Você está na página 1de 13

Universidade Estadual de Maringá

12 a 14 de Junho de 2013

A VIOLÊNCIA SEXUAL ENQUANTO FATOR COMPLICADOR


PARA O DESENVOLVIMENTO NA PERSPECTIVA
VYGOTSKYANA

LIMA, Edyane Silva de (UEM)1


MAIO, Eliane Rose (Orientadora/UEM)2

INTRODUÇÃO

Pautados na teoria de Vygotsky acerca do desenvolvimento, apresentamos como


o fenômeno da violência, quando ocorrido na infância, dificulta/prejudica a evolução
deste. Utilizando de uma revisão bibliográfica que se centrou na pesquisa de categorias
chaves como: violência contra crianças e desenvolvimento e aprendizagem na proposta
de Vygotsky, é que apresentamos este artigo, elaborando suas conceituações.
Propõe-se estabelecer uma conversação entre o conteúdo vygotskyano e o
fenômeno violência, de forma a apontar seus rebatimentos no cotidiano do
desenvolvimento das crianças, visto que estes sujeitos sociais acessam equipamentos de
serviços como a educação, que lidam com o processo de desenvolvimento.
Esta discussão deriva de pesquisa em andamento referente a dissertação do
mestrado que consiste na compressão dos professores e equipe pedagógica da educação
infantil e ensino fundamental acerca da violência sexual, subsidiada pelos conteúdos da
disciplina do Programa de Pós-graduação em Educação “Aprendizagem,
Desenvolvimento e Educação Escolar”, ministrada pela docente Eliane Rose Maio, no
primeiro semestre de 2012.

1
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação da UEM. Membro do Núcleo de Pesquisa e
Estudos sobre Diversidade Sexual NUDISEX e do Grupo de Pesquisa Violência e Indisciplina Escolar.
Assistente Social da Prefeitura Municipal de Assis Chateaubriand. Docente do curso de serviço social da
UNIPAR. E-mail: edyane.lima@bol.com.br
2
Psicóloga. Pós-Doutora em Educação Escolar-UNESP/Araraquara. Professora do Mestrado em
Educação – PPE, UEM. Coordenadora do Grupo de Estudos Núcleo de Pesquisa e Estudos sobre
Diversidade Sexual - NUDISEX. E-mail: elianerosemaio@yahoo.com.br

1
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

O desenvolvimento da aprendizagem em Vygotsky

Revisitando as obras de Lev Vygotsky e reflexões tecidas em salas de aula,


apreende-se que o desenvolvimento do indivíduo ocorre partindo-se de suas relações
para depois se interiorizar no próprio ser, fundamentando-se assim em um processo de
interação. Logo o processo ensino-aprendizagem para o autor surge das relações entre
as pessoas, que é anterior ao aprendizado que se tem na escola, sendo o histórico
considerado previamente.
Em contato com a escola se produz novos aprendizados, sendo que estas novas
relações vão se produzindo (o novo), e Vygotsky (1999, p.97) chama a atenção para a
ZPD (Zona de Desenvolvimento Proximal), que seria

[...] a distância entre o nível de desenvolvimento real, determinado


pela solução independente de problemas, e o nível de
desenvolvimento potencial, cuja solução de problemas se dá com
orientação de um adulto.

Ou seja, existe um desenvolvimento atual da criança Nível de Desenvolvimento


Real e um desenvolvimento potencial, aquele que é capaz de realizar com a ajuda de um
adulto (Nível de Desenvolvimento Potencial), que num determinado momento ela
realizará sozinha, e esta capacidade potencial ocorre por meio da aprendizagem.
Havendo então o desenvolvimento efetivado no meio social, e esta aprendizagem pode
ocorrer na escola ou na vida cotidiana, fomentando o desenvolvimento do Nível do
Desenvolvimento Potencial, via aprendizagem (VYGOTSKY, 1999).
Assim, a escola tem a capacidade de desenvolver a capacidade intelectual nos
indivíduos (alunos), permitindo que estes possam assimilar e refletir sobre os
conhecimentos, que ao longo de suas vidas foram sendo acumulados, não se limitando
apenas à transmissão de conteúdos, ensinando a pensar e a apropriar-se de um
conhecimento já elaborado.
Por isso que não é tarefa fácil identificar e mensurar a Zona de Desenvolvimento
Proximal apontada por Vygotsky (1999), pois a construção do conhecimento implica em
uma ação partilhada, que remete à troca de informações, possibilitando ampliar as

