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Dentre as análises simplistas padrões, advindas das forças progressistas de nosso país,
(não nos encarregaremos de abordar e refutar as visões das forças conservadoras e
reacionárias sobre o assunto, devido a tamanha estupidez teórica presente em tais
análises) tanto em partidos políticos quanto por historiadores, estão no que chamaremos
da “esquerda udenista” e “esquerda getulista”: os primeiros, argumentam que o papel de
Getúlio na história do Brasil foi, na maior parte, de todo o mau, visto se tratar de um
ditador fascista, de extrema direita, que reprimiu milhares de pessoas em sua ditadura
estado novista, perseguiu os comunistas, e portanto, se encontra na lata de lixo da
história. A esquerda getulista, como o nome sugere, defende o legado de Getúlio: se
trata sobretudo de um “pai dos pobres”, um líder louvável que deu direitos aos
trabalhadores e que fez de tudo pelo seu povo, se suicidando e adiando um golpe
fascista, que iria ocorrer 10 anos depois.
Para determinar qual classe social Getúlio Vargas representou, precisamos, antes de
tudo, fazer uma análise de classes da sociedade brasileira, e assim, identificar quais
classes são inerentemente reacionárias e potencialmente revolucionárias. De acordo com
o teórico marxista Mao Tse-tung:
“Quem são os nossos inimigos? Quem são os nossos amigos? Esse
problema é de importância primordial para a revolução. A razão básica
por que as anteriores lutas revolucionárias na China obtiveram tão fracos
resultados está no facto de não se ter sabido fazer a união com os
verdadeiros amigos para atacar os verdadeiros inimigos. O partido
revolucionário é o guia das massas, não podendo, portanto, a revolução
alcançar a vitória se este as conduz por uma via errada. Para não
dirigirmos as massas pela falsa via, para estarmos seguros de alcançar
definitivamente a vitória na revolução, devemos prestar atenção à
unidade com os nossos verdadeiros amigos para atacar os nossos
verdadeiros inimigos. Para distinguir os verdadeiros amigos dos
verdadeiros inimigos, impõe-se proceder a uma análise geral da situação
económica das distintas classes da sociedade chinesa, bem como da
atitude que estas tomam frente à revolução.” (ZEDONG, 1926)
Devido ao caráter didático que pretendemos dar a esse artigo, não iremos fazer uma
grande análise pautada em argumentos históricos. Podemos dizer, sumariamente, que
entre as classes sociais brasileiras, estão principalmente: o proletariado, o campesinato,
a pequena burguesia, a média burguesia (ou burguesia genuinamente nacional) e a
grande burguesia, ou burguesia burocrática e exportadora. A partir disso, devemos
determinar, como Mao corretamente afirmou, quem são nossos inimigos e quem são
nossos amigos.
Dessa forma, é necessário, como afirmado por Stalin, diferenciar a grande burguesia
burocrática da burguesia genuinamente nacional. Segue uma citação do artigo “A
mistificação burguesa do campo e a atualidade da revolução agrária”, também escrito
pelo Jornal A Nova Democracia:
A partir desta breve análise das classes brasileiras, podemos voltar a pergunta
introdutória: afinal, Getúlio esteve ao lado da revolução, junto a ascendente burguesia
nacional, ao proletariado e ao campesinato, ou ao lado da contrarrevolução, junto
burguesia rentista e burocrática, e do latifúndio?
Para o professor Fausto Arruda, Getúlio Vargas serviu a classe burocrática e rentista,
serviu ao latifúndio e ao imperialismo, e consequentemente consolidando o capitalismo
burocrático no Brasil. Como já dito, nós discordamos dessa análise, e iremos discorrer,
baseado em documentos históricos do período, uma outra possível análise do que foi, de
fato, a Era Vargas.
Para iniciar uma análise da classe social a qual Getúlio Vargas servia, é interessante
constatarmos quais eram suas ideias: o que defendia Getúlio, e de que forma isso pode
ser relacionado a suas políticas posteriores? Uma abordagem inicial sobre a formação
política e ideológica de Getúlio Vargas, desde seus anos de formação até sua
consolidação como chefe de estado, não é difícil de ser analisada. O gaúcho era
influenciado por uma corrente muito popular na época chamada Castilhismo – fundada
pelo político Júlio de Castilhos, adotada pelo Partido Republicano Rio-Grandense. Não
iremos nos estender explicando cada ponto dessa ideologia, mas nos limitaremos a dizer
que é uma adaptação do positivismo, mesclada com o trabalhismo, à realidade
brasileira.
