ele registrou linguisticamente no texto.
Por fim, postulamos a possibilidade de ler nas entrelinhas mesmo nos casos em que os
textos não sejam “muito abertos” (ECO, 1986). Consideramos que essa não é uma limitação
necessária.
4- JUSTIFICATIVA
Há muitas razões para se estudar a existência dos níveis de leitura e os processos que
possibilitam que a leitura nas entrelinhas seja feita. Falta clareza sobre o que seja
compreensão e interpretação. Além disso, não está claro o que seja uma leitura nas entrelinhas
e como essa leitura acontece, pois a leitura nas entrelinhas ainda não foi objeto de muitos
estudos .
Nos manuais escolares reina muita confusão no que respeita a possibilidade de
existência de níveis distintos de leitura e qual classificação seria feita desses possíveis níveis.
A leitura nas entrelinhas não é nem mesmo mencionada.
Fica claro, então, que ainda não foi explicitado se há diferença entre os três níveis de
leitura, em que proporção é essa diferença, o que justifica uma investigação a fim de que se
possa ter maior clareza sobre o assunto.
Outra questão que ainda não foi explicitada é em que medida as inferências afetam os
níveis de leitura, uma vez que a inferência em geral é um dos processos cognitivos envolvidos
na compreensão, fazendo parte da leitura (KLEIMAN), se relacionando também com a
interpretação e a leitura nas entrelinhas (ECO,1986).
Em termos de dados sobre o processamento de leitura nas entrelinhas, parece que eles
não existem, o que torna importante a coleta para que possa ser feita uma avaliação de como o
processo se dá.
O estudo desses níveis de leitura e do processamento da leitura nas entrelinhas tem,
também, conseqüências práticas, podendo contribuir para o trabalho dos profissionais de
leitura.
METODOLOGIA
Coleta de dados
A pesquisa será feita com 20 sujeitos. Eles são alunos da 3ª série do 2º Grau. Estudam
em uma escola que, apesar de ser periférica e da rede pública (BH), é considerada de boa
qualidade, bem equipada e com práticas pedagógicas mais avançadas do que outras da mesma
rede.
Os alunos-sujeitos têm a mesma faixa etária (16 -17 anos). Estudam na Escola desde a
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antiga 5ª série. Tiveram o mesmo professor de português durante os 3 últimos anos do Ensino
Fundamental, período em que leram textos de jornais e textos literários curtos. Leram também
romances, livros de crônicas, de contos e de poesia. Quanto aos livros, nos 3 anos, cada aluno
leu em torno de 40 títulos diferentes. Já tiveram acesso ao que poderia ser uma “leitura nas
entrelinhas”. Muitos são trabalhadores e fazem o curso noturno.
O material usado será dois textos. Um, “Assassino em nome do povo”, de Dalmo de
Abreu Dallari, que discute a implantação da pena de morte no Brasil, mais precisamente dos
problemas que ocorreriam na escolha do “carrasco”.
O outro texto, “Neblina é uma inimiga no caminho dos motoristas”, é um texto
informativo e “menos aberto”. Trata de problemas causados pela neblina, aponta alguns locais
no estado de São Paulo onde ela é mais comum e faz orientações aos motoristas no sentido de
como lidar com o fenômeno.
A aplicação dos testes tem por objetivo fazer o aluno mostrar para o pesquisador o
produto de sua leitura. É necessário captar esse produto e fazer uma análise destes dados para
entender os processos que levaram à leitura, em seus diversos níveis.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
2- BARBOSA, José Juvêncio. Alfabetização e leitura. 2 ed. rev. São Paulo: Cortez, 1992.
6- ECO, Umberto. Lector in fabula – A cooperação interpretativa nos textos narrativos. São
Paulo: Perspectiva, 1986.
11- MORAES, Lídia Maria de, e ANDRADE, Maria. Mundo Mágico – língua portuguesa –
livro 2. São Paulo: Ática, 1990.
12- NERY, Alfredina., VIEIRA, Márcia Regina Choueri, e AMARAL, Suely Aparecida. Ponto
e contraponto, português: homem – ser social. São Paulo: Ed. do Brasil, 1990.
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13- ORLANDI, Eni Pulcinelli. Discurso e leitura. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1993.
14- PRATES, Marilda. Reflexão e Ação: Língua Portuguesa: 6ª série. São Paulo: Ed. do
Brasil, 1984.
15- PRETORIUS, Elizabeth J.. A profile of causal development amongst ten-years-olds:
Implications for reading and writing. In: Reading and Writing: An Interdisciplinary Journal 8:
385-406, 1996.
16- RICHE, Rosa Cuba e SOUZA, Denise M. Oficina de Textos: 4. São Paulo: Saraiva,
1995.
17- RUPLEY, William H. e WILLSON, Victor L. . Content, domain, and word knowledge:
Relationship to comprehension of narrative and expository text. In: Reading and Writing: An
Interdisciplinary Journal 8: 419-432, 1996.
18- SAVIOLI, Francisco Platão e FIORIN, José Luiz. Para entender o texto: leitura e redação.
10. ed. São Paulo: Ática, 1995.
19- SCOTT, M. Lendo nas entrelinhas. In: Ilha do Desterro. Florianópolis. n. 13. p. 101-123,
1985.
23- VAN DIJK, Teun A. In: STAMENOV, Maxim. Cognition and Consciousness. Amsterdam:
Benjamins, 1997.
24- _________________. In: VAN OOSTENDORP, Herre. e GOLDMAN, Susan (Eds). The
construction of mental models during reading. Hillsdale: Erlbaum, 1997 (in press).
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