2
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

capacidades individuais. Havendo uma interação entre o indivíduo e o meio,


fomentando a reformulação dos conhecimentos e formulação de novos conhecimentos.
Vygotsky (1999) expõe dois tipos de conceitos: o primeiro é o cotidiano e prático,
desenvolvidos nas práticas, no cotidiano, resultante da interações sociais da crianças; e o
segundo é o científico, que são adquiridos através de ensino
Estas ideias pautam-se na perspectiva histórico - cultural Vygotskyana que
destacam interações entre o individuo e o meio, sendo a linguagem a mediação dessa
interação. Pois, desde criança mesmo antes de sociabilizar com a linguagem
popularmente falada e escrita (língua mãe), deve-se considerar as manifestações de falas
primárias das crianças que já se localizam enquanto fases do desenvolvimento e que
proporcionam sua evolução (formulação e reformulação) do desenvolvimento, estando
para tanto a memória, a imaginação, o pensamento e a emoção interligados.
Para tanto, a criança para Vygotsky (1999, p. 35-36)

[...] através da fala, [...] planeja como solucionar o problema e então


executa a solução elaborada através da atividade visível [pois]
adquirem a capacidade de ser tanto sujeito como objeto de seu próprio
comportamento.

Partindo do pressuposto que as relações sociais sustentam a formulação do


conhecimento e desenvolvimento, visto que as crianças em contato com outros grupos
de sociabilidade que lhes possibilite outras assimilações de conhecimentos, quando
elaborados em situação de violência sexual, essa interação pode ficar prejudicada. Na
verdade, os conceitos científicos e espontâneos, não implicam necessariamente em uma
linearidade e sim em um processo, sendo que quando permeado por esta situação
traumática sofre rebatimentos direitos.
O brincar da criança, constitui fonte para a identidade cultural e da
personalidade, por meios de jogos e brincadeiras ela interage com a realidade e
estabelece relações com o mundo em que vive. Mas

não é todo jogo da criança que possibilita a criação de uma zona de


desenvolvimento proximal, do mesmo modo que nem todo o ensino o
consegue; porém, no jogo simbólico, normalmente, as condições para

3
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

que ela se estabeleça estão presentes, haja vista que nesse jogo estão
presentes uma situação imaginária e a sujeição a certas regras de
conduta (BARBOSA e BOTELHO, 2008, p. 4).

Ao desenvolver um jogo ou brincadeira a criança emite comportamentos e


papéis, valores, hábitos e situações para os quais não está preparada na vida real. O que
nos remete compreender que a situação de violência pode ser evidencia pela atividade
lúdica, devendo ser estar tomada com imenso valor de observação do desenvolvimento
da criança, visto que pode auxiliar no processo de reconhecimento da violação de
direitos.
Mesmo delineada pela imaginação que coloca em estreita relação com a
atividade criadora, que é rodeada de aspectos que a criança representa e produz muito
mais do que aquilo que viu e vivenciou, propiciando à criança recriar a realidade usando
sistemas simbólicos para tal (VYGOTSKY, 1991).
E o brincar na escola tem também uma função informativa para o professor,
visto que o vivenciado é manifestado, sendo que no caso de situação de violência
vivenciada por
uma criança é importante que a ação do educador se oriente no sentido de pensar que
tipo de atividade propor, tendo clareza de intenção. Pois, mesmo o ser humano sendo
sujeito expressivo, afetivo e relacional, muitas vezes, por algum motivo, essas
qualidades são bloqueadas e no caso de situação de violência isto é algo recorrente.
Sob este viés se a infância estiver rodeada por situação de violência, este
fenômeno tem grandes possibilidades de ser introjetado, visto que a relação com o meio
permite assimilação e aprendizagem, pois a “[...] internalização; os signos externos, de
que as crianças em idade escolar necessitam, transformam-se em signos internos,
produzidos pelo adulto como um meio de memorizar” (VYGOTSKY, 1999, p. 60).
Ora,
A memória, em fases bem iniciais da infância, é uma das ações
psicológicas centrais, em torno da qual se constroem todas as outras
funções. Nossas analises sugerem que o ato de pensar na criança
muito pequena é, em muitos aspectos, determinado pela sua memória
e, certamente, não é igual a mesma ação em crianças maiores. Para
crianças muito pequenas, pensar significa lembrar; em nenhuma outra
fase, depois dessa muito inicial da infância, podemos ver a conexão

4
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

íntima entre as duas funções psicológicas (VYGOTSKY, 1999, p.


66).

