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Quem nunca passou pela experiência numa aula de Educação Artística,

(hoje Artes) de o professor entrar, dizer: Peguem uma folha ou o caderno de


desenho e desenhem o que quiserem, pois a aula é de “desenho livre”. e
permanecer sentado se ocupando de outras coisas, pouco interagindo com os
alunos?

Esse é um exemplo de como a “Livre Expressão” é usada de maneira


equivocada, fruto talvez da inexperiência do professor ou de seu despreparo e
acomodação, da carência de recursos ou de falta de consciência da função da
Arte ou de seu próprio papel que o impedem de tecer conceitos e formular
metodologias. Essa postura equivocada acaba por gerar uma prática
indiferente e inexpressiva.

Em entrevista concedida ao Programa Roda Vida (1998) Ana Mae


Barbosa afirma que não é pretensão da escola “formar artistas” e “que arte não
se ensina; contamina-se pela arte”. Essa visão pragmática e ao mesmo tempo
tão arrebatada nas palavras da ilustre arte-educadora é justificada pela sua
intensa participação nas “Escolinhas de Arte”, onde a “Livre Expressão”
encontrou reduto, concretude e sucesso.

Historicamente o “Movimento Escolinhas de Arte” é uma resposta à


realidade política pós-ditadura do Estado Novo. Nasce da empolgação, do
sonho, da ousadia de artistas e arte-educadores; a fim de atiçar novos olhares
sobre a vida, o criar e o maravilhar-se com as inúmeras possibilidades que se
desfraldava com a Arte. Talvez sua principal premissa fosse o respeito ao
indivíduo em sua capacidade de criar, de se expressar, de encontrar na Arte
novas perspectivas de leitura de si e do mundo. A “Escolinha” foi uma lufada de
ar depois de tantos anos de sufoco.

Infelizmente, com a descaracterização do movimento, o conhecimento é


deixado de lado e as ideias se tornaram inconsistentes, guiadas pelo “laissez-
faire” como se a criança ou adolescente já tivesse arraigado em si todas as
suas potencialidades, bastando uma folha de papel e lápis de cor para externa-
las.

A Arte existe para admirar, assombrar, impactar e encantar. Contudo, o


mais importante, a Arte deve ser tratada e abordada como objeto de
conhecimento e restringi-la a uma simples expressão de sentimentos não
propiciam nem a externação real de sentimentos nem uma experiência
cognitiva producente.

De acordo com os PCN, o aluno enquanto sujeito deve ser capaz de


perceber o mundo através de relações e interações, isto é, perceber que o
mundo é plural e, portanto repleto de possibilidades.
Nesse viés, a Arte enquanto disciplina deve colaborar para a capacidade
de reflexão, da crítica e da expressão do educando, auxiliando em seus
aspectos cognitivos, afetivos, psicológicos e sensoriais. Inseridos nessa gama
de conhecimentos o professor deve ser mediador e aproximar a Arte da
vivência do aluno.

Ultrapassando os muros escolares a Arte deve ter o aspecto de auxiliar


na formação de indivíduos críticos, que inseridos na sociedade valorizem a
cultura. Arte esta não excludente e não intelectualizada. Ao encontro desse
propósito, a “Livre Expressão” no ensino de Arte mostra-se como um caminho
possível e prazeroso tanto para o professor quanto para o aluno, se praticado
de modo consciente e construtivo.

A arte existe desde os primórdios. Inerente ao ser humano é tão vital


que sobrevive mesmo nos piores contextos, mas apenas um ensino criador
favorecerá o desenvolvimento da percepção, da imaginação, da criatividade e
da capacidade crítica e da análise da realidade, equilibrando o intelecto e o
emocional.

Barbosa (1998) explicita que não podemos entender a cultura de um


país sem entender sua arte e no âmbito institucional esse conhecimento se faz
através da Metodologia Triangular do ensino de Arte. Essa proposta propicia
contato íntimo do educando com a Arte através de momentos para fruir
(apreciar a obra de arte); refletir (contextualizar seja histórica, social ou
visualmente a obra de arte) e produzir (fazer artístico, produzir sua própria
arte), não necessariamente nessa ordem.

Diante dessa perspectiva esfacela-se a falsa ideia de que arte não é


ensinada, mas expressada. Através dessa metodologia é possível propiciar a
“Livre Expressão” em cada um desses momentos, afinal trata-se de colocar o
educando no centro do processo criador.

Propiciar ao educando uma variedade de experiências artísticas com


liberdade de expressão, incentivando-o a observar suas produções e a do
outro, configurará na prática de uma educação autônoma e ao mesmo tempo,
propiciará que este deixe de ser só um consumidor passivo do que lhe é
apresentado, mas gerará um produtor criativo e singular.

REFERÊNCIAS

BARBOSA, Ana Mae. Entrevista ao Programa Roda Viva. TV Cultura, Outubro de


1998.

BRASIL. Secretaria de Ensino Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Arte.


Brasília, 1997.

JOUCOVSKI, Diana. Quem tem medo de Ana Mae Barbosa? O que você deveria ter
aprendido (ou não) nas aulas de arte na escola. Blog Ítalo Brasileiro, 2020.

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