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Artigos científicos
30 artigos científicos sobre o ensino das lutas na Educação Física
Escolar

1 O conteúdo das lutas nas séries iniciais do ensino fundamental: possibilidades


para a prática pedagógica da educação física escolar

2 O ensino da luta na educação básica nas aulas de educação física: uma


experiência do programa institucional de bolsistas de iniciação à docência

3
O ensino das lutas na educação física escolar - a produção científica (2006-2016) das
revistas RBCE, movimento e pensar a prática

4 O ensino das lutas na educação física escolar: uma breve reflexão

5 O ensino das lutas na educação física escolar: uma experiência no ensino


fundamental

6
O ensino das lutas nas aulas de educação física: análise da prática pedagógica à
luz de especialistas

7
O ensino de lutas corporais indígenas na Educação Física Escolar: um relato de
experiência

8
O ensino de lutas na educação física escolar: uma revisão sistemática da
literatura

9 O ensino de lutas nas aulas de Educação Física Escolar

10
O ensino de lutas/artes marciais em configuração remota: notas de uma
trajetóriadidático-metodológica na formação docente em Educação Física

11 As lutas na educação física escolar: um ensaio sobre os desafios para sua


inserção

12 A configuração do conteúdo Lutas na Educação Física escolar: análise dos


contextos espanhol e brasileiro

13
A Educação Física nos Anos Finais do Ensino Fundamental: Desafios,
experiências e possibilidades para o ensino das lutas na escola

14
A presença/ausência do conteúdo lutas na educação física escolar:
identificando desafios e propondo sugestões

15
A separação dos conteúdos das “lutas” dos “esportes” na educação física
escolar: necessidade ou tradição?
Artigos científicos
30 artigos científicos sobre o ensino das lutas na Educação Física
Escolar

16 A tematização das lutas na Educação Física Escolar: restrições e possibilidades

17 As lutas na Educação Física Escolar

18 Aspectos pedagógicos do ensino das lutas na Educação Física Escolar

19
Desafios para o ensino das lutas na escola: um panorama a partir da base de
dados do portal de periódicos da capes

20 Educação Física escolar e o ensino das lutas: o que é necessário acontecer?

21 Elas podem se machucar: As Lutas no combate ao preconceito de gênero na


Educação Física Escolar

22 Inserção das lutas na educação física escolar da cidade de Muriaé-Mg

23
Lutas na educação física escolar: metodologia através dos parâmetros
curriculares nacionais - PCNs

24 Lutas na educação física escolar: uma experiência no ensino médio

25
Organização e Trato Pedagógico do Conteúdo de Lutas na Educação Física
Escolar

26
Possibilidades do ensino das lutas na escola: uma pesquisa-ação com
professores de educação física

27 Possíveis diálogos entre a Educação Física Escolar e o conteúdo das lutas na


perspectiva da cultura corporal

28
Produção científica nacional sobre o ensino de lutas no ambiente escolar:
estado da arte

29 Reflexões acerca do ensino de lutas na Educação Física

30
Tematizando as lutas na educação física escolar: relato de uma prática
pedagógica no contexto do PIBID
Motrivivência Ano XXV, Nº 41, P. 305-320 Dez./2013

http://dx.doi.org/10.5007/2175-8042.2013v25n41p305

O CONTEÚDO DAS LUTAS NAS SÉRIES INICIAIS


DO ENSINO FUNDAMENTAL: possibilidades para a
prática pedagógica da Educação Física escolar

Nathalia Chaves Gomes1


André Minuzzo de Barros 2
Fernando Paulo Rosa de Freitas3
Suraya Cristina Darido4
 Luiz Gustavo Bonatto Rufino5

RESUMO

As lutas são conteúdos da Educação Física que devem estar presentes na prática
pedagógica. Contudo, há ainda lacunas e incompreensões em seu desenvolvimento
pedagógico. Assim, por meio de uma revisão de literatura, este estudo objetivou analisar
as lutas compreendendo sua importância, bem como apresentando uma forma de
classificação. Em um segundo momento, apresentou-se uma proposta de organização
curricular das lutas nas séries iniciais do ensino fundamental. Conclui-se ser importante
compreender as lutas enquanto conteúdos das aulas de Educação Física propondo
uma organização dos conteúdos que pode contribuir com a apropriação crítica dessa
manifestação da cultura corporal de movimento.

Palavras-chave: Lutas; Prática pedagógica; Organização dos conteúdos.

1 Especialista em Educação Física/UNICAMP. Professora da UNESP. Rio Claro/São Paulo, Brasil.


E-mail: nathichaves@hotmail.com
2 Doutorando em Desenvolvimento Humano e Tecnologias - UNESP. Rio Claro/São Paulo, Brasil.
E-mail: andreminuzzo@terra.com.br
3 Mestre em Ciências da Motricidade Humana – UNESP. Rio Claro/São Paulo, Brasil.
E-mail: fer_edfis@hotmail.com
4 Doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano – USP. UNESP/Rio Claro, Brasil.
E-mail: surayacd@rc.unesp.br
5 Mestre pelo Programa Interdisciplinar de Desenvolvimento Humano e Tecnologias. UNESP/ Rio Claro, Brasil.
E-mail: gustavo_rufino_6@hotmail.com
306

INTRODUÇÃO transformadas e usufruídas pelos alunos ao


longo das aulas de Educação Física. Dessa
De acordo com os Parâmetros Curri- forma, representam um importante conteú-
culares Nacionais (PCN/BRASIL, 1998) nas do que deve fazer parte dos processos de
práticas corporais, o movimento humano é ensino e aprendizagem ao longo dos ciclos
sistematizado, ressignificado e transmitido de escolarização (SOARES et al., 1992).
de geração a geração, resultando em um Contudo, Rufino e Darido (2013)
patrimônio histórico-cultural de práticas ou apontam que o conteúdo das lutas ainda
manifestações corporais que são denomina- é pouco explorado por grande parte dos
das de cultura corporal de movimento. Para professores de Educação Física escolar.
esse documento à Educação Física na escola Tal fato decorre por diversos fatores como
deve ser incumbida da possibilidade de preconceito com relação a esses conteúdos,
introduzir e integrar os alunos na esfera da falta de materiais e vestimentas adequadas,
cultura corporal de movimento, de modo a incitação sobre questões relacionadas à
contribuir com a formação do cidadão, que violência, entre outros (CARREIRO, 2005;
vai tanto produzi-la quanto reproduzi-la, BRARROS e GABRIEL, 2011).
bem como transformá-la. Os autores acreditam, por outro
Diversas são as manifestações lado, que a maior dificuldade está na in-
corporais que fazem parte desse amplo segurança em relação ao tratamento desse
patrimônio, como os esportes, as danças, tema pelo fato dos professores considerarem
as ginásticas, os jogos, as atividades físicas erroneamente que é necessário ser ou ter
de aventura, as práticas circenses, as lutas, sido um praticante de alguma modalidade
entre outras. É preciso permitir ao aluno o para desenvolvê-lo na escola.
contato e vivências significativas com esses Outra questão que merece destaque
conteúdos, possibilitando-os articular refle- e que dificulta o ensino das lutas na escola
xões críticas sobre estas práticas e sobre o em diversos contextos refere-se à defasagem
mundo em que vivem. na formação profissional. Tal fato levou Del
No entanto, devido à amplitude Vecchio e Franchini (2006) a alertarem para
de possibilidades apresentadas pelas prá- diversas lacunas no que corresponde ao
ticas corporais, há ainda dificuldades no não ensino das lutas no Ensino Superior ou
desenvolvimento pedagógico de algumas então a restrição desse ensino, decorrido
delas, de modo que a prática pedagógica do tratamento de somente uma ou outra
da Educação Física escolar, muitas vezes, modalidade (como judô e capoeira, por
fique ainda restrita ao ensino de algumas exemplo) nos currículos dos cursos de
modalidades esportivas coletivas (BETTI; formação profissional em Educação Física.
ZULIANI, 2002; BRACHT et al., 2002; Contribuindo ainda mais com a
BRASIL, 1998; DARIDO et al., 1999; lacuna na compreensão das lutas nas aulas
RANGEL-BETTI, 1999). de Educação Física está a pouca produ-
No caso das lutas, entende-se que ção acadêmica a esse respeito. Correia e
elas são uma das manifestações da cultura Franchini (2010) afirmam haver carência
corporal de movimento, de modo que tam- de publicações sobre lutas, artes marciais
bém podem ser produzidas, reproduzidas, e modalidades esportivas de combate no
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Brasil, principalmente os estudos de caráter como apresentando uma forma de classifica-


aplicado. Os conhecimentos sistematizados ção. Além disso, em um segundo momento,
sobre as múltiplas dimensões dessas práticas procurou-se apresentar uma proposta de
corporais são fundamentais para subsidiar organização curricular das lutas nas séries
os professores em suas práticas, tanto na iniciais do ensino fundamental.
formação inicial como na continuada,
evidenciando a importância de ampliar a
produção a esse respeito. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Esses dados vão de encontro com
o que Drigo (2007) salienta ao constatar a Para o presente estudo realizou-se
pouca produção acadêmica sobre as lutas uma revisão de literatura acerca das temá-
e artes marciais. O autor enfatiza ainda a ticas referentes à inserção do conteúdo das
escassez de produções em uma perspectiva lutas na Educação Física escolar. A revi-
pedagógica e sócio-cultural, uma vez que são de literatura compreende uma busca
a grande maioria dos estudos que existem sistemática pelo que já foi produzido – e
abordam as áreas da fisiologia e treinamento publicado – em alguma(s) determinada(s)
de atletas (subárea da biodinâmica). área(s) de investigação, conforme sugerem
Tal fato é corroborado por Nasci- Thomas, Nelson e Silverman (2007).
mento (2008, p. 2) quando o autor indica Essa técnica é importante por nos
que a temática das lutas “necessita de permitir uma imersão no estado da arte de
estudos e sistematizações que subsidiem uma determinada área. Sendo assim, procu-
o seu trato pedagógico efetivo na escola”. rou-se averiguar as compreensões das lutas
Ainda para o autor, a questão da sistemati- no âmbito da Educação Física. Para isso, par-
zação do conteúdo das lutas na Educação timos das considerações apresentadas por
Física escolar é ainda uma grande carência Correia e Franchini (2010), os quais ao anali-
desta área. Ou seja, a despeito das poucas sarem 11 periódicos nacionais entre os anos
publicações a respeito das lutas enquanto de 1998 até 2008 encontraram que apenas
conteúdos da Educação Física escolar, é 2,93% dos trabalhos abordavam as lutas.
necessário ainda compreender formas de Destes, somente 10,7% relacionavam-se
organizar sistematicamente a abordagem com o âmbito pedagógico.
pedagógica desse conteúdo ao longo dos Buscamos ampliar a busca acerca da
processos de ensino e aprendizagem. produção científica sobre as lutas trazendo
Sendo assim, buscando avançar uma análise qualitativa sobre os artigos
nas lacunas ainda existentes e corroborar produzidos no que corresponde à temática
a necessidade de desenvolvimento de pedagógica. Para isso, compreendemos
propostas de organização curricular para o o período entre os anos de 2008 e 2012,
trato pedagógico das lutas durante as aulas buscando atualizar os dados de Correia e
de Educação Física, este trabalho objetivou, Franchini (2010) nos mesmos periódicos
por meio de uma revisão de literatura, em apresentados pelos autores, a saber: Co-
um primeiro momento, analisar as lutas nexões, Corpoconsciência, Movimento,
como conteúdos da Educação Física esco- Motriz, Revista Brasileira de Ciências do
lar, compreendendo sua importância, bem Esporte, Revista Brasileira de Ciência e
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Movimento, Revista Brasileira de Cineantro- Para Rufino (2012a, p. 17): “a palavra ‘lutar’
pometria e Desempenho Humano, Revista pode conter em si uma série de significados
da Educação Física, Revista de Educação que variam de acordo com o contexto. Luta-
Física, Revista Mineira de Educação Física -se pela vida, por objetivos pessoais, pela
e Revista Brasileira de Educação Física e terra, com um oponente em alguma prática
Esporte. Acrescida desses periódicos inse- esportiva, e assim por diante”. Ao abordar
rimos na análise as revistas Motrivivência e especificamente as lutas enquanto práticas
Pensar a Prática, que também apresentam corporais, esse mesmo autor destaca que:
produções relacionadas às lutas, totalizando
13 revistas científicas analisadas. Em termos de esportivização, as lutas
compreendem uma série de práticas,
Para as análises, foram abordados os
com diferenças e similaridades entre si,
seguintes tópicos de discussão: Lutas: algu- na qual possuem objetivos distintos. Há
mas definições; As lutas na escola: motivos, lutas em que não se pode tocar no outro,
importância e significados; O conteúdo das em que só valem golpes com os braços
(punhos), lutas de agarramento, lutas
lutas na escola: possível classificação; As
que se utilizam de técnicas à distância,
lutas nas séries iniciais do ensino funda- lutas com artefatos, numa infinidade de
mental: proposta de organização curricular. práticas (RUFINO, 2012a, p. 17).
Cada tópico será discutido a seguir.
Sendo assim, embora difícil de pre-
cisar uma vez que a histórica não decorre
Lutas: algumas definições por processos lineares, as lutas como as
conhecemos, representam uma forma que
As definições sobre lutas podem
as sociedades encontraram para superar as
contribuir com maiores compreensões
adversidades de seu meio físico. Com o
acerca dessas práticas corporais. Contudo,
passar do tempo, foi sistematizada e com
não há consensos na literatura uma vez
aplicações práticas nas guerras, em eventos
que transitam na área diversas acepções
distintas, algumas limitando a compreensão diversos, nos esportes, entre outros.
apenas ao que corresponde ao combate e à Os PCN (BRASIL, 1998) trazem uma
oposição entre duas pessoas, outras trazen- definição de lutas partindo das ações pro-
do sentidos mais filosóficos e holísticos ao cedimentais originárias dessas práticas, mas
entendimento dessas práticas. Em muitos também compreendendo valores e atitudes
contextos o verbo “lutar” apresenta diversos circunscritos. Para esse documento oficial
significados. as lutas são definidas como sendo disputas
Segundo Mazzei (2006) a palavra em que os oponentes devem ser subjugados
luta vem do latim: lucta. Ela pode ser de- com técnicas e estratégias de desequilíbrio,
finida como combate entre duas ou mais imobilização ou exclusão de um determina-
pessoas, com ou sem armas, mas também do espaço na combinação de ações de ata-
pode ter um sentido mais abrangente e estar que e defesa. Os parâmetros destacam ainda
ligado ao esforço de um ser em alcançar que as lutas podem ser caracterizadas por
um objetivo, conflito entre doutrinas ou uma regulamentação específica que busca
oposição entre forças materiais ou morais. punir atitudes de violência e deslealdade.
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Bechara (2004, p. 73), por sua vez, adaptando tais pressupostos para as lutas.
aponta que as lutas “são manifestações cul- Para isso, estas práticas corporais são carac-
turais da Cultura Corporal que reproduzem terizadas pelos seguintes aspectos: contato
as formas históricas de enfrentamento (...) e proposital; fusão ataque/defesa; imprevisi-
de preparação para o combate, totalmente bilidade; oponente/alvo e regras (GOMES,
ineficientes no mundo atual comandado 2008; GOMES et al., 2010).
pela tecnologia, porém cheias de tradições Independente da modalidade ou es-
e formas simbólicas de combate”. O autor pecificidade da luta proposta, tais princípios
não apresenta explicações, no entanto, so- salientados anteriormente são condições
bre os motivos de considerar as ações das indispensáveis para que possamos classi-
lutas ineficientes no mundo atual. ficar uma prática como sendo relacionada
Para a Proposta Curricular do Estado às lutas. Ou seja, tais princípios revestem as
de São Paulo (SÃO PAULO, 2008) as lutas práticas das lutas de características próprias,
apresentam em suas origens, características permitindo-nos diferenciá-las das demais
práticas corporais. Por isso, a compreensão
atribuídas à sobrevivência, ao exercício
de tais características é fundamental para
físico, ao treinamento militar, à defesa e ao
que haja subsídios que possam permitir aos
ataque pessoal, além das implicações das
professores ensinar tais manifestações da
tradições culturais, religiosas e filosóficas.
cultura corporal de movimento na escola,
Com o surgimento de outras necessidades
durante as aulas de Educação Física.
e o desenvolvimento de novas técnicas, o
Rufino e Darido (2011) trazem para
ser humano atribuiu outros significados às a pauta a busca pela compreensão se as
lutas. Atualmente há um amplo processo lutas são ou não são esportes. Os autores
de esportivização de muitas modalidades concluem que algumas práticas associadas
bem como de espetacularização, haja vista às lutas passaram por um processo de
a projeção atual dos eventos de Mistura de esportivização, enquanto que outras não.
Artes Marciais (ou Artes Marciais Mistas), da Além disso, os autores ressaltam que ora
sigla em inglês MMA (PAIVA, 2009). estas práticas podem ser consideradas como
Em Gomes (2008) e Gomes et at. esportivas, caso se incluam nas definições
(2010) encontramos uma definição a qual da sociologia do esporte, ora podem ser
compreende as lutas enquanto práticas compreendidas como jogos e brincadeiras,
corporais imprevisíveis que são caracteri- por exemplo, quando vinculadas às aulas de
zadas por apresentar determinado nível de Educação Física na escola.
contato entre os participantes, bem como A partir de tais apontamentos acre-
possibilitar a execução de ações ofensivas ditamos que é possível convergir propostas
e defensivas realizadas simultaneamente. de compreensão das lutas nos contextos es-
Estes autores salientam ainda que o objetivo colarizados, buscando romper paradigmas
das lutas é mútuo, sobre um alvo móvel, que outrora relacionaram tais práticas com
personificado no oponente. aspectos vinculados à violência ou falta de
Para tais definições Gomes (2008) e respeito entre os participantes. Portanto, é
Gomes et al. (2010) buscam contemplar os preciso ter clareza do universo plural e mul-
princípios condicionais do modelo proposto tifacetado relacionado às lutas (CORREIA;
por Bayer (1994) para os esportes coletivos, FRANCHINI, 2010).
310

Corroboramos com Rufino (2012a, cimento socialmente produzido e acumula-


p. 17) quando o autor arremata: “dessa do historicamente, independentemente da
forma, antes de pretender encontrar um con- condição social do aluno, devendo ir além
ceito ‘rígido e fechado’ ao termo das ‘lutas’, da mera transmissão, cópia ou reprodução
é evidente que, por tudo isso, o ser humano do conhecimento. O autor ainda aponta
luta há muito tempo, desde as épocas mais que a Educação escolar não é condição
remotas de sua existência”. suficiente, mas é condição necessária para
Ou seja, mais do que buscar por de- desabrochar a cidadania, com vistas à for-
finições a priori acerca da pluralidade de sig- mação do sujeito, num contexto de direitos
nificados adjacentes às lutas, é fundamental e deveres.
compreender seu processo de construção Diante disso e considerando que a
histórica, fato que se torna preponderante Educação Física está inserida num contex-
quando relacionamos tais práticas como to maior, que é a Educação escolar, fica
pertencentes à cultura corporal de movi- evidente a sua participação na formação
mento. A partir de tais relações, podemos da cidadania e a necessidade que isso seja
construir um panorama que contribua com considerado na elaboração e concretização
a prática pedagógica na Educação Física da prática pedagógica.
escolar, dando subsídios para o desenvol- Neste contexto, as lutas representam
vimento de propostas de implementação uma das práticas integrantes da cultura
das lutas na escola. No próximo tópico, corporal de movimento, cujo tratamento pe-
buscaremos enfocar a importância das lutas dagógico deverá ampliar os conhecimentos
na escola e como elas podem se inserir ao relacionados a conceitos, procedimentos e
longo dos processos de ensino e aprendiza- atitudes dos alunos, para que possam fazer
gem na Educação Física escolar. opções mais conscientes e autônomas
(BRASIL, 1998).
Ao conhecer as lutas em diversos
As lutas na escola: motivos, importância aspectos (políticos, econômicos, sociais,
e significados históricos, estéticos, fisiológicos etc.), os
alunos poderão se apropriar de elementos
Entendemos que, a escola, desde que contribuirão com a construção crítica
seu primeiro nível de ensino, deve ter de conhecimentos, valores, atitudes, fatos
como objetivo que os alunos se apropriem e procedimentos que auxiliarão na amplia-
de saberes que irão contribuir para a sua ção de suas visões de mundo. No caso das
formação enquanto indivíduos que venham lutas, é possível além de vivenciar diversas
a exercer a cidadania com valores demo- práticas corporais, compreender o enfoque
cráticos, de forma crítica e autônoma, em apontado pelas mídias, diferenciando-as dos
busca da construção de uma sociedade mais contextos violentos, possibilitando a tomada
justa e igualitária. de decisões sobre opções mais conscientes
Palma Filho (1998) afirma que a es- para sua vida cotidiana, entendendo estas
cola torna possível a existência do cidadão, práticas corporais como possibilidades de
na medida em que cumpre a sua função de lazer, saúde, rendimento, comunicação,
viabilizar o acesso da população ao conhe- expressão corporal, entre outras.
Ano XXV, n° 41, dezembro/2013 311

No entanto, é ainda corriqueiro o têm grande responsabilidade pela associa-


estabelecimento de associações errôneas ção com contextos de violência. Desde
das lutas com questões relacionadas à in- as séries iniciais do ensino fundamental é
citação à violência, às brigas, entre outras preciso contextualizar pedagogicamente
questões (BARROS; GABRIEL, 2011; CAR- os desenhos animados, brinquedos, jogos
REIRO, 2005; RUFINO; DARIDO, 2013). de cartas e tabuleiros, mangás, histórias em
Tais relações estão revestidas não apenas de quadrinhos, elementos que fazem parte do
preconceitos, mas de concepções limitadas universo infantil.
e pautadas em distorções sobre o que de Por essas e outras razões as lutas
fato as lutas podem significar para a prática devem estar relacionadas às aulas de Edu-
pedagógica a partir de sua vinculação como cação Física, desde os mais tenros anos de
uma das manifestações da cultura corporal escolarização. Dessa forma, é possível res-
de movimento. significar visões ainda dicotomizadas e per-
No caso especificamente das crian- meadas pela ótica do preconceito para com
ças, Olivier (2000) aponta que desde cedo estas práticas. Ademais, a diversificação de
podemos constatar nas escolas jovens dis- conteúdos propicia uma ampliação da apro-
putando objetos ou territórios, e que isso faz priação da cultura corporal de movimento,
parte de seu processo de desenvolvimento de modo que tal processo deve ocorrer já
para aprender a regular conflitos. Para esse nas séries iniciais do ensino fundamental.
autor, tais processos são formas de comu- Para que as lutas possam efetivamente fazer
nicação e expressão pela qual a criança parte da prática pedagógica, apresentare-
possa reagir a um estresse, a uma frustração, mos, na sequência, algumas possibilidades
provocação, entre outros. de classificação.
Jogos e brincadeiras envolvendo
elementos das lutas podem contribuir para
O conteúdo das lutas na escola: possível
que a criança aprenda a gerir e a controlar classificação
a complexidade das relações violentas no
interior do grupo social, tal como apontam As práticas corporais, em sua ampla
Rufino e Darido (2011). Portanto, as lutas magnitude de formas, sentidos e manifesta-
apresentam notável presença no universo ções, para serem ensinadas na escola devem
infantil e podem ser tratadas desde as séries ser adaptadas aos objetivos e possibilidades
iniciais do ensino fundamental, permitindo da instituição escolar. De acordo com
que a criança diferencie lutas e brigas. Para González e Fensterseifer (2010) a Educação
isso é fundamental que elas compreendam Física tradicionalmente pouco tem sido
os sentidos e significados de tais práticas e pensada dentro de uma perspectiva educa-
como elas se distinguem das brigas e outras cional pautada na compreensão de leitura
atitudes pautadas pela ótica da violência. de mundo, o que passa, impreterivelmente,
Outro fator fundamental no qual as pela necessidade de entendimento do que
lutas estão presentes, sobretudo na infância, significa ser um componente curricular
refere-se às relações que estas práticas es- obrigatório no sentido de matéria escolar.
tabelecem com as mídias, que, por vezes, Nesse sentido, os autores salientam:
312

Nessa linha, a EF escolar, na condição • Compreensão por parte do educan-


de disciplina, tem como finalidade for- do do ato de lutar (por que lutar,
mar indivíduos dotados de capacidade
crítica em condições de agir autonoma- com quem lutar, contra quem ou
mente na esfera da cultura corporal de contra o que lutar);
movimento e auxiliar na formação de • Compreensão e vivência de lutas
sujeitos políticos, munindo-os de ferra- no contexto escolar (lutas versus
mentas que auxiliem no exercício da ci-
dadania (GONZÁLEZ; FENSTERSEIFER, violência; vivência de momentos
2010, p. 12). para a apreciação e reflexão sobre
as lutas e a mídia);
Ainda para esses autores, é ne- • Análise dos dados da realidade po-
cessário que cada componente curricular sitiva das relações positivas e nega-
se constitua enquanto um elemento que tivas com relação a prática das lutas
contribua com a ampliação das visões de e a violência na adolescência (luta
mundo das pessoas. A Educação Física como defesa pessoal e não para
escolar deve, por conseguinte, corroborar “arrumar briga”).
com tal intencionalidade de modo que as Ainda para esse documento de
diversas manifestações da cultura corporal caráter oficial o processo de ensino e
de movimento possibilitam. aprendizagem das lutas requer, entre outros
aspectos, a vivência de situações que envol-
No caso das lutas, a literatura tem
vam perceber, relacionar e desenvolver as
apontado algumas formas de abordagem
capacidades físicas e habilidades motoras
teórico-metodológica buscando outras ma-
presentes nas lutas praticadas na atualidade;
neiras de compreensão que não se limitem,
vivência de situações em que seja necessá-
ou ao menos não redundem, no ensino de
rio compreender e utilizar as técnicas para
apenas algumas vivências de uma ou pou-
a resolução de problemas em situações
cas modalidades em específico (RUFINO,
específicas – tais como as técnicas e táticas
2012b; GOMES et al., 2010; GOMES, 2008;
de ataque e defesa – e também vivências de
BREDA et al., 2010).
atividades que envolvam as lutas, dentro do
Para se pensar em formas de ensino
contexto escolar (BRASIL, 1998).
das lutas que vão além da dependência de Tais proposições apresentam a con-
apenas uma ou outra modalidade é preciso juntura de ilustrar algumas possibilidades
que se compreendam as unidades didáticas de intervenção pedagógica, entretanto,
enquanto processos de vivência, reflexão, não aprofundam em termos de quais co-
ação e interpretação sobre essas práticas. nhecimentos devem ser ensinados, bem
Nesse contexto é necessário compreender como não demonstram uma organização
elementos que possam ser concebidos curricular para o ensino das lutas ao longo
como conhecimentos que farão parte do dos diversos ciclos de escolarização.
conteúdo das lutas na escola. A busca por uma forma de clas-
De acordo com os PCN (BRASIL, sificação introduz a perspectiva de am-
1998), há alguns objetivos da prática das pliação das compreensões acerca dessas
lutas na escola, os quais podem ser siste- manifestações corporais. Nesse contexto,
matizados da seguinte maneira: podemos encontrar alguns critérios para a
Ano XXV, n° 41, dezembro/2013 313

seleção/classificação das lutas na escola, levando em consideração, em primeiro


tais como: compreensões dos objetivos de lugar, os aspectos de organização da
identificação e da categorização dos
um enfrentamento, qual o tipo de contato movimentos de combate corpo-a-corpo.
entre oponentes, quais as ações motoras Depois, abordando a iniciação da siste-
desenvolvidas, a distância entre os opo- matização desses movimentos, a partir
nentes, o tipo de meta no enfrentamento, da compreensão do sentido/significado
de cada uma de suas formas. Por fim,
entre outras. Porém esses agrupamentos ao chegando até a ampliação dessa sistema-
mesmo tempo em que unem as lutas pelo tização, de maneira que sejam compre-
que possui em comum, também as separam endidas as técnicas mais aprimoradas e
por suas diferenças (GOMES, 2008). sejam criadas outras formas de combate
(PERNAMBUCO, 2008, p. 26).
Para Espartero (1999) a classifica-
ção das lutas, denominado pelo autor de
Gomes (2008) considerando as
esportes de luta, promove uma organiza-
ideias de Bayer (1994) à luz das classifica-
ção de elementos ou categorias de acordo
ções pesquisadas, apresenta a classificação
com um determinado critério, que permite
organizada a partir das distâncias existentes
estabelecer uma diferenciação entre eles,
entre os oponentes, bem como às ações
o que facilitaria o ensino e a escolha do
empregadas em cada uma dessas distân-
mais adequado a ser ensinado. As orienta-
cias, perspectiva corroborada por outros
ções teórico-metodológicas do Estado de
autores, tais como Breda et al. (2010) e
Pernambuco (2008) contribuem com essa
Rufino (2012b). O quadro a seguir ilustra
perspectiva ao assinalar:
tal proposição.
A luta, assim como os outros temas da
cultura corporal, precisa ser abordada

Quadro 1: Os grupos de aproximação das Lutas – Adaptado de Gomes (2008)

Curta Distância Média Distância Longa Distância


Desequilibrar
Tocar
Rolar Tocar (intermediado por
Golpear (Mãos, braços,
Projetar implementos)
cotovelos, pernas, joelhos,
Cair Manipular (implemento)
pés, etc.)
Controlar

Com relação às ações de curta dis- desequilibrar, que demonstram a necessi-


tância destaca-se que elas possuem pouco dade do contato direto entre os oponentes
espaço entre os oponentes e para a reali- e alunos na prática dessas modalidades.
zação das técnicas e alcance dos objetivos As ações de média distância em-
da luta é necessário que os praticantes se preendem um espaço médio, ou modera-
coloquem em contato direto (contato como do entre os envolvidos no qual permite a
um meio para o fim). Como habilidades aproximação em situações de ataque entre
específicas da curta distância estão ações os oponentes, pois a intenção e o propósito
como segurar, pegar, projetar, rolar, cair, ofensivo vão determinar a distância entre os
314

lutadores. Os golpes caracterizam o contato para reter, imobilizar e livrar-se; jogos para
e não dependem dele para acontecer como combater (OLIVIER, 2000). Esses jogos
na curta distância (o contato é um fim e abrangem ações motoras fundamentais
não o meio). Na média distância estão que as crianças são capazes de realizar nas
presentes os chutes, socos e as sequências atividades de oposição. É possível ainda que
combinadas. os professores incluam outros elementos nas
Finalmente, as ações de longa dis- unidades didáticas relacionadas às lutas nas
tância são definidas pela presença de um séries iniciais, desde que haja clareza dos
implemento e, por isso, deve haver uma objetivos pretendidos, bem como do nível
distância maior entre os oponentes para que desenvolvimento dos alunos.
os mesmos possam manipular de forma ade- Reconhecemos que as classificações
quada esse implemento, fazendo com que apresentadas não contemplam a diversida-
o contato entre eles seja por meio de uma de de lutas existentes e que tão adoção,
espada, por exemplo. Na longa distância há como toda tomada de decisão, implica em
ações como as empunhaduras, habilidades uma seleção de procedimentos e conheci-
manipulativas e posturas. mentos (FORQUIN, 1993). Contudo, tal
perspectiva permite ilustrar possibilidades
Para se desenvolver tais perspectivas
concretas de contextualização didática das
na escola, ao longo das aulas de Educação
lutas na escola haja vista, dentro de outras
Física, os professores podem lançar mão
questões, a grande amplitude de práticas
de uma série de estratégias teórico-meto-
existentes relacionadas às lutas (CORREIA;
dológicas. Nessa visão, os jogos podem
FRANCHINI, 2010), bem como às perspecti-
ser compreendidos enquanto elementos
vas de formação profissional atualmente em
que proporcionam potenciais de ensino.
voga (DEL VECCHIO; FRANCHINI, 2006).
Para Olivier (2000) os jogos podem ser
Acreditamos ainda que nos anos
compreendidos enquanto uma simplifi-
iniciais do ensino fundamental é possível
cação na abordagem de lutar, no qual os aprender as lutas por meio de jogos que
alunos devem desempenhar papéis que enfatizem os elementos das lutas. Sendo
serão previamente definidos pelo professor assim, modificamos e adaptamos a classifi-
(o jogador ataca ou defende, imobiliza ou cação de jogos de Olivier (2000), tratando
livra-se, desequilibra ou tenta manter o dos elementos de lutas que prevalecem nos
equilíbrio), ao invés de desempenhá-los jogos de combate, resultando na seguinte
simultaneamente. Tais perspectivas, ao classificação:
menos ao longo das séries iniciais do ensi- • Jogos de esquivar: consiste em jo-
no fundamental facilita a aprendizagem e gos de ações de desvio dos ataques
conscientização quanto os elementos das desferidos, sendo que é preciso al-
lutas (RUFINO; DARIDO, 2011). ternar os papéis de quem ataca e de
O autor ainda classifica as lutas den- quem defende, evitando o contato
tro de seis categorias, as quais podem estar com o adversário;
permeadas pela classificação das distâncias: • Jogos de imobilizar: são jogos em
jogos de rapidez e de atenção; jogos de que há a necessidade de contato
conquista de objetos; jogos de conquista para se chegar a ações de imo-
de territórios; jogos de desequilibrar; jogos bilização e de saídas ou fugas de
Ano XXV, n° 41, dezembro/2013 315

imobilização. Os papéis podem fundamental por meio de outras estratégias


ser combinados, ou seja, tanto se didático-metodológicas que possibilitem
pode imobilizar quanto escapar, apropriações críticas de mais essa manifes-
ou separados, quando apenas um tação da cultura corporal de movimento aos
trabalha imobilizando enquanto o alunos. Contudo, as propostas preconizadas
outro somente tenta escapar; no presente texto podem contribuir com a
• Jogos de conquistar território: são fundamentação teórica, bem como com
jogos que consistem em conquis- subsídios práticas que contribuam efetiva-
tar, defender ou excluir o adver- mente com o ensino das lutas na escola.
sário de um determinado espaço.
Implicam aproveitamento e diver-
sificação das ações desequilibra- As lutas nas séries iniciais do ensino funda-
doras para chegar a seus fins. È mental: proposta de organização curricular
preciso também puxar, carregar,
empurrar, fazer virar, esquiva-se, Além da proposta de classificação
desviar, resistir. O contato é quase das lutas que corrobore com a prática pe-
sempre inevitável; dagógica de professores de Educação Física
• Jogos de desequilibrar: consiste nas séries iniciais do ensino fundamental, o
em jogos que tem o objetivo de presente trabalho objetivou também ilustrar
desfazer os apoios do adversário uma proposta de organização curricular
no solo, podendo ser finalizado para esse conteúdo. Em princípio, reco-
com o toque de determinada parte nhecemos que essa é uma possibilidade
do corpo no solo ou exclusão de entre outras que podem ser elaboradas, fato
determinado espaço ou marca. Os que deve fazer parte das ações curriculares
papéis de ataque e defesa também de seleção e organização dos conteúdos
podem ser, ora alternativos, ora si- (FORQUIN, 1993), ao longo dos processos
multâneos. de ensino e aprendizagem das aulas de
Consideramos que é possível abor- Educação Física. Nossa proposta pode ser
dar as lutas nas séries iniciais do ensino visualizada a seguir.
316

Quadro 2: Organização curricular sobre o conteúdo das lutas ao longo das séries iniciais
do ensino fundamental

1º ANO 2º ANO 3º ANO 4º ANO 5º ANO

Revisão
O que são Revisão Revisão Revisão
conteúdos
lutas? conteúdos já conteúdos já conteúdos já
TEMA 1 já estudados
estudados nos estudados nos estudados nos
nos anos
2 aulas anos anteriores anos anteriores anos anteriores
anteriores

Diferenciação
Elementos das Elementos das Origem e Conhecendo
de lutas e
lutas: jogos de lutas: criação e Possibilidades as Lutas
briga
lutas de transformação de Lutas
TEMA 2 desequilibrar e
conquistar
território
4 aulas 6 aulas 3 aulas 4 aulas
3 aulas

Elementos Lutas X desenho Lutas e Mídia Classificação Técnicas e


das lutas: animado (Mídia) (filmes e jogos das lutas estratégias de
TEMA 3 jogos de lutas virtuais) ações de
de esquivar e ataque e defesa
imobilizar 4 aulas
2 aulas 5 aulas
3 aulas 4 aulas

Total de
8 aulas 8 aulas 8 aulas 8 aulas 8 aulas
aulas

Partimos do ponto de partida apre- Podemos sistematizar a proposta de


sentado por Nascimento e Almeida (2007) abordagem da manifestação corporal das
que salientam que a inserção das lutas na lutas de Nascimento e Almeida (2007) a
escola está atrelada à concepção de Educa- partir das dimensões dos conteúdos: dimen-
ção Física vinculada à perspectiva da cultura são conceitual, dimensão procedimental e
corporal de movimento, ou seja, enquanto dimensão atitudinal. Em cada uma dessas
elementos da cultura, estas manifestações dimensões há proposições distintas que se
corporais devem fazer parte do processo relacionam buscando propiciar possibilida-
educativo, não sendo necessário ao pro- des de ensino e aprendizagem na escola.
fessor ser especialista em lutas, embora ele Na dimensão conceitual é necessá-
deva compreender alguns dos condicio- rio que os alunos apropriem-se dos elemen-
nantes e características dessas práticas para tos que constituem as lutas, como histórico,
melhor ensiná-las. rituais, crenças e principais regras. Tais fatos
Ano XXV, n° 41, dezembro/2013 317

podem ser realizados por meio de trabalhos como um todo.


de pesquisa, permitindo aos alunos aprofun- A partir das considerações propostas
darem seus conhecimentos sobre as lutas, no presente estudo, apontamos a impor-
tendo em vista que, muitas vezes, as com- tância de se compreender de modo mais
preensões sobre lutas advindas do senso apropriado o processo de organização cur-
comum são superficiais e carregam grande ricular do conteúdo das lutas ao longo das
“dose” de preconceito, atribuindo-lhes aulas de Educação Física. Nesse contexto,
o imaginário de práticas violentas. apresentamos uma proposta de organização
Já na dimensão procedimental, a baseadas em 8 aulas por ano, bem como de
ênfase recai sobre os jogos de lutas, como temáticas para serem ensinadas ao longo
já foi ilustrado anteriormente. Dos jogos das séries iniciais do ensino fundamental,
de lutas que podem ser realizados em baseadas nas dimensões dos conteúdos:
aula, destacam-se o cabo de guerra, briga conceitual, procedimental e atitudinal.
de galo, exclusão de espaço com ombro, Essa é uma possibilidade dentre
mãos, conquista da quadra do oponente e outras que podem ser realizadas. Considera-
conquista de objetos com oposição. Devem -se, no entanto, fundamental que haja uma
ser incorporados também nos jogos de lutas organização sequencial dos conteúdos
a criação de regras e novos jogos propostos a serem ensinados ao longo das diversas
pelos alunos, no qual eles estabelecem o séries escolares de modo que a Educação
nome da luta, o modo de jogar/objetivo, as Física possa ser reconhecida, de fato, com a
regras, proibições e estratégias. importância de um componente curricular
Finalmente, na dimensão atitudinal obrigatório, indo além da perspectiva do
deve ser desenvolvido nos jogos criados/ “exercitar-se para”, criticada por González
adaptados pelos alunos a intenção de pre- e Fensterseifer (2010).
venir atitudes de deslealdade por meio das
proibições contidas em seus jogos, para
demonstrar o respeito, à ética, ao esporte e CONSIDERAÇÕES FINAIS
inibição da violência.
Além disso, é preciso que os alu- As lutas, enquanto manifestações
nos adotem critérios para saber analisar, da cultura corporal de movimento, são um
avaliar e criticar situações de exclusão nas conteúdo relevante que deve ser desenvol-
aulas de Educação Física, contribuindo, vido nas aulas de Educação Física do ensino
desta forma, para a construção do respeito fundamental, desde seus anos iniciais. Por
às diversidades e individualidades dos isso, devem ser produzidas, transformadas,
sujeitos que fazem parte de cada contexto. usufruídas e ressignificadas de acordo com
Nessa perspectiva, Olivier (2000) considera as diferentes intencionalidades do processo
que as lutas são um conteúdo rico para se educativo.
desenvolver atividades que busquem a di- Por questões didáticas, defendemos
minuição da indisciplina na escola, embora a necessidade de uma organização para o
reconheçamos que a dimensão axiológica ensino dos diversos conteúdos escolares.
de valores e atitudes devem permear todas Diante do propósito deste estudo e da carên-
as disciplinas, bem como a cultura escolar cia de publicações neste sentido na área da
318

Educação Física sobre lutas, apresentamos BECHARA, E. C. Educação Física escolar:


uma possibilidade de tratamento de temas proposta para formação de líderes
e subtemas a serem abordados em cada comunitários para alunos de 2ª e
um dos anos das séries iniciais do ensino 3ª séries do Ensino Médio. 2004.
fundamental, que são adequados às diver- 137f. Tese (Doutorado em Educação
sas características dos alunos, favorecendo Física) – Faculdade de Educação Física,
assim a apropriação de tais conhecimentos, Universidade Estadual de Campinas,
bem como o alcance dos objetivos de uma Campinas, 2004.
educação preocupada com a formação para BETTI, M.; ZULIANI, L. R. Educação Física
a cidadania. escolar: uma proposta de diretrizes
Enquanto proposta de organização pedagógicas. Revista Mackenzie de
curricular, buscamos apresentar possibilida- Educação Física e Esporte, São Paulo,
des para a prática pedagógica das lutas nas v.1, n.1, p. 73- 81, 2002.
séries iniciais do ensino fundamental. Para BRACHT, V.; PIRES, R.; GARCIA, S. P.;
isso, nos valemos da necessidade de com- SOFISTE, A. F. S. A prática pedagógica
preender as funções sociais da Educação em Educação Física: a mudança a partir
Física à luz de uma prática permeada por da pesquisa-ação. Revista Brasileira de
intencionalidades educativas claramente Ciências do Esporte, Campinas, v. 23,
definidas, buscando valorizá-la enquanto n. 2, p. 9-29, jan. 2002.
componente curricular de importância BRASIL. Secretaria de Educação
fundamental ao processo educativo. Fundamental. Parâmetros Curriculares
Nesse ensejo as lutas, bem como Nacionais. Educação Física, 3.e 4.
as propostas de organização pedagógica ciclos.Brasília: Mec, 1998.
desse conteúdo e dos processos de ensino BREDA, M.; GALATTI, L.; SCAGLIA, A.
e aprendizagem relacionados são mais um J.; PAES, R. R. Pedagogia do esporte
elemento que compõe a complexidade de aplicada às lutas. São Paulo: Phorte, 2010.
relações desenvolvidas. Dessa forma, tais CARREIRO, E. Lutas. In: DARIDO, S.C.;
ações devem ser valorizadas em prol de RANGEL,I.C. Educação Física na escola:
uma prática pedagógica crítica, reflexiva e implicações para a prática pedagógica.
que ofereça subsídios para a busca pela au- Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
tonomia e ampliação das visões de mundo 2005, p.244-261.
dos educandos. CORREIA, W. R.; FRANCHINI, E. Produção
acadêmica em lutas, artes marciais e
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São Paulo: Phorte, 2011. DEL VECCHIO, F. B.; FRANCHINI, E.
BAYER, C. O ensino dos desportos Lutas, artes marciais e esportes de
coletivos. Lisboa: Dinalivro, 1994. combate: possibilidades, experiências
Ano XXV, n° 41, dezembro/2013 319

e abordagens no currículo da Educação Judô do Estado do Rio de Janeiro. 2006.


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MAZZEI, L. Cultura e Modelo Biociências. Universidade Estadual
Organizacionais da Federação de Paulista, Rio Claro, 2012b.
320

RUFINO, L. G. B.; DARIDO, S. C. A SÃO PAULO (Estado) Secretaria de


separação dos conteúdos das “lutas” dos Educação do Estado de São Paulo.
“esportes” na Educação Física escolar: Proposta Curricular de Educação
necessidade ou tradição? Pensar a Física. São Paulo: SEE, 2008.
Prática, Goiânia, v. 14, n. 3, p. 1­17, SOARES, C. L.; TAFFAREL, C. N. Z.;
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física. Porto Alegre: Artmed, 2007.

FIGHTS CONTENT IN ELEMENTARY SCHOOL’S EARLY GRADES: pedagogical practice


possibilities in School Physical Education

ABSTRACT
Fights are Physical Education contents that should be present in pedagogical practice.
However, there are still gaps and misunderstandings in their educational development.
Thus, through a literature review, this study aimed to analyze fights as contents of School
Physical Education, comprehending its importance as well as presenting a classification
form. In a second moment, we presented a curricular organization proposal of fights in
elementary school’s early grades. We concluded that is important to understand fights
as School Physical Education contents. In this way, the content organization suggested
can contribute to the critical appropriation of this movement body culture manifestation.

Keywords: Fights; Pedagogical Practice; Content’s organization.

Recebido em: agosto/2013


Aprovado em: novembro/2013
O ENSINO DA LUTA NA EDUCAÇÃO BÁSICA NAS
AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA: UMA EXPERIÊNCIA
DO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSISTAS DE
INICIAÇÃO À DOCÊNCIA1

Adriana F. Gehres2
Rita C. B. F. Rodrigues3
Caio N. O. Silva4
Pablo P. H. Guimarães5
Rebecca R. Oliveira6
Tiago E. Nascimento7

RESUMO
O estudo objetivou sistematizar uma proposta de ensino da Luta para uma escola federal de
educação básica no âmbito do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID-
Capes) da Escola Superior de Educação Física da Universidade de Pernambuco (ESEF-UPE). Para
tanto, utilizou-se da pesquisa-ação. A proposta de ensino da Luta foi apresentada ao Serviço de
Orientação e Experimentação Pedagógica (SOEP) da referida escola, o qual a aprovou para as aulas
de educação física da escola.
PALAVRAS-CHAVE: Luta; Programa de ensino; Educação física escolar.

1 INTRODUÇÃO

O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID-Capes) tem


como objetivo o aperfeiçoamento e a valorização dos professores seja na formação
inicial ou na atuação profissional, proporcionando um encontro entre a educação
básica e o ensino superior, entre o formando e o profissional em atuação, através
de intervenções nas escolas, com o corpo docente, discente e com a comunidade
escolar.
No contexto da Educação Física, a Universidade de Pernambuco (UPE) se
estabelece como lócus formador, atuando junto ao PIBID nos cursos de Licenciatura.
Os bolsistas do PIBID da Educação Física da Escola Superior de Educação Física
1 O presente trabalho contou com apoio financeiro da CAPES
2 Universidade de Pernambuco, agehres@yahoo.com
3 Universidade Federal de Pernambuco, ritclaudia@yahoo.com.br
4 Universidade de Pernambuco, cnoscnos@gmail.com
5 Universidade de Pernambuco, pablo.patrick13@gmail.com
6 Universidade de Pernambuco, becca.edfisica@hotmail.com
7 Universidade de Pernambuco, tiagoemanuel7@gmail.com

RESUMO EXPANDIDO | GTT 05 - ESCOLA


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ISSN 2175-5930
1302
(ESEF/UPE) atuam numa escola pública federal do Recife que abrange o ensino
fundamental/anos finais e o ensino médio. A escola em questão, através dos seus
documentos balizadores, o Projeto Político Pedagógico (PPP) e o Programa de
Ensino por disciplinas, definem aspectos estruturais, político-pedagógicos e de
conteúdo da escola, destacando-se, nesta investigação, o Programa de Ensino da
disciplina Educação Física.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais PCN´s, Brasil (1997), a Educação
Física se insere como componente curricular na escola, evidenciando-se a inovação
desta abordagem na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) (1996),
diante da anterior, na qual a Educação Física caracterizava-se como atividade:

A Educação Física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente


curricular da Educação Básica, ajustando-se as faixas etárias e às condições da
população escolar, sendo facultativa nos cursos noturnos (BRASIL, 1996, p.10)

As intervenções do PIBID na referida escola demonstraram, inicialmente,


através da inquirição dos alunos, que havia uma lacuna no ensino da Luta. A partir
da observação das aulas de uma turma do 9º ano, identificou-se que os estudantes
apresentavam ausência no trato do conhecimento Luta. Quando questionados se
a Luta havia sido tematizada em anos anteriores, um dos estudantes afirmou que
haviam tido uma aula de capoeira no 6º ano com a professora substituta.
Em momento posterior, foi realizado um levantamento com outras turmas (do 6º
ano do ensino fundamental ao 1º ano do ensino médio) acerca do seu conhecimento
sobre Luta e se haviam tido contato dentro e fora da escola. Em paralelo, foi analisado
o Programa de Ensino de Educação Física (1999) da escola e constatou-se que o
conteúdo Luta era descrito, para o 2º e 3º ciclos de aprendizagem como: “origem e
evolução das lutas nacionais e estrangeiras, técnicas e regras. Barreto et al. (1999, P.
9-11) e inexistindo para o 4° ciclo.
A partir destas constatações, os bolsistas com a supervisora do PIBID (docente
da escola) colocaram-se uma possível questão de pesquisa: como desenvolver um
programa de ensino para o conteúdo Luta nessa escola federal de referência.

A LUTA

Historicamente a Luta teve grande importância para a humanidade pois através


dela o homem pôde encontrar meios para sobreviver em ambientes inóspitos;
defendeu-se e protegeu sua vida, território e bens através das guerras; pleiteou
melhores condições de trabalho e direitos iguais; além, da manutenção de hábitos
e tradições perante um processo de “aglutinação de culturas” onde duas culturas
misturavam-se e prevalecia aquela mais forte, enquanto a mais fraca era reduzida
até desaparecer parcial ou totalmente. (ARCHANJO, 2005)
O ato de Lutar é definido por   Luft (2000, p.431) como: “combater, pelejar,
brigar, disputar, competir, trabalhar arduamente, esforçar-se, empenhar-se” e o
substantivo luta é definido como ação de lutar, qualquer combate corpo a corpo,
guerra, peleja, antagonismo, esforço, empenho.
Como arte marcial, de acordo com Silva e Nascimento (2014), a Luta se
caracteriza como um conjunto de técnicas corporais com finalidade de utilização

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1303
específica em situações de ataque e defesa, na preparação para a guerra, podendo
também possuir aspectos filosóficos e religiosos.
A luta como modalidade esportiva, segundo Rufino e Darido (2011), caracteriza-
se com uma forma “esportivizada” que pode incidir sobre os diversos tipos de lutas
corporais, possuindo características comuns às demais modalidades esportivas,
como “ regras, normas e critérios. ”
Correia e Franchini (2010) evidenciaram que a Luta como fenômeno sociocultural,
estabelece-se em diferentes contextos, como os já citados, artes marciais e esportes,
mas também como defesa pessoal e com sentido estético, entre outros. Entretanto,
no que se refere ao trato do conhecimento Luta em aulas de Educação Física, os
autores constataram a carência de estudos científicos.

2 METODOLOGIA

Atentando para os objetivos do PIBID - conhecer para intervir – se fez a opção


pela metodologia da pesquisa-ação educacional. De acordo com Tripp (2003), a
pesquisa-ação é uma variação da investigação-ação (intervenção sobre a própria
prática com vistas à melhoria da mesma), na qual a intervenção e a avaliação da
mesma excedem os limites do cotidiano e dos pequenos problemas para vir a
sistematizar conhecimento sobre a prática. O estudo revestiu-se de forte caráter
exploratório, dada a necessidade de aprofundar o conhecimento acerca da realidade
estudada com vistas a uma intervenção sustentada e adequada.
A pesquisa-ação desenvolve-se em ciclos constantes de planejar, agir, descrever
e avaliar. Esta pesquisa foi realizada em quatro ciclos: identificação do problema
(diagnóstico), realização de uma intervenção (plano de ação); descrição e análise
dos resultados (avaliação da ação); estabelecimento de um novo problema (novo
ciclo de pesquisa-ação).

IDENTIFICAÇÃO DO PROBLEMA

Através de observações, diários de campo, análise de documentos e


intervenções (regências de aulas, foi possível identificar um problema com o trato
do conhecimento Luta: ausência do conteúdo nas aulas da escola; e, reduzida
referência no Programa de Ensino da disciplina de Educação Física desta escola.
Para qualificar a identificação do problema, foi aplicado um questionário
em todas as turmas do 6º ano do ensino fundamental ao 1º ano do ensino médio,
totalizando 243 estudantes, que permitisse esclarecer a situação do conteúdo Luta
na referida escola.
O questionário apresentou perguntas abertas e fechadas sobre a prática da
mesma dentro e fora da escola e sobre as definições de luta, as quais foram respondidas
pelos estudantes individualmente durante o período de aulas, no ano de 2015.
Dos 243 estudantes entrevistados, 141 informaram ter vivenciado a Luta. Destes,
66,8% responderam que haviam vivenciado a Luta na escola e 33,2% informaram que
a vivência foi fora do ambiente escolar. Vale salientar que desde 2014, os bolsistas
do PIBID já vinham realizando intervenções na escola no âmbito do ensino da Luta,
apesar da reduzida referência ao ensino da Luta no Programa de Ensino da escola.
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1304
As respostas às perguntas abertas foram avaliadas a partir da análise de conteúdo
temática, de acordo com categorias a priori (descritivas) e a posteriori (analíticas). As
categorias descritivas da Luta definidas foram: fenômeno sociocultural, modalidades
esportivas e artes marciais. Dos 243 alunos entrevistados, 134 responderam que
Luta é modalidade esportiva, 28 que Luta é Arte Marcial, 81 trouxeram respostas
que não apontavam para as categorias descritivas. Assim foram identificadas as
seguintes categorias analíticas: defesa pessoal e atividade física; e apenas 4 alunos
expressaram a definição de Luta como fenômeno sociocultural.
Ainda no que se refere aos resultados dos questionários, a maioria dos
estudantes informaram ter tido contato com a Luta, através da televisão, ou seja, como
consumidores. Notou-se que, muitos alunos consomem conteúdos relacionados à
Luta, mas não a vivenciaram na escola ou fora dela. E a maioria não a compreendem
como fenômeno sociocultural, associando-a predominantemente às modalidades
esportivas.
Diante do exposto, foi elaborada a sistematização de uma proposta para o
ensino da Luta para o Programa de Ensino da Educação Física na escola federal de
educação básica.

3 PLANO DE AÇÃO

A proposta de alteração do Programa de Ensino de educação física da escola


federal foi o plano de ação dentro do ciclo de pesquisa-ação e tomou os PCPEs como
referência. Partindo dos resultados analisados, juntamente com os professores da
disciplina de Educação Física da referida escola, foi elaborada uma proposta para
o trato com o conhecimento Luta na componente curricular da Educação Física,
durante o ano de 2015.
Partindo de uma compreensão mais ampla da Luta como fenômeno
sociocultural, a proposta de ensino desenvolveu-se das regularidades das lutas para
as modalidades de Luta como modalidades esportivas e artes marciais.

RESULTADOS

A proposta de Plano de Ensino para o conteúdo Luta ficou assim caracterizada:

• Para o segundo ciclo foi proposto como objetivo de aprendizagem da Luta:


Identificar, entender e discutir os princípios gerais presentes na Luta, nas
suas diversas formas corporais, que segundo GOMES, et al. (2010) são: fusão
ataque/defesa; contato proposital; imprevisibilidade; oponente (s) /Alvo (s);
regras. Com a utilização de jogos de oposição.
• Para o terceiro ciclo foi proposto o seguinte objetivo: conhecer a diferença
entre lutas, brigas, esportes e artes marciais, bem como desenvolver algumas
modalidades de lutas.
• No quarto ciclo foi proposto como objetivo: refletir sobre o processo
de esportivização das artes marciais considerando a explosão midiática
relacionada às artes marciais mistas (MMA), aprofundando o sentido
polissêmico da Luta e o conhecimento sobre as modalidades de lutas.
No dia 29/04/2016, a proposta foi apresentada ao SOEP, na presença dos
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professores e professoras da escola, dos alunos bolsistas, da supervisora do PIBID e
da coordenadora de área do PIBID. Após a apresentação por parte dos bolsistas do
PIBID a proposta foi colocada em discussão e, posteriormente, aprovada para que
fosse desenvolvido um projeto de experimentação pedagógica com a implantação
da mesma nos três ciclos de ensino.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo se propôs a investigar, através da pesquisa-ação, o trato com


o conhecimento Luta, numa escola federal de educação básica. Partindo das
intervenções realizadas, da análise dos documentos da escola, foi identificada a
necessidade de alterar o Programa de Ensino da componente curricular Educação
Física no que se referia ao trato com o conhecimento Luta.
Após a elaboração da proposta a mesma foi apresentada e aprovada pelo SOEP,
gerando uma nova questão de pesquisa: como materializar a proposta ainda que de
forma experimental. Com esta questão iniciou-se um novo ciclo de pesquisa-ação.

ENSEÑANZA DE LA LUCHA EN LA EDUCACIÓN BÁSICA CLASES DE


EDUCACIÓN FÍSICA: UNA EXPERIENCIA PROGRAMA INSTITUCIONAL DE
INICIACIÓN A LA ENSEÑANZA DE LOS BENEFICIARIOS
RESUMEN: El estudio tuvo como objetivo articular una propuesta pedagógica de enseñanza de la
lucha en una escuela federal de la educación básica en el marco del Programa de Beca Institucional
de Introducción a la enseñanza (PIBID-Capes) de la Escuela de Educación Física de la Universidad
de Pernambuco (ESEF-UPE). Por lo tanto, se utilizó la investigación-acción. La propuesta didáctica
lucha se presentó al Servicio de la Educación y Experimentación Asesor (SOEP) de dicha escuela,
que lo aprobó para las clases de educación física.
PALABRAS CLAVES: Lucha, programa de enseñanza, educación física

THE TEACHING OF THE FIGHT IN BASIC EDUCATION IN THE LESSONS OF


PHYSICAL EDUCATION: AN EXPERIENCE OF THE INSTITUTIONAL PROGRAM OF
BOLSISTS OF INITIATION TO TEACHING
ABSTRACT: The objective of this study was to systematize a teaching proposal of the Fight for a
Federal School of Basic Education in the scope of the Institutional Program of Initiatives for Teaching
(PIBID-Capes) of the School of Physical Education of the University of Pernambuco (ESEF-UPE).
For that, it was used of the research-action. The teaching proposal of the Fight was presented to
the Pedagogical Guidance and Experimentation Service (SOEP) of the mentioned school, which
approved it for the physical education classes of the school.
KEYWORDS: Fight; Teaching program; Physical school education.

REFERÊNCIAS
ARCHANJO, Flávio Miguel. A História das Lutas Corporais: Contribuições Epistemológicas
para a Educação Física. Recife, 2005. Monografia de Especialização (ESEF/UPE)

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Nacionais:Educação Física: Ensino de Primeira à Quarta Série. Brasileira: MEC / SEF, 1997.
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O ENSINO DAS LUTAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA
ESCOLAR - A PRODUÇÃO CIENTÍFICA (2006-2016)
DAS REVISTAS RBCE, MOVIMENTO E PENSAR A
PRÁTICA1 

Ana Carla Dias Carvalho2


Luara Faria dos Santos3
Maristela Vicente de Paula4

RESUMO
Este artigo investiga a produção científica (2006-2016) sobre o ensino das lutas nas aulas de educação
física por meio dos artigos das Revistas Pensar a Prática, RBCE e Movimento. Como objetivo, busca-
se um panorama sobre a produção científica que contemple o ensino das lutas na escola. Conclui-se
que a produção científica vem superando a fase de denúncia da ausência do conteúdo lutas e aponta
estratégias e metodologias para o ensino, articulado à formação continuada e a realidade escolar.
PALAVRAS-CHAVE: produção científica; ensino; lutas.

1 INTRODUÇÃO

Este texto problematiza o que tem sido produzido na área de educação física
acerca do ensino das lutas. Matos et al (2013) ao investigar a produção acadêmica
sobre os conteúdos da educação física constata que o esporte continua sendo o
conteúdo hegemônico tematizado pelos autores, de modo que as lutas, a capoeira
e a ginástica configuram-se como temas da cultura corporal abordados em menor
número. O argumento teórico desta investigação busca potencializar os estudos
no campo sócio pedagógico da educação física, especialmente acerca das lutas,
tema pouco abordado pedagogicamente e, de menor visibilidade na produção
acadêmica.
O objetivo central visa oferecer um panorama sobre a produção científica da
área quanto às preocupações de pesquisa sobre o ensino das lutas. Contribuindo
assim, para a constituição de um “estado do conhecimento” que pode revelar
concepções e prescrições pedagógicas que norteiam e fazem interface com a
temática investigada.
O corpus documental constitui-se dos textos indexados em três periódicos
da área no período de 2006 a 2016, inclusive as edições especiais do período, são
1 O presente texto não contou com apoio financeiro de nenhuma natureza para sua realização.
2 Universidade Federal de Goiás, anacarla.carvalho72@gmail.com
3 Universidade Federal de Goiás, luarafaria@hotmail.com
4 Universidade Federal de Goiás, maristela.vicente.paula@gmail.com

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eles: A Revista Pensar a Prática, a Revista Movimento e a RBCE - Revista Brasileira
de Ciências do Esporte. Para isso, selecionamos textos que privilegiam o “ensino
das lutas na educação física escolar” conforme os títulos, as palavras-chave e os
resumos.
Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, em que os textos levantados tornam-
se fontes da pesquisa (SEVERINO, 2012). A análise dos textos compreende
a sistematização dos aspectos teórico-metodológicos centrais da realidade
apresentada pelas fontes.

2 O ENSINO DAS LUTAS NA PRODUÇÃO DA PENSAR A PRÁTICA, RBCE E


MOVIMENTO

O corpus documental constitui-se de nove artigos que tematizam o ensino das


lutas no âmbito escolar, sendo: um (1) RBCE, quatro (4) Pensar a Prática e quatro
(4) Movimento, conforme Tabela 1, que apresenta título, autor(s), número e ano de
veiculação.

TABELA 1 - Acervo de artigos sobre o ensino das lutas nas aulas de educação física.
Título Autores(as) Periódico Ano
A separação dos conteúdos das “lutas” dos “esportes” na Pensar a
Rufino; Darido 2011
Educação Física escolar: Necessidade ou tradição? Prática
Agressividade, violência e Budô: temas da Educação Física em Pensar a
Ueno; Sousa. 2014
uma escola estadual em Goiânia. Prática
Conhecimento declarativo de docentes sobre a prática de lutas,
Fonseca; Pensar a
artes marciais e modalidades esportivas de combate nas aulas de 2013
Franchini;Vecchio. Prática
Educação Física escolar em Pelotas-RS.
O jogo de faz de conta e o ensino da luta para crianças: criando Fabiani; Scaglia; Pensar a
2016
ambientes de aprendizagem. Almeida. Prática
Capoeira nas aulas de educação física: alguns apontamentos
Silva. RBCE 2011
sobre processos de ensino-aprendizado de professores.
A Tematização das lutas nas aulas de Educação Física Escolar: Nascimento;
Movimento 2007
restrições e possibilidades. Almeida.
Bertazzoli; Alves;
Uma Abordagem Pedagógica para a Capoeira. Movimento 2008
Amaral.
Ensino das lutas: dos princípios condicionais aos grupos Gomes; Morato;
Movimento 2010
situacionais Duarte; Almeida.
MMA e Educação Física Escolar: a luta vai começar Vasques; Beltrão. Movimento 2013

Fonte: Revista Pensar a Prática, RBCE e Movimento (2006-2016)

Rufino e Darido (2011) através de uma revisão de literatura, abordam a separação


dos conteúdos de lutas dos esportes se dá em razão origem. Uma vez que as lutas
são manifestações que acompanham a humanidade enquanto que o esporte é um
fenômeno recente (Séc. XIX). Concluem que, embora as lutas também tenham
sofrido o processo de esportivização a separação dos esportes pode ser favorável
para o seu fortalecimento, evitando a sua diluição entre os outros conteúdos na
educação física.
Fonseca; Franchini; Del Vecchio (2013) pesquisam o conhecimento declarado
pelos docentes sobre a prática de lutas nas aulas de educação física escolar na
cidade de Pelotas no Rio Grande do Sul. O estudo caracteriza-se como observacional,

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transversal e descritivo, no qual participaram professores de educação física. Os
resultados demonstram que a maioria dos professores declaram não ter instrução
para desenvolver os conhecimentos das na escola. Assim sugere-se que entidades
oficiais, como Secretarias Estaduais e Municipais de Educação promovam cursos de
capacitação e atualização para os professores, bem como, os cursos de Licenciatura
em educação física, revisem a estrutura dos seus Projetos Pedagógicos, a fim de
formar profissionais capacitados para desenvolver os conteúdos relacionados a
esse tema.
Ueno e Sousa, (2014) abordam as percepções de estudantes de uma escola
estadual de Goiânia/GO sobre a relação agressividade e lutas tematizadas nas aulas
de educação física. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que utilizou observação
sistemática e participante. Concluiu-se que há uma distorção na representação das
lutas e uma associação com a temática violência, evidenciando a necessidade do
trato pedagógico, pela disciplina educação física sobre o tema.
Fabiani; Scaglia; Almeida (2016) tratam dos processos de ensino, vivência
e aprendizagem da luta para crianças por meio do jogo. Através de pesquisa
qualitativa, descritiva e propositiva fundamenta-se no referencial histórico-cultural
e apresentam estratégias pedagógicas que valorizam o jogo de faz de conta como
mediador dos processos de aprendizagem no universo da luta.
Silva (2011) por meio de uma investigação qualitativa, em que se inseriu
como observadora participante teve como objetivo a qualificação do trato com o
conhecimento das lutas a partir da capoeira mediante um processo de formação
continuada de professores de educação física. Reflete sobre a importância desse
conteúdo e a necessidade do estudo e desenvolvimento e propõe estratégias
para o ensino-aprendizado que compreendam interações gestuais no contexto da
experiência com a capoeira.
Nascimento e Almeida (2007) problematizam a restrição do trato com o
tema lutas nas aulas de educação física e apontam para importância de reflexões e
intervenções pedagógicas que superem a falta de vivência pessoal em lutas (na vida
e âmbito acadêmico) e, a preocupação com o fator violência, que julgam intrínseco
às lutas. Destacam que as lutas estão presentes na escola em ações extracurriculares
desvinculadas do projeto político pedagógico, conduzidas por praticantes, ex-
atletas e voluntários.
Vasques e Beltrão (2013) através de revisão bibliográfica cujo objetivo é
abordar o fenômeno MMA (MixedMartialArts) enquanto manifestação sociocultural
e seu tensionamento com a educação física escolar afirmam, a necessidade de
intensificação dos estudos e debates sobre o tema a fim de subsidiar a prática
pedagógica da educação física quanto aos aspectos relacionados a mercadorização
das práticas corporais, massificação, espetacularização e violência.
Gomes et al (2010) em investigação qualitativa de caráter descritivo e analítico,
realizam entrevistas semiestruturadas com professores de educação física que
atuam em distintas modalidades de lutas, com objetivo de classificar e identificar
princípios comuns no ensino das lutas. Concluem que existem princípios comuns
norteadores para o ensino global das lutas. Nessa direção, compreendem que o ensino
de modo ampliado torna-se possível antes da prática especializada, permitindo
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o desenvolvimento amplo do aluno e não a reprodução descontextualizada dos
gestos técnicos.
Bertazzoli; Alves; Amaral (2008) pesquisam a viabilidade de aplicação de
instrumentos metodológicos para o ensino da capoeira numa perspectiva crítica. A
partir da observação participante como método de investigação sistematizam uma
metodologia de ensino cujo eixo norteador é a socialização articulada as ações: a
solução de problemas, a criação de movimentos e a reflexão.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quanto aos aspectos centrais dos textos levantados, evidenciamos que esta
produção inaugura um novo estágio de conhecimento para o ensino das lutas
na escola na medida em que, supera o denuncismo corrente da inexistência do
trato pedagógico das lutas na educação física para lançar mão de estratégias
metodológicas que possam subsidiar metodologias de ensino para este conteúdo.
Vale dizer, que a necessidade de formação qualificada ainda é enfatizada pela
literatura, no entanto esta produção mais recente da área tem-se comprometido
em focalizar esforços que colaboram para a formação continuada de professores de
educação física pautada nas demandas da realidade escolar.
Assim, a abordagem das lutas ocorre de modo amplo, as modalidades não
são tratadas de modo estanque, perspectiva esta que reflete a sintonia com o que
vem sendo produzido no campo das metodologias críticas da educação física.
Todos os textos possuem abordagem qualitativa e estão articuladas a experiência
docente, seja no sentido das preocupações teórico-metodológicas, seja articulando
universidade-escola através de investigações de cunho propositivo que podem
contribuir para a reflexão e  qualificação dos envolvidos.

ABSTRACT: This article investigates the scientific production (2006-2016) on the teaching of the
struggles in physical education classes through the articles of the Magazines Thinking Practice,
RBCE and Movement. As an objective, we search for a panorama about the scientific production that
contemplates the teaching of the struggles in the school. It is concluded that the scientific production
has overcome a stage of denunciation of the absence of content struggles and points out strategies
and methodologies for teaching, articulating the continuous formation and the school reality.
KEYWORDS: scientific production; teaching; Fights

ENSEÑANZA DE DIFICULTADES EN LA ESCUELA FÍSICA EDUCACIÓN -


PRODUCCIÓN CIENTÍFICA (2006-2016) DE REVISTAS RBCE, EL MOVIMIENTO Y
PENSAR ACERCA DE LA PRÁCTICA
RESUMEN: En este artículo se investiga La producción científica (2006-2016) em la enseñanza de las
luchas de las clases de educación física a través de los artículos de revistas Pensar a Práctica, RBCE
y Movimiento. Como objetivo, buscamos una visión general de la literatura científica que se ocupa
de laenseñanza de lãs peleas em La escuela. Se concluye que La producción científica ha superado
a fase queja de la falta de contenido y los puntos de lucha estrategias y métodos para enseñar, para
articular La formación continua y larealidad escolar.
PALABRAS CLAVE: producción científica; laeducación; peleas.

REFERÊNCIAS
ALVES JÚNIOR, E. Discutindo a violência nos esportes de luta: a responsabilidade do
professor de educação física na busca de novos significados para o uso das lutas como
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BERTAZZOLI, B. F.; ALVES, D. A.; AMARAL, S. C. F. Uma Abordagem Pedagógica para a


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FABIANI, D. J. F.; SCAGLIA, A. J.; ALMEIDA, J. J. G. O jogo de faz de conta e o ensino da


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O ENSINO DAS LUTAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: UMA
BREVE REFLEXÃO
CORSO, João Schmidt1
ANTUNES, Fabiana Ritter2

RESUMO
Este estudo tem o objetivo de analisar e refletir sobre o ensino das práticas de Lutas no ambiente
escolar, a partir da concepção de 2 (dois) acadêmicos do curso de Educação Física. Possui uma
abordagem qualitativa de cunho descritivo interpretativo com ênfase no estudo de caso. Foi
utilizado um instrumento de pesquisa, no formato de questionário misto, contendo perguntas
abertas e fechadas, com o intuito de coletar o depoimento dos participantes, a partir de 5 (cinco)
questões norteadoras sobre o tema. De maneira geral, os entrevistados manifestaram aprovação
em relação ao ensino de Lutas na Educação Física escolar e demonstraram estar cientes dos
benefícios que estas práticas podem proporcionar, se trabalhadas da forma adequada. As
percepções apresentadas pelos estudantes possibilitaram ao estudo reflexões como: a necessidade
do ensino de Lutas no meio acadêmico; além do tipo de abordagem que este tema deve ter nas
escolas, possibilitando o conhecimento de diferentes práticas e as individualidades
técnicas/históricas/culturais que possuem, além da execução de jogos educativos com elementos
das Lutas, para vivenciar na prática estas características estudadas; por fim, também mostrou-se
extremamente essencial a atenção e o cuidado com a prática docente, que exerce grande influência
na maneira que os alunos irão encarar e praticar as Lutas durante as aulas.
Palavras-chave: Aprendizado; Docente; Práticas Corporais.

INTRODUÇÃO
Atualmente a Educação Física escolar passa por grande carência no que tange ao
ensino das diferentes práticas corporais. Apesar dos constantes discursos da necessidade
de diversificar os conteúdos, a maior parte das instituições oferece uma educação
limitada, priorizando apenas o ensino dos clássicos esportes coletivos, como: futsal,
voleibol, handebol e basquetebol. Desta forma, o aprendizado e a experiência dos alunos
com as práticas corporais acabam se tornando superficiais e insuficientes, por conta da
ausência de outros conteúdos com grande valor social e cultural, como é o caso das Lutas
(MATOS, 2015).
As Lutas são práticas que possuem grande relevância na cultura do movimento e
estiveram presentes em grandes momentos históricos da humanidade, exercendo grande
influência em diversos costumes, estilo de vida e no rumo das sociedades. Neste sentido,
Matos (2015, p.120) destaca que as Lutas “são conteúdos ricos em significados e
possibilitam a apreensão de conhecimentos em diferentes dimensões, quer sejam
conceituais, científicas, estéticas, corporais, econômicas, dentre outras”.
Diante disso, González e Fensterseifer (2014, p.437) caracterizam as Lutas como,

[...] práticas corporais de importância histórica e social pertencentes à


esfera da cultura corporal de movimento que agregam objetivos
focalizados na oposição de ações entre indivíduos cujo foco está
centrado no corpo da outra pessoa a partir da imprevisibilidade de ações

1
Acadêmico, Educação Física da UNIJUÍ, Ijuí-RS, joao.corso@sou.unijui.edu.br

2
Docente do Curso de Educação Física da UNIJUÍ, Ijuí -RS, fabiana.antunes@unijui.edu.br

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Revista Saúde Viva Multidisciplinar da AJES, Juína/MT, v. 4, n. 5, jan./jun. 2021. 27
de caráter simultâneo. Apresentam o envolvimento de ações que
ocorrem ao mesmo tempo e são centradas em um alvo que é móvel e
personificado pelo corpo de outrem, além de diferentes níveis de
contato de acordo com as características de cada prática. São regidas
por regras básicas que variam conforme a modalidade.
Devido à magnitude destas práticas, as Lutas estão previstas como conteúdos a
serem trabalhados na Educação Física escolar, com presença tanto no ensino fundamental
quanto no ensino médio. Estas orientações fazem parte dos documentos nacionais que
norteiam a composição do currículo das escolas, como a BNCC – Base Nacional Comum
Curricular (BRASIL, 2018). Sendo assim, é de direito dos alunos, o aprendizado e
experiências com Lutas em determinadas aulas de Educação Física.
Apesar disso, este conteúdo ainda é pouco trabalhado e é quase inexistente no
ambiente escolar. Isso se deve a certos preconceitos que existem em relação às lutas
relacionando-as com brigas; a falta de materiais; e/ou a formação falha dos profissionais
de Educação Física, dentre outros empecilhos que acabam desenvolvendo certo receio
com a prática das Lutas nas escolas (RUFINO, 2014).
Visando colaborar para a superação destes problemas citados, Rufino apresenta
algumas considerações sobre cada um deles. Com relação ao preconceito, o autor constata
que não há uma postura crítica e discute a necessidade de um ensino de maneira adequada,
envolvendo debates, troca de ideias, estudos, fatos históricos e experiências concretas,
para desmistificar certos pensamentos simplistas e errôneos em relação às lutas. Referente
à falta de materiais e adaptação das atividades, Rufino (2014, p.34) indica que“é
importante conhecer modos de adaptação dos materiais, das regras e da utilização de
formas de ensino, assim como a estratégia dos jogos de luta”. Sobre a formação falha dos
profissionais da área de Educação Física, diz é que,

[...] o professor não precisa ser um especialista em todas as modalidades


de luta (o que seria extremamente difícil), mas, ao mesmo tempo,
precisa ter alguns conhecimentos que possam dar suporte para suas
intervenções. Tal conteúdo deve ser desenvolvido tanto nos cursos de
formação inicial quanto continuada, assim como em diversas outras
possibilidades formativas [...] (RUFINO, 2014, p. 34).

Outra questão fundamental para o ensino das Lutas na escola são os jogos
educativos de lutas. Estes, aliados ao modelo situacional-ativo de educação, possuem
grande potencial, pois permitirão a vivência da lógica interna e das mais variadas
características que as lutas possuem. Deste modo os jogos educativos apresentam-se
como grandes aliados na superação dos obstáculos e na viabilização das práticas de Lutas
no ambiente escolar. Seguindo esta compreensão,

[...] a utilização de jogos permite que possamos manter as


características básicas relacionadas às lutas, tais como as regras, a
imprevisibilidade, o alvo personificado no corpo da outra pessoa, a
oposição direta, entre outras, porém deixando o aprendizado mais
lúdico para os alunos. Dessa forma, trazemos elementos das lutas e os
transformamos em práticas possíveis de serem ensinadas de modo
interativo, sem perder as características básicas das diferentes
modalidades (RUFINO, 2014, p.34).

Um importante espaço de obtenção e desenvolvimento do conhecimento é o meio


acadêmico, por conta disso, analisar o entendimento e experiência que se tem sobre Lutas
neste contexto contribui para a compreensão do que irá ser transmitido no meio escolar.

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Desta forma é de extrema relevância para o campo das Lutas, estudos que se propõe a
analisar diferentes pontos de vista em diferentes contextos da sociedade, para maiores
aprofundamentos na resolução de problemas e na viabilização de caminhos para o ensino
destas práticas.
Diante das considerações destacadas, este estudo busca contribuir na ampliação
das reflexões acerca do tema “Lutas” no meio universitário. Para isso, tem por objetivo
analisar e refletir sobre o ensino das práticas de Lutas no ambiente escolar, a partir da
concepção de 2 (dois) acadêmicos do curso de Educação Física de uma Universidade
pública do país.