Para tanto, desde muito pequenas as crianças memorizam o aprendizado


ocorrido oriundos de suas relações, e estes permitem a esta evoluir ou não em seu
desenvolvimento. Tecer considerações sobre a violência faz-se necessário para que
possamos refletir sobre as consequências desta expressão sobre o processo de
desenvolvimento.

Considerações sobre violência sexual

Muitos autores tecem considerações sobre violência, sobretudo Faleiros (2000),


Guerra e Azevedo (1998, 2000), bem como legislações e documentos como o Estatuto
da Criança e do Adolescente (1990), a Constituição Federal (1988), o Código Penal
(1940), relatórios e planos, e ainda não menos importantes, filmes e documentários que
abordam suas tipificações.
As definições dadas ao termo violência têm as mais diversas conotações em
dimensões médicas, sociais, culturais, psicanalíticas e mundiais, segundo Adorno (1989
apud AZEVEDO, 1989) abrange várias situações caracterizadas pela coisificação do
sujeito nas relações interpessoais, sua conversão em objetos. Caracteriza-se por um
fenômeno que sempre se manifestou em todas as classes sociais de forma articulada ao
nível de desenvolvimento civilizatório da sociedade.
Historicamente crianças e adolescentes foram vitimizadas por meio de castigos
corporais e métodos severos, dando margem ao abandono, assassinatos, espancamentos
e até mesmo abusos sexuais que ocorrem desde o século XVII, demarcados pela
ausência de políticas públicas de proteção, se reforçando durante os séculos XX e XXI,
observada a dominação e discriminação social prevalecentes (FALEIROS, 2000). Sendo
que o surgimento dos estudos a respeito da violência contra a criança e sua constituição
enquanto um problema social específico ocorreu a partir de 1962, em Chicago, com a

5
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

obra “Síndrome da Criança Espancada”3, que chamou a atenção de profissionais de


saúde e da sociedade para a necessidade de proteção da criança.
De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2008), a violência é a quarta
principal causa de óbitos entre crianças de 0 a 9 anos, e a primeira principal causa de
óbitos entre adolescentes de 10 a 19 anos (RESENDE e SILVA, 2011).
Com base em Guerra de Azevedo (2001), consideram-se quatro tipos de
violência:
- Violência Física que corresponde ao emprego de força física no processo disciplinador
de uma criança, caracterizando-se em toda a ação que causa dor física;
- Violência Psicológica consiste na interferência negativa do adulto sobre as crianças
formando nas mesmas um comportamento destrutivo, de baixa autoestima e auto
confiabilidade, envolvendo subordinações.
- Negligência que pode ser considerada todo de omissão e descuido com a proteção da
criança e/ou adolescente, podendo caracterizar na ausência de auxílio financeiro,
expondo a situações de vulnerabilidade pessoal e social como: desnutrição, doenças,
falta de higiene.
- Violência Sexual implica em todo ato ou jogo sexual entre um ou mais adulto e uma
criança e adolescente, tendo por finalidade estimular sexualmente esta
criança/adolescente, ou utilizá-lo para obter satisfação sexual. Sendo considerada uma
das violências mais graves, pois afeta o físico e o emocional da vítima.
Sendo que com relação a esta última, consideram-se dois tipos que são:
- Abuso sexual que consiste no ato ou jogo sexual em que o adulto submete a criança ou
o adolescente (relação de poder desigual) para se estimular ou satisfazer-se
sexualmente, impondo-se pela força física, pela ameaça ou pela sedução, com palavras
ou com a oferta de presentes (ANDIO, 2002); e
- Exploração sexual que compreende o abuso sexual praticado por adultos e a
remuneração em espécie ao menino ou menina e a uma terceira pessoa ou várias. A
criança é tratada como objeto sexual e mercadoria. A exploração sexual comercial

3
KEMPE, C. H.; SILVERMAN, F. N.; STEELE, B. F.; DROEMUELLER, W. & SILVER, H. K. — The
battered child syndrome. JAMA 181: 17, 1962.