A partir disso, muitos afirmam, como prova material, que Getúlio Vargas era
reacionário. Afinal, o que há de mais reacionário que um positivista, que faria qualquer
coisa em nome da manutenção da “ordem”, incluindo a repressão de operários em nome
das oligarquias? Esse tipo de análise, entretanto, ignora que uma determinada ideologia,
pode se manifestar de diferentes formas em determinadas realidades. É sabido que, na
França e em boa parte do mundo, o positivismo se manifestou de forma abertamente
reacionária, reprimindo as aspirações revolucionarias do proletariado internacional.
Entretanto, como nos mostra o historiador marxista Eric Hobsbawm, em sua obra “A
Era dos Impérios”, apesar do positivismo ter se degenerado em aberração reacionária
nos países europeus, em países em desenvolvimento – sobretudo Turquia, México e
Brasil – o positivismo se manifestou de forma revolucionária, responsável por
impulsionar a abolição da escravatura (vale lembrar que, antes da Lei Áurea, Júlio de
Castilhos já havia libertado 90% dos escravos de Rio Grande sem indenização aos
escravistas); a fundação da República dos Estados Unidos do Brasil, derrubando a velha
monarquia; e posteriormente, com a Revolução de 30 (apesar de Hobsbawm não citar,
poderíamos elencar aqui o Tenentismo, cuja maior parte dos militares envolvidos
tinham alta influência positivista). Ainda poderíamos acrescentar os avanços
conquistados por certos presidentes de influência castilhista da República Velha (como
Borges de Medeiros, no Rio Grande) que buscaram ampliar a questão trabalhista no país
e até manifestaram apoio a Greve de 1917. (RIBEIRO, 2002)
Tal frase pode ser traduzida da seguinte maneira: a questão social é caso de polícia. Isso
é, de fato, um pensamento extremamente reacionário, que não representava os clamores
do povo brasileiro por melhores condições de trabalho. Na plataforma da Aliança
Liberal em 1930, Getúlio responde a tal estupidez:
Além da questão trabalhista, Getúlio ainda defende a anistia aos militares e civis
integrantes da Coluna Prestes, ressaltando que tal concessão:
“Não é, apenas, esta ou aquela parcialidade partidária que a solicita. É o
país que reclama.” (VARGAS APUD RIBEIRO, 2002)
Vemos aqui que, ao menos em discurso, Getúlio herdou todo o aspecto progressista dos
teóricos que o influenciaram. Não se tratava de um fascista, defensor da ordem acima de
tudo, aliado ao coronelismo e ao imperialismo, indo contra os interesses do povo
brasileiro. Se tratava de um político progressista, que defendia uma forte proteção da
indústria interna, a consolidação de uma legislação trabalhista, a anistia aos grandes
revolucionários que lutaram contra os oligarcas da República Velha, o voto livre e
secreto, e a reforma agrária.
É alegado, afinal, que mesmo com esses posicionamentos, Getúlio era um ferrenho
anticomunista. Ideologicamente, de fato, Getúlio sempre foi anticomunista. Em uma
conversa com sua filha Alzira Vargas, Getúlio disse que tanto o integralismo (leia-se
fascismo brasileiro), quanto o comunismo, eram ideologias estrangeiras, que não
poderiam ajudar a nação, sendo necessário uma ideologia de desenvolvimento própria,
feita por brasileiros, para que se atingisse os objetivos desejados (VARGAS, 1960). Tal
posicionamento de Getúlio, está ligado a uma limitação de classe. Como nacionalista,
não via além dos interesses da pátria, da principal contradição imperialismo e seus
lacaios x progressistas nacionalistas, não podendo avançar com a contradição capital x
trabalho.
Podemos concluir, dessa forma, que Getúlio não conseguiu avançar na questão marxista
de classe, ao contrário do presidente argentino. Entretanto, isso em nada tira o
progressismo dos seus pensamentos e ideais. Em nenhum momento Getúlio teve algum
tipo de influência fascista em sua formação ideológica, pelo contrário, até o presente
momento, sempre esteve ao lado das forças democratas da nação. Tal abordagem, é
claro, foi uma análise apenas do discurso, das propostas de Getúlio na Aliança Liberal, e
nos diários e conversas que o mesmo teve. Isso por si só não reflete, ao menos ainda, as
políticas de Getúlio na prática, e na forma que isso se relaciona com a sua classe.