METODOLOGIA
Este estudo possui uma abordagem qualitativa de cunho descritivo interpretativo
com ênfase no estudo de caso. Foi utilizado um instrumento de pesquisa, no formato de
questionário misto, contendo perguntas abertas e fechadas. Com o intuito de coletar o
depoimento dos participantes, a entrevista contou com 5 (cinco) questões norteadoras,
envolvendo os temas: desenvolvimento do ensino de Lutas nas escolas; disciplina de
Lutas na formação acadêmica; condições dos cursos graduação para o trabalho com este
tema; o papel do docente no ensino das Lutas nas escolas; os benefícios e/ou malefícios
das Lutas para os alunos.
Este instrumento de pesquisa foi enviado por e-mail em um documento no formato
de PDF aos 2 (dois) voluntários da pesquisa que responderam e devolveram também
através do e-mail. Buscando preservar a identificação pessoal dos entrevistados, os
mesmos estão representados no presente artigo como Estudante 1 e Estudante 2. De
acordo com os dados coletados inicialmente, os participantes possuíam os seguintes
perfis:
Estudante 1 - 21 anos; sexo masculino; graduando do 4º semestre do curso de
Educação Física (bacharelado) em Universidade pública.
Estudante 2 - 19 anos; sexo masculino; graduando do 1º semestre do curso de
Educação Física (bacharelado) em Universidade pública.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Diante das respostas concedidas pelos entrevistados, foi possível analisar o
contato e as relações de cada um com as Lutas, a partir das questões 2 e 3, além das
percepções e opiniões dos voluntários sobre o contexto da prática de Lutas no ambiente
escolar, por meio das questões 1,4 5.
A primeira questão, referente ao ensino do tema "Lutas" nas aulas de Educação
Física escolar, foi respondida pelos entrevistados da seguinte forma:
“Desenvolveria sim este tema nas aulas, para que os alunos possam ter a experiência e
a iniciação de lutas, assim podendo se interessar e daí individualmente de acordo com o
interesse próprio levar a prática mais a fundo. Além de abrir o “leque” de possibilidades
na Educação Física escolar” (Estudante 1, 2021).
“Eu desenvolveria o tema de lutas na educação física escolar, pois acredito que seja
importante tanto para autodefesa, tanto para interação com os colegas, para aprenderem
a se respeitar e também porque acho importante a apresentação de diferentes esportes
para os alunos” (Estudante 2, 2021).
A partir destas considerações, fica evidente que os 2 (dois) sujeitos são favoráveis
ao ensino das Lutas nas escolas, confirmando que trabalhariam com este tema na
disciplina de Educação Física. Dentre as justificativas, foram citadas a importância da:
interação dos alunos; a autodefesa; a disciplina. E a ideia que merece destaque, inclusive

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presente nos 2 (dois) discursos, é o reconhecimento da importância da diversidade de
práticas e das inúmeras possibilidades que o campo da Educação Física pode oferecer.
Esta ideia reflete o grande desafio dos profissionais desta área, de proporcionar
aos alunos o aprendizado e as experiências nas diversas práticas pertencentes à cultura
corporal do movimento. As Lutas pertencem ao grupo de práticas previstas no currículo
escolar e, como os sujeitos do estudo apontaram, é de grande importância para o processo
de formação dos alunos na Educação Física.
A segunda questão da entrevista busca saber se há alguma disciplina específica de
Lutas na graduação da universidade em que os entrevistados estudam. Por cursarem
Educação Física na mesma instituição, os 2 (dois) responderam que sim, porém é ofertada
de forma optativa no currículo do curso e eles não haviam cursado até o momento.
É fundamental que disciplinas que abordam o ensino das Lutas estejam presentes
nos cursos de Educação Física, para que os futuros profissionais, formados nestas
instituições, tenham aporte teórico e prático adequado para trabalhar com este tema nas
escolas. No caso dos entrevistados, há a possibilidade, mesmo que de forma optativa, de
realizarem a disciplina. Diferentemente de grande parte dos cursos de Educação Física do
país, que sequer oferecem disciplinas com abordagens deste tipo. Neste sentido, é cabível
a seguinte reflexão: o atual ensino e prioridades das instituições de ensino superior, em
geral, estão contribuindo com a formação necessária para o trabalho com práticas
inovadoras e a inclusão de diferentes conteúdos, como é o caso das Lutas?
A terceira pergunta da entrevista questiona se, na opinião dos entrevistados, o
curso que estão realizando oferece condições para que incluam as aulas de Lutas na
escola. A partir disso, obteve-se as seguintes respostas:
“Acredito que o curso que estou estudando oferece sim as condições necessárias para
que tenhamos a capacidade de passar aos alunos uma base das Lutas. Mas não se
aprofunda de maneira que possamos trabalhar com as técnicas mais avançadas e
apuradas de tal Luta específica” (Estudante 1, 2021).
“Sim, porque temos a disciplina de inicialização em lutas e podemos tranquilamente
incluir em aulas, porém é uma disciplina base, por isso, se decidíssemos trabalhar no
âmbito do treinamento específico e de alta intensidade com determinada Luta, seria
necessário um estudo e formação maior” (Estudante 2, 2021).
Analisando as opiniões dos estudantes é possível entender que os dois
compreendem o papel da disciplina de Lutas no curso de Educação Física, que não se
detêm a ensinar/treinar técnicas avançadas de Lutas específicas, mas sim trabalhar com
elementos, lógicas, regras e características que sirvam como base para o ensino adequado
deste tema no ambiente escolar, em dinâmicas de recreação/lazer ou até mesmo práticas
que possam envolver certas técnicas/características de Luta.
O preparo e o treinamento de práticas específicas de Luta para o alto nível não
está presente na proposta dos cursos de Educação Física. Caso o profissional pretenda
tornar-se professor ou instrutor de uma determinada Luta específica, precisa se
especializar, praticar e atingir certo nível de graduação da modalidade para, então, estar
apto a ministrar aulas e treinamentos, com fins de aprendizado, competição e/ou
aprimoramento para o alto rendimento.
Já no curso de Educação Física, o ensino de Lutas deve estar presente no intuito
de capacitar o graduando a trabalhar com seus futuros alunos sobre: aspectos históricos e
culturais do tema; prática de jogos/dinâmicas/tarefas que envolvam determinados
movimentos, técnicas e características de Lutas; além de vivências com certas
modalidades e o conhecimento dos mais variados tipos de Lutas. No caso dos
entrevistados, o curso que realizam oferece uma disciplina com este tema, por conta disso,
os dois acreditam que o curso atende às demandas para o posterior ensino nas escolas.

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A questão seguinte (4ª questão) indaga se, na opinião dos entrevistados, o docente
deve ensinar o tema Lutas nas aulas de Educação Física escolar. A partir disso, obteve-se
as seguintes respostas:
“Na minha opinião, os professores devem sim passar o tema lutas nas aulas de
educação física, para que os alunos possam ter a oportunidade de aprender e se
interessar pela arte” (Estudante 1, 2021).
“Em minha opinião sim, o tema lutas deve ser introduzido no âmbito da educação
física escolar” (Estudante 2, 2021).
As duas opiniões mostram-se a favor do ensino das Lutas nas escolas e, a
similaridade das ideias dos estudantes perante esta e as demais questões tem grande
influência da provável forma de pensar o ensino da Educação Física no curso que
estudam, desde o início até o término do mesmo. Deste modo, apesar de ainda não terem
feito a disciplina específica de Lutas, os entrevistados já mostraram entender sobre a
importância da diversidade de práticas a serem trabalhadas na Educação Física, além das
inúmeras possibilidades de experiências e aprendizado que esta área pode e deve
proporcionar aos alunos.
Por isso, mesmo estando em semestres/etapas diferentes, as ideias dos estudantes
seguem a mesma linha de pensamento e são refletidas nas diversas respostas concedidas
a este estudo. Como por exemplo, ao citarem em boa parte delas a necessidade da
presença de diferentes práticas e possibilidades na Educação Física escolar além de
considerarem as Lutas como uma dessas possibilidades para ampliar o “leque” de opções.
Ao tomar consciência, desde o início, do dever e importância do trabalho com as
diversas práticas inovadoras na Educação Física, o graduando tende associar
adequadamente certas propostas com naturalidade, como é o caso da proposta do ensino
das Lutas nas escolas. Mesmo não tendo estudado diretamente com estas práticas, os
estudantes já possuíam o conhecimento da relevância da diversidade de modalidades no
campo da Educação Física, portanto associaram as Lutas a estas práticas, compreendendo
então como necessárias e importantes.
Por fim, a 5ª e última pergunta questiona se, na opinião dos entrevistados, as aulas
de Lutas na escola podem trazer benefícios ou malefícios aos alunos. As respostas
concedidas foram as seguintes:
“Acredito que as aulas sobre lutas trazem grandes benefícios, pois proporciona
aos alunos um convívio social de interação com os demais colegas e ensina-os a respeitar
o esporte” (Estudante 1, 2021).
“Acredito que, se bem introduzida pelo professor, pode trazer diversos benefícios
como os já citados na questão 1. Porém, se não for introduzida com cuidado e atenção
pode gerar conflito entre os alunos e se tornar algo agressivo e ruim para os mesmos”
(Estudante 2, 2021).
A primeira opinião traz elementos relacionados aos benefícios que as Lutas podem
proporcionar aos alunos, como o convívio e interação entre eles. Estes aspectos estão
fortemente ligados ao potencial de inclusão e relações sociais que estas práticas
proporcionam para os participantes, através do contato físico, respeito à integridade dos
oponentes e superação de limites individuais por meio de interações com os colegas.
Outro elemento citado que vale destaque é o respeito com a prática, ou seja, muito
além de realizar determinada Luta, o aluno compreenderá o que ela significa, valores que
carrega e características que envolve, como: regras, noções técnicas e táticas, dentre
outros aspectos que tornam estas práticas tão ricas e complexas. Desta forma, o aluno
tende distinguir as Lutas de brigas ou violência gratuita e, portanto, passará a trata-las de
forma mais responsável e respeitosa.

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A segunda resposta acrescenta a responsabilidade do docente diante dos
benefícios ou malefícios que estas práticas podem proporcionar. Este elemento é
extremamente importante para o andamento das aulas, tanto com práticas de Lutas quanto
com qualquer outro tipo de prática, destacando a influência do professor sobre o
aprendizado e entendimento dos discentes perante os conteúdos trabalhados.
Neste sentido, cabe ao docente conduzir a aula de forma apropriada,
proporcionando a seus alunos o ensino através de reflexões, criticidade e, além do simples
ato de realizar determinada prática, gerar a tomada de consciência do que estão praticando
e por que estão praticando. No entanto, se o professor não tiver o cuidado necessário, não
realizar as explicações e contextualizações adequadas, apenas trabalhando com técnicas
e movimentos aleatórios, a tendência é que passe por problemas, ainda mais trabalhando
este tipo de prática, que já sofre com grande preconceito, desconhecimento e receio no
ambiente escolar. Consequentemente, ao invés de proporcionar os benefícios que as Lutas
possuem, acabarão causando os malefícios que elas tanto abominam.
Por isso, faz-se necessário o preparo/capacitação dos professores para o trabalho
com o conteúdo a ser ensinado e esta é a importância dos cursos de graduação que
possuem em seu currículo as práticas de Lutas. Sem uma base de metodologias, materiais
e possibilidades, torna-se extremamente difícil o ensino adequado destas práticas no
âmbito escolar e isso acaba colaborando para serem deixadas de lado nas aulas de
Educação Física de grande parte das escolas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo proporcionou análises e reflexões que buscam validar e reforçar
a importância do ensino de Lutas nas escolas. A partir das respostas dos estudantes
universitários, foram abordados assuntos e questões extremamente relevantes para esta
temática. Os entrevistados manifestaram aprovação em relação ao ensino de Lutas na
Educação Física escolar e, de maneira geral, demonstraram estar cientes dos benefícios
que estas práticas podem proporcionar, se trabalhadas da forma adequada, como: respeito,
melhor interação com os colegas, diversidade de experiências, dentre outras contribuições
que a temática tende a potencializar nesta disciplina.
As percepções apresentadas pelos estudantes possibilitaram ao estudo reflexões
como a necessidade do ensino de Lutas no meio acadêmico, com o intuito de preparar os
futuros profissionais para o trabalho com estas práticas na Educação Física escolar de
forma adequada. Outro tópico analisado foi a abordagem que este tema deve ter nas
escolas, não se detendo ao ensinamento de modalidades específicas, mas sim no
conhecimento de diferentes práticas e as individualidades técnicas/históricas/culturais
que possuem, além da execução de jogos educativos com elementos das Lutas, para
vivenciar na prática estas características estudadas.
Mostrou-se também extremamente essencial o cuidado e a atenção na prática
docente, que exerce grande influência na maneira que os alunos irão encarar e praticar as
Lutas durante as aulas. Desta forma, o professor tem o papel de guiar as aulas com
reflexões, senso crítico e explicações que irão elucidar o aprendizado destas práticas e
desenvolver o respeito e a valorização das mesmas.
Por fim, conclui-se que as Lutas devem ser incluídas no ambiente escolar, como
conteúdos na disciplina de Educação Física. Neste sentido, torna-se necessário o preparo
e capacitação dos futuros docentes nos cursos de graduação, desenvolvendo as
competências necessárias para o ensino adequado desta temática nas escolas. Portanto, se
existir a consciência e a atenção apropriada ao ensino das Lutas nos cursos de graduação,

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esta condição terá grande impacto e contribuição para os futuros profissionais e refletirá
posteriormente na presença destas práticas na Educação Física escolar.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular – BNCC 3ª


versão. Brasília-DF, 2018. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>.
Acesso em: 18 fev. 2021.
GONZÁLEZ, F. J. (Org.); FENSTERSEIFER, P. E. (Org.). Dicionário Crítico de
Educação Física. 3. ed. Ijuí-RS: Editora Unijuí, 2014. v. 1. 680p.
MATOS, J. A. B. et al. A Presença/Ausência do Conteúdo Lutas na Educação Física
Escolar: Identificando Desafios e Propondo Sugestões. Conexões, Campinas, v. 13, n.
2, p. 119, abr./jun. 2015. Disponível em:
<https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/conexoes/article/view/8640658>.
Acesso em: 18 fev. 2021.
RUFINO, L. G. B. Lutas, Capoeira e Práticas Corporais de Aventura. In: GONZÁLEZ,
F. J.; DARIDO, S. C.; OLIVEIRA, A. A. B. Práticas corporais e a organização do
conhecimento. 4. ed. Maringá-PR: Editora Maringá. 2014.

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Motrivivência v. 27, n. 45, p. 262-279, setembro/2015

http://dx.doi.org/10.5007/2175-8042.2015v27n45p262

O ENSINO DAS LUTAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA


ESCOLAR: uma experiência no ensino fundamental

Raphael Gregory Bazílio Lopes1


Tiemi Okimura Kerr2

RESUMO

A Educação Física brasileira é controversa quanto aos seus conteúdos: ao mesmo tempo
em que se declaram diversas possibilidades de tematização, nota-se que aquelas que se
apresentam no cotidiano das aulas são retratos da área em décadas passadas. O estudo
tem o objetivo de relatar possibilidades de inclusão das Lutas nas aulas de Educação
Física para alunos do sexto ano do ensino fundamental a partir de jogos. Foi proposto
um percurso com quatro situações de aprendizagem em que se buscou a compreensão
e a experimentação dos princípios condicionais das Lutas e suas classificações por tipo
de contato e distância. Destacam-se as aprendizagens que permitiram a interconexão
entre o saber fazer e as razões do fazer nas diferentes situações-problema. Além disso,
esta experiência rompe com alguns paradigmas recorrentes, como a questão da violência
ou a necessidade de ser especialista em Lutas para abordá-las.

Palavras-chave: Cultura de Movimento; Educação Física Escolar; Lutas

1 Especialista em Ética, Valores e Cidadania na Escola. Professor de Educação Física da Rede Municipal do Ensino
de São Paulo e da Rede Estadual de São Paulo. São Paulo/SP, Brasil. E-mail: raphael.gregory@hotmail.com
2 Mestre em Pedagogia do Movimento. Professora de Educação Física da Rede Estadual de São Paulo. Professora
do Centro Universitário UNISANTAT’ANNA, São Paulo/SP, Brasil. E-mail: tiemiok@yahoo.com
V. 27, n° 45, setembro/2015 263

INTRODUÇÃO Compreende-se que todas as mani-


festações corporais humanas são gestadas
É imenso o universo de manifesta- na dinâmica cultural, cada qual com seus
ções corporais em que as pessoas podem se significados próprios, de acordo com o
engajar, todavia, ao analisarmos o tempo e contexto dos grupos em que estão inseridas.
o espaço da escola e das aulas de Educação Portanto, cabe a Educação Física escolar tra-
Física, constata-se que as possibilidades tar da transposição didática dos conteúdos
de movimento existentes permanecem inerentes ao movimento humano, produto
quase as mesmas de períodos distantes, e processo dinâmico característico de uma
apesar do movimento iniciado na década sociedade que a ele atribui valor.
de 1980, que aponta para temáticas que Lembrando que, na direção indicada
inter-relacionam educação, cultura, corpo por Betti (2011) e Daolio (2007) caminha o
e movimento humano (KUNZ, 2006). Currículo de Educação Física do Estado de
Nessa época, várias inquietações São Paulo3 (SÃO PAULO, 2010), ao com-
impulsionaram o aumento do debate aca- preender que o enfoque cultural leva em
dêmico na Educação Física, em que passou conta a pluralidade de manifestações corpo-
a ser questionado o seu ensino tradicional, rais em que os alunos podem se relacionar.
tecnicista e esportivista, a partir de diversas Para tanto, o professor deve selecionar
conteúdos que desvelem os diferentes signi-
proposições teórico-metodológicas (BETTI,
ficados e sentidos que podem ser expressos
2011). Daolio (2007) argumenta que o pre-
pelos alunos em diversas manifestações
domínio biológico passou a ser questionado
corporais, ampliando as possibilidades de
e que a questão sociocultural começou a
tematização presentes no universo da Cultu-
ganhar força, dada a infusão de outras áreas
ra de Movimento. Também deve considerar
do conhecimento oriundas das Ciências Hu-
objetos de aprendizagens que se coadunam
manas (Antropologia, Sociologia, História,
com a experiência real do aluno, levando-os
etc.) na discussão cultural da área.
a pensar como a realização do movimento
Surgem então novas maneiras de
se modifica em diferentes contextos.
se pensar e fazer Educação Física, que Nesse sentido, compreende-se que
reconhecem a pessoa como autora de seus todas as possibilidades da Cultura de Mo-
movimentos, nos quais múltiplos fatores vimento têm espaço na escola, inclusive
– emoções, desejos, possibilidades, etc. – as Lutas, cujo tratamento didático ainda
podem interferir em sua prática corporal. parece incipiente, haja vista a precarieda-
Práticas reconhecidas como formas de de de estudos relacionados ao conteúdo
linguagem que, sinteticamente, se expres- (AGUIAR, 2008; ALMEIDA, 2012; BREDA
sam em Jogo, Esporte, Ginástica, Atividade et al. 2010; GOMES, 2008; NASCIMENTO,
Rítmica e Danças e Lutas, elementos da 2008; NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007;
Cultura de Movimento (BETTI, 2011). RUFINO, DARIDO, 2012).

3 Esta possibilidade de inserção das Lutas foi pensada e aplicada em uma escola da rede estadual paulista, logo,
as experiências didáticas dialogaram com o currículo oficial adotado.
264

Matos et al. (2013) analisaram as formas de desenvolver as Lutas podem


produções acadêmicas que tratam sobre influenciar os alunos a adotarem compor-
os conteúdos de ensino da Educação Física tamentos agressivos ou não. Isto posto,
escolar entre os anos de 1981 a 2010, em Olivier (2000) coloca que as atividades
146 artigos distribuídos em 14 periódicos, bem sistematizadas e conduzidas ajudam
e constataram que os Esportes ocupam 29% as crianças a controlar as relações violentas
dos trabalhos analisados, enquanto as Lutas que podem acontecer no interior da escola.
ocupam apenas 2% (desconsiderando a Ca- Outro posicionamento bem comum
poeira que foi categorizada separadamente de recusa sobrevém da ideia – princi-
com 3%). Os autores apontam que, enquan- palmente por parte dos professores – da
to a publicação sobre outros conteúdos se necessidade de ser especialista em alguma
propagava a partir de 2001, os estudos sobre modalidade de luta para poder ensiná-la
as Lutas só iniciaram em 2007. Fica eviden- (ALMEIDA, 2012; GOMES et al., 2013).
te a necessidade de aumentar a produção Isso foi observado por Nascimento (2008)
acadêmica sobre o conteúdo, incidindo nas e Nascimento e Almeida (2007) ao verifi-
compreensões conceituais, procedimentais carem que a falta de vivência pessoal dos
e atitudinais acerca dessas práticas corporais professores entrevistados os fez afastar a
(RUFINO; DARIDO, 2012). proposição da prática. Tal fator pode ter sido
Corroborando tais indicadores, agravado pela recente inserção de discipli-
várias são as predisposições, por que não nas que contemplam as Lutas nos currículos
dizer mitos, que vão defender ou recusar a de Licenciatura e Bacharelado em Educação
inserção das Lutas na escola. Entre as que Física ou sua restrição as peculiaridades de
recusam, é comum escutar que a prática uma modalidade, por exemplo, o Judô (DEL
deste componente pode levar a adoção de VECCHIO; FRANCHINI, 2006). Assim,
comportamentos violentos (AGUIAR, 2008; ambos os fatores podem resultar na inse-
ALMEIDA, 2012; NASCIMENTO, 2008; gurança dos professores em abordar esse
NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007), mas a conteúdo nas aulas (BREDA et al., 2010).
questão da violência atinge uma comple- Por outro lado, quem a defende,
xidade muito maior, indo além da prática supervaloriza sua importância para a for-
da Luta, uma vez que ela está presente na mação moral, dada a ideia de disciplina
sociedade: intrínseco às relações sociais, oriunda da tradição militar, apoiada pelo
emanadas pelos modos de se expressar e método de ensino tecnicista, que prioriza a
comunicar em situações de conflito, de repetição de movimentos a exaustão, agre-
ameaça e de incerteza (OLIVIER, 2000). gada a valores como dedicação e esforço
Logo, os comportamentos agressivos re- (ALMEIDA, 2012; BREDA et al., 2010).
produzidos na escola podem ser reflexos Fica ainda, subjacente a estas ideias, uma
das ações que ocorrem nos cotidianos concepção ingênua e simplista que a prática
das pessoas, por exemplo, no trânsito, nas da Luta afasta seus praticantes da violência,
relações familiares, nas práticas esportivas, desconsiderando que as formas de tratar
etc. (AGUIAR, 2008). o conteúdo podem repercutir de diversas
Almeida (2012) alerta que o profes- formas no comportamento dos alunos (AL-
sor deve tomar consciência que as diferentes MEIDA, 2012).
V. 27, n° 45, setembro/2015 265

Ambas as ideias demonstram as em questão reconheceu a escola como um


diferentes compreensões que os profes- espaço que produz uma cultura escolar
sores têm sobre o tema e que ressoam na do esporte, no caso, ao buscar estabelecer
inserção de um “conteúdo desconhecido” um diálogo entre os alunos e as Lutas para
nas aulas. Nas palavras de Almeida (2012), recriar a experiência pessoal e situada, que
a vivência dos elementos que compõem as ultrapassa a ideia de reprodução da cultura
Lutas pode até ser considerada inovadora, hegemônica do esporte (VAGO, 1996).
mas não necessariamente complexa, pois Vale ressaltar que este texto é parte
há subsídios suficientes para que a prática da monografia (LOPES, 2013) desenvolvida
possa ser abordada com qualidade em seus no curso de pós-graduação lato sensu em
componentes básicos; contudo, é necessária Educação Física escolar, pela Faculdade de
a disposição do professor em estudar esta Educação Física da Universidade Estadual
manifestação da Cultura de Movimento. de Campinas em parceria com a Secretaria
Dessa forma, este estudo tem o da Educação do Estado de São Paulo. Logo,
objetivo de relatar a tematização das Lutas as reflexões e propostas indicadas são pauta-
em uma turma do sexto ano do ensino das na prática profissional do autor.
fundamental. Portanto, serão apresentadas
algumas possibilidades de levar as Lutas
para dentro da escola, pensando sua práti- Lutas na escola: aproximações necessárias
ca de uma forma mais global, enfatizando
seus princípios condicionais a partir de Segundo as palavras de Piernavieja
jogos organizados pelo tipo de contato (1973, p. 15) citado por Aguiar (2008,
e/ou distância estabelecida entre os oponen- p. 19), o surgimento das Lutas “[...] [coinci-
tes (GOMES, 2008; GOMES et al. 2008), de] com a própria aparição do homem sobre
assim como as relações históricas, sociais a terra”, o que torna muito difícil precisar
e culturais que a permeiam e sua relação seu aparecimento, pois não se trata de uma
com a violência, principalmente pela dife- construção isolada em dado momento histó-
renciação entre Luta e briga4. rico, mas sim de construções socioculturais
Acentua-se que a tematização do modificadas ao longo dos tempos (BREDA
conteúdo também foi pensada a partir das et al., 2010).
práticas apresentadas pelos alunos nos dife- As primeiras formas de lutar eram
rentes momentos escolares: as brincadeiras importantes para a preservação da vida e
de “lutinha”, os discursos referentes ao UFC de territórios (BREDA et al., 2010), basta
(Ultimate Fighting Championship), as brigas ver a necessidade de conseguir alimentos,
referenciadas como Lutas, etc. – conheci- proteger o grupo ao qual fazia parte e partir
mentos cotidianos que precisavam ser colo- em busca de novas terras (AGUIAR, 2008).
cados em evidência, discutidos, reconstruí- Com o tempo as Lutas foram adquirindo
dos e sistematizados. Assim, a experiência outros significados e sentidos, como a sua

4 Neste texto, a expressão “briga” é sinônimo de “agressão”, conforme adotado por Oliveira e Martins (2007): a
aplicação de força excessiva contra o outro, de maneira intencional, com o objetivo de causar dano.
266

utilização em rituais (indígenas, por exem- especialista em alguma modalidade de luta


plo); na preparação para a guerra; nas artes para abordá-la na escola (ALMEIDA, 2012;
marciais (Oriente), bem como sua intrínseca GOMES et al., 2013). Tampouco que deve
relação com a escrita, culinária, jardinagem ser supervalorizada sua importância para a
e tradições guerreiras, compondo um deter- formação moral que visa disciplinar o indi-
minado estilo de vida; e, atualmente, um víduo, bem como aderir a uma concepção
caráter esportivo (AGUIAR, 2008; BREDA ingênua que acredita que sua prática afasta
et al., 2010). seus praticantes da violência (ALMEIDA,
Como alerta Almeida (2012, p. 1), 2012; BREDA et al., 2010).
verificam-se diferentes representações na/ Deve-se ainda tomar cuidado com
da temática, como “[...] a defesa pessoal, a os procedimentos didáticos adotados que
formação moral do praticante, a preservação devem estar alinhados com aquilo que se
cultural e, sobretudo, a esportivização, são almeja para sua inserção na escola, haja
aspectos que se fazem presentes no universo vista que tradicionalmente os métodos que
das Lutas, e que dialogam com diferentes orientam o ensino das Lutas revelam-se pelo
valores que transitam em nossa sociedade.” seu alto teor militarista e disciplinador, a fim
de manter o respeito às tradições e por um
Ou seja, há uma gama de ideias associadas
modelo de ensino tecnicista e excludente,
às Lutas, o que requer uma análise crítica
limitando-se à repetição e reprodução do
dos objetivos que vão permear a inserção
gesto conforme um padrão (BREDA et al.,
do conteúdo nas aulas, como o reconhe-
2010). Todavia, eles podem oferecer ele-
cimento do espectro de relações que a
mentos úteis para o seu ensino na escola,
sociedade em geral e a comunidade escolar
desde que sejam problematizados e dialo-
estabelecem com o mesmo em conjunto
guem com interesses e possibilidades dos
com as diretrizes educacionais preconiza-
educandos (ALMEIDA, 2012).
das pela escola.
Para tanto, é necessária a vontade e
Dessa forma, uma das formas de o esforço do professor em estudar as Lutas
tomar contato e (res)significá-la na escola que serão trabalhadas na escola, bem como
pode partir da análise dos aspectos histó- reconhecer que o método a ser empregado
ricos, culturais, sociais, etc. que moldaram não pode ser igual àquele que prioriza a
sua criação e, posteriormente, compreender repetição de movimento, mas sim aquele
os diferentes significados e sentidos para que dá oportunidades para que todos parti-
seus praticantes, as principais habilidades cipem e desenvolvam suas potencialidades
envolvidas, etc. consolidando assim a “[...] (BRASIL, 1998), cujo aprendizado é signi-
apropriação crítica e criativa deste conteúdo ficativo (ALMEIDA, 2012). Neste sentido,
da cultura de movimento pelos alunos [...]” o professor pode fazer diversos arranjos
(ALMEIDA, 2012, p. 2). materiais para que os alunos obtenham êxito
Inserir este conteúdo nas aulas nas tarefas (BETTI, 2011).
não significa endossar a prática de com- Até o momento apontou-se perspec-
portamentos violentos (AGUIAR, 2008; tivas de como as Lutas podem ser tratadas
ALMEIDA, 2012; NASCIMENTO, 2008; na escola. Agora, convém perguntar: o que
NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007), nem é Luta? De acordo com a definição adotada
mesmo afirmar que o professor precisa ser para o estudo é uma
V. 27, n° 45, setembro/2015 267

Prática corporal imprevisível, caracteri- difícil distinguir cada uma dessas


zada por determinado estado de conta- ações.
to, que possibilita a duas ou mais pesso-
as se enfrentarem numa constante troca
• Imprevisibilidade – devido à rela-
de ações ofensivas e/ou defensivas, re- ção de interdependência entre os
gida por regras, com o objetivo mútuo lutadores e as possibilidades de
sobre um alvo móvel personificado no ação que se colocam no combate,
oponente (GOMES, 2008, p. 49, grifos
do autor).
não é possível definir modelos se-
quenciais previsíveis, ou seja, ha-
verá diversas situações diferencia-
O conceito é claro e define o que é
das às quais os lutadores devem se
e o que não é Luta, entretanto, o tratamento
adaptar para resolver os problemas
didático não precisa se fundamentar numa
encontrados.
modalidade que compreenda todas as ca-
• Regras – regulam as condutas ne-
racterísticas elencadas. Pode-se abordar, por
cessárias à realização do jogo, ou
exemplo, um ou mais dos princípios condi-
seja, definem o que é permitido ou
cionais elencados, pode apoiar-se ao tipo
não, quais técnicas e táticas podem
de contato ou distância utilizado entre os
ser usadas pelos oponentes.
oponentes, tratar sobre as formas ou ainda
em modelos pedagógicos comuns à Educa-
Gomes (2008) aponta que, mesmo
ção Física, pautados na parcialização dos
com os princípios condicionais, existem
movimentos ou na interação entre pessoas,
elementos que distinguem cada modalidade
materiais e ambientes (ALMEIDA, 2012).
de luta das demais, contudo, algumas dinâ-
Os princípios condicionais são as
micas de funcionamento da modalidade,
características comuns presentes nas Lutas
bem como algumas de suas técnicas são
capazes de defini-las como tal. Gomes
semelhantes a outras modalidades. Pensan-
(2008) e Gomes et al. (2008) apresentam:
do nisso, as Lutas podem ser classificadas
em grupos, sejam por tipo de contato ou
• Oponente/alvo – personificado no distância empregada pelos oponentes. Em
adversário, que implica reconhecer relação ao tipo de contato, utilizando a
o mesmo como alvo móvel e que categorização de Espartero (1999), Gomes
pode executar ações ofensivas. (2008) apresenta:
• Contato proposital – as pessoas se
“tocam” podendo para isso utilizar • Luta com agarre – envolve ações
diferentes formas (socos, chutes, to- de derrubar, desequilibrar, proje-
ques com implementos, etc.) a fim tar, etc.;
de chegar aos objetivos predefini- • Luta com golpe – envolve golpes
dos no embate. impactantes com diferentes partes
• Fusão ataque/defesa – assim como do corpo de forma isolada ou com-
em outros jogos, existem nos com- binada, por exemplo, socar, coto-
bates momentos de ataque e de- velar, chutar, etc.;
fesa, com a possibilidade dessas • Luta com implemento – envolve o
ações serem simultâneas, sendo até toque no corpo do adversário por
268

meio de implemento, por exemplo, As experiências didáticas propostas


a esgrima. neste trabalho procuraram aprofundar as
experiências do se-movimentar5 nas Lu-
Com relação à distância entre os tas a partir dos princípios condicionais e
adversários, Gomes (2008, p. 47) classifica: das classificações por tipo e/ou distância,
priorizando o trabalho com os jogos de
• Curta – “[...] possui um espaço pra- luta, pois, provavelmente, são os primeiros
ticamente nulo entre os oponentes contatos de muitos alunos com o conteúdo.
[...] para a realização das técnicas Estes modelos adaptados – arranjos ma-
[...]”; teriais – apresentados por meio de jogos
• Média – “[...] seria um espaço mo- parecem relevantes para a vivência de uma
derado que permite a aproximação prática da Luta no contexto escolar, pois são
em situações de ataque entre os formas não esportivizadas que levam em
oponentes [...]”; consideração as lógicas internas da moda-
• Longa distância – “[...] definida lidade sem descartar o seu aspecto lúdico
pela presença de um implemento, e a preocupação com a aprendizagem dos
deve haver uma distância maior en- alunos (GOMES, 2008; GOMES et al., 2013;
tre os oponentes para que os mes- RUFINO; DARIDO, 2012).
mos possam manipular de forma Convém ressaltar ainda que na
adequada esse implemento [...]”. prática do jogo estão inseridos momentos
de tensão e alegria, sensações permitidas
Gomes (2008) e Gomes et al. (2008) às pessoas que se entregam à atividade to-
ainda apontam um ramo denominado For- talmente, como estabelece Huizinga6. Sem
mas (Katas) que não se enquadra nessas contar outras características que podem ser
classificações e definições, pois “[...] não inseridas no jogo como a cooperação – na
possuem os mesmos objetivos e lógica tomada de decisões coletivas; inclusão e
interna inerentes às Lutas, já que podem respeito às diferenças – há a necessidade
ser ensaiados como uma coreografia” do outro para jogar contra, é necessário
(GOMES, 2008, p. 49). Apesar disso, não aceitá-lo a partir de suas potencialidades
podem ser descartadas, pois podem ser um para desenvolver a tarefa; o exercício da
elemento para apropriação de habilidades criatividade – podem ser ressaltadas as
fundamentais de uma luta, desde que seja soluções encontradas para resolver o pro-
respeitado o se-movimentar, ou seja, não blema de alguma maneira, e a valorização
seja um modelo repetitivo e burocrático do processo – pelo entendimento que todos
(ALMEIDA, 2012; KUNZ, 2006). possuem papel importante na atividade

5 Para Elenor Kunz, a pessoa estabelece relações de sentido e significado com o movimento e consequentemente
com mundo, logo o “se-movimentar” representa uma experiência subjetiva, que vai além de um movimento
que considera apenas os aspectos de natureza física (compreendido apenas pelas leis da Física, por exemplo),
para considerá-lo como “[...] meio e precondição para as experiências humanas mais ricas e variadas” (KUNZ,
2006, p. 20).
6 “[...] o jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de
tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim
em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente
da ‘vida quotidiana’” (HUIZINGA, 2008, p. 33).
V. 27, n° 45, setembro/2015 269

(tanto na vitória ou derrota), pois uma série 14 aulas para desenvolver o tema entre
de ações é executada para se chegar aos Agosto e Setembro de 2013.
objetivos almejados (DAOLIO, 2012). O Percurso de Aprendizagem foi
organizado em quatro Situações de Apren-
dizagem (Quadro 1): Mapeamento, Princí-
Percurso de aprendizagem pios Condicionais, Classificações da Luta
e Revisão. Nem todas as aulas aplicadas
O percurso apresentado faz parte serão analisadas neste texto de forma mi-
do trabalho desenvolvido pelo autor com nuciosa, no entanto, os fenômenos mais
alunos do sexto ano do ensino fundamental significativos serão apreciados com mais
de uma escola da rede estadual paulista, profundidade para situar o leitor sobre as
localizada na zona norte da cidade de São repercussões do seu desenvolvimento em
Paulo, cujo bairro possui característica resi- consonância com os objetivos almejados.
dencial e atende uma população com baixas Convém ressaltar que o presente
condições socioeconômicas. A maioria dos Percurso de Aprendizagem contempla os
alunos é residente no bairro e em outros conteúdos para as séries iniciais do ensino
vizinhos à escola. fundamental proposto por Gomes et al.
As aulas foram aplicadas para as (2013) em sua revisão de literatura, mesmo
dez turmas de sexto ano, contudo foi se- ano em que o Trabalho de Conclusão de
lecionada uma turma para a produção do Curso que motivou este estudo foi defen-
estudo com as seguintes características: dido (LOPES, 2013). Essa coincidência
assiduidade, número adequado de alunos demonstra a urgência em se incluir essa
(24 alunos frequentes) e com composição temática na Educação Física escolar, visto
equilibrada entre meninos e meninas, cujas a escassez de trabalhos relacionados às
idades variavam entre onze e doze anos. Lutas na escola e tendo poucos referenciais
Salienta-se ainda que essa turma teria mais teóricos sobre o tema que servem de base
aulas previstas no bimestre, visto poucos para as práticas pedagógicas.
feriados, reuniões escolares etc., totalizando

Quadro 1 – Situações de Aprendizagem e seus Conteúdos

2. Princípios
1. Mapeamento 3. Classificações da Luta 4. Revisão
Condicionais
Jogos de luta: Princípios Classificações da Luta. O que é Luta
- Arranca Fita em condicionais. (definição)?
grupo/dupla; Jogos de luta:
- Rouba Bandeira; Jogos de luta: - Imóvel; Percurso
- Ameba. - Luta de Cobra; - Luta com Balões; histórico da Luta.
- Luta de Braço; - Esgrima.
Roda de conversa: - Luta com Bola; Princípios
- O que é Luta - Empurra-empurra; condicionais.
(definição)? - Arranca Fita em
- Percurso histórico duplas; Classificações
da Luta. - Cabo de Guerra. da Luta.
270

Relato da experiência bem como os ataques realizados chegavam


a tocar o adversário. Ao que tange ao gesto
No Mapeamento, buscava-se que motor, ao final da aula, os alunos deixavam
os alunos: (1) reconhecessem as Lutas nas as costas menos expostas para as investidas
práticas abordadas; (2) vivenciassem e dos adversários; tentavam ludibriar, por
classificassem as atividades propostas; (3) meio de fintas, as investidas nos coletes dos
compreendessem o processo histórico das colegas; mantinham a perna oposta a do
Lutas; (4) elaborassem opiniões frente aos colete à frente, resguardando o material; se
diferentes conhecimentos socializados. deslocavam em passos alternados, manten-
Nas primeiras aulas desta etapa, do a base equilibrada, tanto para a investida
quando foi apresentado o cronograma de quanto para a defesa, etc. Cabe lembrar que
atividades e o conteúdo, vários discursos estas ações motoras muito se relacionam as
contrários ao tema ecoaram, mas um em razões do fazer, como defende Garganta
especial se destacou: “Professor, nós vamos (1995) citado por Daolio (2012), para o
brigar nas aulas?”. Ou seja, evidenciou-se a ensino do jogo, haja vista que compõem
necessidade de desconstruir os significados a estratégia para resolver corporalmente as
negativos atribuídos à prática e construir situações-problemas encontradas.
outros mais positivos. Já com a “Roda de Conversa”,
O tema iniciou com a vivencia de atrelada ao percurso histórico das Lutas,
jogos7 como o “Arranca Fita” em grupo e em algumas de suas representações na Contem-
duplas, o “Rouba Bandeira” e o “Ameba” poraneidade e as práticas vivenciadas até o
– mesmo que tais práticas não possam ser momento, ensaiou-se um estudo mais apro-
definidas como Lutas –, pois auxiliam na fundado da prática, a desvelar, por exemplo,
compreensão das ações que caracterizam as características que permitem distinguir a
a manifestação corporal, como as situações Luta da briga (GOMES et al., 2013).
de ataque e defesa simultâneas. Durante a A partir das seguintes perguntas:
realização dos jogos percebia-se, nas ex- “O que é Luta para você?”, “Quais Lutas
pressões corporais manifestadas, momentos você conhece?”, “Das atividades realiza-
de tensão e alegria (HUIZINGA, 2008), com das anteriormente, quais eram Lutas? Por
a maioria da turma participando ativamente. quê?”, verificou-se que os alunos conheciam
Cabe destacar o “Arranca Fita” em diversas modalidades de luta, no entanto,
duplas, pois os alunos perceberam sua não sabiam defini-la. Merece destaque os
aproximação ao conceito de Luta quando inúmeros relatos referentes ao UFC, como
disputavam entre si, em um espaço deli- os lutadores mais conhecidos, as roupas
mitado em comum acordo e cujo o correr utilizadas, as modalidades que compõem
era impedido para fugir das investidas. o evento e até mesmo a prática delas em
Entre os relatos dos participantes, ouvia-se academias da região. Tais indicadores
a necessidade de se esquivar dos ataques, levam a crer que a presença massiva da

7 Não serão descritos todos os jogos utilizados, haja vista que muitos deles estão presentes nos cotidianos
escolares, mas eles podem ser encontrados no projeto Mapa do Brincar do jornal Folha de S.Paulo, disponível
em: <http://mapadobrincar.folha.com.br>. Acesso em 18 abr. 2015.
V. 27, n° 45, setembro/2015 271

Mídia exerce influências significativas na Luta desde seus primórdios até a atualidade,
vida das pessoas, reiterando um discurso além do seu conceito adotado neste traba-
hegemônico e criando novos produtos para lho. A partir disso, a diferenciação entre
o consumo (AMARAL, 2012). Luta e briga foi ressaltada, haja vista que
Quando foram solicitados a olhar a manifestação corporal apresenta regras
para as práticas vivenciadas, os alunos nota- bem definidas e o respeito mútuo entre os
ram que o “Arranca Fita”, nas duas versões, adversários.
eram mais próximos ao conceito de Luta do Por fim, como forma de avaliação
que os demais jogos, ainda mais o realizado e registro das aprendizagens, foram apre-
em duplas. Quanto ao “Ameba” e ao “Rou- sentados vídeos (Quadro 2) com diferentes
ba Bandeira”, falaram que não eram Lutas, práticas corporais e os alunos tiveram que
pois não tinha contato físico ou era mínimo. elaborar um quadro síntese identificando as
Após a “Roda de conversa” foi apre- práticas que podem ser consideradas Lutas
sentado um percurso histórico situando a a partir do que foi visto nas aulas.

Quadro 2 – Vídeos apresentados aos alunos para classificação

“Jogo de puxar o bastão”. Disponível em:


<http://www.youtube.com/watch?v=s-KvqDfZxgg&feature=related>. Acesso em: 12 abr. 2015;
“Cabo de guerra”. Disponível em:
<http://www.youtube.com/watch?v=NgcxK4g7uSM>. Acesso em: 12 abr. 2015;
“Capoeira Angola”. Disponível em:
<http://www.youtube.com/watch?v=DgwJ9fdueuU>. Acesso em: 12 abr. 2015;
“Judô”. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=mzUjkMBCDO0>. Acesso em: 12 abr. 2015;
“Queimada”. Disponível em:
<http://www.youtube.com/watch?v=Bf5VySfY3pQ&feature=related>. Acesso em: 12 abr. 2015;
“Futebol”. Disponível em:
<http://www.youtube.com/watch?v=dkUbAsSgsPk>. Acesso em: 12 abr. 2015.

A análise dos vídeos diagnosticou e não situaram quando eles estavam presen-
articulou os saberes trabalhados até o mo- tes nos vídeos que apresentavam Lutas ou
mento. Os alunos deveriam se concentrar brigas. Dentre as habilidades e capacidades
em classificar aqueles que eram Lutas; quais apontaram: velocidade, força, agilidade,
comportamentos dos lutadores poderiam socos, chutes, rasteiras, derrubar, ginga,
ser observados; quais as principais habili- equilíbrio, correr e puxar; o que demonstra
dades empregadas; quais regras estavam o conhecimento das ações necessárias à prá-
presentes; enfim, deveriam refletir se “é tica. Sobre as regras, devido a diversidade
possível vivenciar as Lutas na escola?”.
de práticas apresentadas, não foi possível
A maioria dos alunos identificou as
estabelecer uma análise mais precisa, haja
práticas concernentes às Lutas. Quanto aos
vista que eles poderiam citar qualquer uma
comportamentos, eles citaram a agressivida-
e suas peculiaridades.
de, o respeito, a violência, a raiva etc., mas
272

Por fim, sobre a possibilidade de encontrada. Vale destacar que eles não só
vivenciar as Lutas na escola, não foi encon- alteraram as duplas entre seus pares de mes-
trada nenhuma resposta negativa, principal- mo sexo, mas também para menino-menina,
mente ao observar os relatos das primeiras o que demonstra um avanço no aspecto de
aulas, que indicavam a preocupação em se aceitação e respeito visto que as diferenças
conhecer o conteúdo. Várias podem ser as costumam marcar as atividades em que
hipóteses, mas acreditamos que os jogos predomina a “força”, tida como masculina.
parecidos com as Lutas tenham levado a Já na “Luta com bolas”, cada dupla
compreensão que a mesma não precisa ser estava sentada, um de frente para o outro,
idêntica ao modelo oficial; que as Lutas de modo que as solas dos pés se encontrem
tem regras e as brigas não, caracterizan- e segurando uma bola ao mesmo tempo.
do esta última como um comportamento Vencia aquele que conseguia tomar a posse
inadequado ao ambiente escolar e social do material. Foi observado que eles gosta-
como um todo. ram da atividade, mas depois de duas/três
Já a situação de aprendizagem realizações, e mesmo trocando as duplas,
Princípios Condicionais procurava que eles perderam um pouco a motivação em
os alunos (1) vivenciassem elementos que realizá-la: alguns foram arremessar a bola à
compõem as Lutas, a partir de formas adap- cesta e outros propuseram uma nova forma
tadas; (2) compreendessem e articulassem de execução: em trios. Nesta, em vez de
as vivências aos princípios condicionais ter duas pessoas disputando a posse de
das Lutas. Foram desenvolvidos jogos que bola, haviam três, o que tornou o jogo mais
priorizavam ao menos um dos princípios divertido e emocionante, pois havia forças
condicionais: a “Luta de Cobra” prioriza atuantes em três direções contrárias; nesse
o princípio condicional alvo/oponente; o momento, até quem estava arremessando
“Braço de ferro” e o “Empurra-Empurra”8, retornou a tarefa.
o contato proposital; a “Luta com bolas”, A “Luta de Cobra” foi realizada em
a fusão ataque/defesa; o “Arranca Fita” e dupla, frente a frente, em posição do exer-
o “Cabo de Guerra”, a imprevisibilidade. cício de “flexão de braços” ou seis apoios
No “Braço de ferro”, eles voltaram (joelhos no chão), com o objetivo de tirar o
a vivenciar uma atividade que brincam equilíbrio do colega puxando o antebraço
costumeiramente na escola e que podem do colega e tomando cuidado para não cair;
demonstrar sua “força”, o que representa o aluno que tocava o abdômen no chão
a dimensão lúdica e competitiva do jogo. perdia. Com certeza foi a atividade que
Foi orientado que eles trocassem de duplas, eles mais gostaram, haja vista a expressão
para que verificassem os níveis de dificul- corporal deles e as falas, eles estavam se
dades com cada um dos adversários, o que divertindo nas situações que envolviam
gerou nova resposta a situação-problema possibilidade de derrubar e ser derrubado.

8 “Empurra-empurra”. Em duplas, com os alunos de frente um para o outro e com os braços estendidos e mãos
apoiadas nos ombros do colega, o objetivo é mover o oponente do lugar, isto é, fazer com que ele ultrapasse
uma marcação definida.
V. 27, n° 45, setembro/2015 273

Várias foram às técnicas corporais que eles razões do fazer (porque fazer assim e não
utilizaram para desenvolver a tarefa: pernas de outra maneira). Destarte, não se procu-
mais juntas, mais afastadas; com o corpo rou desempenhar o gesto técnico perfeito
mais próximo ou distante dos adversários; para as atividades em questão, mas sim o
corpo mais ou menos arqueado, etc. Ou processo de experimentação, pois várias
seja, a situação-problema suscitou inúmeras respostas foram adequadas para as situações
respostas que levaram a diversas experi- encontradas (MOREIRA; NISTA-PICCOLO,
mentações do se-movimentar (BETTI, 2011; 2009; FERREIRA et al., 2010).
KUNZ, 2006; TREBELS, 2006). Já as Classificações da Luta pro-
Ao término das vivências, abriu-se punham que os alunos: (1) vivenciassem
uma roda de conversa para socializar as elementos que compõem as Lutas, a partir
sensações experimentadas, as respostas de formas adaptadas; (2) compreendessem
encontradas para resolver corporalmente e associassem as vivências às classificações
os problemas, bem como se conseguiram das Lutas (distância e/ou contato). Assim,
detectar os princípios priorizados. Vale foram ensinadas as classificações das Lutas
(aula expositiva) atrelada à análise das
ressaltar que o princípio condicional regras
experiências e uma atividade de identifica-
foi enfatizado em todas as práticas, pois elas
ção dessas classificações em modalidades
regulam as ações que são executadas (o que
oficiais. No que tange as experiências do
é válido ou não), definem o vencedor, entre
se-movimentar, foram desenvolvidos os
outras coisas. Para solidificar a aprendiza-
seguintes jogos: “Luta com Balões”, classifi-
gem dos princípios condicionais foi propos-
cado como Luta de média distância ou Luta
ta uma síntese dos mesmos articulando-os
com golpe; “Imóvel”, classificado como
às práticas vivenciadas anteriormente. Para Luta de curta distância ou Luta com agarre,
finalizar, os alunos registraram em forma de e a Esgrima, Luta de longa distância ou Luta
desenho um dos princípios condicionais com implemento. Nessas atividades foram
aprendidos resgatando uma experiência proporcionadas oportunidades para que os
anterior, uma luta que tenham visto na TV, alunos percebessem porque certas ações de
uma criação pessoal, etc. movimento estão mais associadas a um tipo
Referente às aprendizagens, os de luta do que outro, logo, que consigam
alunos ampliaram o entendimento sobre lançar mão de suas experiências pessoais
as Lutas e foram capazes de diagnosticar e criativas para responder as situações-
alguns elementos que nela estão presentes, -problemas criadas de forma diferenciada.
que se assemelham aos princípios condi- A “Luta com Balões” consistia na
cionais estudados (GOMES, 2008; GOMES realização de golpes com o objetivo de
et al., 2008). acertar uma das bexigas presas ao corpo
Também foi muito interessante as do colega. Cada um da dupla tinha uma
respostas encontradas no plano motor para bexiga presa ao braço e outra a perna. Ficou
cada uma das situações em que eles experi- combinado que um golpe que entrasse em
mentaram diferentes formas de fazer e testar contato direto com o corpo do colega seria
aquilo que mais se adequava a cada uma punido com um ponto para o atingido – os
delas, o que revela entendimento do como alunos regularam as regras e as pontuações
fazer (movimento, propriamente dito) e das do combate.
274

A maioria se divertiu bastante com a mesclavam tensão, alegria, espanto, força,


proposta de atingir a bexiga do colega. Nos concentração etc.
combates, os defensores tentavam manter o No jogo os atacantes começavam
máximo possível de distância do adversário; com uma boa vantagem, haja vista que o
também mantinham a perna oposta a da peso do seu corpo sobre o do outro difi-
bexiga à frente, ou seja, deixava o corpo cultava o deslocamento do colega. Além
entre a bexiga e o adversário, resguardando disso, depois de algumas execuções, os
com mais eficiência o implemento. Os de- atacantes não mais deixavam as mãos e os
fensores se utilizavam de giros para escapar braços apenas apoiados no chão, eles a uti-
de golpes que vinham da lateral, geralmente lizavam trançando a cintura dos colegas ou
socos. Já os atacantes, para romper com esta segurando as pernas e/ou braços evitando
estrutura defensiva, realizavam pequenas ao máximo que eles conseguissem escapar
corridas de aproximação para encurtar da imobilização.
a distância e para deslocar um pouco a Os defensores conseguiam êxito
proteção (fazer o colega se movimentar), num momento de falha do atacante, que
nesses momentos investiam ações que deixava um vão entre o seu corpo e do
mesclavam socos e chutes e, geralmente, defensor, por onde este conseguia escapar
saíam exitosos. com muita facilidade. Outra forma utilizada
Já no “Imóvel”, o defensor começou para fugir era quando conseguiam realizar
deitado, em decúbito dorsal no tapete de a inversão do decúbito, passando do dorsal
EVA, enquanto o atacante ficou em seis para o ventral; ao chegar nesta posição
apoios, com o tronco passando por cima o defensor fazia força com os braços e
da barriga do colega e as mãos apoiadas pernas, suspendendo o atacante e fugindo
no chão e, somente após o sinal, o atacante dele. Outra forma menos frequente foi
poderia se aproximar (abaixar o tronco e quando conseguia empurrar o colega na
braços) do defensor efetuando a imobili- região peitoral, se afastando o suficiente
zação por cinco segundos para ganhar ao para fugir dele.
combate. Em ambas as atividades, tanto por
As duplas foram formadas de acor- parte dos defensores como dos atacantes,
do com os interesses dos alunos, sem se verificou-se diferentes respostas para a
preocupar com o equilíbrio de força, peso, resolução dos problemas encontrados e,
altura etc. que poderiam interferir na rea- em muitos casos, as “técnicas” de ataque e
lização do jogo; acreditamos que foi uma defesa utilizadas se aproximavam àquelas
decisão acertada, pois eles puderam testar preconizadas nas Lutas (ALMEIDA, 2012),
a atividade com diferentes colegas e notar sejam elas de curta ou média distância (GO-
as diferentes solicitações exigidas por cada MES, 2008; GOMES et al., 2008).
uma das situações-problemas. Apesar da maioria dos alunos ter
Igualmente a outra, a maioria estava participado, em alguns momentos notou-se
alegre na realização desta atividade, tanto alunos sem o envolvimento desejado,
no momento em que a realizava, quanto na pareciam que não estavam à vontade em
visualização da luta exercida pelos colegas. executá-las, mas quando questionados, eles
Percebia-se diferentes expressões faciais que respondiam que não estavam gostando das
V. 27, n° 45, setembro/2015 275

atividades; acreditamos que vai além disso, priorizado o aspecto criativo (DAOLIO,
pois estas atividades sugerem ações bem 2012) para resolver corporalmente os pro-
diferentes daquelas que costumam realizar blemas encontrados, tanto é que alguns
e talvez o aspecto da vergonha tenha gerado alunos chegavam à vitória sem infringir
isto, especialmente, com as meninas. nenhuma das regras ou executar os movi-
Quanto à “Esgrima”9, em uma aula mentos ensinados.
foi apresentada as regras e movimentos bá- Como síntese, os alunos relembra-
sicos da modalidade e em outra os alunos ram as experiências e aprendizagens ao
registrar num questionário, que continha
construíram a espada com jornal10. Com o
fotos com diferentes modalidades de luta,
material produzido, os alunos ficaram de
suas classificações por tipo de contato e/
frente um para o outro, mas sem nenhu-
ou distância.
ma demarcação que lembrasse a Esgrima Por fim, a Revisão buscou consoli-
oficial, e tentaram a execução dos golpes dar os objetivos almejados nas situações de
vistos nos vídeos anteriormente. Foi refor- aprendizagens anteriores. Esta etapa contou
çado que o objetivo era tocar a ponta da com uma “Avaliação Bimestral” que faz
espada no corpo do colega (região peitoral e parte do calendário escolar e reúne todos
abdômen), tomando cuidado com os olhos os componentes curriculares, cada qual
e região genital. contribuindo com três questões sobre os
Durante a prática, os alunos iam estudos realizados. Para finalizar, foi reali-
com vontade para o ataque e se descuida- zada uma breve incursão sobre os assuntos
vam do aspecto defensivo, assim, aqueles vistos durante o bimestre, relembrando as
que tinham um pouco mais de percepção experiências obtidas nas aulas e percepções
deste fator e conseguiam se livrar da in- obtidas na avaliação aplicada anteriormen-
vestida inicial, realizavam o contragolpe te, bem como esclarecer dúvidas ou equí-
vocos que os alunos apresentaram sobre
com eficiência. Em algumas execuções foi
a manifestação cultural Luta. Nessa aula
possível observar que eles tentavam seguir
também foi realizado um registro em que
a posição de guarda indicada e com isso
os alunos anotaram aquilo que aprenderam
levavam vantagem, pois a movimentação no bimestre; recurso interessante para que
permitia um recuo e um ataque mais equi- o professor conheça como os alunos se
librado. Tal fator foi potencializado quando veem em relação aos saberes construídos
eles executavam o afundo com a perna cor- e a efetividade do seu trabalho.
respondente ao lado do corpo que segurava
a espada, ampliando o alcance.
Mais uma vez não foi exigido que CONSIDERAÇÕES FINAIS
eles seguissem exatamente as técnicas,
mesmo sabendo que elas ajudariam em um Esta experiência apresentou ca-
melhor desenvolvimento do jogo. Tanto minhos para levar o conteúdo Lutas para
nesta quanto nas outras atividades foi dentro da escola, conteúdo clássico da

9 “Esgrima”, disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=mQXt2klTtqc>. Acesso em: 12 abr. 2015.


10 “Espada de jornal”, disponível em: <http://blogs.estadao.com.br/estadinho/2012/10/06/espada-de-jornal/>.
Acesso em: 12 abr. 2015.
276

Cultura de Movimento que está ausente Tudo isso leva à reflexão que a in-
nesse contexto, mesmo sendo uma prática serção de um “conteúdo novo” na escola
que acompanha os seres humanos ao longo passa primeiro pela mudança de atitude do
dos tempos, ou seja, que diz respeito aos professor, que exige a aceitação dos desafios
modos de vida das pessoas e da socie- e novas formas de pensar e atuar na Edu-
dade em diferentes momentos históricos cação Física escolar, ao compreender que
(RUFINO; DARIDO, 2012). Assim, foram toda a manifestação corporal tem espaço na
considerados os estudos empreendidos por escola, inclusive as Lutas, cujo tratamento
Almeida (2012), Gomes (2008) e Gomes didático ainda é incipiente. Destarte, a
et al. (2008) ao conceituar a Luta enquanto forma como foi organizado o trabalho não
manifestação corporal, os princípios con- apontou para a necessidade de o professor
dicionais subjacentes, suas classificações ser especialista em alguma modalidade de
por tipo de contato e/ou distância e suas luta para poder ensiná-la, bem como foram
possibilidades de inserção na escola, além abertas possibilidades de diálogo com os
das ideias de Daolio (2012), ao lançar mão alunos para discutir sobre a questão da
do jogo como elemento para chegar às violência, que pode aparecer nas diferentes
práticas corporais, não só nas Lutas. Com
vivências planejadas.
isso, buscou-se evitar a manifestação de
Acentua-se que este trabalho tam-
comportamentos violentos durante as aulas.
bém obteve sustentação em Gomes et al.
Devem ser destacadas também
(2013), pois houve convergência com
as aprendizagens de gestos motores, que
a proposta de ensino das dimensões do
versavam sobre o saber fazer e as razões
conteúdo, ainda que no estudo de revisão
do fazer por meio de jogos de lutas, nas
de literatura proposto por Gomes et al.
quais em diferentes situações-problema
(2013) sejam enfatizadas as Lutas nas séries
encontradas os alunos utilizavam-se de di-
iniciais do ensino fundamental. Em ambas
ferentes saberes corporais para resolvê-las,
as propostas verificou-se as três dimensões associadas aos princípios condicionais da
do conteúdo frisadas por Rufino e Darido Luta ou suas classificações a partir do tipo
(2012) ao proporem uma pedagogia dos de contato ou distância empregados pelos
esportes às Lutas. São exemplos do concei- oponentes durante a prática.
tual: ao trabalhar com os aspectos históricos Estes resultados se tornam ainda
das Lutas; procedimental: a aprendizagem mais instigantes ao observamos a recepção
do saber fazer corporal preconizado nas do conteúdo por parte dos alunos, em
situações propostas nos diferentes jogos; que este não foi bem visto num primeiro
atitudinal: ao desmitificar os comporta- momento, mas com sua ressignificação ao
mentos violentos associados às Lutas. Vale longo das aulas foi possível verificar que
ressaltar ainda, que tais conteúdos devem eles gostaram: quantas vezes os alunos não
estar em consonância com os objetivos foram vistos brincando de “lutinha”, por
almejados, bem como com as estratégias exemplo, ao chegar instantes antes da aula.
e métodos de ensino e sua consequente Outras preocupações que não foram
avaliação (GOMES et al., 2013; RUFINO; discutidas com a profundidade merecida
DARIDO. 2012). neste texto, mas que podem ser campos
V. 27, n° 45, setembro/2015 277

importantes para estudos futuros apontam ALMEIDA, José J. G. Disciplina: luta. Curso
para a articulação das Lutas com os dife- de Pós-Graduação. SÃO PAULO (Estado):
rentes Eixos Temáticos preconizados no RedeFor; Campinas: Unicamp, 2012.
CEF-SP, como as Mídias, Lazer e Trabalho AMARAL, Sílvia. C. F. Disciplina: eixos
e/ou com Corpo, Saúde e Beleza; Contem- temáticos para o ensino médio:
poraneidade (questões relativas ao gênero, mídias; lazer e trabalho. Curso de
por exemplo), bem como temas referentes Pós-Graduação. SÃO PAULO (Estado):
ao paradigma da Inclusão que perpassam a RedeFor; Campinas: Unicamp, 2012.
escola contemporânea. BETTI, Mauro. Disciplina: concepção da
Enfim, as aulas de Educação Física disciplina educação física na proposta
são um tempo e espaço adequado para curricular. Curso de Pós-Graduação.
a construção de ideias que objetivam SÃO PAULO (Estado): Redefor;
o aprofundamento das experiências do Campinas: Unicamp, 2011.
se-movimentar, no caso, (res)significar as BRASIL. Secretaria de Educação
Lutas em toda a sua complexidade. Mas é Fundamental. Parâmetros curriculares
necessário que as visões sobre os objetivos, nacionais: educação física. Secretaria de
sobre os conteúdos e sobre os procedi- Educação Fundamental. Brasília: MEC /
mentos didáticos se modifiquem, a fim de SEF, 1998.
atender as atuais exigências, que não mais BREDA, Mauro et al. Pedagogia do esporte
se traduzem na repetição de movimentos. aplicada às lutas. São Paulo: Phorte, 2010.
Assim, apresentou-se uma proposta em DAOLIO, Jocimar. Educação física e o
que a experiência lúdica da Luta na escola conceito de cultura. 2. ed. Campinas:
é possível, bem como um tratamento mais Autores Associados, 2007.
aprofundado pode levar a compreensão que DAOLIO, Jocimar. Disciplina: do jogo
esta pode representar um povo, seus costu- ao esporte coletivo. Curso de Pós-
mes, etc., que pode ser contextualizada com Graduação. SÃO PAULO (Estado):
a realidade de cada um, promovendo uma RedeFor; Campinas: Unicamp, 2012.
apropriação crítica, autônoma e criativa, le- DEL VECCHIO, Fabrício. B.; FRANCHINI,
vando o aluno a utilizá-la nos mais diversos Emerson. Lutas, artes marciais e
espaços, além daqueles estabelecidos pelos esportes de combate: possibilidades,
muros da escola. experiências e abordagens no currículo
da Educação Física. In: SOUZA NETO,
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REFERÊNCIAS profissional em educação física: estudos
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278

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V. 27, n° 45, setembro/2015 279

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na escola: da negação radical à tensão 3, n. 5, p. 4-17, ago./dez. 1996.
permanente - um diálogo com Valter

TEACHING OF MARTIAL ARTS IN SCHOOL PHYSICAL EDUCATION: an experience


in basic education

ABSTRACT

Brazilian Physical Education is controversial regarding to its contents: while claiming for
several possibilities of themes in one hand, we note that in another hand those which
are present in daily lessons are portraits of the area in past decades. The study aims to
report possibilities for inclusion of Martial Arts’ themes in Physical Education classes for
students from the sixth grade in elementary school using games. We proposed a path
with four learning situations in which we have sought to understand and experiment
the conditional principles of Martial Arts and their classifications by type of contact
and distance. It highlights the learning that allowed the interconnection between the
know-how and the reasons the making of different problem situations. Furthermore,
this essay breaks with some recurring paradigms, such as the issue of violence or the
need to be an expert in Martial Arts to address them.

Keywords: Movement Culture; School Physical Education; Martial Arts

ENSEÑANZA DE LAS LUCHAS EN EDUCACIÓN FÍSICA EN LA ESCUELA: UNA EXPE-


RIENCIA EN LA EDUCACIÓN BÁSICA

RESUMEN

La Educación Física brasileña presenta controversia en cuanto a su contenido: mientras


afirma haber varias posibilidades para la tematización, observamos que las que se
presentan en las clases diarias son fotografías de la área en las últimas décadas. El
estudio tiene como objetivo describir las posibilidades de inclusión de las Luchas en
clases de Educación Física para los estudiantes del sexto grado de la escuela primaria a
partir de los juegos. Proponemos una ruta con cuatro situaciones de aprendizaje en que
tratamos de comprender y experimentar los principios condicionales de las Luchas y sus
clasificaciones por tipo de contacto y distancia. Destacamos el aprendizaje que permite
la interconexión entre el conocimiento y las razones para hacer diferentes situaciones-
problema. Por otra parte, este ensayo rompe con algunos paradigmas recurrentes, como
la cuestión de la violencia y la necesidad de ser un experto en Luchas para enseñar.

Palabras clave: Cultura del Movimiento; Educación Física en la Escuela; Lucha

Aprovado em: março/2015


Recebido em: julho/2015
DOI: 10.4025/reveducfis.v26i4.26441  

ARTIGOS ORIGINAIS

O ENSINO DAS LUTAS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA: ANÁLISE DA


PRÁTICA PEDAGÓGICA À LUZ DE ESPECIALISTAS

THE TEACHING OF FIGHTS IN PHYSICAL EDUCATION CLASSES: ANALYZE OF


PEDAGOGICAL PRACTICE IN THE LIGHT OF EXPERTS

Luiz Gustavo Bonatto Rufino ∗

Suraya Cristina Darido ∗∗

RESUMO
Objetivou-se analisar as opiniões de docentes universitários especialistas no tema das lutas sobre a prática pedagógica nas
aulas de Educação Física na escola, propondo implicações para o desenvolvimento dos contextos de formação de professores.
A amostra foi constituída por 5 professores selecionados de modo intencional que participaram de entrevistas
semiestruturadas a partir de um roteiro previamente construído. A análise dos dados foi realizada por meio da técnica da
análise de conteúdo, culminando com a inferência de duas categorias: 1) fatores restritivos, a qual buscou analisar os
principais elementos de dificuldade no que corresponde ao desenvolvimento das lutas na escola; 2) possibilidades, a qual
representou propostas de edificação das lutas frente às demandas sociais atuais. Conclui-se que a prática pedagógica das lutas
na escola apresenta alguns dilemas oriundos da forma como elas são desenvolvidas no âmbito da formação, indicando a
necessidade de alterações que possam valorizá-las como manifestações da cultura corporal.
Palavras-chave: Capacitação Profissional. Ensino. Artes Marciais.

INTRODUÇÃO curricular (BRACHT, 2010; GONZÁLEZ;


FENSTERSEIFER, 2010; KIM; LEE; WARD,
As práticas relacionadas à esfera da cultura 2015).
corporal de movimento, dentro de suas No que corresponde ao âmbito da formação
especificidades, têm se constituído social e docente, Tardif (2012) considera que o
historicamente como os conteúdos escolares que distanciamento entre os saberes profissionais dos
devem ser ensinados durante as aulas de professores do ensino básico e os conhecimentos
Educação Física, compreendida como universitários dos docentes de ensino superior
componente curricular da educação básica provocam rupturas para a construção dos saberes
(SOARES et al., 1992). e, consequentemente, para a prática pedagógica.
Contudo, muitas vezes, o ensino de tais Estes dilemas engendram uma problemática
manifestações tem apresentado dificuldades de complexa para o quadro da formação de
tratamento pedagógico na escola. Tal fato se professores que deve estar devidamente
deve, em parte, à diversificação e ampliação de articulada com as demandas oriundas dos
práticas corporais existentes, eclodindo tanto em contextos de intervenção escolar, ou seja,
problemas aos processos formativos de novos superar a visão aplicacionista que apresenta
profissionais (CALDEIRA, 2001; KIRK, 2010) como principal armadilha a desconsideração da
quanto em dificuldades para o desenvolvimento prática como local de produção de saberes,
da prática pedagógica deste componente

*
Doutorando. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Motricidade do Instituto de Biociências, Universidade Estadual
Paulista, Rio Claro-SP, Brasil.
**
Doutora. Professora do Departamento de Educação Física. Instituto de Biociências. Universidade Estadual Paulista, Rio
Claro-SP, Brasil.

Rev. Educ. Fís/UEM, v. 26, n. 4, p. 505-518, 4. trim. 2015


506 Rufino e Darido.

desarticulando assim o processo de formação e da Educação Física deve contemplar o universo


de pesquisa sobre o ensino (TARDIF, 2012). das práticas de luta, buscando contribuir com os
No caso da Educação Física, entre as diversas objetivos de análise crítica da realidade social,
manifestações da cultura corporal de visando a formação, ampliação e enriquecimento
movimento, alguns autores apontam que as lutas cultural das pessoas.
têm suscitado dúvidas aos professores durante a Tais assertivas instigam questionamentos
prática pedagógica, seja por dificuldades de concernentes aos processos de ensino e
domínio destes conteúdos (BARROS; aprendizagem relacionados aos profissionais que
GABRIEL, 2011; CARREIRO, 2005; são formadores de professores de Educação
NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007), ou por Física escolar, ou seja, aos professores
desconhecimento e preconceito com relação a universitários responsáveis pelo ensino das lutas
estas práticas (DEL VECCHIO; FRANCHINI, no ensino superior. O ensino das lutas é
2006; JAGIETTO; DORNOWSKI, 2011; assegurado em termos de diretrizes curriculares,
RUFINO; DARIDO, 2011) ou ainda devido a mas tende a ser um conteúdo pouco abordadopor
produção acadêmica insuficiente que possa muitos cursos de formação superior na Educação
subsidiar as ações profissionais (CORREIA; Física, o que repercute em problemas para sua
FRANCHINI, 2010; RUFINO; DARIDO, 2012; efetivação no âmbito escolar.
VERTONGHEN; THEEBOOM, 2012). Nesse sentido, é necessário trazer à tona as
Para Nascimento e Almeida (2007), nas opiniões e representações de professores que
escolas, o conteúdo lutas é pouco abordado, estão diretamente envolvidos na formação de
provocando questionamentos e preocupações por professores uma vez que até o presente momento
parte dos professores. Os autores reconhecem o campo da Educação Física no Brasil tem
que alguns argumentos corriqueiramente investido pouco na compreensão da formação
utilizados para esta deficiência noensino das em lutas no ensino superior, bem como em sua
lutas – como a necessidade do professor ser relação com a prática pedagógica encontrada na
especialista em modalidades ou incitações a área da Educação Física escolar. Esse déficit de
aspectos de violência – são fatores restritivos investigações tem gerado lacunas que precisam
para a prática desse conteúdo. ser melhores compreendidas pela área da
Nesta perspectiva, Del Vecchio e Franchini Educação Física brasileira.
(2006) consideram que a dificuldade em tratar os Para direcionar o estudo, buscamos arrolar
conteúdos lutas na escola deve-se, em parte, à algumas questões problematizadoras as quais,
formação profissional em Educação Física. Para por conta do próprio quadro introdutório
esses autores, em diversos casos, os cursos de apresentado, não serão inteiramente respondidas
graduação apresentamformações deficientes em pela investigação, devido à sua complexidade.
relação a estas práticas, ora restringindo o ensino Dessa forma, podemos destacar, entre outras
a apenas uma modalidade, ora nem sequer questões: Como se dá o processo de ensino e
havendo a presença destes conteúdos nos aprendizagem das lutas no Brasil tanto nos
currículos dos cursos de formação superior, fato cursos superiores de Educação Física quanto nas
que dificulta a presença destes conteúdos na aulas de Educação Física escolar? Quais as
escola uma vez que pode limitar as intervenções principais opiniões de professores especialistas
profissionais dos professores de Educação no ensino das lutas em Instituições de Ensino
Física. Superior no que corresponde ao ensino destes
De acordo com a resolução do Conselho conteúdos na escola? Como é possível
Nacional de Educação/Câmara de Educação desenvolver a prática pedagógica da Educação
Superior nº 7 de 31 de março de 2004, que Física em relação ao trato pedagógico do
institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para conteúdo lutas a partir do contexto da formação
os cursos de graduação em Educação Física, esta de professores? Quais são os principais fatores
área de conhecimento e de intervenção tem restritivos que incidem em dificuldades para o
como objeto de estudo e de aplicação o ensino das lutas na escola? Como prover
movimento humano com foco nas mais variadas possibilidades de desenvolvimento pedagógico
formas de manifestação, tais como as lutas/artes das lutas no contexto escolar? E, finalmente:
marciais (BRASIL, 2004). Ainda para esse quais as principais implicações para o âmbito da
documento, a formação profissional no âmbito formação profissional no que corresponde ao

Rev. Educ. Fís/UEM, v. 26, n. 4, p. 505-518, 4. trim. 2015


O ensino das lutas nas aulas de educação física: análise da prática pedagógica à luz de especialistas 507

desenvolvimento de propostas alternativas para o de 42 anos e 6 meses, ±6,72). Rudio (1978)


ensino das lutas na escola? define como amostras intencionais não
Essas, entre outras questões, demonstram que probabilísticas aquelas oriundas de uma
o professor de lutas no ensino superior é, estratégia adequada, escolhendo casos para a
portanto, de fundamental importância à amostra que representem determinada população
disseminação de possibilidades pedagógicas para sob algum aspecto. Os resultados não permitem
o ensino destas práticas em ambiente escolar, a realização de generalizações para toda uma
fato que necessita de análises mais população, possibilitando analisar as
pormenorizadas por parte da literatura brasileira, características dessa determinada amostra, bem
ainda incipiente neste âmbito de estudos, como como suas implicações para o desenvolvimento
salientam Correia e Franchini (2010). das compreensões do problema de pesquisa.
Assim, o presente estudo teve como objetivo Os critérios para caracterização dos
analisar as opiniões de docentes universitários especialistas foram: 1) ser professor de lutas no
especialistas no tema das lutas sobre a prática ensino superior por um período de, no mínimo,
pedagógica deste conteúdo durante as aulas de cinco anos; 2) Ser praticante ou ter praticado
Educação Física na escola, propondo modalidade(s) de luta(s) por, pelo menos, dez
implicações para o desenvolvimento dos anos (média de tempo de prática de 22 anos e 4
contextos de formação de professores. meses, ±8,54), o que permitiu poder considerar
que estes profissionais são especialistas em um
ou mais modalidades, ou seja, apresentam
MÉTODO experiência e vivência com a prática de
modalidades de luta, assim como com o seu
Como técnica de coleta de dados utilizou-se ensino no âmbito universitário. Todos os
entrevistas semiestruturadas, as quais, de acordo especialistas ministram aulas em Instituições de
com Marconi e Lakatos (1982), objetivam a Ensino Superior (IES) localizadas no interior do
obtenção de informações diretamente dos estado de São Paulo, sendo 3 de caráter público
entrevistados. Triviños (1987) afirma que a (estadual) e 2 de caráter privado. O Quadro 1
entrevista semiestruturada parte de certos ilustra as principais características dos
questionamentos básicos, apoiados em teorias e especialistas.
hipóteses que interessam à pesquisa, oferecendo As entrevistas foram desenvolvidas da
um amplo campo de interrogativas à medida que seguinte forma: após o contato inicial com cada
recebem as respostas. um dos especialistas e seu posterior aceite, foi
As entrevistas seguiram um roteiro, dividido agendado um encontro individual com cada um
em quatro partes: 1) caracterização do deles, no local de preferência do entrevistado. As
participante (idade, formação acadêmica e entrevistas foram registradas por meio de um
atuação profissional); 2) experiências com as gravador digital de voz (marca Sony, modelo
lutas (modalidades já praticadas, graduações Px312 – 2gb). A duração média de cada
conquistadas, como surgiu o interesse pelas entrevista foi de cerca de uma hora e quinze
lutas, experiência com o ensino das minutos.
modalidades, etc.); 3) experiências na docência Para a análise dos dados, optou-se por utilizar
em lutas no ensino superior (tempo de atuação a técnica de análise do conteúdo (BARDIN,
profissional, instituições que trabalharam, 1991), submetendo os discursos transcritos à
contextos de atuação, como ensinavam a organização sistemática dos dados em
disciplina de lutas, principais dificuldades na categorias. Para isso, procedemos à realização
formação inicial, etc.); 4) considerações sobre as das etapas propostas pela autora. Na pré-análise
lutas nas aulas de Educação Física (como ensinar realizamos a leitura flutuante, relacionando
as lutas na escola, como avaliar o ensino, como possíveis códigos vinculados com o objetivo do
organizar os conteúdos das lutas no currículo, estudo, bem como preparamos o material para
principais dificuldades sobre as lutas nas aulas posterior exploração. Na fase de exploração e
de Educação Física,considerações finais). codificação elencamos as unidades de registro
Foram selecionados cinco especialistas em relacionadas com as palavras, temas e situações
lutas de maneira intencional não probabilística, presentes nas falas dos participantes, bem como
com idades entre 30 e 51 anos (média de idade definimos as unidades de contexto. Finalmente,

Rev. Educ. Fís/UEM, v. 26, n. 4, p. 505-518, 4. trim. 2015


508 Rufino e Darido.

no momento de tratamento dos dados definimos Todos os procedimentos legais foram


as categorias e subcategorias que coadunassem cumpridos a partir da aprovação do estudo no
com o objetivo do estudo, desenvolvendo o Comitê de Ética em Pesquisa da universidade de
processo de inferência dos dados, bem como de origem dos autores (protocolo número 2400 de
interpretação e análise dos resultados, 08/04/2011). Os participantes assinaram o
apresentados a partir da frequência de aparição Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(f) dos códigos, apresentados em forma de (TCLE), tendo todas as dúvidas sanadas, antes
porcentagem. ou durante a realização dos procedimentos.
Quadro 1 – Principais características dos especialistas participantes do estudo.
Tempo de Tempo de docência
Identific Modalidades de Instituição que
Idade Sexo prática em lutas (Ensino
ação luta conhecidas trabalha
(em anos) Superior)
Especia- Capoeira, Particular
47 Masculino 20 5
lista 1 JiuJitsu, Judô (privada).
Aikidô,
Especia- Capoeira, Pública
41 Masculino 34 11
lista 2 Hapkidô, estadual.
JiuJitsu, Judô
Especia- Boxe, JiuJitsu, Particular
44 Masculino 21 7
lista 3 Judô, Karatê (privada).
Especia- Capoeira, Judô, Pública
51 Masculino 25 18
lista 4 Wrestling estadual.
JiuJitsu, Judô,
Especia- Pública
30 Feminino 12 6 Karatê,
lista 5 estadual.
MuayThai
Média 42,6 - 22,4 9,4 - -
Fonte: Os autores.

RESULTADOS E DISCUSSÃO FATORES RESTRITIVOS

A partir da análise de conteúdo realizada por A categoria intitulada “fatores restritivos”


meio das transcrições das falas dos abarcou as subcategorias destacadas ao longo
especialistasemergiram duas categorias que, por das falas e vinculadas às principais dificuldades
sua vez, aglutinaram subcategorias, conforme é elencadas pelos especialistas sobre o ensino das
possível visualizar no Quadro 2. lutas, fato que proporciona implicações tanto à
Quadro 2 – Categorias e subcategorias temáticas formação profissional (formação deficiente),
oriundas do discurso dos especialistas. quanto com relação à prática pedagógica do
CATEGORIA SUBCATEGORIA professor de Educação Física.
Formação deficiente(f=52%) O fator restritivo que emergiu com maior
Insegurança do professor na veemência no discurso dos especialistas (f=52%)
escola(f=15%)
relacionou-se à formação deficiente, sendo
Infraestrutura escolar
deficiente(f=15%) considera precária no que corresponde ao ensino
Falta de materiais para o ensino das lutas na escola. Além disso, os participantes
FATORES
RESTRITIVOS
das lutas(f=9%) salientaram dificuldades no estabelecimento de
Carga horária insuficiente para a critérios pedagógicos para auxiliar os
Educação Física(f=3%) professores. Para a especialista 5:
Poucas informações sobre as lutas
na sociedade(f=3%)
Associação com incitações à A principal dificuldade está na forma
violência(f=3%) como as lutas são tratadas na
universidade. Se a gente for pensar na
Propostas de adaptação/inovação escola a formação é a universidade e
das lutas (f=45%) muitos professores não tiveram contato
Produção de materiais didáticos com lutas. As universidades não me
POSSIBILIDADES
sobre lutas na escola(f=19%) parecem estar sendo tão competentes
Propostas de formação em trazer uma visão de lutas que seja
continuada(f=36%)
Fonte: Os autores.