6
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

constitui uma forma de coerção e violência contra crianças, que pode implicar trabalho
forçado e forma contemporânea de escravidão (ESTOCOLBO, 1996).
A violência sexual começa a ser enfrentada no Brasil no final do século XX,
onde somente com o Estado Democrático de Direitos, que reconhece e viabiliza os
direitos sociais, tem-se a perspectiva de romper com alguns padrões antigos,
preconizando os direitos humanos e “implica em tecer relações de trocas afetivas e de
aprendizagem, coibir abusos, enfrentar ameaças, proteger os vulneráveis e as
testemunhas e responsabilizar os agressores” (SANTOS, 2004, p.11).
Sobretudo nos anos de 1990 inicia-se o rompimento com o “segredo de família”
como até então tratado o fenômeno da violência sexual, incluindo a temática na agenda
do Estado, ganhando dimensão de frentes nacionais e internacionais para o seu
enfrentamento, desencadeando vários eventos que deram visibilidade para discussão do
assunto, resultando dessas lutas de mobilizações o Plano Nacional de Enfrentamento da
Violência Sexual Infanto-Juvenil, no Rio Grande do Norte em 2000 (FALEIROS, 2000).
A compreensão teórica da violência sexual sob visão de crianças como seres
puros e inocentes não ajuda muito no combate à violência sexual, pois é
responsabilidade do adulto estabelecer a fronteira entre afeto e sexo, respeitando o
desenvolvimento sexual da criança e do adolescente (GUIA ESCOLAR, 2004). Em
virtude dessa dimensão do erotismo não ser delimitada por parâmetros de limites sociais,
não ser respeitada, fez-se necessário a promulgação de legislação pertinente à violência
sexual enquanto crime4. Porém a notificação desses casos às autoridades competentes
ainda é desafio a ser efetivado, pois o medo, o não comprometimento, a demora na
resolutividade dessas situações faz com este procedimento inicial e estritamente
necessário não ocorra.
Para tanto desde o abuso sexual que se evidencia a partir da satisfação sexual do
adulto mediante o “uso” da criança ou do adolescente, que pode se caracterizar desde
carícias, manipulação de genitália, mama ou ânus, até a exploração comercial sob
relações de abuso de poder, prostituição, turismo sexual, pornografia e o tráfico para
estes fins se classificam nos tipos de violência sexual contra criança que por ora também
4
Conforme Constituição Federal de 1988, artigo 227, § 4º e o previsto no Código Penal – Lei nº.
2.848/1940.

7
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

são o mesmo público atendido pelos estabelecimentos de ensino e tem as mais diversas
sequelas desta prática, conforme assinalado por Braun (2002). Sobre o que destacamos
ter o devido cuidado, pois esta compreensão pode nortear a compreensão e abordagem
nos espaços de formação como a escola, mas há que se considerarem os rebatimentos
sérios e que caso não tenham o devido acompanhamento, lesões, disfunções sexuais e
psicológicas, e o próprio suicídio, sobretudo traumas que resultam na insociabilidade do
indivíduo podem ocorrer.
Em pesquisa realizada por Martinez (2000) observamos que vários países como
o Chile de 7 a 36% das mulheres e de 3 a 29% dos homens já sofreram abuso sexual na
infância. Além disso, a OMS (Organização Mundial de Saúde), estima que em 2002, 150
milhões de meninas e 73 milhões de meninos abaixo de 18 anos foram forçados a manter
relações sexuais ou sofreram outras formas de violência sexual que envolveram contato
físico (RESENDE e SILVA, 2011). Sobre isto destacamos enquanto uma das maneiras,
e como uma das instituições de enfretamento a esta expressão da questão social a
unidade escolar e o professor, corroborando a ideia de Bruno e Williams (2003) de que a
escola é o lugar ideal para prevenção, intervenção e enfrentamento deste fenômeno, haja
vista que o próprio Estatuto da Criança e Adolescente tem como objetivo estabelecer
ações articuladas para intervenção técnica, política e financeira para o enfrentamento à
violência infanto-juvenil, possibilitando a esses sujeitos ao menos apoio.
Algumas crianças são vitimizadas quando ainda são muito pequenas. Embora os
casos de abuso sexual se concentrem na faixa etária entre 7 e 14 anos, mais de um terço
das notificações de abuso sexual envolvem crianças de 5 anos ou menos (AZEVEDO e
GUERRA, 1997).
Sob estes pressupostos, a identificação de casos de violência é obrigação dos
profissionais que trabalham com os mesmos e em especial o professor, conforme
previsto no artigo 245 e 13 do ECA em que

[...] deixar o médico, o professor ou responsável por estabelecimento


de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de
comunicar a autoridade competente os casos de que tenha
conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos
contra criança ou adolescente: pena: multa de 3 a 20 salários de
referência, aplicando-se o dobro no caso de reincidência.

8
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra a criança


ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho
Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo e outras providencias
legais.

