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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CEDERJ – Licenciatura em História


DISCIPLINA: História do Brasil I – 2020.1

Nome: Leonardo Dangelo


Matrícula: 16216090149
Polo: Duque de Caxias

Avaliação à Distância 1 – AD1

Atividade: Resenha crítica do texto ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios no
tempo da corte: reflexões sobre política indigenista e cultura política indígena no Rio de
Janeiro oitocentista. Revista USP, São Paulo, n.79, p. 94-105, setembro/novembro 2008.

A política indigenista no Rio de Janeiro oitocentista

O presente texto foco desta atividade trata-se de uma obra que discute a situação da política
indigenista no Rio de Janeiro durante os oitocentos. A autora estruturou sua obra fazendo uma
introdução com um trecho da Carta Régia de 1º de abril de 1809 (REFERÊNCIA) já para
trazer uma ideia de qual era o discurso oficial, na palavras do príncipe regente, D. João VI.
Esta estratégia proporcionou uma discussão já a partir de uma fonte oficial do período em
questão. O objetivo de tal obra é de refletir sobre estas políticas, procurando perceber
possíveis influências da presença da corte sobe elas, segundo a própria autora.

Pensar, hoje, que o tratamento oferecido aos indígenas em um território tão vasto como este
fosse homogêneo, seria ingenuidade. Ele diferia conforme as diferenças regionais de cada
ajuntamento dos indígenas. Como pode-se notar pelo trecho da referida Carta Régia, a política
indigenista da Coroa portuguesa era ambivalente, ou seja, havia duas formas, gerais de
tratamento. Apesar de alguns disfrutarem de certos benefícios, outros eram mortos em
guerras, principalmente em torno de suas terras.

Outro ponto importante a se pensar nesta questão é a forma como os indígenas produziam
seus acordos com o “outro”, sendo ele um nativo destas terras ou um europeu. Segundo
Almeida, nos oitocentos, os indígenas já tinham ampliado sua cultura de acordos para com as
autoridades e, até mesmo, o rei, que não se furtava do contato, como poderia se esperar, em
um primeiro momento. Este ponto é bem abordado no texto, onde a autora discorre acerca das
estratégias diferenciadas, dando exemplo de resoluções dadas pelo rei ao ser interpelado por
indígena provindo de uma aldeia no Piauí.

Mesmo com leis, o que a Coroa aspirava era assimilar os índios ao Império português
(Diretório dos Índios – 1757), o que vai além da assimilação religiosa, já constante desde a
carta de Pero Vaz de Caminha em 1500 (CORTESÃO, 1994) e passa, também pela
mestiçagem com casamentos mistos entre índios e portugueses, conforme concorda Moreira
(2015).

Apesar de findo o Diretório dos Índios, a política não se alterou substancialmente, com os
índios procurando proteção no governo. De maneira a buscar sua sobrevivência e a não
extinção, os índios se amparavam em alianças fiéis que garantiam terras, tratamento brando,
outros auxílios e proteção em geral. A contrapartida esperada pelos portugueses foi
exatamente assegurar suas fronteiras e obter mão de obra, sendo zelosos no serviço ao
monarca português. O texto dá alguns exemplos sobre esta relação, mas não indica quais
“tribos” eram as chamadas de índios bravos. Almeida afirma que esta relação não assim tão
amistosa na diversidade de territórios e na linha do tempo, com muitas reivindicações pelas
terras dadas aos índios em algumas localidades.

A estes problemas, os índios respondiam de maneiras variadas, como “colaborações, fugas,


reivindicações, ameaças e ataques” (pág.98) já desde meados dos setecentos, quando a
questão pela ocupação da terra se acentuou. O que podemos perceber no texto de referência é
que a questão indígena passou a ser uma questão de terras e isto se agravou com a chegada da
Corte em 1808. Observou-se um aumento populacional vertiginoso e sua, consequente,
demanda por terras e gêneros alimentícios. Logo, o desenvolvimento das capitanias exigia
duas ações: a ocupação de terras, extinguindo aldeias seculares e, a segunda, a ocupação
destas terras, ocasionando conflitos e ainda acordos com os índios.

Os aldeamentos empreendidos podem ser entendidos, pelas palavras de Almeida como um


processo que passou por mudança de legislação (fim do Diretório) com os jesuítas expulsos e
aparecimento de intermediários. Como bem aponta o texto, apesar da mudança, a nova
legislação procurava acentuar a interação entre os índios e os não índios, antes proibida
formalmente. Aqui a autora observa diferentes formas de aldeamentos como a presença de
capuchinhos italianos, no norte fluminense, e um abastado fazendeiro ao sul fluminense,
demonstrando que não houve um procedimento homogêneo de aldeamento e uma derivada
administração deste território. Já em relação aos índios aldeados, possuíam garantias e
liberdades que os não aldeados desfrutavam, como “direito de ir e vir nas aldeias, sertões e
fazendas” (pág. 100).