Rev. Educ. Fís/UEM, v. 26, n. 4, p. 505-518, 4. trim. 2015


O ensino das lutas nas aulas de educação física: análise da prática pedagógica à luz de especialistas 509

prática e possível de ser levada para a elaboração dos saberes necessários à prática
escola com segurança (Especialista 5). educativa”.
Del Vecchio e Franchini (2006) salientam
Essa perspectiva corrobora a fala apresentada que o domínio das técnicas específicas de uma
pelo especialista 1: “Eu acho que o maior determinada modalidade de luta leva entre cinco
empecilho é a formação do professor. É provável e dez anos, aproximadamente. Por outro lado, no
que muitos docentes não tiveram uma formação âmbito universitário, a disciplina de lutas
que mostrasse que é possível adaptar as lutas na apresenta-se usualmente em apenas um ou dois
escola”. Para o especialista 3 os problemas de semestres. Como saída para essa divergência:
formação de professores para abordar o
conteúdo das lutas são prejudiciais para a prática Seria mais importante que o graduando
pedagógica. Para ele: “o maior problema é que a aprendesse a utilizar a luta/arte marcial
graduação do professor é deficiente. Seria como estratégia para atingir o objetivo
preciso haver mais semestres para o ensino das de um programa de educação física em
lutas e que elas não fossem disciplinas optativas vez de executar técnicas específicas de
como é em alguns lugares”. um único estilo durante sua
permanência no ensino superior (DEL
A defasagem em termos de formação
VECCHIO; FRANCHINI, 2006, p.
profissional, sobretudo a forma como as lutas são
103).
compreendidas na universidade, principalmente em
cursos de formação de professores, foi o ponto Como apontamentos para a formação
mais enfatizado pelos participantes. O especialista profissional competente no ensino das lutas, Del
2 questionou: “Nem todas as universidades têm Vecchio e Franchini (2006) ressaltam que não é
disciplinas de lutas, e as que têm por vezes são possível assumir a prática isolada de uma ou
modalidades específicas, e aí nem sempre isso dá outra modalidade. Os autores propõem que a
uma visão para ser levado na escola”. abordagem do ensino das lutas deveria propiciar
Estas inquietações corroboram os aos graduandos a aprendizagem de conceitos,
apontamentos de Del Vecchio e Franchini procedimentos e atitudes que os auxiliem a
(2006) ao admitir que as dificuldades em tratar analisar criticamente esta prática corporal,
os conteúdos das lutas na escola são oriundas, compreendendo tanto os processos didáticos
em parte, devido à formação do profissional de envolvidos quanto a assimilação de conteúdos
Educação Física. Para os autores, a disciplina de que os possibilitem aprender e ensinar.
lutas nos currículos das instituições de ensino Essa argumentação elucida a implicação
superior deve direcionar claramente para a área a prática de se repensar a forma como o processo
qual pretende formar seu profissional, seja a de ensino e aprendizagem das lutas vem sendo
licenciatura no âmbito escolar, seja o abordado no âmbito do ensino superior no Brasil
bacharelado no âmbito não escolar. Para isso, de modo geral, uma vez que tal deficiência
são necessárias formas diferenciadas de tratar provoca e contribui com outras dificuldades,
pedagogicamente as lutas no ensino superior. algumas das quais também foram abordadas
Essa implicação apresenta aporte inclusive pelos participantes. Dessa forma, é fundamental
fora do contexto brasileiro. Espartero e Gutierrez que seja revista a forma de encadeamento e
(2004) admitem que na Espanha poucos ancoragem pedagógica das lutas no âmbito dos
professores consideram-se com formação cursos de graduação em Educação Física.
adequada para utilizar as lutas nas aulas de Outra dificuldade elencada pelos
Educação Física. Esse dado ilustra a dimensão especialistasrelacionou-se à insegurança do
da defasagem profissional no que corresponde professor. O especialista 1, por exemplo,
ao ensino das lutas no ensino superior. admitiu: “para mim o maior empecilho seria a
Da mesma maneira, Correia e Franchini ação do professor, sua insegurança para ensinar
(2010) salientam a escassez de cursos que as lutas na escola”. Da mesma maneira, a
proponham a tematização das lutas. Ainda de especialista 5 apontou: “o professor tem pouca
acordo com Correia e Franchini (2010, p. 6) informação sobre o que são as lutas e como é
“[...] a importância da produção de que ele vai ensinar uma coisa que ele não sabe o
conhecimento para alicerçar uma condição que é, que ele tem medo”.
mínima de apoio aos docentes, na eminência da

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510 Rufino e Darido.

O fato do professor não sentir-se seguro para Barros e Gabriel (2011), Carreiro (2005) e
ensinar as lutas na escola está relacionado com Nascimento e Almeida (2007) ao admitirem que
defasagens na formação, pois o professor, na os argumentos mais encontrados para justificar a
maior parte das vezes, opta por ensinar aquilo não inserção das lutas na escola remetem aestas
que ele possui domínio de tratamento questões. No entanto, os autores e os
pedagógico o que, muitas vezes, redunda-se no especialistas analisados reconhecem ser possível
ensino dos esportes coletivos mais tradicionais, superar estas dificuldades por meio de
dado sua forte influência na sociedade e na adaptações de espaços e materiais que permitam
formação dos professores de Educação Física intervenções seguras e em conformidade com a
(RUFINO; DARIDO, 2011). De modo escola.
semelhante, Barros e Gabriel (2011) afirmam Outros três temas também emergiram da
que a insegurança com relação ao tratamento análise de conteúdo, sendo eles: carga horária
pedagógico das lutas na escola é uma das insuficiente para a Educação Física na escola,
maiores dificuldades dos professores que poucas informações sobre as lutas na sociedade e
consideram fundamental ser especialista em associação com incitações à violência. Sobre a
modalidades para poder ensiná-las. questão da carga horária insuficiente, o
Como aponta Forquin (1993), o professor especialista 4 afirmou que: “sei que o ensino das
ensinade modo significativo apenas aspectos lutas caí em diversas limitações, da própria
advindos da cultura que ele conhece, que lhe é grade, por exemplo”. Este especialista admitiu
familiar, que faz parte de sua compreensão e ainda que muitas vezes a Educação Física
visão de mundo, aquilo que ele tem domínio. apresenta poucas aulas semanais para os alunos
Sobretudo, o autor salienta que o professor de forma que, com uma carga horária reduzida,
ensinará realmente aquilo que for válido e muitos conteúdos passam a ser negligenciados.
verdadeiro a seus próprios olhos. Ou seja, a A especialista 5 elencou a falta de
insegurança no ato de ensinar as lutas na escola informações sobre as lutas na sociedade,
origina-se de maneira bastante enfática na falta afirmando que estas práticas costumam ser
de domínio desse conteúdo, resultando em uma pouco vinculadas nas mais diversas mídias,
formainsuficiente de abordagem das lutas na comparado com outros esportes, impedindo que
escola ou ainda na superficialidade de seu os professores que não são praticantes tenham
tratamento pedagógico. contato sistemático e conhecimentos
Os especialistas elencaram também a questão aprofundados sobre estas manifestações
da infraestrutura escolar deficiente como corporais. Comparado com outras práticas
condição que muitas vezes gera empecilhos para corporais mais hegemônicas em termos
o ensino das lutas. O especialista 3, por exemplo, midiáticos, as lutas não apresentam a mesma
afirmou: “a gente tem algumas dificuldades, pois notoriedade. Contudo, há tendências de um
as vezes você não encontra a questão do crescimento de alguns eventos relacionados às
espaço”. O especialista 4 também corroborou lutas e vinculados às mais diversas mídias. Tal
essa perspectiva ao admitir que: “Os maiores fato se deve uma vez que muitas dessas práticas,
problemas se devem à questão das condições de a partir de seu processo de esportivização,
estrutura das escolas”. No entanto, este tornaram-se espetacularizadas (RUFINO;
especialista reconheceu que as condições de falta DARIDO, 2011). Esse motivo ilustra a
de infraestrutura não podem se tornar importância de se discutir as lutas com
justificativa para o não ensino das lutas na criticidade na escola, para que os alunos, ao
escola. acompanharem pela mídia tais eventos, tenham
Os problemas de infraestrutura coadunam condições de discernir sobre os diversos
também com defasagens em termos de materiais aspectos que os tangenciam.
para o ensino das lutas na escola, elencados Finalmente, houve o destaque sobre a
pelos professores. Para o especialista 3: “muitas associação com incitações à violência. A
vezes você não encontra a questão do espaço, especialista 5 admitiu que o desconhecimento
não encontra os materiais minimamente sobre as lutas, muitas vezes, pode gerar
adequados para o ensino destas práticas”. preconceitos sobre a violência exacerbada que
Tanto a falta de materiais quanto as questões passa a ser relacionada comestas práticas. Esta
de infraestrutura são elencadas por autores como especialistaadmitiu ainda que essa relação passa

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O ensino das lutas nas aulas de educação física: análise da prática pedagógica à luz de especialistas 511

a justificar a não inclusão das lutas na escola em especialistas (f=45%). Além disso, houve
diversos contextos. Alguns autores que algumas proposições de inovação que buscaram
buscaram a inclusão das lutas na escola também romper com os aspectos tradicionalmente
afirmam que a relação entre lutas e violência é relacionados às lutas no contexto escolar. O
uma característica muitas vezes estabelecida, o especialista 1 admitiu: “porque adaptar tudo
que dificulta o seu ensino (BARROS; pode ser adaptável. É possível adaptar as lutas na
GABRIEL, 2011; CARREIRO, 2005). escola, mas o professor fica ‘preso’ naquilo que
Os fatores restritivos apresentados pelos ele tem mais segurança”. Nessa mesma
participantes não se resumem somente ao perspectiva, o especialista 3 sinalizou que “se
processo de ensino e aprendizagem das lutas e adaptando você consegue ensinar alguns tipos de
nem se reduzem apenas aos conteúdos a serem modalidades de combate dentro da escola”.
ensinados, denotando implicações à própria Para o especialista 4, as lutas são um
compreensão do trabalho docente. Contudo, por conteúdo possível de ser ensinado na escola de
apresentarem especificidades e conhecimentos forma adaptada, desde que se ofereça condições
pouco difundidos no âmbito da formação de para o ensino. Este especialista ainda admitiu, ao
professores, conforme destacam os autores remeter à sua própria história como professor:
supracitados, bem como devido ao fato das lutas “eu adaptava tudo, isso porque eu tinha uma
estabelecerem relações de falta de familiaridade experiência que estava focada na adaptação”.
com os professores que não apresentam muitas O especialista 2 exemplificou formas de
vivências com estas práticas, tais fatores podem adaptação das lutas na escola tanto pela
eclodir em restrições, corriqueiramente impossibilidade de usufruto de materiais, quanto
assinaladas e que devem ser analisadas, tendo com a realização de pesquisas e outras
em vista sua superação. adaptações ao afirmar que “você pode não ter
De acordo com os especialistas entrevistados um tatame para trabalhar o judô, por exemplo,
a despeito dos dilemas relacionados ao ensino mas trabalhar qualquer outro tipo de luta”. Este
das lutas na escola, há algumas potencialidades mesmo especialista apontou ainda outra
educativas nestas práticas, desde que abordadas possibilidade de adaptação por meio de filmes
de modo coerente e de acordo com pressupostos que permitem discussões e a reflexões sobre
pedagógicos críticos e reflexivos. Tais alguns aspectos relacionados às lutas,
proposições fazem parte dacategoria semelhante às proposições de Tavares e Lopes
possibilidades, analisada a seguir. (2014), ao analisarem que os recursos materiais
e simbólicos utilizados por professores de karatê
Possibilidades estão fortemente alicerçado em seus saberes,
sobretudo os oriundos da experiência.
A categoria intitulada “possibilidades” A questão da adaptação é condição
buscou abranger algumas questões oriundas dos fundamental para o ensino das lutas na escola
discursos que demonstraram aspectos possíveis uma vez que é preciso traduzir pedagogicamente
para o ensino das lutas na escola, por meio de o ensino destas práticas de uma forma
propostas de inovação e adaptação do ensino das diferenciada daquela que é encontrada em outros
lutas no meio escolar, produção de materiais contextos sociais. A partir das representações
didáticos sobre lutas e questões concernentes à dos especialistas podemos inferir que essa busca
formação continuada. por adaptações é necessária por diversas razões,
destacando-se: 1) a não adaptação das lutas
Propostas de adaptação e inovação das lutas no requer do professor um conhecimento muito
meio escolar aprofundado, necessitando que ele seja
Essa subcategoria referiu-se às possibilidades especialista em uma ou mais modalidades; 2) A
de ensino das lutas na escola a partir da não adaptação das lutas na escola indica que elas
realização de adaptações, seja com relação a devam ser inseridas seguindo os mesmos
materiais, infraestrutura ou mesmo metodologias preceitos das práticas encontradas fora da escola,
de ensino. O destaque às questões referentes à impossibilitando que elas sejam
adaptação foi veemente uma vez que esse termo pedagogicamente assimiladas e circunscritas de
apareceu inúmeras vezes nas falas dos forma educativa ao longo dos processos de

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512 Rufino e Darido.

ensino e aprendizagem (RUFINO; DARIDO, desportivos. Se o enfoque é


2012). modalidade, eu vejo algumas
Nesse sentido, a especialista 5 corroborou em dificuldades no sentido de qual é a
seu discurso com a questão da preocupação com importância de se trabalhar
modalidades de lutas na escola? Porque
as formas com as quais as lutas são ensinadas na
as lutas são inúmeras. Agora, eu posso
escola. Para ela: trabalhar elementos comuns entre elas.
Há uma possibilidade como, por
Não adianta querer que o professor exemplo, trabalhar as lutas próximas,
ensine 10 modalidades se ele não médias e de longas distâncias
conhece nenhuma. Mas ele tem que (Especialista 2).
saber que existem conteúdos básicos,
técnico-táticos, que compõem essas
O especialista 2 elencou ainda possibilidades
modalidades, e ele tem que saber
diferenciar uma prática curta, de uma de desconstruir as modalidades, ensinando
média e de uma longa distância, quais alguns jogos, a partir das proposições
modalidades estão nas olimpíadas e apresentadas por Olivier (2000) em seu livro
quais não estão e os motivos disso, intitulado Das brigas aos jogos com regras. Para
entre outras questões (Especialista 5). esse participante, esse tipo de atividade é muito
importante para que o aluno possa compreender
A partir dessas análises, os especialistas a busca do alvo, precisão e o contato existente,
propuseram uma série de adaptações e inovações permitindo agrupamento de ações motoras,
para o ensino das lutas, permitindo que fossem contextualizadas com as lutas.
vislumbradas outras formas de compreendê-las Nessa mesma perspectiva, o especialista 3
no contexto escolar. Todos os entrevistados também apontou a possibilidade de ensinar as
apontaram formas diferentes de abordagem lutas no contexto escolar. Este especialista
pedagógica do conteúdo das lutas na escola, no apontou que a partir da motivação e participação
qual não seja preciso se prender somente ao dos alunos é possível ensinar as lutas, sendo
ensino de modalidades de luta na escola. necessário que o professor exerça sua
Para os especialistas, a ênfase convergiu nas criatividade e capacidade de adaptação das
possibilidades de se ensinar as lutas para além formas de ensino desse conteúdo.
das modalidades. Para isso, eles propuseram que Finalmente, a especialista 5 também
fossem buscados aportes teóricos que coadunou com o discurso dos demais,
fundamentassem critérios de sistematização e endossando a importância da desconstrução das
seleção de conceitos sobre o ensino das lutas na modalidades de luta existentes visando
escola. De acordo com o especialista 1, não é adequações que possam gerar compreensões
necessário ao professor abordar conteúdos mais generalizadas acerca do fenômeno lutas,
específicos provenientes das modalidades não abrangendo apenas uma ou outra prática
tradicionalmente relacionadas às lutas, embora corporal com suas especificidades. Nessa
isso seja possível, caso ele tenha o domínio perspectiva, alguns autores sinalizam para o
dessas práticas. Para isso ele remeteu à sua movimento de busca pelos princípios gerais ou
experiência pessoal de professor, admitindo que invariantes das lutas (GOMES et al., 2010).
o professor não precisa se basear nas A especialista 5 enfatizou que a busca pelos
modalidades, mas sim nos conceitos aspectos em comum das modalidades de luta
fundamentais das lutas. existentes depende, sobretudo, do tratamento
Estratégias como a realização de pesquisas, pedagógico que se objetiva no contexto escolar.
elencadas pelo especialista 1 são uma das Esta participante assinalou a possibilidade de
possibilidades de abordagem metodológica para abordar a questão das distâncias:
o ensino das lutas no contexto escolar. O
especialista 2 apontou outras possibilidades, O que seria em comum às lutas?
conforme é possível evidenciar em seu discurso. Vamos classificá-las pela distância:
curta, média e longa. A curta distância
As lutas podem ser divididas em várias são aquelas que eu tenho contato direto
questões, como a cultural, o trato com o com o oponente, a média eu tenho
corpo, preparação, os jogos pré- toque, seja um soco ou para encostar e

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O ensino das lutas nas aulas de educação física: análise da prática pedagógica à luz de especialistas 513

marcar pontos e a longa tem O especialista 1 corroborou a opinião do


implementos. A partir dessas distâncias especialista 2 ao sinalizar também para a
a gente começa a caracterizar os necessidade de diversidade em termos de livros
conjuntos: agarre, torção, imobilização,
didáticos, admitindo que
diferentes técnicas, diferentes práticas
corporais relacionadas para resolver os
[...] é preciso ter materiais didáticos em
problemas e assim por diante
todos os níveis da educação. Materiais
(Especialista 5).
para facilitar a vida do professor são
importantes, para dar um norte, uma
A classificação pela distância encontra aporte direção em seu trabalho.Quanto mais
teórico na literatura (BREDA et al., 2010; materiais ele tiver melhor para a
GOMES et al., 2010). Além disso, é possível escolha dele.
abarcar, a partir da distinção propiciada pelas
distâncias, uma série de práticas e modalidades A especialista 5 apontou também que
que, por outros meios, talvez não fossem considera o livro didático um norte, um
ensinadas na escola. Por outro lado, essa forma referencial de consulta que o professor utiliza ao
de classificação pode impedir, em certos longo da prática pedagógica. Nessa perspectiva,
momentos, um olhar mais apurado para uma ou esta especialista trouxe para a discussão algumas
outra modalidade. visões referentes aos usos que os professores
A discussão sobre as possibilidades de fazem a partir de suas interpretações.
inovação no ensino das lutas na escola
convergiu, em diversos momentos, para a O livro didático deveria ser um
necessidade de haver a utilização de materiais referencial porque você não parte do
didáticos que auxiliem a prática pedagógica. nada, você vai elencar os conteúdos
Dessa forma, por sua representatividade que são importantes dentro de um bloco
de conhecimento. Quando você faz um
(f=19%), estas discussões foram aglutinadas na
livro didático você não pode querer ser
subcategoria a seguir. o ‘pai’ da aula do professor, você só vai
construir um referencial para ele, que
Produção de materiais didáticos sobre lutas ele pode utilizar ou não (Especialista
na escola 5).
Os participantes, em diversos momentos,
Fernandes (2004, p.535) afirma que, por livro
enfatizaram a utilização de materiais como
didático, compreendem-se as
forma de subsidiar o ensino das lutas, com
ênfase aos livros didáticos. Os especialistas [...] publicações diversas, utilizadas em
foram favoráveis ao uso desses materiais, situações escolares por professores e/ou
apontando que eles são meios importantes de alunos para orientação, estudo, leitura e
auxílio e desenvolvimentoda prática pedagógica, exercícios: compêndios, cartilhas,
além de ajudar o professor, desde que utilizados livros literários, paradidáticos, manuais
de modo apropriado. de orientações para docente, caderno de
De acordo com a especialista 5, o livro desenho, tabuadas e coletâneas de
mapas.
didático, como material utilizado ao longo da
prática pedagógica apresenta duas vantagens
Dessa forma, vários são os formatos e
importantes, ao servir de parâmetro ao
diversas são as maneiras as quais os livros
professor que está pouco interessado em
podem assumir o papel didático ao longo da
melhorar sua prática e subsidiar com propostas
prática pedagógica.
de intervenção o professor interessado e
Gimeno Sacristán (2000) indica que o livro
motivado. Nessa mesma perspectiva, o
didático deve trazer tópicos com informações
Especialista 2 reportou que o livro auxilia o
diversas, abordando temas de diferentes pontos
professor na sua intervenção, cabendo à ele
de vista, contextualizando e desenvolvendo o
discernir sobre como utilizá-lo, sendo
conjunto de conhecimentos assinalados,
necessário vários materiais para utilização do
exemplificando conceitos que são abordados no
professor.
material e ilustrando-os graficamente. No

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514 Rufino e Darido.

entanto, o autor reconhece que essas questões fundamental que haja proposições que possam
são, por diversas vezes, deixadas de lado, uma auxiliar os professores na seleção dos saberes,
vez que encarece o produto final, o que torna o bem como na organização das aulas,
material desinteressante para o mercado diversificando as formas de atuação docente sem
editorial. substituir o papel da formação profissional nesse
O especialista 1 considerou a construção de processo.
materiais didáticos como uma ação importante Os materiais didáticos são um dos elementos
para a prática pedagógica especialmente em que compõe o currículo escolar. É preciso
conteúdos não muito comuns aos professores, considerarque a educação é uma ação social que
como as lutas, embora tenha reconhecido que o exige reflexões constantes, bem como estudos e
livro não é capaz de capacitar o professor e sim análises que não cessem em buscar saltos
auxiliá-lo ao longo de suas aulas. Para ele: “a qualitativos aos processos de ensino e
elaboração de livros didáticos é algo positivo e aprendizagem de todos os componentes
fundamental. Cada vez mais isso tem que ser curriculares, como a Educação Física. No caso
explorado e com mais instrumentos para que o das lutas, a diversificação de materiais, se bem
professor tenha acesso a eles”. O especialista 4 utilizados, pode auxiliar no desenvolvimento de
também convergiu suas considerações sobre a propostas pedagógicas que contribuam com sua
importância de se considerar as formas as quais inserção de modo crítico e criativo.
os materiais didáticos são corriqueiramente
utilizados, ressaltando que o livro é uma Propostas de formação continuada a partir do
ferramenta que depende do modo que é utilizado contexto da prática pedagógica
e da riqueza de informações sobre as lutas Os especialistas enfatizaram as dificuldades
apresentadas. enfrentadas pelos professores de Educação
Especificamente com relação ao conteúdo das Física com relação ao trato pedagógico do
lutas, a especialista 5 considerou que é conteúdo das lutas, alertando para os problemas
fundamental a existência de materiais didáticos referentes à formação. A partir dessas
uma vez que os professores podem não ter considerações, eles apontaram que uma das
muitos conhecimentos acerca destas práticas possibilidades de proporcionar um domínio
corporais, de modo que estes instrumentos maior acerca desse conteúdo pode ocorrer por
podem corroborar a transposição didática e meio da realização de processos de formação
seleção de prioridades e ênfases as quais os continuada, como encontros, debates, cursos,
professores podem se basear, desde que não capacitações, dentre outros, desde que estas
sejam utilizados como “muletas”. açõeslevem em consideração o trabalho que os
Contudo, há uma escassez de materiais professores realizam cotidianamente, bem como
didáticos acerca do conteúdo das lutas que seus saberes e contextos sociais relacionados.
apresentam uma perspectiva crítica e organizada O especialista 2, por exemplo, buscou
de como ensinar estas práticas nas aulas de enfatizar a necessidade de uma atenção maior
Educação Física sem serem concebidos, tanto à formação inicial quanto à formação
necessariamente, como manuais de atividades. continuada, devido às características de
Esta afirmação, reforçada por autores como rápidas transformações da sociedade
Darido et al. (2010), se lança como um desafio contemporânea, sendo necessário reformular e
para a área da Educação Física que deve ressignificaros conhecimentos. Este
fomentar o desenvolvimento desses materiais, especialista considerou a importância de se
para que sejam capazes de subsidiar o trabalho compreender as lutas como um dos conteúdos,
docente. valorizando a autonomia docente.
Os usos dos livros didáticos são A especialista 5 também apontou a formação
determinantes para a compreensão de seus continuada como possibilidade de permitir aos
papéis durante os processos de ensino e professores a aquisição de conhecimentos,
aprendizagem, não substituindo a figura do metodologias e procedimentos didáticos não
professor, mas podendo auxiliá-lo durante a adquiridos na formação inicial, além de
prática pedagógica. No caso específico das lutas, atualizações e ressignificações de sua prática,
como destacaram os especialistas, é ainda mais ressaltando ainda a importância de propostas que

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O ensino das lutas nas aulas de educação física: análise da prática pedagógica à luz de especialistas 515

indiquem aos professores parâmetros e diretrizes constantemente penetrando a prática e vice-


de ação pedagógica, mobilizando-os à reflexão. versa”.
A formação inicial, nesse sentido, não deve Cristino e Krug (2008) apontam que as
ser compreendida como única fonte de estratégias e as concepções de formação
conhecimento a qual o profissional deve se continuada no âmbito da Educação Física não
apegar de maneira única e exclusiva costumam ser bem compreendidas por
(MARTINY; GOMES-DA-SILVA, 2011). Ela instituições e professores. Os autores afirmam
deve ser capaz de subsidiar o futuro profissional que essas incompreensões comprometem, muitas
com um amplo espectro de saberes, vezes, a mudança da prática pedagógica,
metodologias, possibilidades didáticas e enfatizando que os processos formativos
conjunto de conhecimentos das mais diversas continuados passam por um momento de
origens que o possibilite compreender sua área verticalização dos modelos existentes,
de formação. Além disso, deve ser capaz de ocasionando em crises de identidade dos saberes
valorizar a contínua busca pelo desenvolvimento docentes em busca por seu espaço e legitimidade
de sua prática, fato que propostas de formação social.
continuada podem contribuir de modo O reconhecimento da formação continuada é
significativo. uma forma de proporcionar novas reflexões, bem
Como alerta Tardif (2012), a formação como ressignificações sobre a prática. Contudo,
profissional acadêmica, seja ela inicial ou ela não deve se pautar apenas em formatos
continuada, não é a única forma de proporcionar técnico-instrumentais que estabelecem uma
saberes aos professores e, muitas vezes, não são ordem hierárquica de relação entre os
esses saberes de ordem curricular, disciplinar ou responsáveis pelas formações e os professores
mesmo da formação profissional os quais os inseridos na prática pedagógica.
professores irão fundamentar, em grande O especialista 3 apresentou uma possibilidade
medida, sua prática pedagógica, que fica para contribuir com a formação continuada,
fortemente alicerçada em seus saberes considerando a importância de vincular as
experienciais. universidades em processos formativos dos
Assumindo a perspectiva dos saberes docentes que estão desenvolvendo suas ações
docentes, a formação continuada não deve ser profissionais nas escolas, por meio de projetos
encarada como um produto que visa capacitar de extensão, cursos de especialização entre
o professor com conhecimentos de ordem outros,nos quais as universidades estabeleçam
técnica e instrumental, baseada na parcerias colaborativas com as escolas, desde
racionalidade técnica. Esse modelo de que estes programas não concebam uma ordem
formaçãoque, de acordo com Pérez Gómez hierárquica na qual os professores devem apenas
(1995), sustenta a atividade profissional de ouvir passivamente. É o que alerta Sousa Santos
modo instrumental, direciona a solução de (2010) ao propor que as universidades devem ser
problemas por meio da aplicação de teorias e incentivadas para promover parcerias ativas no
técnicas científicas, fato que não condiz com a domínio pedagógico e científico com as escolas.
complexidade de contextos proporcionados A busca por conhecimentos, bem como o
pela prática pedagógica. reconhecimento das dificuldades e limitações é
Caldeira (2001) critica os modos como a fundamental para a prática pedagógica. Como o
formação continuada de professores é elaborada, especialista 4 destacou, o fato de muitos
admitindo que muitas vezes essas propostas se professores reconhecerem que não dominam
concretizam por meio de cursos, conferências e minimamente o conteúdo das lutas e a busca por
seminários de forma a reproduzir a formação uma melhor apropriação é uma prática que deve
anterior. Para isso, iniciativas que visem discutir ser valorizada, embora seja preciso considerar a
e contextualizar as crenças, compreensões, realidade muitas vezes deficiente no que se
problemas e ações oriundas da prática refere à forma como tem se desenvolvido o
pedagógica são importantes. Para Caldeira ensino das lutas na formação profissional de
(2001, p. 92): “concebendo o saber docente professores de Educação Física.
como um processo, e não como algo estático, Os especialistas ressaltaram ainda que a
acabado e definitivo, sua renovação precisa estar formação continuada é um dos meios mais

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516 Rufino e Darido.

eficientes de propiciar ressignificações às formas pedagógica deste conteúdo durante as aulas de


de se compreender o ensino das lutas. Essa Educação Física na escola, propondo
assertiva coaduna com Cristino e Kurg (2008) ao implicações para o desenvolvimento dos
admitirem que é fundamental haver a contextos de formação de professores. À guisa
intensificação e continuidade de estudos para de conclusão sobre os discursos dos
que os professores tornem-se cada vez mais especialistas, foi possível constatar que eles
conhecedores de sua profissão. referiram-se tanto com relação à questão do
Dessa forma, iniciativas de proposição de ensino e da aprendizagem do conteúdo das lutas
processos formativos continuados, com o modo em específico, quanto à alguns
de desenvolver e ampliar os saberes sobre as desmembramentos vinculados à prática
lutas é uma das possibilidades que deve fazer pedagógica, relacionando aspectos como os
parte do processo de valorização destas materiais didáticos e a importância da formação
manifestações corporais (TAVARES; LOPES, continuada. Os entrevistados circunscreveram
2014). Cristino e Kurg (2008) elencam cursos, algumas dificuldades com relação às lutas no
leituras, fundamentações teóricas do trabalho contexto escolar, como também salientaram
docente, entre outras possibilidades de formação possibilidades de superação de algumas das
continuada. atuais perspectivas apresentadas.
A formação continuada é um aspecto Há inúmeros fatores restritivos para o ensino
fundamental para contribuir com os professores das lutas na escola de acordo com os
no que corresponde ao processo de ensino e especialistas, como a formação deficiente, a
aprendizagem das lutas na escola, além de insegurança do professor, problemas de
permitir a eles refletir sobre suas próprias ações, infraestrutura, entre outros. Isso implica ao
ressignificá-las e compreender os condicionantes professor de Educação Física, sobretudo àquele
sociais, históricos e culturais que essas que não possui muitos conhecimentos sobre as
manifestações corporais apresentam. Porém, manifestações corporais das lutas, inúmeros
vale destacar que é preciso analisar com atenção dilemas que podem contribuir para a falta de
como tem se desenvolvido esse processo, o que abordagem dessas práticas, ou ainda, com
demanda iniciativas que possam contribuir com formas muito superficiais de se ensinar esses
os professores de Educação Física, sobretudo aos conteúdos.
que não apresentam muitas relaçõescom estas No entanto, os especialistas apresentaram
práticas corporais. também algumas possibilidades que precisam ser
mais exploradas para que as lutas possam ser
Como fator limitante da pesquisa destaca-se a
ensinadas de modo mais efetivo ao longo da
possibilidade de ampliação da amostra, bem
prática pedagógica. Dessa forma, eles elencaram
como a elaboração de outras estratégias
proposições de adaptação e de inovação para o
metodológicas tais como grupos focais entre os
ensino das lutas na escola, possibilidades
participantes para que seja possível considerar o
referentes à utilização de materiais didáticos e,
diálogo entre eles e as observações de aulas
finalmente, propostas de formação continuada
destes especialistas, buscando encontrar relações que podem contribuir para com o atual quadro
para o desenvolvimento da formação relacionado ao ensino dessas manifestações
profissional da Educação Física escolar. corporais.
Ademais, torna-se importante ampliar e Tanto os fatores restritivos quanto as
diversificar o recorte geográfico analisado para possibilidades não devem ser encarados de
que as discussões possam compreender as forma polarizada haja vista que uma dificuldade
dinâmicas e configurações acerca do conteúdo pode ser geradora de novas possibilidades, e
lutas em outros contextos para além do avaliado. vice-versa. As proposições refletem a
importância da construção de novos paradigmas
CONSIDERAÇÕES FINAIS sobre o desenvolvimento das lutas na formação
de professores de Educação Física no Brasil. É
O presente estudo teve como objetivo necessário superar laços históricos com
analisar as opiniões de docentes universitários relaçãoàs lacunas em como as lutas tem sido
especialistas no tema das lutas sobre a prática tratadas na formação, fato que sugere a

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O ensino das lutas nas aulas de educação física: análise da prática pedagógica à luz de especialistas 517

importância de novos estudos, sobretudo com estas práticas como manifestações da cultura
amostras maiores e advindas de outras regiões, corporal que devem ser ensinadas de modo
bem como indica a necessidade de apropriado na escola, ao longo das aulas de
transformações que possam de fato valorizar Educação Física.

THE TEACHING OF FIGHTS IN PHYSICAL EDUCATION CLASSES: ANALYZE OF PEDAGOGICAL


PRACTICE IN THE LIGHT OF EXPERTS

ABSTRACT
This study aimed to analyze college teachers’ opinions experts in fight contents about the pedagogical practice in school
Physical Education, proposing implications for the development of teacher education contexts. The sample consisted of 5
teachers selected intentionally, who participated in a semi-structured interview from a script previously built. Data analysis
was performed using the content analysis technique, culminating with the inference of two categories: 1) restrictive factors,
which seeks to analyze the main elements related to the development of fights contents in school; 2) possibilities, which
accounted for proposals for building the fights ahead to today's social demands. We concluded that the pedagogical practice
of fights in school presents some dilemmas arising from the way they are developed in teacher education, which requires
changes that may value them as manifestations of body culture.
Keywords: Professional Training. Teaching. Martial Arts.

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Endereço para correspondência: Luiz Gustavo Bonatto Rufino. UNESP – Rio Claro. Avenida 24-A, nº1515, bairro
Bela Vista, Rio Claro – SP, CEP: 13506-900. Departamento de Educação, Instituto de
Biociências. E-mail: gurufino@rc.unesp.br.

Rev. Educ. Fís/UEM, v. 26, n. 4, p. 505-518, 4. trim. 2015


O ensino de lutas corporais indígenas na Educação Física Escolar: um relato
de experiência
Daiane Araujo de Sousai
Secretaria de Educação, Quixeramobim, CE, Brasil

Resumo
Os povos indígenas carregam consigo uma riqueza de manifestações
1
culturais próprias como o artesanato, as danças, mitos, ritos e dentre outros.
Na escola a temática indígena tornou-se obrigatória a partir da Lei nº
11.645/08, mas há diversos fatores que influenciam o trabalho dos
professores sobre essa temática, por exemplo, questões acerca da falta de
formação inicial e continuada, fatores relacionados à família dos discentes,
falta de apoio da gestão escolar, disponibilidade de tempo e acesso a
materiais pelos alunos. Para tanto, o escopo deste estudo é relatar a
experiência de uma professora de Educação Física em uma escola pública
municipal da cidade de Quixeramobim, na região do Sertão Central no
estado do Ceará. Assim, foram tecidas as dificuldades encontradas ao se
abordar o conteúdo de lutas no ensino remoto em que foi aplicada a
temática das lutas corporais indígenas e a experiência da professora em
uma formação continuada.
Palavras-chave: Prática Docente. Cultura Indígena. Lutas Corporais
Indígenas.

The teaching of indigenous body fights in Physical Education at


School: an experience report

Abstract
Indigenous peoples carry with them a wealth of cultural manifestations such
as handicrafts, dances, myths, rites and others. At school, the indigenous
theme became mandatory after Law nº 11.645/08, but there are several
factors that influence the work of teachers on this topic, for example, issues
about the lack of initial and continuing education, factors related to the
students' families, lack of support from school management, availability of
time and access to materials by students. Therefore, the scope of this study
is to report the experience of a Physical Education teacher in a municipal
public school in the city of Quixeramobim, in the Sertão Central region of the
state of Ceará. Thus, the difficulties encountered when addressing the
content of struggles in remote education were woven, in which the theme of
indigenous bodily struggles and the teacher's experience in continuing
education were applied.
Keywords: Teaching Practice. Indigenous Culture. Indigenous Body
Struggles.

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1 Introdução

O artesanato, as danças, mitos, ritos, etc., são manifestações culturais que


fazem parte da cultura dos povos indígenas. Entre os diversos povos indígenas
brasileiros, é notável como os seus costumes e tradições revelam muito do que foi
vivido por seus ancestrais e que posteriormente foram repassados entre as
2
gerações. No entanto, esses povos são vistos, pelos não-indígenas, de forma
romantizada e estereotipada, com aquela imagem que tradicionalmente é vinculada
a mídia, fruto da desinformação que se arrasta ao longo dos anos (SILVA, 2002).
Na escola, de modo geral, questões relacionadas à cultura indígena são
trabalhadas em seu primeiro momento associada ao “descobrimento do Brasil” em
1500, que na verdade foi uma invasão, ou a datas comemorativas, como o “Dia do
Índio” (SILVA, 2002; PEREIRA; VENÂNCIO, 2021) e por muitas vezes até mesmo
de forma superficial, visto a ampla possibilidade de abordagens existentes.
Desde a implantação da Lei Federal nº 11.645 de 10 de março de 2008,
torna-se obrigatório o ensino das culturas afro-brasileiras e indígenas nos currículos
oficiais das escolas públicas e privadas do ensino fundamental e médio (BRASIL,
2008). Mesmo com a obrigatoriedade da lei, o grande desafio é buscar trazer esse
conteúdo para dentro da escola não somente em datas específicas como o “Dia do
Índio”, mas nas várias ocasiões, como exemplo na área de Educação Física com a
temática dos jogos, lutas, brincadeiras e esportes.
Dentro da disciplina de Educação Física existe uma gama de possibilidades
de se trabalhar as práticas corporais indígenas. Como exemplo, Pereira (2021)
relata que o modo como os povos indígenas brincam é uma forma do corpo
entender as histórias que são contadas pelos mais velhos, e onde as crianças
(re)vivem em sua corporeidade, a ancestralidade da história de seu próprio povo.
Para além da utilização da natureza para sua própria subsistência, as
crianças indígenas as utilizam como parte de suas brincadeiras. Elas brincam nos
rios, lagoas, matos, no mar, interagem com os animais e os imitam, utilizam de
objetos encontrados na natureza, como galhos, pedras, folhas, flores, pedras e

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tantos outros instrumentos que acabam participando de suas brincadeiras
(PEREIRA, 2021).
Diante dessas reflexões, o objetivo do presente estudo é relatar a
experiência de uma professora de Educação Física em uma escola pública
municipal de Quixeramobim-CE e as dificuldades encontradas ao se abordar o
conteúdo de lutas no ensino remoto em que foi aplicada a temática das lutas
corporais indígenas.
3
A temática das lutas corporais indígenas é ainda bibliograficamente escassa
(PEREIRA; SOUZA, 2021) e a falta de conhecimento dos professores acerca das
leis nº 10.639/03 e 11.645/08 (PEREIRA et al, 2019) só reafirma o quão essa
temática é negligenciada, sendo pouco discutida nas instituições de ensino superior,
na formação inicial e consequentemente, na prática docente dos atuais professores
da educação básica (PEREIRA; SOUZA, 2021).
Portanto, esse relato de experiência justifica-se pela necessidade de relatar
as dificuldades encontradas pela docente ao ministrar a temática das práticas
corporais indígenas durante as aulas no ensino remoto em uma escola pública
municipal de Quixeramobim-CE frente a não abordagem dessa temática durante a
graduação e a escassez de materiais de apoio que pudessem dar um maior suporte
a referida professora.

2 Metodologia

O presente estudo é de abordagem qualitativa, pois “não se preocupa com


representatividade numérica, mas, sim, com o aprofundamento da compreensão de
um grupo social, de uma organização” (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, p. 31), e do
tipo narrativa autobiográfica, permitindo ao pesquisador relatar um acontecimento,
um fato relevante que ocorreu em sua história de vida (SOUSA; CABRAL, 2015).
O relato apresentado foi desenvolvido com base na minha experiência no
ensino do conteúdo de lutas indígenas que ocorreu no mês de maio do ano de 2021
com a turma do 6° ano do ensino fundamental através da disciplina de Educação
Física de uma escola municipal de Quixeramobim-CE.

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Como princípio ético deste estudo, ressalto que o nome dos alunos da
escola participante do contexto no qual o relato se refere não foram identificados,
sendo revelado apenas o nome da professora envolvida.

3 Relato de Experiência

Ao dar início a prática docente em uma escola municipal da cidade de


4
Quixeramobim, na região do Sertão Central do estado do Ceará, encontrei
dificuldades no caminhar da prática docente por estarmos no período de pandemia
de Covid-19 e esbarrar com as dificuldades que as aulas remotas acentuaram, como
por exemplo: famílias com apenas um celular para mais de uma pessoa, outras que
usam a internet dos vizinhos por não ter condições de pagar, alunos tendo que
assistir as aulas no mesmo momento em que precisam cuidar dos irmãos mais
novos; entre tantos outros relatos presenciados por nós, professores da rede
pública.
A pandemia do Covid-19 impactou de forma substancial o processo de
ensino aprendizagem da educação mundial, trazendo grandes danos na
aprendizagem dos alunos (NEVES; VALDEGIL; SABINO, 2021), se deparar com as
dificuldades encontradas pelos discentes para participar de uma aula foi um tanto
preocupante.
Ao dar início às aulas remotas, eu não tive nenhum encontro com os alunos
antes do período pandêmico, possibilidade essa que as aulas presenciais
possibilitam. Ou seja, desconhecia totalmente a realidade da comunidade escolar e
o contexto da população em seu entorno.
Começar o ano letivo foi um grande desafio, pois, dar início a prática
docente em um período tão atípico foi de fato muito inesperado para uma recém-
licenciada em Educação Física. No entanto, a gestão escolar deu todo o apoio e
orientações necessárias para que eu embarcasse nessa jornada.
Antes de mais nada, gostaria de ressaltar que os professores recebem da
Secretaria de Educação do município de Quixeramobim, as expectativas de

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aprendizagens para o bimestre que se inicia, com os conteúdos, sugestões de
vídeos e questões para se trabalhar com os alunos.
No segundo bimestre, um dos objetos de conhecimento para se trabalhar
com os alunos do 6° ano do ensino fundamental foram as lutas do Brasil, com os
seguintes aspectos metodológicos: lutas indígenas; o lúdico e as lutas do povo
Kalapalo; experimentação e luta do toque no joelho; lutas dos jacarés; joelho valioso;
luta ikindene; construção de valores; luta solidária, conteúdo esse elencado pela
5
Secretaria de Educação do referido município.
Dentro desse planejamento é possível observar que as aulas práticas foram
inclusas, no entanto, por falta de conhecimento sobre a forma de como proporcionar
essas atividades e pelo pouco tempo disponibilizado com os alunos, limitando-se a
apenas um encontro semanal de forma síncrona de 40 minutos a cada 15 dias.
Decidi, assim, abordar apenas o conteúdo em seu aspecto conceitual e atitudinal.
Em que conceitual refere-se a tudo que se deve saber sobre determinado assunto;
por exemplo, os conceitos e fatos históricos que permeiam os povos indígenas. Já o
conteúdo em seu aspecto atitudinal diz respeito aos valores e atitudes que se pode
depreender do conteúdo abordado, a exemplo, valorizar e respeitar a cultura
indígena (DARIDO, 2019).
Para complementar o conteúdo, trazer um aspecto visual soou bem
interessante para o momento, em que foram exploradas imagens e vídeos
disponíveis na internet para que os alunos pudessem formar uma representação
mental sobre como aconteciam essas práticas de fato; já que o momento não
oferecia uma aula mais rica, onde todos pudessem se encontrar e desfrutar de uma
experiência prática.
Porém, aliando a essa ideia de trazer vídeos e imagens, surgiu o anseio com
relação ao conteúdo das mídias a serem apresentadas aos alunos, pois as imagens
encontradas para se apresentar eram apenas de indígenas mostrando algumas
partes íntimas. Sabe-se que faz parte da cultura de alguns povos indígenas a
utilização de poucas ou nenhuma roupa, ou ainda de pinturas e adereços para
enfeitar seus corpos, sendo uma prática comum entre eles, características essas
bem diferentes daquelas utilizadas e vivenciadas pela cultura ocidental.

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Cabe ressaltar que esse não é um padrão de vestimenta dos povos
indígenas, como já pontuado por Silva, Oliveira e Canabarro (2009), em que no
Brasil pode-se encontrar indígenas que falam somente o português, que andam de
calças, blusas e sapatos, possuem uma profissão, títulos universitários, assistem
jogos de futebol e novelas. Cabe ao professor também, o papel de romper os
estereótipos homogêneos impostos sobre esses povos.
A partir daí surgiu o questionamento: como os pais desses alunos e a gestão
6
da escola iriam reagir ao presenciar seus filhos tendo contato com esses materiais?
Por mais que a professora visse como algo comum e normal, visto que são questões
que fazem parte das culturas indígenas, outros, no entanto, poderiam não ter esse
mesmo olhar. Desta forma, infelizmente, optei por procurar materiais no qual os
indivíduos estivessem com o corpo mais coberto, mesmo que trouxesse um
conteúdo mais pobre com relação aos outros.
Ressalta-se que na semana que não há encontro síncrono, os alunos
recebem exercícios de fixação referente ao conteúdo trabalhado na semana anterior,
como materiais reforçando o conteúdo já estudado, como vídeos, atividades de
fixação, entre outros. Nesse momento pensei em propor atividades de construção de
materiais confeccionados pelos próprios alunos, porém, me senti desestimulada ao
receber reclamações de alguns pais dos discentes alegando que a escola estava
passando muito conteúdo para seus filhos e que eles estavam pensando em trocá-
los de escola, pois não estavam dando conta da demanda.
Inicialmente, os alunos se mostraram muito alheios ao conteúdo ali
discutido, no entanto, posteriormente se apresentaram interessados pelo assunto,
gerando uma boa conversa durante a aula; surgindo também muitas dúvidas sobre a
questão inerentes à cultura dos povos indígenas, e dúvidas de como eram suas
brincadeiras, vestimentas, se tinham acesso a tecnologia e aos supermercados, por
exemplo.
O que se percebeu foi uma visão ultrapassada e estereotipada sobre o
cotidiano dos indígenas, prevalecendo um olhar de uma população que usa pena e
poucas roupas, que vivem exclusivamente nas matas e florestas ou que moram
apenas em ocas e etc. A questão que deixou muito a desejar foram as vivências

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com as práticas corporais indígenas, que por conta das aulas remotas, tornou-se
inviável.
Durante a graduação, esse objeto de conhecimento não foi discutido, tão
pouco era de meu conhecimento sobre as leis e a obrigatoriedade de se trabalhar
com essa temática nas escolas, assim como, da possibilidade de explorar as
práticas corporais indígenas na disciplina de Educação Física, questões essas que
me trouxeram dificuldades no momento de ir em busca do material de apoio.
7
Pereira et al, (2019) identificou em seu estudo o desconhecimento dos
professores sobre as leis 10.639 e 11.645, onde 69,1% dos participantes alegaram
desconhecê-las, e os professores que aborda a temática (54,5%), restringem-se
apenas às datas comemorativas e festivas, questão que só nos mostra como esse
assunto é negligenciado, desde a formação inicial à continuada.
São vários os fatores que influenciam o trabalho do professor, em especial
no que tange a temática indígena, desde questões que dependem da busca de uma
formação continuada para trazer uma aula cada vez mais rica para seus alunos,
como fatores relacionadas a família, gestão escolar, disponibilidade de tempo e
acesso a materiais pelos discentes para a realização das atividades.
Em estudo realizado por Pereira e Souza (2021) foi constatado a escassez
de bibliografias abordando a temática das lutas corporais indígenas, questão essa
que dificulta o trabalho do professor de Educação Física ao querer abordar esse
assunto que é exigido pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Assim, em maio de 2021 vi a oportunidade de realizar um curso de formação
continuada, ofertado pelo Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará
(IFCE), exclusivamente sobre os conhecimentos das práticas corporais indígenas e
voltado para professores de Educação Física, com carga horária de 160 horas e
realizada totalmente de maneira online, intitulado “Educação física e relações
étnicos-raciais: práticas corporais indígenas”. O curso surgiu como uma
possibilidade de mergulhar nesse universo dos povos indígenas, que muitas vezes
ou quase sempre são negligenciados pelos professores da disciplina que leciono e
que acabam não reconhecendo tais conhecimentos como parte dos conteúdos da

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área de Educação Física ou simplesmente não acham relevante abordar esse
conteúdo em suas aulas.
O referido curso também me deu um direcionamento muito certeiro sobre o
caminho a seguir, com discussões e reflexões importantes sobre as possibilidades
da prática docente no que tange ao objeto do conhecimento abordado. A partir
dessa formação continuada, me senti mais preparada para ministrar uma aula
acerca das relações étnico-raciais sobre a cultura indígena, em que há muitas
8
possibilidades. Percebi que por falta de formação, seja ela inicial ou continuada,
muitas vezes, nós professores, nos restringimos ao superficial e/ou a uma
abordagem paupérrima e de cunho colonial.
Agora, para além de aulas abordando apenas os conteúdos conceituais, que
agora tenho um maior embasamento teórico, vislumbro a possibilidade de trabalhar
também com a construção de artefatos indígenas, os quais podem ser criados em
uma oficina com os alunos, com materiais encontrados em casa ou com baixo custo,
para posteriormente serem experimentados em uma atividade lúdica. Percebi
também que nós professores, podemos sempre que necessitarmos, procurar
orientação com outros professores com mais experiência, ou que tenham realizados
experiências exitosas, ou como um aprofundamento teórico sobre o assunto como
forma de agregar mais conhecimentos à prática docente.
Além disso, o curso me deu um embargo teórico ainda maior, sobre o
conhecimento das lutas corporais indígenas, em que foram apresentadas várias
outras lutas e as possibilidades de se trabalhar nas aulas de Educação Física.

4 Considerações finais

O escopo deste texto foi relatar a experiência de uma professora de


Educação Física em uma escola pública no município de Quixeramobim no estado
do Ceará sobre o conteúdo de lutas corporais indígenas. Assim, foram mencionadas
as dificuldades encontradas ao se abordar as lutas corporais indígenas no conteúdo
de lutas e ainda temo como percalço o ensino remoto, por conta da pandemia de
Covid-19.

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É perceptível a batalha que os professores diariamente vêm travando no
planejamento de suas aulas, em que se deve pensar não somente sobre a qualidade
do material que será trabalhado, mas se esse material vai de encontro aos preceitos
das famílias ou da escola, que muitas vezes se dizem tradicionais, e não enxergam
um material com fins educativos de forma mais crítica. Mas no caso da temática
indígena, por exemplo, podem interpretar com um cunho meramente sexual e que é
impróprio para a sala de aula.
9
Outra questão que os professores devem refletir é sobre a sua qualificação
profissional na área de Educação Física acerca dos conteúdos indígenas, visto que
tal temática é obrigatória de acordo com a Lei nº 11.645 de 2008; pois muitas vezes
por falta de conhecimento e por não procurar se aprofundar ou até mesmo conhecer
minimamente sobre este assunto, negam a aprendizagem, que é processo
constante na educação, para si mesmo e para os discentes, ou ainda repassam de
forma mítica e folclorizada tais conhecimentos.
Tal relato foi desenvolvido para mostrar a dura realidade que não somente
eu, mas muitos outros professores passam durante suas aulas, a dificuldade
encontrada de ministrar determinado conteúdo, seja pela falta de formação inicial ou
continuada, falta de materiais etc.
Enseja-se que esse relato encoraje os diversos professores que se
encontram na mesma situação ou em situações similares, a irem em busca de
qualificação profissional e sejam assim professores subversivos por não se
conformarem em ministrar os conteúdos com viés de cunho colonial.

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i Daiane Araujo de Sousa, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5895-8137
Secretaria de Educação, Quixeramobim, CE, Brasil
Licenciada em Educação Física pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará
(IFCE) campus Canindé. Especialista em Educação Física Escolar pela Faculdade dos Vales Elvira
Dayrell. Membro do Núcleo de Investigação em Avaliação Educacional (NiAVe).
Contribuição de autoria: Realizou a escrita integral do artigo.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/3090626820959553
E-mail: daianeuece@gmail.com

Editora responsável: Karla Colares Vasconcelos

Como citar este artigo (ABNT):


SOUSA, Daiane Araujo de. O ensino de lutas corporais indígenas na Educação
Física Escolar: um relato de experiência. Ensino em Perspectivas, Fortaleza, v. 2,
n. 1, p. 1-11, 2021.

Ensino em Perspectivas, Fortaleza, v. 2, n. 1, p. 1-11, 2021


https://revistas.uece.br/index.php/ensinoemperspectivas/
ISSN: 2675-9144
DOI 10.5216/rpp.v22i0.51677

O ENSINO DE LUTAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: UMA


REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA

Diego Luz Moura


Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, Pernambuco. Brasil.

Ivanildo Alves Lima da Silva Junior


Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, Pernambuco. Brasil.

João Gabriel Eugênio Araujo


Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, Pernambuco. Brasil.

Cleyton Batista de Sousa


Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, Pernambuco. Brasil.

Maria Larissy da Cruz Parente


Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, Pernambuco. Brasil.

Resumo
Este artigo teve como objetivo analisar a produção acadêmica brasileira acerca do ensino das
lutas como conteúdo das aulas de Educação Física escolar. Utilizou-se o método qualitativo
de revisão sistemática, o qual foi pesquisado em periódicos do sistema WebQualis entre A1 e
B2. Para a seleção dos artigos, foram analisados os títulos, resumos e estudo na íntegra,
buscando artigos que tratassem do conteúdo “lutas na escola”. Foram selecionados 19 artigos
que resultaram em três categorias: Aspectos Pedagógicos e Metodológicos das Lutas;
Violência e Lutas no Contexto Escolar, e Formação Docente. Constatamos que é necessário
sistematizar o ensino das lutas e refletir sobre sua intervenção pedagógica, potencializar a
formação inicial e continuada na operacionalização desse conteúdo, distanciar as lutas da
ideia de violência e promover a escola como local de estudo e propagação desse conteúdo.
Palavras-chave: Educação Física escolar. Ensino. Lutas.

THE TEACHING OF STRUGGLES IN SCHOOL PHYSICAL EDUCATION: A


SYSTEMATIC REVIEW OF LITERATURE

Abstract
This article aims to analyze the Brazilian academic production about the teaching of the fight
in the School Physical Education. The qualitative systematic review method was used, was
investigated in WebQualis periodicals between A1 and B2. For the selection of the articles we
analyzed the titles, abstracts and study in the integral searching article with the content fight
in the school. We selected 19 articles that resulted in the grouping of three categories that
guided our analysis in a didactic perspective: pedagogical and methodological aspects of the
fight; violence and fight in the school context; and Teacher training. We found that it is
necessary to systematize the teaching of the fight and to reflect on their pedagogical
intervention, to potentiate the initial and continuous formation in the operationalization of this

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content, to distance the fight from the idea of violence and to promote the school as a place of
study and propagation of this content.
Keywords: School Physical education. Theaching. Fight.

LAS LUCHAS DE LA ENSEÑANZA EN LA EDUCACIÓN FÍSICA ESCOLAR:


UNA REVISIÓN SISTEMÁTICA DE LA DOCUMENTACIÓN

Resumen
Este artículo tiene como objetivo analizar La producción académica brasileña en La
enseñanza de las luchas y contenido de las clases de Educación Física. Se utilizo el método de
revisión sistemática cualitativa que fue investigado en los WebQualis periódicas del sistema
entre A1 y B2. Para seleccionar los artículos fueron analizados títulos, resúmenes y estudiar la
búsqueda de texto completo para el tratamiento de los contenidos de peleas en la escuela. 19
artículos dieron como resultado La agrupación de tres categorías que guiaron nuestro análisis
en una perspectiva didáctica fueron seleccionados: aspectos pedagógicos y metodológicos de
las luchas; violencia y peleas en el contexto escolar; y La formación docente. Observamos que
es necesario sistematizar La enseñanza de las luchas y reflexionar sobre su intervención
pedagógica, mejorar La formación inicial y continua en El funcionamiento de este contenido,
distancia combate La idea de La violencia y promover La escuela como un lugar de estudio y
propagación de este contenido.
Palabras clave: Educación Física. Enseñanza. Peleas.

Introdução

A Educação Física escolar está inserida em um contexto que envolve muitas


discussões. Desde o final da década de 1980, esse debate passa por uma perspectiva voltada
para questões sociais e políticas, no intuito de promover uma nova identidade para a área e
um novo papel para o professor de Educação Física (MOURA, 2012).
Dessa forma, ocorreram mudanças no que diz respeito aos processos de ensino e
aprendizagem. Caparroz (1997) afirma que o movimento da Educação Física, da década de
1980, é decorrente de dois fatores: o movimento sociopolítico e o processo de
redemocratização do país.
A partir de então, se iniciou um período em que surgiu uma profusão de propostas
pedagógicas para a Educação Física escolar. Entretanto, pouca coisa se fez sobre o ato
propriamente dito de ensinar (MOURA, 2012). O debate se prendeu mais em tentar
prescrever como deveriam ser as aulas de Educação Física do que buscar saídas para sua
intervenção. Chega-se à impressão de que a Educação Física não consegue olhar para o seu
interior e visualizar as questões da prática pedagógica, do componente curricular e da didática
(CAPARROZ, 1997).
No modelo de escola ocidental, a Educação Física é o componente curricular que
aborda mais diretamente o ser humano em movimento e sua relação com a sociedade, através
de seus diferentes conteúdos (ROSÁRIO; DARIDO, 2005). Todavia, alguns conteúdos são
mais privilegiados do que outros.
Embora façam parte das mais remotas expressões do ser humano, as lutas devem estar
presentes em qualquer proposta curricular da Educação Física, por fazer parte do patrimônio
cultural da humanidade. Entretanto, é necessário ressignificar as lutas, para que possam
contribuir com os objetivos educacionais propostos para a Educação Física escolar
(CARREIRO, 2005).

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A busca na literatura é uma das formas de conhecer a produção de uma área


específica, quer seja para identificar lacunas, quer seja para encontrar possibilidades que
inspirem outras formas de olhar para determinado fenômeno. Nesse sentido, este artigo tem
como objetivo analisar a produção acadêmica brasileira sobre o ensino das lutas nas aulas de
Educação Física escolar.

Metodologia

O método utilizado foi a revisão sistemática qualitativa, que possibilita considerar as


similaridades e as diferenças significativas entre as pesquisas já realizadas, ampliando, assim,
as possibilidades interpretativas das pesquisas, construindo (re)leituras ampliadas (GOMES;
CAMINHA, 2014).
Dois pesquisadores, de forma independente, realizaram buscas nos periódicos.
Avaliaram e selecionaram os estudos relevantes, a correspondência entre o registrado pelo
pesquisador e o conteúdo e a aplicabilidade dos achados (DE-LA-TORRE-UGARTE-
GUANILO; TAKAHASHI; BERTOLOZZI, 2011).
Para a realização da pesquisa, seguimos os critérios apontados por Sampaio e Mancini
(2007). De acordo com os autores, a realização de uma revisão sistemática passa por cinco
fases: 1) definir a pergunta; 2) buscar evidências científicas; 3) revisar e selecionar os
conteúdos; 4) analisar a qualidade metodológica dos estudos; 5) apresentar os resultados.
Como primeira fase, utilizamos a seguinte pergunta de partida: “Quais as
contribuições presentes na produção acadêmica acerca do ensino das lutas na Educação Física
escolar?”. Na segunda fase, delimitamos as revistas científicas a serem utilizadas. Os critérios
de escolha das revistas foram: ter publicação na área de Educação Física escolar e
classificação no sistema WebQualis entre A1 e B2.1 Assim, as revistas analisadas foram:
Motriz; Movimento; Revista Brasileira de Ciências do Esporte; Revista Brasileira de
Educação Física e Esporte; Pensar a Prática; Revista Brasileira de Ciência e Movimento;
Revista da Educação Física, e Motrivivência. A busca foi realizada no período de agosto a
dezembro de 2015.
Número inicial de artigos encontrados por revista
Revistas Nº de Artigos

Motriz 0

Movimento 3
Revista Brasileira de Ciências do Esporte 1

Revista Brasileira de Educação Física e Esporte 2

Pensar a Prática 5
Revista Brasileira de Ciência e Movimento 2

Revista da Educação Física 2


Motrivivência 7

Total 22

Fonte: Próprio autor, 2017.

1
Utilizamos como critério extratos de B2 em diante por serem aqueles que têm sido alvo de maior estímulo de
publicação pelos critérios da CAPES.

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Na terceira fase, a seleção dos artigos foi realizada a partir da leitura dos títulos,
quando foram encontrados 22 artigos. Feito isso, iniciamos a leitura dos resumos, aplicando
os seguintes critérios de inclusão: 1) artigos que discutiam o ensino das lutas na escola; 2)
publicações no arco temporal de 2005 a 2015; 3) artigos publicados em língua portuguesa; 4)
publicações no formato de artigo original, relato de experiência, ensaio e artigo de revisão.
Após a leitura dos artigos, foram selecionados 19 para compor a amostra, assim como
apresentado na Tabela 2.

Tabela 2 − Número final de artigos encontrados por revista


Revistas Nº de artigos

Motriz -

Movimento 3

Revista Brasileira de Ciências do Esporte 1

Revista Brasileira de Educação Física e Esporte 2

Pensar a Prática 4

Revista Brasileira de Ciência e Movimento 1

Revista da Educação Física 1

Motrivivência 7
19
Total
Fonte: Próprio autor, 2017.

Na quarta fase, os artigos foram agrupados em categorias para tornar a discussão mais
didática. As contribuições de cada artigo foram analisadas através de uma análise
interpretativa. A seguir, serão apresentados os resultados e as discussões analisadas.

Resultados e discussão

Nesta seção, apresentaremos os resultados encontrados a partir da análise dos 19


artigos, bem como sua discussão. Construímos as seguintes categorias: Aspectos Pedagógicos
e Metodológicos das Lutas, Violência e Lutas no Contexto Escolar e Formação Docente.

Aspectos pedagógicos e metodológicos das lutas

Essa categoria é composta por 14 artigos, que relacionam os aspectos pedagógicos e


lançam reflexões sobre estratégias metodológicas para o ensino das lutas (ALENCAR et al.,
2015; NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007; RUFINO; DARIDO, 2001; RUFINO; DARIDO,
2012; GOMES et al., 2013; FONSECA; FRANCHINI; DEL VECCHIO, 2013; SABINO;
BENITES, 2010; BERTAZOLLI; ALVES; AMARAL, 2008; NASCIMENTO, 2008;
RADICCHI; FALCÃO, 2012; UENO; SOUZA, 2014; SANTOS; PALHARES, 2010;
BUENO; SILVA; CAPELA, 2011; LOPES; KERR, 2015). A produção crítica o ensino

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técnico das lutas e propõe uma abordagem que debata esse conteúdo de uma forma ampla,
considerando os aspectos históricos, culturais e pedagógicos.
As reflexões sobre o ensino das lutas atuam em diferentes sentidos. Alencar et al.
(2015) e Rufino e Darido (2012) propõem o ensino das lutas focado nas dimensões
conceituais, procedimentais e atitudinais.
O objetivo de Alencar et al. (2015) foi elaborar, aplicar e avaliar uma proposta do
conteúdo “lutas” nas aulas de Educação Física. Foram construídos seis planos de aula sobre as
diversas modalidades de lutas. As aulas dialogavam com as três dimensões do conteúdo
(atitudinais, procedimentais e conceituais). A intervenção foi realizada em duas escolas,
através da observação participante e de um diário de campo. Apontaram que o ensino das
lutas é negligenciado na escola e, para mudar essa situação, é necessário que esse conteúdo
seja sistematizado para o ambiente escolar.
Rufino e Darido (2012) afirmam que o ensino das lutas deve estar pautado na busca de
atitudes críticas e criativas. Apontam a necessidade de ampliação dos conteúdos por meio da
contextualização das dimensões conceitual, atitudinal e procedimental. Reconhecem que o
ensino das lutas na escola deve buscar a superação da abordagem reducionista, priorizar a
formação geral em detrimento da repetição dos gestos técnicos, considerar as subjetividades e
empregar sentido à prática. Deve-se procurar o entrelaçamento do conteúdo com as
concepções pedagógicas. No entanto, ainda é um desafio identificar quais são essas
concepções e como elas podem ser abordadas na intervenção desse conteúdo.
Notemos que tanto Alencar et al. (2015) quanto Rufino e Darido (2012) percebem o
desafio de uma sistematização para as lutas. Embora os autores não sejam mais propositivos
na indicação de propostas de sistematização, avançam ao indicar caminhos via as dimensões
do conteúdo.
Outros autores apresentam propostas a partir da reflexão sobre experiências de aulas e
projetos. Bertazolli, Alves e Amaral (2008) descrevem um relato de experiência sobre o
ensino da capoeira inspirado na pedagogia histórico-crítica, no ensino aberto e nas reflexões
de Vitgotsky. Apontam que é possível ocorrer uma dinâmica de aula com três ações
articuladas: a solução de problemas, a criação de movimentos e a reflexão.
Nascimento e Almeida (2007), a partir de um relato de experiência, relatam a
utilização de jogos tradicionais com elementos de equilíbrio como uma forma de ensino desse
conteúdo. Bueno, Silva e Capela (2011) propõem problematizar questões sobre a capoeira
como instrumento de formação dos educandos. Para isso, foram utilizadas estratégias de
ensino como: musicalidade, organização e promoção de eventos, prática da capoeira na luta,
apresentações teatrais, viagens e oficinas.
Sabino e Benites (2010) desenvolveram um projeto extracurricular de capoeira em
uma escola de Rio Claro. De acordo com os autores, as atividades devem ir ao encontro de
temáticas envolvendo história, golpes, movimentos, músicas e roda, assim tornando a prática
da capoeira mais prazerosa, demonstrando a possibilidade de abordar o conteúdo “lutas” nas
suas diversas possibilidades e explorando questões além do aspecto técnico e instrumental.
Ueno e Souza (2014) compreendem a necessidade de abordar o tema “lutas” através
dos temas transversais, com isso, considerando as lutas por linhas gerais e suas relações com a
sociedade. O direcionamento do tema “lutas” segue a preposição com o fenômeno social,
refletindo para a ação no ambiente escolar, em particular nas aulas de Educação Física, como
um campo de intervenção que busca sua consolidação.
As experiências apresentadas nesses artigos apontam a busca por contextualização do
conteúdo e proposição de atividades lúdicas com menos ênfase nas técnicas. Os artigos
aproximam o conteúdo de uma linguagem mais pedagógica, mas ainda não apontam formas
de sistematização desse conteúdo. Todavia, há outros artigos que procuram avançar nesse
sentido, indicando formas de sistematização do conteúdo.

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Nascimento (2008) aponta a necessidade de utilizar métodos que contemplem a


pluralidade das lutas. Essa internalização deve emergir de maneira genérica, fazendo com que
os alunos vivenciem diversas possibilidades peculiares ao ensino das lutas, tais como: puxar,
empurrar, gingar, conquistar territórios, julgar e subjugar; enfim, construir ambientes
diversificados, a partir de experimentações.
Fonseca, Francine e Del Vecchio (2013) defendem que as aulas sejam construídas em
um ambiente lúdico. Apontam que o conteúdo deve ser abordado a partir dos aspectos
comuns que as diferentes lutas compartilham entre si. Pensando nessa perspectiva, Alencar et
al. (2015) propõem uma organização das lutas entre lutas de contato, lutas agarradas e lutas
armadas.
Gomes et al. (2013) apresentam uma classificação metodológica, tendo como
referência a distância entre os oponentes. a) curta distância: desequilibrar, rolar, projetar cair e
rolar; b) média distância: golpear (mãos, braços, cotovelos, pernas, joelhos, pés etc.), e c)
longa distância: intermediada por implementos (tocar e manipular). De acordo com os
autores, para as séries iniciais do Ensino Fundamental, é possível aprender as lutas através de
jogos que enfatizem alguns elementos como esquivar, imobilizar, conquistar território e
desequilibrar. Os autores sugerem temas como: o que são lutas?, diferenciação entre lutas e
brigas, elementos das lutas, jogos de lutas de desequilibrar e conquistar territórios, lutas x
desenhos animados, elementos das lutas, criação e transformação, lutas e mídia, origens e
possibilidades, classificação das lutas, conhecendo a luta, técnicas e estratégias de ataque e
defesa (GOMES et al., 2013).
No mesmo sentido, Lopes e Kerr (2015) apontam a utilização de jogos como forma de
intervenção, através de percurso com quatro situações de aprendizagem em que se buscaram a
compreensão e a experimentação dos princípios condicionais das Lutas e suas classificações
por tipo de contato e distância.
Santos e Palhares (2010) destacam a aquisição de valores para a vida diante da sua
prática no ambiente escolar. Apontam que, dessa forma, as lutas se tornam veículo do
processo educativo e cultural através da consolidação curricular. A capoeira é sistematizada
através de princípios gerais: caráter combativo, dissimulação e disfarce, inversão corporal,
musicalidade, diálogo corporal, raiz africana e mandinga.
A sistematização das lutas é apontada como um desafio no ensino desse conteúdo nas
aulas de Educação Física. Essas propostas são um avanço para a abordagem das lutas, pois
possibilitam que o professor reconheça as potencialidades, as características e as estratégias
que podem ser utilizadas para o ensino. Apesar de avançarem no debate sobre o ensino, existe
a necessidade de maiores aprofundamentos.

Violência e lutas no contexto escolar

Nesta categoria, encontramos três artigos (NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007 UENO;


SOUZA, 2014; VASQUES; BELTRÃO, 2013) que abordam a relação entre lutas e violência
na escola. Os autores destacam a necessidade de um debate crítico sobre as lutas, buscando
desconstruir a relação entre violência e lutas.
Ueno e Souza (2014) apontam que o pouco conhecimento sobre as lutas contribuiu
para uma visão preconceituosa dessas práticas. Isso ocorre, principalmente, pela influência da
mídia, que colabora com uma visão distorcida da representação das lutas na história da
humanidade e na sociedade atual. Nascimento e Almeida (2007), no mesmo sentido,
observam que é necessário relativizar o argumento da violência como sendo algo restritivo ao
ensino das lutas. Dessa forma, é fundamental analisar a forma como ocorre a tematização
desse conteúdo.

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Ueno e Souza (2014) apresentaram as percepções de 360 estudantes de uma escola de


Goiânia sobre a relação entre agressividade e lutas nas aulas de Educação Física. Ao analisar
as respostas dos alunos, perceberam que eles conseguiram distanciar a relação entre lutas e
violência. Além disso, as aulas oportunizaram a abordagem de valores sociais como:
coragem, autoconhecimento, autoconfiança etc.
Vasques e Beltrão (2013) refletiram sobre o MMA como manifestação sociocultural e
a tensão em abordar essa temática nas aulas de Educação Física. O objetivo foi refletir sobre o
MMA como manifestação sociocultural do campo das lutas/esportes e o seu tensionamento
com a Educação Física escolar. O surgimento do MMA está ligado ao espetáculo e ao
telespectador, pois o produto inicial de exploração era a violência descontrolada transmitida,
preferencialmente, pela televisão. No entanto, devido a pressões de ordem social, política e
econômica, essa prática sofre modificações que podem ser caracterizadas como
reesportivização2 do MMA. Assim, ocorre uma preocupação em organizar e sistematizar as
regras para que sua prática seja aceitável para os padrões da sociedade atual. Ao reconhecer
que o MMA é uma prática criada com a principal finalidade de entreter as pessoas, questões
como a sua associação à violência e a sua massificação entre o público jovem podem ser
debatidas nas aulas de Educação Física escolar. Além disso, outros fatores influenciam a sua
vivência na escola, como o receio de professores abordarem um conteúdo aliado ao pequeno
número de publicações (VASQUES; BELTRÃO, 2013).
Entretanto, mesmo reconhecendo que o professor deve ter uma melhor formação para
a abordagem do MMA nas aulas de Educação Física, não foram apontadas contribuições mais
específicas sobre a abordagem dessa temática na escola. É fundamental, assim como relatado
pelos autores, que mais publicações possam somar esforços, além de propor formas de
intervenção.
As lutas fazem parte de um produto que vem sido veiculado pela mídia e que faz parte
do cotidiano do esporte moderno e, por ser amplamente consumido, são construídas inúmeras
representações. A ideia de violência é uma delas. É preciso que a escola, na sua função
pedagógica, problematize de forma crítica tais representações.

Formação docente

São nove artigos que fazem parte dessa categoria (NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007;
SANTOS; PALHARES, 2010; MELO, 2011; ALENCAR et al., 2015; VASQUES;
BELTRÃO, 2013; CORREIA, 2015; FONSECA; FRANCHINI; DEL VECCHIO, 2013;
RUFINO; DARIDO, 2015; SILVA, 2011). O debate central se concentra em diagnósticos e
propostas de auxiliar a formação do docente para atuar com esse conteúdo.
A formação inicial e continuada tem influência direta na utilização do conteúdo lutas
nas aulas de Educação Física. Os autores reconhecem que a utilização dessa metodologia na
escola apresenta algumas barreiras, dentre elas, a principal é a formação inicial e continuada,
que não prepara o professor para atuar sobre esse conteúdo na escola (FONSECA;
FRANCINE; DEL VECCHIO, 2013).
A insegurança ao abordar as lutas como conteúdo das aulas de Educação Física é uma
das principais causas da pouca inclusão desse conteúdo. Os autores dessa categoria apontam
que a formação inicial precisa ser reestruturada para assegurar ao professor a possibilidade de
vivência desse conteúdo nas aulas de Educação Física. Além disso, Fonseca, Franchini e Del

2
Segundo os autores, o processo de esportivização das lutas ocorreu com o advento da Modernidade. Todavia, a
criação de eventos com poucas regras sucedeu uma desesportivização. Mas, quando essa modalidade se trans-
forma em MMA, aumentando o número de regras restritivas à violência, e o MMA vive um processo de reespor-
tivização.

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Vecchio (2013) apontam que deve haver, por parte dos gestores ligados à educação, a
preocupação constante com a formação continuada dos professores de Educação Física.
Darido e Rufino (2015) entrevistaram cinco professores universitários que ministram a
disciplina de lutas sobre as implicações dessa disciplina para a formação de professores. Os
autores concluem que a prática pedagógica das lutas na escola apresenta alguns dilemas
oriundos da forma como elas são desenvolvidas no âmbito da formação, indicando a
necessidade de alterações que possam valorizá-las como manifestações da cultura corporal.
Nascimento e Almeida (2007), a partir de um relato de experiência, relativiza a ideia
de que os professores devem ter experiência com as modalidades de lutas para ministrar esse
conteúdo na escola.
Os demais artigos desta categoria discutem a formação a partir da especificidade da
capoeira. Para esses autores, a abordagem da capoeira nas aulas de Educação Física é
dependente da formação inicial e/ou da vivência desses professores em ambientes extra-
acadêmicos. A falta de segurança para abordar a capoeira é uma das principais dificuldades
enfrentadas pelos professores em relação ao ensino desse conteúdo (SANTOS; PALHARES,
2010).
Santos e Palhares (2010) apresentaram algumas reflexões a respeito da inclusão da
capoeira na formação de professores de Educação Física. Para eles, as diferentes formas de
conhecimento entre o mestre de capoeira e o professor de Educação Física não devem ser
comparadas. Nesse sentido, Melo (2011) sugere uma aproximação entre os atores da
comunidade ligados à capoeira e as intervenções dessa modalidade no ambiente escolar.
Segundo Santos e Palhares (2010), os campos de atuação profissional são diferentes, ambos
são conhecimentos epistemológicos e práticas pedagógicas que atendem a objetivos que
podem ocorrer no mesmo lugar: a escola.
Silva (2011) realizou um curso prático de formação continuada com professores de
Educação Física de Campinas sob o conteúdo da capoeira. O objetivo do curso foi apresentar
e aprofundar o ensino desse conteúdo de maneira prática. De acordo com o depoimento dos
professores-alunos, esse objetivo foi alcançado, pois muitos avaliaram as aulas e o processo
de ensino e aprendizado de forma positiva. Entretanto, foi relatado pelo grupo que, mesmo
apreendendo o jogo da capoeira e sua gestualidade, tiveram dificuldades quanto ao
aprendizado da musicalidade e à insuficiência de tempo para as vivências gestuais. O
principal ponto positivo refere-se à apreensão dos sentidos e significados dos gestos da
capoeira demonstrados pelos professores-alunos. Conclui que são as condições sociais de
produção nas quais o professor encontra-se inserido que vão impulsionar a escolha (ou não)
da capoeira para compor o rol das manifestações da cultura corporal a serem estudadas nas
aulas. Nesse sentido, um curso de formação pode auxiliar, mas não garante a possibilidade de
inserção dessa luta na escola.
Os artigos apontam a necessidade de maior acesso dos docentes ao conteúdo das lutas,
seja pela formação inicial, seja pela continuada, para que os docentes possam ter mais
segurança ao tematizar esse conteúdo. Todavia, refletem que a utilização desse conteúdo não
pode depender de experiência como atleta. Nesse sentido, enfatizamos que a formação deve
ter uma abordagem menos técnica e mais próxima da realidade da docência.

Considerações finais

Este artigo teve como objetivo analisar a produção acadêmica brasileira acerca do
ensino das lutas como conteúdo na Educação Física escolar. A partir da revisão sistemática da
literatura especializada nas revistas brasileiras da área, identificamos três temas centrais: a)
Aspectos pedagógicos e metodológicos das lutas; b) Violência e lutas no contexto escolar, e
c) Formação docente.

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Constatamos que a produção existente aponta como principais necessidades do ensino


das lutas a sistematização desse conteúdo e uma maior reflexão pedagógica na sua
intervenção. A produção, no que se refere ao tratamento pedagógico do conteúdo lutas,
pareceu apontar como tendência mais a utilização de categorias baseadas nas características
das lutas do que trabalhar com as diferentes modalidades. Porém, a área ainda precisa avançar
mais nesse sentido.
A formação docente se destaca como um elemento para potencializar a utilização
desse conteúdo pelos professores. As formações devem focalizar mais na operacionalização
desse conteúdo para a escola, de modo a dialogar com os dilemas reais dos professores.
A busca em distanciar as lutas da ideia de violência deve ser encorajada pela prática
pedagógica do professor para esclarecer as distorções causadas pela mídia. É papel do
professor proporcionar o debate sobre a violência, as lutas e o contexto em que cada uma se
apresenta.
Devido à importância que as lutas têm no universo da Educação Física escolar, é
necessário que mais pesquisas sejam desenvolvidas, principalmente, no sentido de auxiliar o
professor em sua prática pedagógica.
___________________________________________________________________________

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…………………………………………………………………………………………………...

Recebido em: 26/02/2018


Revisado em: 02/04/2018
Aprovado em: 03/08/2018

Endereço para correspondência:


lightdiego@yahoo.com.br
Diego Luz Moura
Universidade Federal do Vale do São Francisco, CEFIS - Educação Física.
Avenida José de Sá Maniçoba
Centro
56304205 - Petrolina, PE - Brasil

Pensar a Prática, Goiânia, 2019, v. 22: 51677________________________________________________11-11


ISSN 2177-4005

Revista do Departamento de Educação Física e Saúde e do Mestrado em


Promoção da Saúde da Universidade de Santa Cruz do Sul / Unisc
>> Acesse: http://online.unisc.br/seer/index.php/cinergis
>> Ano 15 - Volume 15 - Número 4 - Outubro/Dezembro 2014

ARTIGO ORIGINAL

O ensino de lutas nas aulas de Educação Física Escolar


The fight teaching in scholar physical education classes
Mauro Lúcio Mazini Filho1, Michel Resende Simões2, Gabriela Resende de Oliveira Venturini3, Rafael Pedroza
Savóia1, Dihogo Gama Mattos1, Felipe José Aidar1, Saulo Paula Costa1
1
Universidade Trás os Montes e Alto Douro (UTAD), Vila Real, Portugal.
2
Programa de Graduação Faculdade Sudamérica, Cataguases, MG, Brasil.
3
Programa NGIME, Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Juiz de Fora, MG, Brasil.