Até porque a figura do professor denota parte integrante do segundo círculo de


formação e referência da criança em seu desenvolvimento, sendo de extrema
importância à notificação por este profissional para romper com o círculo do silêncio.
Pois, muitas vezes demonstram sinais da violação de direitos sofrida, exigindo uma
postura dos que estão ao seu redor. Assim, os profissionais da educação deparam-se com
esse segredo, tendo por dever romper com o mesmo para que o sujeito receba o mais
rápido possível as intervenções profissionais necessárias para não continuar com esse
ciclo de violência, bem como elaborar e não repetir esse comportamento. Para tanto a
escola pode ter uma prática que possa identificar esses casos até porque esse rebate
diretamente no processo de desenvolvimento da criança, bloqueando e/ou retardando-o,
conforme será seguidamente abordado.

Uma leitura de Vygotsky sobre os prejuízos para o desenvolvimento

Visto que a violência tem suas múltiplas dimensões enquanto causas, vítimas e
manifestações, ocorrendo extra e intra familiarmente, nas diferentes classes sociais, é
que tecemos algumas considerações sobre o prejuízo que a mesma acarreta, tendo como
pano de fundo a teoria vygotskyana.
Silva e Resende (2011 apud DAY, et al 2003) comentam que transtornos
psíquicos, pesadelos, quadro fóbicos-ansiosos, isolamento social, sentimento de estar
sujo, problemas de aprendizagem, depressão, medo, abuso de álcool e outras drogas, são
algumas das manifestações das seqüelas de violência. O que nos remete a compreender
que direta e indiretamente traz prejuízos sérios e em diferentes níveis para o
desenvolvimento saudável de criança. Na verdade o impacto deste acontecimento de
forma alguma é temporário e passageiro, não devendo ser desconsiderado, pois há

[...] efeitos a longo prazo [que] não são evidenciados de imediato.


Deve ser reconhecido como um sério problema da infância. Mesmo

9
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

que crianças vitimizadas sejam retiradas de suas casas, os efeitos da


experiência vivida repercutirão em toda sua vida (SILVA e
RESENDE, 2011, p. 8 apud DAY et al, 2003, p.14).

Refletindo assim, ser de suma importância o papel da família e das referências


de convivência do indivíduo no sentido de proporcionar um ambiente bom para o
desenvolvimento da criança, pois a criança enquanto ser em fase de desenvolvimento e
para que isso aconteça de uma forma equilibrada é preciso que o ambiente externo
propicie condições saudáveis de desenvolvimento. Logo, estímulos positivos, equilíbrio,
boa relação familiar, vínculo afetivo, diálogo, entre outros, devem nortear a concepção
de desenvolvimento.
Caso este ambiente não seja fomentado, dificulta a superação das marcas da
situação de violação de direitos, visto que

[...] as conseqüências da violência doméstica podem ser muito sérias,


pois crianças e adolescentes aprendem com cada situação que
vivenciam, seu psicológico é condicionado pelo social e o primeiro
grupo social que a criança e adolescente tem contato é a família
(ROSAS e CIONEK, 2006 p. 11).

E os reflexos rebatem na escola, a qual imprime local de fomento à


aprendizagem, porque na verdade

[...] aspectos emocionais estariam ligados ao desenvolvimento afetivo


e sua relação com a construção do conhecimento a expressão deste
através da produção escolar [...]. O não aprender pode, por exemplo,
expressar uma dificuldade na relação da criança com sua família; será
o sintoma de que algo vai mal nessa dinâmica (ROSAS e CIONEK,
2006, p. 11 apud WEISS, 2004, p.23).

Assim a escola através de seus profissionais, que estão próximos das crianças
devem-se atentar aos sinais, pois as vítimas pedem socorro seja via de suas vozes, da
linguagem corporal, de ações e de comportamento, indicando que há algo de errado.

10
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

Nos casos de violência sexual, esses indícios se expressam de acordo com Rosas
e Cionek (2006, p.14) assim:

- Interesses não usuais sobre questões sexuais, isto inclui expressar


afeto para crianças e adultos de modo inapropriado para a idade,
desenvolve brincadeiras sexuais persistentes com amigos, brinquedos
ou animais, começa a masturbar-se compulsivamente.
- Medo de uma certa pessoa ou sentimento de desagrado ao ser
deixada sozinha em algum lugar ou com alguém;
- Uma série de dores e problemas físicos sem explicação médica;
- Gravidez precoce;
- Poucas relações com colegas e companheiros;
- Não quer mudar de roupa na frente de pessoas;
- Fuga de casa, prática de delitos;
- Tentativa de suicídio, depressões crônicas;
- Mudanças extremas, súbitas e inexplicadas no comportamento
infantil (anorexias, bulimias);
- Pesadelos, padrões de sono perturbados;
- Regressão a comportamentos infantis tais como choro excessivo,
enurese, chupar os dedos;
- Hemorragia vaginal ou retal, cólicas intestinais, dor ao urinar,
secreção vaginal;
- Comportamento agressivo, raiva fuga, mau desempenho escolar;
- Prostituição infanto-juvenil.

