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Parturiente de 38 semanas, diabética mal

controlada, teve desprendimento do polo


cefálico, porém sem desprendimento dos
ombros do feto. Qual o diagnóstico e qual a 6.1
conduta mais adequada? Essa mesma
paciente apresentou sangramento vaginal
aumentado no quarto período. Quais as
possíveis causas?
INTRODUÇÃO
A sequência de contrações uterinas coordenadas e involuntárias que resultam no
apagamento e na dilatação do colo uterino, simultaneamente à descida fetal, quando
associadas aos puxos e às contrações voluntárias da parede abdominal, na expulsão
dos produtos da gestação, denomina-se trabalho de parto. E o conjunto dos
movimentos passivos que o feto executa no transcurso do canal de parto é
denominado mecanismo de parto. O feto é o móvel ou objeto que percorre o trajeto
— bacia —, impulsionado por um motor — contração uterina (Obstetrícia, 2017).

O feto encontra-se em posição longitudinal em 99% dos casos, e em 96,5% em


apresentação cefálica, com apenas 1% em deflexão. Assim, 95,5% das gestantes em
trabalho de parto devem estar com seus fetos em apresentação cefálica fletida —
occipital. Por esse motivo, geralmente o mecanismo de parto analisa os movimentos
da cabeça sob a influência das contrações uterinas, passando pela fenda vulvar do
útero (Obstetrícia, 2017). A cabeça, apesar de ser menor que o resto do corpo, é
menos redutível. O mecanismo de parto apresenta movimentos passivos que
procuram adaptar o feto ao canal de parto (Obstetrícia, 2017).

O curso e o prognóstico são determinados por fatores maternos e fetais


(Ginecologia e obstetrícia: manual para concurso, 2007). São eles:

• Dimensões e configurações da pelve materna;

• Resistência das partes do canal do parto — colo uterino e partes moles;

• Dimensões do feto;

• Eficiência das contrações uterinas.

Os tempos do mecanismo de parto são: insinuação ou encaixamento, descida e


desprendimento.
6.2 MECANISMO DE PARTO NAS APRESENTAÇÕES
CEFÁLICAS FLETIDAS
Ocorre em cerca de 96% das gestações. O maior diâmetro nas apresentações
fletidas é o suboccipitobregmático e corresponde a 9,5 cm. Os movimentos
contínuos e sucessivos do mecanismo de parto em apresentações fletidas são:
insinuação; descida; rotação interna da cabeça; desprendimento; rotação externa da
cabeça; desprendimento das espáduas.

6.2.1 Insinuação – Primeiro tempo

A insinuação consiste na passagem do diâmetro biparietal pelo estreito superior da


bacia. A sutura sagital é a linha de orientação. O feto está insinuado quando o ápice
da cabeça fetal se encontra no nível das espinhas isquiáticas — plano 0 de De Lee.
Tem como tempo preliminar a redução dos diâmetros, o que, nas apresentações
cefálicas, é conseguido pela flexão — apresentação de vértice —, ou deflexão —
apresentação de face. Na apresentação pélvica, a redução dos diâmetros é obtida
aconchegando-se os membros inferiores sobre o tronco ou desdobrando-se os
membros, para baixo ou para cima. Nas apresentações córmicas, a insinuação não
ocorre com feto de tamanho normal, em decorrência da grande dimensão dos
diâmetros (Obstetrícia, 2017).

A insinuação ocorre por dois processos diferentes. São eles:

• Insinuação estática, processada na gravidez, em mais de 50% das primigestas.


Flexão por aconchego no segmento inferior e na descida, conjuntamente com o
útero, por tração dos ligamentos sustentadores do órgão e pressão das paredes
abdominais;

• Insinuação dinâmica, que surge no fim da dilatação cervical ou no início do período


expulsivo nas multíparas. Flexão por contato com o estreito superior da bacia e
descida à custa das contrações expulsivas (Obstetrícia, 2017).

No início dessa fase, a cabeça fetal encontra-se acima do estreito superior da bacia,
em flexão moderada, com a sutura sagital orientada no sentido do diâmetro oblíquo
esquerdo ou do transverso e com a pequena fontanela — fontanela lambdoide —
voltada para esquerda (Obstetrícia, 2017). Os autores franceses, no que têm sido
seguidos pelos demais latinos, consideram a variedade de posição mais frequente,
cerca de 60%, a occipito-esquerda-anterior (OEA), que designam de primeira
posição (Obstetrícia, 2017).

A atitude de moderada flexão — atitude indiferente —, em que se encontra a cabeça


no início do mecanismo do parto, apresenta ao estreito superior da bacia o diâmetro
occipitofrontal, maior do que o suboccipitobregmático, que mede 9,5 cm. Para
apresentar esse último diâmetro, mais favorável, a cabeça sofre um primeiro
movimento de flexão (Obstetrícia 2017).
A flexão da cabeça pode ser explicada por três teorias, descritas a seguir
(Obstetrícia, 2017):

• Teoria de Zweifel: a implantação da coluna cervical na base do crânio se faz mais


para o lado occipital do que da face, criando a condição de uma alavanca de braços
desiguais. A contrapressão exercida pelo contato das bordas da pelve, representando
forças iguais nos dois extremos da alavanca, domina o braço mais longo, que
corresponde à face, por isso, esse extremo sobe e o outro desce;

• Teoria de Lahs: define que as pressões laterais exercidas sobre a cabeça pelo canal
do parto alcançam níveis diferentes, sendo o mais baixo, o lado occipital. A ação das
linhas de força em sentido oposto resulta no abaixamento do occipital;

• Teoria de Sellheim: explica que mediante uma diferença de pressão atmosférica,


quando um elipsoide de rotação, colocado obliquamente ao seu eixo, progride
através de um tubo reto, igual ao canal do parto, o elipsoide dispõe-se de modo que
seu eixo maior coincida com o eixo do tubo.

Essas três teorias não se contradizem: explicam o mesmo fenômeno de maneiras


diferentes (Obstetrícia, 2017).

Figura 6.1 - Teoria de Sellheim

Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Em bacias normais, na maioria dos casos, o encaixamento dos fetos em


apresentação cefálica ocorre pelos movimentos de assinclitismo (Ginecologia e
obstetrícia: manual para concurso, 2007).

