LIVRO: Curso de Direito Penal Militar (Parte Geral)
Autor: Jorge Aberto Romeiro
Ano: 1994 Páginas: 205 e 206
122. Circunstância impeditiva do "sursis" ignorada à época de sua
concessão
Se há uma circunstância impeditiva do sursis; ignorada pelo juiz
à época de sua concessão, como, por exemplo, a reincidência do beneficiado, não mais pode ele ser revogado se essa circunstância só é conhecida após o trânsito em julgado da decisão.
A sentença que concede a suspensão condicional da pena, como bem
esclarece Vincenzo Manzini, em seu Trattato di diritto penale (Torino, 1950, v. 3, p. 599 e 602), além da providência da condenação do réu a uma pena privativa da liberdade, contém mais as duas seguintes: a) o reconhecimento, explícito ou implícito, de que tem o condenado direito à suspensão da dita pena, por preencher determinados requisitos legais, como não ser reincidente e autorizar a presunção de que não tornará a delinqüir; b) e a ordem da suspensão da pena por determinado tempo e sob as condições que impõe, condicionada ao cumprimento destas e à não ocorrência de causas outras, taxativamente previstas pela lei, para a sua revogação, sempre supervenientes. Se à última providência (sub b) pode atribuir-se caráter administrativo, porque condicional e revogável, a qual não transitaria materialmente em julgado, o mesmo não acontece com a primeira (sub a), que configura um ato puramente jurisdicional. Por que jurisdicional? Porque reconhece um direito público subjetivo do condenado à suspensão condicional da pena, que é um instituto de direito material (CPM, arts. 84 a 88), entendido como um substitutivo ou sub-rogado da pena e interferindo, assim, com o jus puniendi do Estado. Como já dito antes, o juiz ou tribunal, na sentença condenatória, se reunidos os pressupostos e requisitos da suspensão condicional da pena, é obrigado a pronunciar-se sobre ela (art. 607 do CPPM) e quando a negue ao condenado que lhe faz jus, pode este recorrer da decisão, como também o Ministério Público quando concedida contra legem (arts. 516, m, e 526, parágrafo único, do CPPM). Transita, portanto, formal e materialmente, em julgado a parte da sentença que reconhece ao condenado o seu direito à suspensão condicional da pena. As causas de revogação do sursis, previstas taxativa e não exemplificativamente pela lei (CPM, art. 86, e CPPM, art. 614), não atingem essa parte da sentença (sub a). Dizem respeito à outra parte, referente à ordem de concretização da suspensão condicional da pena, resumida acima sub b. São causas supervenientes, como, v.g., a condenação do beneficiado pelo sursis, na justiça militar ou na comum, por sentença irrecorrível a pena privativa da liberdade, durante o curso do prazo da suspensão condicional da pena e não antes (art. 614, I, do CPPM). Causas que ocorrem ulterior e não anteriormente à sentença concessiva do sursis. Entre essas causas, por serem todas supervenientes, não figura, como é evidente, em nossos CPM e CPPM, a de ignorar
o juiz motivo impeditivo do sursis por ocasião do reconhecimento do
direito ao mesmo pelo condenado, a qual não permite ainda seu entendimento como causa de incidente de execução (rubrica do Título II do Livro IV do CPPM). Roberto Lyra é bastante incisivo a respeito do assunto: "Tanto a concessão (do sursis) constitui ato jurisdicional, que se torna coisa julgada, em conseqüência da qual a prova superveniente da falta de requisito não altera o statu quo"8. No sentido de que uma vez concedido o sursis, salvo por causas· supervenientes, só pode ser revogado através de recurso da acusação nos pronunciamos várias vezes como juiz do Tribunal de Alçada do extinto Estado da Guanabara9 e é iterativa a jurisprudência do STF10.