Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Relatório 5
2015
O Diretório era o documento oficial das políticas indigenistas e suas leis visavam
transformar os aldeamentos jesuíticos em vilas portuguesas, onde os índios teriam direitos
assegurados, dentre os quais os assegurados pela Lei da Liberdade (1755), que proibia a
escravização de indígenas, e a Lei de casamentos (1755), como incentivo à mestiçagem,
garantindo benefícios àqueles que se casassem com índios. Tal incentivo tinha como objetivo
extinguir a cultura indígena paulatinamente. Além disso, era determinado o fim das
discriminações legais contra os índios e havia o incentivo de que estes ocupassem cargos
oficiais nas vilas. Entretanto, controversamente, eram considerados ainda incapazes de
governarem a si mesmos, necessitando, assim, ser administrador por um diretor. Essas
políticas não extinguiram, de fato, as distinções, ao contrário, as reforçaram ainda mais. A
autora achou cabível também salientar que o Diretório seguia as mesmas diretrizes do
Regimento das Missões Estado do Maranhão e Grão-Pará (1686), principalmente no que diz
respeito à divisão categórica dos índios entre mansos e selvagens, à obrigação do trabalho
compulsório, à garantia de terras aos índios nas aldeias e, também, à condição de tutelados
imposta a eles. Mantinha também os privilégios dos principais, lideranças indígenas,
Como expoente do poder imperial, iam contra todos os setores que se opunham a ele.
Quanto a isso, Almeida faz breve consideração à transformação da reputação dos inacianos
(de bons representantes e servidores da Coroa a potenciais “inimigos” de seus objetivos.).
Nesse sentido, ela explica como a expulsão dos inacianos também pode ser compreendida
como um dos recursos necessários a Pombal, para que se estabelecessem suas novas leis, uma
vez que retiraria os índios da tutela dos padres, abriria caminho para que os limites de
separação territorial fossem dissipados e assim por diante. O local onde se iniciou o processo
de transformação das aldeias indígenas em vilas portugueses foi, em 1756, a aldeia de Trocano,
na Amazônia, que passou a se chamar Vila de Borba. A autora esclarece que, segundo a
historiadora Fátima Martins Lopes, o modelo instituído na primeira vila, foi seguido nas vilas
posteriores, aprovado pelo rei como um regulamento prático de civilização. As vilas eram
locais que, segundo o Diretório, seriam governados pelos juízes ordinários, vereadores ou
outros oficiais de justiça; ou até mesmo pelos principais, sob a direção dos diretores. O
estabelecimento de novas vilas após a criação de Borba não se deu sem muitos percalços: é
citado o exemplo da rebelião indígena em Dari, que se estendeu por toda a região e tronou-se
um empecilho para que o governador da capitania do Rio Negro, Joaquim de Mello e póvoas,
cumprisse os deveres do Diretório. Além disso, grande parte da população indígena não estava
disposta a colaborar e se submeter à política portuguesa. Muitos fugiam, dificultando os
descimentos, expedições que tinham como objetivo deslocar os índios de suas aldeias de
origem para o povoamento mais próximo aos portugueses. Entretanto, conforme salientado
pela autora ao longo do capítulo, tais atitudes não foram regra geral no contexto das reformas
pombalinas na colônia. Para a aplicação das leis, era necessária certa adaptação a depender da
região e organização da sociedade indígena ali presente. Em alguns lugares, por exemplo,
realizava-se procedimento de descimentos; em outros casos, eclodiam guerras e estabeleciam
acordos com lideranças indígenas; e, em áreas colonizadas mais antigas, pretendia-se extinguir
as aldeias a fim de promover uma situação de horizontalidade entre os índios e outros vassalos.
Algumas lideranças entravam em acordo com a Coroa a fim de garantir seus direitos e obter
certos privilégios. A autora destaca casos em que eles se envolviam nas atividades econômicas
da colônia. Destaca, também, o desejo de muitos em obter títulos e cargos de prestígio
garantidos pela lei pombalina, principalmente acesso a cargos militares. Embora já existissem
políticas que conferiam prestígio aos principais desde o século XVI, a autora explica de que
forma a política pombalina aumentou significativamente sua importância. Novas regalias lhes
foram asseguradas, uma em especial é especificada no texto: podiam, por meio do 50 do
Diretório, mandar índios aos sertões para trabalharem para si. Contudo, as motivações não
devem ser reduzidas a apenas isso. É possível perceber, também, um sentido mais amplo,
segundo o que a autora mostra ao longo do texto: essas atitudes muitas vezes simbolizavam
resistências num contexto de adaptação e uso de leis a seu favor, o que, ainda assim, não
deixavam de favorecer a política pombalina. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que garantia
direitos de modo a beneficiar os indígenas, tal política fazia com que a expansão portuguesa
fosse possível, por meio da assimilação e, também, da sobreposição forçada à base de
violência.