A cabeça, antes da insinuação, é observada em posição transversa, com o parietal


posterior apresentando-se sobre a região anterior da pelve — obliquidade de
Litzmann. A sutura sagital permanece horizontalmente sobre a sínfise, ligeiramente
por detrás dela. A insinuação ocorre por mecanismo de alavanca: flexão lateral da
cabeça para o lado oposto, ficando a sutura sagital no diâmetro transverso da bacia
— sinclitismo. Simultaneamente, começa a descida, e logo a apresentação do
parietal posterior, no estreito superior, é substituída pela apresentação do parietal
anterior, na escavação — obliquidade de Nägele (Obstetrícia, 2017).

A seguir, estão as características dos tipos de assinclitismo:

• Assinclitismo anterior:

• Parietal anterior desce primeiro;


• Sutura sagital próxima ao sacro;
• Obliquidade de Näegele;
• Mais comum em multíparas.

• Assinclitismo Posterior:

• Parietal posterior desce primeiro;


• Parietal posterior e sutura sagital próximas ao pube;
• Obliquidade de Litzman;
• Mais comum em primíparas, porque a parede abdominal é mais firme e empurra o
polo cefálico, levando ao parietal posterior descer antes do anterior.

Geralmente, o assinclitismo é transitório. Entretanto, se permanecer, consideramos


distocia, devendo ser avaliado como tal. Para saber se o encaixamento aconteceu:
porção mais baixa do polo cefálico encontra-se ao nível ou abaixo dos níveis das
espinhas isquiáticas — plano 0 de De Lee (Ginecologia e obstetrícia: manual para
concurso, 2007).
Figura 6.2 - Assinclitismo posterior da cabeça
Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 6.3 - Assinclitismo anterior da cabeça


Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 6.4 - Sinclitismo da cabeça


Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 6.5 - Bipartição dos ossos parietais

Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

6.2.2 Descida – Segundo tempo

A descida ocorre quando há progressão do polo cefálico do estreito superior ao


inferior da pelve materna; começa no início do trabalho de parto e só termina com
expulsão total do feto (Ginecologia e obstetrícia: manual para concurso, 2007).
Durante a insinuação e a descida, ocorrem movimentos de inclinação lateral da
apresentação, denominados assinclitismo.

O assinclitismo é anterior quando a sutura sagital está mais próxima do sacro, e


posterior quando essa sutura está mais próxima do pube. A ausência de flexão
lateral quando a sutura sagital está equidistante desses reparos anatômicos é
chamada de sinclitismo. Durante esse mecanismo do parto, o movimento da cabeça
é turbinal: à medida que o polo cefálico roda, vai progredindo no seu trajeto
descendente. É a penetração rotativa, de Fernando Magalhães (Obstetrícia, 2017).

É considerada o fator mais importante do trabalho de parto em relação ao parto


vaginal (Ginecologia e obstetrícia: manual para concurso, 2007).
Figura 6.6 - Descida cefálica avaliada em centímetros relativamente ao diâmetro biciático (De
Lee)
Fonte: adaptado de Fetal station based on the trapezoidal plane and assessment of head
descent during instrumental delivery, 2014.

Figura 6.7 - Eixo da bacia e planos de Hodge

Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

6.2.3 Rotação interna da cabeça – Terceiro tempo

Essa fase tem início quando o polo cefálico entra em contato com o assoalho
pélvico, no qual se inicia o acotovelamento do canal de parto, o que significa que a
circunferência máxima da cabeça fetal se encontra ao nível das espinhas isquiáticas
— plano 0 de De Lee. A rotação interna tem por finalidade colocar a linha de
orientação no diâmetro anteroposterior do estreito inferior da bacia materna.
Geralmente, o lambda loca-se abaixo do pube com a rotação interna da cabeça, ou
seja, há rotação para a posição occipitopúbica. A rotação ocorre sempre no sentido
da menor circunferência a percorrer e vai depender da posição da cabeça fetal no
momento do encaixamento, sendo menor nas posições occipitoanteriores — por
volta de 45° — e maior na occipitoposteriores — por volta de 135°.
Figura 6.8 - Variedade de posição fetal occipitodireita anterior

Nota: vai rodar 45° para OP.


Fonte: elaborado pelo autor.

Figura 6.9 - Variedade de posição fetal occipitodireita posterior


Nota: vai rodar 135° para OP.
Fonte: elaborado pelo autor.

Figura 6.10 - Variedade de posição fetal occipitoesquerda anterior

Nota: vai rodar 45° para OP.


Fonte: elaborado pelo autor.

Figura 6.11 - Rotação interna

Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Entretanto, há casos em que a rotação interna da cabeça ocorre para a posição


occipitossacra, sendo uma posição pior para o desprendimento cefálico.
Simultaneamente à rotação interna da cabeça e sua progressão no canal do parto,
ocorre a penetração das espáduas através do estreito superior da bacia. A avaliação
clínica realizada por toque vaginal é muito importante para avaliar a evolução do
trabalho de parto e a necessidade de utilizar fórcipe ou vacuoextrator (Ginecologia e
obstetrícia: manual para concurso, 2007).

6.2.4 Desprendimento da cabeça fetal ou extensão – Quarto tempo

Começa quando a cabeça fetal chega ao nível do períneo. Após o término da rotação
interna, o lambda se encontra sob a sínfise púbica, com a sutura sagital no sentido
anteroposterior (Ginecologia e obstetrícia: manual para concurso, 2007).

Desprendimento cefálico: a cabeça fetal desprende-se com o auxílio da retropulsão


do cóccix; nas cefálicas fletidas, o desprendimento é por movimento de deflexão; o
desprendimento ocorre mais rapidamente em occipitopúbica do que em
occipitossacra (OS). No desprendimento em OS, a cabeça acentua a flexão e a
deflexão ocorre quando o suboccipital é liberado. Há grande risco de laceração
perineal posterior.
Figura 6.12 - Mecanismo de parto na posição occipitoesquerda anterior
Legenda: (A) e (B) insinuação e descida; (C) e (D) rotação para occipitopúbica.
Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 6.13 - Ampliação de períneo pela cabeça na apresentação de vértice


Nota: a cabeça aparece na vulva; o occipício está sob a sínfise e a fronte já transpôs a ponta do
cóccix; deflexão do polo cefálico prestes a começar.