A Defesa da Indústria Nacional – Getúlio: o Pai dos Pobres e a Mãe dos Ricos (mas
dos Ricos Brasileiros)
Existe, entretanto, certas controvérsias nesse ponto. É afirmado, geralmente, que boa
parte dessa industrialização foi paga com capital americano. Getúlio realmente fez um
jogo de concessões com o imperialismo em meados do Estado Novo, quando cedeu
bases militares aos EUA para poder bancar a Companhia Siderúrgica Nacional.
Para isso, deve se considerar o contexto da época. O Brasil, ao contrário do que dizem
certos udenistas, nunca teve flertes com o fascismo italiano ou alemão (nazismo).
Apesar de sempre prezar por manter a neutralidade e a as relações econômicas com
todos os lados (não nos esqueçamos que Getúlio estava bancando a industrialização), o
Brasil já havia expulso do território nacional, em 1938, o embaixador alemão Karl
Ritter, após esse declarar apoio aos Partidos Nazistas do sul do Brasil, que estavam
sendo severamente reprimidos pela polícia estado novista. Antes, vejam bem, da
Segunda Guerra. De acordo com as memórias do marechal Cordeiro de Farias:
“Declarei minha guerra à Alemanha em 1938, antes, portanto, do início
da Segunda Guerra Mundial” (FARIAS APUD RIBEIRO, 2002)
Em plena Segunda Guerra Mundial, dois navios brasileiros foram derrubados pelos
nazistas alemães. Novamente, certas frações da esquerda udenista buscam acusar os
americanos pelo ataque, como uma tentativa de pressionar o Brasil na entrada da guerra.
Tais falácias são devidamente refutadas no livro “U-507: O submarino que afundou o
Brasil na Segunda Guerra”, do jornalista Marcelo Monteiro. Haviam motivos de sobra
para mandar as divisões expedicionárias contra o Eixo.
Getúlio sabia, entretanto, que se envolver em uma guerra, traria gastos militares
extensos para a nação. Também sabia que os EUA estavam pressionando o país,
inclusive com um plano de invasão conhecido como “Rubber”. Enfrentar os EUA, à
época, era impossível para a parca força militar brasileira. Getúlio, então, usou um dos
artifícios que mais o acompanhou em sua vida política: a Realpolitik.
Como se sabe, uma das maiores propagandas do governo estado novista era justamente
sobre a questão operária. Os famosos bordões do tipo “Pai dos Pobres”, ainda
reivindicados pelos getulistas fervorosos, devem ser abandonados absolutamente. Já
vimos acima que as políticas econômicas de Getúlio eram destinadas a classe da
burguesia nacional, não podendo assim, ser um representante da classe operária.
Tal fato é de conhecimento geral, afinal, como já afirmado, era um dos pilares da
propaganda getulista. Devemos, então, analisar o caráter de tais leis, se realmente foram
efetivas, ou apenas “pelegas” e fascistas, com destaque para a Lei dos Sindicatos.
Certas frações da esquerda udenista, ainda que defendam a CLT atual, vociferam aos
quatro cantos: “vejam, a prova cabal do fascismo de Getúlio, as leis trabalhistas,
inspiradas na Carta del Lavoro de Mussolini”.
Para encerrar de vez a alegação de que as leis trabalhistas eram fascistas, cito aqui
Mario Pedrosa, um dos maiores trotskistas que o Brasil já teve, e grande opositor do
getulismo (inclusive, este integrou a UDN):
Vamos agora, para a Questão Agrária, um dos pontos mais controversos da Era Vargas.
“De fato, existe bastante evidência para mostrar como o regime Vargas
procurou ‘organizar a vida rural’ desde os primeiros meses de seu
governo provisório, nos anos 1930, até seus últimos meses de governo,
em 1945. Nos anos 1980, a renovação do movimento camponês já havia
chamado a atenção dos cientistas sociais do Brasil. Estudos realizados
com camponeses a partir desse período demonstraram como eles
lembravam o ‘tempo de Getúlio’ como um ‘tempo de fartura’. ‘Ele
deixou aquelas leis, que pobre não era cachorro, que não podia mandar
camarada embora, que tinha que pagar indenização’, relatou para a
antropóloga Verena Stolcke (1986, p.308, 327) uma trabalhadora rural
chamada Dona Maria. [...] Para as centenas de milhares de brasileiros que
viviam no campo, longe das disputas políticas, a nova legislação social
seria o instrumento que os motivaria a aumentar a produtividade. Essa
possibilidade fez Vargas antecipar a promulgação de um código para
todos os trabalhadores. ‘Tanto o proletário urbano como o rural
necessitam de dispositivos tutelares, aplicáveis a ambos, ressalvadas as
respectivas peculiaridades’ (Vargas, 1938, p.28). [...] No início de 1931,
o novo ministro do Trabalho, Lindolfo Collor, articulou a filosofia
sindicalista do governo quando anunciou a organização social do campo.
