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BEATRIZ FURLAN DE CARVALHO

TRABALHO DE DIREITO PENAL III


A RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DA PESSOA JURÍDICA
COMO AUTORA DE CRIMES AMBIENTAIS

Quarto Ano do Curso de Direito (Turma 4000)


Prof. Me. Carlos José Cogo Milanez
Londrina-PR/2016
O meio ambiente possibilita as diversas formas de existência de vida no Planeta e
devido a sua suma importância para qualidade de vida desta e de futuras gerações,
tornou-se um bem jurídico constitucionalmente tutelado.
Considera-se crime toda conduta lesiva praticada por pessoa física ou jurídica ao
meio ambiente. O crime foi estendido às pessoas jurídicas, afim de que tenha uma
maior salvaguarda em relação a proteção ambiental, e para que os delituosos sejam
responsabilizados.
Apesar da responsabilização penal da pessoa jurídica já ser uma realidade no
ordenamento jurídico pátrio, tendo se mostrado eficaz na prevenção e repressão dos
crimes ambientais e ser majoritariamente aceita pelas doutrinas, ainda remanescem
alguns doutrinadores que não admitem a responsabilização penal da pessoa
jurídica, aludindo a princípios como o societas delinquere non potest.
A responsabilização penal do ente corporativo é matéria geradora das mais intensas
controvérsias. Apesar de sua aplicação à tutela ambiental já estar indiscutivelmente
firmada em nosso ordenamento jurídico legal - inicialmente, através do artigo 225,
parágrafo 3º, da Constituição Federal, e, posteriormente, pelo advento da Lei
9.605/98, denominada Lei dos Crimes Ambientais -, a discussão doutrinária a
respeito de sua utilidade prossegue. 

A razão para tanto, em suma, decorre do fato de que uma parte mais tradicional da
doutrina tem-se apegado ao dogma romano-germânico do societas delinquere non
potest. Segundo este princípio, em conformidade com a chamada teoria da ficção
legal de Savigny, a pessoa jurídica é totalmente destituída de uma personalidade e,
logo, incapaz de manifestar vontade. Desta forma, seria impossível que este mesmo
ente, puramente ficto, viesse a praticar uma conduta que gerasse efeitos na esfera
penal, pois, para isso, é necessário exatamente o atributo da vontade, requisito
essencial para que haja, aliás, também, a culpabilidade. 

René Ariel Dotti, contrário à responsabilização penal da pessoa jurídica, afirma que
só a pessoa humana tem capacidade genérica de entender e querer, sendo a
potencial consciência de ilicitude, isto é, a culpabilidade em si, uma qualidade
exclusiva da pessoa física e impossível de ser encontrada no ente jurídico . Assim,
por ser desprovida da capacidade de ação, a pessoa coletiva não seria, então,
capaz de praticar uma conduta infratora, pois não poderia ser a ela atribuída a
culpabilidade inerente à pessoa natural. 

Contudo, há um fator que deixa dúvidas por esta fração mais conservadora da
doutrina. Primeiramente, destaque-se que o artigo 3º da Lei dos Crimes Ambientais -
o qual regularizou especificamente a aplicação do instituto na legislação brasileira –
ao responsabilizar a pessoa jurídica pelos crimes ambientais, não menciona em
nenhum momento o termo conduta enfocado por esses doutrinadores. Destarte, o
parágrafo 3º do artigo 225 da Carta Magna, trouxe em seu texto uma inovação ainda
não suficientemente ressaltada, qual seja, a responsabilização da pessoa jurídica,
não necessariamente em razão de uma conduta por esta praticada, mas sim, em
decorrência de suas próprias atividades. 

Constituição Federal, art. 225, § 3º: as condutas e atividades consideradas lesivas


ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções
penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados. 

Desse modo, a Constituição Federal responsabilizou a pessoa jurídica pelos crimes


cometidos através das atividades por ela desenvolvidas, afastando, assim, a
relevância da discussão concernente à capacidade ou não do ente coletivo praticar
uma conduta. Ora, é pacífico que a pessoa jurídica exerce uma atividade, e é
exatamente através desta atividade que ela poderá vir a ofender o meio ambiente. 