Figura 6.14 - Desprendimento cefálico em occipitopúbica

Nota: deflexão total da cabeça e libertação das bossas frontais.

6.2.5 Rotação externa da cabeça – Quinto tempo

Corresponde à restituição do occipício à orientação observada antes da rotação


interna após a saída da cabeça fetal; esse movimento ocorre simultaneamente à
rotação interna das escápulas, que orienta o diâmetro biacromial — ombros — na
direção anteroposterior da saída do canal. Geralmente, o ombro anterior fica
orientado para o pube e o ombro posterior fica orientado para o sacro. Isso ocorre na
altura do estreito médio. Este tempo do mecanismo do parto não requer a
intervenção do obstetra (Ginecologia e obstetrícia: manual para concurso, 2007).

6.2.6 Desprendimento das espáduas

Desprendimento da cintura escapular e do polo pélvico. A liberação do ombro


anterior ocorre primeiro, seguido da liberação do ombro posterior. Em seguida, há
liberação da pelve do feto de forma rápida e sem problemas. Pode acontecer de
forma espontânea, mas geralmente é necessária uma tração leve no sentido
posterior para desprendimento do ombro anterior e logo após no sentido anterior
para a saída do ombro posterior. Nessa fase, pode ocorrer a distocia de ombro,
acontece em 1 a 4 % dos partos.
Sobre as cefálicas fletidas:

• Ponto de referência: occipício — lambda;

• Linha de orientação: sutura sagital;

• Desprendimento: deflexão;

• Diâmetro: suboccipitobregmático em 9,5 cm.

6.3 MECANISMO DE PARTO EM APRESENTAÇÃO


BREGMÁTICA
Figura 6.15 - Graus de deflexão de cabeça

A defletida de primeiro grau, é a de melhor prognóstico (Obstetrícia, 2017). O


mecanismo de parto e a evolução da progressão se assemelham aos da cefálica
fletida, sendo mais prolongada a duração do trabalho (Obstetrícia, 2017).

Sobre as cefálicas defletidas de primeiro grau:

• Ponto de referência: bregma;

• Linha de orientação: sutura sagitometópica;

• Desprendimento: flexão seguida por deflexão;

• Diâmetro: occipitofrontal em 12 cm;

• Causas: vício pélvico, laceração perineal, rotura prematura das membranas ovulares
e placenta prévia.
Figura 6.16 - Apresentação defletida de primeiro grau

Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

6.4 MECANISMO DE PARTO EM APRESENTAÇÃO DE


FRONTE
Sobre as cefálicas defletidas de segundo grau:

• Ponto de referência: raiz do nariz ou glabela;

• Linha de orientação: sutura metópica;

• Mecanismo de parto: maior frequência de distocias entre as apresentações


cefálicas, com indicação de cesárea quando há persistência após dilatação total;

• Diâmetro: occipitomentoniano em 13 cm;

• Causas: vício pélvico, tumores prévios, multiparidade, vícios de conformação


uterina, feto volumoso, placenta prévia ou malformações fetais — dolicocefalia.

É a variedade de posição em deflexão mais rara e com pior prognóstico. Refere-se à


apresentação em que a região entre o rebordo orbital e a fontanela anterior é a
superfície fetal que se apresenta no canal do nascimento — fronte ou testa. A
variedade de fronte impede a insinuação da cabeça fetal. Entretanto, na maioria das
vezes, essa variedade de posição é transitória. Quando persistente, há indicação de
cesárea, visto que o diâmetro occipitomentoniano é bem maior que o diâmetro
suboccipitobregmático — apresentação fletida.
Figura 6.17 - Apresentação defletida de segundo grau

Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

6.5 MECANISMO DE PARTO EM APRESENTAÇÃO DE


FACE
Sobre as cefálicas defletidas de terceiro grau:

• Ponto de referência: mento;

• Linha de orientação: linha facial;

• Desprendimento: flexão; indicação de parto cesárea nas variedades de posição


mentoposterior;

• Diâmetro: submentobregmático em 9,5 cm;

• Causas: polidrâmnio, amniorrexis precoce com saída intempestiva do líquido


amniótico, ventre materno “em pêndulo”, vício pélvico, tumores prévios, bócio fetal
congênito e malformações fetais, gravidez múltipla, grande multiparidade,
prematuridade e DCP (Obstetrícia, 2017).

Na apresentação de face, o maior diâmetro será o submentobregmático, que é


relativamente pequeno, e geralmente é capaz de atravessar o conjugado obstétrico.
Pode ocorrer as variedades de posição mentoanterior e mentoposterior. A
apresentação mentoposterior geralmente não evolui positivamente via vaginal, pois
a cabeça, pescoço e ombro tentam entrar simultaneamente na pelve e a boca fetal
pode abrir prejudicando o parto. Dessa forma, o parto vaginal mais traumático e
demorado é possível em apresentação de face anterior. Se apresentação de face
mentoposterior, deve-se realizar o parto cesárea.

Pelo toque, o obstetra identifica as diversas estruturas da face fetal: nariz,


proeminência malar, boca e queixo, sendo o mento o ponto de referência
(Obstetrícia, 2017).

Procedimentos tococirúrgicos, como a aplicação do fórcipe, vacuoextração, rotação


manual ou instrumental, assim como a tentativa de flexão manual da cabeça, não
devem ser empregados na apresentação de face.

Figura 6.18 - Apresentação defletida de terceiro grau

Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

6.6 APRESENTAÇÃO CÓRMICA


Na apresentação córmica, o grande eixo fetal não coincide com a direção da coluna
vertebral materna, cruzando-o em ângulo reto — situação transversa. A
apresentação córmica tem incidência de 1:300 partos (Obstetrícia, 2017).
Sobre a apresentação transversa — córmica:

• Ponto de referência: acrômio;

• Linha de orientação: dorso;

• Desprendimento: indicação de cesárea;

• Causas: a prematuridade é o principal fator de risco para sua ocorrência.


Implantação placentária, alterações morfológicas uterinas e distensão uterina podem
alterar o espaço dentro da cavidade uterina e afetar a posição fetal; tumores prévios.