Recebido em: outubro 2014 / Aceito em: dezembro 2014


sauloedif@hotmail.com

RESUMO zen development, body language, movements, physical


abilities involved in its practice, morality, and respect
A prática das lutas apresenta valores que ajudam no among participants in health promotion and so on; its
desenvolvimento do cidadão, nas expressões corporais, realization fits within the physical education content.
nos movimentos, nas capacidades físicas envolvidas em However such content has not been part of everyday
sua prática, na moral e respeito entre os participantes, life for many schools. Objective: investigate whether
na promoção da saúde entre outros; sua realização se physical education teachers of elementary schools from
encaixa dentro dos conteúdos da educação física escolar. municipal city of Cataguases, Minas Gerais (Brazil)
Todavia tal conteúdo não tem feito parte do cotidiano de know and teach fight content in their classes. Method:
muitas escolas. Objetivo: investigar se os professores de participants were 18 physical education teachers who
Educação Física do ensino fundamental da rede munici- answered to a closed questionnaire containing eight
pal da cidade de Cataguases, Minas Gerais conhecem e specific issues. Results and final considerations: 18
ministram o conteúdo lutas em suas aulas. Método: parti- professionals interviewed, 17 said it is possible to teach
ciparam deste estudo 18 professores de Educação Física fight content in school. 10 said teach fight content
que responderam a um questionário fechado contendo 8 within their physical education classes and of these,
questões específicas. Resultados e considerações finais: 9 marked working content through play and just one
dos 18 profissionais entrevistados, 17 afirmaram que é ask for expert assistance. Most of teachers who said do
possível trabalhar lutas na escola. 10 afirmaram ministrar not apply the fight content reports that the school has no
lutas dentro de suas aulas de Educação Física e destes, specific location for this. Fight content has been worked
9 marcaram que trabalham o conteúdo de forma lúdica improperly and often not even put into practice. Professio-
e apenas um recorre a ajuda de especialista. Quanto nal skills are required for this specific area of intervention,
aos professores que afirmaram não aplicar o conteúdo, associated to relevant studies on the theme that can be
a maioria relata que a escola não tem condições físicas supported by the PCN (National Curriculum Parameters)
para isso. Entende-se que o conteúdo lutas vem sendo and CBC (Common Basic Content), reinforcing the fight
trabalhado de forma inadequada e muitas vezes nem é teaching in Physical Education classes.
colocado em prática. São necessárias capacitações profis- Keywords: Fights; Physical Education; Education.
sionais específicas nesta área de intervenção, associadas
a estudos pertinentes à temática, que podem ser auxilia-
dos pelo PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) e CBC INTRODUÇÃO
(Conteúdo Básico Comum), reforçando o ensino das lutas
na Educação Física escolar. As lutas são disputas em que os oponentes de-
Palavras-chaves: Lutas; Educação Física Escolar; Ensino. vem ser subjugados, com técnicas e estratégias de
desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão de
ABSTRACT um determinado espaço, na combinação de ações de
ataque e defesa. Caracterizam-se por uma regulamen-
Practice of sport fights has values that help in citi- tação específica, a fim de punir atitudes de violência

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não para fins de citação
O ENSINO DE LUTAS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR
Mauro Lúcio Mazini Filho, Michel R. Simões, Gabriela R. de Oliveira Venturini, Rafael P. Savóia, Dihogo G. Mattos, Felipe José Aidar, Saulo P. Costa.

e deslealdade. Podem ser citadas como exemplos de Os participantes do estudo foram 18 professores
luta, as brincadeiras de cabo de guerra e braço de de Educação Física, sendo nove do sexo masculino e
ferro até as práticas mais complexas da capoeira, do nove do sexo feminino. Os professores participantes
judô e do karatê1-5. deste estudo possuíam faixa etária entre 25 e 48 anos
A Educação Física enquanto componente curricu- de idade, metade da amostra possuía pós graduação, o
lar da Educação Básica deve assumir uma tarefa que restante apenas concluíram a graduação. Todos os pro-
ao introduzir e integrar o aluno na cultura corporal de fessores já exerciam a função por pelo menos dois anos.
movimento, formando o cidadão que vai produzi-la,
reproduzi-la e transformá-la através do gesto motor, Instrumento
habilidades aprendidas e valores trabalhados, durante O instrumento utilizado para verificação da
as aulas de Educação Física6-8. possível abordagem do conteúdo Lutas nas aulas de
A prática da luta, em sua iniciação esportiva, apre- Educação Física Escolar foi um questionário fechado
senta valores que contribuem para o desenvolvimento adaptado15, contendo seis questões fechadas.
pleno do cidadão, como respeito, disciplina, dentre outros.
Além disso, analisada pela perspectiva da expressão cor- Procedimentos metodológicos e estatísticos
poral, seus movimentos resgatam princípios inerentes ao No momento da aplicação do questionário foram
próprio sentido e papel da Educação Física, na sociedade explicados o objetivo do trabalho e as questões rela-
atual, ou seja, à promoção da saúde; o que a caracteriza cionadas ao instrumento avaliativo. Vale ressaltar que,
como conteúdo curricular da Educação Física9-12. durante o preenchimento das questões investigadas, o
Dessa forma, faz-se necessário aos professores avaliador permaneceu ao lado do avaliado, ficando de
de Educação Física Escolar, saber e ensinar a diferença prontidão para sanar quaisquer dúvidas, que pudessem
entre lutas e brigas para seus alunos, independente da surgir, durante o processo, sem interferir e influenciar
modalidade13,14. Enquanto a primeira trata-se de uma nas respostas.
prática esportiva ou alternativa de atividade física com Utilizou-se, para realização do tratamento dos
regras determinadas, a segunda é vista como uma dados, a frequência relativa e percentual nas questões
forma de provocar confusões, desrespeito ao próximo, investigativas. Para o tratamento dos dados, foi utiliza-
gerando violência excessiva. do o Microsoft Excel do Windows Seven.
Com o objetivo de analisar como vem acontecen-
do nas aulas de Educação Física, das Escolas da Rede
Municipal da cidade de Cataguases, nossa busca é RESULTADOS E DISCUSSÃO
entender, em especial, como funciona a utilização das
A tabela 1, expressa os resultados referentes a
lutas e se está acontecendo uma das temáticas dos
questão da utilização das lutas na educação física escolar.
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s), que são
Dos professores investigados, 56% afirmaram
as artes marciais, principalmente pela sua importância
ministrar lutas dentro das aulas de Educação Física, en-
quando falamos de artes milenares, ou das capacidades
quanto que 44% responderam que não trabalham com
físicas envolvidas como a força, a flexibilidade, a resis-
este conteúdo em suas atividades na escola. Ferreira15
tência, a agilidade, e a velocidade.
encontrou apenas 32% de professores que trabalham
com lutas, dentro de uma amostra de 50 investigados,
no município de Fortaleza, Ceará.
MÉTODO A maior parte dos entrevistados afirmaram tra-
Tipo de Pesquisa balhar com conteúdo lutas, respeitar o que sugere os
No estudo transversal foi realizado um levanta- PCN’s e o CBC’s (conteúdos básicos comuns). Mesmo
mento do número de escolas (14) da Rede Municipal assim, o percentual dos entrevistados ficou aquém do
do Ensino Fundamental da cidade de Cataguases, do desejado com relação à utilização de aulas de lutas. É
Estado de Minas Gerais, pertencentes à Secretaria importante contribuir com a formação dos alunos dentro
Municipal de Educação da referida cidade. Neste de um contexto holístico. Metodologias diversificadas e
mesmo levantamento, também foi verificado a inovações em atividades da Educação Física, pedagogi-
quantidade de professores (22) de Educação Física, camente são positivas quanto à participação dos alunos
que lecionam nas mesmas. de uma maneira mais empolgante e maciça15.
Foi realizada uma visita aos professores de Educa- Ainda dentro desta questão, quando verificamos
ção Física das escolas encontradas no levantamento, na as respostas positivas, observa-se que 90% dos entre-
qual foram esclarecidos os objetivos e procedimentos vistados marcaram que trabalham lutas de forma lúdica,
do estudo. Em seguida, foi passado a eles um Termo enquanto 10% recorrem ajuda de algum especialista.
de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) aos que se Vídeos e aulas de campo não foram citadas (ver tabela 1).
dispuseram a participar do estudo, sendo a assinatura Assim, dos professores que responderam posi-
um critério de inclusão à participação do mesmo. Os tivamente a esta questão avaliativa, nove destes res-
estagiários foram excluídos da amostra. ponderam que se utilizam de práticas lúdicas, enquanto
O estudo seguiu os padrões éticos de pesquisa, en- um professor citou que recorre a ajuda de especialista.
volvendo seres humanos de acordo com a lei 466/2012 Podemos perceber que os profissionais que utilizam
do Conselho Nacional de Saúde. dos recursos lúdicos para ministrarem as lutas, dentro
do conteúdo escolar, muitos recorrem à criatividade
Amostra com devidas adaptações aos movimentos técnicos

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O ENSINO DE LUTAS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR
Mauro Lúcio Mazini Filho, Michel R. Simões, Gabriela R. de Oliveira Venturini, Rafael P. Savóia, Dihogo G. Mattos, Felipe José Aidar, Saulo P. Costa.

tradicionais. No estudo de Ferreira15, o autor encontrou abordadas. Nossa amostra citou esta variável em 25%
resultados um pouco diferentes ao que encontramos (2), enquanto o estudo de Ferreira apresentou 17,64%
em nosso experimento. Enquanto em nossa pesquisa, (6), relatando este problema. Por último, o questiona-
encontramos 90% que utilizam-se de técnicas lúdicas mento foi referente se o conteúdo estaria adequado para
(9 professores), no estudo de Ferreira encontrou um o ambiente escolar. Nesta investigação, nossos entre-
percentual muito menor equivalente a 12,5% (2 pro- vistados não citaram esta questão, enquanto que para
fessores). Em nosso estudo 10%, (1) solicita ajuda de tamanho de cidades diferentes, por ter o estudo de
especialista na área para intervenção das atividades de Ferreira um número mais significativo que o nosso e
lutas, enquanto que, no estudo de Ferreira, 31,25% (5) também por compreender escolas da rede particular
se apoia na mesma metodologia abordada. Em relação além das públicas pode ser que os resultados apresen-
ao auxílio dos vídeos como ferramenta para as aulas, tados se tornem diferentes de nossa pesquisa que só
nenhum integrante de nossa amostra citou este recur- investigou a rede municipal.
so, enquanto que 50% do estudo de Ferreira (16) citou Podemos perceber que independente das dificulda-
este recurso como metodologia para esta atividade. des que os professores possam vir a ter para lecionarem
as lutas dentro do conteúdo da Educação Física Escolar,
estes ainda podem recorrer a inúmeros recursos como
Tabela 1 - Utilização das lutas nas aulas de educação
vídeos, palestras, atividades lúdicas, aulas de campo de
física (n=18).
modalidades diversificadas, conhecimento da história
Você utiliza as lutas nas aulas de educação física? n % de cada modalidade, seus ídolos, regras, países onde
Sim 10 56
são mais difundidas, visitas técnicas dentre outras.
Não 8 44
Importante deixarmos claro que a iniciativa, a vontade
Respostas positivas n=10
de fazer algo diferente e desafiador e a ajuda do alto
Como é fundamentada a aula? n %
escalão da escola são variáveis a se considerar dentro
Através de práticas recreativas/lúdicas 9 90
deste contexto.
Através de ajuda de especialista 1 10
Quando apresentamos o questionamento rela-
Através de vídeos 0 0
Através de aula de campo 0 0
cionado às lutas e suas formas de manifestações:
Respostas negativas n=8
pré-existentes com modalidades específicas ou ainda
Motivo pelo qual não aplica as lutas como conteúdo? n % se apresentarem como formas lúdicas como cabo de
Não tenho instrução para isso 2 25 guerra, queda de braço, dentre outras. A tabela 2 nos
A escola não tem condições físicas para isso. 4 50 apresenta os resultados que se segue.
Não temos colaborador 2 25 Observa-se que 33% (6) responderam que as lutas
Acho conteúdo inadequado para a aula 0 0 se apresentam apenas de acordo com as modalidades
específicas, enquanto que 67% (12) visualizam este
conteúdo, sendo apresentadas também com formas lú-
dicas. Novamente no estudo de Ferreira et al.15, dos 50
Já, em relação à abordagem de aula de campo,
entrevistados, 64% (32) consideraram que lutas seriam
nossos entrevistados também não citaram que se utili-
somente as técnicas pré-existentes de combate, en-
zam deste recurso, enquanto que no artigo de Ferreira
quanto que 36% (18) afirmaram que qualquer atividade
6,25% se utilizam deste recurso (1). Talvez, uma pos-
em que dois oponentes se enfrentam pode ser um tipo
sível explicação para estas diferenças estejam associa-
de luta. Podemos observar que estes resultados não
das ao local de investigação das pesquisas. Enquanto
vão ao encontro, mais uma vez aos encontrados com
entrevistamos professores que em grande maioria nem
nossa pesquisa. O trabalho mencionado acima demons-
tiveram este conteúdo em suas grades curriculares, o
tra que a maioria dos professores ainda não reconhece
estudo de Ferreira investigou professores de Fortaleza
a luta diversificada o que em nosso, já demonstra esta
no Ceará com possivelmente diferentes grades insti-
concepção. Ainda utilizando os dados de Ferreira15,
tucionais e maiores possibilidades de competições de
apenas técnicas de Karatê, de Judô, de Capoeira, Boxe,
lutas diversificadas por se tratar de uma capital.
Jiu-Jitsu dentre outras modalidades, são consideradas
Quando verificamos as respostas negativas, po-
lutas o que sabermos que não é uma verdade absoluta.
demos verificar os seguintes resultados de acordo com
Desta forma, os alunos tendem a perder a oportunidade
a tabela 1. Das questões negativas, 8 professores se
de vivenciarem as lutas seja através de um simples
mostraram resistentes ao conteúdo lutas. Nosso estudo
cabo-de-guerra, ou de uma queda de braço e traba-
encontrou resultados em que 25% (2) afirmaram não te-
lharem com isso o componente físico força muscular e
rem instruções para tal prática, enquanto que no estudo
experimentarem estar numa situação de combate.
de Ferreira15, 41,17% (14) mostraram-se resistentes ao
trabalho com lutas por desconhecerem instruções espe-
cíficas de como conduzir as atividades. Em relação ao Tabela 2 - Forma de aplicação das lutas na escola.
questionamento estrutura física da escola, 50% (4) de
Você considera que as lutas são apenas as formas pré-
nossa amostra afirmou que não trabalha este conteúdo existentes, como Caratê, Boxe, Capoeira ou acha que cabo- n %
por causa desta variável, enquanto que no estudo de de-guerra e braço-de-ferro também são formas de luta?
Ferreira15, 23,52% (8) afirmaram que o motivo de não Somente as técnicas pré-existentes podem ser consid-
trabalharem com lutas está relacionado à estrutura física 6 33
eradas lutas.
escolar. Esta mesma temática foi citada por Nakamoto13 Qualquer atividade em que dois oponentes se enfrentam,
e Olivier14. Quando o questionamento foi relacionado a 12 67
tentado superar o outro é um tipo de luta.
ter um colaborador que pudesse ajudar nas temáticas

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não para fins de citação
O ENSINO DE LUTAS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR
Mauro Lúcio Mazini Filho, Michel R. Simões, Gabriela R. de Oliveira Venturini, Rafael P. Savóia, Dihogo G. Mattos, Felipe José Aidar, Saulo P. Costa.

Quando passamos a uma outra questão avaliativa, com as crianças, enquanto 6% (1) ficam mais receosos
perguntamos, aos professores investigados, qual tipo quanto a esta metodologia de aula. Quando buscamos
de luta eles acreditam ser ideais para se trabalharem nas comparar com outro estudo15, 76% (38) alegaram que
escolas. Os resultados são apresentados na tabela 3. não sugerem esta prática dentro das escolas no âmbito
Como pode ser observado, a capoeira foi a mais infantil, cabendo a mesma ser realizada por um espe-
citada com 35% (7) seguida por Karatê 20% (4), Judô cialista em uma academia própria, e os outros 12 pro-
15% (3), Tae Know Do 15% (3), Boxe 5% (1), Jiu-Jitsu fessores (24%) disseram que é possível sim realizar tal
5% (1) e Hapkido 5% (1). tipo de intervenção. Acreditamos que uma capacitação
Para Ferreira15, 16% (8) responderam que nenhu- de Educação Física, frente a esta modalidade tende a
ma luta deveria ser abordada no conteúdo escolar e deixar os professores mais homogêneos no que tange
justificaram pelo fator agressividade ser uma temática às respostas lutas e Educação Física, quer seja relacio-
recorrente dentro de diversificadas escolas, espalhadas nado às técnicas, quer seja relacionado à ludicidade e à
pelo Brasil. Das modalidades mais citadas, a capoeira expressão corporal do movimento.
foi a de maior destaque com 26% (13), indo ao encon- Quando o questionamento tem relação à prática
tro a nossos achados. Talvez uma explicação plausível das lutas e a geração de agressividade, observa-se que,
para isto reside no fato de a capoeira ser genuinamente nenhum dos professores entrevistados, responderam
brasileira. Sequencialmente aparece o Karatê com 24% positivamente a esta questão. 39% dos entrevistados
(12) assim como em nosso estudo. Posteriormente relataram que as lutas não geram violência e 61% dos
aparece o Judô com 18% (9), também aparecendo na entrevistados relataram que depende do professor.
mesma sequencia de nossa proposta. O Tae Know Do Quando comparados ao estudo de Ferreira15, 24% (12)
aparece na mesma sequencia de nosso estudo com 8% responderam que sim; 44% (22), que não; e 32% (16)
(4), seguido do Kung-Fu com 6% (3), Jiu-Jitsu, com 2% disseram que depende do professor. Um fator que po-
(1) e seguidos por 4% (2) que a lúdica deve ser lúdica de ser explicado sobre as diferenças nestas respostas
apresentada como brincadeira. podem estar relacionados aos locais que as pesquisas
foram realizadas, ao tipo de alunos investigados, às
Tabela 3 - Tipo de luta que deve ser trabalhada na escola famílias envolvidas bem como os profissionais que tra-
(n=18). balham com Educação Física e lutas. Temos que deixar
claro que luta é um esporte como um outro qualquer,
Que tipo de luta você acha ideal ser trabalhada na escola? n %
todavia o envolvimento com a utilização de quedas,
Jiu Jitsu 1 5
torções, imobilizações, estrangulamentos, uso da força
Hapkido 1 5
Karatê 4 20
e situações de combate possam ser confundidas com
Boxe 1 5
brigas, o que sabemos que não é uma verdade. Por
Capoeira 7 35 fim apresentamos a questão referente se os alunos se
Judô 3 15 tornariam mais agressivos ao praticarem lutas.
Tae know do 3 15 Verifica-se que nenhum dos professores entrevis-
tados respondeu que acreditam que as lutas tornariam
os alunos mais agressivos, 50% (9) que não acreditam
A mídia, filmes, desenhos, podem ter influencia e que 50% (9) que talvez. Um fato que pode ser explica-
nas respostas dos professores investigados, bem como do a este percentual, pelo fato de que a maior parte das
o comportamento dos praticantes de diferentes modali- lutas, leva à disciplina e não à violência, como virtude
dades. Como pode ser observado, o Jiu-Jitsu apresen- de um grande lutador e desportista. Para Ferreira15,
tou-se com número baixíssimo em ambos os estudos, 24% (12) responderam que sim; 50% (25), que não e
talvez pelo comportamento de tais lutadores que não 26% (13) que talvez. Sugere-se uma maior conscien-
saibam diferenciar lutas de brigas. Todavia deixamos tização dos professores, palestras educativas, vídeos
claro que não é a modalidade que é responsável pela específicos e aulas práticas conduzidas de forma que
violência e sim o fator social que anda muito conturba- sejam respeitados os oponentes e as regras se fazem
do dentro das famílias e dentro da própria sociedade, de necessárias para criações de alunos com um perfil con-
uma maneira geral. trário à violência.
Quando a abordagem refere-se à Educação In-
fantil, apresentamos a tabela 4, referente às questões
impostas ao professores. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como pode ser observado, 94% (17) dos entre-
vistados sugerem que é possível trabalhar ludicamente Diante dos resultados encontrados no presente

Tabela 4 - Número de alunos e valores percentuais de professores relacionado ao trabalho de lutas na escola, agressividade dos
alunos e o uso das lutas na educação infantil (n=18).

É possível trabalhar Aumentaria a agressividade É possível trabalhar lutas na


lutas na escola? dos alunos? Educação Física infantil?
n % n % n %
Sim 17 94
Não 1 6 7 39 9 50
Talvez/Depende do professor 11 61 9 50

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não para fins de citação
O ENSINO DE LUTAS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR
Mauro Lúcio Mazini Filho, Michel R. Simões, Gabriela R. de Oliveira Venturini, Rafael P. Savóia, Dihogo G. Mattos, Felipe José Aidar, Saulo P. Costa.

estudo, podemos concluir que o conteúdo lutas nas REFERÊNCIAS


aulas de Educação Física, vem encontrando dificulda-
des no processo ensino-aprendizagem e sendo pouco 1. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN: Educação
trabalhado, como nos mostram os resultados. Motivos Física. Brasília: Secretaria Fundamental, MEC / SEF,1998.
como falta de estrutura, materiais disponíveis e falta de 2. Reid H, Croucher M. O caminho do guerreiro, o paradoxo das
conhecimentos específicos, dentre outros são mencio- artes márcias. São Paulo: Ed.Cultrix, 2000.
nados em nossa investigação. 3. Alves Jr. In Guedes O.C(org). Judô: evolução técnica e
Sendo assim, é necessário que os professores de competição.João Pessoa: Ed Ideia, 2001; 73-91.
Educação Física investigados nesta pesquisa participem 4. Breda M. Pedagogia do esporte aplicada às lutas. São Paulo,
de cursos de capacitação da temática “lutas na escola”, SP: Phorte, 2010.
pois através das estratégias utilizadas poderão adquirir 5. Betti M. Educação física e sociedade.São Paulo, SP: Revista
conhecimentos técnicos e lúdicos de como conduzir Movimento, 1992.
tais atividades destinadas a seus discentes dentro do 6. Betti M, Zulliani LR. Educação Física Escolar: Uma proposta
conteúdo escolar, podendo assim os professores viven- de diretrizes
ciarem um aprendizado mais sólido de aulas de campo, 7. Pedagógicas. In. Revista Mackenzie de Educação Física e
para colocarem em prática mais opções diversificadas Esporte. São Paulo. Ano I, nº. 1, 2005.
de atividades que fujam dos esportes com bolas que, 8. Ghiraldelli Júnior, P. Educação Física progressista. São Paulo:
normalmente predominam nas aulas de Educação Física Ed Loyola, 1997.
escolar. 9. Coletivo de Autores. Metodologia do Ensino da Educação
Outro aspecto que podemos concluir em nosso es- Física. São Paulo: Editora Cortez, 1992.
tudo é que as lutas mais sugeridas ficam a cargo da ca- 10. Nascimento, P. R.; Almeida, L. A tematização das lutas
poeira seguida pelo Karate, Judô, Tae-Know-Do, Boxe, na Educação Física Escolar: restrições e possibilidades.
Jiu-Jtsu e finalizada com Hapkido. Com estes achados, Movimento, Porto Alegre, v. 13, n.03, p.91-110, setembro/
podemos verificar que a falta de conhecimentos prévios dezembro de 2007.
e específicos sobre lutas fazem com que os professores 11. Lizieiro L. O que eu posso aprender com as lutas? Disponível em
recomendem as lutas mais conhecidas da mídia e ao <http://www.professorleonardoef.com/2011/11/luta-e-briga-
mesmo tempo deixam de oferecer tais atividades a seus afinal-e-tudo-mesma-coisa.html> acesso em 24/07/2013>.
alunos, fazendo com que estes deixem de adquirir mais 12. Lançanova J. E. Lutas na Educação Física Escolar: alternativas
noções da cultura corporal do movimento que estas pedagógicas. 2006. 70 f. Monografia (licenciatura em
atividades poderiam oferecer. Educação Física). Universidade da Região da Campanha,
Os PCN's e os CBC's em conjunto com inúmeros Alegrete, 2006.
artigos da literatura, associadas a formações continu- 13. Nakamoto HO. Sistematização de uma metodologia
adas em cursos de extensão e especializações podem para o ensino de luta. 2005. Relatório de Pesquisa
auxiliar aos profissionais que trabalham no âmbito esco- apresentando ao Programa apresentado ao Programa
lar a ministrarem atividades lúdicas e desportivas frente Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, Faculdade
ao conteúdo lutas. de Educação Física, Universidade de Campinas. Campinas,
Sendo assim, sugerimos que mais estudos sejam 2005. Disponível em: http://br.groups.yahoo.com/group/
realizados frente a esta problematização investigada em professorespesquisadores. <acesso em 28/09/2013>.
escolas particulares, com o ensino médio e em cidades 14. Olivier JC. Das brigas aos jogos com regras: enfrentando a
diferentes para que os resultados possam ser compara- indisciplina na escola.Porto Alegre: Artmed, 2000.
dos e verificados se este se trata de um problema local, 15. Ferreira HS. As lutas na educação física escolar. Revista De
regional ou nacional. Educação Física. n°135, 2006.

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não para fins de citação
O ENSINO DE LUTAS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR
Mauro Lúcio Mazini Filho, Michel R. Simões, Gabriela R. de Oliveira Venturini, Rafael P. Savóia, Dihogo G. Mattos, Felipe José Aidar, Saulo P. Costa.

ANEXO: QUETIONÁRIO APLICADO AOS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA.

1.Você utiliza as lutas em suas aulas de educação física?


Se a resposta for positiva:
A. Através de práticas recreativas/ lúdicas.
B. Através da ajuda de um especialista.
C. Através de vídeos.
D. Através de aula de campo.
Se for negativa:
A. Não tenho instrução para isso.
B. A escola não tem condições físicas para tal aula.
C. Não temos um colaborador que saiba tal tema.
D. Acho este conteúdo inadequado para a escola.

2. Você considera que as lutas são apenas as formas pré-existentes, como Caratê, Boxe, Capoeira ou
acha que cabo-de-guerra e braço-de-ferro também são formas de luta?
A. Somente as técnicas pré-existentes podem ser consideradas lutas.
B. Qualquer atividade em que dois oponentes se enfrentam, tentado superar o outro é um tipo de luta.

3. Que tipo de luta você acha ideal ser trabalhada na escola?

4. É possível trabalhar com lutas na educação infantil?


A. Sim
B. Não

5. Você considera que a prática da luta gera violência?


A. Sim.
B. Não.
C. Depende do professor.

6. Você acha que seus alunos se tornariam mais agressivos ao praticarem lutas?
A. Sim.
B. Não.
C. Talvez.

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não para fins de citação
ARTÍCULO / ARTICLE

Educación Física y Ciencia, vol. 24, nº1, e212, enero-marzo 2022. ISSN 2314-2561
Universidad Nacional de La Plata.
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación.
Departamento de Educación Física

O ensino de lutas/artes marciais em configuração remota: notas de


uma trajetóriadidático-metodológica na formação docente em
Educação Física
e teaching of fights/martial arts in a remote setting: notes on a didactic-methodological trajectory in teacher
formation in Physical Education
La enseñanza de las luchas/artes marciales en un entorno remoto: impresiones sobre una trayectoria didáctico-
metodológica en la formación del profesorado en Educación Física

Gustavo Almeida Soares


Docente na Educação Básica em Minas Gerais, Brasil
gustavo.soares@estudante.ufla.br
https://orcid.org/0000-0003-4797-5895

Fábio Pinto Gonçalves dos Reis


Universidade Federal de Lavras (UFLA), Brasil
fabioreis@ufla.br
https://orcid.org/0000-0003-4797-5895

Kleber Tüxen Carneiro


Universidade Federal de Lavras (UFLA), Brasil
kleber2910@gmail.com
https://orcid.org/0000-0003-0826-6172

Resumo:
O artigo retrata uma investigação cujo objetivo consistiu em perscrutar as implicações do trabalho pedagógico desenvolvido num
componente curricular intitulado: ‘Pedagogia das Lutas’, no segundo semestre de 2020, elaborado em conformação remota, em
uma instituição de ensino superior federal, no estado de Minas Gerais/BR. Tratou-se de uma pesquisa de natureza qualitativa.
O grupo amostral contou com vinte e oito aprendizes, sendo quatorze homens e o mesmo número de mulheres. Em termos de
procedimentos analíticos foram escrutinados os materiais empíricos produzidos por ocasião das aulas. Para examiná-los empregou-
se a análise de conteúdo, enquanto técnica. Os resultados expuseram êxito em relação aos aportes teóricos selecionados à disciplina,
com realce para os conteúdos correlatos e àqueles que forneceram subsídio epistemológico para o desenvolvimento do ensino de
Lutas nas diferentes etapas da educação básica. Outro destaque referiu-se ao modo de condução dos encontros, em especial, quando
houve atividades “práticas”. Em termos de limites a ênfase recaiu na “falta de contato corporal”, configurando-se como o grande
desafio para o ensino de Lutas/Artes Marciais na escola, em razão da conformação remota.
Palavras-chave: Lutas, Artes Marciais, Educação Física, Formação Inicial, Ensino Remoto.

Abstract:
e article portrays an investigation whose objective was to analyze the implications of the pedagogical work developed in a
curricular component entitled: 'Pedagogy of Struggles', in the second half of 2020, prepared in remote conformation, in a federal
higher education institution, in the state of Minas Gerais/BR. It was a qualitative investigation. e sample group had twenty-
eight apprentices, being fourteen men and the same number of women. In terms of analytical procedures, the empirical materials
produced during the classes were scrutinized. To examine them, content analysis was used as a technique. e results showed
success in relation to the theoretical contributions selected to the discipline, with emphasis on contents with social relevance and
those that provided epistemological basis for the development of the teaching of Fighting, in the different stages of basic education.
Another highlight referred to the way the meetings were conducted, especially when there were “practical” activities. In terms of
limits, the emphasis fell on the “lack of body contact”, constituting the great challenge for the teaching of Fighting/Martial Arts
at school, due to its remote configuration.
Keywords: Fights, Martial Arts, Physical Education, Initial Formation, Remote Teaching.

Recepción: 21 Agosto 2021 | Aprobación: 15 Enero 2022 | Publicación: 01 Febrero 2022

Cita sugerida: Soares, G. A., Reis, F. P. G. y Carneiro, K. T. (2022). O ensino de lutas/artes marciais em configuração remota: notas
de uma trajetóriadidático-metodológica na formação docente em Educação Física. Educación Física y Ciencia, 24(1), e212.
https://doi.org/10.24215/23142561e212

Esta obra está bajo licencia Creative Commons Atribución-NoComercial-CompartirIgual 4.0 Internacional https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/4.0/deed.es_AR
Educación Física y Ciencia, enero-marzo 2022, vol. 24, n° 1, e212. ISSN 2314-2561

Resumen:
El artículo retrata una investigación cuyo objetivo fue indagar las implicaciones del trabajo pedagógico desarrollado en un
componente curricular titulado: 'Pedagogía de las Luchas', en el segundo semestre de 2020, elaborado en conformación a distancia,
en una institución de educación superior federal, en el Estado de Minas Gerais General/BR. Fue una investigación cualitativa.
El grupo de muestra tenía veintiocho aprendices, siendo catorce hombres y el mismo número de mujeres. En términos de
procedimientos analíticos, se escudriñó el material empírico producido durante las clases. Para examinarlos se utilizó como técnica
el análisis de contenido. Los resultados arrojaron éxito en relación con los aportes teóricos seleccionados a la disciplina, con énfasis
en contenidos con relevancia social y aquellos que brindaron base epistemológica para el desarrollo de la enseñanza de la Lucha,
en las diferentes etapas de la educación básica. Otro punto a destacar se refirió a la forma en que se llevaron a cabo las reuniones,
especialmente cuando hubo actividades “practicas”. En cuanto a los límites, el énfasis recayó en la “falta de contacto corporal”,
constituyendo el gran desafío para la enseñanza de la Lucha/ Artes Marciales en la escuela, debido a su configuración remota.
Palabras clave: Luchas, Artes Marciales, Educación Física, Formación Inicial, Enseñanza a Distancia.

Considerações iniciais: o contexto do ensino remoto

Em decorrência da crise pandêmica deflagrada pelo vírus SARS-Cov-2 em março de 2020 – de acordo
com a World Health Organisation (2020) constituía-se numa Emergência de Saúde Pública de Importância
Internacional (ESPII) –, escolas e universidades interromperam o ensino presencial, com base na Medida
Provisória N° 934 (01/04/2020) a qual institui a contemporização dos dias letivos presenciais nas instituições
educacionais de todo o país. Como efeito implementa-se a modalidade de Ensino Remoto Emergencial
(ERE) no domínio de uma universidade federal situada no estado de Minas Gerais, consoante às medidas
preventivas exigidas pelo contexto. Em razão disso, tal instituição propôs um modelo de Roteiro de Estudos
Orientados (REO), de modo a subsidiar o trabalho pedagógico docente referente às disciplinas de graduação
e pós-graduação.
À face dessa conjuntura insólita para o desenvolvimento da formação inicial, mais especificamente
no interior do curso de Licenciatura em Educação Física, engendrou-se esta investigação cujo objetivo
consistiu em cotejar e perscrutar a pedagogia universitária empregada pelo regente do componente curricular
intitulado ‘Pedagogia das Lutas’, cuja carga horária perfaz 34 horas semestrais. De igual modo mapear as
implicações do trabalho pedagógico realizado ao longo do segundo semestre de 2020, sob uma atmosfera
virtual.
Trata-se de um interesse epistêmico desinente da complexidade e desafio presentes na elaboração de um
trabalho pedagógico – desenvolvido ao longo de dezessete semanas – no qual os saberes relativos às lutas/artes
marciais foram ensinados sem a “presença da experiência corporificada”, ou seja, à dimensão procedimental
(saber fazer) do conteúdo, uma face relevante para a apropriação do conhecimento (Coll, Pozo, Sarabia e
Walls, 1998; Zabala, 1998). Em outras palavras, o que nos mobilizou cientificamente residiu na possibilidade
de avaliar essa experiência formativa num curso (presencial) de formação docente (licenciatura) em Educação
Física, em uma universidade federal situada no estado de Minas Gerais, escrutinando a disciplina ‘Pedagogia
das Lutas’ cuja oferta ocorrera sob conformação remota.
Corresponde a um cenário inusitado, ao menos em relação à Instituição de Ensino Superior (IES) em
análise, portanto, deve-se levar em consideração à conformação remota. Soma-se a isso o fato do docente erigir
o trabalho pedagógico evocando as representações discentes para organizar a construção de procedimentos
metodológicos e fomentar tematizações, com vistas a atuar no novo cenário sobre o qual o componente
curricular – e a vida humana em linhas gerais – experienciaram abruptas modificações.
Basicamente, a organização da disciplina entremeou (semanalmente) momentos de estudos, videoaulas
e desenvolvimento de atividades. Além disso, houve encontros síncronos, no horário cujas aulas estavam
previstas na matriz curricular – todos eles foram gravados e disponibilizados aos acadêmicos/as, por

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intermédio da plataforma (Campus) virtual da instituição –. Oportuno citar a criação de espaços de interação
entre professores e alunos, quais sejam: os fóruns de discussão e os painéis de registro, facultando que os
ausentes nos encontros síncronos tivessem acesso ao conteúdo, pari passu preconizassem suas impressões e
dúvidas.
Ademais, os materiais elaborados pelos aprendizes compuseram parte das atividades avaliativas quinzenais,
confeccionadas por exigência do componente curricular supracitado. Foram desenvolvidos: estudos
dirigidos, textos dissertativos, resenhas, planos de aula, indagações para subsidiar os debates (leia-se encontros
virtuais), dentre outros recursos, sendo essas formulações – materiais empíricos – objetos de análise para a
consecução do estudo em tela.
Nessa esteira de descrição do contexto do estudo, destacam-se, além disso, o planejamento de ensino
elaborado pelo docente regente do componente curricular – disponível para consulta pública no sistema
integrado da IES – e sua formação acadêmica dedicada ao campo didático –, afora os anos de magistério e
atuação na educação básica – constatação examinada por ocasião da pesquisa. Conjuntura a qual suscitou
o interesse em escrutar sua pedagogia universitária, conquanto perscrutar-se-á apenas as implicações do
trabalho pedagógico desenvolvido num dos componentes curriculares (lê-se: ‘Pedagogia das Lutas’) por ele
ministrado, cujos efeitos, em alguma medida, traduziram os atributos formativos descritos.
Acrescenta-se a esse quadro investigativo o próprio curso de formação docente em Educação Física,
em virtude de suas idiossincrasias de ordem epistemológica, haja vista corresponder a uma subárea do
conhecimento “colonizada” por outras áreas científicas (Rezer, Nascimento e Fensterseifer, 2011; Bracht,
2000; Loviloso, 1998; Carneiro, Assis e Bronzatto, 2016; Carneiro 2012). Além das questões de natureza
didática, deve-se levar em conta a forte presença de uma formação tecnificada, fragmentada, esportivizada
(Darido, 1999; 2012). Ademais se tem a questão da obliteração das práticas – ou experiências – corporais,
devido à condição virtual do ensino, circunstância já aludida, convindo reiterar. Um cenário absolutamente
implexo e adverso para se pensar e desenvolver o ensino das Lutas/Artes Marciais.
Não bastasse o panorama descrito, há ainda, o fato dos saberes relativos às Lutas/Artes Marciais serem
prescindidos ou negligenciados, sob a égide das seguintes alegações: estrutura precária e ausência de materiais;
formação acadêmica deficitária; falta de interesse de aprendizes e docentes; em grande medida em decorrência
da preferência por jogos coletivos, em especial aqueles com bola; ademais temos a associação peremptória com
a violência, portanto sendo uma prática corporal inadequada ao ambiente escolar, dentre outras justificativas
cotejadas no estudo Lise, Cavichiolli e GIl (2022), no qual apresenta uma correlação entre o Brasil e a Espanha
no que se refere à efetividade do conteúdo Lutas nas aulas de Educação Física.
Adiciona-se outro elemento a esse cenário intrigante, a escassez de produções acadêmicas que tematizem
o conteúdo das Lutas no ambiente escolar, pois de acordo com Correia e Franchini (2010) apenas 2,93%
das produções publicadas em revistas acadêmicas de circulação nacional (leia-se brasileira) versam sobre
a temática: Lutas/Artes Marciais, desse percentual somente 10,7% tratam de aspectos voltados para a
Pedagogia do Movimento Humano, dificultando, por sua vez, o aprofundamento teórico/metodológico
dos docentes em exercício professoral. O quadro (intricado) exposto ensejou a presente investigação. Na
continuidade serão expostos os aspectos metodológicos empregados na investigação.

Metodologia

Delineamos o percurso metodológico do trabalho investigativo de acordo com os pressupostos de uma


abordagem qualitativa por traduzir-se na melhor maneira de analisar os dados cotejados pela investigação,
assim como estabelecer relações e inferências sobre eles, uma vez que tal modalidade nos confere a
possibilidade de observar/compreender os valores, crenças, hábitos, atitudes, representações, opiniões sobre
fatos, processos particulares e específicos dos indivíduos e grupos em que estão inseridos (Sampieri, Collado
e Lucio, 2013).

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Pode-se, então, afiançar que ao eleger a abordagem qualitativa o pesquisador/a volta-se para a busca do
significado das coisas, porque este tem um papel organizador nos seres humanos. Aquilo que as “coisas” –
fenômenos, manifestações, ocorrências, fatos, eventos, vivências, ideias, sentimentos, assuntos – representam
oferece "molde" à vida das pessoas (Lüdke e André, 1986). Num outro nível, os significados que os fenômenos
(leia-se “coisas”) recebem passam também a ser partilhados culturalmente e, assim, organizam o grupo social
em torno dessas representações e simbolismos (Chizzotti, 2003).
Em termos de procedimentos analíticos para escrutinar os dados coletados empregou-se a análise de
conteúdo, consoante aos pressupostos formulados por Bardin (1994), consistindo, para o contexto do estudo
em questão, na descrição detalhada e sistematizada dos relatos dos acadêmicos/as, somado aos registros
escritos provenientes dos REOs, em conjunto com as gravações das aulas. De acordo com a autora supracitada,
esta técnica de análise organiza-se em três etapas, a saber: a primeira refere-se a “pré-análise”, momento no
qual se realiza a primeira leitura do material empírico de modo a ordená-lo e estabelecer conjecturas, visando
o aprofundamento do objeto de estudo.
A segunda diz respeito à “fase de exploração”, equivalendo à ocasião da formulação de categorias
(analíticas) específicas, com base na recorrência temática ou por análise e agrupamento de conteúdo
(Bardin, 1994). Para fins desta pesquisa identificamos a reincidência do teor temático tanto nos relatos
dos/as acadêmicos/as quanto nas atividades resultantes da proposta do componente curricular: ‘Pedagogia
das Lutas’. Somou-se a essa técnica os critérios de caracterização de categorias baseado na exclusividade,
homogeneidade e confiabilidade propostos por Carlomagno e Rocha (2016).
E à última etapa concernente ao “tratamento dos resultados”, de acordo com Bardin (1994) utilizou-
se o referencial teórico de modo a granjear subsídio (epistemológico) para decodificar e perscrutar os
materiais empíricos produzidos ao longo do trabalho pedagógico desenvolvido pelo componente curricular
supramencionado. Estabelecendo, por sua vez, inferências sobre “os achados” da pesquisa.
Em termos éticos, para o desenvolvimento do estudo houve anuência dos/as pesquisados/as, na medida
em que aceitaram colaborar com a pesquisa, referendando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE). A pesquisa foi aprovada junto ao comitê de ética da instituição investigada, cujo registro consta no
parecer número 4614.882.
O grupo amostral contou com vinte e oito (28) aprendizes matriculados na disciplina ‘Pedagogia das
Lutas’, sendo quatorze (14) homens e o mesmo número de mulheres (lê-se 14). Com o intuito de preservar a
identidade de cada um deles, ao invés de empregarmos uma simbologia gráfica ou numérica – desumanizando
os participantes da pesquisa –, inseriu-se nomes fictícios relacionados ao universo das Lutas/Artes Marciais,
evocando as representações relativas ao mote.
Compete-nos informar ainda, o intento de articular pesquisa e formação, uma premissa segundo a qual
se fomente um processo de superação de formas convencionais de trabalho científico aplicado, dado que,
historicamente, tem-se observado investigações em Educação – e áreas correlatas – nas quais os investigados
(professores/as) reduzem-se a amostras (estatísticas) e, portanto, a objetos de estudo (Demo, 2004). Trata-se
de uma perspectiva pela qual se alvitra transcender essa concepção instrumentalizada, cujos “pesquisadores
da área educacional têm sido desafiados a propor formas de investigação que possam estabelecer uma relação
mais orgânica entre suas atividades de pesquisa e ensino” (Demo, 2004, p. 17).
Nessa direção, ao contrário do pesquisador inserir-se no ambiente educativo apenas para observar
ou tecer críticas e adequações, objetiva-se debater “junto ao professor a realidade de seu trabalho, as
dificuldades encontradas e oferecer subsídios teórico-metodológicos para a implementação de novas práticas
possíveis” (Bortoni-Ricardo, 2011, p. 26). Correspondendo, portanto, a uma noção “de pesquisa em que todo
o processo é conduzido em coparticipação entre professor e pesquisador, visando sempre à reestruturação e
reconstrução do trabalho com a linguagem em situação de ensino” (Bortoni-Ricardo, 2011, p. 22).

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Experiências formativas no contexto do ERE: o caso do ensino de Lutas/Artes


Marciais

Antes de descrever o processo formativo propriamente dito, faz-se indispensável elucidar a razão pela qual
se optou pelo emprego do binômio: Lutas/Artes Marciais. Parte-se da premissa de que tanto na concepção
de Lutas quanto no entendimento de Artes Marciais há certa complementaridade, seja no plano da evolução
histórica, ou mesmo na conformação das práticas corporais, afora o aprimoramento de seus artefatos,
em que pesem os riscos – tradições, histórias e elementos contextuais – ao aproximá-las. Ainda assim,
independentemente da ousadia epistemológica e de suas implicações, coaduná-las nos parece indicar um
caminho auspicioso na tentativa de ampliar a presença desses saberes no espaço escolar, uma noção alinhada
à proposta de Pereira, Reis e Carneiro (2020) e Pereira, Reis, Carneiro e Scaglia (2021).
Ao abrigo dessa premissa conceitual estruturaram-se os “caminhos epistêmicos” tracejados à disciplina
‘Pedagogia das Lutas’. O docente responsável organizou o componente curricular sob quatro eixos (de
conhecimento), a saber: 1) levantamento das representações discentes a respeito dos conceitos de Lutas, Artes
Marciais e Modalidades Esportivas de Combate; 2) discussões teórico-metodológicas para o ensino de Lutas/
Artes Marciais à luz da pedagogia do esporte; 3) tematizações possíveis quanto aos conteúdos de Lutas/Artes
Marciais – observando os marcadores sociais de gênero, classe social, raça, etnia, geração, religiosidade, dentre
outras que pudessem insurgir –; 4) outros temas possíveis (violência e competição).
Inicialmente houve um investimento formativo na direção de pôr em desconfiança às representações
referentes ao universo das Lutas/Artes Marciais na tentativa de compreender como as vivências, às
dimensões sociais e as leituras de mundo incidiriam na percepção com a qual um indivíduo apresenta ao
apreciar determinado material, acessar artefatos culturais (vídeo, música, poesia, dentre tanto outros), ou
mesmo relatar uma experiência. De igual modo pelas relações de poder cujos sujeitos estão submetidos,
representadas pela “composição e intenção do autor que cria a obra para determinado público. Sendo assim,
as representações que cada pessoa carrega consigo são constituídas de acordo com suas histórias de vida e
permitem outras interpretações de mundo” (Chartier, 1991, p. 87).
Acessar às narrativas produzidas tornou-se relevante na medida em que deslindaram representações sobre
o entendimento de Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate, haja vista consistir no ponto
de partida – avaliação diagnóstica – da organização pedagógica empreendida (Rabelo, 1998). Ao trazer a
lume todas as impressões prévias construídas (historicamente) sobre o mote, a proposição inicial alvitrava pô-
las em suspeição, com efeito, desestabilizá-las, tendo em mente o fato de não serem fixas, porquanto, apesar
de funcionarem como convenções sociais, não são inabaláveis (Resende, 2018).
À vista disso, o resultado do primeiro REO originou vinte e três relatos produzidos pelos aprendizes no
interstício do primeiro para o segundo encontro (virtual) da disciplina. Na qualidade de objeto disparador o
docente regente formulou a seguinte perquirição: “O que são lutas, artes marciais e modalidades esportivas de
combate?” Objetivava-se, com isso, mapear – a “bagagem” histórica/cultural adquirida ao longo da trajetória
formativa e das experiências de vida – o conhecimento a respeito do tema.
Ao analisar o teor dos relatos notou-se uma variedade de respostas consoante a subjetividade de cada
um, resultante, inclusive, do processo formativo do próprio curso de licenciatura ao qual estão vinculados.
Oportuno anotar o fato do campo semântico relativo ao termo “Luta” suceder diferentes conotações, isso
equivale a dizer que a palavra “luta” possui uma natureza polissêmica, recebendo diferentes acepções, a
depender do contexto ou da apropriação de seus objetivos (Rufino, 2012).
Ao interpretarmos o modo com o qual o termo “Lutas” figurou nos primeiros relatos, constatou-se
determinadas correspondências temáticas, observemos as mais frequentes: técnicas/golpes, disputa, prêmio,
machucar, treino, brincar, defender, brigar, adversário, disciplina, ataque/defesa, inimigo, regras e cultura.
Diante dessas associações relativas ao conceito, notou-se o registro de quatro explanações distinguirem o

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termo “brigar” de “lutas”, pois, essa conjugação conceitual alija a presença de seus saberes no espaço escolar,
conforme demonstram alguns relatos a seguir:
[...] dificuldade de serem introduzidas na escola por muitas vezes serem confundidas com uma “briga”, o que é justamente
o contrário (Rickson Gracie).

[...] separarmos o conceito de luta como sendo sinônimo de “BRIGA” VIOLÊNCIA”/“SELVAGERIA” entre outros
sentidos errôneos (Gabi Silva)

[...] deixar claro para os alunos que luta não é briga (Cris Cyborg)

A luta ensina exatamente maneiras de como agir e quando agir caso esteja sendo atacado por alguém, como em brigas (Kyra
Gracie).

Como se pode depreender, parte dos/as aspirantes à docência avalizaram existir diferenças entre as Lutas
e as brigas, entendimento análogo ao de Gomes (2008), ao elucidar o fato das manifestações codificadas
de combate obrarem de modo diametralmente oposto das expressões de violências, basta ponderar sobre
a presença de regras e espaço definido de confronto. A autora complementa sua explanação anotando
que ao contrário das brigas, as Lutas têm como característica o contato proposital entre duas ou mais
pessoas, com ações ofensivas e defensivas alvitrando acertar ou imobilizar o oponente/alvo. De acordo
com ela (lê-se, Gomes (2008)), são acontecimentos com regras previamente reconhecidas e respeitadas,
à semelhança de ações corporais imprevisíveis com o intuito de sobrepujar o oponente. Ademais, tem-
se um alvo personificado, o oponente, podendo ocorrer em nível representativo – a título de exemplo
lembremo-nos dos treinamentos/demonstrações de técnicas de lutas cuja ação não necessariamente requeira
um oponente “concreto” –. A ausência de qualquer uma dessas características tolher-se-ia o fenômeno, com
efeito, facultariam outros tipos de práticas, mas não manifestações codificadas de combate (Gomes, 2008).
Em relação ao termo “Artes Marciais”, observamos a ocorrência de outras palavras que foram elencadas
direta ou indiretamente à referida prática corporal, sendo elas: disciplina, batalhas, guerras, história, técnicas,
implementos, defesa pessoal, cultura e atividades físicas. Segundo Correia e Franchini (2010) e Rufino
(2018), Arte Marcial diz respeito às práticas corporais utilizadas em combates ou guerras, contudo, ao longo
do tempo outras noções foram atreladas ao conceito, a exemplo das ideias de beleza e estética dos movimentos,
de igual modo às condutas e fundamentações filosóficas com forte influência do “mundo oriental”.
No entanto, ao perscrutarmos a ocorrência de termos associados ao conceito de “Arte Marcial”, verificou-
se uma aproximação com o conceito de ‘técnica’, amplamente difundida no campo da Educação Física, em
especial, no Esporte. Logo, a questão das “técnicas” foi um dos conteúdos mais recorrentes na descrição
dos relatos, correlacionando-as com as Artes Marciais, entendimento igualmente constatado por (Correia e
Franchini, 2010) e (Rufino, 2018). Os excertos textuais ulteriores evidenciam essa agregação:
Quando é mencionada a palavra artes marciais, logo me vem na cabeça que são às técnicas de lutas desenvolvidas para utilizar
em batalhas [...] (Anderson Silva).

As artes marciais surgiram como uma luta corporal própria para guerras, técnicas de lutas desenvolvidas para utilizar em
batalhas [...] (Kyra Gracie).

As artes marciais dizem respeito a um conjunto de técnicas de cada lutador [...] (Amanda Ribas).

[...] artes marciais referem-se a um conjunto de técnicas de luta individual (Amanda Nunes).

Admitir essa associação entre técnica e o universo das Artes Marciais, embora não incorra num equívoco
– desde que haja uma noção mais elaborada a respeito do conceito, a exemplo da acepção de técnicas
corporais formulada por Marcel Mauss (1974), segundo a qual o antropólogo francês considerou os gestos e
os movimentos corporais como técnicas próprias da cultura, passíveis de transmissão através das gerações e
imbuídas de significados específicos –, todavia poderá ser deformada, na medida em que no interior da escola

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seja apregoada de forma tecnificada – sob acepção estritamente biomecânica –, apolítica e descontextualizada,
visto que a Educação Física escolar – assim como os outros componentes curriculares da educação básica
– dever-se-ia fomentar aos aprendizes à emancipação, por intermédio da apropriação do conhecimento
historicamente situado (Bracht, 2005; Charlot, 2008).
Não se trata de negligenciar o ensino da técnica enquanto conhecimento social e dimensão procedimental
do saber, conquanto rechaçar a ideia de reprodução técnica e mecânica dos movimentos, haja vista essa
perspectiva incidir numa concepção acrítica de educação, afora olvidar a reflexão sobre ‘o que’ está se fazendo,
além do ‘por quê’ dos fazeres, sendo, portanto, indispensável uma organização pedagógica pela qual se
produza sentido e significado para os saberes escolares, notadamente no que concerne às Lutas/Artes Marciais
(Alencar, Silva, Lavoura, e Drigo, 2015; Pereira, et al., 2020; Pereira et al., 2021).
Seguindo a esteira de análise, após o mapeamento e as interpretações produzidas em relação às
representações, o segundo REO foi dedicado a granjear os contributos da pedagogia do esporte para os
processos de ensino das Lutas/Artes Marciais. Para tanto, propôs-se indagar os/as acadêmicos a essa respeito,
com base na seguinte perquirição: “quais as contribuições da pedagogia do esporte nos processos de ensino das
Lutas/Artes Marciais”? Apenas dezenove acadêmicos/as entregaram o trabalho escrito, dos quais quatorze
notabilizaram à necessidade de ‘ressignificações/transformações’ dos conteúdos relativos às Lutas/Artes
Marciais na escola, enquanto cinco assinalaram na direção do ‘ensino das técnicas’.
No interior do agrupamento ‘ressignificações/transformações’ explicitam à indispensável necessidade
de transformação didático/metodológica para se ensinar os saberes referentes às Lutas/Artes Marciais.
Chamou-nos à atenção o indicativo de transformação didática por intermédio de jogos/brincadeiras, uma
compreensão admitida por (Pereira et al., 2020; Pereira et al., 2021), ao serem arautos da pedagogia do jogo.
No que se refere à categoria de ‘ensino de técnicas’, os/as aprendizes fizeram alusão às Lutas centralizando os
argumentos na questão de aprendizagens das técnicas específicas, voltadas ao treinamento e autodefesa.
Em face do exposto, pode-se perceber que as práticas corporais de Luta/Artes Marciais devem ser
transformadas de modo a acolher a função social da escola, com isso se tornar uma possibilidade educativa.
Algumas das discentes pesquisadas argumentaram de maneira pontual quanto aos caminhos e atividades pelas
quais poder-se-iam desenvolver as Luta/Artes Marciais no contexto escolar, conforme se constata doravante:
Acredito que o ensino de lutas na escola deve ser feito, como por exemplo, através de brincadeiras de cabo-de-guerra, braço
de ferro e outras. A contextualização deve ser feita de maneira lúdica, levando o aluno a compreender a diferença entre as
modalidades e entre modalidades esportivas de combate e brigas, e apresentar as lutas no contexto onde os alunos estão
inseridos (Cris Cyborg).

Para ensinar tais práticas corporais, por exemplo, dentro de um ambiente escolar, o professor pode trabalhar com brincadeiras
e jogos que tenham características próprias ou comuns as das lutas, artes marciais ou esportes de combate (Jessica Andrade).

Consoante ao entendimento dos relatos, o emprego de jogos/brincadeiras desponta como uma


possibilidade pedagógica auspiciosa pela qual o/a aluno/a se apropriaria das Lutas/Artes Marciais no espaço
escolar. De acordo com (Pereira et al., 2021), trata-se de um caminho metodológico deveras possível, contudo
recomendam o trabalho educativo assentado sob uma perspectiva “rizomática”. Essa ótica anotada pelos
autores supracitados pretende fomentar o ensino de Lutas/Artes Marciais valendo-se de um conjunto de
(re)conexões, entremeando artefatos culturais diversificados, por efeito duma miríade de possibilidades, tais
como: lutas e teatro; lutas e desenhos; lutas e brincadeiras; lutas e músicas; lutas e cosplay; lutas e filmes,
dentre tantos outros liames. Ao mesmo tempo facultam identificar relações existentes entre as diferentes
modalidades de Lutas/Artes Marciais no que concerne aos princípios filosóficos, técnicas semelhantes e
indumentárias.
Vencidas as duas primeiras propostas da disciplina, adentrou-se no momento de tematizar às manifestações
corporais de Luta/Artes Marcial. Nessa direção, propôs-se uma atividade na qual os/as professores/as em

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formação inicial dever-se-iam elaborar um texto dissertativo a respeito do assunto, de modo que as ideias e
reflexões contidas na produção textual pudessem nutrir o debate do encontro (virtual) subsequente.
No que tange aos resultados, em dezesseis produções o conteúdo basilar escrutava ou problematizava
as Lutas/Artes Marciais, colocando em perspectiva a conjugação entre violências/brigas – uma verificação
relevante, em virtude de corresponder ao primeiro eixo de conhecimento desenvolvido no interior do
componente curricular, no qual se averiguou às representações discentes a respeito dos conceitos de Lutas,
Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate, um fato cujo indicativo permite à ilação de êxito, de
algum modo, na proposta formativa –, outras quatro abordaram questões de gênero e duas se destinaram a
discorrer sobre discriminação e ascensão social.
Dentre os argumentos mais críticos e frequentes nos escritos, tem-se a vinculação das práticas de Lutas/
Artes Marciais à construção do comportamento agressivo, ou mesmo um estereótipo de ações violentas e
repletas de preconceitos. A literatura especializada já acoimou o equívoco dessa correlação induzida – na
maioria das vezes proveniente do senso comum ou de empirias deformadas –, no que concerne às Lutas/Artes
Marciais, brigas e as distintas manifestações de violências e o quanto ela deprecia e promove interditos para se
vivenciar e ensinar essas práticas corporais (Rufino e Darido, 2013). Não sem razão advertiram Nascimento e
Almeida (2007, p 12), “o fator violência, que julgam ser intrínseco às Lutas/Artes Marciais, incompatibiliza
a possibilidade de abordagem deste conteúdo na escola”.
Segundo os referidos autores, trata-se de um dos principais entraves na vivência do conteúdo pelos jovens,
entretanto, argumentam que a violência ou comportamentos violentos não se restringem ao universo das
Lutas/Artes Marciais. Sublinham até mesmo o fato da existência frequente de violências e agressões em outras
práticas corporais, a título de exemplo, citam o futebol e outras modalidades, em relação à questão das torcidas
(Nascimento e Almeida, 2007). A rigor, se porventura analisássemos os atos violentos que acontecem em
campeonatos da modalidade aludida, provavelmente poder-se-ia encontrar mais manifestações de violência
(simbólica e efetiva) nos estádios e nas torcidas organizadas, se comparado aos torneios e competições que
envolvem as Lutas/Artes Marciais (Ferreira, 2006; Pereira, et al., 2020; Pereira et al., 2021).
Na realidade, as violências se inscrevem em raízes mais amplas e complexas, expressas nas relações sociais
enquanto modos e procedimentos de comunicação que insurgem em situações de conflito, ameaças, incerteza,
medo, tensão, entre outras. Conjectura-se, nesse sentido, que o desenvolvimento das Lutas/Artes Marciais na
escola ao ser realizado de forma sistematizada, ou seja, transformado didaticamente, fomente aos aprendizes
uma condição de (re)aprender a gerir e a controlar as pulsões ante a complexidade das relações “violentas”, as
quais, eventualmente, possam estar expostos. Portanto, pode-se avalizar não haver uma relação peremptória
entre essas práticas corporais e a violência. No limite, admite-se sobrevir – em decorrência de um histórico
de exposição às violências – eventuais extravaso de pulsões reprimidas em ambiente de disputas corporais,
acontecimento, até mesmo, azado para se interferir pedagogicamente e, quem sabe, promover à reelaboração
de reações emocionais, experiências e afetos (Ferreira, 2006; Lise et al., 2022; Pereira et al., 2020; Pereira et
al., 2021).
Em outra perspectiva de análise presente nos excertos produzidos, fez-se uma problematização relativa
à discriminação social incluída em determinadas modalidades esportivas, compreendendo as Lutas/Artes
Marciais, em razão de existirem práticas mais elitizadas em oposição a outras. A esse respeito Betti (1998)
destacou o fato da comercialização e a midiatização esportiva coadjuvarem à discriminação no esporte, basta
notar a ocorrência de algumas modalidades granjearem notoriedade em razão do apelo comercial e incentivo
de patrocinadores, com efeito, adquirem mais evidência em relação às outras, seja em decorrência de como
são praticadas, seja em virtude do potencial de venda – tornando-se commodities –. Na continuidade há uma
passagem textual cujo teor explicita essa questão:
Na minha cidade as lutas são divididas em duas partes, as que são ensinadas gratuitamente, ou seja, voltado para os menos
afortunados (capoeira, muay thai), e as lutas que são ensinadas em academias privadas como (Karatê, Judô, jiu-jitsu) sendo
que essas últimas não oferecem nenhuma oportunidade para quem não tem condição financeira. Creio que em toda cidade

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é necessário haver locais disponíveis para toda população gratuitamente nos quais se ensine lutas e outras modalidades, mas
o que vejo hoje é uma grande segregação onde o esporte é separado entre modalidade para ricos e modalidades para pobres.
(Flavio Canto)

Identificamos, além disso, outros quatro trabalhos correlacionando às Lutas/Artes Marciais às


desigualdades de gênero. A esse respeito Louro (2000) elucida que as relações sociais de gênero são urdidas
sob uma tessitura histórica/cultural, portanto, alicerçadas sobre e nas diferenças sexuais. Nessa conformidade
as desigualdades devem ser examinadas “nos arranjos sociais, na história, nas condições de acesso aos recursos
da sociedade” e não a partir das diferenças biológicas (Louro, 1997, p. 21).
Ao anotarem a interface das desigualdades de gênero e as Lutas/Artes Marciais chamam à atenção para o
escamoteamento de espaços às mulheres nesse universo específico. Dentre os argumentos dissertados houve
destaque ao papel social demarcado – como “dona de casa”, por exemplo –, portanto, imutável, ou mesmo em
relação à questão de algumas modalidades esportivas nas quais há “reservas masculinas”, isto é, naturalizadas
como exclusivamente de e para homens, como se gênero figurasse como uma categoria fixa, quando, na
realidade, ele tem a natureza dinâmica, construída e é suscetível de metamorfoses (Louro, 1994).
Fizeram alusão ao caso do Ultimate Fighting Championship (UFC) cuja competição contempla Artes
Marciais Mistas, promovendo embates entre atletas desde meados dos anos de 1990. Corresponde a um
dos principais eventos esportivos na atualidade sobre Lutas, contudo apenas promoveu o primeiro combate
entre mulheres na sua 157° edição (Awi, 2012). Não gratuitamente, ainda hoje, o maior número de combates
por edição destina-se ao gênero masculino. Outro exemplo citado nos relatos diz respeito ao campeonato
brasileiro de Jiu-Jitsu, visto que existem documentos relatando a primeira participação feminina (faixa
preta), apenas em 1998. Nessa mesma edição da competição estavam inscritos 36 atletas do sexo masculino,
de acordo com a Confederação Brasileiro de Jiu-Jitsu (Confederação Brasileira de Jiu-Jitsu, 2021). A
propósito, mulheres que decidem sobrepujar demarcações de gênero no esporte e transcender estereótipos
frequentemente passam a ser associadas ao sexo masculino, colocando em suspeição sua orientação sexual
(Altmann, 1998; Goellner, 2005).
Muito bem, após esgotar-se o debate relativo às Lutas/Artes Marciais e os conteúdos mais versados nos
excertos textuais, encetou-se um diálogo – promovido inicialmente pelo professor regente do componente
curricular, na ocasião de um dos encontros virtuais – a respeito do tema competitividade, haja vista o fato
dele eclodir tacitamente no decurso da disciplina, seja em narrativas cuja noção preconizava dubiedades, seja
nas passagens textuais pelas quais o mote insurgiu de modo subjacente.
Ciente disso comentou que o tema da competitividade não se restringe ao universo da Educação Física
e tampouco aos limites do alcance dos “tentáculos” esportivos. Ao que tudo indica, a competição é parte
constituinte do viver e, a rigor, está presente no cotidiano da contemporaneidade de forma mais evidente do
que em qualquer outro período da história da humanidade (Carneiro, Camargo, Bronzatto e Assis, 2017).
Na continuidade conclamou os/as acadêmicos/as a refletir – de maneira mais elaborada – com relação aos
modelos de competição baseados no maniqueísmo: “derrota/vitória”, compreensão cuja perspectiva incorre
num reducionismo tanto do entendimento quanto do fenômeno propriamente dito.
Para tanto, propôs uma breve contextualização dos formatos existentes e de como são tratados pelos
canais midiáticos. A esse respeito Galatti, Breda, Scaglia e Paes (2007) advertem quanto à supervalorização
da vitória, desconsiderando outros aspectos formativos da competição na infância. Ademais, os autores em
questão ajuízam sobre as diferentes formas de manifestação da mesma, sendo admissível adjudicar um caráter
formativo a ela, desde que haja um olhar didático/pedagógico ao tratá-la em sua complexidade e abrangência.
Em outros termos, recomenda-se levar em consideração as necessidades educativas dos/as aprendizes, de
modo a promover um espaço-tempo de integração (Reverdito et al., 2008).
À face do exposto, indicou-se como possibilidade para sobrepujar a polarização binária do mote, a acepção
formulada por Carneiro et al.( 2017), segundo a qual a competitividade tem outra conotação, na medida em
que aprimora o desenvolvimento ético. Trata-se de um enfoque cuja visão não se inscreve num ambiente sem

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justiça e desumanizado, no qual a competição se vê privada de seu amplo potencial formativo, pois, se assim o
fosse, até proporcionar-se-ia empenho, excelência individual e autossuperação, por exemplo. Contudo seria
incapaz – dada a ambientação em que se vê imersa – de aprimorar a humanização da sociedade, a autonomia
humana e o reconhecimento do “outrem” (Carneiro et al., 2017).
Nesse sentido, uma “terceira margem da questão”, entre o desprezo da competitividade ou a aceitação
de sua caricatura neoliberal, dar-se-á pelo “resgate da competitividade como uma peculiaridade humana”,
já que ela “não é uma invenção do sistema capitalista, tampouco precisa ser execrada como um vício, ou
uma antítese da virtude”, mas poder-se-ia se “manifestar de forma rica em um ambiente justo, em especial o
ambiente em que ocorrem as escolarizações dos indivíduos, cuja formação ética tem oportunidades ímpares
de ocorrer” (Carneiro et al., 2017, p. 88).
Encerrou-se o debate, ou melhor, o encontro, exprimindo a proposta de uma última atividade relativa ao
período letivo, a saber: a produção de um relato avaliativo sobre o processo (virtual) formativo experienciado.
Nessa direção, o último REO orientava os/as aspirantes à docência a revisar todo o conteúdo da disciplina
alvitrando avaliá-la. Para isso, o docente regente erigiu uma espécie de roteiro semiestruturado de questões,
de modo a subsidiar a proposta avaliativa. A tabela 1 expõe as indagações, conforme se vê de agora em diante.
TABELA 1
Roteiro semiestruturado de questões

Fonte: elaborada pelos autores.

Em termos de resultados, dos vinte e oito (28) aprendizes matriculados na disciplina ‘Pedagogia das
Lutas’, apenas dezesseis (16) concluíram a atividade. Em relação ao primeiro ponto (lê-se “Que bom”),
cujos/as acadêmicos/as descrever-se-iam experiências significativas, em linhas gerais, notou-se dois aspectos
proeminentes nas avaliações – após um escrutínio analítico dos relatos para composição das categorias de
análise –. O primeiro diz respeito à compreensão do fenômeno Lutas/Artes Marciais a partir da ótica dos
autores selecionados como aporte teórico da disciplina, com destaque à relação do conteúdo com temas de
relevância social e as possibilidades do trabalho pedagógico com as diferentes etapas de ensino. O segundo
elemento está atrelado ao projeto didático com a qual se conduziu as aulas, em especial, às propostas cujas
implicações culminaram na produção e desenvolvimento de atividades propositivas, “práticas”, por assim
dizer. Ambos os aspectos arrolados nos relatos retratam a relevância dos atributos formativos – descritos na
introdução do texto –, presentes na pedagogia universitária empregada pelo docente regente do componente
curricular, uma evidência ratificada por nossa investigação, a despeito de não tê-la explorado em termos de
material empírico de análise, caracterizando um limite do estudo empreendido. Percorramos alguns trechos
dessas avaliações cujos teores revelam os destaques significativos – sob a percepção dos/as aprendizes – do
processo de formação, em conformação remota:
No que diz respeito aos processos de aprendizagens, experiências e formação, esta disciplina foi um potencializador
para minha aprendizagem dos aspectos e as características das Lutas de maneira geral. Ao longo da disciplina pude
compreender que as várias expressões de Lutas possuem características semelhantes, apesar de cada uma delas apresentarem
suas especificidades (Hélio Gracie).

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Que bom que no decorrer da disciplina, nós conseguimos aprender um pouco sobre as lutas/artes marciais. Foi dado início
com uma introdução sobre a temática, onde o objetivo foi conhecer os conceitos e as características (Amanda Ribas).

Muito bom, o fato de termos conseguido dar continuidade a disciplina de Pedagogia das Lutas, em razão da pandemia. Os
textos abordados durante a disciplina foram de extrema importância para esclarecer muitos conceitos sobre a luta, como, por
exemplo; suas características, suas semelhanças, maneiras de aplicação prática nas aulas [...] (Yvone Duarte).

Depreende-se dos três excertos expostos o fato de alguns dos/as futuros/as professores/as de Educação
Física interpretarem o trabalho conceitual relativo às Lutas/Artes Marciais como significativo, notadamente
no tocante à compreensão de seus princípios condicionantes (características) os quais adjudicam distinguir
e aproximar os saberes concernentes a essas práticas corporais (historicamente situadas), de igual modo
estruturar uma planificação em termos pedagógicos (Gomes, Morato, Duarte e Almeida, 2010; Pereira et al.,
2020; Pereira et al., 2021). Logo, essa verificação nos permite estabelecer a ilação da presença de mobilização
intelectiva na direção de apropriação dos conceitos discorridos, no momento da formação inicial dos/as
investigados/as, malgrado nem todos/as explicitarem tal acontecimento nos relatos.
Essa apropriação conceitual confere, de alguma maneira, aos aspirantes à docência, condição pedagógica
para desenvolver o conteúdo na escola, haja vista que o escamoteamento do conteúdo na formação inicial
incide na ausência de seu ensino, de acordo com Rufino (2018), muito embora a apropriação epistêmica não
afiance sua presença no interior do trabalho pedagógico desenvolvido nas aulas de Educação Física.
Ainda na esteira do primeiro ponto (lê-se “Que bom”), outros participantes enalteceram as tematizações
relativas: as questões de gênero, as competições infantis e a discriminação socioeconômica em práticas
esportivas vinculadas ao universo das Lutas/Artes Marciais, sejam nos encontros virtuais ou nas atividades
escritas. Na continuidade alguns fragmentos textuais revelam essa questão:
[...] trouxe à tona temas sociais relevantes (gênero, violência, classe social, mídia, dentre outros), que podem e devem ser
problematizados e discutidos para promover o ensino das lutas/artes marciais (Cris Cyborg).

A questão de gênero também foi assunto de nossas aulas, através do filme “Menina de Ouro” podemos analisar como ainda
na sociedade moderna há preconceitos baseados em estereótipos, muitos ainda enxergam as lutas somente para o público
masculino, sendo que mulheres não devem lutar. Contudo, movimentos como o feminismo, sinalizam à igualdade de gênero,
defendendo que mulheres podem estar onde elas quiserem (Luana Azulguir).

Uma questão debatida na disciplina muito importante foi a da competição; os modelos historicamente construídos pelos
adultos, modelos baseados, muitas vezes, no alto rendimento e na busca por resultados (a qualquer preço), sobretudo pela
famigerada vitória. Fato que acaba, por sua vez, prejudicando os sujeitos envolvidos, principalmente as crianças; a questão da
especialização precoce; supervalorização da competição; a questão de como pensar a competição na infância e como trabalhar
de forma pedagógica com as crianças (Anderson Silva).

Como se vê, suscitar tematizações correlacionando às Lutas/Artes Marciais denota uma perspectiva de
formação alvissareira, a despeito de desafiadora, porquanto fomenta igualmente conflitos, já que coloca em
debate aspectos relevantes da sociedade, todavia expõe preconceitos, crenças e convicções. A esse respeito,
explana Castro (2014, p. 20) “importa menos o que as aulas dizem sobre os/as autores/as, os conceitos, e
mais como as/os estudantes, em relação com as palavras e conceitos desses/as autores/as, podem formar e
transformar suas palavras, suas ideias, seus saberes”. Complementa sua explicação dizendo “como as aulas
podem ajudar a pensar e sentir o que ainda não foi possível pensar e sentir. Nessa experiência as/os estudantes
podem encontrar com suas próprias fragilidades, vulnerabilidades e ignorâncias, sua própria impotência”. Em
última análise são reflexões – a respeito de problemáticas sociais – cujo ideal de educação assenta-se sob o
preceito da emancipação, consoante a Freire (2002).
Além disso, há avaliações indicando à importância deste conteúdo em qualquer ambiente de formação,
embora a ênfase recaia-se na escola, justamente porque corresponde a um saber pertencente ao acervo
da cultura corporal de movimento (Bracht, 2005). Na sequência têm-se dois relatos recomendando essa
perspectiva.

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O ensino das lutas na escola ou em centro de treinamentos é de extrema importância tanto na formação motora como
psicológica e social dos educandos, uma aula bem elaborada pode contribuir tanto no desenvolvimento motor dos alunos,
assim como no quesito psicológico e social, formando um ser de maneira integral (Flavio Canto).

[...] aprendemos como ensinar, tratar e problematizar as lutas dentro do âmbito escolar. Percebemos que embora ainda
haja aspectos que limitam ensinar lutas através da Educação Física escolar, basta adaptar à realidade da escola, levando em
consideração aspectos socioculturais dos alunos ou os problemas relacionados à infraestrutura (Gabi Garcia).

No fragmento textual produzido por Gabi Garcia, nota-se à mobilização do saber no que se refere ao
ajuste do conteúdo ao contexto escolar específico, demonstrando “pequenas marcas formativas” resultante
do contato com a disciplina Pedagogia das Lutas. Quanto a isso glosam Pires, do Nascimento, Farias e
Suzuki (2017) que marcas deixadas no processo de formação inicial de professores de Educação Física podem
interferir no desenvolvimento profissional e atuação ulterior.
Houve, além disso, um realce presente em alguns relatos referente ao encontro no qual se expôs
movimentos corporais característicos de alguma modalidade marcial, com demonstrações de elementos
tático-técnicos pelo regente do componente curricular. Ao que tudo indica, para os/as acadêmicos/as,
existiu uma valorização das aulas nas quais se versava à construção de experiências corporais, mesmo
em condição remota (virtualidade). Muito provavelmente corresponda a uma valorização do movimento
corporal, no sentido do ‘aprender fazer para saber ensinar’, uma perspectiva, segundo Figueredo (2007),
cuja aprendizagem marca o corpo de maneira profícua. Aliás, de acordo com o autor, a escolha do curso de
Educação Física, via de regra, está relacionada diretamente com as práticas corporais vivenciadas ao longo
da existência, razão pela qual os/as participantes enalteceram os encontros (virtuais) cuja temática suscitava
algum tipo de movimentação ou realização de movimento, malgrado às limitações da condição remota.
Apresentado os destaques relativos aos aspectos assertivos da pedagogia universitária, pelos quais houve
possibilidades de apropriação dos conteúdos desenvolvidos, adentramos no segundo ponto cujo objetivo
consistia em vasculhar os obstáculos e impedimentos do processo formativo, referenciado pela expressão:
“Que pena”. Em linhas gerais as críticas foram dirigidas para a carência de contato e de experiências corporais
relacionadas às Lutas/Artes Marciais, conforme revela o excerto da avaliação a seguir:
Foi um pouco frustrante não poder realizar a disciplina presencialmente, mas o professor e seus auxiliares fizeram o máximo
que puderam para amparar e suprir essas necessidades. Torço para que em breve seja possível nos encontrar e desfrutar das
coisas boas que o contato físico nos permite. (Kyra Gracie)

Na passagem citada, constata-se o desapontamento de Kyra com o ensino remoto, não por falta de
conhecimentos relacionados ao saber ensinar, mas, sim, pela ausência do contato físico. A discente patenteia
o fato de o contato proporcionar “coisas boas”, trata-se de uma verificação cujo indicativo oportuniza inferir
que nenhuma outra condição de ensino substitui à presencial, ao menos no que diz respeito ao ensino de
práticas corporais. Soa como uma espécie de desabafo sua manifestação textual. Similar a ela, essa questão foi
sublinhada por outro/as aprendizes:
Como desafios do processo de ensino aprendizagem eu destacaria primeiramente a questão de estarmos limitados por uma
tela em virtude do momento que atravessamos, acho que a falta do contato presencial seria o primeiro desafio no ensino
aprendizagem da disciplina, até porque se trata de uma disciplina de prática corporal em que o contato dos indivíduos é
fundamental para elucidar aspectos importantes das Lutas/Artes Marciais (Caín Velásquez).

Infelizmente não tivemos a prática nesta matéria – exceto em alguns momentos demonstrativos –, devido ao caos gerado
pela pandemia. Acho que faz e fez bastante falta à troca de experiência que ocorre dentro da sala de aula, pois gosto assaz
dessas matérias, principalmente quando há a parte prática (Gabi Garcia).

Uma pena não termos tido a possibilidade de realizá-la presencialmente, pois as dinâmicas práticas ajudariam muito para
uma melhor assimilação dos conteúdos. Mas vale destacar que as aulas práticas demonstradas pelos convidados foram de
extrema importância, facilitando, em muito, à aprendizagem. Assim, mesmo não sendo possível realizar a prática, o “assistir”
também ajudou muito na compreensão (Ronda Rousey).

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Fica marcado nos fragmentos textuais a necessidade dos/as acadêmicos/as realizarem corporalmente –
uma espécie de aprendizagem encarnada – os jogos e as práticas de Lutas/Artes Marciais, tendo em vista que
isso robusteceria os saberes e experiências preconizadas na disciplina. Ao trazer o contexto da prática corporal
à baila no processo de formação de professores de Educação Física, Quaranta e Pires (2013) identificaram
que a falta de vivências corporais e saberes pedagógicos – principalmente no início do curso –, obscurece
a mobilização da aprendizagem na direção de ressignificar ou romper com empirias e representações
precedentes ao Ensino Superior. No caso, em questão, não notamos a ausência de desconstrução no que diz
respeito às perspectivas arraigadas que antecederam o ingresso ao curso, ao menos não fica nítido nos materiais
(empíricos) escrutinados.
Muito bem, esgotado os aspectos referentes aos desafios examinou-se o terceiro ponto proposto na
avaliação, sendo ele de natureza mais propositiva, a partir da indagação: “Que tal?”. Tratava-se do momento
cujos participantes deveriam apresentar propostas ou ideias frente aos desafios cotejados, a fim de aquilatar
os processos de aprendizagem formulados na oferta – atual e ulterior – da disciplina. À semelhança dos
apontamentos expostos no segundo ponto – obstáculos e impedimentos do processo formativo, a partir da
expressão: “Que pena” –, os relatos indicam à carência de experiências corporais, sendo a mesma resolvida
com a ampliação da quantidade de aulas, pari passu com a intensificação da participação efetiva do coletivo
de aprendizes, conforme se vê de agora em diante.
Como sugestões ao processo de ensino da disciplina eu acho que seria legal ter mais experiências práticas nos encontros,
pois proporcionaria uma participação mais efetiva dos alunos a refletirem todos juntos e a entender melhor a teoria;
disponibilizaria como subsídios filmes, seriados e até mesmo desenhos para elucidar melhor determinadas Lutas e Artes
Marciais, os jogos de oposição, contexto histórico, etc. (Caín Velásquez).