Os direitos ao plantio e sustento assegurados pelo Diretório aos índios aldeados, não
representa menos que mais uma controvérsia na jurisdição pombalina. Almeida conta que os
índios não tinham liberdade para executar suas atividades, por serem considerados ignorantes
e rústicos, portanto eram representados em tudo pelos diretores, que faziam a venda do
excedente produzido, a compra de seus produtos para subsistência e até mesmo o
recebimento de seus salários. O cultivo era fiscalizado pelos diretores e a divisão de trabalho
era feita pelos principais. Impunha-se o ofício aos indígenas de 13 a 60 anos, porém, na
prática, menores e idosos também trabalhavam. As plantações de índios aldeados ficavam
localizadas em sítios distantes dos povoados e a forma de cultivo era a coivara, tipo de
agricultura tradicional itinerante definida por poucos anos de cultivo e seguida por muitos
anos de repouso. Os índios não tinham tempo suficiente para o cultivo de seus próprios
alimentos, pois passavam grande parte do tempo fora dos aldeamentos em função dos
serviços que deviam prestar obrigatoriamente. A capitania do Rio Negro, de modo geral,
carecia de produtos que suprissem suas necessidades alimentícias. Nesse sentido, a produção
era majoritariamente voltada para a subsistência. O extrativismo era o fator principal que
garantia algum rendimento com ajuda de recursos externos. Assim, a autora chega á
conclusão de que fatores demográficos, culturas e, principalmente sócio-econômicos
contribuíram para as dificuldades apresentadas à substituição das aldeias jesuíticas por vilas
lusitanas. O que assegurava, em certa medida, o rendimento econômico das expedições aos
sertões, e o que, em contrapartida, também promovia certo desfalque nas vilas povoadas,
obstruindo de certo modo, o desenvolvimento agrícola, assim como a eficácia da política de
povoamento. Além disso, a resistência das populações indígenas é muitas vezes mencionada
como determinante para o déficit das vilas.
No tocante ás fugas na capitania do Pará, há a ressalva destacada por Almeida que
examina a natureza de algumas. Em primeiro lugar, as fugas não tinham um sentido
generalizado de rejeição à nova ordem lusitana, muitas vezes eram apenas fugas temporárias.
A autora observa, à luz das investigações de Sommer, que o contingente de fugas nos novos
povoamentos era bem maior do que em aldeamentos mais antigos. Uma das possíveis
explicações é que dentro desse novo cenário de criação de uma nova sociedade e articulações
políticas de miscigenação, uma nova cultura emergia no interior da Amazônia. Outro fator
atribuído ao menor índice de fugas em aldeamentos antigos, além da estabilidade assegurada,
é a diminuição dos sertões, proveniente do avanço dos novos povoamentos, ocasionando a
redução das possibilidades de sobrevivência nesse primeiro. Em última instância, Almeida
também atribui relevância às relações estabelecidas por meio de acordos que alguns indígenas
optavam por realizar, a fim de garantir condições favoráveis para permanecer nas vilas.
Alguns optavam por ficar nas aldeias a fim de assumir certos papéis de destaque conferidos
pela nova lei.
Em linhas gerais, o que pretendeu analisar no texto foi a complexidade das relações
entre índios não aldeados, índios aldeados e não índios, configurada por diversos fatores como
conflitos de lideranças e territoriais, questões comerciais, étnicas, entre outros. É, portanto, de
difícil definição, como esclarece a autora, a fluidez com a qual se davam as interações entre
essas populações, que se movimentavam e estabeleciam diversas relações de acordo com sua
necessidade. Essa complexidade torna ainda mais difícil uma definição fixa que dê conta de
separar precisamente os grupos indígenas entre aldeados e não aldeados, dada à inconstância
dessas posições em determinados contextos em função de influências mútuas. Em suma, a
autora esclareceu como as aplicações da política indigenista de meados do século XVIII
foram feitas de maneira articulada às políticas indígenas locais, as influências que sofreram,
ao tempo que influenciava simultaneamente, e como essas relações determinaram as
configurações da sociedade colonial a partir de então.