As apresentações córmicas geralmente se modificam para apresentação cefálica ou


pélvica ao longo da gestação, em até 35% dos casos. Entretanto, quando se mantém
durante o trabalho de parto prolongado, pode ocorrer ruptura uterina. É indicativo de
parto cesárea quando presente durante o trabalho de parto. Quando o diagnóstico é
realizado antes do trabalho de parto, é possível fazer versão externa para a
apresentação cefálica, a ser realizada entre 36 e 37 semanas de gestação, podendo
ser repetida entre 38 e 39 semanas e indução do parto. Caso a versão externa não
seja realizada, opta-se por cesárea entre 39 a 40 semanas de gestação. Não se
realiza versão cefálica externa em mulheres com membranas rotas, porque há maior
risco de complicações maternofetais, como prolapso de cordão. A parturição
espontânea pode acontecer em fetos muito prematuros e, sobretudo, quando foi a
óbito, mais facilmente em multíparas com a bacia ampla. É o chamado mecanismo
em conduplicato corpore (Obstetrícia, 2017).

6.7 APRESENTAÇÕES PÉLVICAS


A maioria dos fetos mudará para a apresentação cefálica antes do trabalho de parto.
Normalmente, o ponto de referência nessas apresentações é o sacro, e a linha de
orientação é o sulco interglúteo. No parto pélvico, a expulsão dos segmentos fetais é
mais difícil, visto que o volume deles é progressivamente maior — pelve, ombro e
cabeça —, sendo o “parto das dificuldades crescentes”. O polo pélvico apresenta o
diâmetro bitrocanteriano.

Quanto maior o polo insinuado melhor é o teste para a bacia, assim, as pélvicas
completas tem melhor chance no parto normal pela insinuação da circunferência
sacrotibial, de maior extensão (Obstetrícia, 2010). A rotura das membranas somente
deve ocorrer no período expulsivo e não se deve tracionar o feto (Obstetrícia, 2017).

6.7.1 Insinuação

Leve assinclitismo posterior, o bitrocantérico dispõe-se em um dos diâmetros


oblíquos — passa de 12 para 9,5 cm.

6.7.2 Descida e rotação

O bitrocanteriano é orientado em relação ao diâmetro anteroposterior, portanto, a


rotação interna no parto pélvico é sempre de 45° (Obstetrícia, 2010).
6.7.3 Desprendimento pélvico

Diferentemente da apresentação cefálica, o modo da apresentação é laterolateral —


posição transversa —, e não anteroposterior. Normalmente, esse passo não tem
grandes complicações, com a saída primeiro do quadril posterior, com a realização
do hipomóclio (Obstetrícia, 2010). Depois, há saída do quadril anterior e do tronco
(Obstetrícia, 2010). Nesse momento, há a insinuação das escápulas sempre com os
membros superiores fletidos a frente do tórax (Obstetrícia, 2017).

6.7.4 Desprendimento das escápulas

Após o desprendimento da pelve, o feto desce com a rotação das escápulas —


diâmetro biacromial — para o diâmetro anteroposterior da bacia. Geralmente, a
escápula anterior é a primeira a se apresentar; logo em seguida, com a retropulsão
do cóccix, a escápula posterior também se apresenta.

6.7.5 Desprendimento da cabeça derradeira

Logo após a saída do tronco fetal, seu dorso deve ser posicionado para cima,
apreendendo-o com os polegares ao longo das coxas e os quatro dedos restantes de
cada mão aplicados sobre a região lombossacra (Obstetrícia, 2017) realizando a alça
de cordão, evitando a compressão e o estiramento do cordão. Quando o ângulo da
escápula anterior surge na vulva, o feto é levantado em direção ao abdome materno,
próximo a sínfise púbica — manobra de Bracht (Obstetrícia, 2010).

Sobre o desprendimento da cabeça derradeira pélvica:

• Ponto de referência: sacro;

• Linha de orientação: sulco interglúteo;

• Desprendimento: há desprendimento pélvico, escapular e da cabeça derradeira,


com características específicas;

• Causas: prematuridade e outros.


6.8 MANOBRAS NAS DISTOCIAS DE PARTO
Quadro 6.1 - Resumo das manobras nas distocias de parto
Figura 6.19 - Mecanismo de parto no sacrodireito anterior
Figura 6.20 - Manobra de Bracht
Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 6.21 - Manobra de Rojas


Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 6.22 - Preensão do polo pélvico


Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.
Figura 6.23 - Manobra de Pajot
Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

Figura 6.24 - Manobra de Mauriceau


Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

6.8.1 Algoritmo para distocia de ombro

A distocia de ombros é óbvia quando a cabeça fetal se exterioriza e se retrai, o que é


comumente referido como “sinal da tartaruga”. É emergência obstétrica e são
necessárias manobras imediatas para solucioná-la. As técnicas obstétricas podem
ser divididas em: primeira linha, segunda linha e terceira linha.

São consideradas medidas preliminares:

• Requisição de obstetra mais experiente, auxiliares, anestesista e neonatologista;

• A episiotomia por si só não soluciona a distocia de ombros, que é problema ósseo;


no entanto, ela pode ser necessária para manobras internas;

• Não deve ser aplicada força em excesso sobre a cabeça ou o pescoço nem exercer
pressão no fundo do útero, porque essas manobras não deslocam o ombro
impactado e podem lesionar a mãe e o feto;

• Colocar as nádegas da paciente na borda da mesa.

Sobre as técnicas obstétricas:

• Manobras de primeira linha: a manobra de McRoberts e a pressão suprapúbica;

• Manobras de segunda linha: manobras internas de rotação — Rubin II, Woods e


Woods reverso —, extração do braço posterior e colocar a paciente em posição de
quatro apoios;

• Manobras de terceira linha: manobras heroicas, de exceção, propostas na última


tentativa de evitar o óbito fetal. São: a clidotomia, a manobra de Zavanelli e a
sinfisiotomia.
Figura 6.25 - Distocia de ombro
Fonte: Obstetrícia, 2017.

6.9 ASSISTÊNCIA CLÍNICA AO PARTO


O trabalho de parto consiste na presença de contrações uterinas rítmico-regulares e
efetivas maiores ou iguais a duas contrações a cada 15 minutos e dois ou mais dos
critérios a seguir:

• Apagamento cervical;

• Colo dilatado maior ou igual a 3 cm;

• Ruptura espontânea da bolsa das águas.