Que tal nos próximos períodos, caso continuarmos ainda estivermos remotamente, a ministração de mais aulas envolvendo
a prática de outros professores, como foi com os professores Alex, Alysson e Gustavo (Amanda Ribas).

Os relatos assinalam para o fato das aulas cuja teorização foi construída a partir da vivência de jogos de
oposição e vivências demonstrativas (dimensão procedimental do conteúdo), tenham potencializado uma
compreensão mais elaborada sobre os próprios conceitos (dimensão conceitual). Em que pesem os limites,
ao que parece, a disciplina conferiu subsídios – teórico-metodológicos – de modo que os/as aspirantes à
docência desenvolveram saberes concernentes às Lutas/Artes Marciais na escola, entretanto, segundo eles,
as experiências corporais poderiam ser ampliadas. Houve, além disso, discentes que não sugeriram nenhum
tipo de mudança ou acréscimo à disciplina, haja vista entenderem a conjuntura na qual o processo formativo
transcorrera, à face disso contemplou todas as expectativas, tal qual evidencia o próximo fragmento textual.
Diante do processo, não mudaria nada, pois no meu entendimento o conteúdo foi trabalhado de forma sistematizada e
abordando de forma claro, como a modalidade Luta deve ser trabalhada na escola, assim como as diversidades, desafios,
obstáculos, resistência que são encontradas nas aulas de educação física (Rickson Gracie).

O relato reconhece o contexto (e suas fragilidades) sobre o qual o ensino remoto híbrido e/ou a distância
decorreu, ainda assim, denota assertividade na proposta formativa, na medida em que não propõe adequações.
A esse respeito, Lazzarotti Filho, Silva, Lisbôa e Pires (2013) e Pimentel (2014) advertem para a possibilidade
dos cursos de Educação Física fomentarem o ensinar a partir de ferramentas virtuais diversas, rompendo com
modelos tradicionais de ensino baseado no “saber fazer-ensinar”.
Concluindo o último ponto proposto na avaliação, ter-se-ia o momento cujos aprendentes discorreriam a
respeito das impressões extraídas de todo o processo formativo, descrevendo os limites e possibilidades para o
ensino de Lutas/Artes Marciais no contexto remoto, contudo ao invés de apresentá-lo neste espaço o faremos
nas impressões finais, de maneira a usá-lo na qualidade de uma “moldura” para o encerramento do estudo.

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À guisa de conclusão

Conforme se aludiu anteriormente, a última propositura da disciplina ‘Pedagogia das Lutas’ alvidrou uma
espécie de processo autoavaliativo. De modo geral houve relatos com argumentos e questões díspares. Alguns
alegaram não terem conseguido acompanhar à disciplina em sua totalidade, limitando-se a apreciação dos
aportes teóricos. Outros declararam o acompanhamento dos encontros sincronamente, embora tenham
deixando de elaborar as atividades indicadas para nutrir os debates e fomentar a inteligibilidade dos conteúdos
desenvolvidos nos encontros.
Adiciona-se a isso, enunciados justificando o absenteísmo dos encontros em razão de ocupação laboral,
na tentativa de complementar o orçamento familiar, em virtude de adoecimento ou desemprego dos/as
entes. Ademais existiram agradecimentos dedicados ao professor e convidados, com destaque em relação ao
empenho para fornecer uma formação a qual fizesse sentido em face de tantas adversidades.
Em termos de limites a ênfase reincidiu na “falta de contato corporal”, o tema mais recorrente em todos
os relatos, com efeito, acabou se configurando como o grande desafio para o ensino de Lutas/Artes Marciais
na escola, residindo na principal crítica endereçada à disciplina. Com a ressalva dele (lê-se o toque) figurar
na qualidade de uma das características da prática corporal em questão, lembrando a explanação de Gomes
(2008), a respeito do contato intencional, oponente/alvos, imprevisibilidade e fusão ataque/defesa, portanto,
requerendo a participação de outrem na atividade.
No plano da virtuosidade tem-se a proeminência dos autores selecionados na qualidade de aporte teórico
da disciplina, com realce à relação do conteúdo com temas de relevância social e a questão de fornecerem
subsídio epistemológico para o desenvolvimento do trabalho pedagógico pensando as diferentes etapas
de ensino. Houve referência ao modo de condução dos encontros, em especial, quando às propostas em
atividades “práticas”. A título de elucidação dos assuntos arrolados erigiu-se uma tabela cujo teor sintetiza-
os, doravante:
TABELA 2
Possibilidades e desafios para o ensino de Lutas.

Fonte: elaborada pelos autores.

Ora, se os obstáculos listados serão sobrepujados, quer em uma nova edição do componente curricular,
quer no desenvolvimento da docência dos/as futuros/as professores/as, não se pode afiançar, no entanto,
a síntese construída ao menos indica um exercício reflexivo dos/as acadêmicos/as, de modo a evocar
conscientização e granjear mudanças para o aprimoramento do ensino das Lutas/Artes Marciais na escola.

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Esperamos assaz cuja investigação até aqui descrita, permita, de algum modo, lançar rebento para se
pensar as injunções imputadas à docência em tempos de pandemia e se some a outras contribuições para
compreender o complexo campo da formação docente, notadamente sob conformação remota. Nosso
intento, em última análise, consistiu em perscrutar uma experiência docente no tocante ao ensino de Lutas/
Artes Marciais, observando um contexto específico, reconhecendo suas limitações – algumas, inclusive
descritas em outros momentos do trabalho – e potencialidades, todavia coerente com a perspectiva de
articular pesquisa e formação (Demo, 2004).

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Proyecto académico sin fines de lucro, desarrollado bajo la iniciativa de acceso abierto
ISSN 2318-5104 | e-ISSN 2318-5090
CADERNO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE
Physical Education and Sport Journal
[v. 16 | n. 1 | p. 179-184 |2018]
RECEBIDO: 05-04-2018
APROVADO: 14-05-2018

ENSAIO
DOSSIÊ LUTAS

As lutas na educação física escolar:


um ensaio sobre os desafios para sua inserção
The fights in scholar physical education: an essay on the challenges for its insertion
DOI:

Gabriela Simone Harnisch, Lizete Wasem Walter, Shayda Muniz de Oliveira Guilherme,
Bruna Poliana Silva, Ana Laura Fischer Lottermann, Douglas Roberto Borella

Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste)

RESUMO
Trata-se de um ensaio que teve como objetivo discursar acerca dos desafios para a inserção do conteúdo lutas na educação
física escolar. As lutas, apesar de contempladas nos documentos norteadores da educação física escolar, ainda carecem de
maior atenção, tendo em vista que, muitos empecilhos ainda são elencados para a mesma ser desenvolvida nas escolas. Sendo
assim, sugere-se que as lacunas evidenciadas quanto à formação de professores em relação às lutas e a disponibilidade de
materiais e espaços sejam sanadas, bem como, que a relação das lutas com a violência seja cada vez menos presente perante
a comunidade escolar. Espera-se que este estudo possa suscitar a comunidade acadêmica quanto ao assunto para que tal
conteúdo seja desenvolvido, conforme previsto na literatura e nos principais documentos que regulamentam a Educação Física
no Brasil.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Física; Lutas; Escola.

ABSTRACT
It is an essay aiming to address the challenges for the insertion of content fights in physical education classes. The fights,
although contemplated in the guiding documents of physical education classes, still lack more attention, considering that many
obstacles are still listed for it to be developed in schools. Therefore, it is suggested that the gaps evidenced regarding teacher
training in relation to the fights and the availability of materials and spaces be solved, as well as, that the relationship of fights
with violence be less and less present before the school community. It is hoped that this study may stimulate the academic
community on the subject so that such content is developed, as predicted in the literature and in the main documents that
regulate physical education in Brazil.
KEYWORDS: Physical Education; Fights; School.

Direitos autorais são distribuídos a partir da licença


Creative Commons
(CC BY-NC-SA - 4.0)
HARNISCH et al.
180 As lutas na educação física escolar: um ensaio sobre os desafios para sua inserção

INTRODUÇÃO

Com o objetivo de proporcionar o acesso à cultura corporal do movimento e/ou às práticas corporais, a
Educação Física foi inserida enquanto componente curricular nas escolas regulares brasileiras (BRASIL, 1997).
Para que o acesso fosse possível, os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN’s sugeriram cinco conteúdos: jogos,
esportes, danças, ginásticas e lutas. Recentemente, tais conteúdos foram revistos no mais novo documento
norteador da educação brasileira: a Base Nacional Comum Curricular - BNCC, no qual as lutas, foco do presente
estudo, permaneceram (BRASIL, 2017).
A prática das lutas é uma atividade tão antiga quanto os jogos, na civilização humana. A partir da
arqueologia, encontram-se indícios dos primórdios da humanidade nos mais diferentes cantos do mundo,
pinturas em cavernas, paredes, jarros que descrevem a práticas das lutas, essas que por sua vez em cada lugar,
praticadas de maneiras distintas umas das outras (ANTUNES, 2016).
Sobre tal conteúdo, justifica-se a importância de sua inserção nas escolas de modo que, além de dar
acesso a esta prática corporal, a mesma pode ser um elemento canalizador da violência, podendo melhorar o
repertório motor a partir de novos movimentos (BREDA et al., 2010; GOMES, 2008; RUFINO; DARIDO, 2015)
Todavia, muitos professores de Educação Física não desenvolvem o conteúdo lutas. Estes justificam
que existem diversos motivos para que isso aconteça, desde a falta de preparo para ministrar tal conteúdo,
a associação das modalidades pela sua temática a violência, e mesmo pela ausência de roupas e espaços
adequados (BARROS; GABRIEL, 2011; HARNISCH et al., 2017; RUFINO; DARIDO, 2015).
Contrapondo tal discurso, Campos (2014) reflete que trabalhar as lutas é uma oportunidade para
discutir acerca da violência, com suas causas, consequências e mecanismos para evitar tal. Ainda, trata-se de
uma oportunidade de desenvolver mais uma prática possível na Educação Física Escolar, explorando todos os
princípios da corporeidade.
Assim, o objetivo do presente estudo foi de discursar acerca dos desafios para a inserção do conteúdo
lutas na Educação Física Escolar. Para alcançar o objetivo proposto, os procedimentos metodológicos pautaram-
se em um ensaio com base nas principais literaturas e autores do tema.

AS LUTAS NOS DOCUMENTOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO FÍSICA

Um dos documentos pioneiros na educação física escolar, no que tange os seus conteúdos e as práticas
pedagógicas para o seu desenvolvimento, é a obra “Metodologia do ensino de Educação Física”, idealizado pelo
Coletivo de Autores. Neste, as lutas não estavam contempladas enquanto um único conteúdo, mas a capoeira
constava como uma das manifestações da cultura corporal de movimento, juntamente com as ginásticas,
danças, jogos e esportes (SOARES et al., 1991).
Neste documento fica clara a importância da capoeira na história do país, quanto ao contexto dos negros
no período Brasil escravocrata. Ao longo deste período, a capoeira era desenvolvida em todos os seus sentidos
escondidos, camuflados em cada gesto de harmonia do golpe com a música (SOARES et al., 1991).

A Educação Física brasileira precisa, assim, resgatar a capoeira enquanto manifestação cultural, ou seja,
trabalhar com a sua historicidade, não desencarná-la do movimento cultural e político que a gerou
(SOARES et al, 1991, p.76).

Mais tarde, nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1997), formularam conteúdos, dentre outras
sugestões, que norteassem a Educação Física nas escolas brasileiras. Neste documento, voltado aos ensinos
fundamental e médio, os professores deveriam desenvolver jogos, esportes, ginásticas, atividades rítmicas e
expressivas, conhecimentos sobre o corpo, bem como, as lutas (BRASIL, 1997).
Deste modo, as lutas foram tratadas enquanto

Disputas em que o(s) oponente(s) deve(m) ser subjugado(s), mediante técnicas e estratégias de
desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão de um determinado espaço na combinação de ações
de ataque e defesa. Caracterizam-se por uma regulamentação específica, a fim de punir atitudes de
violência e de deslealdade (BRASIL, 1997, p. 37).

Ademais, fica evidente nos PCN’s que se tem uma preocupação para com o espaço adequado necessário
não somente para a aplicação do conteúdo lutas, mas também para com os demais conteúdos. Porém esse

Caderno de Educação Física e Esporte, Marechal Cândido Rondon, v. 16, n. 1, p. 179-184, jan./jun. 2018.
http://e-revista.unioeste.br/index.php/cadernoedfisica/index
HARNISCH et al.
As lutas na educação física escolar: um ensaio sobre os desafios para sua inserção 181

desfalque não impossibilita que os professores consigam adaptar os espaços disponíveis para a realização de
seu trabalho, um contexto comum até mesmo com os alunos que vivem suas infâncias adaptando minicampos
de futebol nas ruas dos bairros onde moram (BRASIL, 1997).
Assim como os demais conteúdos, o conteúdo de lutas deve ser utilizado com a finalidade de desenvolver
as capacidades físicas, aprimorar as habilidades motoras, bem como, um material para apreciação dos
alunos, de modo que possam expressar suas opiniões quanto a estratégias e atitudes a serem utilizadas em
determinadas situações (BRASIL, 1997).
Além disso, Matos et al. (2015) corroboram que as diretrizes curriculares de vários Estados preveem o
ensino das Lutas nas aulas de Educação Física, tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio.
De forma mais recente, a Base Nacional Comum Curricular - BNCC, o mais novo documento norteador
da Educação Física, também contempla as lutas, juntamente com as danças, ginásticas, esportes, brincadeiras
e jogos e as práticas corporais de aventura. Neste, cada conteúdo deve ser desenvolvido de acordo com oito
dimensões: experimentação, uso e apropriação, fruição, uso e reflexão, construção de valores, análise e
compreensão, protagonismo comunitário (BRASIL, 2017).
Quanto ao foco no desenvolvimento do conteúdo lutas, a BNCC

focaliza as disputas corporais, nas quais os participantes empregam técnicas, táticas e estratégias
específicas para imobilizar, desequilibrar, atingir ou excluir o oponente de um determinado espaço,
combinando ações de ataque e defesa dirigidas ao corpo do adversário. Dessa forma, além das lutas
presentes no contexto comunitário e regional, podem ser tratadas lutas brasileiras (capoeira, huka-
huka, luta marajoara etc.), bem como lutas de diversos países do mundo (judô, aikido, jiu-jítsu, muay
thai, boxe, chinese boxing, esgrima, kendo, etc.) (BRASIL, 2017, p. 176).

Com tais constatações é possível perceber que as lutas, do mesmo modo que os demais conteúdos,
devem ser tratadas não somente enquanto uma prática a ser reproduzida, mas também, como um modo de
reflexão de sua inserção na comunidade e suas contribuições para outros aspectos da formação humana, que
vão além do âmbito físico e motor.
Sendo assim, confirma-se a relevância de trabalhar com o conteúdo lutas, amplamente refletidas nos
principais documentos que norteiam a Educação Física Escolar no Brasil. Apesar da, ainda, não obrigatoriedade
em seguir as propostas de tais documentos, compreende-se o quanto estes podem contribuir para os
professores e, consequentemente, para a formação dos alunos que frequentam as escolas brasileiras.

DESAFIOS PARA A INSERÇÃO DO CONTEÚDO LUTAS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Apesar de, conforme explanado anteriormente, as lutas apresentarem grande relevância enquanto
conteúdo da Educação Física Escolar, muitos professores ainda não desenvolvem o mesmo devido a diversos
empecilhos elucidados pelos mesmos. Dentre estes, destaca-se a relação das lutas com a violência, as lacunas
na formação de professores em relação as lutas, a ausência de espaços e materiais e espaços adequados,
dentre outros (BARROS; GABRIEL, 2011; BREDA et al., 2010; CAMPOS, 2014; MATOS et al., 2015; RUFINO;
DARIDO, 2015).
A inclusão das lutas no currículo real da Educação Física estabelece dependências com a formação
dos professores em relação a esse conteúdo (MATOS et al., 2015). Todavia, os professores universitários que
ministram essa disciplina na graduação, em sua maioria, tiveram contato com alguma modalidade especifica
na condição de praticante. Sendo assim, esse professor restringe suas aulas em apenas uma modalidade, não
desenvolvendo o conteúdo de modo que os graduandos possam compreender os aspectos pedagógicos do
ensino das lutas de forma global no âmbito escolar (DEL VECCHIO; FRANCHINI, 2006).
Sobre isso, Matos et al. (2015, p. 125) refletem sobre os problemas elencados acerca da formação de
professores em relação as lutas, de modo que

As experiências dos professores que colaboraram com esta pesquisa indicam a necessidade de revisão
das disciplinas que tratam do conteúdo Lutas nos cursos de Educação Física. O aumento da carga horária
ou inclusão de novas disciplinas nos currículos podem contribuir na qualificação dos futuros professores.
O ensino tecnicista parece não atender à realidade escolar, ao mesmo tempo os professores reclamam
por mais experiências práticas durante a formação inicial, por isso, propostas que não sejam centradas
nas técnicas formais mas que, ao mesmo tempo, não negligenciem o fazer corporal presentes nas Lutas
possam concorrer para que as Lutas se façam mais presentes no currículo real das escolas.

Caderno de Educação Física e Esporte, Marechal Cândido Rondon, v. 16, n. 1, p. 179-184, jan./jun. 2018.
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HARNISCH et al.
182 As lutas na educação física escolar: um ensaio sobre os desafios para sua inserção

Entende-se assim que, para desenvolver este conteúdo no ambiente escolar não é necessário que o
professor tenha amplos conhecimentos sobre modalidades especificas de lutas. Mas, que possua os conceitos
básicos para sentir-se competente para recriar sua prática e atuar de maneira transformadora (MATOS et al.,
2015; RUFINO; DARIDO, 2015).
Para sanar lacunas em relação à formação inicial de professores para o trabalho com o conteúdo lutas,
sugere-se que estes busquem a formação continuada, ou seja, o aperfeiçoamento em cursos de extensão
universitária, em momentos oferecidos pelas escolas, secretarias de educação ou até mesmo por entidades
diretamente ligadas às lutas (BETTI; SO, 2009; CAMPOS, 2014; HARNISCH et al., 2017; MAZINI FILHO et al.,
2014; MATOS et al., 2015).
É necessário que os professores de Educação Física participem de cursos de qualificação e aprimoramento
da temática “lutas na escola”, pois assim poderão agregar mais estratégias técnicas e lúdicas de se abordar o
conteúdo, esgueirando-se dos esportes tradicionais, que na maioria das vezes é o olhar principal das aulas de
Educação Física (MAZINI FILHO et al., 2014).
Além de dificuldades oriundas da formação inicial deficitária, outro empecilho para o desenvolvimento
das lutas na escola é a associação deste conteúdo à violência (BARROS; GABRIEL, 2011). Os participantes da
pesquisa de Matos et al. (2015), que relataram não desenvolver tal conteúdo justificaram que a oferta de
atividades relacionadas às lutas estimularia atitudes inadequadas para a convivência, como a agressividade.
De modo contrário, na pesquisa realizada por Mazini Filho et al. (2014), nenhum dos professores
participantes consideraram as lutas enquanto elemento fomentador de violência e agressividade, sugerindo
assim maior conscientização dos professores, por meio de palestras educativas, vídeos específicos e aulas
práticas conduzidas de forma que sejam respeitados os oponentes e as regras se fazem necessárias para
criações de alunos com um perfil contrário à violência.
Sendo assim, Breda et al. (2010), sugerem que não se permitam agressões relacionadas aos gestos
técnicos de modalidades de luta, conforme se observa em filmes e desenhos, mas ensinar os alunos a conviver
com a agressividade, não prejudicando-se e nem mesmo, prejudicando aos colegas.
Campos (2014) ressalva que o debate sobre a violência e a agressividade deve ser frequente em aulas
de Educação Física, aprimorando questões da concentração, da preservação da integridade física e até do
relaxamento, considerando que uma das características importantes das lutas é a paciência.
Outro aspecto importante a ser destacado é a ausência de espaços e materiais adequados. Quanto a
isso, as pesquisas de Gomes (2008) e Rufino; Darido (2015), idealizaram propostas pedagógicas para o ensino
das lutas a partir do ensino global, e não se focando em modalidades especificas. Para que este ensino fosse
possível em ambiente escolar, os autores propõem a utilização de materiais alternativos, como a substituição
de tatames por colchonetes; sacos de pancada por bexigas; espadas de metal por jornal, dentre outros. Lopes
e Kerr (2015) ainda destacam que a partir dessas práticas pedagógicas não existe a necessidade do professor
de Educação Física ser especialista em alguma modalidade de luta para poder ensiná-la.
Ou seja, independente das dificuldades que os professores possam vir a ter para lecionarem as lutas
dentro do conteúdo da Educação Física Escolar, estes ainda podem recorrer a inúmeros recursos como vídeos,
palestras, atividades lúdicas, aulas de campo de modalidades diversificadas, conhecimento da história de cada
modalidade, seus ídolos, regras, países onde são mais difundidas, visitas técnicas dentre outras. Importante
enfatizar que o mais importante é a vontade de fazer algo diferente (MAZINI FILHO et al., 2014).
Para tanto, Fabiani, Scaglia e Almeida (2016) ainda sugerem a adoção do jogo de faz de conta enquanto
recurso facilitador da aprendizagem das lutas. Desta maneira, segundo os autores,

O professor será um personagem imprescindível no processo de construção e ressignificação dos saberes,


tradições, gestos e valores. [...] criando uma teia de significados e conhecimentos que transcenda e ao
mesmo tempo se utilize do tradicional, pois a história e a cultura de determinados grupos sociais são
essenciais para a apropriação dos saberes referentes à Luta (p. 139).

Sendo assim, destaca-se a importância das lutas como parte da cultura humana, representando um
meio eficaz de educação e um conjunto de conteúdos altamente importante para a Educação Física escolar,
pois, qualquer que seja a modalidade de luta, exige respeito às regras, a hierarquia e a disciplina, valorizando
a preservação da saúde física e mental de seus praticantes. As lutas, assim como os demais conteúdos da
Educação Física, devem ser abordadas na escola de forma reflexiva, direcionada a propósitos mais abrangentes
do que somente desenvolver capacidades e potencialidades físicas (OLIVEIRA; REIS FILHO, 2013).
Rufino e Darido (2013) à guisa de defender esta ideia da inserção das lutas nas escolas abordam que o

Caderno de Educação Física e Esporte, Marechal Cândido Rondon, v. 16, n. 1, p. 179-184, jan./jun. 2018.
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HARNISCH et al.
As lutas na educação física escolar: um ensaio sobre os desafios para sua inserção 183

professor de Educação Física deve ter consigo a compreensão da importância deste conteúdo, já que o mesmo
faz parte da cultura corporal, e por esse motivo os alunos devem ser oportunizados a vivenciá-lo, de modo que,
com a prática, o professor e o aluno possam aprender e progredir juntos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Levando em consideração o objetivo do estudo, argumenta-se o fato de que todos os desafios superados
até hoje foi por conta das pessoas, percebendo sua importância, se proporem a enfrentar tal situação. Na
Educação Física não foi diferente.
Portanto, quando levado em consideração o conteúdo lutas, que ainda é menosprezado nas escolas, é de
extrema importância que o professor de Educação Física se envolva com o mesmo, procurando se aprofundar
no assunto, superar as dificuldades de ausência de espaço e vestimenta adequada, bem como da visão do
senso comum que retrata as lutas como sinônimo de violência. Assim, envolvendo-se na mudança para uma
nova realidade. Realidade esta que, finalmente, atenderá aos documentos que a citam enquanto conteúdo
contemplado dentre as práticas corporais a serem desenvolvidas nas aulas de Educação Física Escolar.
Por fim, espera-se que com este estudo novas ideias e propostas pedagógicas para o ensino das lutas no
ambiente escolar sejam idealizadas, testadas e amplamente utilizadas por professores de Educação Física, de
modo a tornar as lutas cada vez mais disseminadas e compreendidas pela sociedade enquanto manifestação
da cultura corporal de movimento.

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contemporaneidade. In: ANTUNES, M. M.; ALMEIDA, J. J. G. Artes marciais, lutas e esportes de
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Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1991.
____________________________________

Autor correspondente: Gabriela Simone Harnisch


E-mail: agaby_@hotmail.com

Recebido: 05 de abril de 2017.


Aceito: 14 de maio de 2018.

*****

Caderno de Educação Física e Esporte, Marechal Cândido Rondon, v. 16, n. 1, p. 179-184, jan./jun. 2018.
http://e-revista.unioeste.br/index.php/cadernoedfisica/index
2022, Retos, 44, 846-857
© Copyright: Federación Española de Asociaciones de Docentes de Educación Física (FEADEF) ISSN: Edición impresa: 1579-1726. Edición Web: 1988-2041 (https://recyt.fecyt.es/index.php/retos/index)

A configuração do conteúdo Lutas na Educação Física escolar: análise dos contextos espanhol e
brasileiro
Content configuration Combat Sports in school Physical Eeducation: analysis of spanish and
brazilian contexts
La configuración de contenidos de Luchas en Educación Física escolar: análisis de contextos
español y brasileño
*Riqueldi Straub Lise, **José Francisco López-Gil, *Fernando Renato Cavichiolli
*Universidade Federal do Paraná (Brasil), **Universidad de Murcia (España)

Resumo: O objetivo deste estudo é, em uma perspectiva comparada, compreender as diferenças e semelhanças acerca da
efetividade do conteúdo Lutas nas aulas de Educação Física da Espanha e do Brasil. Para tanto foram analisadas as principais
legislações que regulamentam os currículos escolares de ambos os países; o Real Decreto, na Espanha, e a Base Nacional
Comum Curricular, no Brasil. Em complemento a essa análise documental foram elencadas algumas pesquisas correlatas ao
tema, cujo propósito consiste na verificação do cumprimento das normativas legais acerca do conteúdo de Lutas nas escolas.
Notou-se, a partir das fontes selecionadas para este estudo, que existem, nos dois países, legislações robustas preconizando o
ensino de Lutas nas aulas de Educação Física. No entanto, algumas pesquisas apontam para o fato de que esse conteúdo
raramente está presente nas aulas de Educação Física, devido a alguns fatores restritivos, tais como: falta de estrutura, incapacidade
dos professores, vinculação com violência.
Palavras-chave: Lutas; Esportes de combate; Educação Física; Escola; Currículo Escolar.

Abstract:The objective of this study is to understand the differences and similarities regarding the effectiveness of the content
Combat Sports in Physical Education classes in Spain and Brazil, in a comparative perspective.To this end, the main laws that
regulate school curricula in both countries were analyzed – the Royal Decree, in Spain, and the National Common Curricular
Base, in Brazil. In addition to this documentary analysis, some researches related to the theme were listed. The purpose of
theses researchs was to verify compliance with legal regulations regarding the content of combat sports in schools. We
concluded that there are, in both countries, robust laws recommending the teaching of combat sports in Physical Education
classes. However some researches point to the fact that this content is rarely present in Physical Education classes, due to some
restrictive factors, such as: lack of structure, incapacity of teachers, connection with violence.
Keywords: Combat sports; Physical Education; School; School program.

Resumen: El objetivo de este estudio es, desde una perspectiva comparada, comprender las diferencias y similitudes en
cuanto a la efectividad de los contenidos de Lucha en las clases de Educación Física en España y Brasil. Para ello, se analizaron
las principales leyes que regulan los planes de estudios escolares en ambos países; el Real Decreto, en España, y la Base
Curricular Común Nacional, en Brasil.Además de este análisis documental, se enumeraron algunas investigaciones relacionadas
con el tema, cuyo propósito es verificar el cumplimiento de la normativa legal sobre el contenido de Luchas en las escuelas.
Se señaló, a partir de las fuentes seleccionadas para este estudio, que existen, en ambos países, leyes robustas que recomiendan
la enseñanza de peleas en clases de Educación Física. Sin embargo, algunas investigaciones apuntan a que este contenido rara
vez está presente en las clases de Educación Física, debido a algunos factores restrictivos, como: falta de estructura, incapacidad
de los profesores, vinculación con la violencia.
Palabras clave: Luchas; Deportes de combate; Educación Física; Colegio; Planes de estudios.

Introdução Educação Física na Espanha e no Brasil. Sabe-se que


os sistemas de ensino de cada um desses dois países
A ideia para a elaboração deste artigo surge da se constituem a partir de tradições socioculturais
curiosidade dos autores em compreender como o singulares, e isto vai se refletir na maneira pela qual
conteúdo de Lutas é desenvolvido nas aulas de elementos da cultura corporal serão incluídos ou su-
primidos enquanto unidades temáticas das aulas de
Educação Física. Provém justamente dessas
Fecha recepción: 20-02-21. Fecha de aceptación: 29-12-21 diferenças, o interesse em tentar apreender de que
Riqueldi Straub Lise
liseriqueldi@gmail.com forma os variados conteúdos temáticos são contem-

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plados, ou não, no decorrer dessa disciplina. Confor- que terão caráter global e inclusivo (MECD, 2013);
me estudo de López-Gil, Hercules e Cavichiolli compreendendo uma faixa etária entre 6 e 12 anos.
(2019), o qual preconiza que constatar semelhanças Essa etapa divide duas seções: a primeira, que varia
ou diferenças, identificar problemas e qualidades, da primeira a terceira série; e a segunda seção, da
fundamentar críticas e tensionar as normativas que quarta à sexta série. O objetivo do Ensino Funda-
nor teiam os caminhos da Educação Física em mental é proporcionar aos alunos o aprendizado da
territórios tão distantes – Brasil e Espanha – pode expressão e compreensão oral, leitura, escrita, cál-
ser o primeiro passo para a estruturação de culo, aquisição de noções básicas de cultura, o hábito
proposições cujo sentido está assentado no da coexistência, bem como de estudo e trabalho, o
aperfeiçoamento dessa disciplina. Dessa forma en- senso artístico, a criatividade e a afetividade, a fim
tender como a Educação Física está estruturada nos de garantir um treinamento abrangente que
currículos escolares de ambos os países e identificar contribua para o pleno desenvolvimento da
de que forma o conteúdo de Lutas apresenta-se personalidade dos alunos e prepará-los para Educação
enquanto unidade temática das aulas dessa disciplina, Secundária Obrigatória (MECD, 2013).
pode auxiliar nesta tarefa. Uma disciplina presente em todas as séries da
Tendo em vista a amplitude do tema, as exigências Educação Básica é a Educação Física, cujo principal
curriculares e as diferenças das divisões anuais da objetivo é desenvolver nas pessoas sua competência
escolaridade em ambos os países, logo percebeu-se a motora, entendida como «a integração de
necessidade de estabelecer um recorte que, embora conhecimentos, procedimentos, atitudes e
arbitrário, tornasse possível que as análises estivessem sentimentos ligados fundamentalmente ao
circunscritas às crianças com idade entre 6 e 14 anos. comportamento motor». Da mesma forma, confor-
Na Espanha este nível de escolaridade refere-se a me indicado no Real Decreto 126/2015, que
Etapa de Educação Primária (6 e 12 anos) e no Brasil estabelece o currículo básico do ensino fundamental,
corresponde ao Ensino Fundamental (6 a 14). [...] para sua realização, a mera prática não é su-
O objetivo deste estudo é, em uma perspectiva ficiente, mas é necessária uma análise crítica para
comparada, compreender as diferenças e semelhanças fortalecer atitudes, valores relacionados ao corpo,
acerca da efetividade do conteúdo Lutas nas aulas de movimento e relacionamento com o meio ambien-
Educação Física entre esses dois países. Nesse senti- te. Dessa forma, os alunos serão capazes de contro-
do, este estudo se pauta na análise dois principais lar e entender suas próprias ações motoras, enten-
documentos que normatizam os conteúdos der os aspectos perceptivos, emocionais e cognitivos
curriculares; na Espanha o Real Decreto (RD) 126/ relacionados a essas ações e gerenciar os sentimentos
2015 (Ministerio de Educacion, Cultura y Deporte, a eles relacionados, além de integrar conhecimentos
[MECD], 2014) e no Brasil a Base Nacional Comum e habilidades transversais, como trabalhar em equi-
Curricular (BNCC). A BNCC é um documento de pes, fair play e respeito às regras, entre outros. Da
caráter normativo que define o conjunto orgânico e mesma forma, o EF está vinculada à aquisição de
progressivo de aprendizagens essenciais que todos os competências relacionadas à saúde por meio de ações
alunos devem desenvolver ao longo das etapas e que auxiliam na aquisição de hábitos responsáveis
modalidades da Educação Básica. Normatiza a pela atividade física regular e na adoção de atitudes
adequação dos currículos regionais e das propostas críticas em relação a práticas sociais não saudáveis.
pedagógicas das escolas públicas e particulares (MECD, 2014, p. 48).
brasileiras (Ministério da Educação [MEC], 2017). As A Educação Física no Estágio da Educação Primária
análises presentes nesse estudo se fundamentam nos tenta capacitar os alunos a descobrir seu potencial
preceitos teóricos da Análise documental (Cellard, motor, à medida que desenvolvem habilidades mo-
2008). toras básicas. Para isso, é necessário colocar em
prática várias habilidades motoras, atitudes e valo-
Compreendendo a Educação Física no con- res em correlação com o corpo, por meio de vários
texto curricular: Espanha e Brasil contextos de ensino-aprendizagem, onde a
experiência pessoal e em grupo nas diferentes
Na Espanha, a etapa da Educação Primária variações de atividades possibilita adaptar o
compreende seis séries e está organizada em áreas, comportamento motor a situações diferentes (López-

Retos, número 44, 2022 (2º trimestre) - 847 -


Gil, 2018; Romero-Chouza et. al, 2020; Alonso et. tal devem consolidar os aprendizados advindos do
al, 2020; Mateos, Pérez López & Marzo, 2021). ensino infantil além de propiciar a ampliação de
Durante esta etapa, a competência motora deve práticas necessárias ao desenvolvimento sociocultural
permitir ao aluno entender a realidade do seu corpo, dos estudantes. Já nos anos finais do Ensino Funda-
bem como suas possibilidades; desenvolvendo habili- mental os alunos se deparam com desafios de maior
dades motoras básicas com a prática, aumentando sua complexidade visando ampliar o repertório físico
complexidade à medida que os próximos níveis são cognitivo dos estudantes, os preparando para a próxi-
avançados. As atividades convenientes e o papel do ma fase da escolaridade, o ensino médio (MEC, 2017).
professor de Educação Física contribuirão para o Presente em todos os anos do Ensino Fundamen-
desenvolvimento de relações sociais com o grupo de tal no Brasil, a Educação Física é definida como «Com-
pares, bem como de certos valores, como respeito, ponente curricular que tematiza as práticas corporais
cooperação, hábitos de esforço, trabalho em equipe, em suas diversas formas de codificação e significação
etc. (López-Gil, 2018; Alonso et. al, 2019; Romero- social, entendidas como manifestação das
Chouza et. al, 2020; Santesmases, 2020). Da mesma possibilidades expressivas dos sujeitos, produzidas por
forma, para o desenvolvimento dessa competência diversos grupos sociais no decorrer da história».
motora, o jogo constitui uma ferramenta fundamen- (MEC, 2017, p. 213). Com sentido de organizar os
tal nesse período para induzir aprendizado adequado, conteúdos das práticas corporais que devem ser con-
devido à sua natureza motivadora; capacitar os alunos templados pela Educação Física ao longo dos nove
a refletir e analisar o que está acontecendo, além de anos do Ensino Fundamental, foram estabelecidas pela
facilitar a implementação de estratégias para trans- BNCC seis unidades temáticas, sendo elas:
ferir conhecimentos úteis em outras situações (López- Brincadeiras e Jogos, Esportes, Ginásticas, Danças,
Gil, 2018). Lutas e Práticas corporais de aventura. Vale ainda
Com relação ao conteúdo da área da Educação destacar que os conteúdos Brincadeiras e Jogos,
Física, o RD 126/2014 estabelece que esse assunto Danças e Lutas, devido principalmente a extensão
deve oferecer variadas situações e contextos de territorial e evidentes diversidades culturais, devem
aprendizagem, razão pela qual recomenda que os ele- ser elaborados e ministrados de acordo com a
mentos curriculares da programação temática sejam intensidade da influência deste tipo de manifestação
estruturados em torno de cinco situações motoras social, de acordo com os costumes e hábitos de cada
diferentes. Como podemos ver, eles são derivados região. Em consonância com a BNCC, outros docu-
da classificação fornecida por Parlebas (1988) com mentos em caráter estadual e municipal, tais como
base na incerteza causada pelo parceiro, pelo opo- exemplo: o Referencial Curricular do Paraná (Se-
nente e pelo meio ambiente. Assim, os elementos cretaria de Estado da Educação do Paraná [SEED],
curriculares da programação da disciplina de Educação 2018) e as Diretrizes Curriculares para a Educação
Física podem ser estruturados em torno de cinco Municipal de Curitiba (Secretaria Municipal de
situações motoras diferentes, sendo: ações motoras Educação [SME], 2006), respectivamente, reforçam
individuais em ambientes estáveis, ações motoras em a inclusão das seis unidades temáticas como conteúdo
situações de oposição, ações motoras em situações curricular obrigatório na Educação Física.
de cooperação, com ou sem oposição, ações motoras
em situações de adaptação ao ambiente físico e ações Ensino dos Desportos de Combate (DDCC)
motoras em situações de natureza artística ou
expressiva. Os Despor tos de Combate (DDCC) se
Já no Brasil, o Ensino Fundamental, previsto na constituem em um fenômeno de grande interesse
Base Nacional Comum Curricular (BNCC), tem atual devido ao aumento significativo de sua prática
duração de 9 anos e é a etapa mais longa da Educação nos últimos anos, bem como ao elevado número de
Básica. Via de regra, os estudantes que frequentam estudos relacionados a essa temática, especialmente
regularmente esta fase da escolaridade possuem en- entre crianças e adolescentes (Loftian, Ziaee, &
tre 6 e 14 anos. Esta etapa é dividida em dois perío- Mansournia, 2011; van Bottenburg, Rijnen, & Van
dos, os anos iniciais, entre o primeiro e o quinto ano, Sterkenburg, 2005; Vertonghen & Theebom, 2010;
e os anos finais, entre o sexto e o nono ano. Segundo Vertonghen, Schaillée,Theeboom, & de Knop, 2015;
esta legislação, os anos iniciais do ensino fundamen- Pereira et. al, 2017; Simões et. al, 2020).

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Dentro dessas situações ou ações motoras já men- Ao longo do terceiro, quarto e quinto anos, a BNCC
cionadas anteriormente, podemos ver como nas indica que sejam trabalhados dois objetos de
«ações motoras em situações de oposição», o RD conhecimento, «Lutas do contexto comunitário e
126/2014 se refere a jogos de luta e até judô. No regional e Lutas de matriz indígena e africanas»
entanto, sua implementação no currículo da Educação (MEC, 2017, p. 228). Com relação as lutas no con-
Física espanhola ainda carece de uma presença mais texto comunitário e regional não há, na
significativa (Camerino, Gutiérrez, & Prieto, 2011; documentação, a indicação de modalidades específi-
Menéndez & Fernández-Río, 2014a, 2014b; León- cas, tendo em vista questões referentes a influência
Díaz et. al, 2020). cultural de algumas lutas em determinadas regiões
Em consonância com o exposto, em uma do Brasil, a modo de exemplo pode-se aqui citar o
investigação realizada na Espanha em 2003, foi indi- judô, o muay-thai, o jiu-jitsu com influência marcante
cado que apenas 2 a 6% dos alunos haviam realizado nos estados da região sul do Brasil. Já na região nor-
aulas de DDCC durante a escolaridade (Gutiérrez, deste a capoeira e o boxe possuem tradição cultural
Espartero, Pacho & Villamón, 2003). Nesse sentido, marcante. Em alusão às lutas de matrizes indígenas e
o trabalho de Theeboom e De Knop (1999) ofereceu africanas a BNCC indica que sejam trabalhados o huka-
uma visão global da situação dos DDCC nos currículos huka, luta na qual os oponentes iniciam a luta em pé,
escolares de vários países europeus, onde na Espanha se agarrando pela cintura, até que um consiga
apenas se destaca com a presença do judô. No entanto, derrubar o outro ao chão, o vencedor abre os braços
em termos gerais, os DDCC não são imersos regu- e dança em volta do oponente, cantando e imitando
larmente nos currículos de Educação Física da Espanha uma ave (Brasil Oeste, 2004), a luta marajoara cujo
(Menéndez, 2017). objetivo consiste em sujar de barro as costas do opo-
No que se refere ao conteúdo Lutas, consideran- nente (Santos & Freitas, 2018), e por fim a capoeira.
do o contexto brasileiro, a BNCC o entende como, Vale aqui ressaltar que com exceção à capoeira, tan-
[...] disputas corporais, nas quais os participantes to o huka-huka quanto a luta marajoara são
empregam técnicas, táticas e estratégias específicas praticamente desconhecidos nas referidas regiões
para imobilizar, desequilibrar, atingir ou excluir o (Santos & Freitas, 2018).
oponente de um determinado espaço, combinando No sexto e sétimo ano (crianças com 11 e 12 anos)
ações de ataque e defesa dirigidas ao corpo do devem ser trabalhados as Lutas do Brasil e no oitavo
adversário. Dessa forma, além das lutas presentes no e nono ano (crianças com 13 e 14 anos) Lutas do
contexto comunitário e regional, podem ser trata- mundo. As Lutas do Brasil referem-se aos mesmos
das lutas brasileiras (capoeira, huka-huka, luta objetos de conhecimento propostos para as Lutas de
marajoara etc.), bem como lutas de diversos países matriz indígenas e africanas, ou seja, o huka-huka, a
do mundo (judô, aikido, jiu-jítsu, muay thai, boxe, luta marajoara e a capoeira. Já para a temática Lutas
chinese boxing, esgrima, kendo etc.) (MEC, 2017, p. do mundo sugere-se o ensino do judô, jiu-jitsu, muay-
218). thai, boxe, boxe chinês, esgrima, kendô, entre outras.
A inclusão desta unidade temática como conteúdo Nota-se ainda que ao longo do oitavo e do nono
obrigatório da Educação Física escolar se deu a par- ano, além das modalidades previstas no conteúdo de
tir do entendimento de que as lutas no Brasil se Lutas existe ainda a determinação de inclusão dos
constituem como um importante elemento da cul- Esportes de combate, parte integrante do conteúdo
tura corporal nacional. Dessa forma incluí-la na escola, Esportes, havendo a indicação das modalidades judô,
considerando os cuidados didáticos pedagógicos, se- boxe, esgrima, tae-kwon-do, entre outros.
ria, segundo a BNCC, imprescindível no sentido de Tendo em vista os dados acima postos é possível
propiciar aos alunos da rede nacional de ensino uma afirmar com certa precisão que as diretrizes
educação totalizante, plural e crítica. curriculares referentes ao conteúdo Lutas na escola
Sobre o conteúdo Lutas na Educação Física cons- são amplas e detalhadas, indicando aos professores
tante na Base Nacional Comum Curricular é possível inclusive quais e quando os conteúdos devem ser
constatar que esta unidade temática está ausente nos trabalhados ao longo do Ensino Fundamental. Embora
dois primeiros anos do Ensino Fundamental (crianças a BNCC preconize uma normatização robusta com
de 6 e 7 anos), sendo iniciada a partir do terceiro ano sentido de amparar o ensino do conteúdo de Lutas
e permanecendo até o último ano (dos 8 aos 14 anos). durante o percurso da escolaridade brasileira, a

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aproximação às práticas diárias da Educação Física, de estudos que analisaram as possibilidades do DDCC
revela um panorama um tanto adverso. Pesquisas nessa área (Espartero, Gutiérrez , & Villamón, 2005;
apontam que o ensino deste conteúdo é negligenciado, Robles, 2008; Tejero-González, Balsalobre-
mal executado e majoritariamente excluído das au- Fernández, & Ibáñez-Cano, 2011; Tejero-González,
las de Educação Física (Carreiro, 2008; Rufino & Ibáñez-Cano, & Pérez-Alonso, 2008; Villamón,
Darido, 2015; Nascimento & Almeida, 2007; Gutiérrez & Espartero, 2005) Da mesma forma, no
Ferreira, 2006; Leite, Borges & Dias, 2012; Matos nível internacional, também é notável o número de
et al, 2015; Campos, 2014), situação muito investigações realizadas (Alencar, Silva, Lavoura &
semelhante a conjuntura espanhola. Drigo, 2015; Brown & Johnson, 2000; Chyu, Feng,
Esperat, & Ochoa, 2010; Figueiredo, 2009; Lakes &
Fatores restritivos para a prática de Lutas Hoyt, 2004; Twemlow & Sacco, 1998; Zivin et al.,
na Educação Física escolar 2001; Pereira et. al, 2017).
Apesar do judô ser a arte marcial mais utilizada
Na Espanha, em relação as principais causas da na área da Educação Física, seja no contexto espanhol
ausência desses conteúdos na disciplina Educação Fí- (Espartero et al., 2005; Villamón et al., 2005) ou no
sica, destacam-se fundamentalmente os seguintes mundo inteiro (Simões, Gomes & Avelar -Rosa, 2012;
aspectos: a formação acadêmica de professores pelas Theeboom & de Knop, 1999), existem evidências de
Universidades, as instalações e materiais disponíveis trabalhos que aplicaram vários tipos de DDCC nessa
nos centros educacionais, interesses e demandas dos área, tais como: autodefesa (Potenza, Konunkman,
alunos, experiências e interesses anteriores dos Yu, & Gümü’dag, 2014;Tejero-González et al., 2011,
professores, falta de propostas didáticas aplicáveis e, Tejero-González et al., 2008), aikidô (Levine, 1995),
até mesmo, a alta quantidade de preconceitos e kickboxing (Menéndez & Fernández-Río, 2014a,
estereótipos aos quais esse tipo de ensino está sujeito; 2014b; Fernández-Río & Menéndez, 2017),
geralmente concebido como comportamento violen- taekwondo (Turkmen, 2013), kung-fu (Alencar et al.,
to, agressivo ou anti-social (Casterlanas, 1990; Ro- 2015), capoeira (Hortiguela, Gutiérrez-García, &
bles, 2008; Ortíz et. al, 2018; Sosa et. al, 2020; Hernando, 2017), boxe (Barbouchi, 2007), esgrima
Simões et. al, 2020;Villaverde-Caramés et. al, 2021). (Ruiz, 2012), tai chí (Wright, 2001), luta (Destanni,
Essa questão é ainda mais acentuada quando se Hanon, Podlog & Brusseau, 2014), sumô (Alencar et
trata de espor tes mais próximos do esporte al., 2015) ou karatê (Szopa et al., 2004).
espetacularizado, com maior perigo e aspereza A acentuada importância dos jogos e esportes
(Durán & Pardo, 2006), do que de natureza educa- coletivos é prejudicial para outros tipos de conteúdos,
cional (Gutiérrez, 1998). A consequência final é a resultando na perda de diversidade no currículo
criação de um clima cheio de medos que reduz as (Treanor, Graber, Housner, & Wiegand, 1988). Os
possibilidades de introduzir esses conteúdos de for- currículos da Educação Física não apenas precisam
ma educacional por profissionais da área (Menéndez estimular o aprendizado motor variado, mas também
& Fernández-Río, 2014b). Nesse sentido, essas fornecer aos alunos uma ampla gama de conteúdos
atividades de combate são aquelas que sofrem maior que incutem neles uma certa cultura esportiva
descrédito social; em parte produzido pelas (Camerino et al., 2011). Por esse motivo, a
informações estereotipadas as quais a mídia apóia implementação dos DDCC como conteúdo educa-
(Castarlenas, 1990; Menéndez & Fernández-Río, cional pode trazer benefícios substanciais, tanto no
2014b). nível educacional quanto no motor, conceitual e
Além disso, os DDCC sempre foram práticas atitudinal (Menéndez, 2017).
associadas ao gênero masculino e, apesar da renovação Mesmo concordando que as lutas se configuram
pedagógica que tentou promover práticas esportivas como um importante elemento da cultura corporal
coeducativas e neutras, ainda continuam ligadas ao brasileira é preciso ressaltar que em termos de
sexo masculino (Camerino et al., 2011; Pereira et. popularidade, massificação e tradição escolar, sua
al, 2017; Simões et. al, 2020). expressão é considerada menor se comparada a outras
Apesar de, como mencionado acima, a presença práticas corporais, tais como alguns esportes
dessas práticas ser muito limitada nos currículos de coletivos, em especial o futebol (Araújo; Rocha;
Educação Física da Espanha, têm um grande número Bossle, 2018). Em uma crítica ao recente passado da

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Educação Física no Brasil, alguns autores afirmam ter estado baiano é de muita proximidade com a luta de
existido no país uma monocultura do futebol que capoeira.
praticamente inviabilizou o ensino de outras práticas Com sentido de compreender os motivos da re-
corporais na escola, e mais do que isso, este fenômeno cusa em efetivar o conteúdo Lutas nas escolas, alguns
hegemônico, representado pelo futebol, ainda não autores (Nascimento & Almeida, 2007; Ferreira,
apresenta indícios inequívocos de ter sido superado 2006; Matos et al., 2015), constataram, por meio de
(Nascimento & Almeida, 2007; Araujo, Rocha & entrevistas com os docentes, a existência de elemen-
Bossle, 2018). tos restritivos para tais práticas. Entre os principais
Para constatar esta argumentação não é necessário argumentos elencados pelos docentes de Educação
muito esforço, ao se observar aulas de Educação Físi- Física estão a precariedade da estrutura física das
ca nas escolas nota-se que a unidade temática escolas, a vinculação do conteúdo lutas com questões
Esportes, entendida geralmente por futebol, obtém relacionadas à violência e por fim, a falta de vivência
primazia sobre todas as outras (Araújo, Rocha & e de competências necessárias para ministrar este
Bossle, 2018). Não é incomum autores discorrerem tipo de conteúdo por parte do profissional em
sobre esse tema, principalmente teorizando sobre Educação Física. Quanto à precariedade na estrutura
algumas possíveis motivações para esta realidade, física das escolas, os docentes alegam não haver, na
desde a centralidade do futebol enquanto elemento maioria delas, um espaço adequado para as práticas
identitário nacional, passando pelo processo de de lutas, tais como tatames ou mesmo um piso
espetacularização da modalidade, a forte tradição adequado que reduza os riscos de lesões em caso de
cultural e até mesmo considerando as facilidades en- quedas. Além disso existem relatos recorrentes acer-
contradas pelos educadores físicos para ministrar tal ca da ausência de materiais necessários para estas
conteúdo (Araújo, Rocha & Bossle, 2018). Não se práticas tais como luvas, capacetes ou ainda sacos de
tem aqui a pretensão de espraiar um debate sobre areia, especialmente em modalidades que envolvam
essas questões relacionadas ao futebol na escola, mas elementos de percussão como socos e chutes (Alencar
apenas mencionar a existência de um esforço et al., 2015).
institucional, em referência a BNCC, no sentido de Outro elemento restritivo recorrente nas falas
alterar o atual panorama da Educação Física no país dos docentes está relacionado a vinculação do
inserindo práticas menos tradicionais na escola como conteúdo Lutas com violência. No estudo conduzido
as Ginásticas, as Danças e principalmente as Lutas. por Ferreira (2007) 17,64% dos professores
No Brasil, estudos elencaram outros fatores afirmaram que o conteúdo Lutas é inadequado ao
restritivos para a prática das lutas em ambiente es- ambiente escolar por se tratar de uma forma de in-
colar. Em pesquisa realizada por Ferreira (2006) centivo a violência. Tal percepção possivelmente se
envolvendo 50 professores da rede pública e privada deva ao atual estágio de espetacularização e de
da cidade de Fortaleza, capital do estado do Ceará, visibilidade obtido por esportes de combates, em
região nordeste brasileira, foi constatado que 68% especial nas mídias televisivas brasileiras. Na última
deles nunca ministraram o conteúdo de lutas. De década, por exemplo, houve no Brasil um aumento
maneira análoga, Leite; Borges; Dias (2012) ao en- exponencial da audiência e de visibilidade midiática
trevistar alunos do Ensino Fundamental de escolas do Mixed Martial Arts (MMA), esse acréscimo de
públicas da cidade de Araguaína, estado do Tocantins, público se deu em decorrência do sucesso de lutadores
região norte do Brasil, verificou que 80% deles nun- brasileiros na referida modalidade (Lise, 2018). Por
ca haviam participado de aulas de Educação Física vezes, esta exposição acompanhada de uma narrativa
cujo conteúdo fosse Lutas. Matos, et al (2015) ao en- espetacularizada, com ênfase nos nocautes, nas
trevistar professores de escolas públicas do Vale do contusões, nos sangramentos e na agressividade dos
Jiquirí, região localizada no interior do estado da Bahia, lutadores, propicia uma percepção de violência e
região nordeste brasileira, conclui «[...] as Lutas, brutalidade que tangenciam as impressões acerca dos
como em outras localidades, ainda são pouco presen- esportes de combate de uma maneira geral (Madu-
tes nas aulas de Educação Física nesta região da Bahia, ro, 2015).
sobretudo experiências pedagógicas de vivências Em relação ao argumento de que boa parte dos
corporais» (Matos et al., 2015, p. 131).Vale ressaltar, professores não ministram o conteúdo de Lutas na
que a imagem que os próprios brasileiros têm do escola por conta da falta de vivência e de

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competências necessárias, requer um pouco mais de internacionais.
atenção. Conforme a normatização preconizada pela Conscientes desse cenário desfavorável em relação
BNCC, há a necessidade de que professores dominem ao ensino de Lutas nas escolas brasileiras, alguns au-
aspectos particulares formais, técnicas e tores têm proposto alternativas em contraposição às
regulamentações, de cada uma das modalidades exigências da BNCC. Autores (Rufino, 2012; Rufino
propostas, tais como judô, jiu-jitsu, muay-thai, boxe, & Darido, 2015; Cartaxo, 2013; Santos, 2018; Cam-
capoeira, taekwondo, entre outras. Professores pos, 2014; Souza Junior, Oliveira & Santos, 2010;
relatam que ao longo do processo formativo Souza Junior & Santos, 2010) sugerem que o ensino
universitário na categoria licenciatura, o conteúdo de Lutas nas escolas se distancie de conteúdos técni-
de Lutas, por vezes, se encontra ausente ou na cos e formais de modalidades específicas e se aproxi-
condição de disciplina optativa. Quando esta discipli- me de uma abordagem pedagógica com ênfase na
na tem caráter obrigatório, todo conteúdo é ludicidade e em elementos genéricos que valorizem
ministrado em apenas um semestre letivo, totali- valências físicas gerais e habilidades básicas para o
zando 60 horas/aula, o que, segundo os professores é ensino das lutas. São os chamados jogos de combates,
insuficiente para a apreensão de aspectos técnicos, jogos de oposição ou brincadeiras de lutas, embora
regulamentares e pedagógicos das Lutas (Rufino & não contemplem exatamente a proposição da BNCC,
Darido, 2015). Ou seja, a partir deste argumento é podem colaborar para o estabelecimento de uma
possível inferir que a ausência do conteúdo de Lutas cultura corporal das Lutas no ambiente escolar
na escola é consequência de uma lacuna na (Gomes et al., 2013; Lopes & Kerr, 2015).
estruturação dos currículos universitários (Hegele, Uma das principais características dos jogos de
González & Borges, 2018). Além disso, os professores lutas consiste na categorização das diversas modali-
do Ensino Fundamental obser varam que os dades de esportes de combate em apenas três tipos,
professores universitários responsáveis por ministrar tendo como elemento fundamental a distância
a disciplina de Lutas, via de regra, são especialistas (Gomes, 2008). Assim as modalidades são classificadas
em pelo menos uma modalidade e geralmente em lutas que envolvem elementos de curta, média e
restringem seus ensinamentos aos aspectos técnicos longa distância com implementos. São habilidades de
e formais de um esporte de combate específico, li- curta distância; agarrar, empurrar, derrubar,
mitando a vivência prática dos alunos em modalida- imobilizar, entre outros. Dinâmicas de média
des distintas. Esta situação se reproduz nas escolas, distância seguem uma lógica de tocar seu oponente
tendo em vista que normalmente quem desenvolve sem ser tocado por ele, evitando assim elementos
o conteúdo de Lutas possui uma formação esportiva de percussões tais como chutes e socos. E dinâmicas
extracurricular, adquirida em academias especiali- de longa distância com implementos produzidos pe-
zadas no ensino de esportes de combate (Santos, 2018; los próprios alunos, tendo como matéria prima
Nascimento & Almeida, 2007; Maduro, 2015). jornais, plásticos, entre outros materiais que pela
Outro elemento que corrobora indiretamente maleabilidade não tendam a causar lesões. Dessa
com a argumentação dos docentes está no fato de maneira é possível propor jogos e brincadeiras que
que existe uma escassez de produções acadêmicas que enfatizem apenas elementos gerais das lutas, sem
tematizem o conteúdo das Lutas no ambiente esco- priorizar especializações exigidas pela BNCC.
lar. Em um estudo elaborado por Correia e Franchini
(2010), foi constatado que apenas 2,93% das produções Considerações finais
publicadas em revistas acadêmicas de circulação na-
cional discorrem sobre a temática Lutas. Desse Ao longo deste estudo foi possível notar diversas
percentual somente 10,7% tratam de aspectos semelhanças entre a efetivação dos conteúdos Lutas
voltados para a Pedagogia do Movimento Humano, nas aulas de Educação Física escolar na Espanha e no
tais porcentagens levam os autores a concluir que Brasil. A principal delas consta no fato de que, em
existe uma carência de publicações desta natureza ambos os países, este conteúdo é subministrado ou
em periódicos nacionais, dificultando o mesmo negligenciado aos alunos entre os 6 e 14 anos.
aprofundamento teórico prático dos professores. No Este cenário pode ser explicado a partir de alguns
entanto, conforme já ressaltado anteriormente, este fatores restritivos, relatados pelos próprios
tipo de produção é profusa em periódicos científicos professores, tais como; estrutura precária e ausência

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de materiais, formação acadêmica deficitária dos J., (2015). As lutas no ambiente escolar: uma
professores, falta de interesse de alunos e docentes, proposta de prática pedagógica. Revista Brasileña
tendo em vista a preferência por jogos coletivos, em de Ciencia y Movimiento, 23(3), 53-63. http://
especial aqueles com bola, a concepção de prática doi.org/10.18511/0103-1716/rbcm.v23n3p53-
violenta e inadequada ao ambiente escolar, entre 63
outras. Alonso, S. F., Da Vila Alonso, A., & Díaz, J. R. (2019).
No caso brasileiro ainda há outro agravante, a El atletismo en pista: propuesta didáctica para su
proposição da BNCC de certa forma implica em um integración en la Educación Primaria (Track and
processo de especialização e de valorização de aspec- field: didactic proposal for its integration in
tos técnicos formais de modalidades de Lutas especí- primary education). Retos, 37, 731-737. https://
ficas.Tal fato, pode se converter em fator desfavorável doi.org/10.47197/retos.v37i37.71328
para aqueles que não possuem especialização em Araújo, S. N., Rocha, L. O., & Bossle, F. (2018). So-
alguma modalidade de esporte de combate. Vale aquí bre a monocultura esportiva no ensino da
ressaltar que a BNCC representa um avanço no sen- Educação Física na escola. Pensar a Prática. 21(4),
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persiste tendo em vista a formação acadêmica Recuperado de http://www.brasiloeste.com.br/
deficitária dos docentes. 2004/11/modalidades/
A partir deste cenário um tanto problemático, Brown, D., & Johnson, A. (2000). The Social Practice
torna-se necessário repensar alguns aspectos relacio- of Self-Defense Martial Arts: Applications for
nados ao conteúdo Lutas na Educação Física escolar, Physical Education. Quest, 52(3), 246-259. https:/
para que, este importante elemento da cultura cor- /doi.org/10.1080/00336297.2000.10491713
poral não seja suprimido dos conteúdos curriculares. Camerino, O., Gutiérrez, A., & Prieto, I. (2011).
O primeiro deles faz menção à necessidade de des- La inclusión de las actividades de lucha en la pro-
vincular o ensino de lutas na escola das práticas de gramación de la educación física formal. Tándem.
lutas formais, especialmente no caso brasileiro. Em Didáctica de la educación física, 37, 92-99. Recupe-
segundo lugar torna-se imprescindível repensar as rado de: http://www.observesport.com/
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Revista de Educação, Ciência e Cultura (ISSN2236-6377)
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Canoas, v. 25, n. 2, 2020
http://dx.doi.org/10.18316/recc.v25i2.6471

A Educação Física nos Anos Finais do Ensino Fundamental: Desa os, experiências e
possibilidades para o ensino das lutas na escola

Physical Education in the Final Years of Elementary School: Challenges, Experiences, and
Possibilities for Teaching School Struggles

João Augusto Galvão Rosa Costa1


Dinah Vasconcellos Terra2

Resumo: Este relato de experiência parte das aulas de Educação Física com duas turmas do 6º ano do Ensino
Fundamental em uma escola situada no Município de Duque de Caxias, Rio de Janeiro. Teve como objetivo
compreender a partir das estratégias didáticas organizadas pelo professor das turmas como os jogos de oposição
podem contribuir no desenvolvimento de uma proposta introdutória para o ensino das lutas. Usou - se a observação
participante com Gil (2002) e as imagens como registro. Entendeu-se que os jogos de oposição foram ferramentas
do processo de conhecimento, abordagem e proposta da temática luta no contexto das turmas do sexto ano. Como
resultados, a ludicidade, as atitudes e valores trabalhados sobressaíram na verbalização dos alunos, re exões nas
rodas de conversa e nos grupos dos seminários, bem como as estratégias fundamentadas na dinâmica e regras dos
jogos que possibilitaram a introdução de elementos e movimentos de diversi cadas lutas.
Palavras-chave: Educação Física; Jogos de Oposição; Ensino Fundamental; Lutas.

Abstract: is experience report starts from Physical Education classes with two classes of the 6th grade of Elementary
School in a school located in Duque de Caxias, Rio de Janeiro. It aimed to understand from the didactic strategies
organized by the class teacher how the opposition games can contribute to the development of an introductory
proposal for the teaching of ghts. Participant observation with Gil (2002) and images were used as record. It was
understood that the opposition games were tools of the process of knowledge, approach and proposal of the theme
ght in the context of the sixth grade classes. As a result, playfulness, attitudes and values worked out stood out in
the students’ verbalization, re ections in the conversation wheels and seminar groups, as well as strategies based on
the dynamics and rules of the games that allowed the introduction of elements and movements of diverse struggles.
Keywords: Physical Education; Opposition Games; Elementary School; Fights.

Introdução

Quem nunca passou por uma situação de con ito na vida? Na escola, em casa, no trabalho, na rua?
Quem nunca viu ou ouviu uma discussão e achou que era briga? Mas o que é brigar?, O que é lutar?, O

1 Mestrando em Educação pela UFF. Professor da Rede Municipal de Duque de Caxias.


2 Doutora em Ciências da Educação. Mestrado em Educação Física. Graduação em Educação Física. Professora Associada IV
da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (Departamento SSE) e do Programa de Pós-graduação em
Educação da Universidade Federal Fluminense. Tem experiência na área Formação Pro ssional, atuando principalmente
nos seguintes temas: educação física escolar, formação pro ssional, planejamento e currículo. Editora da Revista Movimento
- Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense (2017-2020). Pesquisadora do Grupo de
Pesquisa Currículo, Docência e Cultura (CDC) - PPGEd/UFF. Atualmente é coordenadora do Programa de Pós-graduação
em Educação da Universidade Federal Fluminense. Orcid id: https://orcid.org/0000-0003-4589-3861
João Augusto Galvão Rosa Costa, Dinah Vasconcellos Terra

que é o con ito? O que é o Consenso? Os con itos ocorrem de que maneira?, Os con itos fazem parte do
processo educativo?, Nas aulas de Educação física escolar (Efe) como eles ocorrem? Quais são os fatores
que interferem ou não nesse processo? Que estratégias podem ser construídas para amenizar tais questões?.
Essas questões iniciais nos levam a pensar nos possíveis sentidos de con ito, visto que de acordo
com Vinha (2004), existem pessoas/grupos que seguem as normas/regras sociais, principalmente por
dois aspectos. O primeiro porque compreendem as regras enquanto um valor intrínseco de moralidade,
respeitando o próximo. O segundo porque existe o receio/medo das pessoas de, ao burlarem as normas,
serem descobertas e sofrerem penalizações sociais. Para Chrispino (2007), os con itos podem ocorrer
na sociedade em geral e no ambiente escolar por diversas motivações, ideológicas, de gênero, opiniões
divergentes e outras diversas situações.

O autor destaca ainda que o con ito signi ca a falta de compreensão entre duas ou mais partes. Isso
não signi ca necessariamente algo negativo, pois ao expor pontos divergentes em um con ito, “é possível
promover novas re exões que podem colaborar para a mudança de atitudes dos envolvidos” (CHRISPINO,
2007, p. 67). Esse direcionamento no processo de ensino e aprendizagem na escola deve ser mediado pelo
professor na sua prática pedagógica que neste caso estaremos problematizando no seio do componente
curricular Educação Física (EF).

Destacamos a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9.394/96 que rati ca a
Educação física escolar (Efe) como componente curricular da Educação Básica. Essa legislação fomenta
a participação e autonomia da disciplina no trabalho integrado ao currículo escolar – o que favorece
problematizar questões que as crianças apresentam durante as aulas, re exões perante as práticas
pedagógicas desenvolvidas, novos olhares e metodologias que proporcionem diversi cadas intervenções.

Nesse contexto, a Efe faz parte de um projeto maior como a rmam Mattos e Neira (2013), visto que
está situada em um contexto da escolarização básica território fundamental no desenvolvimento humano
e formação de um cidadão crítico e re exivo perante o contexto social em que vive. Na visão de Oliveira
(1994), a Educação Física evoluiu de uma prática reprodutivista e consensual para uma prática crítica e
con ituosa, tornando-se consequentemente uma prática social politizada.

Com isso, estabelecer estratégias de ensino, métodos e objetivos se constituem como processos
fundamentais para a construção, ressigni cação de qualquer conteúdo da área. No diálogo com Soares
(1992) podemos usufruir de inúmeras possibilidades de questionamentos ao pensarmos na cultura
corporal, visto que, dentro de seu objeto de estudo, a Educação Física desenvolve conteúdos como os jogos,
os esportes, as danças, a capoeira, as lutas, os conhecimentos do corpo e a ginástica.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Educação Física, PCN de EF (1997, p. 29) “introduzir e
integrar o aluno na cultura corporal de movimento, formando o cidadão que vai produzi-la, reproduzi-la e
transformá-la [...] em benefício do exercício crítico da cidadania e da melhoria da qualidade de vida”.
Dessa forma, estabelecemos como objetivo compreendera partir das estratégias didáticas organizadas
pelo professor como os jogos de oposição podem contribuir no desenvolvimento de uma proposta introdutória
para o ensino das lutas nas aulas de educação física escolar. Tem como pergunta: Como e quais elementos
favoreceram a vivência dos jogos de oposição no contexto da educação física escolar?.

290 RECC, Canoas, v. 25, n. 2, p. 307-318, julho, 2020.


A Educação Física nos Anos Finais do Ensino Fundamental: Desa os, experiências e possibilidades para o ensino das lutas na escola

Educação Física escolar e o ensino das lutas: os jogos de oposição em cena

Os Parâmetros Curriculares Nacionais PCN de EF, (1997) tratam os conteúdos dança, jogos,
ginástica, esporte e lutas como uma representação corporal das diversas culturas humanas que tenham
como característica o lúdico. Partindo deste entendimento, as lutas devem ser trabalhadas como estratégias
metodológicas que não visem apenas à técnica pela técnica, mas sim que a criança possa vivenciar os
aspectos corporais das lutas de uma maneira que lhes proporcione prazer e respeite sua individualidade,
relação com o mundo em que vive e seus saberes.

Ainda dialogando com esse documento percebemos que, “as lutas são atividades em que o
adversário deve ser subjugado com técnicas e estratégias de desequilíbrio, contusão, imobilização ou
exclusão, combinando movimentos de ataque e defesa” (BRASIL, 1998, p. 70). Nesse sentido, Ru no e
Darido (2011) argumentam que as lutas são atividades onde ocorrem disputas, sendo que um indivíduo
deve ganhar do outro, utilizando técnicas e táticas de desequilíbrio, dominação, imobilização ou exclusão
de um determinado espaço. Para isto utilizam-se técnicas e táticas de ataque e defesa.

Quando estreitamos nossa busca encontramos Santos (2012) que contribui nesse contexto ao
demarcar que os jogos de oposição existem desde a pré-história na humanidade. As formas corporais de
combate eram usadas pela sobrevivência e com o tempo as disputas por comida e território aumentaram.
Com isso, nos fortalecemos nos pressupostos deste mesmo autor pelo seguinte conceito:
[...] “os jogos de oposição caracterizam-se como uma atividade lúdica que envolve o confronto
entre duplas ou grupo, na qual cada participante tenha intenção de vencer ( sem valorizar o
contexto de competição para não excluir os “perdedores”) impondo-se ao outro pela tática, pelo
físico, sempre respeitando regras e convenções relativas à sua segurança e à de seu oponente,
sem jamais deixar de lado o componente lúdico e prazeroso, uma vez que os opositores são livres
para criar e ter o jogo como objetivo principal. Os jogos de oposição objetivam como qualquer
atividade de cunho educacional, formar indivíduos para o convívio social por meio de conteúdos
que passam por valores culturais, históricos, sociais e de gênero, e que podem ser ensinados pelo
movimento humano” (SANTOS, 2012, p. 41).

Essa ampla de nição nos permite pensar sua especi cidade dentro das propostas pedagógicas na Efe.
Os valores e o trabalho com as regras que esses jogos exteriorizam a possibilidade usá-los como ferramenta
educacional em diversas situações de aula, principalmente aquelas em que a violência e os con itos exacerbados
predominam. Logo, instrumentalizar os alunos para que desenvolvam conceitos, atitudes e valores constituem
como uma tarefa possível pela perspectiva da temática luta e os jogos de oposição.

Metodologia

O estudo é do tipo qualitativo, construído por meio de um relato de experiência (BAUER; GASKEL,
2012). Tal abordagem se justi ca na medida em que o objetivo principal é observar o fenômeno, descrevê-
lo e compreender o seu signi cado, a partir de relações estabelecidas entre os dados empíricos acumulados
e a literatura elencada.

Com ns de acompanhar o processo de ensino e aprendizagem proposto, utilizamos a observação


participante em Gil (2002), que se encerra na participação real do conhecimento na vida da comunidade,
do grupo ou de uma situação determinada. Nesse caso, o observador assume, pelo menos até certo ponto,

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João Augusto Galvão Rosa Costa, Dinah Vasconcellos Terra

o papel de um membro do grupo. Nesse caso, o professor integrado ao grupo de alunos em interação com
as observações realizou os registros acerca das situações nesse espaço e tempo escolar.

Ao voltarmos as anotações do caderno do professor, detectamos pelo texto registrado a transparência


de determinados elementos e questões como: o relacionamento dos alunos durante os jogos, a verbalização
com o colega, suas expressões, reações nas trocas entre os pares, organização nos coletivos, compreensão
da proposta e o diálogo com a turma nas rodas de conversas sobressaíram nas descrições sobre o contato
dos alunos com os jogos de oposição.

A partir da perspectiva da observação participante, realizamos uma seleção do material que foi
utilizado para composição da experiência em questão. Sobretudo, o conjunto de imagens registradas ao
longo das atividades desenvolvidas. Podemos re etir com Samian (2012) a respeito de como pensam as
imagens?. Tal problematização, nos ajuda a compreender que toda imagem na relação que o autor apresenta
traz consigo e é portadora de um pensamento.

Pode-se ainda apontar que toda imagem é viajante e nos provoca em viajar por uma trilha re exiva
que está ligada há um sistema de pensamento. “Essa espécie de ‘jogo de pensamento’ fomenta a ideia de
que a imagem está para além de um objeto” (SAMIAN, 2012, p. 54). A memória também surge nesse jogo,
visto que ao olharmos uma imagem as ideias/lembranças ligadas a ela voltam a se movimentar dentro
de nós e que nos convida a pensar na noção de tempo. Após identi carmos esse acervo, procurou-se
analisá-lo como fonte no sentido de recuperar as vivências, visto que as imagens ajudaram no processo de
rememoração do vivido por esse coletivo de alunos e a diálogo do professor com esses grupos discentes.
No segundo momento, iniciamos o processo de escrita da experiência em si, buscando problematizar
esses elementos de forma dialógica para além de uma mera descrição das imagens. Todavia, re etir sobre
essas observações que foram registradas durante e após as aulas ministradas, visto que favoreceram o
conjunto de elementos na experiência descrita.

A experiência dos jogos de oposição nos Anos Finais do Ensino Fundamental

Nesse cotidiano revelador e complexo diversas tramas/ cenários começaram a ser revelados com
os alunos do 6º ano. Tais questões surgiram na perspectiva de problematizar o desenvolvimento de uma
proposta de ensino fundamentada nos jogos de oposição e suas aproximações com as lutas nas aulas de
Educação Física em uma escola no Município de Duque de Caxias.

Essa escola localiza-se na região do primeiro distrito no centro da cidade. Recebe alunos que
residem nas periferias de Duque de Caxias e também do Município de São João de Meriti. Atende alunos
dos anos nais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano), Classe Especial e Educação de Jovens e Adultos
(EJA). Como professor dessa escola há dois anos no turno da tarde sempre lecionei para todos os anos de
escolaridade. Essa experiência foi construída durante o quarto bimestre de 2019 com duas turmas do sexto
ano. Cada turma em média possuía 20 a 30 alunos com faixa etária de 11 a 14 anos. Na 609, a média era em
torno de 16 meninas e 10 meninos. Já na 608, 17 meninos e 5 meninas.
Tivemos aproximadamente 12 aulas de 50 minutos com cada umas dessas turmas, onde foram
construídas estratégias a partir dos jogos de oposição na perspectiva de introduzir a temática lutas nas
aulas de Educação Física. Concordamos que:

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A Educação Física nos Anos Finais do Ensino Fundamental: Desa os, experiências e possibilidades para o ensino das lutas na escola

[...] Cabe ao professor, inserido numa metodologia com perguntas operacionalizadas e na base das
descobertas de problemas, conscientizar-se da necessidade da formação da criança, valendo-se do
suporte cienti co para fundamentar a prática dos jogos de oposição associada à cultura corporal
e ao despertar de valores, como a participação dos alunos no seu cotidiano, e que estes opinem,
solicitem atividades, discutam com o grupo e que o professor procure levar a turma a um processo
de solução de problemas”(SANTOS, 2012, p. 96).

As aulas se con guraram por atividades desenvolvidas em grupos, trios e duplas. Para além disso, a
cada atividade conversamos acerca do tipo de jogo vivenciado e suas especi cidades, relações com as lutas.
A roda de conversa no inicial e no nal das aulas favoreceram a discussão, diálogo e re exão a partir dos
relatos dos alunos.

Portanto, entendemos que às formas pelas quais os docentes fazem interligações com o conteúdo
e o que se espera alcançar. Salientam que as estratégias de ensino devem estar expostas no equipamento
didático e com seus objetivos claros para os sujeitos envolvidos, visto que elas têm como primordial “o
alcance dos seus objetivos, não perdendo de vista que o processo de ensino tem que deixar visível o que
quer atingir naquele momento” (MELO; MELO, 2016, p. 34).
A classi cação dos Jogos de Oposição usados nas aulas no quarto bimestre foram baseados em Santos
(2012), visto que podemos classi cá-los em três grandes grupos: Jogos que aproximam os combatentes:
Estes jogos são procedentes dos esportes de combate que mantém contato direto (corpo a corpo), os quais
consistem em tirar, empurrar, desequilibrar, projetar e imobilizar. Entre estes Jogos de Oposição podemos
citar o Judô, Luta olímpica, Jiu-Jitsu, Sumô etc.

Jogos que mantêm o adversário á distância: estes jogos têm como característica não manter contato
direto com seu adversário, este contato só se dá no momento da aplicação de uma técnica. Os exemplos
que podemos destacar são o Karatê, Boxe, Muayay, Taekwondo. Jogos que utilizam um instrumento
mediador: Esgrima e Kendo.
Com isso, apresentamos a seguir algumas imagens a partir de re exões que representam o processo
de vivência dos jogos de oposição com as turmas 608 e 609 durante o quarto bimestre de 2019. Na primeira
imagem são revelados os processos e experiências a partir do jogo “Gato e Rato”. O objetivo era proteger o
colega (rato) que estava no centro do círculo do gato que estava posicionado fora. Ou seja, a formatação da
roda se con gura como a “defesa” do colega que está nessa posição. Interessante é que nas duas turmas os
alunos perceberam que se a roda casse totalmente parada a proteção do rato caria comprometida.

Figura 1. Gato e Rato.

Fonte: Próprio autor, 2020.

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João Augusto Galvão Rosa Costa, Dinah Vasconcellos Terra

Nesse sentido, as estratégias adotadas em geral nas turmas foram a aproximação com o coleado ao
lado estreitando a passagem do gato e girar em torno do rato de acordo com os movimentos e tentativas
do gato. Segundo Oliver (2010) no Ensino Fundamental, propõe-se às crianças situações motivadoras que
possam permitir, a descoberta das ações fundamentais das disciplinas de combate, a aplicação do modo
mais diversi cado possível, considerando as possibilidades motoras do momento e reutilizando-as em
condições diferentes.

Figura 2. Pegue o Colete.

Fonte: Próprio autor, 2020.

O jogo pegue o colete foi considerado pelos alunos como um dos jogos mais “legais” desse percurso
de vivência dos jogos de oposição. Nesse jogo, cada dupla uma de frente para o outra, onde o objetivo era
que os alunos tentassem pegar o colete do outro que estava pendurado na cintura. Alguns alunos ao longo
da atividade relataram que os movimentos e regras se aproximavam do Taekwondo. Dessa forma, re etimos
sobre as caraterísticas desse esporte e se realmente se aproximava dos objetivos do jogo vivenciado.

Figura 3. Queda de Braço.

Fonte: Próprio autor, 2020.

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A Educação Física nos Anos Finais do Ensino Fundamental: Desa os, experiências e possibilidades para o ensino das lutas na escola

Para ser considerado um Jogo de Oposição “a atividade deve apresentar as ações motoras de ataque
e defesa envolvendo técnicas de lutas com características lúdicas ou jogos de estratégias” (OLIVER, 2010,
p. 23). Podemos perceber que dois ou mais oponentes se colocam em atitudes de oposição com o combate,
sobrepondo o espírito de combatividade e esportividade.

Figura 4. Pegue o pregador.

Fonte: Próprio autor, 2020.

O jogo “Pegue o pregador” foi uma das atividades mais interessantes para os alunos, principalmente
por verbalizarem que nunca tinham participado de nenhuma atividade nas aulas de educação física com
esse material. A regra era que os alunos dentro do círculo deveriam tentar pegar o pregador do outro,
sendo que se seu oponente saísse do círculo a vitória seria decretada para o outro.

A maioria dos alunos tentou retirar o objeto do colega com os movimentos que os mesmos
identi caram como análogos ao do Karatê e Taekwondo. A forma e o tratamento entre os alunos também
podem ser apresentadas como destaque nesse processo de vivência dos jogos de oposição. Em cada atividade
os alunos sempre se cumprimentavam demonstrando respeito e solidariedade ao outro.

Figura 5. Briga de galo.

Fonte: Próprio autor, 2020.