A título de debate, contudo, é cabível mencionar que a doutrina favorável à


responsabilização penal da pessoa jurídica entende que a natureza desta deve ser
conceituada através da teoria da realidade técnica, pela qual a noção de
personalidade é própria do campo ideológico e jurídico. Desse modo, sendo o ente
corporativo um titular de direitos e obrigações, separadamente daqueles próprios de
seus sócios, obviamente possui uma personalidade também distinta daquela de
seus membros. Assim, tendo a pessoa jurídica uma personalidade,
consequentemente, vem a ser dona também de uma vontade coletiva independente,
o que tornaria perfeitamente viável a caracterização da conduta. 
Inicialmente, a denúncia, no caso da pessoa jurídica, deve obedecer ao estipulado
no parágrafo único do artigo 3º da Lei 9.605/98. Segundo tal dispositivo, a peça
inicial acusatória deve especificar, como parte no pólo passivo da ação, não apenas
a pessoa jurídica infratora, mas, também, as pessoas físicas que contribuíram para o
delito ambiental. Na situação em que, todavia, não for possível a apuração dessas
pessoas naturais, esta circunstância deve ser explanada na peça inicial acusatória,
sob pena da mesma ser considerada inepta. 

No que concerne ao interrogatório, via de regra, o ente jurídico será interrogado


através da pessoa física de seu representante legal. No entanto, é perfeitamente
cabível a indicação de um preposto, tanto quando este for um maior conhecedor dos
fatos em questão, quanto no caso do representante legal ser também réu no mesmo
processo, podendo ocorrer colisão de defesa. 

No caso dos crimes de menor potencial ofensivo, estes são regulados pela Lei dos
Crimes Ambientais em seus artigos 27 e 28 e, também, pela Lei 9.099/95. O artigo
27 estabelece a possibilidade da transação penal (consistente na aplicação imediata
da pena de multa ou restritiva de direitos) sempre quando houver a prévia reparação
do dano ambiental. De acordo com o artigo 28, poderá ocorrer, inclusive, a
declaração de extinção de punibilidade, desde que haja laudo de constatação de
reparação do dano ambiental. 

A reparação do dano possibilita ainda a própria suspensão do processo. Destaque-


se que a sentença por crimes de menor potencial ofensivo obedece à regra disposta
no parágrafo 6º, artigo 76, da Lei 9.099/95, segundo o qual a sanção penal imposta
em sede de transação não proporciona efeitos civis, cabendo aos próprios
interessados a proposição da ação cabível no juízo cível. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

DOTTI, René Ariel. Incapacidade Criminal da Pessoa Jurídica: uma perspectiva do


direito brasileiro. In: Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: em defesa do
princípio da imputação penal subjetiva. Coordenador Luiz Régis Prado. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2001. 

FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a
natureza (de acordo com a lei 9.605/98). 6ª ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2000. 

LECEY, Eladio. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: Efetividade e Questões


Processuais. In: Congresso Internacional de Direito Ambiental – Fauna, Políticas
Públicas e Instrumentos Legais, 8º, 2004, São Paulo. São Paulo: Instituto "O Direito
por um Planeta Verde", 2004. 

_____. A Atividade Empresarial e a Co-responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica e


do Dirigente na Lei dos Crimes Contra o Ambiente. In: Curso de Direito Ambiental
Penal, 4º, 2004, Porto Alegre. Rio Grande do Sul: Instituto "O Direito por um Planeta
Verde", 2004. 

MARCHESAN, Ana Maria Moreira. Alguns aspectos sobre a lei dos crimes
ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 19, p. 67-81, jul./set. 2000. 

SANCTIS, Fausto Martins de. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. São


Paulo: Saraiva, 1999. 

SIRVINSKAS, Luís Paulo. Tutela Penal do Meio Ambiente: breves considerações


atinentes à Lei n. 9.605, de 12-2-1998. 3ª ed. Ver., atual. e ampl. São Paulo:
Saraiva, 2004. 
SOUSA, Gaspar Alexandre de. Crimes Ambientais: Responsabilidade Penal das
Pessoas Jurídicas. Goiânia: AB, 2003.

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