Contrações com duração de 50 a 60 segundos, aproximadamente, mais dolorosas,


são contrações efetivas, típicas de trabalho de parto. Duas contrações a cada dez
minutos é um sinal de trabalho de parto ou iminência de TP (Obstetrícia, 2017).

As contrações apresentam dois papeis fundamentais no trabalho de parto:


modificam o colo — abertura do colo — e provocam a descida da apresentação fetal.
Clinicamente, o parto pode ser dividido em quatro períodos: período de dilatação,
período expulsivo, dequitação e quarto período.

São pródromos de trabalho de parto presença de contrações uterinas irregulares e


arrítmicas; inicia-se entre 30 e 36 semanas de gestação e pode durar semanas.
Pode ocorrer saída do tampão mucoso endocervical, precedendo o parto em vários
dias.

6.9.1 Período de dilatação ou primeiro período do trabalho de parto

Começa no início do trabalho de parto com contrações ativas e termina na dilatação


total (Obstetrícia 2017). Nas primíparas, ocorre primeiro o apagamento do colo e
depois a dilatação; nas multíparas, os dois ocorrem o mesmo tempo (Obstetrícia,
2017).

Esse período é dividido em duas etapas:

• Fase de latência: há contrações uterinas, início da dilatação cervical e descida do


polo cefálico. Alterações cervicais são fisiologicamente lentas. A dilatação nessa fase
é de 0,35 cm/h, com duração variável. Esse período dura até dilatação entre 3 e 5 cm.
A fase latente é considerada prolongada quando:

• Nulíparas: maior que 20 horas;


• Multíparas: maior que 14 horas.

• Fase ativa: essa fase é caracterizada por contrações dolorosas, regulares


(Assistência aos quatro períodos do parto de risco habitual, 2018) com aumento
gradual de frequência e intensidade, levando à rápida dilatação do colo. Geralmente,
se inicia com 5 cm de dilatação. Após 5 cm de dilatação cervical, é esperada
dilatação, em média, de 1 cm/h, entretanto, pode variar amplamente entre as
pacientes:

• Nulíparas: 1,2 cm/h com duração média de 4 a 6 horas;


• Multíparas: 1,5 cm/h com duração média de 2 a 4 horas;
• Métodos não farmacológicos de analgesias devem ser sempre estimulados (Who
recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience, 2018).

O controle de vitalidade fetal deve ser realizado com a avaliação da frequência


cardíaca, pelo menos, a cada 30 minutos, antes, durante e até 30 segundos após
uma contração (Assistência aos quatro períodos do parto de risco habitual, 2018).
Durante o período de dilatação do trabalho de parto, a frequência das contrações
uterinas varia de dois a cinco episódios a cada dez minutos.

A amniotomia é considerada precoce quando a rotura ocorre no início do trabalho de


parto; oportuna, no final da dilatação (Obstetrícia, 2017); tardia, após esse momento,
80% das roturas espontâneas ocorrem no fim do período de dilatação e início do
expulsivo (Obstetrícia, 2017).

A Organização Mundial da Saúde emitiu novas diretrizes em 2018 para estabelecer


padrões de atendimento globais para mulheres grávidas saudáveis e reduzir
intervenções médicas desnecessárias; as principais mudanças incluem:

• A fase ativa do parto inicia-se com dilatação cervical de 5 cm;

• A progressão da dilatação, pode variar amplamente entre as pacientes; o ideal é que


a fase ativa (OMS, 2018) não ultrapasse dez horas em multíparas e 12 horas em
primíparas.

Tríplice gradiente descendente: a contratilidade uterina obedece ao sentido


descendente da propagação, há maior duração da contração próxima ao seu ponto
de origem e a sua intensidade é decrescente à medida que se aproxima do colo.
Considera-se suspeita para falha de progresso na fase ativa de trabalho de parto
quando:

• Dilatação cervical menor que 2 cm em quatro horas para as primíparas;

• Dilatação cervical menor que 2 cm em quatro horas ou um progresso lento do


trabalho de parto para as multíparas (Diretrizes nacionais de assistência ao parto
normal, 2017).

Métodos não farmacológicos de analgesias devem ser sempre estimulados


(Diretrizes nacionais de assistência ao parto normal, 2017). Durante o trabalho de
parto, a ingestão de líquidos e de alimento com baixo teor de resíduos pode ser
permitida nas parturientes com baixo risco (Diretrizes nacionais de assistência ao
parto normal, 2001).
6.9.2 Período expulsivo ou segundo período do trabalho de parto

Acontece quando a dilatação cervical está finalizada e termina com o


desprendimento total do feto.

A duração desse período pode variar, principalmente levando em conta a paridade


da paciente e a realização de analgesia de parto. Assim, considera-se período
expulsivo prolongado:

• Nulíparas: mais que três horas com analgesia de parto e mais que duas horas e meia
sem analgesia de parto;

• Multíparas: mais que duas horas com analgesia de parto ou mais que uma hora sem
analgesia de parto.

Pode ser dividida em:

• Fase inicial ou passiva: dilatação total do colo sem sensação de puxo involuntário
ou parturiente com analgesia e a cabeça do feto ainda relativamente alta na pelve;

• Fase ativa: dilatação total do colo, cabeça do bebê visível, contrações de expulsão
ou esforço materno ativo após a confirmação da dilatação completa do colo do útero,
na ausência das contrações de expulsão (Assistência aos quatro períodos do parto
de risco habitual, 2018).

Há metrossístoles involuntárias de intensidade de 50 mmHg, com frequência de


cinco contrações em dez minutos, aparecimento dos puxos para auxiliar a impelir o
feto por meio do canal de parto.

A episiotomia é um procedimento seletivo que deve ser justificado (Diretrizes


nacionais de assistência ao parto normal, 2017), não é necessária em todas as
pacientes.

Proteção do períneo deve ser realizada durante o parto vaginal. A manobra de


Kristeller não deve ser utilizada. Paciente deve ser encorajada a ficar na posição que
desejar para o parto (Diretrizes nacionais de assistência ao parto normal, 2017). Deve
ser incentivado o aleitamento na primeira hora de vida, devendo-se aguardar ao
menos três minutos para a ligadura do cordão umbilical, após cessadas suas
pulsações, em caso de recém-nascidos saudáveis (Obstetrícia, 2017).