A posição e o movimento dos alunos nesse jogo foi um dos destaques recorrentes levantados por
eles. A verbalização voltou-se para a questão do “ter equilíbrio” para conseguir forçar o colega a cair. A regra

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João Augusto Galvão Rosa Costa, Dinah Vasconcellos Terra

era car na posição de cócoras e tentar derrubar o colega sem deixar o joelho tocar no chão. Interessante
que na primeira rodada, os alunos escolheram suas duplas sem nenhum critério (gênero, sexo, idade)
estabelecido pelo professor.
Os alunos perceberam que o peso, a força e a composição corporal eram fatores que poderiam
interferir no desenvolvimento do jogo. Nas rodadas seguintes, os mesmos sugeriram que as divisões das
duplas ocorressem de acordo com o peso e altura. Novamente foram realizadas rodadas que possibilitaram
e (re)signi caram os conhecimentos, visto que a problematização voltava-se agora para o olhar do outro e
a sua observação.

Para Kunz (2004), se o ensino oferecer possibilidades aos alunos como as múltiplas formas de relações
e entendimentos linguístico - comunicativo, oferecerá também a chance para as possibilidades de uma
capacidade crítico e emancipatória. Percebeu-se que as agressões verbais e con itos que predominavam
nas turmas aos poucos foram amenizados pelo diálogo com respeito a opinião do outro, espaço, forma de
se movimentar e ocupar os espaços, principalmente dos alunos com o professor e alunos com alunos. O
processo comunicativo com e pelo jogo foram destaques desse registro feito.

Inspirado nas lutas indígenas3 o próximo jogo foi chamado de “Jogo do Empurra”. Nesse jogo, os
alunos deveriam se posicionar no círculo central da quadra de forma que um apoiasse as mãos do outro,
visto que o objetivo era empurrar o colega para fora do círculo. Os mesmos não poderiam apertar o colega
para levar vantagem nem usar as pernas através de chutes. Diferente da origem do jogo que é realizado
ajoelhado, zemos em pé em razão das condições estruturais da quadra.

Figura 6. Jogo do empurra (608).

Fonte: Próprio autor, 2020.

O contato físico estimulado pelos jogos foi observado como uma questão problematizadora,
principalmente pelo afastamento que esse grupo demonstrava ao realizar atividades desse caráter nas aulas.
Como a rma Souza Junior e Santos (2010, p. 3) “ao vivenciarem os jogos de oposição os discentes podem
desenvolver capacidades cognitivas, sócio-afetivas e motoras”.

3 A inspiração veio da luta HukaHuka que foi criada pelo povo indígena Bakairi e povos do Xingu, localizados no Estado
do Mato Grosso. O huka-huka é bastante praticado nessa região e representa uma das modalidades dos Jogos dos Povos
Indígenas, competição esportiva criada no ano de 1996. Fonte: https://www.infoescola.com/artes-marciais/huka-huka/ .
Acesso em: 03 jan 2020.

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A Educação Física nos Anos Finais do Ensino Fundamental: Desa os, experiências e possibilidades para o ensino das lutas na escola

No que tange a questão cognitiva, a tomada de decisão e a estratégia foram elementos que ganharam
destaque, pois alguns alunos entenderam que esperar o colega empurrar seria mais interessante do que
tomar essa iniciativa. Outro ponto, foi que utilizar o seu centro de gravidade contribuiria para uma base de
sustentação do corpo impedindo que o colega avançasse.

A respeito da questão sócio-afetiva a ação de cumprimentar o outro antes e depois do jogo


possibilitou maior aproximação entre os pares. Problematizou-se a competição e as emoções durante esses
jogos. Os alunos relataram que a competição faz parte desse jogo, mas que durante e após deve existir
respeito entre os jogadores. Na questão motora assegurar um bom desenvolvimento da postura e base,
controle do equilíbrio, coordenação dos movimentos também foi observado pelos alunos como fatores
inseridos nesse jogo.

Como culminância desse conjunto de aulas, foram planejados seminários. Tais apresentações
tiveram como objetivo dialogar com as lutas que os alunos identi caram nas aulas a partir da experiência
dos jogos.Com isso, as turmas foram divididas em grupo de 4 a 5 alunos, visto que cada grupo deveria
elementos da história da luta escolhida, os golpes predominantes, regras de combate, as características
e curiosidades. Cada grupo teve em torno de 5 a 10 minutos para apresentar sua luta. Na 609, foram
apresentados trabalhos sobre as seguintes práticas: Muaythai, Capoeira, Kung fu, Sumô e Jiu-Jitsu.

Figura 7. Culminância dos grupos sobre as lutas (609).

Fonte: Próprio autor, 2020

Nos seminários, os alunos perceberam os traços identitários de cada luta, principalmente por
verbalizarem como, por exemplo, na capoeira a relação de ancestralidade, respeito entre os “jogadores”4,
bem como o sentido da roda e a ginga como elemento chave.
Na imagem, temos um grupo que trouxe para sua apresentação a luta muaythai. Essas alunas
mostraram em suas falas que essa arte marcial tem suas especi cardes e que se diferencia de outras como
o judô e a capoeira. Relataram que nas aulas o ato de cumprimentar o outro foi um aspecto que chamaram
sua atenção ainda que não tivéssemos realizado jogos que trabalhassem diretamente os movimentos

4 Expressão que foi recorrente na apresentação do grupo ao se referirem aos capoeiristas.

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João Augusto Galvão Rosa Costa, Dinah Vasconcellos Terra

característicos dessa luta. Outra aproximação que destacaram foi na sua relação com o boxe e sua
diferenciação pelo uso dos membros inferiores no uso de habilidades como o chutar.

Na 608, os alunos apresentaram as seguintes lutas: judô, sumô, capoeira e taekwondo. A imagem
abaixo representa um dos grupos no seminário que falou sobre a capoeira. Esse grupo teve a preocupação
de trazer traços históricos da prática, visto que apresentaram o signi cado do nome capoeira como sendo
uma expressão cultural brasileira que tem características de movimentos como chutes e rasteiras bem
como sua musicalidade como destaque.

Figura 8. Culminância dos grupos sobre as lutas (608).

Fonte: próprio autor, 2020.

Um dos grupos levantou a questão da capoeira: Capoeira seria uma luta, esporte, jogo ou dança?.
Esse questionamento fundamentou um debate interessante na turma que correspondeu a indagação do
grupo. Percebeu – se que a capoeira traz diversas características que “bebem” na fonte de cada elemento da
cultura corporal citado na pergunta dos alunos. Entretanto, e:
[...] A Educação Física brasileira precisa, assim, resgatar a capoeira enquanto manifestação cultural,
ou seja, trabalhar com a sua historicidade, não desencarná-la do movimento cultural e político
que a gerou. Esse alerta vale nos meios da Educação Física, inclusive para o judô que foi, entre nós,
totalmente despojado de seus signi cados culturais, recebendo um tratamento exclusivamente
técnico (SOARES et al., 1992, p. 53).

Dessa forma, esse resgate favorece a ampliação dos conhecimentos pelos alunos bem como sua visão
de mundo para com a educação física escolar e especi camente seu repertório de conhecimentos acerca
da cultura corporal de movimento. Além disso, contribui na quebra do paradigma do “quadrado mágico”
nas aulas que se restringe ao contato apenas dos esportes coletivos como futsal, basquete, handebol e vôlei.

O debate e a apresentação dos grupos favoreceram a ressigni cação de conhecimentos e conceitos


não só da capoeira, mas das lutas expostas pelas turmas. Nesse fechamento da unidade didática jogos
de oposição observaram-se os elementos característicos de cada luta, movimentos, traços identitários,
correspondência dessas práticas e a nossa cultura.

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A Educação Física nos Anos Finais do Ensino Fundamental: Desa os, experiências e possibilidades para o ensino das lutas na escola

Considerações Finais

Vivenciamos variados jogos de oposição com o objetivo de pensar estratégias que pudessem favorecer
uma proposta introdutória no ensino das lutas para alunos do 6º ano da E. M. Professora Olga Teixeira de
Oliveira. As estratégias foram problematizadas a partir de debates, rodas de conversa, diálogo com o outro,
utilização de jogos em duplas, trios e grupos, bem como o uso de materiais diversi cados como pregadores
e jornais. Sobretudo, realizamos a construção e sistematização dos conhecimentos através de seminários
sobre as lutas pesquisadas pelos discentes.

Os alunos da turma 609, foram mais receptivos a proposta dos jogos em duplas o que nos incita dizer
que desenvolver esse tipo de atividade contribuiu na amenização dos con itos entre eles. Nos jogos em
grupos, como o “gato e rato”, a ação de segurar a mão do outro gerou con itos, mas os mesmos perceberam
que segurar a mão ao outro seria um movimento necessário para a ocorrência do jogo.

Nesse sentido, dialogar com esses alunos favoreceu a preocupação dos mesmos em esperar o seu
tempo de fala e o respeito ao momento do outro na verbalização de diferentes ideias. A relação e o convívio
se transformaram ao longo desse processo, visto que conviver com o outro no mesmo espaço não era mais
um “problema” ou uma “chatice”. Na turma 608, alguns fatores se destacaram de forma positiva como: a
atenção dos alunos em ouvir as regras dos jogos e atividades apresentadas pelo professor, a diminuição da
“panelinha” entre os mesmos, limitando o contato com outros colegas e a melhora no tratamento ao colega.

Outros destaques estratégicos ecoaram pelas ações realizadas pelo professor na roda de conversa
antes e ao nal da aula. Antes de cada aula, os alunos eram reunidos para as explicações e apresentação
dos objetivos de cada jogo proposto. O uso dos jogos de oposição como estratégia introdutória possibilitou
durante o processo de ensino e aprendizagem a elucidação da dimensão criativa dos alunos em escolher a
melhor posição para car ou criar um movimento.

A estratégia dos seminários contribuiu para que diversas escutas e vozes pudessem apresentar
suas percepções, sensações e emoções desse processo pelo ensino dos jogos de oposição. Essa experiência
trouxe representatividades e re exões para os alunos, visto que na disciplina existem objetivos, conteúdos
para além da “rola bola”, metodologia, avaliação e planejamento. E ainda que não é uma mera prática
desconectada de re exões e discussões.

Por m, abordar os jogos de oposição foi uma das intervenções e estratégias utilizadas nesse período
letivo com essas turmas. Rati ca-se que esses jogos são ferramentas, meios e não ns interessantes para o
docente potencializar futuras desconstruções de con itos exacerbados, agressões verbais caso ocorram em
suas aulas, e ainda, construir um entendimento sobre o tratamento com o colega, o convívio, respeito ao
espaço, a percepção do outro, o diálogo e as múltiplas possibilidades do ensino das lutas nas aulas de Efe.

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300 RECC, Canoas, v. 25, n. 2, p. 307-318, julho, 2020.


A PRESENÇA/AUSÊNCIA DO CONTEÚDO LUTAS NA EDUCAÇÃO
FÍSICA ESCOLAR: IDENTIFICANDO DESAFIOS E PROPONDO
SUGESTÕES

José Arlen Beltrão de Matos, Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Bahia -


Brasil
Leopoldo Katsuki Hirama, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, Campinas,
São Paulo - Brasil
Larissa Rafaela Galatti, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, Campinas,
São Paulo - Brasil
Paulo César Montagner, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, Campinas,
São Paulo - Brasil

RESUMO
O presente trabalho objetivou investigar o conteúdo Lutas no currículo real da disciplina
Educação Física de escolas públicas situadas no interior do estado da Bahia, buscando
identificar os possíveis motivos que contribuem para a sua presença ou ausência nas aulas
desta disciplina. Para isso, foi utilizado, como instrumento investigativo, um questionário
contendo 15 questões, entre abertas e fechadas. A pesquisa contou com 26 professores que
atuavam em escolas públicas de 11 cidades. As Lutas ainda são pouco presente nas aulas
de Educação Física nesta região, sobretudo experiências pedagógicas de vivências
corporais. A formação acadêmica dos professores se mostrou determinante tanto na
presença quanto na ausência deste conteúdo no currículo real das escolas. Conclui-se que
alterações no formato das disciplinas que tratam o tema Lutas na graduação, a oferta de
formação continuada e a melhoria nas condições materiais das escolas podem contribuir
para uma presença mais efetiva das Lutas nas aulas de Educação Física. Sugere-se, então,
que as formações privilegiem as abordagens estruturadas em similaridades e nos princípios
das Lutas.

Palavras-Chave: Educação Física escolar; Lutas; Formação de professores.

PRESENCE/ABSENCE OF THE CONTENT MARTIAL ARTS IN


SCHOOL PHYSICAL EDUCATION : IDENTIFYING CHALLENGES
AND PROPOSING SUGGESTIONS

ABSTRACT
This study investigated the presence/absence of the contents martial arts in Physical
Education in the practicum curriculum of Bahia´s State schools. The aim was to identify
the possible reasons for that. To this, it was used applied a questionnaire containing fifteen
questions, between open and closed. The research involved 26 teachers who worked in
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030

117
public schools in 11 Bahia´s cities. Like in other Brazilian regions, martial arts were little
addressed in classes, especially pedagogical activities of bodily experiences. As conclusion
teacher´s primary University formation is pointed as decisive in the presence or not of this
content in the real schools´ curriculums. We conclude that changes in the format of the
disciplines that treat the subject struggles in college, the provision of continuing education
and improvement in the material conditions of the schools can contribute to a more
effective presence of the struggles in Physical Education classes. Then it is suggested that
the formations in favor structured similarities and principles of the struggles approaches.

Key-Words: Physical Education; Fights; Teacher Formation.

PRESENCIA/AUSENCIA DE CONTENIDOS LUCHAS EN LA


ESCUELA DE EDUCACIÓN FÍSICA : IDENTIFICANDO LOS
DESAFÍOS Y PROPONIENDO SUGERENCIAS

RESUMEN
El objetivo fui investigar la presencia/ausencia del contenido lucha en el currículo efectivo
de Maestría en Educación Física de las escuelas situadas en Bahía, identificando las
razones que contribuyen a su presencia o ausencia en las clases de esta disciplina. Como
herramienta de investigación se aplicó un cuestionario de 15 preguntas. Participaron 26
profesores que trabajaban en las escuelas públicas en 11 ciudades bahianas. En estas, como
en otras regiones del país, las luchas siguen estando insuficientemente representadas en las
clases de educación física, en especial las actividades pedagógicas de experiencias
corporales. Concluimos que la formación inicial del profesorado fue decisiva en la
presencia o ausencia de estos contenidos en el currículo real de las escuelas. Llegamos a la
conclusión de que los cambios en el formato de las disciplinas que tratan las luchas materia
en la universidad, la provisión de la educación continua y la mejora de las condiciones
materiales de las escuelas pueden contribuir a una presencia más efectiva de las luchas en
las clases de Educación Física. A continuación se sugiere que las formaciones en favor
estructurado similitudes y principios de las luchas de los enfoques.

Palabras Clave: Educación Física; Luchas; Formación del profesorado.

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030

118
INTRODUÇÃO
Há pelo menos três décadas se discute a necessidade de diversificação dos conteúdos na
Educação Física escolar e um tratamento pedagógico que supere práticas tecnicistas.
Apesar disso, as Lutas, conteúdo clássico da cultura corporal, têm enfrentado dificuldades
em sua inserção no currículo real das escolas.1-3 A ausência deste conteúdo sugere que a
Educação Física escolar vem oferecendo uma formação limitada, já que negligencia um
conteúdo de grande relevância social.

Diretrizes curriculares de vários Estados4-8 preveem o ensino das Lutas nas aulas de
Educação Física, tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio. Mais que isso, os
documentos nacionais que orientam a constituição do currículo da Educação Física escolar
também indicam o ensino deste conteúdo.9-10

As Lutas são conteúdos ricos em significados e possibilitam a apreensão de conhecimentos


em diferentes dimensões, quer sejam conceituais, científicas, estéticas, corporais,
econômicas, dentre outras. No entanto, para que este elemento da cultura corporal ocupe
um espaço significativo na formação de crianças e jovens é necessário a adoção de
procedimentos pedagógicos inovadores, já que o professor de Educação Física, em geral,
não apresenta um conhecimento técnico aprofundado das Lutas.11-12

Apesar das orientações curriculares sugerirem o ensino das Lutas, e as produções


científicas13-14 apresentarem delimitação deste conteúdo, defendendo a viabilidade de
sistematização e operacionalização no sentido de torná-los abrangentes, diversificados e
articulados com projetos de formação, isso não garante que este conteúdo seja
ensinado/aprendido nas aulas de Educação Física, visto que, com bastante frequência, há
um distanciamento entre o que é previsto para se ensinar e o que é efetivamente ensinado
nas escolas.

Em relação a essas questões, Santos e Paraíso15 afirmam que o termo currículo guarda
diversas especificidades e se manifesta no ambiente escolar em diferentes dimensões,
necessitando de terminologias específicas. Nesse sentido, os conhecimentos presentes no

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plano oficial a serem ensinados nas diferentes disciplinas e séries compõem o denominado
currículo oficial, enquanto que as aprendizagens resultantes de experiências educativas
compõem o chamado currículo em ação ou real.

Se a existência do conteúdo Lutas no currículo formal não, necessariamente, garante sua


presença no currículo real, a incorporação do universo das Lutas nas orientações oficiais
para a Educação Física escolar contribuiu para que este conteúdo se inserisse em grande
parte dos currículos na formação do professor de Educação Física.16

Apesar da previsão curricular oficial e da inclusão da discussão sobre Lutas na formação


de professores, muitos desafios são apresentados para sua real concretização nos espaços
da Educação Física escolar. Carreiro1:245 afirma:
Dentre os conteúdos que podem ser apresentados na Educação Física
Escolar, as Lutas são um dos que possivelmente encontram mais
resistência, levantados geralmente os argumentos de que há falta de
espaço, falta de materiais, falta de roupa adequada e, sobretudo, pela
associação às questões de violência.

Breda et al.16:22 também sinalizam como dificuldades a recente inclusão deste tema na
Educação Física escolar e, consequentemente, o receio do professor em abordar o conteúdo
Lutas em suas aulas. Um conjunto de situações parece tornar esta insegurança justificada,
visto que muitos problemas são detectados, tais quais a escassez de propostas pedagógicas
de tratamento ao conteúdo Lutas e o pequeno número de publicações sobre o ensino das
Lutas.2, 17 Os indícios aventados pelos autores suscitam diversas questões, dentre elas: Por
que as Lutas não se estabelecem no currículo real da Educação Física escolar? Quais são as
maiores dificuldades enfrentadas pelos professores? A formação relacionada ao ensino das
Lutas nos cursos de Educação Física atende às demandas do cotidiano escolar?

A preocupação em constatar as barreiras impostas e as dificuldades enfrentadas pelos


professores de Educação Física ao propor ou ensinar o conteúdo Lutas na escola
motivaram este estudo, que objetivou investigar a presença/ausência do conteúdo Lutas no
currículo real da disciplina Educação Física de escolas situadas no interior da Bahia,
buscando identificar os possíveis motivos que contribuem para a sua presença ou ausência

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nas aulas desta disciplina e sinalizar possibilidades de minimização de problemas
encontrados por meio de propostas recentes de pedagogia das Lutas.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Como o estudo pretendeu diagnosticar a realidade de uma determinada região, foi utilizado
como instrumento investigativo um questionário, visto que este recurso possibilita atingir
um grande número de pessoas, mesmo que estas estejam ou vivam em áreas geográficas
extensas.18 Apesar do número de professores que responderam aos questionários parecer
pequeno, esta quantidade passa a ser representativa quando se relaciona ao universo total
de profissionais que atuam com a disciplina Educação Física na região do Vale do
Jiquiriçá. A coleta de dados da pesquisa foi realizada durante um seminário de formação
dos professores de Educação Física que atuavam, durante o ano de 2013, em escolas
públicas sob a circunscrição da 4ª Diretoria Regional de Educação da Bahia – DIREC. A
pesquisa contou com a participação de 26 professores de 11 cidades1 diferentes,
representando uma amostra de 40% dos profissionais, de um total de 65 professores que
lecionavam a disciplina Educação Física na região administrativa desta diretoria, onde
existem 26 unidades escolares. Importante salientar que no estado da Bahia é permitido
que professores de outras disciplinas assumam as aulas de Educação Física para
completarem suas respectivas cargas horárias.

O questionário foi composto por 15 questões, entre abertas e fechadas, que versavam sobre
o ensino das Lutas nas aulas de Educação Física, as condições físicas e materiais das
escolas e sobre a formação inicial e continuada dos professores em relação ao tema Lutas.
A DIREC 4 encaminhou convite e garantiu transporte e alimentação a todos os professores
de escolas públicas desta região para participarem do referido evento. Todos os professores
que compareceram foram convidados a participar da pesquisa, sendo adotado como critério
de inclusão “ministrar aulas de Educação Física nas escolas públicas da região” e declarar
motivação e interesse em participar da pesquisa.
1
12 Municípios compõem a região administrativa da DIREC 4, dos quais 9 contaram com representantes nesta pesquisa,
a saber: Santo Antônio de Jesus, Dom Macedo Costa, Castro Alves, Aratuípe, Varzedo, Jaguaripe, Muniz Ferreira, Santa
Terezinha e Nazaré. Apenas Conceição de Almeida, Salinas da Margarida e Itatim não tiveram representantes. A DIREC
4 convidou professores de Ubaíra e Laje, cidades próximas e apoiadas pela diretoria, para participarem do evento, os
quais aceitaram participar da pesquisa, totalizando 11 cidades representadas.
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Para analisar os dados, recorreu-se a análise de conteúdo,21 que, segundo Souza Júnior,
Melo e Santiago,20 vem sendo bastante utilizada em pesquisas qualitativas em Educação
Física escolar, já que possibilita a análise de mensagens escritas ou transcritas. A opção por
essa técnica se deu por interesse de verificar além da frequência dos fenômenos, os seus
significados e relevância no contexto estudado.

Os questionários foram transcritos, os trechos que demonstravam aproximações entre as


respostas dos diferentes professores reunidos em temas e, finalmente, discutidas no
decorrer deste artigo.
Para justificar esta análise a partir dos temas, nos referenciamos novamente em
Bardin,21:135 que define como tema:
Uma afirmação acerca de um assunto. Quer dizer, uma frase ou uma frase
composta, habitualmente um resumo ou uma frase condensada, por
influência da qual pode ser afetado um vasto conjunto de formulações
singulares.

Desta forma, a partir das respostas aproximadas dos participantes, levantamos os temas,
realizando as “formulações” e relacionando-as com o referencial teórico.

As Lutas na formação dos professores de Educação Física: o que a realidade escolar


nos sugere?
Dos 26 professores (15 homens e 11 mulheres) que colaboraram com a pesquisa, 9 eram
formados em Educação Física, destes, 4 cursaram pós-graduação lato-sensu na área da
Educação Física ou Educação. Destaca-se que a maioria dos professores (8) tem menos de
cinco anos de formado. Dentre os demais participantes, 12 eram formados em outras áreas,
3 eram graduandos em Educação Física e 2 tinham cursado apenas o ensino médio. O
grupo estudado, de modo geral, tem pouco tempo no exercício da docência em Educação
Física, 19 professores atuam há menos de 5 anos na área, sendo que destes, 12 atuam há
menos de 2 anos.

Apesar das mudanças na Educação e mais especificamente na Educação Física não


dependerem apenas dos professores, a formação docente é um pressuposto importante para
a qualidade da educação e, consequentemente, para o processo permanente de legitimação

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junto à comunidade escolar. Tanto a formação inicial quanto a formação continuada,
agindo de maneira articulada, devem dar subsídios científicos para que o professor possa
sentir-se competente para recriar sua prática e atuar de maneira transformadora. Nesse
sentido, a inclusão das Lutas no currículo real da Educação Física estabelece dependências
com a formação dos professores em relação a esse conteúdo.

Nesta região da Bahia, quanto à formação universitária, 14 professores afirmaram não


terem tido nenhuma disciplina que abordasse o conteúdo Lutas e 12 professores afirmaram
terem cursado o componente na graduação. Daqueles que se lembravam, a carga horária
foi de 60 horas, o que representaria 4 aulas semanais em um semestre de 15 semanas, com
exceção de um professor que afirmou ter cursado disciplina com 40 horas .

Com relação ao conteúdo de tais disciplinas, enfatizou-se a abordagem a partir de algumas


modalidades mais tradicionais de Lutas como o Karatê, o Judô, o Boxe e, especialmente, a
Capoeira, sendo esta a única modalidade trabalhada na disciplina segundo as respostas de 4
professores.

Estes dados indicam o distanciamento de propostas de ensino que tratam as Lutas a partir
de seus princípios gerais e aproximações.16, 22-23 Desta forma, as possibilidades de atuação
do professor ficam limitadas às poucas modalidades abordadas, que são, em geral,
trabalhadas tradicionalmente com ênfase em seus aspectos técnicos em detrimento das
possibilidades de relação com outras expressões através de suas semelhanças. No mesmo
sentido, destaca-se a ênfase no conteúdo Capoeira, indicando a preferência regional, visto
que o Vale do Jiquiriçá e Recôncavo Baiano2 são conhecidos por serem o berço desta
manifestação. No entanto, ao se oferecer como conteúdo apenas uma modalidade,
minimizam-se as possibilidades de ampliação das vivências e discussões sobre a cultura
corporal relacionadas às demais Lutas.

Um dos problemas reside no fato das próprias disciplinas ofertadas, embora tenham uma
denominação genérica como “Lutas” ou “Metodologia do Ensino das Lutas”, na prática
tratam, em muitos casos, de algumas poucas modalidades específicas, senão apenas uma

2
A DIREC 4 integra cidades destas duas regiões administrativas da Bahia.
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(em geral a que o docente domina com vivências como lutador). Como discutir as Lutas
sem que se restrinja o conteúdo abordando apenas uma modalidade?

Somente estudos mais recentes, marcadamente do final da década 1990, têm levantado
propostas de intervenção com as Lutas buscando tratá-las a partir de suas similaridades,
proporcionando a abordagem de diversas modalidades sem necessariamente excluir outras,
dentre eles destacam-se os estudos de Espartero,14 de Breda et al.,16 Gomes22 e Olivier.24 A
partir dos autores, uma alternativa para os componentes curriculares que abordam o tema
Lutas no ensino superior seja conduzir uma abordagem a partir destas propostas.

Espartero14 classifica as Lutas em três categorias, quais sejam, Lutas de agarre, Lutas de
golpes e Lutas com implementos. No mesmo sentido Breda et al.16 também apresenta
classificação das Lutas em elementos de curta, média e longa distância. Tais classificações
permitem ao professor melhor sistematizar seu planejamento no sentido de abordar as
Lutas partindo de seus princípios operacionais, envolvendo, desta forma, muitas
modalidades diferentes, mas com características semelhantes.
Do total de entrevistados (26 professores), apenas 12 afirmaram ter cursado a disciplina
Lutas na graduação. Destes, 8 afirmam que se sentem preparados para abordar este
conteúdo nas aulas de Educação Física. Contudo, 5 destes profissionais alegam que a
disciplina de Lutas cursada na graduação não foi suficiente para prepará-los para as
demandas enfrentadas na escola:
"Não. Obviamente as experiências acadêmicas nos dão uma boa base
para o trato com o conhecimento Lutas, porém as vivências das Lutas no
curso de formação acontecem muito pontualmente e às vezes
superficialmente, o que não contribui para uma maior apropriação do
conhecimento sobre o conteúdo já na Universidade." Prof. 43

Para ser capaz de abordar o conteúdo Lutas na Educação Física escolar e suprir as
deficiências da disciplina específica vivenciada na graduação, alega-se a necessidade de
formação continuada.
"Porque a graduação não é suficiente para que o professor sinta-se
habilitado para ensinar, é preciso uma busca continua de conhecimentos
para que se concretize o conhecimento e daí está apto para suprir as
demandas da escola." Prof. 13

3
Optamos por manter a originalidade das respostas, sem realizar modificações ortográficas.
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“Pois 60 horas de aula não foi suficiente para nos embasar de forma pelo
menos mediana. É preciso e pretendo me capacitar um pouco mais, pois,
as demandas são enormes." Prof. 11

Segundo Ferreira,3 muitos alunos encaram a disciplina de Lutas na graduação como “mais
uma disciplina descartável”, questionando como seria possível aprender judô ou caratê, por
exemplo, em seis meses e estarem aptos a empregarem esses conhecimentos na escola.

As experiências dos professores que colaboraram com esta pesquisa indicam a necessidade
de revisão das disciplinas que tratam do conteúdo Lutas nos cursos de Educação Física. O
aumento da carga horária ou inclusão de novas disciplinas nos currículos podem contribuir
na qualificação dos futuros professores. O ensino tecnicista parece não atender à realidade
escolar, ao mesmo tempo os professores reclamam por mais experiências práticas durante a
formação inicial, por isso, propostas que não sejam centradas nas técnicas formais mas
que, ao mesmo tempo, não negligenciem o fazer corporal presentes nas Lutas possam
concorrer para que as Lutas se façam mais presentes no currículo real das escolas.

Conteúdo Lutas: Onde está? Como está?


A escola deve possibilitar o desenvolvimento das funções psicológicas superiores dos
alunos, em uma formação sólida onde os sujeitos possam; identificar, interpretar,
compreender e explicar os objetos.25 Nesta tarefa educativa, a Educação Física é chamada
a assumir o papel de elevar o lastro cultural esportivo dos alunos, enquanto patrimônio da
humanidade socialmente produzido, historicamente acumulado, que deve ser crítica e
criativamente ensinado e praticado.25-26 Contudo, esta tarefa encontra como exigência um
ensino com conteúdos diversificados, que não se encerre apenas no estudo/prática dos
esportes, mas que contemple a multiplicidade da cultura corporal. Entretanto, a superação
de ranços históricos e a introdução dos demais conteúdos da cultura corporal não vêm
sendo uma missão fácil. As Lutas estão entre os conteúdos que encontram mais
dificuldades em adentrarem os muros das escolas. O seu ensino nas aulas de Educação
Física está cercado de medos, receios e preconceitos.

Sobre a inclusão deste conteúdo nas aulas de Educação Física, quando questionados, 4
professores se posicionaram contrários ao ensino das Lutas nas aulas de Educação Física, 1
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professor não respondeu e a grande maioria dos professores afirmou que concordava,
totalizando 21 professores, atribuindo ao conteúdo a contribuição para a formação cidadã,
evidenciando-se o estímulo a valores de relacionamento inter e intrapessoal.

No entanto, é interessante destacar que a minoria dos professores que se mostraram contra
a abordagem do conteúdo Lutas na Educação Física escolar, ao todo 4 professores,
alegaram como justificativa exatamente o contrário dos colegas que defendem o tratamento
deste conteúdo, ou seja, que a oferta de atividades relacionadas às Lutas estimulariam
atitudes inadequadas para a convivência, como a agressividade.

Professores de Educação Física entrevistados por Nascimento e Almeida27 também


informaram que não trabalhavam com Lutas em suas aulas por medo de aflorar ou
incentivar a violência no ambiente escolar. Os mesmos autores, ao abordarem este
conteúdo na escola, contraditoriamente, não observaram comportamentos violentos ou
agressivos, pelo contrário, identificaram comprometimento e zelo pelos acordos firmados.

É importante destacar que estes 4 professores que se posicionaram contra a abordagem das
Lutas na Educação Física escolar não cursaram na graduação disciplina específica deste
conteúdo. Suas afirmações denunciam um entendimento superficial do fenômeno muitas
vezes relacionando luta à briga.24

Essa visão que vincula as Lutas ao aumento da violência também foi identificada em uma
investigação com alunos do ensino fundamental no Paraná, que não tinham experiência
com Lutas. Ao serem questionados se a prática das Lutas geraria mais violência, 84% dos
alunos (n-80) afirmaram que sim. Contudo, após a abordagem deste conteúdo em uma
intervenção de vinte horas, apenas 8% dos alunos continuaram afirmando que as Lutas
fomentavam a violência.28

Esse relato confirma a necessidade de abordamos este conteúdo nas aulas de Educação
Física, no intuito de desmistificar preconceitos relacionados às Lutas, além de cumprir a
função da escola de oferecer a apreensão de conhecimentos científicos, para que os alunos
possam fazer uma leitura crítica e intervir de maneira transformadora na sociedade.

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Negligenciar o ensino das Lutas no âmbito escolar pode ainda alimentar equívocos
fomentados pela mídia e contribuir para a proliferação de consumidores pouco conscientes.
Já que a mídia vem explorando com maior frequência emoções relacionadas à violência em
transmissões de Lutas.29

Ao serem questionados sobre a possibilidade do professor de Educação Física escolar


ensinar Lutas sem a vivência prática em espaços específicos como academias, as respostas
foram bastante diversificadas. Um grupo afirma que é possível, alegando que o professor
deve assumir a posição de mediador e facilitador nas atividades:
"Sim. O professor caracteriza-se como um facilitador e não como
reprodutor de gestos técnicos para as crianças lutarem." Prof. 6

Ainda defendendo a possibilidade de abordar o conteúdo sem que o profissional tenha


vivência em espaços específicos, defende-se a necessidade de estudo teórico e prático,
assim como a busca por praticantes nas diferentes modalidades, quer seja para ajudá-los
diretamente nas aulas, ou para melhoria de seu conhecimento para posterior tratamento
pedagógico para as aulas:
"Sim. Todo conhecimento produzido pela humanidade é possível de
discussão por um educador e com as Lutas não é diferente. Ainda que o
mesmo não tenha vivências como lutador de determinada modalidade, ele
pode sim mediar o conteúdo a partir de bons referenciais teóricos, assim
como convidar lutadores legítimos para estarem compartilhando suas
experiências com os alunos" Prof 2

Outros professores concordam que seja possível abordar o tema nas aulas de Educação
Física, mas fazem ressalvas referentes às dificuldades geradas pela falta de conhecimento
relativo às técnicas das modalidades:
"Possível é, porque todos são capazes de aprender, mas considero muito
difícil e desconfortante para o professor que não tem experiência nem
afinidade com a área. Seria melhor se fosse possível o professor trabalhar
em conjunto com um professor específico da área." Prof. 4
"É possível, mas é bem mais difícil a partir do momento que você tem
que empregar as técnicas." Prof. 1

Por outro lado, a mesma dificuldade relativa ao não conhecimento das técnicas é o motivo
principal alegado por outros professores que entendem que não é possível ensinar as Lutas
sem esta vivência anterior. Identifica-se nas respostas forte tendência tecnicista e a
exigência do professor ensinar através do exemplo prático, distante ainda das
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possibilidades de mediação/facilitação do docente e consequentemente da minimização dos
processos de criação, investigação e experimentação por parte dos alunos:
"Caso o professor nunca tenha praticado uma arte (luta) ele não tem
condições de ensinar". Prof 14
"Não. É preciso que tenha conhecimento e vivenciado para que saiba
como agir em determinadas atuações." Prof. 13

Esse posicionamento dos professores está alinhado a uma tradição formativa no campo das
modalidades de Lutas, que seguem um formato de repetição exaustiva, em que o aluno
‘copia’ o professor e assim reproduz tudo aquilo nas aulas e competições.16

Os depoimentos da maioria dos professores denunciam uma concepção de ensino


centralizada na técnica, independentemente dos percursos formativos destes docentes ou da
instituição formadora. O ensino centrado na técnica, muito comum na formação de atletas,
predominou na formação dos professores de Educação Física até meados da década de
1970, quando passou a receber críticas, visto suas implicações e frequente reprodução na
Educação Física escolar. Parece que esse modelo já não é hegemônico nos diferentes
componentes curriculares esportivos no ensino superior, no entanto, além de pouco
questionado ainda é muito frequente no ensino das Lutas. Esse fato sugere que a tradição
das Lutas impera na formação dos professores

Algumas experiências pedagógicas comprovam que professores sem especialização ou


graduação em modalidades de Lutas são capazes de ensinar/abordar o conteúdo Lutas nas
aulas de Educação Física,28, 30 conforme relata Nascimento e Almeida:27:100

Essa intervenção nos possibilitou confirmar a tese de que não há


necessidade de termos uma especialização em uma modalidade de
Lutas, desde que nosso objetivo não esteja pautado na formação de
atletas/lutadores, mas na produção de conhecimento nas aulas de
Educação Física. Isso não quer dizer que devamos desconsiderar as
contribuições dos especialistas que dedicam seus estudos a este tema.

Os depoimentos também destacam uma tendência quando se refere ao conteúdo Lutas: a de


tratá-lo de forma “teórica”, devido ao distanciamento prático dos professores e também do
receio de estimular conflitos e agressões. Ainda sobre a possibilidade de tratar o conteúdo

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sem experiência prática do professor, as seguintes respostas confirmam o tratamento
teórico:
"Só se for teórica, mas não terá tanta habilidade para trabalhar na
prática". Prof. 17
"Sim. Porque o conteúdo pode ser estudado na teoria, sem exatamente a
necessidade de praticá-los." Prof. 23

Este distanciamento das atividades práticas é reforçado quando os professores são


questionados se já trabalharam em suas aulas o conteúdo Lutas. Do total, apenas 13
professores já haviam abordado o tema e, destes, 4 não incluíram atividades práticas,
concentrando as intervenções em seminários, pesquisas e apresentações de vídeos.

O fato de incluir a discussão das Lutas nas aulas de Educação Física pode ser considerado
um avanço, entretanto, não devemos perder de vista a necessidade de oferecermos espaço
para a apropriação do fazer corporal presente nestas manifestações. Parece que um dos
desafios postos a estes professores está relacionado à proposição de experiências corporais
aos seus alunos quando o tema for Lutas. Visto que a Educação Física não pode ser uma
disciplina apenas que fale sobre os esportes, jogos, danças, ginásticas e Lutas, correndo o
risco de perder aquilo que a caracteriza, o fazer corporal.

Somente em uma resposta foi encontrada ênfase em aulas baseadas apenas na prática de
modalidades ou ações relacionadas às Lutas:
"Sim, foi abordado Lutas livres sem socos, só no sentido de imobilizar o
colega, mas eles não aceitaram o desafio não estavam preparados para
tais desafios." Prof. 16

No entanto, foram relatadas propostas que relacionavam a prática com aspectos sociais,
históricos e econômicos, destacando a atenção na abordagem do conteúdo para além do
fazer corporal, aproximando-se da proposta defendida por Soares et al.13

"Sim. Em certa ocasião experimentei a mediação dos conteúdos Karatê e


capoeira, a fim de estabelecer um debate a partir do confronto entre uma
cultura oriental e outra ocidental." Prof. 2
"Sim. As vivências acontecem basicamente através de jogos de
equilíbrio, imobilização e força. Ao mesmo tempo, inúmeras questões
foram analisadas quanto à espetacularização das Lutas, tendo como
exemplo o MMA." Prof. 6

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Apesar da carência formativa apontada por diversos professores e escassez de bibliografia
e material didático disponíveis na região, foram relatadas experiências interessantes. A
sistematização e socialização dessas propostas podem ser uma alternativa para introduzir
de fato as Lutas no currículo da Educação Física escolar na região. A maioria das
experiências práticas relatadas por aqueles professores que abordaram o conteúdo Lutas
em suas aulas se aproximava de propostas estruturadas em similaridades das Lutas ou em
seus princípios,14, 16, 24 mesmo as experiências dos professores que tiveram uma formação
mais “tecnicista”.

Como exemplo de utilização das classificações é possível descrever uma aula em que se
abordem Lutas de pequena distância ou com agarre. Criar e vivenciar jogos com regras
onde se deva retirar o adversário de um local determinado ou projetá-lo ao solo podem
servir de gatilho para discussões sobre diferentes modalidades que envolvam esta dinâmica
como o Sumô, a Luta Olímpica e o Judô.

Destaca-se que apesar de tratar as diferentes modalidades de Lutas de forma generalizada,


é interessante que discussões, investigações e vivências sejam oferecidas no sentido de
relacioná-las às modalidades que mais se assemelham na especificidade das técnicas e
táticas, oportunizando o entendimento da construção dos fundamentos já consagrados,
valorizando, desta forma, o conhecimento milenar construído pelas artes marciais.

Também foi questionado sobre a presença ou não de espaços e materiais adequados na


escola para as aulas com o conteúdo Lutas. Com exceção de algumas escolas que possuem
espaço físico disponível, a grande maioria dos professores afirma não ter condições
adequadas para as aulas, especialmente com relação aos materiais disponíveis.

Ao responderem sobre quais materiais seriam necessários, a ênfase foi nos tatames, que de
fato pode contribuir para as atividades relacionadas às Lutas. Os demais materiais são
específicos de modalidades como luvas de boxe, protetores, vestimentas e instrumentos
musicais da capoeira, denunciando uma aproximação da percepção da prática atrelada às
diferentes modalidades.

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Como nenhum material de uso geral foi descrito, como cordas, cones, bolas, grandes
colchões, entre outros, é possível inferir duas situações: tais materiais já existam na escola,
ou não há percepção por parte do professor em utilizá-los em aulas com este conteúdo.

CONCLUSÃO
Apesar de ser considerado um conteúdo clássico da cultura corporal e marcar presença
significativa em diferentes momentos históricos da humanidade,9, 13-14 as Lutas, como em
outras localidades, ainda são pouco presentes nas aulas de Educação Física nesta região da
Bahia, sobretudo experiências pedagógicas de vivências corporais.

Ao se levantar as impressões de um grupo, que consideramos representativo da região


estudada (40% do total de professores atuantes na EF escolar), acerca deste conteúdo,
percebemos que a afirmação acima é verdadeira. A formação docente inadequada,
propostas com ênfase em atividades teóricas ou em modalidades específicas pautadas
unicamente na execução das técnicas, a visão de que para se abordar Lutas é necessário
experiência como praticante de artes marciais, a falta de materiais específicos e a ausência
de propostas de adaptação destes últimos foram destacadas nas respostas.

Este cenário, suas práticas docentes e as demandas do cotidiano escolar indicam que
propostas inovadoras do ensino de Lutas podem contribuir na inserção das Lutas nas aulas
de Educação Física. Tendo por características a abordagem da diversidade de modalidades
de Lutas com ênfase em seus princípios, afastando-se da ênfase nas técnicas específicas,
propondo a adaptação de materiais para as vivências, estimulando a criação de gestos a
partir de situações problemas oferecidas nas aulas, é possível minimizar as dificuldades
atribuídas para a inclusão deste conteúdo nas aulas de Educação Física.

Conclui-se que alterações no formato das disciplinas que tratam o tema Lutas na
graduação, a oferta de formação continuada, a melhoria nas condições materiais das
escolas, o aumento de publicações sobre o ensino das Lutas, assim como a sistematização
de experiências realizadas pelos professores da educação básica podem contribuir para
uma presença mais efetiva das Lutas nas aulas de Educação Física.

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10
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ensino de Lutas. In: FRANCHINI, E.; DEL VECCHIO, F. B. Ensino de lutas: reflexões e
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Recebido em: 23 set. 2014


Aceito em: 19 mar. 2015
Contato: arleneducacaofisica@Yahoo.com.br

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030

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A SEPARAÇÃO DOS CONTEÚDOS DAS “LUTAS” DOS


“ESPORTES” NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR:
NECESSIDADE OU TRADIÇÃO?

Luiz Gustavo Bonatto Rufino


Universidade do Estado de São Paulo Júlio de Mesquita Filho, Rio Claro, São Pau­
lo, Brasil

Suraya Cristina Darido


Universidade do Estado de São Paulo Júlio de Mesquita Filho, Rio Claro, São Pau­
lo, Brasil

Resumo
Muitas propostas curriculares de Educação Física escolar apresentam as lutas sepa­
radas da categoria de esportes. Mas lutas não são esportes? Por que há essa separa­
ção? O objetivo desse trabalho foi discutir sobre os possíveis motivos pelos quais
as lutas são separadas dos conteúdos dos esportes na esfera da cultura corporal. Pa­
ra isso, buscou­se por meio de uma revisão de literatura, analisar as concepções de
lutas e esportes presentes nas propostas curriculares e em alguns autores da área da
Educação Física. Conclui­se que a separação ocorre por diferentes motivos e pode
constituir uma maneira de garantir que as lutas sejam efetivamente implementadas
nas aulas de Educação Física escolar.
Palavras­chave: Lutas ­ Artes Marciais ­ Esportes ­ Educação Física Escolar

A
Introdução

s modalidades de lutas, também denominadas de artes marciais,


estão presentes na sociedade de diversas maneiras. Há diferentes
práticas, cada uma com suas especificidades, regras e normas. Há ain­
da muitos praticantes dessas modalidades. Somente em relação ao
judô, por exemplo, estima­se haver no Brasil cerca de dois milhões de
praticantes (DA COSTA, 2006).
Há também um grande número de espectadores de desenhos ani­
mados e filmes, além de muitos consumidores de produtos que abor­
dam as lutas, como videogames, revistas, dvds, camisetas, canais de
televisão, dentre outros, assim como nos esportes e outras práticas
corporais.
Contudo, as lutas ainda estão afastadas do ambiente escolar e,
mesmo sendo defendida por inúmeros autores e propostas curricula­
res, não são aplicadas de maneira contínua e sistematizada, conforme

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alerta Carreiro (2005). O autor afirma que dentre os conteúdos que po­
dem ser apresentados na Educação Física escolar, as lutas são um dos
que encontram maior resistência por parte dos professores, com argu­
mentos como: falta de espaço, falta de material, falta de vestimentas
adequadas e associação intrínseca às questões de violência (CARREI­
RO, 2005).
Eis uma grande divergência encontrada: embora garantida por pro­
postas curriculares e defendida por inúmeros autores, na prática esco­
lar as lutas ainda não aparecem enquanto um conteúdo plenamente
ensinado. Por que isso ocorre?
Del´Vecchio e Franchini (2006) consideram que a dificuldade em
tratar os conteúdos das lutas na escola deve­se, em grande parte, à for­
mação do profissional de Educação Física que, em muitos casos, fre­
quenta uma graduação deficiente em relação a esses conteúdos,
restringindo­se à apenas uma modalidade (como o judô ou a capoeira,
por exemplo), ou as vezes sequer havendo a presença desses conteú­
dos no ensino superior.
Dessa forma, as lutas geralmente são aplicadas apenas (e isso
quando são) pelos profissionais que tiveram vivências com esta temá­
tica durante suas vidas, independente de terem tido aulas de lutas ou
não em sua formação inicial. Há casos também de algumas escolas
que oferecem aos alunos modalidades de lutas como judô e karatê co­
mo atividade extracurricular, ministradas por ex­praticantes, não inte­
gradas ao Projeto Político Pedagógico da escola.
Outro problema é a falta de pesquisas sobre lutas no Brasil, fato
evidenciado por Correia e Franchini (2010) ao analisarem 11 periódi­
cos nacionais no período de 1998 até 2008 e constatarem que dos
2561 encontrados, apenas 75 (ou 2,93%) eram sobre lutas. Os autores
encontraram ainda um número muito baixo de artigos que abordassem
os aspectos pedagógicos das lutas. A maioria dos artigos encontrados
abordou as lutas nas temáticas da fisiologia ou do comportamento mo­
tor (CORREIA e FRANCHINI, 2010).
Apesar das dificuldades, é possível tratar a temática das lutas na
escola, afinal, estes conteúdos são assegurados por uma série de pro­
postas e autores que as destacam como sendo parte integrante do que
se denomina de cultura corporal. Entretanto, surge uma questão para
ser analisada, uma vez que todos estes autores e propostas diferenciam
as lutas dos esportes.
As lutas não são esportes? Ora, as modalidades apresentadas pela

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mídia, praticadas por inúmeras pessoas, integrantes do seleto grupo de


práticas olímpicas, como é o caso do boxe amador, do judô, do wres­
tling, da esgrima e do taekwondo, não possuem características que nos
permitem classificá­las como esportes?
Por que nas definições de cultura corporal há essa diferenciação
entre lutas e esportes? Seriam as lutas o mesmo que esportes? Se sim,
por que distingui­los? Se não, como diferenciar as lutas dos esportes e,
mais ainda, por que no âmbito da cultura corporal é assegurado que as
lutas sejam práticas distintas dos demais conteúdos?
Estas indagações são complexas e difíceis de serem respondidas,
afinal, as explicações sobre estas diferenças ainda não foram aborda­
das de maneira sistemática. Assim, por meio de uma revisão de litera­
tura sobre os seguintes temas: a cultura corporal, os esportes e as
lutas; um olhar da sociologia do esporte; caracterização esportiva das
lutas e, finalmente, lutas: são ou não são esportes, pretendeu­se discu­
tir sobre estas questões, objetivando analisar as possibilidades de se
compreender as lutas separadamente dos esportes e seus desdobra­
mentos no universo escolar.

A cultura corporal, os esportes e as lutas

A seguir, serão apresentadas algumas definições sobre a perspecti­


va da cultura corporal encontradas em alguns autores e propostas cur­
riculares da área da Educação Física, observando as diferenciações
apresentadas com relação aos conteúdos dos esportes e das lutas.
Soares et al. (1992) afirmam que a Educação Física escolar tem co­
mo objeto de estudo a reflexão sobre a cultura corporal. Para os auto­
res, essa dinâmica curricular no âmbito da Educação Física tem
características bem diferenciadas das da tendência anterior já que:

Busca desenvolver uma reflexão pedagógica sobre o acervo de


formas de representação do mundo que o homem tem produzi­
do no decorrer da história, exteriorizadas pela expressão corpo­
ral: jogos, danças, lutas, exercícios ginásticos, esporte,
malabarismo, contorcionismo, mímica e outros, que podem ser
identificados como formas de representação simbólica de reali­
dades vividas pelo homem, historicamente criadas e cultural­
mente desenvolvidas (SOARES et al., 1992, p. 38, grifo nosso).

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Para os autores, ter a cultura corporal como objeto de estudo e re­


flexão envolve considerar esse acervo de formas e representações cor­
porais do mundo de extrema importância tanto histórica quanto social,
assim, a área da Educação Física deve formular recorte epistemológi­
co próprio, tratando de conteúdos como, por exemplo, as lutas (SOA­
RES et al., 1992).
Ainda segundo estes autores, o homem se apropria da cultura cor­
poral dispondo sua intencionalidade para o lúdico, o artístico, o ago­
nístico, o estético ou outros, que são representações, ideias, conceitos
produzidos pela consciência social, denominado por eles de “signifi­
cações objetivas” (SOARES et al.; 1992, p. 62).
Soares (1996) relata também que, historicamente, a Educação Físi­
ca ocidental moderna tem ensinado o jogo, a ginástica, as lutas, a dan­
ça e os esportes, sendo considerados como “conteúdos clássicos que
permaneceram através do tempo transformando inúmeros de seus as­
pectos, para se afirmar como elementos da cultura, como linguagem
singular do homem no tempo” (SOARES, 1996, p. 11, grifo nosso).
Darido e Rangel (2005, p. 34, grifo nosso) compreendem a Educa­
ção Física como uma prática pedagógica cuja função é “formar os ci­
dadãos que irão usufruir, partilhar, produzir, reproduzir e transformar
as manifestações que caracterizam essa área, tais como: o Jogo, o Es­
porte, a Dança, a Ginástica e a Luta”.
Darido e Souza Júnior (2007, p. 14, grifo nosso) apresentam uma
proposta pedagógica na qual compreendem a Educação Física como
uma “disciplina curricular voltada a introduzir e integrar o aluno a es­
fera da cultura corporal, instrumentalizando­os para usufruir de jogos,
esportes, danças, lutas e ginásticas”.
Betti (2009) também separa as lutas dos esportes, conceituando a
Educação Física na escola como:

(...) uma disciplina que tem por finalidade propiciar aos alunos
a apropriação crítica da Cultura Corporal de Movimento, visan­
do formar o cidadão que possa usufruir, compartilhar, produzir
e transformar as formas culturais do exercício da motricidade
humana: jogo, esporte, ginásticas e práticas de aptidão física,
dança e atividades rítmicas/ expressivas, lutas/ artes marciais,
práticas alternativas (BETTI, 2009, p. 64, grifo nosso).

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Este autor acrescenta ao tema das lutas a expressão artes marciais,


embora não os diferencie. Para o presente estudo também não houve a
diferenciação destes termos, pois não há consenso quanto à diferencia­
ção ou semelhança dos conceitos de lutas, artes marciais, budo e mo­
dalidades esportivas de combate, havendo autores que os diferenciam
enquanto que outros os classificam como sinônimos. No entanto, Ru­
fino e Darido (2009) afirmam que:

Mais relevante ainda não é a discussão sobre qual terminologia


está mais correta ou deve ser empregada em relação à outra e
sim discutir sobre a inserção desses conteúdos, [lutas, artes
marciais, modalidades esportivas de combate, etc.], que fazem
parte da cultura corporal, nas aulas de Educação Física (RUFI­
NO e DARIDO, 2009, p. 406).

Outra ressalva deve ser feita ao fato de Betti (2009) utilizar o ter­
mo “cultura corporal de movimento”. Embora haja diferentes termino­
logias para caracterizar esse acervo de manifestações corporais
humanas, como cultura física, cultura corporal, cultura de movimento,
cultura corporal de movimento, entre outras, todas caracterizam o lu­
tar como uma das manifestações pertencentes a essa cultura, tendo im­
portância histórica e social. Assim, buscando encontrar adequações
sobre a terminologia, optou­se por utilizar a expressão “cultura corpo­
ral” conforme o referencial da abordagem crítico­superadora de Soa­
res et al. (1992).
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNS/BRASIL, 1998, p. 28, grifo nosso) a Educação Física tem uma
história de pelo menos um século e meio no mundo ocidental moder­
no, possuindo “uma tradição e um saber­fazer ligados ao jogo, ao es­
porte, à luta, à dança e à ginástica, e, a partir deles, tem buscado a
formulação de um recorte epistemológico próprio”.
Algumas propostas curriculares também distinguem o conteúdo
das lutas dos esportes. Conforme descrito na Proposta Curricular do
Estado de São Paulo para a área da Educação Física, a Educação Físi­
ca escolar deve tratar pedagogicamente de conteúdos culturais relacio­
nados ao movimentar­se humano, “porque o ser humano, ao longo de
sua evolução de milhões de anos, foi construindo certos conhecimen­
tos ligados ao uso do corpo e ao seu movimentar­se” (SÃO PAULO,
2008, p. 42). De acordo com esta proposta: “a Educação Física trata

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da cultura relacionada aos aspectos corporais, que se expressa de di­


versas formas, dentre as quais os jogos, a ginástica, as danças e ativi­
dades rítmicas, as lutas e os esportes” (SÃO PAULO, 2008, p. 42,
grifo nosso).
A Proposta Curricular do Estado do Rio Grande do Sul relacionada
à área da Educação Física, elaborada para servir de apoio ao professor
da rede estadual de ensino daquele estado, descreve que: “(...) as práti­
cas esportivas, as ginásticas, as lutas, as atividades lúdicas, as práticas
corporais expressivas, entre outras, se firmaram ao longo dos anos co­
mo objetos de estudo próprios da Educação Física” (RIO GRANDE
DO SUL, 2009, p. 114, grifo nosso).
Dessa forma há a diferenciação dos esportes e das lutas, fato evi­
denciado inclusive na proposição das atividades, já que conteúdos dos
esportes aparecem em quase todas as séries enquanto que os conteú­
dos das lutas são propostos apenas nas sétimas e oitavas séries (deno­
minadas atualmente de oitavo e nono ano). Além disso, a proposta
estima que as lutas sejam tratadas durante somente 8% do tempo rela­
tivo ao ensino dos conteúdos da Educação Física (RIO GRANDE DO
SUL, 2009).
É evidente que, nas proposições apresentadas, o conteúdo das lutas
diferencia­se dos conteúdos dos esportes, sendo explicitado separada­
mente como uma das práticas que compõem a cultura corporal, deven­
do ser abordado nas aulas de Educação Física escolar. Entretanto, para
melhor compreender a separação apresentada pelos autores e pelas
propostas analisadas, é preciso compreender outros olhares sobre esta
distinção. A seguir será abordada algumas considerações acerca da vi­
são da sociologia do esporte para a caracterização conceitual de espor­
tes e, a partir dessa concepção, considerar ou não a possibilidade de
classificar as lutas como modalidades esportivas.

Um olhar da sociologia do esporte

Não será feita uma extensa revisão sobre o conceito de esporte,


tanto do ponto de vista histórico, quanto sociológico, pretendendo­se
contextualizar, ainda que inicialmente, as origens e relações entre os
esportes e as lutas. A origem dos esportes modernos diferencia­se das
origens do conceito mais amplo de lutar relacionado à busca pela so­
brevivência, historicamente envolvido com os seres humanos desde o
período da pré­história, como afirma Ramos (1982, p. 16): “o homem

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pré­histórico, no primórdio do seu primitivismo, tinha sua vida cotidi­


ana assinalada, sobretudo, por duas grandes preocupações: atacar e de­
fender­se”.
Segundo Virgílio (1994), os primeiros indícios da utilização pelo
homem de algumas formas primitivas de luta individual e sem armas
datam de três a quatro mil anos antes de Cristo. Antes disso, entretan­
to, o conhecimento se perde no tempo, mas “a própria sobrevivência
do homem supõe alguma forma de luta” (VIRGÍLIO, 1994, p. 32).
Ou seja, o ato de lutar é tão antigo quanto a própria história da hu­
manidade. Ao longo do tempo, estas manifestações que foram de so­
brevivência e utilitárias, passaram a ser sistematizadas e
regulamentadas de acordo com cada sociedade, surgindo diferentes
práticas, permeadas por processos históricos repleto de rupturas e des­
continuidades.
Esta origem diferencia­se da origem dos esportes modernos. Pri­
meiro, é preciso deixar claro que “esportes” são estes. Elias e Dunning
(1992) afirmam que os esportes modernos surgiram na Inglaterra no
século XIX. Entretanto, os autores defendem que já no século XVIII
se iniciou o que eles denominam de “processo de esportivização” dos
passatempos populares (ELIAS e DUNNING, 1992). Ou seja, os con­
ceitos sobre esporte caracterizados a seguir correspondem aos do es­
porte moderno, originário na Inglaterra do século XIX.
Helal (1990) trás uma importante contribuição para a compreensão
do esporte pelo enfoque da sociologia. Inicialmente, este autor dife­
rencia jogo de esporte ao afirmar que eles possuem fronteiras bem de­
marcadas porque nos esportes há uma organização burocrática mais
ampla, eles são organizados em grande escala e situados acima e além
dos interesses individuais dos jogadores. “Os esportes possuem ainda
os elementos da disputa física e da competição” (HELAL, 1990, p.
28).
O autor afirma também que o esporte é um desdobramento da brin­
cadeira, a mais lúdica das atividades. Entretanto, nos esportes, pode
haver a perda do prazer e da autonomia. Existe um prazer lúdico em
jogar ou mesmo competir respeitando as regras, porém “a sistematiza­
ção provocada pela imposição de regras fixas diferencia o esporte da
brincadeira, dando­o uma outra roupagem em relação à brincadeira”
(HELAL, 1990, p. 31).
Para Helal (1990), o esporte moderno é diferente do esporte de ou­
tras épocas por dois motivos: a secularização e a racionalização. A se­

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cularização é o processo pelo qual realidades pertencentes ao domínio


religioso, sagrado ou mágico passam a pertencer ao domínio profano,
ou seja, “sempre que uma representação racional, científica e técnica
substitui uma representação religiosa ou uma explicação pelo sagrado
ou pelo divino, há o processo de secularização” (HELAL, 1990, p.
34). O autor lembra que o esporte moderno não possui vínculo religio­
so, sendo denominado como um evento secular, possibilitando que
fosse constituído como uma atividade profissional, altamente organi­
zada e financiada, em muitos casos.
Segundo Helal (1990) a secularização mais recente tomou conta do
esporte moderno em quase todo o mundo industrializado, resultando
num sentimento generalizado de desencanto. Entretanto, o autor reco­
nhece que ainda persiste uma tendência à sacralização, embora de ou­
tra maneira, como se a crescente comercialização dos eventos
esportivos absorvessem determinadas características de sacralização.
Dessa forma, no esporte moderno, as fronteiras do sagrado e do profa­
no não são bem demarcadas, sendo o esporte, por si só, um domínio
extremamente fértil para o surgimento e o desenvolvimento de aspec­
tos sagrados (HELAL, 1990).
Em relação à racionalização, Helal (1990) constata que o esporte
moderno procurou paulatinamente eliminar considerações de ordem
pessoal, afetiva ou emocional, buscando uma adaptação consciente,
exata e eficaz dos meios aos fins pretendidos. As ações passaram a ser
governadas por regras bem definidas, calculáveis e racionais, confor­
me pode ser observado pelo considerável aumento das análises estatís­
ticas, mensurações objetivas, análises táticas, etc. que se tornou a ser a
tônica na organização de determinadas modalidades esportivas. No
entanto, o autor limita­se ao emprego da racionalização somente na
questão da impossibilidade do emprego de raciocínios místicos ou na
falta do surgimento de relações e atitudes imprevisíveis (HELAL,
1990), não expandindo a visão sobre esse conceito.
A competição é outra característica dos esportes. Toda competição
envolve um “conflito agonístico” entre os participantes. Huizinga
(1993) apresentou o conceito de agôn dos gregos para classificar o do­
mínio das competições. Para o autor, tanto o agôn dos gregos quanto
as competições em toda a parte do mundo possuem todas as caracte­
rísticas formais do jogo, pertencendo ao domínio da festa, do lúdico.
O agôn é, portanto, uma espécie de jogo que se define por sua função
lúdica e pela competição. Tanto os jogos, quanto as competições, as­

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sim como as lutas, as disputas e os combates são agonísticos (antagô­


nicos) para os gregos (HUIZINGA, 1993).
Para Helal (1990), o conflito surge como parte integrante do espíri­
to da competição esportiva e não como um problema que precisa ser
eliminado ou resolvido. Os competidores ao concordarem com as re­
gras e objetivos do jogo estão cientes do conflito inevitável que surgi­
rá a partir de então. Harmonizam­se para conflituar. E conflituam­se
pelo prazer de conflituar, nada mais. O esporte é uma luta pelo amor à
luta (HELAL, 1990).
Na verdade, os aspectos de racionalização, secularização com certa
tendência à sacralização, organização burocrática, regras fixas e uni­
versais, existência de competição, dentre outras características, estão
presentes na maioria das modalidades de lutas. Entretanto: seriam as
lutas esportes? Será que todas as modalidades de lutas podem ser ca­
racterizadas como esportes?

Caracterização esportiva das lutas

Todos os esportes possuem certas especificidades que os diferenci­


am e os distinguem dos demais. Para isso, uma série de regras, normas
e critérios surgiram ao longo dos anos permitindo que modalidades até
mesmo com origens semelhantes pudessem se tornar distintas.
Com as lutas não foi diferente. Embora com muitas variedades,
elas apresentam características semelhantes entre si e diferentes de ou­
tras temáticas da cultura corporal. Em termos de práticas esportivas,
embora as lutas tenham tido origens diferentes dos esportes, elas apre­
sentam certas especificidades. Porém, primeiramente é preciso enfati­
zar que existem diversas modalidades de lutas ou artes marciais, cada
uma com determinadas características, havendo aspectos em comum e
outros diversos em relação a cada uma destas práticas.
Há lutas, por exemplo, que enfocam o embate com armas, enquan­
to outras privilegiam a luta sem armas. Algumas sociedades criaram
formas de lutar a distância, com socos e chutes como, por exemplo, o
Krav Maga de Israel, enquanto outras criaram formas de lutar na de­
nominada luta corpo a corpo, sem a distância e sem a utilização de
golpes como chutes e socos como, por exemplo, o Judô no Japão. Há
ainda a característica de grupos sociais distintos que desenvolveram
formas semelhantes de lutar, embora não haja registros de contato en­
tre estes grupos como, por exemplo, duas sociedades que desenvolve­

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ram a luta corpo a corpo, como algumas tribos de índios brasileiros


como os povos do alto do Xingu e da tribo Bakairi com o Huka­Huka
e os gregos e romanos com o wrestling estilo greco­romano (em am­
bas as modalidades não é permitido encostar completamente as costas
no chão).
Entretanto, mesmo com todo este universo de modalidades, há cer­
tas características específicas das lutas, que possibilitam que elas pos­
sam ser classificadas dentro de uma mesma categoria na esfera da
cultura corporal. Estas semelhanças são o que diferenciam as lutas de
outras modalidades esportivas, permitindo que haja certas característi­
cas em comum entre elas.
O dicionário Luft (2000) define o ato de lutar (do latim luctari) co­
mo: “combater/ pelejar, brigar/ disputar, competir/ trabalhar ardua­
mente, esforçar­se, empenhar­se”. Já o substantivo luta é definido
como “ação de lutar/ qualquer combate corpo a corpo/ guerra, peleja/
antagonismo/ esforço, empenho” (LUFT, 2000, p. 431). Portanto, mo­
dalidades esportivas que se assemelhem a esta definição podem ser
categorizadas como modalidades esportivas de lutas.
Para os PCNs (1998), as lutas são definidas como “disputas em que
o(s) oponente(s) deve(m) ser subjugado(s), com técnicas e estratégias
de desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão de um determi­
nado espaço na combinação de ações de ataque e defesa” (BRASIL,
1998, p. 70).
Com relação aos conteúdos dos esportes, os PCNs (BRASIL,
1998) consideram­nos como práticas em que são adotadas regras de
caráter oficial e competitivo, organizadas em federações regionais, na­
cionais e internacionais que regulamentam a atuação amadora e a pro­
fissional, além de envolverem “condições espaciais e de equipamentos
sofisticados como campos, piscinas, bicicletas, pistas, ringues, ginási­
os, dentre outros” (BRASIL, 1998, p. 70).
Portanto, para os PCNs (BRASIL, 1998), devido às distinções his­
tóricas provenientes do fato de possuírem origens diferentes, as lutas
são separadas dos esportes e, sendo assim, são caracterizadas como
práticas singulares. Entretanto, sua importância é considerada e, por
isso, é assegurada que as lutas façam parte da cultura corporal, sendo
aplicadas e ressignificadas nas aulas de Educação Física na escola.
Paes (2010) também buscou caracterizações sobre as lutas, apro­
priando­se de uma definição bem difundida, dividindo as formas de
lutar em três tipos: curta, média e longa distância. As lutas de curta

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distância relacionam­se com o agarramento do adversário, as lutas de


média distância são aquelas que têm como característica tocar, percu­
tir golpes no adversário (como socos e chutes, por exemplo). Já as lu­
tas de longa distância utilizam­se de implementos e outros materiais
como as espadas, por exemplo.
A maior diferenciação entre as lutas e outras modalidades esporti­
vas é o fato do objetivo principal ser o enfrentamento físico direto
com um adversário ou oponente. Portanto, ao longo das ações técnicas
e táticas, há possibilidades que vão sendo criadas devido a este fator
de imprevisibilidade, já que o adversário nunca ficará inerte e respon­
derá às reações de forma inesperada, imprevisível.
O objetivo das lutas envolve superar fisicamente o adversário, uti­
lizando para isso princípios que variam de acordo com cada prática.
Elas são práticas individuais, na maioria das vezes, e que requerem a
imposição física dos competidores, ou seja, eles se tocam, se agarram,
desferem­se chutes, socos, dentre outros golpes visando o objetivo fi­
nal, que varia conforma cada modalidade. Em nenhuma outra prática
esportiva há a possibilidade de impor resistência física contra o adver­
sário de maneira explícita e legal (permitida perante as regras do es­
porte) visando submetê­lo de diferentes formas.

Lutas: são ou não são esportes?

As lutas não são apenas práticas esportivas. De acordo com as aná­


lises estabelecidas, pode­se considerar que para uma prática ser carac­
terizada como um esporte ela deve possuir determinadas
características. Porém, nem todas as modalidades de lutas enquadram­
se nestas características. Algumas sofrem constantes resistências de al­
guns praticantes em relação ao seu enquadramento como esportes.
Há o caso da capoeira que, embora haja algumas formas de siste­
matização e hierarquização, essas tentativas ainda não foram aceitas
por grande parcela de mestres e praticantes. Areias (1984) afirma que
a capoeira é uma criação dinâmica e não estática do ser humano, ca­
racterizando­a como: “música, poesia, festa, brincadeira, diversão e,
acima de tudo, uma forma de luta, manifestação e expressão do povo,
do oprimido e do homem em geral em busca de sobrevivência, liber­
dade e dignidade” (AREIAS, 1984, p. 8).
Para Areias (1984) alguns mestres de capoeira (sobretudo da capo­
eira angola) são completamente contra a esportivização dessas práti­

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cas, alegando não ser possível institucionalizá­la. Há outras modalida­


des também, como o Tai Chi Chuan, por exemplo, considerado, além
de uma luta, uma forma de “meditação em movimento” (WIKIPÉ­
DIA, 2010).
Tanto as lutas quanto outras práticas corporais podem ser conside­
radas como esportes, dependendo das adequações realizadas. Desta­
cam­se como exigências: a utilização de regras universais, a
institucionalização de federações e confederações, a presença de auto­
ridade como o árbitro, aparente igualdade de condições entre os com­
petidores, dentre outras.
Da mesma forma, as lutas e outras práticas podem assumir outras
características, como as de jogos e brincadeiras se forem praticadas
sem atender às exigências dos esportes como, por exemplo: não visar
o resultado final propriamente dito, não atender as regras estabeleci­
das como número de jogadores, uniformes, locais de prática, não de­
pender de órgãos institucionalizados que organizam burocraticamente
a modalidade, dentre outras.
O fato dos esportes e das lutas terem origens distintas, permite que
ambos sejam caracterizados separadamente e, dessa forma, lutas e es­
portes podem ser considerados conteúdos diversificados dentro da es­
fera da cultura corporal.
Ou seja, as lutas podem ou não ser esportes, de acordo com a orga­
nização e regulamentação estabelecida. No contexto da Educação Físi­
ca escolar, no entanto, é muito mais interessante abordar estes
conteúdos de maneira lúdica, promovendo vivências significativas e
possibilitando que os alunos possam apropriar­se criticamente destes
conteúdos, sendo capazes de conhecê­los, transformá­los e ressignifi­
cá­los.

Considerações finais

Voltando­se à questão central deste texto: por que os autores e pro­


postas da área da Educação Física escolar costumam separar os con­
teúdos das lutas dos conteúdos dos esportes?
Historicamente, lutas e esportes surgiram em diferentes contextos.
O esporte moderno surgiu na Inglaterra no século XIX, com o proces­
so de esportivização de alguns passatempos, conforme afirmam Elias
e Dunning (1992) enquanto que as práticas de lutas, seja no oriente ou
no ocidente, são práticas inerentes à própria origem dos homens, rece­

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bendo diversas denominações como, por exemplo, práticas de sobre­


vivência ou práticas utilitárias, dentre outras.
Origens distintas promoveram classificações diferentes. No entan­
to, apesar de diferentes origens, algumas modalidades de lutas tam­
bém sofreram o processo de esportivização, como o judô e outras
modalidades olímpicas, por exemplo. No âmbito da cultura corporal,
o fato de haver a separação das lutas das outras temáticas, como o es­
porte, pode ser compreendido como uma forma de garantir que elas
sejam efetivamente ensinadas nas aulas de Educação Física.
As lutas poderiam estar inseridas dentro dos conteúdos dos espor­
tes, mas dessa forma, elas seriam “diluídas” dentro dos inúmeros ou­
tros conteúdos de esporte existentes, sendo aplicadas de maneira
superficial, dada a força, tradição e presença de determinados esportes
(sobretudo alguns esportes coletivos) nas aulas de Educação Física.
Se as lutas são um dos conteúdos ainda pouco explorados e pouco
difundidos nas aulas de Educação Física escolar, pode­se imaginar
que se não houvesse a distinção entre lutas e esportes elas praticamen­
te não apareceriam nas aulas de Educação Física na escola, poupando
os alunos de vivenciarem essa importante forma de manifestação da
cultura corporal.
Outra razão importante que deve levar os autores a proporem a se­
paração das lutas dos esportes é o fato de haver, em grande parte das
lutas, características peculiares como a imposição de resistência física
explícita contra os adversários.
As lutas são práticas plurais e heterogêneas, com origens distintas
do conceito de esporte moderno e de importância histórica, sendo par­
te integrante da cultura corporal. Não devem ser classificadas apenas
como esportes, pois podem possuir outras características, dependendo
do contexto na qual estejam inseridas. Há, dessa forma, diversas práti­
cas que ainda não se esportivizaram e nem por isso devem deixar de
ser conteúdos da Educação Física escolar, como é o caso do Tai Chi
Chuan e da capoeira.
Com relação a essa impossibilidade de compreender as lutas ape­
nas como esporte, destaca­se a frase de Rubem Alves, citado por Mar­
cellino (1989, p. 11): “(...) é da beleza da poesia que nascem os
guerreiros. Lutam melhor aqueles em cujos corpos moram os sonhos.
Para se lutar não basta ter corpo e saber competentes: é preciso ter al­
ma”.
Esta frase ilustra que a questão do lutar pode ser empregada em di­

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versos outros contextos além daqueles que as definem como práticas


esportivas. Compreender as lutas enquanto práticas esportivas é ques­
tão central para facilitar o entendimento desse fenômeno plural e
abrangente, porém, deve­se destacar que o ato de lutar pode transcen­
der a visão esportiva destas práticas, até mesmo por possuírem origens
históricas diferentes. Entretanto, independente de serem classificadas
ou não como modalidades esportivas, as lutas possuem a sua impor­
tância e devem ser ensinadas aos alunos nas aulas de Educação Física
escolar, possibilitando que eles se apropriem deste importante conteú­
do da cultura corporal.

The separation of the contents “fights” of “sports” in Physical Education


Classes: necessity or tradition?

Abstract
A lot of curriculum proposals present the division between fights and sports con­
tents. However, isn´t fights sports too? Why do they separate these contents? The
objective of this study was to discuss about the reasons why some proposals and
some authors separate the fights contents of the sports contents in body culture
conception. For this, we analyzed, through a review of literature, the concepts of
fights and sports in some curriculum proposals and some authors in the field of
Physical Education. We conclude that the separation occurs for different reasons,
and it may offer a means of ensuring that these contents could be applied in Physi­
cal Education classes.
Keywords: Fights ­ Martial Arts ­ Sports ­ Physical Education Classes

Separación de los contenidos de la “luchas” y el “deportes” en la escuela de


Educación Física: ¿necessidad o tradición?

Resumen
Muchas propuestas curriculares muestran la división entre los contenidos de las lu­
chas y los deportes. Pero las luchas no son deportes también? Por qué hay esta se­
paración? El objetivo de este estudio era examinar las posibles razones de la
separación de contenidos de las luchas y deportes en el alcance de la cultura física.
Para ello, hemos tratado de analizar a través de uma revisión de la literatura, los
conceptos de lucha y los deportes presentes en los currículos, y algunos autores en
el ámbito de la educación física. Se concluye que la separación se produce por di­
ferentes razones. Así, separar las luchas de los deportes es una manera de asegurar
que estos contenidos se aplican en las clases de educación física en la escuela.
Palabras clave: Luchas ­ Artes Marciales ­ Deportes ­ Educación Física en la Es­
cuela

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Pensar a Prática, Goiânia, v. 14, n. 3, p. 1­17, set./dez. 2011 16
DOI: 10.5216/rpp.v14i3.12202

Recebido em: 20/10/2010


Revisado em: 105/03/2011
Aprovado em: 10/03/2011

Endereço para correspondência


gustavo_rufino_6@hotmail.com
Luiz Gustavo Bonatto Rufino
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
Departamento de Educação Física.
Av. 24 A, No 1515
Bela Vista
13506­000 ­ Rio Claro, SP ­ Brasil

Pensar a Prática, Goiânia, v. 14, n. 3, p. 1­17, set./dez. 2011 17


Movimento
ISSN: 0104-754X
stigger@adufrgs.ufrgs.br
Escola de Educação Física
Brasil

Barbosa do Nascimento, Paulo Rogério; Almeida, Luciano de


A tematização das lutas na Educação Física Escolar: restrições e possibilidades
Movimento, vol. 13, núm. 3, septiembre-diciembre, 2007, pp. 91-110
Escola de Educação Física
Rio Grande do Sul, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=115314345005

Como citar este artigo


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A tematização das lutas na Educação Física
Escolar: restrições e possibilidades

Paulo Rogério Barbosa do Nascimento*


Luciano de Almeida**

Resumo: O tema “lutas”, indicado para ser tratado pedago-


gicamente pela disciplina curricular de Educação Física na
escola, apresenta algumas restrições. O desafio deste
trabalho foi realizar uma necessária reflexão sobre o tema e
efetivas intervenções no contexto escolar, para contrapô-las.
Entendemos que, com essas experiências “singulares”, foi
possível relativizar “empecilhos” postos para o trato peda-
gógico desse conteúdo na escola. Reforçarmos a convicção
da importância de o professor ter claro para si sob qual
perspectiva teórica tratará os conteúdos para, então, lançar
mão de metodologias de trabalho sintonizadas com a teoria.
Palavras-chave: Luta. Educação Física. Currículo.

1 INTRODUÇÃO

Este texto objetiva participar do debate e, principalmente, instigar


a construção de um corpo de conhecimentos significativos, rela-
cionados ao trato do conteúdo de lutas, pela disciplina curricular de
Educação Física na escola, assim como procura atestar a validade do
diálogo entre profissionais, a troca de experiências e, ainda, a
construção coletiva de novos subsídios teórico-práticos, que signifiquem
e re-signifiquem tratos com os conteúdos da Educação Física escolar.
No momento, podemos afirmar que alguns dos argumentos
em relação ao tema na Educação Física escolar, que perpassam o
posicionamento e as concepções dos professores atuantes em

*
Mestre em Educação nas Ciências (UNIJUÍ). Professor do Curso de Educação Física da
URI (Campus Santo Ângelo) e Professor da Escola Municipal Madalena, Panambi, RS, Brasil.
E-mail: paulonascimento@urisan.tche.br
**
Mestre em Educação nas Ciências (UNIJUÍ). Professor do Curso de Educação Física da
URI (Campus Santo Ângelo) e Professor da Escola Estadual de Ensino Médio Santo Augusto,
Santo Augusto, RS, Brasil. E-mail: lucianoedf@urisan.tche.br
92 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

escolas, são restritivos para a efetivação do trato pedagógico desse


conteúdo. Diante disso, buscamos refletir sobre a temática e
realizar intervenções pedagógicas no âmbito escolar, capazes de
suscitar elementos para nos posicionarmos mais categoricamente,
inclusive considerando a possibilidade de contrapor algumas
supostas restrições.
As reflexões e intervenções que seguem originaram-se a
partir do diálogo e interesse comum dos autores do texto. De um
lado, um professor de Educação Física sem vivências específicas
em alguma modalidade de luta e, de outro, um com vivência
profissional no ensino da capoeira.

2 ARGUMENTOS RESTRITIVOS EM RELAÇÃO AO


TRATO DA LUTA NA DISCIPLINA DE EDUCAÇÃO
FÍSICA

A ampliação dos temas ou conteúdos a serem devidamente


estudados na disciplina de Educação Física na escola, fruto, também,
de mudanças paradigmáticas1 no próprio campo é fato, porém, a
efetivação de tal ampliação não é um processo que ocorre rapidamente.
No espaço de intervenção escolar, podemos afirmar que o tema/
conteúdo de lutas é pouco acessado e, inclusive, o seu trato
pedagógico suscita questionamentos e preocupações diversas por
parte dos profissionais atuantes na Educação Física.
Se o fenômeno lutas aparece na escola, conforme Nascimento
(2005), isso acontece pelas aberturas preconizadas por essa insti-
tuição para terceiros realizarem, em seu espaço, oficinas, voluntárias
ou não, desvinculadas da disciplina de Educação Física e do projeto
político-pedagógico da Escola.
Em pesquisa realizada pelos alunos do curso de graduação em
Educação Física da UNIJUÍ, Campi Ijuí e Santa Rosa (RS), e da

1
Considera-se, para este estudo, a mudança paradigmática que se refere à introdução do
conceito de “cultura” nos estudos acadêmicos da área de Educação Física, o que tem
ampliado a visão da área para além do corpo eminentemente biológico, mas também histórico,
social e cultural.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 93

URI/Santo Ângelo (RS), na disciplina de Metodologia do Ensino de Lutas


desenvolvida no 1º semestre de 2006, segundo Nascimento (2007, p. 3):2
[...] buscou verificar as concepções dos professores
de Educação Física sobre o conteúdo de lutas a ser
tratado pela disciplina de Educação Física,
intervenções já realizadas e, como acreditam que
este tema deve ser tratado por esse componente
curricular [...]

foram encontrados indicadores que se mostraram argumentos


restritivos para a possibilidade de trato pedagógico desse tema/
conteúdo. Entre outros argumentos restritivos verificados, destaca-
se, basicamente, dois dos mais recorrentes nas respostas obtidas:3
1) a falta de vivência pessoal em lutas por parte dos professores,
tanto no cotidiano de vida, como no âmbito acadêmico;
2) a preocupação com o fator violência, que julgam ser
intrínseco às práticas de luta, o que incompatibiliza a possibilidade
de abordagem deste conteúdo na escola.