‘Já que os sindicatos de trabalhadores agrários praticamente não existem,
será indispensável promover a formação de alguns deles em vários
estados’ (Collor, 1931). Em reunião com fazendeiros, Collor explicou
que a sindicalização seria o meio para que as duas classes (eles, os
empregadores, e seus empregados, os camponeses) poderiam ajudar a
traçar a política agrícola do Brasil. Em março, 4 meses depois da
revolução, Vargas emitiu o Decreto 19.770 que explicou como o
Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio de Collor assumiria a
responsabilidade pela regulação das condições de trabalho nos setores
agrícola, comercial e industrial, registrando as associações de
empregador e empregado nas escalas local, estadual e nacional como
agências consultivas e técnicos do governo. [...] Mais uma vez, o governo
Vargas revelava sua intenção de promover a formação de sindicatos
rurais, agora na Carta corporativista de 1937. A Carta persistia em reunir
sob a lei os trabalhadores agrícolas e todos os outros trabalhadores. Em
seu capítulo sobre a economia nacional (Art. 57 a 63), deixou espaço
para investigar as condições de trabalho na agricultura e para
‘racionalizar a organização e administração’ do setor. Quando uma nova
lei de sindicalização foi decretada (Lei 1.402, de 5 de julho de 1939), ela
especificamente excluiu o setor agrário em seu artigo 58, determinando
no artigo 25, seção 4, que ‘as associações sindicais de grau superior da
agricultura e da pecuária serão organizadas na conformidade do que
dispuser a lei que regular a sindicalização dessas profissões’ [...] O
debate sobre a organização da vida rural iniciada na Era Vargas acentuou
a nova disposição do Brasil para ‘racionalizar’ ou ‘modernizar’ os
diversos setores de sua economia. Para espelhar a moderna sociedade
industrial, a sociedade agrícola teve de se organizar. Vargas manteve as
mudanças, e ninguém depois dele pôde negar as consequências. As
atividades econômicas do campo se desenvolveram em todos os sentidos
com a formação de 8 mil sindicatos de trabalhadores rurais [...] assim, o
governo Vargas nem excluiu nem ignorou o campo, mas gerou uma série
de estudos, ideias, leis e instituições para a organização da vida rural que
se mostrou parte permanente de seu legado.” (WELCH, 2015)
Foi também durante a Era Vargas que se teve a primeira experiência de reforma agrária
no país, com o Estatuto da Lavoura Canavieira (BRASIL, 1941). Mais tarde, esse
projeto de reforma agrária seria retomado por João Goulart, e devido a isso, sofreu o
lembrado golpe de 1964.
Um ponto, que geralmente é dito sobre isso, é que Getúlio teria garantido a manutenção,
e até feito um pacto de classe com os coronéis e latifundiários da República Velha. Tal
ponto é embasado, geralmente, na famosa compra do café paulista, feita pelo governo
federal à época, para garantir que a produção de café fosse mantida. Entretanto, se
Getúlio não houvesse “salvado” os barões do café na época, como defendia Washington
Luís, o colapso econômico do país não afetaria tanto em si os coronéis – mas sobretudo,
o proletariado paulista, que estava tendo seu salário reduzido ao máximo, antes da
legislação trabalhista se concretizar. Getúlio em nada simpatizava com os latifundiários
paulistas, mas a medida foi necessária. Comenta sobre isso o jornalista José Augusto
Ribeiro:
“O café era a riqueza e, nesse momento, o desespero das elites, não ainda
dos trabalhadores industriais da cidade. No início da crise do café, essas
elites tentaram safar-se levando o governo do Estado a tomar novos
empréstimos estrangeiros para custear a política de valorização dos
preços [...] Em 1929, porém, com a dificuldade cada vez maior na
tomada de empréstimos, surgem iniciativas alternativas: ‘Outra
providência que a oligarquia toma em sua defesa – diz Vavy Pacheco
Borges – é a baixa dos salários dos trabalhadores. Desde a crise de 1929,
os fazendeiros reduzem de 35 a 40% a remuneração do trabalho
agrícola... Em compensação permitem que esses empregados plantem
cereais entre as ruas dos cafezais...’. Até para preservar a simpatia e o
apoio dos trabalhadores de São Paulo, Getúlio precisava salvar as elites
de São Paulo antes que a crise do café atingisse mais profundamente a
cidade e suas indústrias e levasse a elas a redução dos salários – que a
ainda não tinham qualquer proteção legal – e de quebra aumentasse os
índices já perigosamente altos do desemprego [...] Decidido a agir
rapidamente, já em 1º de fevereiro de 1931 Getúlio assina o decreto que
permite a compra de estoques de café pelo governo federal. Era o que se
pedia a Washington Luís e ele recusara até o fim. Getúlio, porém, não se
limita aos desejos dos barões do café, aos quais Washington Luís
recomendara um ‘salve-se quem puder!’, sem considerar que a merecida
ruína deles teria como consequência uma crise econômica e social
devastadora. Os barões do café estavam acostumados a nada ceder.