A revisão da região vulvoperineal é recomendada, porém, a revisão da vagina e do


colo uterino deve ser sistemática apenas quando o parto for cirúrgico ou houver
sangramento anormal (Obstetrícia 2017).
Figura 6.26 - Contração uterina: correlação entre o registro da pressão intra-amniótica e o
exame clínico

6.9.3 Dequitação ou terceiro período do trabalho de parto

Esse período também é denominado de secundamento, delivramento ou decedura.


Inicia-se após o desprendimento fetal e é finalizado com a saída da placenta. Ajuda
no descolamento, na descida e na expulsão da placenta e assegura a hemostasia. Na
maioria dos casos, ocorre entre cinco e dez minutos após o período expulsivo e é
considerada prolongada quando ultrapassa 30 minutos, além de estar associado à
hemorragia pós-parto. Existem dois mecanismos de dequitação:

• Baudelocque-Schultze — central: placenta no fundo uterino. Primeiro há saída da


placenta pela face fetal e depois eliminação do coágulo. Mais frequente – 75% casos;

• Baudelocque-Duncan — marginal: placenta inserida na parede lateral do útero.


Primeiro ocorre o sangramento e depois a exteriorização da placenta pela face
materna, pela borda inferior (Obstetrícia, 2017).

O manejo ativo do terceiro período pode ser realizado na conduta ativa, para diminuir
a chance de hemorragia: utiliza-se uterotônicos — 10 UI de ocitocina após o
desprendimento dos ombros ou logo após o nascimento —, tração controlada do
cordão — cuidado com inversão uterina — após a separação placentária (Who
recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience, 2018) e
massagem uterina após secundamento. O uso de ocitocina, 10 UI, IM, após
dequitação placentária é conduta preconizada em muitos serviços como forma de
diminuir a chance de hemorragia. Sempre revisar a placenta para confirmar que saiu
inteira (Obstetrícia, 2017).

6.9.4 Quarto período do trabalho de parto ou período de


Greenberg

Caracterizado pela primeira hora após a dequitação. Nesse intervalo de tempo,


esperam-se a estabilização dos sinais vitais maternos e a consolidação da
hemostasia uterina, que acontece por dois mecanismos principais:

• Miotamponamento: oclusão dos vasos miometriais pela retração muscular — globo


de segurança de Pinard —; primeira linha de defesa contra a hemorragia (Obstetrícia,
2017);

• Trombotamponamento: os vasos são obliterados por trombose vascular,


constituindo hematoma intrauterino que recobre, de modo contínuo, a ferida aberta
no local placentário. Os coágulos enchem a cavidade uterina, à medida que a matriz
gradualmente se relaxa e atinge, ao fim de uma hora, o nível do umbigo (Obstetrícia,
2017).

A perda sanguínea média total no parto vaginal é de, aproximadamente 300 a 500
mL. Nesse período, pode ocorrer hemorragias significativas, principalmente por
atonia uterina. Fatores associados a alterações nesse período, com sangramento
uterino aumentado: trabalho de parto prolongado ou excessivamente rápido,
gestações múltiplas, fetos macrossômicos e polidramnia.
Figura 6.27 - Evolução do parto dividido funcionalmente

6.10 HEMORRAGIA PUERPERAL


É a hemorragia pós-parto que cursa com perda sanguínea suficiente para causar
instabilidade hemodinâmica de grande importância. Ainda é uma grande causa de
morbimortalidade materna com incidência de 10 a 15% (Ginecologia e obstetrícia:
manual para concurso, 2007). A perda sanguínea de mais de 500 mL no parto
vaginal ou mais de 1.000 mL no parto cesárea, ou perda sanguínea suficiente para
causar instabilidade hemodinâmica, podem ser:

• Primária ou precoce: se ocorre nas primeiras 24 horas pós-parto 75% — principal


causa de atonia uterina;

• Secundária ou tardia: quando acontece após as primeiras 24 horas até 12 semanas


pós-parto. (Obstetrícia, 2017; Ginecologia e obstetrícia: manual para concurso, 2007).

Os sinais e sintomas clínicos podem variar entre palpitações, vertigem, fraqueza,


sudorese, taquicardia, agitação e palidez, podendo chegar a oligúria/anúria e colapso.
Existem quatro principais fatores responsáveis para a ocorrência da hemorragia
puerperal. São os chamados 4 “Ts”, apresentados a seguir com suas respectivas
condutas:

• Tônus: alteração do tônus uterino — hipotonia/atonia uterina. Massagem uterina


bimanual, drogas uterotônicas — ocitocina, derivados do “ergot”, prostaglandinas —,
agentes hemostáticos ou agentes vasopressores — noradrenalina. Se necessário,
medidas cirúrgicas: sutura de B-Lynch, ligadura de artérias uterinas, de artérias
hipogástricas ou histerectomia;

• Trauma: trauma de canal de parto, rotura uterina ou inversão uterina (Ginecologia e


obstetrícia: manual para concurso, 2007). Podem ser diagnosticados no exame físico
e devem ser prontamente corrigidos com técnica cirúrgica adequada;

• Tecido: retenção do tecido placentário ou de membranas. Realização de extração


manual da placenta — retenção placentária —, curetagem uterina puerperal ou
histerectomia — acretismo placentário;

• Trombina: estão representadas principalmente pela doença de von Willebrand e


mais raramente pela Púrpura Trombocitopênica Idiopática (PTI), Púrpura
Trombocitopênica Trombótica (PTT) e hemofilias (Obstetrícia, 2017). Devem ser
realizados tratamento da doença de base, avaliação do status de coagulação e
contagem de plaquetas.

Algumas medidas são prioritárias, independentemente do fator desencadeante:


reposição volêmica e, eventualmente, tratamento do choque e reanimação
cardiopulmonar (Obstetrícia, 2017).

Nas situações de alteração de tônus uterino — 70% dos casos de hemorragia


puerperal —, a conduta consiste em: massagem uterina bimanual, utilização de
drogas que ajudam na contratilidade das fibras musculares do útero, sendo as mais
utilizadas a ocitocina, os derivados do “ergot” — metilergometrina — e as
prostaglandinas — misoprostol —; medidas cirúrgicas, como sutura de B-Lynch,
ligadura de artérias uterinas, das artérias hipogástricas, ou histerectomia, deverão
ser realizadas quando todas as alternativas já citadas falharem.