3 PERSPECTIVAS TEÓRICO-METODOLÓGICAS OU
CAMINHOS QUE PERPASSARAM O ESTUDO
PROPOSTO

Compreende-se que o trato pedagógico do componente lutas


na Educação Física escolar deva comportar necessariamente
aspectos da autonomia, criticidade, emancipação e a construção de
conhecimentos significativos. As reflexões que apontam para a
cultura corporal de movimento como o conjunto de conhecimentos
que devem ser “tematizados” pela Educação Física podem municiar,
pedagogicamente, para construir possibilidades metodológicas para
o trato específico deste tema.

2
NASCIMENTO, Paulo R. B. Sistematização do tema/conteúdo de lutas para a Educação
Física escolar. 2007. (Mímeo).
3
No estudo citado, a falta de sistematização deste tema/conteúdo também foi uma indicação
relevante por parte dos professores, sendo então tratado, especificamente, por Nascimento
em outro artigo, intitulado “Sistematização do tema/conteúdo de Lutas para a Educação
Física Escolar”, em vias de publicação.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


94 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

Assim pensando, assumimos o desafio de realizar intervenções


no âmbito da escola, tratando pedagogicamente o tema/conteúdo
de lutas na Educação Física, considerando a perspectiva acima citada,
a formação e/ou vivências de cada um dos professores e os contextos
escolares diferenciados onde cada um atua.
Este trabalho, que inicialmente surgiu de discussões entre os
pesquisadores sobre os limites e as possibilidades de se trabalhar
com o tema/conteúdo lutas na escola, evoluiu para a idéia de realizar
intervenções nas escolas em que atuávamos e, depois, foi tomando
corpo em nossos diálogos e encontros em que discutíamos acerca
da sistematização de nossas aulas.
Nesse sentido, adotamos como metodologia a pesquisa-ação,4
por articular o objetivo prático, que visa buscar um diagnóstico da
realidade investigada, na tentativa de encontrar soluções alcançáveis
para as situações consideradas problemas, a fim de transformá-las,5
com o objetivo de “[...] obter informações que seriam de difícil acesso
por meio de outros procedimentos, aumentar nosso conhecimento de
determinadas situações (reivindicações, representações, capacidades de
ação ou de mobilização, etc.)” (THIOLLENT, 1988, p. 18).
Não dar um tratamento pedagógico ao tema é, para nós, um
problema e, por isso, nos desafiamos a tematizar este conteúdo nas
diferentes realidades em que atuamos. Um dos pesquisadores, sem
vivência pessoal em lutas no seu cotidiano de vida e também
acadêmico, desafiou-se a tratar pela primeira vez deste tema, de forma
sistematizada, e outro, com vivência pessoal na prática e ensino da
capoeira, desafiou-se a confrontar o argumento da violência como
aspecto restritivo à tematização deste conteúdo no âmbito escolar.
O fruto do trabalho é apresentado a seguir em forma de relato,6
procurando deixar claro sob qual entendimento de Educação Física
e qual perspectiva de trato do conteúdo o mesmo foi desenvolvido.

4
É preciso chamar a atenção para o fato de que adotamos a pesquisa-ação como metodologia
de referência, sem fechar as portas para elementos que escapem desse universo, por
entendermos que isso poderia obstruir nosso percurso investigativo.
5
Assim, precisamos nos reconhecer como professores-pesquisadores, que criam e recriam
a sua profissão no contexto da prática (MALDANER, 2000).
6
O relato no 1 refere-se à intervenção realizada pelo professor Luciano de Almeida. O relato
no 2, à intervenção realizada pelo professor Paulo Rogério Barbosa do Nascimento.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 95

Acreditamos, desta forma, poder contrapor os argumentos


restritivos citados, inserindo-nos no debate sobre a temática e
contribuindo para a superação de pseudo-entraves ao oferecimento
e desenvolvimento deste tema no ensino escolar formal.

4 RELATOS E ANÁLISES

4.1 RELATO N O 1: A NECESSIDADE DE O PRO-


FESSOR SER ESPECIALISTA OU TER VIVÊNCIAS
SUBSTANCIAIS EM “LUTAS”: UM DISCUTÍVEL
ARGUMENTO RESTRITIVO PARA O TRATO DO TEMA
NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

Deteremos o foco de nossa análise no relato que buscou


contrapor o argumento de que o professor, para desenvolver o
conteúdo de lutas na Educação Física escolar, precisa,
necessariamente, ter tido vivências de lutas no seu cotidiano de
vida, ou ser um especialista em alguma modalidade de luta. Será
que esse requisito é um critério necessariamente indispensável?
A resposta a essa pergunta não pretende ser universal, mas
objetiva contribuir para a reflexão dos professores que estão inseridos
nas escolas e que se sentem “despreparados” em tratar este tema,
de certa forma, “novo” na escola. Esta primeira resposta vem em
forma de relato de uma experiência que apresenta os limites e
possibilidades de uma intervenção com uma turma de 5ª série de uma
escola da rede pública estadual da cidade de Santo Augusto (RS).
Neste relato, apresentamos uma abordagem que não deve ser
considerada uma “receita” para o trabalho do ensino de lutas na
Educação Física escolar, e sim apenas uma das possibilidades do
trato pedagógico do tema, uma vez que qualquer proposta, ao ser
universalizada sem considerar o contexto no qual se insere, está
condenada ao fracasso.
Nas aulas de Educação Física, tem-se dado prioridade ao plano
procedimental (emprego de técnicas e fundamentos), enquanto tem-se

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


96 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

deixado de lado o atitudinal (valores nas e para as práticas), bem


como o conceitual (entendimento do porquê realizar este ou aquele
movimento) (DARIDO, 2001).
Nossa intervenção está alicerçada nessas três dimensões e
nas seguintes questões, que nos deram um indicativo de como
constituir o processo de ensino de lutas no contexto escolar:7 por
quê ensinar? (justificativa); o que ensinar? (seleção de conteúdos);
quando ensinar? (etapas ensino-aprendizagem); como ensinar?
(metodologia); o que, para que, como e quando avaliar? (construção
de um processo de avaliação).
Da tentativa de esboçar um entendimento acerca destas
questões, consolidou-se a presente intervenção. Nesse sentido,
abordamos o tema, no plano conceitual, com base nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs), que caracterizam os esportes de
combate/luta como “[...] disputas em que o(s) oponente(s) deve(m)
ser subjugado(s), mediante técnicas e estratégias de desequilíbrio,
contusão, imobilização ou exclusão de um determinado espaço na
combinação de ações de ataque e defesa” (BRASIL, 1997, p. 49).
A partir da explicitação desse conceito, iniciamos nossa discussão
com os alunos para que eles expusessem as lutas que “conheciam”.
Em suas falas, surgiram: judô, karatê, boxe, kung fu, sumô, etc.
Algumas lutas eles não sabiam nomear, mas deram algumas
características para que pudéssemos identificá-las conjuntamente.
Após, elegemos as lutas que utilizam como técnicas, táticas e
estratégias de oposição, a imobilização, a exclusão de determinado
espaço e o desequilíbrio, ou seja, a greco-romana, o sumô e o judô.
Abordamos o esporte de combate/luta institucionalizado, no
plano conceitual, para que os alunos pudessem se apropriar dos
elementos que constituem as lutas, como histórico, rituais, crenças
e principais regras, através de trabalho de pesquisa. Outro recurso
utilizado para que os alunos compreendessem este tema foi a
visualização e análise de vídeos das três modalidades estudadas.
A abordagem do esporte institucionalizado permite aos alunos
aprofundarem seus conhecimentos sobre os esportes de combate/

7
Essas questões embasam também uma proposta de intervenção que vem sendo realizada,
desde 2004, na escola em que parte deste estudo vem sendo desenvolvido (ALMEIDA;
FENSTERSEIFER, 2006).

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 97

lutas, tendo em vista que o acesso aos mesmos é superficial e carrega


uma grande dose de preconceito, atribuindo-lhes o imaginário de
esportes violentos.
No plano procedimental, a ênfase recai sobre os jogos de lutas
(NASCIMENTO, 2006), 8 com a conseqüente transformação
pedagógica desses esportes (KUNZ, 2001). Dos jogos de lutas
realizados em aula, destacamos o cabo de guerra, briga de galo,
exclusão de espaço com ombro, mãos, conquista da quadra do
oponente e conquista de objetos com oposição. Alguns elementos
do esporte são incorporados nos jogos de lutas com a criação de
regras e novos jogos propostos pelos alunos. Utilizamo-nos de três
exemplos de jogos de lutas propostos por três grupos de alunos.9

Nome Modo de
Regras Proibições Estratégias
da luta jogar/objetivo

Tirar o
adversário
É proibido
da pista;
soltar as
Derrotar o usando só
mãos e Exclusão do
Jo g o d e adversário, tirando-o as costas,
qualquer e sp a ço .
costas da pista, só usando dando as
tipo de
as costas. mãos
violência
para o
co m o s p é s.
adversário
não cair.

É proibido
trocar de
Vestir-se de gaúcho; Conseguir
braço
desequilibrar o tirar o
quando
adversário no adversário
estiver
espaço adaptado, d o e sp a ço , Exclusão do
Luta jogando e
com um dos braços não tirando e sp a ço .
gaúcha não pode
nas costas e o outro um dos
usar
tentando braços de
qualquer
desequilibrar o trás das
tipo de
adversário. costas.
violência
co m o s p é s.
continua...

8
NASCIMENTO, Paulo R. B. Apostila da disciplina de Metodologia do Ensino de lutas,
2006. (Mímeo).
9
Será mantida a descrição original dos alunos, sem alteração ou correção de erros ortográficos
e/ou gramaticais.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


98 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

continuação.

Os oponentes desta
luta devem ficar de
Não pode
joelhos em um lugar
Permanecer soltar as
apropriado e têm
Briga de co m o s mãos. É
que tentar derrubar o Desequilíbrio.
joelhos joelhos no proibido dar
outro. Quem ficar
chão. socos nos
com os joelhos no
adversários.
chão ganha a luta.
Quem tirar, perde.
Quadro 1. Lutas propostas pelos alunos

Neste quadro, percebemos a intenção de prevenir atitudes de


deslealdade dos alunos através das proibições contidas em seus
jogos, para demonstrar o respeito à ética, ao esporte e inibição da
violência (dimensão atitudinal) nos jogos criados/adaptados por eles
mesmos.
Todos os grupos realizaram os jogos de lutas elaborados pelos
colegas e apontaram alguns elementos que poderiam ser alterados,
ou melhor explicitados, através da inclusão de novas regras,
proibições, formas de pontuar, etc. Nestes jogos, surgiram vários
elementos para serem discutidos no plano atitudinal, como respeito
às regras, à integridade física e moral dos colegas e às diferenças
de gênero, estatura e peso.
Para exemplificar, trazemos para a discussão um diálogo
estabelecido entre professor e aluno ao final de uma das aulas:10
Aluno: Professor, até que eu tô gostando das aulas
de lutas, mas por quê eu tenho que lutar sempre
com o João?11
Professor: Gabriel, como foram tuas experiências
com os jogos de lutas nas primeiras aulas, quando

10
Fizemos um relato após a aula para não perdermos informações relevantes para o nosso
trabalho diário.
11
Adotamos nomes fictícios para preservar as identidades dos alunos.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 99

você disputava com as meninas e com meninos


mais baixos e de peso inferior?
Aluno: Sempre ganhei.
Professor: E quando você luta com o João?
Aluno: Ganho quase sempre, mas com maior
dificuldade.
Professor: Por quê se joga/luta?
Aluno: Para tentar ganhar.
Professor: Pois é, a incerteza do resultado é o que
dá prazer ao jogo. Você não acha?
Aluno: Acho que sim.
Professor: Você acha que teus colegas gostam de
perder os jogos/lutas para você?
Aluno: Acho que não, mas perder faz parte do
jogo, não é?
Professor: Com certeza, mas perder sempre, é legal?
Aluno: Não.
Professor: Vamos pensar no seguinte: nos jogos
de lutas você vem levando vantagem, pois este
exige força (jogos de exclusão do espaço), mas em
outros jogos, você nem sempre se sai muito bem,
não é?
Aluno: É verdade.
Professor: É necessário ganhar sempre?
Aluno: Não.
Professor: Você gosta de perder sempre?
Aluno: Não.

Neste diálogo estabelecido com Gabriel, tentamos pontuar


questões relacionadas com ganhar e perder, gênero, estatura e peso.
Gabriel faz parte da turma dos “gordinhos” que, nos jogos esportivos,
como o futsal, por exemplo, vai para o gol, é o último a ser escolhido
para fazer parte de uma equipe ou, ainda, ninguém o escolhe. Nos
jogos de lutas, lhe são proporcionadas vivências de sucesso, pois
ganha a maioria das lutas das quais participa. Por outro lado, faz-se

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


100 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

necessário que ele reflita sobre as vivências de fracasso e de sucesso,


pois teve a oportunidade de vivenciar essas duas experiências. Quais
são as que mais nos marcam? É preciso estabelecer uma relação
equilibrada entre esses dois extremos, para que os alunos adotem
critérios para saber analisar, avaliar e criticar situações de inclusão
e exclusão nas aulas de Educação Física, contribuindo, desta forma,
para a construção do respeito às diversidades e individualidades
dos sujeitos que fazem parte de cada contexto (plano atitudinal).
Conseguimos dar novos sentidos a alguns preconceitos que os
alunos tinham com relação às lutas, como, por exemplo, no sumô, o
imaginário dos alunos era de que somente pessoas muito pesadas e
grandes pudessem praticar esta luta, e geralmente é isso que ocorre
no esporte institucionalizado. Porém, quando adaptamos as regras
e damos um trato pedagógico a elas, podemos dar novos sentidos e
produzir conhecimento e oportunizar diferentes vivências aos alunos,
fato que se confirma no depoimento da aluna Laís: “Sumô: é uma
luta que pode ser praticada por qualquer pessoa; o objetivo é tirar o
outro jogador do lugar marcado e aí pontua.”
Essa intervenção nos possibilitou confirmar a tese de que não
há necessidade de termos uma especialização em uma modalidade
de lutas, desde que nosso objetivo não esteja pautado na formação
de atletas/lutadores, mas na produção de conhecimento nas aulas
de Educação Física. Isso não quer dizer que devamos desconsiderar
as contribuições dos especialistas que dedicam seus estudos a este
tema. Necessitamos da reflexão coletiva entre especialistas e não-
especialistas para produzirmos propostas bem fundamentadas e, com
isso, sistematizar novas intervenções que irão contribuir em nossa
prática pedagógica e, de certa forma, evitar o distanciamento com
o tema.

4.2 RELATO NO 2: “VIOLÊNCIA”: OUTRO DISCUTÍVEL


ARGUMENTO RESTRITIVO PARA O TRATO DO TEMA
DE LUTAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

A violência é vista, conforme foi possível interpretar a partir


das falas dos professores entrevistados, como algo intrínseco às

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 101

práticas da luta, e que pode aflorar e/ou despertar ainda mais se o


tema for tratado na escola, pois muitos alunos já demonstram traços
de comportamento violento no cotidiano escolar.
A violência, bem sabemos, é uma característica presente na
sociedade como um todo e, neste caso, a escola não fica imune a
ela. Ademais, comportamentos mais ou menos agressivos também
se fazem notar nas aulas de Educação Física.
Partindo dessas constatações, a questão que colocamos é: o
trato do tema/conteúdo de lutas realmente contribuiria para suscitar
comportamentos violentos e, por conseguinte, indesejáveis no contexto
da escola e da disciplina de Educação Física?
Olivier (2000, p. 11), ao referir-se à violência, entende-a como:
[...] inerente às relações sociais”, e a concebe como “[...] modos
de expressão e de comunicação”, que surgem em situações de
conflito, de ameaças, de incerteza. O autor posiciona-se no sentido
de que as atividades de luta na escola, sistematizadas e metodo-
logicamente pensadas e conduzidas, servem como importantes
elementos de estruturação motora, psico-afetiva e social, que ajudam
“[...] a criança a gerir e a controlar a complexidade das relações
violentas no interior do grupo social”.
Ao referir-se à questão “Violência e Mídia”, Olivier (2000, p.
13) reconhece a exposição extrema das crianças à imagens violentas,
através de heróis lutadores e, mesmo sem avançar na análise dessa
questão na ótica de ser “nociva” ou não, entende estarmos diante
de um fator que não deve ser negligenciado quanto à formação de
nossas crianças. Assim, o autor reconhece a escola como possível
detentora de um papel de “contra poder”, uma vez que pode
privilegiar cada vez mais a “comunicação, as trocas no contexto de
suas próprias regras sociais”.
Percebemos pelas observações cotidianas e por denúncias de
autores da área da Educação Física, que em muitas realidades
escolares há o predomínio de uma “monocultura”, se considerarmos
a diversidade de práticas da cultura corporal de movimento, e que
essa monocultura se materializa, invariavelmente, com fomento
apenas do “jogar futebol”. Dessa forma, poderíamos nos perguntar

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


102 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

se, nas práticas mais fomentadas na escola, o aspecto violência,


então, não se manifesta?
Uma constatação no campo empírico, que se deu através da
prática cotidiana, foi de que o “jogar futebol” condensa sim uma
série de atitudes que poderíamos considerar violentas e perigosas.
Violência essa que se manifesta tanto nas jogadas ríspidas e mal-
intencionadas, como no aspecto verbal.
Outra questão interessante é de que a segunda-feira é o dia da
semana em que os alunos que estão, de certa forma acostumados
com uma prática monocultural da Educação Física, se tornam ainda
mais afoitos para “jogar futebol”12 livremente. Neste caso, conforme
as leis que vão se estabelecendo no grupo, sem a necessária eqüidade
capaz de conferir àquele momento certo equilíbrio de forças entre
os grupos constituídos e, muito menos, uma maior inserção dos
menos habilidosos para jogar, os quais cumprem apenas a função
de completar as equipes, quando não são literalmente excluídos.
Outra característica que fica evidente na situação explicitada
é de que podemos constatar, nas atitudes dos alunos durante o jogo
de futebol, um trailer dos comportamentos vividos, percebidos,
assistidos, no final de semana. Este contato, para uns, começa no
sábado com o jogo da escolinha à qual pertencem, após o jogo de
seu pai, amigo ou parente, no futebol de várzea,13 continua no
campinho ou quadra perto de sua casa e recomeça no domingo
com os programas esportivos da manhã na televisão. Esses cumprem
o papel de incentivar e garantir o espectador para os diversos jogos
e campeonatos simultâneos que estarão ocorrendo à tarde e, claro,

12
Não é pretensão nos posicionarmos contra o futebol, mas sim utilizá-lo como exemplo palpável
da nossa realidade escolar, para então realizarmos um contraponto, pensando as lutas como
conteúdo da Educação Física. Entendemos ser pertinente esta exemplificação, uma vez que o
futebol é prática “naturalizada na escola”, mas apresenta contradições significativas, tanto na
forma como é tratado “pedagogicamente” na escola, quanto na forma como se apresenta no
campo social mais amplo, o que também pode ser dito em relação às lutas.
13
Expressão popular que designa as incontáveis partidas de futebol do âmbito não profissional
que, amistosas ou não, com maior ou menor grau de organização, com maior ou menor grau de
interferência do poder público, acontecem no cotidiano das cidades e vilarejos, ocupando os
mais diversos tipos de campos e gramados, sendo os finais de semana os períodos mais
expressivos em que são realizadas.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 103

sendo transmitidos ao vivo, retornando à noite com as intermináveis


reprises de gols e melhores lances, exaltação dos “craques” do
momento e debates polêmicos acerca dos jogos que continuarão
nos telejornais e programas da segunda-feira.
Frente a essa exposição extrema dos alunos, a carga emocional
protagonizada pela indústria do futebol em todas as suas escalas,
percebe-se, no campo ou quadra da escola, especialmente no dia
de segunda-feira, como já referido, a imitação dos “craques” do
momento, mas também da agressividade do jogo, expressa na
rispidez das entradas, nos gestos agressivos e, principalmente, nas
falas com tons e significados ofensivos e agressivos e carregadas
das gírias dos gramados.
Para além desta análise realizada, também observamos o
comportamento agressivo de colegas, pais e professores, à beira
das quadras e campos esportivos, o que nos levou a pensar que há
certo tipo de emanação da violência que está perfeitamente se
instaurando como natural, justificável, inclusive no âmbito da escola.
A partir dos elementos desta análise, cabe-nos perguntar,
novamente, se a abordagem da luta no âmbito escolar contribuiria
para fazer aflorar comportamentos agressivos e trazer, inclusive,
transtornos para o próprio professor poder interagir com seu grupo
de alunos, inviabilizando assim o trabalho a ser realizado?
Com base nestas observações e questionamentos, realizamos
uma intervenção numa turma de 4ª série do ensino fundamental, que
vinha apresentando um grau elevado de dificuldade para manejarem
suas emoções, o que estava sistematicamente gerando compor-
tamentos agressivos exagerados, física e verbalmente, principalmente
quando as práticas realizadas envolviam competição coletiva.
A intervenção teve o intuito de estudar e vivenciar as atividades
de luta com os alunos, buscando construir coletivamente a prática e
possibilitando a interação entre os mesmos, de uma maneira
diferenciada dos jogos coletivos com bola, cuja lógica comporta a
oposição e colaboração, para ofertar a vivência da oposição com
contato corporal característico das lutas.
Para tanto, essa perspectiva de vivência, intencionalmente
mediada pelo professor, foi adotada no sentido conferido por Sbórquia

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


104 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

e Gallardo (2006, p. 1): “[...] de pôr os alunos em contato com a


cultura corporal, partindo do pressuposto de que a cultura é um
patrimônio universal ao qual todo ser humano deveria ter direito”;
ofertar essas vivências significa que:
[...] o interesse pedagógico não está centrado no
domínio técnico dos conteúdos, mas no seu domínio
conceitual, na perspectiva de um saber sistematizado
que supere o senso comum, inserido num espaço
humano de convivência, em que possam ser
vivificados aqueles valores humanos que aumentem
o grau de confiança e de respeito entre os integrantes
do grupo. (SBÓRQUIA; GALLARDO, 2006, p. 1).

A seguir, apresentamos um relato resumido da vivência


realizada, acompanhado de considerações gerais a respeito de cada
aula desenvolvida e que fizeram parte do desenvolvimento e
avaliação contínua de todo o processo:

Aula Desenvolvimento Impressões gerais do professor

Participação efetiva de todos os alunos


Exploração, com os alunos, do texto
e muita expectativa inicial, o que se
denominado "Brincando de Luar"14
manteve durante a aula e para a aula
contendo exploração sócio-histórica
seguinte através de tarefa levada para
sobre as manifestações de luta e
casa de pensar sobre questões
1ª exploração conceitual da lógica das
estruturais de uma luta para ser
distintas lutas. Utilizou-se
vivenciada, conforme critérios prévios
primeiramente o texto seguido de
repassados aos alunos, quanto ao
debate e visualização através do
objetivo, ações permitidas, ações
vídeo de lutas diferenciadas entre si.
proibidas, etc.
continua...

14
O texto, elaborado pelo professor responsável pela intervenção, tratou de conhecimentos
sócio-históricos gerais a respeito das lutas, com a preocupação de adotar uma linguagem
acessível à turma, conforme sua série e contexto, por exemplo: houve, inclusive, referência
aos animais (gato, cachorro, etc.), e suas reações, que podemos classificar como brincar de
luta. Essa linguagem foi ao encontro da realidade sociocultural dos alunos, que pertencem a
uma comunidade da zona rural, o que despertou os mais diversos relatos e exemplos,
baseados nas suas experiências de vida. O escrever, reescrever, adequar, exemplificar
numa linguagem acessível aos contextos socioculturais e níveis de compreensão, das
turmas escolares e/ou dos escolares de cada realidade específica, conceitos, idéias,
conhecimentos, que como profissionais acessamos numa linguagem técnica, nos parece
cada vez mais uma habilidade necessária do professor de Educação Física, o que
definitivamente redimensiona seu papel “estereotipado” de “instrutor de ginástica”, apenas.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 105

continuação.

A partir do que os alunos haviam


pensado como tarefa de casa,
estabelecemos em aula a criação Todos opinaram e, nas divergências,
coletiva de uma luta para a turma se buscava acordo ou se fazia
vivenciar. Inicialmente, foi votação,15 processo muito bem
coletivamente definida que a entendido, desenvolvido e
lógica a ser vivenciada seria a de acompanhado pelos alunos, é claro,
levar o oponente ao chão. com aquele “barulho” característico, e
2ª Conforme roteiro organizado pelo a necessidade de intervenções do
professor, a turma foi opinando e professor no sentido de retornar ao
estruturando a luta. Estavam em foco específico do trabalho em alguns
jogo questões como local de momentos. De início, foi necessário
prática, ações permitidas e controlar os alunos mais “afoitos”, que
ações não permitidas, etapas de já queriam ir logo para a ação, sem
duração, posicionamento inicial, muito “papo”, o que já era esperado.
ritual de início e término, normas
de segurança.

Os alunos mantinham o entusiasmo. A


questão era saber se, no momento da
vivência, a dificuldade de manejo das
emoções, que muitos alunos vinham
demonstrando nos jogos coletivos
com bola, iria novamente se
caracterizar. A prática foi realizada
em cima de um único colchão, com
uma dupla de cada vez. Como era
uma primeira experiência com a
turma, a restrição do tempo de
Vivência da luta elaborada pela
3ª prática devido a esse tipo de
turma.
organização não foi encarada
inicialmente pelo professor e pelos
alunos como um problema, e sim
como um momento de “testar” a
criação coletiva e readequá-la se
necessário. Alguns poucos alunos não
se sentiram à vontade para os
enfrentamentos diante dos olhos dos
outros e participaram apenas como
assistentes para opinar na avaliação
da tarefa.
continua...

15
Esta habilidade de mediar diferentes e/ou divergentes opiniões pelo uso do debate e do
voto, relacionados com o conhecimento que está sendo tratado, também se entende como
cada vez mais necessária, e mais que isso, uma imposição, uma vez que o professor de
Educação Física passa também a ser investido do papel de “tematizador” de assuntos,
temas, práticas que extrapolam a sua relação/dependência exclusiva dos conhecimentos
anátomo-fisiológicos.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


106 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

continuação.

Passada a primeira vivência, passou-se a


utilizar dois colchões e dividimos a turma
em duas, aumentando assim o tempo de
prática. Os alunos realizaram nova vivência,
que, por sugestão do professor, devia
Nova vivência da luta elaborada contemplar enfrentamentos com colegas
pela turma, com as devidas diferentes a cada vez. Sugestão essa que
4ª readequações percebidas e causou certo furor, em relação às diferenças
opinadas pelos alunos na aula de peso, estatura, força, preferências de
anterior. amizades. Essas questões foram discutidas
permanecendo como tarefa para a turma
descobrir como poderíamos possibilitar que
uma mesma pessoa enfrentasse colegas
com características diferentes, sem que
ambas ficassem em desvantagem extrema.

Discutiu-se sobre as questões emanadas


na aula anterior e, de certa forma, houve
novamente resistências para maior
integração da turma na diversificação dos
enfrentamentos. O professor sugeriu então a
Nova vivência da luta elaborada,
organização da aula, que visava assim
porém com mais colchões e
possibilitar aos poucos as trocas de
alunos dispostos em duplas,
5ª adversários, sem forçar essa atitude. Como
todos lutando ao mesmo tempo
os colchonetes eram menores, adaptou-se
e trocando de dupla a cada nova
a luta para ocorrer com os alunos na
luta.
posição de joelhos, para não correrem o
risco de uma queda a partir da posição de
pé. Com essa organização, houve maior
integração da turma e maior número de
enfrentamentos com adversários diferentes.

Com essa organização e direcionamento


Alunos dispostos em grupos de dado à aula, continuou a participação
quatro componentes. Vivência efetiva dos alunos, com um grau de
da luta adaptada para a posição interesse, de contribuição e de decisão,
de joelhos, porém cada lutador junto a seus colegas, aumentado. Essa
contaria com um colega que forma organizacional nessa turma
faria o papel de auxiliar técnico, desencadeou grande motivação. Percebeu-
cuja função seria observar os se de fato maior interação. No momento
6ª procedimentos utilizados pelos em que se abriu para novos arranjos nos
lutadores e, em momentos acordos e regras, o grau de interação
específicos, rever situações com aumentou ainda mais. Percebeu-se, a partir
seu colega, combinar ações e de então, dois contra um, dois contra dois,
estratégias. Num segundo todos contra todos no grupo, e desafios de
momento, abriu-se a grupo com grupo, o que rompeu quase que
possibilidade de cada grupo totalmente com a situação inicial vivenciada
manejar regras e acordos. de pouca predisposição por parte de uns
interagirem com alguns colegas.
continua...

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 107
continuação.

Os alunos deixaram transparecer, na


avaliação do conteúdo e das aulas,
que a expectativa e motivação nas
aulas foram mantidas em níveis ótimos
e, também, que reconheceram a
validade da nova experiência. Na auto-
Avaliação das aulas pelos alunos e avaliação, deixaram transparecer que
7ª auto-avaliação, conforme ficha haviam compreendido a proposta de
elaborada pelo professor. criação coletiva e a necessidade de
autocontrole de suas ações e
emoções no desenvolvimento de suas
atividades, assim como reconheceram
atitudes e ou sentimentos particulares
de medo, vergonha, ansiedade e
coragem.
Quadro 2. Relato resumido da vivência realizada, acompanhado de
considerações gerais a respeito de cada aula.

Não foram percebidos comportamentos violentos ou agressivos,


nem física, nem verbalmente, no desenvolvimento de todas as aulas;
ao contrário, percebeu-se um envolvimento constante nas tomadas
de decisões e um zelo para o cumprimento dos acordos.
Essa constatação nos leva a compactuar com a posição de Olivier
(2000), anteriormente referida. Os resultados obtidos, no nosso
entendimento, relativizam o argumento da violência como sendo algo
restritivo ao trato deste conteúdo por essa disciplina escolar.
Entendemos também que fundamental é a maneira de conduzir a
tematização deste conteúdo, o que vale também para o futebol e as
demais manifestações da cultura corporal de movimento. Qualquer
que seja o tema a ser abordado, se não for fundamentado e tratado
pedagogicamente, corre o risco de gerar conflitos e situações hostis, o
que confirma o entendimento esboçado por Parlebas apud Belbenoit
(1974, p. 114-115) de que:
[...] o desporto [ou outro tema] não possui nenhuma
virtude mágica. Ele não é em si nem socializante
nem anti-socializante. É conforme: ele é aquilo que
se fizer dele. A prática do judô ou do râguebi pode
formar tanto patifes como homens perfeitos
preocupados com o fair-play.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


108 Artigos Originais Paulo do Nascimento e Luciano de Almeida

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das experiências relatadas e analisadas, podemos afirmar


que os dois fatores inicialmente diagnosticados como restritivos ao trato
pedagógico do tema de lutas na Educação Física escolar podem
realmente ser relativizados. Essa relativização e o conseqüente
tratamento pedagógico deste tema, em nosso entender, estão atrelados
ao delineamento de uma concepção específica de Educação Física por
parte do professor e aos arranjos metodológicos coadunados com essa
perspectiva, no caso deste estudo, a “cultura corporal de movimento”.
Precisamos elaborar “novas” abordagens a partir de nossas
experiências práticas, que, com certeza, irão nos remeter a novas
questões, considerando cada realidade. Essas novas questões ou
problemas não devem ser encarados como empecilhos, e sim como
pontos de partida para re-estruturarmos nosso fazer pedagógico
cotidiano, pois essa é uma condição normal, “natural”, para quem adota
uma postura de constante aprendizado e compreende o movimento
eterno do conhecimento, que, por ser reconhecidamente de caráter
provisório, está sempre passível de ser re-significado de acordo com as
realidades, concepções e momentos históricos específicos.

The thematic of fights in the Physical Education


at School: restrictions and possibilities
Abstract: To the theme/content of fights, indicated
to be treated pedagogically by the curricular subject
of Physical Education at school, some restrictions
are shown. The challenge of the present work was
to carry out necessary thoughts about the theme as
well as effective interventions in the school context,
in order to confront them. It is understood that, with
these “unique” experiences, it was possible to consider
the impeding factors made available to the pedagogic
handling of this theme/content at school, and we
emphasize the importance for the teacher to have
clear to himself the theoretic perspective under which
he/she has to deal with contents and give up work
methodologies adjusted with the respective theory.
Keywords: Fight. Physical Education. Curriculum.

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


A tematização das lutas na Educação Física Escolar... 109

La tematización de las luchas en la Educación


Física Escolar: restricciones e posibilidades
Resúmen: Al tema de luchas, indicado para ser tratado
pedagógicamente por la disciplina curricular de
Educación Física en la escuela, se presentan algunas
restricciones. El desafío de este trabajo fue realizar
una necesaria reflexión sobre el tema, y efectivas
intervenciones no contexto escolar, para compararlas.
Entendemos que, con esas experiencias “singulares”,
fue posible relativizar “obstáculos” puestos para el
trato pedagógico de ese tema/contenido en la escuela,
y reforzamos la convicción de la importancia de el
profesor tener clara para si la perspectiva teórica
bajo la cual tratar los contenidos e lanzar mano de
metodologías de trabajo sintonizadas con la respectiva
teoría.
Palabras clave: Lucha. Educación Física. Currículo.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Luciano de; FENSTERSEIFER, Paulo Evaldo. O que ensinar e aprender


nas aulas de educação física na escola? Revista Digital, Buenos Aires, v. 11, n.
102, nov. 2006. Disponível em: <http://www.efdeportes.com/efd102/aulasef.htm>.
Acesso em: 20 jan. 2007

BELBENOIT, Georges. O desporto na escola. Lisboa: Estampa, 1974.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Fundamental.


Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física. Brasília: MEC/SEF, 1997.

DAOLIO, J. Educação Física Escolar: em busca da pluralidade. Revista Paulista


de Educação Física, São Paulo, supl. 2, p. 40-42, 1996.

DARIDO, Suraya Cristina. Os conteúdos da educação física escolar: influências,


tendências, dificuldades e possibilidades. Perspectivas em Educação Física
Escolar, Niterói, v. 2, n. 1 (supl.), p. 5-25, 2001.

KUNZ, Elenor. Transformação didático-pedagógica do esporte. 4. ed. Ijuí:


UNIJUÍ, 2001.

MALDANER, Otavio Aloísio. A formação inicial e continuada de professores


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, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


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Recebido em: 22/03/2007


Aprovado em: 04/07/2007

, Porto Alegre, v. 13, n. 03, p. 91-110, setembro/dezembro de 2007.


REVISTA DE
EDUCAÇÃO FÍSICA
Nº 135 NOVEMBRO DE 2006

Artigo Original

AS LUTAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

Heraldo Simões Ferreira

Universidade Estadual do Ceará (UECE) - Fortaleza - CE - Brasil.

Resumo expressivo de professores utiliza esta modalidade


como parte de seus conteúdos em aulas. Concluiu-se
Este artigo tem o objetivo de compreender como que a educação física deve proporcionar diversas
os professores de educação física estão utilizando formas de cultura corporal, como as atividades
o bloco de conteúdos proposto nos Parâmetros relacionadas às lutas, que devem fazer parte das
Curriculares Nacionais - Educação Física, no que modalidades ofertadas aos discentes. Para isso,
se refere à prática das lutas. Para tanto, foi utilizada é necessário que os professores façam cursos
uma abordagem quantitativa, onde 50 professores, de atualização ou usem a criatividade, buscando
da rede pública e privada de educação, de Fortaleza alternativas na área.
(Ceará - Brasil), responderam a um questionário.
Os resultados demonstram que um número pouco Palavras-chave: Educação Física, Escola, Lutas.

Original Article combats. For this a quantitative approach was


used, where fifty public and private school teachers,
COMBATS IN PHYSICAL EDUCATION AT from Fortaleza (Ceará – Brazil), responded to a
SCHOOL questionnaire. The results show that an expressively
small number of teachers used this modality as part
Abstract of their class content. We concluded that physical
education must provide diverse forms of body
This article aims to understand how physical culture, such as activities related to combat, which
education teachers are using the group of contents should form part of the modalities offered to the
proposed in the National Curricular Parameters students. For this, it is necessary that teachers
– Physical Education, regarding the practice of take updating renovation courses or use creativity,
seeking alternatives in the area.
_________
Recebido em 19.02.2006. Aceito em 26.07.2006. Key words: Physical Education, School, Combats.

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INTRODUÇÃO geradas na dinâmica cultural, desde os primórdios


da evolução até hoje”.
A educação física que queremos é a de
qualidade e, como tal, a diversidade é um ponto O profissional de educação física não atua sobre
fundamental para se conseguir esta finalidade. Na o corpo ou com o movimento em si, não trabalha
diversidade, valoriza-se a dimensão das múltiplas com o esporte em si, não lida com a ginástica em
leituras da realidade e a conseqüente ampliação das si. Ele trata do ser humano nas suas manifestações
culturais relacionadas ao corpo e ao movimento
possibilidades de comunicação e de relacionamento
humano, historicamente definidas como jogo,
entre as pessoas. Tendo em vista este aspecto, esporte, dança, luta e ginástica (Daolio, 2004).
o presente artigo procura compreender como os
professores desta disciplina estão utilizando o bloco Como estudioso da cultura, considerando a
de conteúdos proposto nos Parâmetros Curriculares educação física como disciplina escolar e a escola
Nacionais (PCN’s) - Educação Física, no que se refere como espaço e tempo de desenvolver a cultura,
à prática das lutas no contexto atual da educação entendo como tarefa precípua da área garantir ao
física escolar. aluno a apreensão de conteúdos culturais, no caso,
Como meio de se atingir os objetivos gerais relacionados à dimensão corporal: jogo, ginástica,
da educação física, utiliza-se a prática das lutas, esporte, dança, luta (Daolio, 2004).
sem, contudo, deixar de incentivar os esportes com
bola, as ginásticas, o atletismo, a dança, os jogos No ensino superior, pode-se constatar, ao
e as brincadeiras. Entende-se como lutas, não assumir uma turma de licenciatura em educação
somente as modalidades tidas como tradicionais física de uma universidade, a preocupação dos alunos
(Judô, Caratê, Kung Fu), mas, também, a prática em como utilizar o conteúdo da disciplina nas aulas
da luta informal. de educação física escolar. Alguns alunos encaram
Ao se lecionar a disciplina de educação a disciplina de lutas como “mais uma disciplina
física, da educação infantil até o ensino médio, descartável”. Por este motivo, passou-se a questionar
comprova-se que as lutas fazem sucesso em todas como um aluno de graduação poderia aprender judô
as faixas etárias. Na educação infantil, as lutas de ou caratê em apenas seis meses e, assim, pudesse
animais (luta do sapo, luta do jacaré ou a luta do saci) estar apto a empregar o conhecimento adquirido
têm ajudado muito na liberação de agressividade no momento em que estivesse trabalhando em
das crianças, além de serem trabalhados, nestas escolas.
atividades, todos os fatores psicomotores. No ensino Para isto, o programa da disciplina na Universidade
fundamental, lutas que requerem um maior esforço Estadual do Ceará (UECE), mediante autorização do
trazem excelentes respostas, como a luta do “empurra coordenador, foi reformulado, procurando-se trabalhar
e puxa” ou o “uga-uga” (tirar o colega de dentro do além do que estava na ementa (somente Caratê e
círculo central). No ensino médio, as modalidades Judô). Passou-se, então, a trabalhar a luta de uma
começam a ser exploradas de uma maneira mais forma lúdica, mostrando que ela pode ser mais um
profunda, levando ao conhecimento do tema, recurso na educação física escolar, muito embora
fazendo um resgate histórico das modalidades e as houvesse a certeza de que um aluno de faculdade,
relacionando com a ética e os valores. sem conhecimento prévio do assunto, dificilmente
As lutas devem servir como instrumento de poderia aprender a arte do Caratê ou do Judô em
auxílio pedagógico ao profissional de educação período tão curto de tempo (um semestre).
física: o ato de lutar deve ser incluído dentro do Algumas questões, portanto, emergem sobre
contexto histórico-sócio-cultural do homem, já que a prática das lutas na aula de educação física
o ser humano luta, desde a pré-história, pela sua escolar, entre elas: os professores de educação física
sobrevivência. conhecem e aplicam os PCN’s? Usam lutas em suas
Daolio (2004) sustenta a idéia de que a cultura aulas? De que forma? Quais as estratégias utilizadas
é o principal conceito para a educação física, “porque em aulas com lutas? O que pensam sobre as lutas
todas as manifestações corporais humanas são na escola?

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Este estudo visa observar a realidade dos não repassavam seus conhecimentos facilmente e,
professores de educação física no que se refere à além disso, não existem registros documentados, já
utilização das lutas como um dos blocos de conteúdo que as tradições eram passadas de forma oral, de
proposto pelos PCN’s. mestre para discípulo.
De acordo com Alves Jr (2001):
DESENVOLVIMENTO
Na história da humanidade quando levamos em
As lutas: questões históricas consideração o estágio já urbano, ao se fazer uma
breve gênese das lutas, observamos que não foram
Existem muitas definições sobre o que seriam poucos os registros encontrados nas mais diversas
as lutas, sendo a definição proposta nos PCN’s - civilizações. Remontando entre os anos 3000 e
Educação Física: 1500 a.C., os sumerianos deixaram imagens de
três duplas de lutadores representando diversas
As lutas são disputas em que os oponentes devem fases de uma luta, com características que D.
ser subjugados, com técnicas e estratégias de Palmer e M. Howell (in Blanchard, Chelska, op. cit)
desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão consideraram como sendo, “uma das provas mais
de um determinado espaço na combinação de antigas” do que hoje entenderíamos como atividade
ações de ataque e defesa. Caracterizam-se por de luta. Outras evidências de práticas de lutas
uma regulamentação específica a fim de punir também foram encontradas em outras culturas,
atitudes de violência e deslealdade. Podem ser através dos desenhos encontrados dentro da tumba
citados exemplos de luta: as brincadeiras de egípcia de Beni Hassan (Henares, 2000) e também
cabo de guerra e braço de ferro, até as práticas em Creta, por volta de 2000 a.C. (Blanchard e
mais complexas da capoeira, do judô e do caratê Chelska, op. cit).
(Brasil, 1998).
Algumas informações nos levam a crer que os
Histórias sobre lutadores são transmitidas de sistemas de lutas chegaram à China e à Índia, no
gerações a gerações. Textos bíblicos já comentam século V a.C., através do comércio marítimo.
pelejas entre oponentes. Segundo Reid e Croucher Muitos artistas marciais consideram a China
(2003): como o berço desta cultura, como se referem Reid e
Croucher (2003):
Desde as épocas antigas temos registro de lutas
a dois. A história de Davi, que matou Golias com
(...) um monge indiano chamado Bodhidharma
uma pedra atirada por uma funda, é uma das
descrições mais detalhadas (...) com sua arma chegou certo dia ao templo e mosteiro de Songshan
simples, Davi foi capaz de obter uma precisão Shaolin, na China, onde passou a ensinar um tipo
comparada à de um samurai quando dá um golpe novo e mais direto de Budismo, que envolvia longos
com sua espada (...). períodos de estática (...) para ajudá-los a agüentar
as longas horas de meditação, ensinou-lhes técnicas
A origem das lutas e das artes marciais continua de respiração e exercícios para desenvolver a
sendo uma incógnita. Os gregos tinham uma forma força e a capacidade de defender-se na remota e
de lutar, conhecida como “pancrácio”, modalidade montanhosa região onde residiam.
presente nos primeiros jogos olímpicos da era antiga.
Os gladiadores romanos, já naquela época, faziam o A filosofia do budismo influenciou profundamente
uso de técnicas de luta a dois. Na Índia e na China, os sistemas de lutas de todo o oriente, principalmente
surgiram os primeiros indícios de formas organizadas na China, na Coréia, no Japão, na Índia e nos países
de combate. do Sudeste Asiático. Assim, as técnicas de luta se
A história das formas de luta, de combate ou de proliferaram pelo oriente.
arte marcial, é difícil de ser definida, pois poucos fatos Neste período, surgem os lutadores sábios e
são verdadeiramente conhecidos. Os antigos mestres suas estratégias militares, sendo exemplos Sun Tzu,

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um general de guerra chinês, e Miyamoto Musashi, o Tae-Kwon-Do, a Esgrima, o Arco e Flecha, o Boxe, a
mais famoso dos samurais do antigo Japão. Ambos Luta Livre e a Luta Greco-romana. O Caratê, que há
escreveram clássicos da arte da guerra, utilizados até muito pleiteia uma vaga nos jogos, já é considerado
os dias de hoje por empresários e empreendedores. esporte olímpico, participando efetivamente do circuito
Segundo Sugai (2004): promovido pelo Comitê Olímpico Internacional, como
os Jogos Pan-Americanos, os Sul-Americanos, os
É interessante destacar também que esses Asiáticos e os Europeus.
clássicos, exaustivamente interpretados ao longo
No Brasil, a educação física deve resgatar a
dos séculos, têm sido considerados muito mais pelo
prisma da lógica, das suas possibilidades bélicas ou Capoeira como parte da manifestação da cultura dos
estratégicas. Todavia, em um momento de tantas negros no período escravocrata. Esta modalidade
transformações por que passamos, de quebra de de luta envolve a dança, a música e um gestual
valores essenciais, da procura do sentido da vida, carregado de historicidade.
é mais que oportuno ressaltar os propósitos mais Também não se pode esquecer o Brazilian
elevados desses dois guerreiros: por meio da arte Jiu-jitsu (derivado do Jiu-jitsu japonês, mas muito
que escolheram, eles conseguiram chegar até o modificado pela família Gracie), hoje considerado um
máximo de compreensão da alma humana para esporte genuinamente “tupiniquim”.
alcançar, à semelhança da natureza, a perfeição A disciplina de educação física, também, tem
da arte de existir.
a responsabilidade de não deixar que os grandes
Conforme atesta Kishikawa (2004), o livro nomes de nossos esportes de luta sejam esquecidos:
de Sun Tzu, “A arte da guerra”, e o de Musashi, “O como Aurélio Miguel, Rogério Sampaio, Eder Jofre,
livro dos cinco anéis”, foram adotados como leitura Maguila, Acelino “Popó” Freitas, Família Gracie, entre
obrigatória na Escola de Administração de Empresas tantos outros.
da Universidade de Harvard.
Após o século XIV, os europeus começaram As lutas na educação física escolar
suas expansões e descobertas de territórios,
tomando contato com a cultura e com os povos de A prática da luta nas aulas de educação física
outros países. Somente em 1900, alguns ingleses deve ser considerada, estando inclusa no bloco de
e outros tantos norte-americanos começaram a conteúdos da disciplina, exposto nos PCN’s:
aprender judô e outras artes marciais japonesas. Após
1945, os norte-americanos, em serviço no Japão, Os conteúdos estão organizados em três blocos,
que deverão ser desenvolvidos ao longo de
disseminaram as lutas do oriente no mundo ocidental
todo o ensino fundamental. A distribuição e o
(Reid e Croucher, 2003). desenvolvimento dos conteúdos estão relacionados
Alguns lutadores possuem uma visão filosófica com o projeto pedagógico de cada escola e a
do que vem a ser uma luta, como afirma Lee especificidade de cada grupo... Assim, não se
(2003): trata de uma estrutura estática ou inflexível, mas
sim de uma forma de organizar o conjunto de
(...) o objetivo da arte é projetar uma visão interior conhecimentos abordados, segundo enfoques que
para o mundo; declarar, em uma criação estética, o podem ser dados: esportes, jogos lutas e ginástica;
espírito mais íntimo e as experiências pessoais de atividades rítmicas e corporais e conhecimentos
um ser humano. sobre o corpo (Brasil, 1988).

Na atualidade, existem inúmeros sistemas de Esta prática pode trazer inúmeros benefícios
luta, as chamadas artes orientais: Kung Fu, Tai-Chi- ao usuário, destacando-se o desenvolvimento motor,
Chuan, Caratê, Judô, Jiu-jitsu, Aikido, Tae-Kwon-Do, o cognitivo e o afetivo-social. No aspecto motor,
Jet-Kune-Do, Kendo, entre outras. Também existem observamos o desenvolvimento da lateralidade, o
aquelas consideradas ocidentais como: o Boxe, a controle do tônus muscular, a melhora do equilíbrio e
Esgrima, o Kick-Boxe, etc. da coordenação global, o aprimoramento da idéia de
Nos jogos olímpicos, estão presentes o Judô, o tempo e espaço, bem como da noção de corpo. No

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aspecto cognitivo, as lutas favorecem a percepção, o revistas que se referem ao tema, adquirem livros de
raciocínio, a formulação de estratégias e a atenção. técnicas de luta e matriculam-se em academias para
No que se refere ao aspecto afetivo e social, pode-se realizar a prática da luta.
observar em alunos alguns aspectos importantes, Portanto, as lutas devem fazer parte dos
como a reação a determinadas atitudes, a postura conteúdos a serem ministrados nas aulas de educação
social, a socialização, a perseverança, o respeito e física, seja na educação infantil, ensino fundamental ou
a determinação. médio, ressaltando-se que as lutas não são somente as
Ao falarmos de lutas como um conteúdo técnicas sistematizadas como Caratê e Judô. O braço
da educação física, alguns podem pensar que de ferro, o cabo de guerra, as técnicas recreativas
se refere a uma das tendências da disciplina: a de empurrar, de puxar, de deslocar o parceiro do
educação física militarista, que possui como objetivo local, as lutas representativas como a luta do sapo
a obtenção de uma juventude capaz de suportar o (alunos agachados, um tentando derrubar o outro),
combate, a luta e a guerra (Ghiraldelli, 1997). Esta a luta do saci (alunos de mãos dadas, somente com
tendência da educação física teve seu apogeu um pé no chão, tentando provocar o desequilíbrio
durante o período nazi-fascista. A inclusão das lutas do parceiro, forçando o colega a tocar com o pé que
na disciplina de educação física não é promover estava elevado no chão), são apenas alguns exemplos
alunos-soldados, nem prepará-los para a guerra. de como se trabalhar as lutas de forma estimulante
Pretende-se oferecê-las, na escola, com o objetivo e desafiadora na aula de educação física. Pode-se
de proporcionar diversidade cultural e amplitude de levar, em visitas às escolas, especialistas, promovendo
atividades corporais. palestras, ministrando pequenos cursos ou fazendo
Outra vez, reportando a Alves Jr (2001): demonstrações específicas. Os alunos podem visitar
academias de lutas, assistir a filmes e documentários
A Educação Física passa a ser uma disciplina ou, ainda, realizar pesquisas sobre o tema.
que vai tratar pedagogicamente de uma área de Não se pode esquecer que, no ensino médio,
conhecimento denominada de ‘cultura corporal’, a filosofia das lutas, a prática competitiva das
configurada na forma de temas ou de atividades modalidades e o estudo dos clássicos de Sun Tzu
corporais. Devemos ter consciência que a atividade
e Miyamoto Musashi, já citados, poderiam motivar e
física das lutas não é nem nociva nem virtuosa em
si, ela transforma-se segundo o contexto. A luta na afirmar o sentido das lutas como conteúdo.
universidade, na escola, ou em qualquer outro local, Além disso, conforme a revista do Conselho
torna-se o que dela a fazemos, e a competição, Federal de Educação Física (CONFEF, 2002):
acrescentaríamos, não é uma imposição deste
esporte. Pierre Parlebas (1990) lembra que as A prática da luta, em sua iniciação esportiva, apresenta
lutas em geral são atividades esportivas com uma valores que contribuem para o desenvolvimento
oposição presente, imediata, e que é o objeto pleno do cidadão. Identificado por médicos,
da ação, existe uma situação de enfrentamento psicólogos e outros profissionais, por sua natureza
codificado com o corpo do oponente. Desta forma, histórica apresentam um grande acervo cultural.
mais do que lutar contra o outro, a educação Além disso, analisada pela perspectiva da expressão
física escolar deve ensinar a lutar com o outro, corporal, seus movimentos resgatam princípios
estimulando os alunos a aprenderem através inerentes ao próprio sentido e papel da educação
da problematização dos conteúdos e da própria física na sociedade atual, ou seja, a promoção da
curiosidade dos alunos.
saúde.

É inquestionável o poder de fascinação que as lutas Segundo os PCN’s (Brasil, 1988), os objetivos
provocam nos alunos. Nos dias atuais, constata-se que da prática das lutas na escola, são:
o tema está em moda, seja em desenhos animados,
em filmes ou em academias. Não é difícil encontrar A compreensão por parte do educando do ato de
crianças brincando de luta nos intervalos das aulas lutar (por que lutar, com quem lutar, contra quem
ou colecionando figurinhas dos heróis que lutam em ou contra o que lutar; a compreensão e vivência de
seus desenhos animados. Os adolescentes compram lutas no contexto escolar (lutas X violência; vivência

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de momentos para a apreciação e reflexão sobre METODOLOGIA


as lutas e a mídia; análise dos dados da realidade
positiva das relações positivas e negativas com Com o objetivo de compreender como os
relação a prática das lutas e a violência na
professores de educação física estão utilizando
adolescência (luta como defesa pessoal e não para
“arrumar briga”). o bloco de conteúdos proposto nos PCN’s -
Educação Física, no que se refere à prática das
Já a construção do gesto nas lutas, ainda sobre lutas, foi utilizada uma abordagem quantitativa,
o prisma dos PCN’s (Brasil, 1998) requer: através de um questionário fechado, aplicado em
50 professores de educação física, de ambos os
A vivência de situações que envolvam perceber, sexos, profissionais que atuam na rede pública
relacionar e desenvolver as capacidades físicas
e habilidades motoras presentes nas lutas
e particular das escolas de Fortaleza, Ceará,
praticadas na atualidade; vivência de situações Brasil.
em que seja necessário compreender e utilizar Estes professores ministravam aulas nos
as técnicas para as resoluções de problemas níveis de educação física infantil (20%), ensino
em situações de luta (técnica e tática individual fundamental (30%) e ensino médio (50%).
aplicadas aos fundamentos de ataque e defesa); Como critério de inclusão, foi utilizado o fato dos
vivência de atividades que envolvam as lutas,
dentro do contexto escolar, de forma recreativa e
professores estarem atuando apenas na área da
competitiva. educação física escolar e estarem vinculados
ao local de trabalho. Excluímos os professores/
Visando estes objetivos, os conteúdos estagiárIos que, eventualmente, ainda não
ministrados na aula de educação física devem estivessem formados. A pesquisa foi realizada
procurar atender ao desenvolvimento do aluno na cidade de Fortaleza, no período de fevereiro a
no que se refere aos aspectos histórico-sociais maio de 2005. A FIGURA 1 mostra o questionário
das lutas. utilizado:

FIGURA 1
QUESTIONÁRIO APLICADO EM PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA.

1. Você utiliza as lutas em suas aulas de educação física?

Se a resposta for positiva:


A. Através de práticas recreativas/ lúdicas.
B. Através da ajuda de um especialista.
C. Através de vídeos.
D. Através de aula de campo.
E. Outras alternativas.

Se for negativa:
A.Não tenho instrução para isso.
B. A escola não tem condições físicas para tal aula.
C. Não temos um colaborador que saiba tal tema.
D. Acho este conteúdo inadequado para a escola.
E. Outras alternativas.

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2. Você considera que as lutas são apenas as formas pré-existentes, como Caratê, Boxe, Capoeira
ou acha que cabo-de-guerra e braço-de-ferro também são formas de luta?

A.Somente as técnicas pré-existentes podem ser consideradas lutas.


B.Qualquer atividade em que dois oponentes se enfrentam, tentado superar o outro é um tipo
de luta.

3. Que tipo de luta você acha ideal ser trabalhada na escola?

4. É possível trabalhar com lutas na educação infantil?

A.Sim
B.Não

5. Você considera que a prática da luta gera violência?

A.Sim.
B.Não.
C.Depende do professor.

6. Você acha que seus alunos se tornariam mais agressivos ao praticarem lutas?

A.Sim.
B.Não.
C.Talvez.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Os que ofereceram respostas positivas (16


professores - 32%) reforçaram que ministravam
Através dos questionários aplicados, chegou-se estas aulas: com vídeo (oito - 50%), com ajuda de
aos seguintes resultados da guia investigativa: especialistas (cinco - 31,25%), através de práticas
Dos 50 professores questionados, 16 (32%) recreativas (dois - 12,5%) e com aula de campo
afirmaram que utilizavam as práticas das lutas (um - 6,25%). Foi constatado que apenas alguns
em suas aulas e 34 (68%) relataram que jamais profissionais utilizam a criatividade e, adaptando
recorreram às aulas com estes conteúdos. as técnicas tradicionais, incluem em suas aulas
Através desta resposta, observou-se que a as práticas das lutas. O vídeo é a maneira de
grande maioria deixa de utilizar um dos conteúdos transmissão deste conteúdo mais utilizada, seguida
propostos nos PCN’s, as lutas, preferindo manter da participação de convidados para ministrarem
a velha pedagogia da bola em suas aulas, pouco palestras, aulas e oficinas envolvendo o tema.
inovando ou não experimentando novas formas de Entretanto, somente uma pequena parcela
ministrar suas aulas. utiliza as lutas de forma lúdica, podendo ser esta
É mais cômodo ao professor ministrar aulas de a melhor forma de se trabalhar lutas na escola.
futebol, de voleibol ou de qualquer outra atividade Brincar de luta desenvolve os fatores físicos e, ao
com bola, do que preparar aulas envolvendo um tema mesmo tempo, exige um grande esforço cognitivo
tão complexo como as lutas. (formulação de estratégias). O fator afetivo e social

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também é exaltado, podendo ser observado que os seja através de um simples cabo-de-guerra ou de
alunos desenvolvem a auto-estima, o autocontrole e um braço-de-ferro.
a determinação. Dos 50 envolvidos, quando perguntados
Os que responderam negativamente (34 sobre qual luta deveria ser praticada na escola: oito
professores - 68%) afirmaram que o motivo de não (16%) consideraram que nenhuma luta deveria ser
utilizarem as práticas das lutas foram: que não tinham trabalhada na escola, já que poderia ser um gerador
instrução para lecionar tal atividade (14 - 41,17%); de agressividade; 13 (26%) optaram pela Capoeira;
que a escola não oferecia condições estruturais para 12 (24%), pelo Caratê; nove (18%) responderam o
a realização das práticas de lutas (oito - 23,52%); que Judô; quatro (8%) escolheram o Tae-Kwon-do; três
achavam que o conteúdo de lutas era inadequado (6%), o Kung Fu; um (2%), o Jiu-Jitsu; e, apenas dois
para o ambiente escolar (seis - 17,64%); e que não (4%) responderam que a luta na escola deve ser
havia especialistas disponíveis para receber ajuda lúdica, praticada através da brincadeira.
sobre o tema (seis - 17,64%). A resposta a esta pergunta demonstra que a
Ficou bem claro que existem dificuldades Capoeira, uma luta nacional, é a mais votada como
para a prática das lutas na escola, porém, estes modalidade a ser praticada na escola, seguida do
obstáculos não devem ser barreiras intransponíveis. Caratê, que pode ter obtido esta classificação em
Se o professor não tem instrução para lecionar virtude da influência da mídia, pois existem inúmeros
lutas, deve procurar cursos de capacitação, trocar desenhos e filmes de ação protagonizados por
experiências com os colegas ou recorrer ao vídeo lutadores de Caratê. O resultado pouco expressivo
e à ajuda de especialistas. Se a escola não oferece atingido pela votação do Jiu-Jitsu (apenas um voto)
condições físicas e materiais, o professor deve parece trazer à reflexão o comportamento de alguns
utilizar a improvisação, realizando suas atividades praticantes desta arte marcial que têm prejudicado a
na própria sala de aula (tendo o cuidado com a imagem de tão nobre forma de luta.
preparação do espaço) ou oferecendo aos alunos Quando questionados se era possível trabalhar
uma aula de campo (visita a academias, por as lutas na educação infantil: 38 professores (76%)
exemplo). alegaram que não, que esta seria uma prática
Chama a atenção o número de professores que realizada por um especialista em uma academia
afirmaram que o conteúdo de lutas era inadequado ao própria, e os outros 12 professores (24%) disseram
contexto escolar. Através desta afirmação, expõe-se que era possível sim, ou com ajuda de especialista
um recuo do desenvolvimento da educação física (10 - 83,33%), ou de forma lúdica (dois - 16,66%).
diversificada. A prática da educação física tradicional, Neste quesito, os educadores físicos expressaram,
onde imperam atividades como o “rachão” e a antiga em grande parte, a divergência entre lutas e educação
ginástica, precisa romper este paradigma. As aulas infantil. Outro engano, pois as lutas na educação
de educação física necessitam de novas formas e infantil promovem o desenvolvimento integral.
de novos conteúdos, como os direcionados pelos Perguntados se a prática da luta geraria
PCN’s, entre eles a luta, a dança, o conhecimento violência: 12 (24%) responderam que sim; 22 (44%),
do corpo, as atividades rítmicas e expressivas, além que não; e 16 (32%) disseram que depende do
dos esportes, dos jogos e das brincadeiras. professor.
Dos 50 entrevistados, 32 (64%) consideraram Também questionados se os alunos da
que lutas seriam somente as técnicas pré-existentes educação física, ao praticarem lutas nas aulas, se
de combate, enquanto que 18 (36%) afirmaram tornariam mais agressivos: 12 (24%) responderam
que qualquer atividade em que dois oponentes se que sim; 25 (50%), que não; e 13 (26%) que talvez.
enfrentam pode ser um tipo de luta. Este resultado
demonstra que a maioria dos professores ainda não CONCLUSÃO
reconhece a luta diversificada. Para estes, somente
técnicas de Caratê, de Judô, de Capoeira e de Através destes resultados, pode-se concluir
outras modalidades, são consideradas lutas. Desta que os PCN’s - Educação Física devem ser revistos
forma, os alunos perdem a oportunidade de lutar, pelos profissionais da área, pois se alguns possuem

REVISTA DE EDUCAÇÃO FÍSICA - Nº 135 - NOVEMBRO DE 2006 - PÁG. 36-44 43


REVISTA DE
EDUCAÇÃO FÍSICA
Nº 135 NOVEMBRO DE 2006

conhecimento sobre este material, poucos são os que alguns profissionais possuem uma visão
que o utilizam na prática. deturpada do que sejam as lutas, relacionando-as
Pode-se constatar que a prática das lutas, parte com violência e com agressividade, atitude oposta
dos blocos de conteúdos dos PCN’s, e, portanto, à educação física e à própria filosofia das lutas.
apreciados pela educação física escolar, não vem Sugere-se que este tema seja abordado por
sendo explorado. outros educadores físicos, contribuindo para a
Para uma educação física diversificada, que discussão e somando com outras posições.
não sucumba às eternas práticas de “rachas com
bola”, deve-se cumprir o que se estabelece nos Endereço para correspondência:
PCN’s, seja com as lutas ou com a dança. Rua Tibúrcio Cavalcante, 1490 / apto 102 - Aldeota
Observa-se que os profissionais necessitam Fortaleza - Ceará - Brasil
de treinamento, de capacitação e de cursos de CEP: 60125-100
reciclagem, para, a partir de então, incluir a prática Tel: 85 32646013
das lutas em suas aulas. Também se pode concluir e-mail: heraldosimoes@bol.com.br

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES JR ED. In GUEDES OC(org). Judô: evolução técnica e competição. João Pessoa: Ed Idéia,
2001;73-91.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física. Brasília: Secretaria de Educação


Fundamental,MEC/SEF, 1998.

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FUNAKOSHI. O meu modo de vida. São Paulo: Ed Cultrix, 1999.

KISHIKAWA JSH. Pensamentos de um samurai moderno. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2004.

LEE B. O Tao do Jet Kune Do. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2003.

GHIRALDELLI PJ. Educação física progressista. São Paulo: Ed Loyola, 1997.

MUSASHI M. O livro dos cinco anéis: o clássico guia de estratégia. São Paulo: Ed Masdras, 2000.

REID H, CROUCHER M. O caminho do guerreiro, o paradoxo das artes marciais. São Paulo: Ed Cultrix,
2000.

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TZU S. A arte da guerra. 16ª ed. Rio de Janeiro: Ed Record, 1995.

YUZAN D. O código do samurai. São Paulo: Ed Masdras, 2003.

44 REVISTA DE EDUCAÇÃO FÍSICA - Nº 135 - NOVEMBRO DE 2006 - PÁG. 36-44


ASPECTOS PEDAGÓGICOS DO ENSINO DAS LUTAS
NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

OLIVEIRA, Guilherme Ribeiro1 - Dom Bosco

MOURA, Gabriela2- PUCPR

URBINATI, Keith Sato3- PUCPR/Dom Bosco

Grupo de Trabalho - Educação, Arte e Movimento


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Por se tratar de atividades que geram contato físico entre estudantes, o senso comum acredita
que a modalidade de lutas acarreta violência e indisciplina. No entanto, observamos
benefícios na prática de lutas em ambiente escolar, como redução de violência e construção de
valores. O objetivo do presente estudo é determinar os fatores limitadores e facilitadores para
o ensino do conteúdo lutas na Educação Física escolar. Os métodos utilizados para o
desenvolvimento do presente trabalho foram revisão bibliográfica além de pesquisa aplicada
no banco de dados da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Os resultados, foram: 18,86
(46%) dos professores, não utilizam o conteúdo de lutas na Educação Física escolar e dentre
as principais justificativas, encontram-se a falta de instrução e falta de estrutura. Os
professores relataram ainda dificuldades em trabalhar o conteúdo na escola, sendo que 11,3
(27,7%) alegaram que a principal dificuldade é a falta de instrução, seguidos de 1,47 (3,6%)
que optaram pela falta de estrutura. Concluímos então, que mesmo fazendo parte dos
parâmetros que regem a educação física, muitos professores não utilizam as lutas como parte
dos conteúdos das suas aulas. Em relação aos fatores limitadores encontra-se a falta de
instrução, de estrutura e por achar o conteúdo impróprio. Em relação à falta de instrução, cabe
ao profissional entender que não é necessário ser um mestre em artes marciais para trabalhar
lutas na escola, basta que o professor busque conhecimento. Quando falamos em falta de
estrutura, nos remetemos não somente a falta de estrutura para as aulas de educação física, e
sim para as aulas em geral, e aqui entra a criatividade do professor. E quanto a achar o
conteúdo impróprio, com o referencial teórico apresentado no presente estudo comprovamos

1
Atleta de Muay Thai. Graduou-se em licenciatura em Educação Física pelo Dom Bosco, atualmente é
acadêmico de Bacharelado na mesma instituição de ensino. E-mail: guimaribeiro@hotmail.com
2
Acadêmica de licenciatura em Educação Física na PUCPR. Participa do Grupo de pesquisas GECOM. E-mail:
moura.gabrielade@hotmail.com
3
Atleta e técnica desportiva de Karate, atuando na seleção brasileira juvenil, júnior e adulto como atleta.
Graduou-se em licenciatura plena em Ed. Física pela UFPR. É especialista em Fisiologia do Exercício pela
UFPR, possui o título de Mestre em Ciência do Movimento Humano pela UDESC e também é Mestranda em
Bioengenharia pela PUCPR. E-mail: keith_sato@hotmail.com
25961

que as lutas são uma ferramenta importante para o profissional de educação física mediante a
educação física escolar.

Palavras-chave: Conteúdo Lutas. Eixo Curricular. Educação Física Escolar.

Introdução

Atualmente existe pré-conceito em relação ao conteúdo de lutas no ambiente escolar.


As lutas conceitualmente podem ser classificadas em três tipos: (1) lutas, (2) artes marciais e
(3) esportes de combate (FRANCHINI e DELVECHIO, 2011). Defende-se que arte marcial
além da luta em si traz a história e costumes de um povo, filosofias que acabaram sendo
criadas pelos povos para defesa ou ataque durante as guerras. Já as lutas envolvem técnicas e
táticas de ataque e defesa. E por fim os esportes de combate, modalidades que possuem
federações e confederações (FRANCHINI e DELVECHIO, 2011 apud CORREIA e
FRANCHINI, 2010). O conceito de luta pode ser definido como todo e qualquer combate, já a
arte marcial é mais específica, sendo que, enquanto as lutas têm como significado combate
com ou sem armas as artes marciais trazem consigo conceitos filosóficos, éticos e regras bem
específicas (LANÇANOVA, 2006). Rufino e Darido (2011) afirmam que as lutas são
atividades onde ocorrem disputas, sendo que um indivíduo deve ganhar do outro, utilizando
técnicas e táticas de desequilíbrio, dominação, imobilização ou exclusão de um determinado
espaço. Para isto utilizam-se técnicas e táticas de ataque e defesa (RUFINO e DARIDO,
2011). Dentro das lutas há uma subdivisão em três subconjuntos conforme a distância. As
lutas de longa distância são caracterizadas pela presença de um equipamento utilizado para
atingir o oponente (Ex: Esgrima). As de média distância utilizam-se de chutes e socos (Ex:
Muay Thai), e as de curta distância visam agarrar ou imobilizar o adversário (Ex: Jiu- Jitsu)
(CORREIA e FRANCHINI, 2010).
Desde os primórdios o homem preocupava-se em atacar e defender-se, o que
demonstra que as lutas existem desde o período pré-histórico (RUFINO e DARIDO, 2011).
Ou seja, as lutas existem desde o início da humanidade, seja ela por busca de alimento, por
domínio de território, contra animais ou até mesmo para conseguir uma companheira (TRUSZ
e NUNES, 2007 apud FERREIRA, 2009). Já as artes marciais surgiram com o início das
civilizações, tendo por objetivo a defesa e sobrevivência, inclusive muitas técnicas e
modalidades devem ter surgido durante combates e conflitos. As lutas surgiram como técnicas
de defesa e com o tempo evoluíram. Entretanto, a história de origem da luta ainda não é uma
25962

unanimidade devido à falta de documentos que comprovem sua origem, uma vez que há
registros na China, Índia, Império Romano e Grécia. Entretanto, para muitos, a China é
considerada o berço das artes marciais no século V a.C. (FERREIRA, 2006). Os esportes de
combate, antes de se tornarem modalidades esportivas eram técnicas de lutas, e uma forma de
defesa de um povo, com princípios e filosofias, ou seja, se a escola tem como objetivo formar
cidadão, seu enquadramento no ensino escolar é de suma importância (TRUSZ e NUNES,
2007). As lutas podem ser definidas como:

disputas em que o(s) oponente(s) deve(m) ser subjugado(s), mediante técnicas e


estratégias de desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão de um determinado
espaço na combinação de ações de ataque e defesa. Caracterizam-se por uma
regulamentação específica, a fim de punir atitudes de violência e de deslealdade.
Podem ser citados como exemplo de lutas desde as brincadeiras de cabo de guerra e
braço de ferro até as práticas mais complexas da capoeira, do judô e do caratê.
(BRASIL, 1998, p.70)

As lutas estão incluídas na Educação Física Escolar como conteúdo relacionado a


culturas corporais, sendo caracterizado como cultura: “o conjunto de características humanas
não inatas, que são criadas e preservadas, ou mesmo se aprimoram por meio da comunicação
e cooperação entre indivíduos em sociedade” (OLIVEIRA; GOMES; SUZUKI, 2009).
As modalidades de lutas, apesar de fazerem parte da matriz do eixo curricular
(BRASIL, 1998) ainda são pouco praticadas no ambiente escolar (NASCIMENTO, 2008). É
raro algum professor de Educação Física que, além dos costumeiros esportes coletivos de
quadra (handebol, vôlei, futsal, basquete), trabalhe também algum conteúdo relacionado às
lutas (FERREIRA, 2006). Parte disto está relacionada à falta de conhecimento dos professores
(NASCIMENTO, 2008). Isto se reflete na produção de estudos científicos, os quais são
poucos ainda, e em sua maioria se restringem a capoeira e ao judô, que são modalidades de
lutas com uma maior popularidade no Brasil (CORREIA e FRANCHINI, 2010). Algo que
pode influenciar na carência de produção de conhecimento na área de lutas é que nem todas as
faculdades de Educação Física ofertam a disciplina de lutas em sua grade curricular como
matéria obrigatória, ou tão pouco optativa, com poucos cursos de aperfeiçoamento na área
(GONÇALVES JUNIOR e DRIGO, 2001). Outro fator verificado é o distanciamento entre os
pesquisadores e os professores atuantes (CORREIA e FRANCHINI, 2010). Isto acaba
fazendo com que as produções científicas nem sempre atendam as necessidades dos
professores de Educação Física escolar.
25963

Devido à falta de experiência dos professores nesta área acaba existindo certo receio
quanto a sua habilidade para trabalhar as lutas no ambiente escolar. Uma vez que por se tratar
de atividades que geram contato físico entre os estudantes, a sociedade acredita que a
modalidade acarreta violência e indisciplina entre os praticantes, quando na verdade é o
oposto (NASCIMENTO, 2008). Deste modo, o objetivo do presente estudo foi determinar os
fatores limitadores e facilitadores para o ensino do conteúdo lutas na educação física escolar
conforme percepção de professores da rede municipal, estadual e particular de ensino.

Metodologia

Foi realizado levantamento sobre os principais fatores limitadores e facilitadores para


o ensino do conteúdo de lutas no ambiente escolar. Utilizou-se questionário similar ao de
Ferreira (2006), onde foram entrevistados 41 professores de Educação Física, sobre a
aplicação do conteúdo lutas como eixo curricular na Educação Física escolar. Do total de 41
professores entrevistados, 13 (31,70%) lecionam Educação Física escolar no Ensino
Fundamental I. Aproximadamente 10 (24,39%) professores lecionam no Ensino Fundamental
II e 3 (7,31%) no Ensino Médio. Alguns professores trabalham em dois sistemas de ensino ao
mesmo tempo, sendo que 6 no Fundamental I e II (14,63%); 8 (19,51%) em uma das etapas
do Fundamental e Médio e, 1 (2,43%) no Fundamental I e II e Médio. Quanto ao local de
ensino verificou-se que 14 (34,14%) lecionam em escola particular, 10 (24,39%) em escolas
municipais, 12 (29,26%) em escolas estaduais, 4 (9,75%) em escolas estaduais e municipais e
1 (2,43%) em escola particular e municipal. Para a análise estatística foi utilizada análise de
frequências.

Resultados e Discussões

Dentre os entrevistados (conforme figura 1) constatou-se que apenas 22,14 (54%)


utilizam as lutas nas suas aulas, e dentre os que não utilizam 9,59 (23,4%) alegaram a falta de
instrução ou falta de estrutura física da escola para tal prática.
25964

Figura 1- Utilização das Lutas na Escola


Fonte: Organizado pelos autores com base na análise de dados

Observou-se (através da figura 2) que a maior utilização do conteúdo de lutas ocorre


especialmente no Ensino Fundamental I e II. Menores níveis de utilização do conteúdo de
lutas no Ensino Médio podem estar associados a um modelo tecnicista que perdura na
educação física desse nível de ensino (POLIS e PORTO, 2010) (DARIDO et al, 1999), cujo
conteúdo de lutas não são contemplados na nova cultura corporal de movimento proposta
pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998).

Figura 2- Utilização do conteúdo de lutas conforme o nível de ensino.


Fonte: Organizado pelos autores com base na análise de dados
25965

Observa-se que quando a prática do conteúdo de lutas esta associada ao tipo de ensino
(figura 3), no ensino público (prefeitura e estado) é mais utilizada do que no ensino particular.
Talvez este fato ocorra porque as diretrizes e normativas da prefeitura de Curitiba
(PREFEITURA MUNICIPAL DE CURITIBA, 2006) e do estado do Paraná (LEITE et al,
2009) basearem suas publicações nos PCNs (BRASIL, 1998).

10
9 9
9

8
7
7

0
Particular Prefeitura Estado

Figura 3 – Utilização do conteúdo de lutas conforme o tipo de Instituição de ensino.


Fonte: Organizado pelos autores

Em relação as porcentagens apresentadas, podemos afirmar que para os professores


que relataram dificuldades na realização do conteúdo lutas na escola, observou-se que os
principais motivos foram a falta de instrução, com 11,3 (27,7%), seguido da falta de estrutura
na escola, que corresponde a 1,47 (3,6%). Encontramos com esses dados, algo bem próximo
ao encontrado por Nascimento e Almeida, (2007) Santos, Oliveira e Cândido (2011) onde
foram evidenciadas as restrições a prática mais apontada pelos professores: (1) a falta de
vivência pessoal em lutas por parte dos professores, tanto no cotidiano de vida, como no
âmbito acadêmico; (2) a preocupação com o fator violência, que julgam ser intrínseco às
práticas de luta, o que incompatibiliza a possibilidade de abordagem deste conteúdo na escola.
Muitos professores utilizam a falta de instrução, como motivo para a não aplicação das lutas
em suas aulas, porém este é um empecilho que não deve se tornar intransponível, uma vez que
25966

o profissional poderá recorrer a cursos de especialização (FERREIRA, 2006). Outro motivo


apontado para a rejeição dos professores quanto à utilização das lutas na Educação Física na
escola é a falta de material e falta de espaço apropriado para a prática das lutas (RUFINO e
DARIDO, 2011). Em estudo realizado por Ferreira (2006), observou-se que dos 50
professores entrevistados, 16 (32%) afirmaram que utilizavam as práticas das lutas em suas
aulas e 34 (68%) relataram que jamais recorreram às aulas com estes conteúdos. Ou seja, mais
de 50% dos professores entrevistados não se utilizam da modalidade de lutas em suas aulas.
Porém a Educação Física escolar não deve ficar restrita somente a 3 ou 4 modalidades
(NASCIMENTO, 2008). Uma vez que as lutas podem agregar diversos benefícios como:
respeito aos outros, melhora da autoestima, tomada de decisão, controle de violência, dentre
outros (FIGUEIREDO, 2000). Entretanto, nesta análise dos dados, estes mesmos professores
ao serem questionados quanto a possibilidade da utilização nas aulas de Educação Física
escolar 40 (97%) responderam que é possível trabalhar tal modalidade, porém se é possível
trabalhar tal conteúdo, por qual motivo apenas 19,18 (46,8%) dos professores entrevistados o
fazem? Algo também evidenciado por Santos, Oliveira e Cândido (2011) é que 32,8 (80%)
dizem ser possível trabalhar as lutas na escola, sobretudo de forma lúdica uma vez que sua
implementação na Educação Física escolar não esta ligada somente ao ensino da luta em si,
mas também a demonstração de valores éticos e morais e trabalhar as habilidades
psicomotoras (FERREIRA, 2009), proporcionando um ensinamento interdisciplinar
(LANÇANOVA, 2006).
Apesar da maioria 24,4 (59,6%) considerar qualquer modalidade onde haja
desequilíbrio, ataque, defesa, jogos de oposição dentre outros como atividades de lutas, ainda
há um número grande 11,3 (27,7%) que consideram lutas apenas práticas desportivas com
técnicas e táticas, algo também observado por Santos, Oliveira e Cândido (2011). Entretanto,
durante as aulas de Educação Física é possível desenvolver atividades que envolvam ataque e
defesa, reter, imobilizar, livrar-se, esquivar, sendo as duas últimas de suma importância para
atividades de ataque e defesa. Também é possível trabalhar as atividades de lutas já
conhecidas, desde que ocorra adaptação para as aulas no ambiente escolar e para a faixa etária
que irá executar a atividade (NASCIMENTO, 2008).
Quanto à utilização das modalidades de lutas obtiveram-se os seguintes dados: Jogos
de Oposição 5 (12,2%), Capoeira 26 (63,4%), Karate 11(26,8%), Judô 16 (39%), Jiu-Jitsu 1
(2,4%), Esgrima 2 (4,8%), Boxe 1 (2,4%), MMA 1 (2,4%), Kempo 1 (2,4%), totalizando 64
25967

respostas dentre os 41 entrevistados (alguns entrevistados responderam que utilizam mais de


uma modalidade). Com isto verifica-se que as modalidades mais aplicadas são Capoeira, Judô
e Karate, algo também evidenciado por Ferreira (2009) onde dos 50 entrevistados 13 (26%)
utilizavam a Capoeira, 12 (24%) o Karate, 9 (18%) responderam o Judô, 4 (8%) o Tae-Kwon-
do, 3 (6%) o Kung-Fu, 1 (2%) o Jiu-Jitsu.
Observa-se que em países orientais como China e Coréia do Sul as lutas fazem parte
da matriz escolar (LANÇANOVA, 2006). Entretanto no Brasil não se utiliza desta filosofia de
inclusão das modalidades na matriz escolar, apesar de ser a capoeira uma luta que tem o nosso
país como o de origem, além do brazilian jiu-jítsu, que foi inicialmente criado no Japão,
entretanto grandemente modificado pela família Grace sendo hoje considerada uma luta de
criação brasileira (FERREIRA, 2006), e mesmo assim tanto a capoeira quanto o jiu-jítsu
acabam não sendo classificados como conteúdos obrigatórios nas aulas de Educação Física
(FERREIRA, 2006) (FONTOURA e GUIMARÃES, 2002). O ensino da capoeira também é
defendido por Paim e Pereira (2004), pois pode ser utilizada de diversas formas na Educação
Física escolar, não só como a luta, mas também como dança jogos, conhecimentos culturais e
desenvolvimentos motores, autonomia, dentre outros, ideia também corroborada por Ferreira
(2009).

as lutas não são somente as técnicas sistematizadas como karate e judô. O braço de
ferro, o cabo de guerra, técnicas recreativas de empurrar, puxar,deslocar o parceiro
do local, lutas representativas como a luta do sapo (alunos agachados,um tentando
derrubar o outro), a luta do saci (alunos de mãos dadas, somente com um pé no
chão, vão tentar provocar o desequilíbrio do parceiro, forçando o colega a tocar com
o pé que estava elevado no chão), são apenas alguns exemplos de como se trabalhar
as lutas de forma estimulante e desafiadora na aula de educação física (FERREIRA,
2005b, p. 9).