Agora, porém, o governo não é controlado por eles e impõe,
compensando a permissão para a compra dos estoques encalhados, uma
taxa sobre cada pé de café, a proibição de novas lavouras e a retenção de
20% de todo o café exportado.” (RIBEIRO, 2002)
Ainda contra os latifundiários, o governo federal tomou várias outras medidas. Uma
delas, identificadas no clássico “Cangaceiros e Fanáticos” do grande jornalista e
comunista Rui Facó, foi o desarmamento forçado dos latifundiários brasileiros, o que
reduziu em muito (pelo menos até o final da Era Vargas) os conflitos agrários:
Por fim, é necessário questionar: se Getúlio fez tantas políticas pelo campesinato, e
igualmente prejudicou a classe latifundiária, porque não realizou uma reforma agrária
geral, por todo território nacional? Aparentemente, pela limitação da classe burguesa
enquanto ascendente na época. A burguesia, apesar de sepultar a República Velha, não
teve força para consolidar uma legítima reforma agrária por todo o território, apesar dos
casos isolados já citados. Diferente foi o homólogo de Vargas no México, Cárdenas,
que consolidou uma reforma agrária muito mais ampla, inspirada nos princípios
zapatistas, o que abrangeu boa parte do território mexicano (ainda que não todo).
Conclusão – O Legado de Getúlio e a Consolidação do Capitalismo Burocrático
Após toda a análise feita, podemos concluir o seguinte: Getúlio Vargas foi o maior
representante político que a nossa burguesia nacional já teve. Por meio de um sistema
de conciliação com as classes progressistas (pequena/média burguesia, proletariado e
campesinato), combateu as velhas oligarquias e classes parasitárias, aliadas ao
imperialismo, que até hoje assolam o país. Promoveu o desenvolvimento das forças
produtivas, a consolidação das leis trabalhistas para auxiliarem tanto o trabalhador rural
quanto urbano, e a industrialização pesada do Brasil, melhorando em muito a qualidade
de vida da população. Lutou até o último dia de sua vida pela implantação de um
capitalismo independente, livre do imperialismo e do latifúndio, e ao se confrontar com
os interesses do império (sobretudo em seu segundo governo), pagou com sua vida,
adiando por dez anos o golpe militar que aprofundaria o processo de capitulação ao
imperialismo e as oligarquias, anteriormente derrubadas.
Sendo um representante da burguesia nacional, de sua fração progressista, deve ser visto
de forma positiva pelos setores da atual esquerda brasileira – rejeitando tanto as
mentiras udenistas quanto as exaltações getulistas. Ele esteve, afinal, ao lado da
revolução (com todos os entraves e limitações que todos nós conhecemos).
Por fim, não precisamos de mais um “Getúlio”, que venha tentar reverter esse sistema
atual. A burguesia nacional provou ser incapaz de encabeçar a revolução democrática,
consolidando de forma quase profética as palavras de Stalin, de cem anos atrás.
Precisamos de um Partido Comunista de Novo Tipo, que conduza de fato uma
Revolução Democrática, e posteriormente, uma Revolução Proletária.
Bibliografia:
PERÓN, Juan Domingo. “Mi querido Presidente y Amigo”. 1965. Disponível em:
<https://www.infobae.com/politica/2017/07/08/la-carta-de-peron-a-mao-llevada-por-
militantes-que-iban-a-entrenarse-a-china/>.
ZEDONG, Mao. Análise das Classes na Sociedade Chinesa. 1926. Disponível em:
<https://www.marxists.org/portugues/mao/1926/03/classes.htm>.