Os principais fatores predisponentes são: gemelaridade, polidrâmnio, macrossomia


fetal, multiparidade, hemorragia pós-parto e parto cesárea em gestação prévia,
dequitação prolongada, parto assistido — fórcipe, vacuoextrator —, trabalho de parto
prolongado etc. As causas de hemorragia pós-parto tardia são: involução uterina
anormal, retenção de restos placentários, infecção intrauterina, lacerações de canal
de parto. A prevenção da hemorragia pós-parto é conduta ativa após dequitação
com uterotônicos.
Figura 6.28 - Esquema ilustrativo da aplicação técnica de B-Lynch

Fonte: O controle da hemorragia pós-parto com a técnica de sutura de B-Lynch – série de


casos, 2007.

Figura 6.29 - Vista anterior após sutura de B-Lynch


Fonte: O controle da hemorragia pós-parto com a técnica de sutura de B-Lynch – série de
casos, 2007.

Figura 6.30 - Vista posterior após sutura de B-Lynch


Fonte: O controle da hemorragia pós-parto com a técnica de sutura de B-Lynch – série de
casos, 2007.

Figura 6.31 - Sequência de procedimentos em caso de hemorragia pós-parto


Fonte: elaborado pelo autor.

6.11 PARTOGRAMA
O partograma é a representação gráfica do trabalho de parto, que torna possível
acompanhar a sua evolução, documentar, diagnosticar alterações e indicar a tomada
de condutas apropriadas para a correção dos desvios, evitando intervenções
desnecessárias (Obstetrícia, 2017). Uma revisão sistemática da Cochrane, ao
contrário do demonstrado em estudos observacionais previamente conduzidos pela
OMS (1996), não se encontrou diminuição das taxas de cesárea nem melhora de
resultados perinatais com o uso de partograma. Todavia, foi possível observar que,
em países de baixa renda, existe diminuição da taxa de cesárea com a aplicação do
instrumento. Dessa maneira, considerando a assistência ao parto no Brasil, país
ainda desfavorecido e com elevadíssima taxa de cesárea, o uso do partograma é
fundamental e recomendado pela OMS e pelo Ministério da Saúde. Além disso, o
registro gráfico garante a documentação necessária, demonstrando adequada
avaliação da vitalidade da mãe e do bebê em casos de desfecho desfavorável e/ou
litígio (Obstetrícia, 2017).

A curva de dilatação cervical ocorre de forma ascendente, de início com menor


velocidade a partir dos 4 cm de dilatação. A diferenciação na velocidade da
cervicodilatação caracteriza a fase latente — inicial — e a fase ativa — final. É na fase
ativa que devemos construir o partograma (Parto, aborto e puerpério: assistência
humanizada à mulher, 2001). Na fase latente do trabalho de parto, a conduta é
expectante, desde que a vitalidade fetal esteja preservada, e o ideal é que as
parturientes sejam acompanhadas de ambulatório quando não se tratar de gestação
de risco. Observa-se que, em muitas mulheres, a duração é superior a 20 horas e os
ocitócitos devem ser evitados, pelo risco de aumento na incidência de cesárea,
decorrente do colo uterino desfavorável. Sinais de alerta, como perda de líquido,
sangramento uterino, contrações eficientes a cada cinco minutos e diminuição dos
movimentos fetais, são orientações para que a parturiente retorne ao hospital no
momento adequado (Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher,
2001).

Utiliza-se de papel quadriculado, colocando na abscissa — eixo X — o tempo em


horas e, nas ordenadas — eixo Y —, em centímetros, a dilatação cervical à esquerda e
a descida da apresentação à direita. Para a descida da apresentação, considera-se o
plano 0 de De Lee — espinhas ciáticas no estreito médio da bacia —, acima deste
ponto estão os valores negativos e abaixo os positivos de De Lee.

As linhas de alerta e de ação foram criadas em um local e época em que muitos


partos eram realizados em casa. Com base nos conhecimentos originais da dilatação
cervical, construíram uma linha de alerta, que servia para identificar as pacientes
com parto de risco. Quando a dilatação cervical cruzava a linha de alerta, a paciente
deveria ser encaminhada ao hospital. Num intervalo de quatro horas, padronizaram a
linha de ação, paralela à de alerta, porque este era o tempo de transporte da
parturiente para centros médicos, onde se efetuavam partos operatórios (Parto,
aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001).
Atualmente, o registro gráfico do parto é realizado em ambiente hospitalar e,
portanto, não há a necessidade de intervenção quando a dilatação atinge ou cruza a
linha de alerta. O alerta implica, simplesmente, a necessidade de uma melhor
observação clínica (Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher,
2001).

Somente quando a curva da dilatação cervical atinge a linha de ação é que a


intervenção médica torna-se necessária, na tentativa de melhorar a evolução do
trabalho de parto e corrigir possíveis distocias que possam estar se iniciando. Isto
não significa necessariamente conduta cirúrgica (Parto, aborto e puerpério:
assistência humanizada à mulher, 2001).

Como preencher o partograma? A seguir, estão as recomendações do Ministério da


Saúde (2001):

• Inicia-se o registro gráfico quando a parturiente estiver na fase ativa do trabalho de


parto — duas a três contrações eficientes em dez minutos, dilatação cervical mínima
de 3 cm. Em caso de dúvida, aguardar uma hora e realizar novo toque: velocidade de
dilatação de 1 cm/h, verificada em dois toques sucessivos, confirma o diagnóstico de
fase ativa do trabalho de parto;

• Realizam-se toques vaginais subsequentes, geralmente a cada duas horas,


respeitando em cada anotação o tempo expresso no gráfico. Em cada toque, deve-se
avaliar a dilatação cervical, a altura da apresentação, a variedade de posição e as
condições da bolsa das águas e do líquido amniótico, quando a bolsa estiver rota. Por
convenção, registra-se a dilatação cervical com um triângulo e a apresentação e
respectiva variedade de posição são representadas por uma circunferência;

• O padrão das contrações uterinas e dos batimentos cardíacos fetais, a infusão de


líquidos e drogas e o uso de analgesia devem ser devidamente registrados;

• A dilatação cervical inicial é marcada no ponto correspondente do gráfico, traçando-


se na hora imediatamente seguinte a linha de alerta e em paralelo; quatro horas após,
assinala-se a linha de ação, desde que a parturiente esteja na fase ativa do trabalho
de parto.