Almeida utiliza uma fonte (MALHEIROS, 2007) como estratégia para ilustrar os conflitos
existentes entre os índios que se sentiam injustiçados e o governo. Neste ponto, sua fonte cita
passagem que mostra esta relação, com os índios indignados com a invasão de suas terras e
ameaçando trocar de soberano, caso o governo não os acuda, estratégia elaborada pelos padres
em diversas localidades do Brasil.

A aldeia de Valença é introduzida como exemplo de aldeia em sua dinâmica de conflitos e


negociações, onde a autora traça suas singularidades a partir do fazendeiro José Rodrigues da
Cruz. Mais uma vez, Almeida invoca um especialista na questão para melhor embasar seus
argumentos, mas que já tinha sido pontuado anteriormente (LEMOS, 2004).

O fazendeiro citado agia como um intermediário para garantir a administração da ampliação


de aldeia, proposta pelo ministro de Negócios Ultramarinos. Cruz sabia exatamente que as
despesas com os índios eram bem empregadas, visto não só as provas de docilidade e gratidão
deles, mas também a mão de obra dos nativos. Lemos salienta que os índios trocavam
diversos produtos, mas “estimavam especialmente as ferramentas que lhes serviam para caça
e coleta, tais como machado, foices, enxadas e facas” (pág. 101). Este exemplo serviu para
dar a dimensão de penetrabilidade destas relações.

A extinção da aldeia de Valença acelerou em fins da década de 1810, com conflitos


envolvendo índios, sesmeiros e autoridades civis e eclesiásticas, já anos após a morte de José
Rodrigues da Cruz. Dentre os conflitos, o texto traz exemplos de problemas com sesmeiros e
índios, em que estes últimos solicitavam a devolução das terras e, chegavam até a argumentar
que elas serias para a fundação de uma igreja matriz. Já ao fim da aldeia de Valença, o perfil
da região foi se alterando por conta das grandes fazendas de café que lá se instalavam.

As sesmarias se configuraram como um transtorno para os índios. Os chamados sesmeiros


não propiciavam confiança aos moradores, não só índios, que tinham receio de serem
expulsos dali, o que ocasionou alguns conflitos. Pautado em relatos do viajante Saint Hilaire,
sobre encontros que teve com os índios, a autora expõe as angústias destes. As reclamações de
maus tratos e invasão de suas terras davam a tônica dos discursos que mostravam até
disposição na reivindicação de seus direitos perante o rei. Tal comportamento evidenciava a
assimilação da cultura política do Antigo Regime, onde o poder era centralizado nas mãos do
rei e seus súditos se dirigiam a ele para solicitar direitos.

Como bem interpreta Almeida, não é possível entender os índios como ignorantes e inocentes,
pois, apesar dos pesares, eles também agiam com interesses próprios. A rede de sociabilidade
criada por eles era extensa, como bem aponta o texto, indo de batismo e permanências nas
fazendas a caciques com padrinhos proprietários de terras e escravos. A autora ainda utiliza
Lemos para salientar a complexidade da questão e os ambíguos e contraditórios interesses dos
diferentes atores envolvidos.

Por fim, apesar da Provisão Régia de D. João VI, dando ganho de causa aos índios, sua
situação não foi muito melhor, e podemos concluir, conforme a autora e corroborado por
Sposito (2009), que eles foram os grandes perdedores deste processo. As aldeias foram sendo
extintas, principalmente após a chegada da família real.

Como considerações finais, Almeida aponta que, apesar da chegada da corte ter
proporcionado um contato com os índios, em que eles puderam reivindicar diretamente seus
direitos ao rei, não houve uma melhora em suas vidas. A extinção de suas terras coletivas e
aldeias foi um fenômeno que perpassou o que se entendeu como “guerra justa”, decretada
pelo próprio príncipe regente com fins à política assimilacionista. A citação feita à Carta
Régia, no início do trabalho, já dava indícios deste tipo de tratamento na política indigenista
adotada no Rio de Janeiro nos oitocentos.

REFERÊNCIAS:

CORTESÃO, Jaime. A Carta de Pero Vaz de Caminha. 3 ed., Lisboa: Imprensa


Nacional/Casa da Moeda, 1994.
LEMOS, Marcelo. O Índio Virou Pó de Café? – A Resistência dos Índios Coroados de
Valença Frente à Expansão Cafeeira no Vale do Paraíba (1788-1836), Dissertação (Mestrado
em História), Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 2004.

MALHEIROS, Marcia. Homens de Fronteiras: Índios e Capuchinhos na Ocupação dos


Sertões do Leste do Paraíba ou Goytacazes Séculos XVIII e XIX, 2007. 401f., Tese
(Doutorado em História) – Universidade Federal Fluminense, 2007.

MOREIRA, Vânia Maria Losada. Territorialidade, casamentos mistos e política entre índios e
portugueses. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 35, n. 70, p. 17-39, 2015.

SPOSITO, Fernanda. As guerras justas na crise do antigo regime português análise da política
indigenista de D. João VI. Revista de História, n. 161, p. 85-112, 2009.

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