Logo as crianças não são naturais e espontaneamente violentas, e sim


incorporam e interagem com estas situações, havendo uma interação, que possibilita o
indivíduo interagir com o mundo, isto é, “a natureza humana precisa de uma natureza
social, o que justifica a necessidade de a criança espelhar-se naqueles que a cercam,
através do processo sociointerativo” (VYGOTSKY, 1991, p. 65).
Para tanto, o desenvolvimento se fomenta numa interação saudável em que a
criatividade, as descobertas positivas propiciam o aprendizado, caso o contrário o que
permeia esse desenvolvimento são bloqueios e prejuízos, resultados de interação
rodeada pelos diversos tipos de violência os quais temos o compromisso de coibir de
toda e qualquer maneira.
Sob esta perspectiva, a escola o tem compromisso ético e legal de notificar as
autoridades competentes sobre casos suspeitos ou confirmados de maus-tratos, que
inclui a violência sexual, objetivando garantir a qualidade de vida, sobretudo fomentar o
desenvolvimento saudável da criança.

11
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

REFERÊNCIAS

ABRAPIA. Maus-tratos contra crianças e adolescentes - proteção e prevenção: Guia


de orientação para professores de saúde. Petrópolis, RJ: Autores e Agentes e
Associados. 2ª. Ed. ABRAPIA, 2002.

ASSIS CHATEAUBRIAND. Fatura de serviços do CREAS. Jan. 2007 – Jul. 2011.


Assis Chateaubriand, 2011.

AZEVEDO, M.A.; GUERRA, V. (Org.) Crianças vitimizadas: a síndrome do pequeno


poder. São Paulo: Iglu, 2000.

______ Pele de asno é só historia ... Um estudo sobre a vitimização sexual de crianças
e adolescentes em família. São Paulo: Rocca. 1988.

BARBOSA, S. L; BOTELHO, H. S.. Jogos e brincadeiras na educação infantil.


Monografia (Graduação em Normal Superior) - Centro Universitário de Lavras. 2008.
34 f. Disponível em
<http://artigos.netsaber.com.br/resumo_artigo_9643/artigo_sobre_jogos_e_brincadeiras
_na_educacao_infantil> Acesso em: 20 mai. 2012.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990.


Brasília, 1990.

BRAUN, S.. A violência sexual infantil na família: do silêncio à revelação do


segredo. Porto Alegre: AGE, 2002. 102 p.

BRINO, Rachel de Faria; WILLIAMS, Lúcia Cavalcanti de Albuquerque.. Concepções


da professora acerca do abuso sexual infantil. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n.
119, p. 113- 128, julho/ 2003. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/cp/n119/n119a06.pdf> Acesso em: 20 mai 2012.

FALEIROS, E. T. S.. Repensando os conceitos de violência, abuso e exploração


sexual de crianças e adolescentes. Brasília: Thesaurus, 2000. 99 p.

ROSAS, Fabiane Klazura; CIONEK, Maria Inês Gonçalves Dias.. O impacto da


violência doméstica contra crianças e adolescentes na vida e na aprendizagem.
Conhecimento Interativo. São José dos Pinhais, v. 2, n. 1, p. 10-15, jan./jun. 2006.
Disponível em: <http://www.mp.rs.gov.br/areas/infancia/arquivos/impacto.pdf > Acesso
em: 20 mai 2012.

SANTOS, B. R. dos et al.. Guia Escolar: métodos para identificação de sinais de abuso
e exploração sexual de crianças e adolescentes. 2. ed. Brasília: Secretaria Especial dos
Direitos Humanos e Ministério da Educação, 2004. 163 p.

12
Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013

SILVA, Laíssa Muniz da; RESENDE, Vera da Rocha.. A violência doméstica contra
crianças e adolescentes: uma (re)visão. 2011. Disponível em:
<http://www.ppi.uem.br/camposocial/eventos/i_jornada/076.pdf> Acesso em: 20
mai2012.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes,


1999.

______. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

13

Você também pode gostar