Na evolução normal do trabalho de parto, a curva de dilatação cervical se processa à


esquerda da linha de ação. Quando essa curva ultrapassa a linha de ação, trata-se de
um parto disfuncional. A construção correta da linha de alerta e de ação é
fundamental para que se evitem erros na interpretação do parto (Parto, aborto e
puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001).
Figura 6.32 - Partograma

A identificação das distocias é feita pela observação das curvas de dilatação cervical
e de descida da apresentação expressas no partograma.

6.11.1 Fase ativa prolongada ou distocia funcional

Dilatação do colo uterino ocorre lentamente, numa velocidade menor que 1 cm/h. A
curva da dilatação ultrapassa a linha de alerta e, às vezes, a linha de ação. Essa
distocia geralmente decorre de contrações uterinas não eficientes — falta de motor.
A correção é feita inicialmente pelo emprego de técnicas humanizadas de estímulo
ao parto normal, por exemplo, estimulando-se a deambulação e, se necessário,
posteriormente pela administração de ocitocina ou rotura artificial da bolsa das
águas (Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001).
Figura 6.33 - Fase ativa prolongada
Fonte: Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001.

6.11.2 Parada secundária da dilatação

Caracterizada por dois toques sucessivos, com intervalo de duas horas ou mais, com
a mulher em trabalho de parto ativo. Nesse tipo de distocia, a dilatação cervical
permanece a mesma durante duas horas ou mais, ultrapassa a linha de alerta e, por
vezes, a linha de ação. Sua principal causa é a desproporção cefalopélvica. Se
absoluta, a indicação é de cesárea. Considera-se desproporção cefalopélvica relativa
quando existe defeito de posição da apresentação, como deflexão, transversas ou
posteriores e, nesses casos, a deambulação, a rotura artificial da bolsa das águas ou
a analgesia peridural podem favorecer a evolução normal do parto. Se essas medidas
não funcionarem, realizar cesárea (Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada
à mulher, 2001).
Figura 6.34 - Fase secundária da dilatação
Fonte: Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001.

6.11.3 Parto precipitado ou taquitócito

A dilatação cervical e a descida e expulsão do feto ocorrem num período de quatro


horas ou menos. O padrão da contratilidade uterina é de taquissistolia e hipersistolia.
Maior risco de sofrimento fetal agudo e lacerações de canal do parto. Pode ser
espontâneo em multíparas e menos frequentemente em nulíparas, mas pode ser
também iatrogênico pela administração excessiva de ocitocina, que, nesses casos,
deve ser interrompida. Cuidado com vitalidade fetal e revisão do canal do parto
(Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001).
Figura 6.35 - Parto precipitado
Fonte: Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001.

6.11.4 Período pélvico prolongado

Descida progressiva da apresentação, mas excessivamente lenta após a dilatação


total. Nota-se dilatação completa do colo uterino e demora na descida e expulsão do
feto. Sua causa é relacionada à contratilidade uterina deficiente e sua correção é
obtida pela administração de ocitocina, rotura artificial da bolsa das águas e, ainda,
pela utilização do fórcipe, desde que preenchidos os pré-requisitos para sua
aplicação — entre os pré-requisitos, feto pelo menos em +3 do plano de De Lee.
Também recomenda-se a posição verticalizada para favorecer a descida da
apresentação (Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001).
Figura 6.36 - Período pélvico prolongado
Fonte: Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001.

6.11.5 Parada secundária da descida

Diagnosticada por dois toques sucessivos, com intervalo de uma hora ou mais,
desde que a dilatação do colo uterino esteja completa. Considera-se que há parada
secundária da progressão da apresentação quando ocorre cessação da descida por
pelo menos uma hora após o seu início com dilatação total.

A causa mais comum é a desproporção cefalopélvica. Se absoluta, está indicada a


cesárea relativa – com polo cefálico profundamente insinuado e cervicodilatação
completa, é válida a tentativa de fórcipe de tração ou rotação, dependendo da
variedade de posição (Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher,
2001).
Figura 6.37 - Parada secundária da descida
Fonte: Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher, 2001.

6.12 RESUMO DE CONCEITOS


Quadro 6.2 - Resumo de conceitos

Parturiente de 38 semanas, diabética mal


controlada, teve desprendimento do polo
cefálico, porém sem desprendimento dos
ombros do feto. Qual o diagnóstico e qual a
conduta mais adequada? Essa mesma
paciente apresentou sangramento vaginal
aumentado no quarto período. Quais as
possíveis causas?
Estamos diante de uma distocia de ombros. Paciente apresentava fator
de risco: diabetes mal controlado. A primeira coisa é chamar ajuda e não
tracionar com força excessiva a cabeça e o pescoço fetal. Colocar as
nádegas da paciente na borda da mesa e iniciar as manobras a seguir:

• Manobras de primeira linha: a manobra de McRoberts e a pressão


suprapúbica. Se não resolver, iniciar manobras de segunda linha;
• Manobras de segunda linha: manobras internas de rotação — Rubin II,
Woods e Woods reverso —, extração do braço posterior e colocar a paciente
em posição de quatro apoios. Se não houver desprendimento dos ombros,
realizar as manobras de terceira linha;
• Manobras de terceira linha: manobras heroicas, de exceção, propostas na
última tentativa de evitar o óbito fetal. São: a clidotomia, a manobra de
Zavanelli e a sinfisiotomia.

Após o nascimento do concepto e já no quarto período, essa paciente


apresentou sangramento vaginal aumentado. Lembrando que a
paciente teve fator de risco para hemorragia pós-parto: possível feto
macrossômico e polidrâmnio pelo diabetes e um parto complicado
devido à distocia de ombros. Na hemorragia do quarto período,
devemos avaliar os sinais vitais e iniciar medidas de ressuscitação, se
necessário. Lembrar dos 4 “Ts”: tônus, trajeto, tecido e trombina. Na
maioria das vezes, a causa é atonia uterina.

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