Dos 41 entrevistados 17,4 (42,6%) alegam que o ensino das lutas na Educação Física
escolar não gera violência, entretanto outros 20 (48,78) entrevistados afirmam que se o ensino
das lutas irá gerar ou não violência, dependerá do professor. Dos entrevistados 28,7 (70,2%)
afirmam que a prática das lutas não torna os estudantes agressivos, algo bem próximo ao
encontrado por Santos, Oliveira e Cândido (2011) onde 65% responderam que não e 35% que
depende do professor, podendo ser possível até mesmo uma redução desta agressividade.
Verifica-se que o conteúdo de lutas é pouco explorado devido à preocupação e dúvidas
dos professores de Educação Física escolar quanto à utilização desta modalidade em suas
aulas, pois para a maioria dos pais e educadores o ensino das lutas geraria agressividade e
25968

violência entre os estudantes (NASCIMENTO, 2008) (NASCIMENTO e ALMEIDA, 2007).


Entretanto, os estudantes apenas representam nas escolas imagens e atitudes do meio onde
vivem, com isto, as lutas podem ser utilizadas como ferramenta pedagógica para a
contextualização do sentido das lutas no ambiente social e esportivo (ROBERTO SO e
BETTI 2009). As lutas quando aplicadas, de forma correta na Educação Física escolar acabam
sendo de grande aceitação, independente da faixa etária, inclusive tendo reflexo na
diminuição da agressividade dos estudantes (FERREIRA, 2006).
Sabe-se que a violência nos dias de hoje é algo que faz parte do cotidiano de cada
indivíduo e nas escolas isto não ocorre de forma diferente. Entretanto, há em várias
modalidades esportivas, atitudes que também podem ser consideradas violentas. Um exemplo
disto ocorre no futebol onde nas partidas ocorrem jogadas desleais e por vezes ofensas verbais
(NASCIMENTO e ALMEIDA, 2007).
Em estudo de Nascimento e Almeida (2007) realizado com estudantes da 4ª série do
Ensino Fundamental, não foram identificados problemas de indisciplina ou agressividade
durante as aulas de lutas na Educação Física, além de observados o cumprimento das regras e
tomadas de decisão pelos estudantes.
As lutas não podem se eximir dos princípios que regem o ensino escolar nos dias
atuais que é de inclusão e diversidade. Porém para que a inclusão ocorra de forma plena o
professor tem que estar bem preparado, e isto tem início em uma boa formação durante sua
graduação (TRUSZ e NUNES, 2007).
A prática das lutas requer um preparo mais elaborado de suas aulas, porém verifica-se
que a maioria dos profissionais não está preparada e compromissada para o ensino de tal
modalidade. E esta falta de preparo reflete-se em imagem de prática violenta das lutas
(LANÇANOVA, 2006).
Isto também fica evidenciado nas faculdades e universidades onde há uma
preocupação dentre os acadêmicos durante sua graduação em Educação Física, pois os
mesmos se questionam como poderão aplicar a modalidade de lutas nas aulas de Educação
Física, sendo que os que possuem contato com a modalidade o fazem por apenas seis meses
ou um ano, de forma superficial. Para um acadêmico torna-se tarefa complicada aprender as
artes marciais, esportes de combate ou lutas em tão pouco tempo, porém defende-se que o
ensino das lutas na Educação Física escolar pode ocorrer através de diversas atividades
lúdicas, não ficando restrito ao ensino de técnicas ou táticas das modalidades específicas.
25969

Outro ponto apontado que pode ser utilizado pelo professor são palestras, filmes e
documentários, bem como incentivar o conhecimento dos estudantes através de pesquisas
dadas a eles sobre diversos temas como história, regras, indumentárias, dentre outros
(FERREIRA, 2009).
Trusz e Nunes (2007) afirmam que:

os esportes de combate devem fazer parte da formação dos professores de Educação


Física não somente de uma maneira superficial, mas proporcionando aos estudantes
da graduação a oportunidade de buscarem mais embasamentos e de terem
disponíveis mais ferramentas para o futuro exercício de sua profissão. Nos PCNs
(BRASIL, 1998) também há a inclusão das lutas na Educação Física escola.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) mostram as 4 linhas


pedagógicas, para a Educação Física escolar: psicomotora, crítica, construtivista e
desenvolvimentista, e conforme Lançanova (2006) as lutas se enquadram em todos eles.
Ponto que pode demonstrar a pouca utilização das lutas na Educação Física escolar se
reflete na escassez de estudos específicos a cerca do tema em questão (LANÇANOVA, 2006).
Outro ponto a ser observado é que quando este estudo ocorre, é de forma muito específica,
pois se verifica que a maioria dos estudos relacionada à modalidade de lutas têm foco em uma
modalidade ou outra, mas de forma bem específica (NASCIMENTO, 2008). Entretanto,
observou-se no congresso CONPEFE (Congresso Paulistano de Educação Física Escolar)
realizado na cidade de Caraguatatuba litoral norte do Estado de São Paulo, no ano de 2009,
uma quantidade considerável de artigos a serem explanados com igual equivalência aos
esportes tradicionais de quadra, o que pode demonstrar uma melhora de pesquisas científicas
de assuntos relacionados às modalidades de lutas (CAZETTO, 2009).
Muito se questiona quanto ao fato se o professor deve ou não ter experiência na área
das lutas para ministrar essas aulas na Educação Física escolar, entretanto não há a
necessidade de o professor ser um especialista em lutas, uma vez que este ensino não visa
treino ou formação de atletas e sim a vivência na modalidade (NASCIMENTO e ALMEIDA,
2007). Para Roberto So e Betti, (2009) a luta:

é uma manifestação de cultura de movimento que não pode ser negada, e seu ensino
na escola não exige que o professor seja treinador ou professor de artes marciais, já
que não se pretende formar um atleta/lutador, mas sim que os estudantes se
apropriem e apreciem elementos das lutas como manifestações da cultura de
movimento.
25970

Com esta explanação, torna-se importante compreender as dificuldades e limitações


apontadas pelos professores e fazer uma análise, para que estes empecilhos possam ser
ultrapassados e que com isto ocorra à inserção da modalidade de lutas na Educação Física
escolar de forma efetiva (NASCIMENTO, 2008).
Atualmente observa-se que as aulas de Educação Física, têm visado o ensinamento de
técnicas e fundamentos, ou seja, tratando a modalidades de lutas apenas como esportivização,
deixando de lado o ensinamento de valores que ela agrega (NASCIMENTO e ALMEIDA,
2007) (ROBERTO SO e BETTI, 2009). Fator apontado por Lançanova (2006) que verificou
uma esportivização das aulas de Educação Física, em sua maioria com esportes coletivos, que
acabam fazendo da Educação Física escolar uma espécie de treinamento específico destas
modalidades. Entretanto consta nos PCNs (BRASIL, 1998) a necessidade de acabar com esta
esportivização: “é necessário mudar a ênfase na aptidão física e no rendimento padronizado
que caracterizava a Educação Física, para uma concepção mais abrangente, que contemple
todas as dimensões envolvidas em cada prática corporal”.
Em estudo realizado por Paim e Pereira (2004) identifica-se que os maiores fatores
motivantes para o estudante praticar capoeira não estão relacionados a ser um exímio lutador
e sim a aprender um novo esporte ou desenvolvimento de habilidades. E a motivação para a
prática de uma atividade é de suma importância, pois: "No momento em que o estudante
sente-se motivado para determinada prática, essa flui melhor e os objetivos propostos são
alcançados de uma maneira mais fácil” (PAIM e PEREIRA, 2004).
No Ensino Fundamental I deve-se focar no ensino de habilidades motoras básicas para
o ensino das lutas subsequentemente, além de estimular tomada de decisão e resolução de
problemas. (NASCIMENTO, 2008). Com isto no Ensino Fundamental I (primeiro ciclo
básico) poderia ocorrer o ensino das lutas, uma vez que dentro deste período objetiva-se
ensinar o companheirismo, cordialidade e respeito com os colegas e com o professor
(FIGUEIREDO, 2000).
Já no Ensino Fundamental II deve-se buscar o ensino das regras e conceitos históricos
e filosóficos das lutas, descaracterizando a violência, considerada intrínseca as lutas. Deve-se
priorizar além do ensinamento das táticas e técnicas das modalidades a construção motora da
criança (NASCIMENTO, 2008). Este ensinamento pode ocorrer por meio de atividades
lúdicas, pois esta seria a melhor forma de se trabalhar as lutas nas aulas de Educação Física
(FERREIRA, 2006). Durante este aprendizado em forma lúdica acaba por acontecer, mesmo
25971

que de forma intrínseca, um aprendizado das técnicas das lutas (FIGUEIREDO, 2000), além
de proporcionar um melhor conhecimento sobre saúde e qualidade de vida (LANÇANOVA,
2006). E para que isto ocorra de forma satisfatória é necessário trabalhar nos três conceitos:
afetivo-social, cognitivo e motor.
O ambiente escolar não deve buscar a formação de atletas e sim a formação de
cidadãos que durante as aulas de Educação Física conheçam e pratiquem a modalidade de
lutas (NASCIMENTO, 2008). Por meio desta afirmação pode-se verificar que o professor não
precisa ser especialista em uma determinada modalidade de lutas, pois o mesmo pode se
utilizar de filmes e vídeos demonstrativos para a execução das atividades durante as aulas
(LANÇANOVA, 2006).
Em estudo de campo feito por Nascimento e Almeida (2007) o professor se utilizou de
vídeos para que ocorresse a análise deste e com isto identificar e mostrar os valores éticos,
históricos e morais das lutas, enquanto que para o conhecimento das regras das modalidades
denominou pesquisa para os estudantes, e com isto desmistificou o conceito de que lutas são
esportes violentos. Cabe ao professor de Educação Física demonstrar, que as lutas não estão
vinculadas apenas ao contato físico entre os praticantes, mas que por meio dela é possível
estimular a tomada de decisão dos estudantes e resolução de problemas (FERREIRA, 2009).
Porém ocorre que há muitos professores que são apenas ex- atletas e se utilizam de
métodos sem comprovação de estudos quanto a sua eficácia quando relacionadas a
treinamento, ou pior, ser instrutor sem fundamentação teórica, apenas repassando práticas que
aprendeu, causando prejuízo a quem pratica a atividade (LANÇANOVA,2006), além destes
profissionais não terem conhecimento do projeto político pedagógico da escola (CORREIA e
FRANCHINI, 2010).
Com tudo que foi abordado neste estudo deve-se buscar uma reestruturação dos
métodos de ensino da Educação Física escolar relacionado às lutas para que sejam
enquadradas na realidade atual e cotidiana dos estudantes (NASCIMENTO e ALMEIDA,
2007), uma vez que as lutas têm papel fundamental na formação do estudante, tanto quanto os
esportes de quadra (LANÇANOVA, 2006).

Considerações Finais

Através deste estudo foi possível verificar que apesar do conteúdo de lutas ser um
conteúdo da educação física escolar (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL,
25972

1998) tal pratica ainda é pouco exercida. A mudança deve ocorrer desde a formação
profissional do professor, demonstrando os benefícios de seu ensinamento no ambiente
escolar. As lutas não devem ser tratadas como esportivização nas escolas, algo evidenciado
nesta pesquisa, uma vez que a forma lúdica e de jogos de oposição não foram à forma mais
lembrada pelos professores, já que as modalidades aplicadas mais mencionadas foram às
técnicas esportivas pré- existentes. Entretanto, cabe uma pesquisa com cunho qualitativo para
observar-se a forma como estas modalidades estão inseridas nas aulas de Educação Física
escolar. Partindo do ponto de vista que este estudo verificou quantitativamente o uso ou não
das modalidades de lutas e não a forma de sua aplicação durante as aulas.
Considerando que os objetivos desse estudo foram determinar fatores limitadores e
facilitadores para o ensino do conteúdo lutas na educação física escolar conforme percepção
de professores da rede municipal, estadual e particular de ensino, entende-se que foram
considerados fatores limitadores a formação profissional e não conhecimento técnico
científico do conteúdo de lutas.

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DESAFIOS PARA O ENSINO DAS
LUTAS NA ESCOLA:
UM PANORAMA A PARTIR DA BASE DE DADOS DO
PORTAL DE PERIÓDICOS DA CAPES1

MS. ALISSON VIEIRA COSTA


Mestre em Atividade Física para Idosos pela Universidade do Porto/Portugal
Professor da Universidade Federal do Amapá – UNIFAP

DR. VICTOR LAGE


Doutor em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina de
São José do Rio Preto – FAMERP
Professor da Faculdade de Educação Física da Universidade de Brasília – UnB

DRA. MARISETE SAFONS


Doutora em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília – UnB
Professora da Faculdade de Educação Física da Universidade de Brasília – UnB

DR. FELIPE RODRIGUES DA COSTA


Doutor em Educação Física pela Universidade Gama Filho – UGF
Professor da Faculdade de Educação Física da Universidade de Brasília – UnB

Resumo | O objetivo foi investigar os desafios e aproximações para o ensino


das lutas na escola a partir da literatura disponível no Portal de Periódicos
da Capes. A metodologia foi baseada no método qualitativo e de análise bi-
bliográfica. Os estudos foram selecionados no período de julho a novembro
de 2017, utilizando as palavras-chave: lutas; ensino das lutas; escola; artes
marciais; pedagogia das lutas. A busca resultou em 6 artigos compatíveis
com os critérios de inclusão. Os resultados apontam necessidade de mais
propostas para o ensino das lutas na Educação Física; Conhecimentos sobre

1. O presente trabalho não contou com apoio financeiro de nenhuma natureza para sua
realização.

44 Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019


propostas pedagógicas, didática, planejamento e o que avaliar. A conclusão
aponta no sentido de uma formação mais sólida para a diversificação dos
conteúdos a serem ensinados.
Palavras-chave | Ensino; Escola; Lutas; Educação Física.

CHALLENGES TO TEACHING SCHOOL FIGHTING: A PANORAMA


FROM THE DATABASE OF THE CAPES NEWSPAPER PORTAL

Abstract | The objective was to investigate the challenges and approaches to


the teaching of struggles in school from the literature available at Portal de
Periódicos da Capes. The methodology was based on the qualitative method
and literature review. The studies were selected in the period from July to
November of 2017, using the keywords: struggles; teaching of struggles;
school; martial arts; Pedagogy of struggles. The search resulted in 6 articles
that are compatible with the inclusion criteria. The results indicate the need
for further proposals for the teaching of struggles in Physical Education;
Knowledge about pedagogical proposals, didactics, planning and what to
evaluate. The conclusion points in the direction of a more solid formation
to the diversification of content to be taught.
Keywords | Teaching; School; Fights; Physical Education

DESAFÍOS PARA LA ENSEÑANZA DE LAS LUCAS EN LA ESCUELA:


UN PANORAMA A PARTIR DE LA BASE DE DATOS DEL PORTAL
DE PERIÓDICOS DE LA CAPES

Resumen | El objetivo era investigar los retos y enfoques para la enseñanza


de las luchas en la escuela de la literatura disponible en el Portal de Periódicos
da Capes. La metodología se basa en el método cualitativo y revisión de la
literatura. Los estudios fueron seleccionados en el período de julio a noviembre
de 2017, usando las palabras clave: luchas; enseñanza de las luchas; Escuela;
artes marciales; pedagogía de luchas. La búsqueda ha devuelto 6 artículos
que son compatibles con los criterios de inclusión. Los resultados indican
la necesidad de nuevas propuestas para la enseñanza de las luchas en la
Educación Física; Conocimiento sobre propuestas pedagógicas, didáctica,
planificación y qué evaluar. La conclusión apunta en la dirección de una
formación más sólida a la diversificación de los contenidos que se enseñan.
Palabras clave | Enseñanza; Escuela; Luchas; Educación Física.

Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019 45


INTRODUÇÃO

O ensino da das lutas na educação física escolar é constantemente


alvo de críticas por teóricos da área relacionadas à falta de preparo dos
professores de Educação Física para o ensino deste componente curricular,
uma vez que o esporte tem dominado as formas de ensinar e pensar o
campo da Educação Física dentro do ambiente escolar (SOARES, 1992;
KUNZ, 2004; STIGGER; LOVISOLO, 2009).
Além disso, há que se considerar que as propostas para o ensino
das lutas na Educação Física escolar ainda pouco têm se efetivado neste
contexto, o que aumenta a crise na área em relação ao trato/ensino peda-
gógico do conteúdo específico (GONZALEZ; FERNSTERSEIFER, 2009).
Apesar de algumas propostas de ensino realizadas por diferentes
autores (DARIDO; RANGEL, 2005; GOMES et al.; 2010; RUFINO;
DARIDO, 2012; RUFINO; DARIDO, 2015), há necessidade de avançar
no debate para que isso se torne uma realidade das escolas brasileiras.
Diante disso, levanta-se o seguinte problema: quais têm sido os
principais desafios e aproximações apontadas pela literatura para o ensino
das lutas como conteúdo da Educação Física escolar?
Kunz (1999) destaca que há uma necessidade de se avançar nos es-
critos da Educação Física para propostas de intervenção capazes de levar
os alunos a pensarem sobre as práticas que realizam, por meio, do que o
autor denomina “se-movimentar”, de modo, a tornar o professor capaz
de lidar com o conteúdo da sua disciplina com segurança e emancipação.
Assim, o objetivo do presente estudo foi investigar o estado da arte
sobre os desafios e aproximações para o ensino das lutas na escola a partir
de propostas e práticas de ensino de lutas como conteúdo da Educação
Física escolar.

METODOLOGIA

O estudo se caracterizou por uma pesquisa qualitativa de caráter


exploratório, analítico e bibliográfico (SANTOS, 2000; LAKATOS E

46 Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019


MARCONI, 2008) que se preocupou em verificar a produção disponível
na base de dados do Portal de Periódicos da Capes sobre o ensino das
lutas na escola.
Os estudos foram selecionados no período de agosto a novembro de
2017 na base de dados do Portal de Periódicos CAPES da Universidade
de Brasília, em “buscaavançada”. A primeira palavra-chave utilizada no
sistema de busca foi “ensino das lutas”, com filtro “qualquer” e “é (exato)”.
O segundo passo foi associar as palavras lutas; ensino das lutas; escola;
artes marciais; pedagogia das lutas, utilizando os filtros “qualquer” e
“contém”. Salientamos com essa busca reforçar o intuito de encontrar
pesquisas relacionadas ao ensino das lutas, nas aulas de Educação Física
escolar, observando a característica da área com as palavras “artes mar-
ciais” e “pedagogia das lutas”.
Os critérios de inclusão foram os utilizados pelos filtros do Portal
de Periódicos CAPES: revisados por pares, no idioma português e que
tratasse de experiências práticas na escola. A partir do sistema automático
de refinamento da base de dados, optou-se pela identificação das palavras-
-chave inseridas para constarem no título, resumo ou palavras-chave.
Na ausência dos termos elencados para análise na pesquisa, os ar-
tigos que fugissem a esse critério não foram considerados elegíveis para
serem incluídos no estudo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram encontrados 1.707 artigos a partir das palavras-chaves e


cruzamentos. O primeiro passo de refinamento foi dado selecionando
a opção “analisados por pares”, obtendo 500 artigos. O segundo passo
foi utilizar para restrição o termo ensino das lutas” no filtro “é exato”,
chegando a sete artigos. Após a leitura na íntegra desses artigos, um ar-
tigo foi excluído por tratar do ensino das lutas fora do ambiente escolar.
Enceramos a fase de elegibilidade com seis artigos selecionados.
Após a análise dos artigos selecionados para o estudo, construíram-
-se três linhas de análise que se destacaram como pontos fundamentais

Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019 47


no conjunto dos textos como questões recorrentes, são elas: a) Desafios
para o ensino das lutas na escola; b) Aproximações e inovações possí-
veis; c) O não mais e o ainda não no ensino das lutas na escola, os quais
trataremos a seguir.

DESAFIOS PARA O ENSINO DAS LUTAS NA ESCOLA

Ao analisar a relação da prática pedagógica no ensino das lutas,


Rufino & Darido (2012) afirmam que houve um aumento significativo de
estudos que tratam das diferentes abordagens metodológicas desenvolvidas.
Segundo Freire (2003, apud RUFINO; DARIDO, 2012) o ensino
do esporte não deve pautar-se a partir de metodologias rígidas, fixas e
reducionistas e, em contrapartida, ampliando a visão sobre o esporte, as
formas de ensiná-lo seriam centradas no aluno como principal agente
desse processo.
Portanto, um desafio a ser superado no ensino das lutas de acordo
com Rufino e Darido (2012) é que os professores percebam que o ensino
das lutas deve pautar-se sempre por meio de procedimentos pedagógicos
claros e objetivos concretos, utilizando jogos e brincadeiras. Avaliar e
refletir sobre sua prática pedagógica é fundamental para avanços e me-
lhorias no processo de ensino e aprendizagem.
Quem ensina esporte deve entender que sim, o esporte é um con-
teúdo a ser ensinado, e que o “como ensinar” precisa ser sistematizado,
experimentado e avaliado (PEREZ; REVERDITO; SCAGLIA, 2008).
Além disso, Correia e Franchini (2010) consideram que a produção
de conhecimento e a formação continuada que propõem a tematização
das Lutas/Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate sejam
importantes para alicerçar uma condição mínima de apoio aos docentes,
na iminência da elaboração dos saberes necessários à prática educativa.
Em outra intervenção junto a uma escola da rede pública de Natal
com utilização das lutas e a consciência corporal como um tema trans-
versal, Silva et al. (2014) sugerem a aquisição de valores e princípios
essenciais para a formação do ser humano em um aspecto mais ampliado.

48 Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019


Desde modo, no estudo de Mazini Filho et al (2014) os autores
analisaram a proposta de ensino de 18 professores de Educação Física e
apontaram que nove aplicavam diretamente o conteúdo lutas nas suas
aulas; outro recorria à especialistas para abordar e desenvolver o tema
em suas aulas por não se sentir seguro em desenvolver a temática; e os
outros oito professores não ministravam o conteúdo lutas nas suas aulas.
Darido et al (2001) alertam sobre a importância de se desenvolve-
rem propostas que observem a necessidade de parâmetros ou de currí-
culo mínimo, fontes e autores de base, até o sistema político vigente que
permitam o avanço concreto destes conteúdos na escola.
Todavia, Darido et al. (2001) apresentam três aspectos que consi-
deram mais marcantes da proposta dos PCNs, área Educação Física, que
representam aspectos relevantes a serem buscados dentro de um projeto
de melhoria da qualidade das aulas, quais sejam; princípio da inclusão,
as dimensões dos conteúdos (atitudinais, conceituais e procedimentais)
e os temas transversais.
Segundo Mazini Filho et al (2014) é necessário lecionar as lutas dentro
do conteúdo da Educação Física Escolar, recorrendo a inúmeros recursos
como: vídeos, palestras, atividades lúdicas, aulas de campo de modalidades
diversificadas, conhecimento da história de cada modalidade, seus ídolos,
regras, países onde são mais difundidas, visitas técnicas dentre outras.
Noutro estudo, Correia e Franchini (2010) apontam como um
fator determinante para uma interface sustentável e profícua entre as
esferas das Lutas/Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate
com a Educação Física, a orientação de pesquisas que tenham como
foco a dimensão da intervenção profissional e dos respectivos saberes
de caráter aplicado.
Alencar et al. (2015) em estudo prospectivo com o objetivo ela-
borar, aplicar e avaliar uma proposta pedagógica no trato do conteúdo
lutas, apontaram argumentos para justificar a ausência deste conteúdo
na escola, entre eles:
1) infra-estrutura inadequada, falta de espaço, material e vestimenta
inadequados;

Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019 49


2) falta de conhecimento e aproximação com tal conteúdo durante
a formação acadêmica e, sobretudo,
3) pela associação às questões de violência.
Outra investigação buscou descrever a experiência das lutas em
escolas públicas foi conduzida por Lacerda (2015), na cidade de Juiz de
Fora (MG), com diversos tipos de lutas e atividades que envolveram ataque
e defesa. Segundo os autores, o conteúdo das lutas pode funcionar como
caminho para o desenvolvimento do reconhecimento corporal bem como
para o aprendizado de outros conteúdos escolares.
Neste mesmo estudo, Lacerda et al (2015) apontam como restrições
para o ensino das lutas: a falta de vivência pessoal em lutas por parte dos
professores, tanto no cotidiano de vida, como no âmbito acadêmico; e a
preocupação com o fator violência, que julgam ser intrínseco às práticas
das lutas. Para Lacerda et al (2015), a violência não é fator intrínseco das
lutas, mas sim um componente da realidade social na qual se insere o
indivíduo, e que, a prática das lutas pode ajudar no processo de educação
para uma cultura de não violência.
Rufino e Darido (2015) ao analisarem as opiniões de docentes
universitários especialistas no tema das lutas sobre a prática pedagógica
deste conteúdo durante as aulas de Educação Física na escola destacaram
inicialmente que a dificuldade para o ensino de algumas manifestações
da cultura corporal de movimento, principalmente pela diversificação e
ampliação de práticas corporais existentes, estavam relacionadas a for-
mação dos professores e professoras.
Assim, aponta-se a defasagem em termos de formação profissional,
que não garante conhecimento e prática pedagógica suficientes para o
desenvolvimento das lutas na escola (RUFINO; DARIDO, 2015). Correia
e Franchini (2010) apontam ainda o distanciamento entre escola e uni-
versidade. Significa dizer que a produção de conhecimento não chega ao
ambiente escolar, e por vezes, não satisfazem a realidade escolar.
Torna-se, portanto, fundamental que seja revista a oferta das
disciplinas de lutas no âmbito dos cursos de graduação em Educação
Física, promovendo conhecimento suficiente para atuação do professor,

50 Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019


atendendo as demandas de ensino, seus aspectos didáticos e metodológi-
cos; a utilização de materiais e infraestrutura; promovendo um ambiente
que conscientize os alunos do aspecto de não violência inerente às artes
marciais (RUFINO; DARIDO, 2015; CORREIA; FRANCHINI, 2010).

APROXIMAÇÕES E POSSIBILIDADES PARA O ENSINO DA LUTA


NA ESCOLA

Nesta seção, destacamos algumas possibilidades apontadas pelos


diferentes estudos para o ensino das lutas na escola. Rufino e Darido
(2012) sugerem que sejam produzidas novas investigações sobre o ensino
das lutas na escola, em diferentes realidades do Brasil, para que as práticas
sejam concretizadas de fato, observando toda a potencialidade pedagó-
gica do conteúdo. A sistematização do ensino das lutas na escola, deve
traduzir-se em propostas pedagógicas que contribuam com sua inserção
de modo crítico e criativo. Isso possibilitará aos alunos, a partir de uma
abordagem teórico-prática, ampliar seu horizonte de conhecimento de
um conteúdo por vezes estereotipado (UENO; FARIAS, 2014).
Em estudo aplicado junto à estudantes da educação básica, Silva
et al. (2014) observaram que a sistematização do conteúdo provocou,
aula-a-aula, uma consciência de suas ações corporais dentro das ativi-
dades, acentuação do respeito às regras, o fortalecimento de condutas
contra atitudes desleais, e até mesmo nas situações de confronto onde
estes aprendem a conviver com vitórias e derrotas.
No estudo de Mazini Filho et al (2014) três pontos fundamentais
são indicados pelos autores como necessários para as aproximações para
o ensino das lutas: porque ensinar; como ensinar e (o que) avaliar. E afir-
mam ainda que as lutas corporais devem ser ensinadas porque são práticas
historicamente importantes e que acompanharam os seres humanos ao
longo do tempo, sendo uma das mais elementares manifestações dessa
cultura corporal (Mazini Filho et al., 2014).
Sobre possibilidades de efetivo ensino das lutas na escola, Alencar
et al (2015) consideram fundamentais os seguintes aspectos:

Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019 51


a) Formação acadêmica: proporcionar aos futuros professores,
conhecimentos inerentes à prática pedagógica, entendendo as tensões
da escola em relação ao tema;
b) Currículo: entender o tema lutas dentro do espectro esportes,
sem desconsiderar suas especificidades técnicas, afastando-o do estereó-
tipo de violência.
Del Vecchio e Franchini (2006) consideram que a abordagem do
ensino das lutas no ensino superior deveria propiciar aos professores a
aprendizagem de conceitos, procedimentos e atitudes que os auxiliem a
analisar criticamente esta prática corporal.
No estudo de Rufino e Darido (2015) destaca-se a importância
de se discutir as lutas com criticidade na escola, para que os alunos, ao
acompanharem pela mídia tais eventos, tenham condições de discernir
sobre os diversos aspectos que os tangenciam, possibilidades de ensino
das lutas na escola a partir da realização de adaptações, seja com relação
a materiais, infraestrutura ou mesmo metodologias de ensino que ga-
rantam um aprendizado significativo aos alunos por parte dos docentes.
As problematizações propostas contribuem para o debate dos con-
teúdos, e para estimularem os discentes a exporem seus conhecimentos,
opiniões e aprendizados para além da perspectiva tradicional da Educação
Física, diante disso, é possível dizer que há inúmeras possibilidades para
o ensino das lutas.

O “NÃO MAIS” E O “AINDA NÃO” NO ENSINO DAS LUTAS


NA ESCOLA

O título desta seção emprestou-se de González e Fensterseifer


(2009), entendendo que houve avanços na tentativa de implementação do
ensino das lutas na escola, mas que carece de reflexão sobre a formação
inicial e continuada na Educação Física, de propostas de ensino adequa-
das as diferentes realidades e da compreensão polissêmica e filosófica
que permeia o tema.

52 Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019


Os achados desta revisão permitiram provocar os formadores e
professores de Educação Física por todo o país a refletirem sobre o ensino
do conteúdo lutas nas aulas de Educação Física brasileira.
Percebeu-se potencial ao conteúdo analisado em dimensões atitu-
dinais, conceituais e procedimentais, para promover uma prática criativa
que leve os alunos à autonomia e possibilite que a tradição e modernidade
dialoguem entre si (MAZINI FILHO et al., 2014). Lacerda et al (2015)
orientam sobre a necessidade de elaborar tentativas para o desenvolvimen-
to de práticas pedagógicas nos ambientes não formais, já que a superação
das doutrinas e crenças de cunho predominantemente tradicionalista
ainda precisam avançar no ensino das lutas nestes ambientes.
Para Rufino e Darido (2015) assume-se como necessário que a
perspectiva dos saberes docentes e a formação continuada não devem
ser encaradas como produtos que visem capacitar o professor com co-
nhecimentos de ordem técnica e instrumental, baseada na racionalidade
técnica, é fundamental a intensificação e continuidade de estudos para
que os professores se tornem cada vez mais conhecedores de sua profissão.
Sendo o conteúdo lutas elemento da cultura corporal de movimen-
to; sabemos que a ênfase da Educação Física não está na técnica, mas sim
no compartilhar do conteúdo na íntegra, sua história, seus valores, sua
contextualização e sua cultura de uma forma geral.

CONCLUSÃO

Os achados desta pesquisa apontam que ainda não há um consenso


sobre o ensino das lutas como conteúdo da Educação Física escolar. A sis-
tematização do ensino das lutas/artes marciais carece de aprofundamento
teórico em relação aos métodos aplicados; de materiais e espaços físicos
adequados – diferente do “alternativo” e do improviso; da compreensão
dos valores intrínsecos às lutas, que a distanciam dos estereótipos de
violência que são construídos no imaginário social; de qualificação do
quadro docente universitário, implicando no desenvolvimento e promo-
ção deste conteúdo no currículo escolar com qualidade.

Cadernos de Formação RBCE, p. 44-56, mar. 2019 53


Ficou evidenciado neste estudo um distanciamento entre o que é
produzido hoje nas pesquisas em Educação Física e a realidade do que
acontece nas escolas. Há que se pensar a produção do conhecimento pró-
xima da realidade do ambiente educacional e as lutas precisam ser pensa-
das para dentro da escola com uma abordagem que não desconsidere sua
ancestralidade e tradição, mas também, considere sua inserção nos dias
atuais, como uma atividade capaz de fazer com que haja relações entre as
pessoas de respeito e compreensão, e que o ensino das técnicas seja dentro
de uma linguagem adequada às exigências e as diretrizes educacionais.

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Recebido: 03 de junho 2019


Aprovado: 18 agosto 2019
Endereço eletrônico:
Felipe Rodrigues da Costa
fcostavix@gmail.com

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EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR E O ENSINO DAS LUTAS: O QUE É
NECESSÁRIO ACONTECER?
STEPHANINI, Jordana1
ANTUNES, Fabiana Ritter2
RESUMO
Este trabalho traz a opinião de professores referente ao tema lutas dentro âmbito escolar, e
quais são as dificuldades encontradas para que essa inserção seja feita com mais
expressividade nas aulas de Educação Física. Apresenta ideias para que esse objetivo seja
alcançado com uma maior ênfase e excelência, elevando o nível de aprendizagem e a
experiência dos alunos dentro das aulas de Educação Física escolar, pois a inserção das ainda
é pouco trabalhada nas escolas.

PALAVRAS-CHAVE: Educação Física Escolar; Inserção; Lutas;

INTRODUÇÃO
Este trabalho explica as dificuldades encontradas no momento que se pensa em
introduzir as lutas dentro das aulas de Educação Física Escolar. Vários são os motivos para
que isso ocorra, alguns deles são: o preconceito por parte das pessoas, diretores, pais e até por
alguns alunos em si, e a falta de preparação dos profissionais ao sair das universidades para
uma sala de aula. Para chegarmos a uma conclusão foi realizado um questionário com dois
professores formados a mais de dez anos pela mesma universidade, com apontamentos feito
por eles podemos notar a diferença que faz se ter uma base de conhecimento boa para a
introdução das lutas dentro da Educação Física escolar.
As lutas estão presentes na nossa história desde o início dela. O ato de lutar surgiu
com a própria origem do homem. Em princípio, lutar pela comida, lutar com outros animais,
lutar com outros homens, lutar para defender a terra (após tornarem-se sedentários), ou seja,
lutar para sobreviver. (RUFINO, 2010). Notamos que as lutas são vistas como marcas
culturais dentro da história de determinadas regiões e locais tanto no mundo como no Brasil,
são marcos e características do povo, vindo do início da história. Porém,
[...] deve-se ressaltar, no entanto, que o “surgimento” das lutas não foi algo “natural”
ou que “nasceu do nada” e sim processo de muitas transformações vividas pelas
sociedades. O surgimento dessas manifestações corporais relacionadas às lutas não
foi retilíneo e sim, provocados por inúmeras mudanças, rupturas e, muitas vezes,
considerando apenas a visão dos povos dominadores sobre os povos dominados
(RUFINO, 2010, p.34).

1
Acadêmica do Curso de Educação Física Licenciatura e Bacharelado da UNIJUI, Email:
jordana.stephanini@sou.unijui.edu.br
2
Docente do Curso de Educação Física da UNIJUI,. E-mail: fabiana.antunes@unijui.edu.br

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As lutas em um panorama geral, não estão significantemente inseridas dentro das aulas
de Educação Física Escolar, e isso é um fator que poderia ser mais trabalhado, onde traria
experiências motoras diferentes dos quais os alunos estão acostumados a ter. Sendo assim,
nesse trabalho será discutido sobre como o ensinamento das lutas dentro da Educação Física
Escolar pode ser realizado, e como isso atingirá tanto culturalmente, corporalmente e
socialmente as crianças e adolescentes envolvidas nessas aulas. Sabemos que,
Culturalmente, ao longo de muitos anos, as lutas foram envolvidas por certas
características místicas, além de treinamentos intensos. Muitos professores foram
formados com estas concepções. Muitos filmes sobre a temática das lutas/ artes
marciais ilustram e enaltecem esta relação e, certamente, todos estes fatores
influenciam a prática dos alunos dessas modalidades (RUFINO,2010, p.14).

Precisamos desfazer essa imagem de que as lutas não são práticas que possam ser
trabalhadas nas escolas, pelo fato de se ter um contato maior que muitas vezes se vê como um
ato violento e que introduzir a luta dentro da escola, a violência vai de uma certa forma
aumentar. Essa desconstrução precisará ser feita de uma forma lenta, através de exemplos e
muita dedicação principalmente dos professores, para buscar o conhecimento e também a
aprovação dos diretores e pais para essa inserção, um passo de cada vez e ficamos mais perto
de chegarmos ao objetivo, que é inserir as lutas dentro da escola de uma forma saudável e
bem vista por todos.

METODOLOGIA

O caminho metodológico percorrido por este estudo conta com abordagem


qualificativa de cunho descritivo interpretativo com ênfase no estudo de caso. Para Cotta, Del-
Masso e Santos (2014) a abordagem qualitativa é interpretar, compreender e analisar um
complexo de significados, os quais não precisam de delimitação de tempo ou lugar, das
causas e procedências, é preciso que o pesquisador tenha uma atenção maior para que a
pesquisa se tenha em uma qualidade considerável. Nesta pesquisa o instrumento utilizado foi
um questionário misto contendo seis questões nas quais as perguntas eram tanto abertas como
fechadas, foi enviado para dois sujeitos via WhatsApp os quais os dois aceitaram e
responderam todas as questões, retornado assim pelo mesmo aplicativo.
Os sujeitos que aceitaram e retornaram com o instrumento respondido foram dois
professores formados em uma universidade comunitária do noroeste gaúcho, em graduação
plena a qual engloba a licenciatura e o bacharelado em Educação Física. O Sujeito Um, é do
sexo masculino, formado em 2009, tens 36 anos atuando atualmente na secretaria municipal
de educação como professor da escolinha de futebol da cidade, o Sujeito Dois, é do sexo

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feminino, formada em 2001, tens 46 anos e está atuando dentro de uma escola estadual e uma
municipal. A análise das respostas foi realizada comparando a resposta de ambos os sujeitos,
realizando um comentário pelo autor baseado na realidade vivida pelos sujeitos, fala de
autores a respeito dos assuntos pautados e por experiências vividas pelo autor.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Como descrito anteriormente foi realizado um questionário com dois profissionais de


Educação Física, o sujeito um é um professor de 36 anos formado a 12 anos, e o sujeito dois é
uma professora de 46 anos formada a 20 anos, ambos na mesma universidade. O questionário
continha seis perguntas as quais iremos debater os resultados a seguir. Primeiramente foi
questionado se os sujeitos desenvolvem ou desenvolveriam as lutas dentro da Educação Física
escolar. O sujeito um respondeu que “sim, desenvolveria pelo fato que as lutas fazem parte
dos conteúdos dentro da Educação Física” (SUJEITO 1,2021), enquanto o sujeito dois
responde que “não desenvolvia o tema até o mesmo entrar na Base Nacional Comum
Curricular – BNCC” (SUJEITO 2, 2021). Como podemos perceber os sujeitos no final
tiveram respostas de uma certa forma positivas, pois um já trabalhou e o outro sujeito inseriu
também nos seus planejamentos.
A segunda questão focava na formação inicial dos professores, se é que dentro da
grade de matérias havia uma disciplina especifica sobre lutas. O sujeito um “confirmou que
havia na graduação dele” (SUJEITO 1, 2021), já o Sujeito Dois relatou que “não lembro de
ter uma disciplina específica do tema lutas na minha grade de matérias” (SUJEITO 2, 2021).
O que podemos perceber é que houve uma evolução dentro do currículo do curso entre o
tempo do Sujeito Dois para o Sujeito Um, pois quando um era acadêmico continha a
disciplina própria isso é um ponto positivo é um passo para a inserção de professores mais
preparados para a didática das aulas de lutas dentro da escola.
A terceira questão está muito ligada à segunda, a qual discute se a graduação
proporciona condições suficientes para que saia da sala da universidade e entre para a sala da
escola com capacidade de inserir e trabalhar com as lutas. O Sujeito Um respondeu que “por
mais que tivesse uma disciplina específica, sai com o mínimo de conhecimento possível para
a inserção do tema na escola, foi um esboço do que se pode fazer” (SUJEITO 1, 2021), o
Sujeito Dois afirmou “tive muita dificuldade neste tema, na época da graduação” (SUJEITO
2, 2021), acreditamos que o fato de não ter a disciplina específica no currículo dela tenha

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proporcionado essa dificuldade de ter um conhecimento considerável para o ensino do tema
de lutas na escola.
Agora percebemos que o sujeito dois não trabalhava com as lutas antes da inserção do
mesmo na Base Nacional Comum Curricular - BNCC, pelo fato de não ter recebido uma base
suficiente para que isso acontecesse, não podemos julgar a atitude dela, pois após a inserção
do tema, ela começou a trabalhar ou pelo menos a iniciar a inserção do mesmo dentro das
aulas de Educação Física escolar, pensamos que nosso sujeito dois tem um alcance de muitos
alunos ao trabalhar tanto em rede estadual como municipal, podemos nos questionar sobre
qual seria a mudança dentro das aulas de Educação Física dessas redes após a introdução e
desenvolvimento deste tema e qual seria o impacto aos alunos. Pensando nisso vemos que,
[...] as lutas são parte integrante e constituinte da cultura corporal dos seres humanos
e por isso devem ser ensinadas nos mais diversos ambientes da educação formal e
não-formal. Entretanto, o fato de fazerem parte da cultura corporal, não garante, por
si só, que elas sejam praticadas por muitas pessoas. É preciso compreender também
os benefícios dessas práticas (RUFINO,2010, p.132).

Segundo a Base Nacional Comum Curricular – BNCC (2017, p. 213) “a Educação


Física é o componente curricular que tematiza as práticas corporais em suas diversas formas
de codificação e significação social”. Pensando nisso vemos a importância que se tem de
trabalhar todas as formas de esportes e o quanto esse trabalho vai atingir nossos alunos tanto
motoramente como no seu comportamento, mas para isso é preciso que se haja uma
preparação dos professores, tanto no conhecimento técnico como na percepção da realidade
que o aluno está inserido, para que se tenha um bom diagnóstico e sucessivamente uma boa
intervenção.
Discutiremos a questão quatro e cinco juntamente pois podemos complementa-las,
foram questionados se o professor deve ensinar lutas dentro das aulas de Educação Física e se
eles acreditam que essas aulas possam trazer benefícios ou malefícios aos alunos se
introduzidas, o Sujeito Um “acredito que o professor deve ensinar o tema em questão pois é
um direito que o aluno tem de aprender sobre todos os tipos de esportes, e que essa inserção
pode trazer muitos benefícios, porém a aula deve ser muito bem organizada e trabalhada
pelo professor para que o mesmo não perca o controle da turma e acabe trazendo malefícios”
(SUJEITO 1, 2021). O sujeito dois destaca “devemos ensinar o tema e esse tema precisa ser
altamente planejado e muito bem executado, para que as aulas não virem algo violento e
tragam mais malefícios do que benefícios tanto para os alunos como para os professores e
para a escola” (SUJEITO 2, 2021), os dois sujeitos enfatizam um receio de que a inserção das

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lutas gere ainda mais violência do que possa ajudar a combate-la. Porém sabemos que a
prática desse tema traz benefícios,
[...] dentro dos benefícios categorizados como capacidades físicas e saúde estão a
melhora da força, coordenação motora, flexibilidade, agilidade, etc.; os benefícios
mentais e cognitivos podem ser representados pela melhora da concentração,
velocidade de raciocínio, entre outros; dentro de disciplina e respeito estão: respeito
à hierarquia, melhora do comportamento e da disciplina, etc.; benefícios
filosóficos/educacionais podem ser representados pela formação da pessoa humana,
aprendizagem de uma filosofia de vida, etc.; e benefícios espirituais e religiosos,
como melhora da espiritualidade e aprendizagem espiritual (RUFINO, 2010, p. 132).

Uma última questão foi feita com o objetivo de abrir espaço para que os sujeitos
participantes pudessem deixar algo registrado que eles achassem importante referente a
inserção das lutas na Educação Física escolar, o Sujeito Um enfatizou que “os alunos tem
todo o direito de aprender todos os tipos de esportes, e para isso acontecer, o professor
precisa buscar conhecimento e se preparar, pois a universidade oferece apenas uma base do
que é preciso para dar uma aula de qualidade, mas nos estigam e nos dão autonomia em
buscar conhecimento e saber qualificar conteúdos de qualidade para que as aulas sejam de
um grande proveito tanto para os alunos como para os professores” (SUJEITO 1, 2021). O
Sujeito Dois destaca que “é preciso que os professores sejam melhor preparados para
trabalharem na sala de aula, acreditando que a universidade precisa dar conta de uma
preparação para que quando os acadêmicos saiam das universidades estejam aptos para a
inserção e para o trabalho dentro das escolas e das salas de aula, com um ensino de
qualidade” (SUJEITO 2, 2021).
Notasse que os resultados obtidos nos questionários revelam o quanto devemos nos
preocupar com a formação dos nossos professores, e como a atualização e a busca da melhora
dos currículos das universidades é importante. Os resultados nos mostram de que mesmo com
as diferenças entre idades e ano de formação a opinião deles do ensino das lutas nas escolas é
de uma certa forma a mesma, levantam um grande ponto ao porquê de as lutas não estarem
inseridas dentro das aulas de Educação Física escolar. Pelo fato dos professores não se
sentirem preparados para a iniciação desse tema, o qual é muitas vezes rebatido pela direção
das escolas e pelos pais, os quais tem preconceitos com o tema proposto e um pensamento de
que a prática de lutas dentro da Educação Física escolar só aumentara a violência nas escolas
e consequentemente na sociedade, eles acabam não inserindo por pressão contraria e por não
se sentirem seguros referente ao tema para poder aplica-lo.
Discutindo agora tudo o que foi relatado podemos ver que o medo da mudança e do
novo por parte dos professores é de uma certa forma bem considerável, ao ponto de não

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trabalharem o tema de lutas na escola, e que o pouco conhecimento e pouca preparação dos
profissionais é um possível causa desse acontecimento, porém,
[...] a postura diante de novos aprendizados, que poderiam em outros momentos,
parecer distantes de nossa realidade, é fundamental para a carreira docente. Para
grande parte dos professores, a proposta de trabalhar com lutas envolve mais
saberes. É preciso superar o medo de trabalhar com esse conteúdo, compreendendo
o trabalho com lutas na escola como uma aplicação dos repertórios de práticas
corporais (BOOG e URIZZI,2019, p.77).

Pensando nisso devemos sair das nossas zonas de conforto e deixar nossos medos de
lado, para que podemos proporcionar aos nossos alunos aulas diversificadas e de uma ótima
qualidade e desfazer essa imagem distorcida das lutas, mas para que isso aconteça é preciso
que aja mudanças, notamos que,
[...] no processo de construção do conhecimento, faz-se necessário descontruir
algumas realidades, sem deixar de valoriza-las, como parte importante da formação
daquele ser humano. E a reconstrução faz essas vivencias, que podem em principio
se ligadas à violência, se tornarem jogos prazerosos, repletos de significados e regras
(BOOG e URIZZI,2019, p.78).

Podemos envolver os alunos a participarem pensando no cotidiano deles, na cultura,


na religião, podemos mostrar o quanto as lutas são importantes dentro da cultura no Brasil e
no mundo, e mostrar que as lutas significam história e aprendizagem e não somente pessoas
batendo em outras pessoas, mas sim que todo o conhecimento que envolve as lutas é muito
maior do que se imagina, por isso,
[...] partindo do contexto da criança, pode-se abordar uma luta especifica, que deve
ser contextualizada, de forma que as crianças estabeleçam relação entre a luta e o
povo ao qual está ligada, destacando sua filosofia, suas vestimentas, seus
equipamentos e suas regras. As crianças devem entender a presença e a importância
dessa luta nos rituais do seu povo de origem, sejam eles ligados à
espiritualidade/religião ou as guerras (BOOG e URIZZI, 2019, p.79).

Refletindo tudo isso podemos notar que se tem muitas dificuldades perante aos
professores, mas com alguns esforços a mais podemos sim inserir as lutas dentro da Educação
Física escolar, é necessário que saiamos da nossa zona de conforto e busquemos métodos e
respostas para que esse tema seja utilizado de uma maneira certa e coerente e nosso alunos
podendo praticar e conhecer o lado bom das lutas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Podemos notar o quanto os nossos professores ainda precisam de um conhecimento


mais elevado para que se haja uma introdução há realidade das escolas, pois vemos que os
mesmos sentem medo e insegurança no momento de ir a prática, podem estar bem preparados
teoricamente, mas muitas vezes sem experiências prática, precisamos incluir nas graduações

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matérias específicas e que trabalham com a inserção dos professores dentro das escolas, que
faça com que esse medo minimize e que eles entrem com um nível maior de segurança, com
um bom conhecimento técnico e uma boa introdução prática.
Notamos que ao falar das lutas essa insegurança é ainda maior, pelo fato do
preconceito em relação a este tema estar muito inserido dentro da sociedade e das escolas,
precisamos descontruir esse preconceito, mostrar que as lutas podem ajudar tanto fisicamente,
como no comportamento dos nossos alunos, por abranger dentro das modalidades normas e
regras, onde o respeito tem uma função crucial dentro do desporto, e que se usarmos essa
visão de que a prática das modalidades de lutas mudam comportamentos e vidas, a
desconstrução do preconceito será um objetivo alcançado, e é nós professores que precisamos
nos erguer e fazer com que essas práticas sejam inseridas com êxito dentro das aulas de
Educação Física, mostrado tanto para sociedade, quanto para os pais e diretores, os benefícios
que a pratica desse esporte faz.
A busca do conhecimento precisar ser constante, pois os temas sempre estão em
evolução, então nós como professores sempre precisamos continuar buscando atualizações,
claramente que uma boa graduação é um grande passo para ser um ótimo profissional, e se
juntarmos uma boa graduação com dedicação, busca de conhecimento, atualizações, parcerias
e constante mudança, podemos aplicar aulas com mais produtividade onde nossos alunos
aproveitem ao máximo em todos os aspectos possíveis.

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Elas podem se machucar: As Lutas no combate ao preconceito de gênero na


Educação Física Escolar
They can get hurted: Struggles to combat gender prejudice in School Physical Education
Pueden ser heridas: Las peleas en la Lucha contra los prejuicios de género en la Educación Física
Escolar

Recebido: 13/02/2021 | Revisado: 21/02/2021 | Aceito: 25/02/2021 | Publicado: 04/03/2021

Eder Rodrigo Mariano


ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3345-0003
Universidade Federal do Maranhão, Brasil
E-mail: eder.mariano@ufma.br
Francisco Eduardo Lopes da Silva
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8998-6803
Universidade Federal do Maranhão, Brasil
E-mail: f.eduardolopes@hotmail.com
Sérgio Souza
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2633-9654
Universidade Federal do Maranhão, Brasil
E-mail: sergio.souza@ufma.br
Deyvid Tenner de Souza Rizzo
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9622-9816
Universidade. Federal do Mato Grosso do Sul, Brasil
E-mail: deyvidrizzo1@gmail.com
Vitor Alberto Valadas Rosa
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5093-8115
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Portugal
E-mail: vitor.rosa@ulusofona.pt
Luís Fernandes Monteiro
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8118-5593
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Portugal
E-mail: p625@ulusofona.pt

Resumo
Na atualidade, as mulheres ainda são estigmatizadas no âmbito esportivo, principalmente no que se refere a prática
das Artes Marciais e Esportes de Combate (AM&EC). No contexto escolar, estudos científicos que tratam da interface
entre Lutas e questões de gênero são escassos. Esta investigação buscou apontar a acepção dos alunos sobre a
participação feminina nas aulas de Lutas na Educação Física. Os estudantes do 3º ano do ensino médio responderam à
um questionário semiestruturado, antes e após, serem submetidos a seis encontros que envolviam aulas teóricas e
aulas práticas subsequentemente, totalizando 140 minutos, cada encontro. O estudo ocorreu no Centro Educacional
Dom Ungarelli, em Pinheiro-MA, numa sala de aula adaptada com Tatame e abrangeu 13 modalidades de Lutas. Os
pais autorizaram-nos a participar, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo excluídos aqueles
que não frequentaram 75% das aulas ou não responderam. Os resultados mostram que, preliminarmente, 150
estudantes que participaram do estudo, 120 consideraram negativa a participação das meninas, pelo risco de se
machucarem; apenas 19 julgaram-nas capazes e 11 com direitos iguais aos meninos. Posteriormente, todos
aprovaram-nas nas aulas de Lutas, 35 confirmaram a capacidade delas e 60 estudantes passaram a reconhecer como
uma prática em que as meninas também tem direito de participar; e destacamos que 55 estudantes perceberam que as
Lutas rompem o preconceito de gênero. Portanto, concluímos que o conteúdo Lutas pode ser uma importante
ferramenta educacional no combate aos estereótipos e preconceitos.
Palavras-chave: Artes marciais; Esportes de combate; Lutas; Educação física escolar; Preconceito; Gênero.

Abstract
Currently, woman are still stigmatized in the sports field. Mainly, in what refers to the practice of Fighting, Martial
Arts and Combat Sports (AM&EC). In the school context, scientific studies dealing with the interface between
struggles and gender issues are scarce. This investigation sought to point out the meaning of student about female
participation in classes of Struggles in Physical Education. The students of the 3rd year of high school answered a
semi-structured questionnaire, before and after being submitted to six meetings that involved theoretical classes and
subsequent practical classes, totaling 140 minutes, each meeting. The study took place at the Dom Ungarelli
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Educational Center, in Pinheiro-MA, in the classroom adapted with fighting mat and covered 13 modalities of Fights.
The parents authorized us to participate, by signing the Free and Informed Consent Form (TCLE), excluding those
who did not attend 75% of the class or did not answer the questionnaire. The results show that, preliminary, of the 150
students who participated in the study, 120 considered negative the participation of girls, because of the risk of getting
hurt; only 19 judged them capable and 11 with equal rights to boys. Subsequently, all approved them in Fighting
classes, 35 confirmed their capacity and 60 students began to recognize it as a practice in which girls also have right
to participate; and we emphasize that 55 students acknowledge that the Struggles break the gender prejudice.
Therefore, we conclude that the content Fighting/Martial Arts/Combat Sports can be an important educational tool in
combating stereotypes and prejudices.
Keywords: Martial arts; Combat sports; Fights; School physical education; Preconception; Genre.

Resumen
En la actualidad, las mujeres siguen estando estigmatizadas en el ámbito deportivo, principalmente en lo que respecta
a la práctica de Luchas, Artes Marciales y Deportes de Combate(AM&EC). En el contexto escolar, los estudios
científicos que aborden la interfaz entre luchas y cuestiones de género son escasos. Esta investigación buscó señalar la
percepción de los estudiantes sobre la participación femenina en las clases de Lucha en Educación Física. Los
alumnos de 3º año de bachillerato respondieron un cuestionario semiestructurado, antes y después, siendo sometido a
seis reuniones que involucraron clases teóricas y prácticas posteriormente, totalizando 140 minutos, cada reunión. El
estudio se llevó a cabo en el Centro Educacional Dom Ungarelli, en Pinheiro-MA, en un aula adaptada con Tatami y
cubrió 13 tipos de peleas. Los padres nos autorizaron a participar firmando el Formulario de Consentimiento
Informado, excluyendo a aquellos que no asistieron al 75% de las clases o no respondieron. Los resultados muestran
que, de manera preliminar, 150 estudiantes que participaron del estudio, 120 consideraron negativa la participación de
las niñas, por el riesgo de lastimarse; solo 19 los juzgaron capaces y 11 con los mismos derechos que los niños.
Posteriormente, todos los aprobaron en las clases de Lucha, 35 confirmaron su habilidad y 60 estudiantes comenzaron
a reconocerla como una práctica en la que las niñas también tienen derecho a participar; y destacamos que 55
estudiantes se dieron cuenta de que las Luchas rompen el sesgo de género. Por tanto, concluimos que el contenido de
Fight puede ser una importante herramienta educativa en la lucha contra los estereotipos y prejuicios.
Palabras clave: Artes marciales; Deportes de combate; Peleas; Educación física escolar; Preconcepción; Género.

1. Introdução
Denotadas como “sexo frágil”, deliberadas aos afazeres domésticos e destinadas à procriação e aos cuidados com a
prole, as mulheres sofreram, exageradamente, as barreiras de um julgamento sexista, impelido por fatores culturais da época
(Beauvoir, 1980; Terret, 2006). As limitações impostas foram estruturadas por esses estereótipos, o que, deste modo,
representava para a sociedade vigente características contrárias às exigências de prática esportiva. Conforme salienta Felipe
(2000), ser simples e discreta eram características intensamente valorizados, possivelmente uma das maiores virtudes nas
mulheres e meninas. Desta forma, a educação das mulheres foi estruturada de forma diferenciada, voltada para a sua
capacidade procriativa e as considerando como subordinadas.
Na atualidade, as mulheres ainda são descriminadas em vários setores da sociedade. No âmbito esportivo, o
preconceito de gênero se faz presente há décadas, e a história da mulher no esporte é pautada pela subversão. Não obstante, o
combate ativo na sociedade e no esporte pela equidade de gênero, se torna, a cada dia, mais efetiva e eficaz (Silva, 2017).
Historicamente, no Brasil, durante a presidência de Getúlio Vargas (1937-1945) e o período da Ditadura Militar
(1964-1985), foram marcados, de maneira abusiva, pelas limitações de possiblidades de articulação das mulheres no Esporte,
haja vista, o vigor do Decreto-lei 3.199 de 14 de abril de 1941, que assim determinava: “Art. 54. Às mulheres não se permitirá
a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de
Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país” (Decreto-lei 3.199, 1941).
No final do século XIX e transcorrer do século XX, as mulheres iniciaram suas conquistas por posições mais ativas no
Esporte e, aos poucos, engajaram-se numa área, que há muito tempo lhes havia sido negada e pela qual se mostravam
intensamente seduzidas (Miragaya, 2007). Por consequência, intensificou-se a promoção de eventos esportivos que
repercutiram no aumento do quantitativo de mulheres atletas participantes de modalidades esportivas direcionadas a elas
(Oliveira, 2011).
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Culturalmente, a participação das mulheres nas artes marciais e esportes de combate (AM&EC) era considerada uma
prática anormal, inconveniente e periculosa; ao passo que, para os homens, lhes eram, e ainda são atribuídas as qualidades
necessárias para praticá-las, como a virilidade, a coragem e a força. Discurso este, legitimado a partir da perspectiva biológica
e adotado como estratégia para manter as mulheres afastadas desta prática esportiva (Santana da Silva, 2019).
Ressaltamos que a inserção efetiva das mulheres nas AM&EC, em particular nas Lutas, ocorreu de forma tardia. Os
registros datam a primeira participação das mulheres na Esgrima em 1924, em Jogos Olímpicos (Mourão & Sebastião, 2005).
No Judô, elas iniciaram seu protagonismo a partir de 1992 (COI, 2016). Em 2000, houve a estreia feminina na modalidade
Taekwondo (Pereira & Carneiro, 2016), e em 2004, a Luta Olímpica - Estilo Livre entrou em cena com a disputa feminina
(COI, 2016). Na nobre arte, o Boxe, registrou-se a marcante participação feminina somente no ano de 2012 (Cardoso et al.,
2013). Este “considerável atraso” foi justificado no estudo de Jardim (2018) ao mostrar as Lutas como práticas marcadas pelo
domínio masculino, e portanto, inadequadas ao corpo frágil, delicado e passivo da mulher.
Por ser um tema contestável, o preconceito de gênero, necessita ser discutido na esfera educacional, especificamente,
nas aulas de Educação Física Escolar (EFE), onde encontramos um campo fértil no trato desta temática, em específico, ao eixo
temático Lutas, determinado pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), na área de Linguagens (Ministério da Educação,
2015). Como afirmam Lima et al. (2017, p. 437-438): “a luta não é um conteúdo com o fim em si mesmo, ela também deve ser
utilizada na abordagem dos temas transversais, já que está diretamente ligada às questões pertinentes ao gênero”.
Evidenciamos, na obra de Rosa et al. (2020), a presença frequente do preconceito de gênero contra
mulheres/alunas/professoras no âmbito educacional através de declarações ofensivas, tais como: marica, bicha, mulherzinha,
afeminado, mulher macho e paraíba; ao passo que, no estudo de Lima et al. (2017, p.438), que tratava do preconceito de
gênero entre alunos do nono ano, nas aulas de Educação Física, registrou-se a persistência na pronúncia da frase: “as meninas
devem praticar balé e os meninos as lutas”, mencionada pelos garotos. Tais atitudes e conotações podem ocorrer em virtude
das consequências culturais, relações escolares, ou ainda, da influência familiar (Rosa et al., 2020).
Neste contexto, Costa (2019) compactuou com uma postura bastante adversa diante de tal situação. Ele defendeu o
pensamento de que atitudes de preconceito de gênero no ambiente educacional deveriam ser discutidas e abolidas. Outrossim,
Rodrigues et al. (2017) alvitrou a possibilidade de se elaborar estratégias para elucidar o papel das Lutas no ambiente escolar e
romper com os estereótipos que, em outros momentos, relacionavam tais práticas como inadequadas ao gênero feminino.
Recentemente, alguns estudos problematizaram as relações de gênero e das sexualidades no cotidiano do currículo
escolar (Da Silva Barros & Queiroz, 2020; Miranda & Dos Reis, 2020; Costa, 2019; So et al., 2018), que culminaram num
atual ataque as discussões de gênero no ambiente educacional.
Estudos atuais se propuseram a verificar o efeito de programas de iniciação as lutas em estudantes no contexto escolar
(Rodrigues et al., 2017; Silva et al., 2019). A desmistificação das Lutas nas aulas de Educação Física Escolar (EFE) se
apresenta como tema emergente (Silva et al., 2020). Firmino e de Souza Ventura (2017) propõe uma análise sistematizada
desta temática na busca pela emancipação da mulher em diferentes modalidades de Lutas. Os autores Silva et al. (2020)
compreendem as Lutas como campo afetivo social que estabelece vínculo entre os envolvidos, por meio de ações e reações
durante o embate. Neste pensamento, os participantes adotam uma postura de confronto, que de forma controversa, promove a
socialização e incita atitudes de perseverança, respeito e determinação. Lima et al. (2017) consideram as Lutas como uma
excelente ferramenta no trato de questões de gênero, na educação formal e informal, na contemporaneidade.
Todavia, na interface entre lutas e gênero, no contexto da EFE, pouco se investigou e se publicou na literatura
científica. Lima et al. (2017) reforçam a carência de pesquisas e novos apontamentos desta temática, principalmente, na esfera
educacional.
Nesta perspectiva, este artigo tem como objetivo verificar a concepção dos alunos a respeito do preconceito de gênero

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diante da participação de meninas nas aulas de Lutas; buscou-se ainda, apontar, se as Lutas promovem inclusão ou a exclusão
de alunos, durante a participação em um bloco de atividades envolvendo diferentes modalidades de Lutas, no ensino médio.

1.1 Gênero, Esporte e Sociedade


Quando problematizamos as questões de gênero na sociedade, constatamos conexões com evidências históricas,
culturais, sociais e legislativas que se constituíram desde a determinação daquilo que “é de menino ou de menina” ao longo da
infância, até o preconceito contra a participação das mulheres nas AM&EC, tanto no ambiente educacional formal como no
informal, evidenciados na atualidade.
Com o ressurgimento dos Jogos Olímpicos (JO), promovidos por Pierre de Fredy, o Barão de Coubertin, foi criado o
órgão que passou a regulamentá-los: o Comitê Olímpico Internacional (COI) (Firmino & De Souza Ventura, 2017). Porém,
para as mulheres foi mantida a proibição delas em participação de eventos esportivos, desde os Jogos da Antiguidade, sendo
então, abdicadas de exercerem sua cidadania.
Contudo, nos JO de Atenas em 1896, Stamata Revith, mulher grega de aproximadamente 30 anos de idade, tentou
realizar sua inscrição na prova de Atletismo, mas teve seu pedido indeferido; tendo que participar de modo não oficial do lado
externo do estádio, o que impulsionou, mesmo que de modo isolado, iniciativas em prol de seus direitos de igualdade (Firmino,
2014).
Um momento político e histórico marcante na trajetória das mulheres em busca dos seus diretos, foi a passeata das
sufragistas, realizada no ano de 1912, em Nova York, no qual mulheres de distintas classes sociais se reuniram em uma
passeata com objetivo de garantir o direito ao voto. Direito este, consumado em 1920 (Firmino & De Souza Ventura, 2017).
Tal fato caracteriza um período de mudanças na atitude das mulheres que, a partir de então, assumiram uma nova postura na
luta por seus direitos no âmbito social.
Enquanto que, no Brasil, o governo executava a implantação de Decretos de Lei e imposições políticas, registrados
entre as décadas de trinta e oitenta, consolidando a regulamentação do Esporte Nacional que, em 1965, determinou o vigor da
deliberação nº 07 do Conselho Nacional de Desportos (CND), proibindo a mulher de praticar Lutas de qualquer natureza,
Futebol, Futebol de Salão, Futebol de Praia, Pólo-Aquático, Pólo, Rugby, Halterofilismo e Baseball (Conselho Nacional de
Desportos, 1965). Ressaltamos neste ponto, a configuração de uma barreira legislativa, além das barreiras culturais. A própria
legislação fragiliza as mulheres e as classificavam como incompatíveis para a prática desportiva, inclusive as AM&EC.
Somente após mais uma década, foi desmembrada a deliberação n° 7 de 1965, vigorando assim a deliberação nº 10 de
1979, concedendo legalmente às mulheres a permissão para praticar qualquer modalidade esportiva, embora houvesse algumas
limitações, como a condição da instituição internacional da modalidade, realizar campeonatos e torneios oficiais femininos e
misto. Caso contrário, teria que ser requerida uma permissão ao Conselho Nacional de Desportos, para a modalidade em
específico (Decreto-lei n° 89.406, 1984).
Após longos períodos de subversões, em 1900, foi oficializada a participação das mulheres no Tênis e no Golfe, visto
que, para a sociedade vigente, representava uma modalidade de esporte sem contato físico, com menores riscos de lesões e
possibilitava ao público apreciar a beleza e delicadeza motora das mulheres durante as partidas. Este fato, apesar de expressar
uma compreensão limitada; foi favorável à emancipação das mulheres no esporte (Rubio & Simões, 1999).
No Atletismo, a história de Katharine Switzer, maratonista, é uma grande evidência do preconceito de gênero e da luta
pela sua superação. Ela foi a primeira mulher a correr oficialmente a “Corrida Boston”, em 1967, e a quebrar o paradigma de
mulher masculinizada por praticar tal modalidade, determinada para homens. Sua atitude de coragem e determinação
repercutiu no mundo esportivo e incentivou inúmeras mulheres a superarem e a combaterem o preconceito de gênero através
do esporte (Lins et al., 2016).

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A Esgrima, que até o século XVIII, era considerada uma atividade bélica destinada ao duelo entre homens e praticada
com enorme veemência entre eles (Alves, 2019), foi proibida para o gênero feminino, em virtude da agressividade que
representava. No início do século XIX, a modalidade passou a ser oficialmente praticada por mulheres, chegando aos Jogos
Olímpicos á partir de 1924 e disseminada a todo público feminino mundial (Mourão & Sebastião, 2005).
No Brasil, muitas mulheres iniciaram sua busca pela independência financeira e autonomia pessoal trabalhando no
comércio, em bancas de rua, açougues e mercados. Entretanto, elas sofriam frequentes tentativas de violência e ameaças. Neste
cenário, surgiram as primeiras menções sobre a participação de mulheres em grupos de Capoeira. A partir deste momento, elas
passaram a ser estereotipadas pela sociedade como mulheres violentas e arruaceiras, confirmando assim, o preconceito de
gênero de caráter cultural que limitou, e ainda limita o público feminino a aderir em diversas áreas de atuação (Oliveira &
Leal, 2009).
Nos anos seguintes percebeu-se uma vagarosa e escassa progressão na participação das mulheres nas AM&EC, em
detrimento a hegemonia e a supervalorização do gênero masculino nas modalidades de combate (Leite et al., 2017).
Neste ínterim, surge uma personagem emblemática, Valdelice Santos de Jesus “Mestra Jararaca”. Em 2001, ela foi
reconhecida como a primeira mulher mestra em Capoeira, e tal fato repercutiu no surgimento de uma personalidade feminina
ativa na sociedade, com o propósito de combater a discriminação e a desvalorização da mulher na sociedade fortalecendo
sobremaneira a autoafirmação da mulher e seu valor na sociedade (Ferreira, 2016).
Ainda hoje, percebemos que algumas práticas de AM&EC continuam restritas ou proibidas ao público feminino,
como é o caso do Sumô, a Arte Marcial mais reverenciada no Japão, local onde as mulheres são oficialmente proibidas de
praticá-lo, pois, para os padrões que o povo ali ostenta, isto representaria “o fim do Sumô” (Ledur et al., 2018).
Na prática do Boxe, as menções revelam que as qualidades anatômicas dos corpos determinavam os direitos, deveres
e possibilidades de movimentação dentro do embate (Louro, 2018). A rotulação de gênero à mulher praticante de Boxe reflete
o efeito de um olhar midiático discriminatório, por considerarem uma prática violenta e bárbara com eminentes riscos à
integridade física da mulher. Infelizmente, o Boxe possui uma hegemonia masculina e uma tardia oficialização da participação
feminina, fato que ocorreu somente em 2012 (Cardoso et al., 2013).
Ao tratarmos das Artes Marciais Mistas (MMA) no remetemos a Jardim (2018) que as compreende como um conjunto
de técnicas de diferentes modalidades de combate, caracterizada por uma prática violenta e agressiva que oferece considerável
risco à saúde do praticante, principalmente, quando se trata de mulheres. Contudo, Silveira e Vaz (2016) sugerem que o
preconceito frente às mulheres se revela, não pelas capacidades esportivas, mas pelos requisitos femininos heteronormativos.
Em aversão a tais pensamentos, salientamos a visão Santana da Silva (2019) ao atribuir a inserção e valorização das
mulheres nas Lutas à expansão do MMA, que por sua vez, foi e é propagado por meio de eventos de grande magnitude
midiática, como o Pride Fighting Championship, fundado em 1997, no Japão; o Cage Warriors Fighting Championship, criado
na Europa, em 2001; o Jungle Fight Championship, originado no estado do Amazonas, Brasil, em 2006; e o Ultimate Fighting
Championship (UFC), nascido em 1993 nos Estados Unidos e reestruturado em 2001, que atualmente, é a maior promotora de
eventos de MMA em todos os continentes. Neste “campo de batalha”, as mulheres estão conquistando e ampliando seu espaço
e reconhecimento, além de deixarem um legado na história das AM&EC construindo a imagem de mulheres aguerridas,
versáteis, determinadas e corajosas (Fernandes, 2015).
Ao romperem as fronteiras da rejeição e da intolerância, as mulheres afrontam o estigma de fragilidade e obediência
imposto pela sociedade e abrem novos caminhos e possibilidades encorajando outras ações de combate ao preconceito de
gênero, fortalecendo assim, a efetivação de seus direitos (Camargo & Kessler, 2017).

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1.2 Lutas, EFE e Preconceito de Gênero: interface em questão


O entendimento tendencioso de que existe uma divisão das práticas esportivas em masculinas” ou “femininas” pode
ter como consequência negativa, atitudes de desvalorização e falta de apoio a determinadas modalidades, como nos casos das
AM&EC quando realizado por mulheres, ou da Ginástica Artística, do Voleibol ou da Dança, quando desempenhados pelo
homem (Do Prado et al., 2016). Em circunstâncias mais extremas tais posicionamentos podem se tornar hostis, manifestando
como resposta o preconceito de gênero em relação ao que é” normal” e “anormal”.
A escola, no Brasil, é apontada por Dos Santos et al. (2019), como a grande responsável pelo primeiro contato dos
estudantes com a prática de diferentes modalidades esportivas durante as aulas de EFE, nas quais se evidencia um espaço
democrático de valiosas experiências cognitivas, motoras e sociais entre alunos. Por outro lado, So et al. (2018),
lamentavelmente, evidenciam um envolvimento desfavorável das meninas na EFE, principalmente, quando o conteúdo
ministrado se refere às AM&EC.
Dois grandes obstáculos anunciados pelos professores de EFE no ensino da AM&EC são o desenvolvimento da práxis
e o envolvimento das meninas. É notório que as Lutas sempre foram vistas como atividades que oferecem riscos aos
participantes e são contraindicadas para as meninas na EFE (Carvalho, 2019).
A investigação de Souza e Menezes (2019) realizada em duas escolas com meninas do sexto ano no ensino
fundamental, revelou que 43% das entrevistadas afirmaram participar das aulas de EFE separadas dos meninos, seguindo a
determinação da professora, com a prerrogativa de evitar a ocorrência de lesões. Quando foram questionadas sobre a vontade
em participar de aulas mistas, 73% delas responderam que concordavam e tinham interesse.
Lima (2017) observou o comportamento de meninos em quadra, durante as aulas de EFE, e registrou algumas
adversidades, com destaque para rejeição quanto a participação feminina nas atividades. Os meninos alegaram ainda que, elas
atrapalhavam o jogo e podiam se machucar durante as aulas práticas de EFE. Percebemos nesses discursos a tentativa de
subalternizar e depreciar a participação feminina no esporte, com argumentos encobertos de preconceito de gênero (Silva,
2017).
Entretanto, cabe aos professores tanto a discussão com os alunos sobre a desconstrução de processos discriminatórios,
quanto a aplicação de atividades que tragam para a escola conteúdos interessantes que venham ser problematizados e
questionados a partir da visão e do discurso dos alunos (Silva et al., 2020).
Seguindo este raciocínio, Lima et al. (2017) valorizam o debate das AM&EC na EFE relacionando-as com a violência
e questões de gênero no ambiente escolar, e justificam a importância desta interface como proposta de ensino dos valores
culturais e de pacificação, utilizando todo potencial educativo embutido nos princípios filosóficos de diferentes modalidades
como o Muay-Thai, Capoeira, Jiu-Jitsu, Taekwondo e Judô, mundialmente reconhecidas.
É possível perceber o quanto os alunos julgam sobre as divisões que existem nas aulas práticas de educação física. As
meninas reclamam por não poderem participar e os meninos justificam a não participação das meninas, por ter em mente a
concepção de que elas não possuem porte físico para a prática, que são fracas, que cansam rápidas, e elas não terem a
capacidade para participarem. Outra explicação que limita a presença das mulheres considera o corpo como um recurso
passivo, possuindo um horizonte orientado unicamente pela cultura (Santana da Silva, 2019).
Combater o olhar preconceituoso e excludente, e oportunizar a todos alunos, independente de raça, gênero ou
condição física, o acesso à diversidade cultural e educacional é dever do professor. Recordamo-nos sempre de que o ser
humano é construtor de ideias e culturas, e a nossa cultura corporal é um resultado das vivências dessas diferentes culturas
(Lima et al., 2017).
Nesta perspectiva, os docentes de EFE, estão incumbidos de propagar a igualdade de direitos e deveres na sua atuação
profissional utilizando de instrumentos pedagógicos pertinentes à realidade sociocultural e às necessidades regionais, no ensino

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de temas relevantes e diversificados que visam a construção de um ser humano autônomo, crítico e atuante na sociedade.
Assim, a nova semântica das aulas de EFE, deve possibilitar a análise de práticas obsoletas que tornavam a aula excludente, e
promover a quebra de paradigmas, excepcionalmente, quanto ao preconceito de gênero no ambiente educacional.

2. Metodologia
Esta investigação caracteriza-se por um Estudo de Caso (EC), por se tratar de um fenômeno que envolve processos
sociais no contexto educacional. Pereira (2018, p. 70) afirma que EC é propício a quaisquer níveis e modalidades de ensino e
pode abranger professor, aluno e turmas, com algum fenômeno em foco. Neste caso, o estudo será realizado com cinco turmas
do ensino médio. O método qualitativo foi adotado para o estudo por favorecer a interpretação do fenômeno e possibilitar uma
descrição e análise mais aprofundadas dos dados obtidos (Pereira, 2018, p. 66). O estudo tem caráter descritivo, pois revela
detalhes dos fenômenos ocorridos nos dados coletados a partir da aplicação de inquérito por questionário, apontado por Gil
(2008) como uma técnica padronizada de coleta de dados. Pereira (2018, p. 67) sugere a utilização do questionário pela
viabilidade de agregar muitos participantes e por assegurar o anonimato das respostas, e afirma que a formulação de questões
abertas permite aos envolvidos expressarem seus pensamentos acerca do assunto enriquecendo a investigação.
Esta pesquisa foi realizada no Centro Educacional Dom Ungarelli, município de Pinheiro-MA, com alunos do 3ºano
do ensino médio. A amostra foi por conveniência e contou com a participação voluntária de 150 estudantes, conforme mostra o
fluxograma (Figura 1):

Figura 1 – Fluxograma amostral.

Fonte: Autores.

Os responsáveis pelos participantes, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) autorizando-
os assim, a ingressar no estudo. No entanto, os alunos seriam excluídos do estudo caso a frequência nas aulas fosse inferior a 8
aulas, sendo que uma aula correspondeu a 50 minutos de teoria seguidos de mais 50 minutos de prática; ou caso o questionário
não fosse respondido, antes ou após as intervenções. O estudo foi iniciado após autorização do Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade Federal do Maranhão/UFMA, Campus Pinheiro, com o Parecer nº 3.212.643.
A respeito do perfil dos participantes, verificamos a idade,100 deles (66,7%) tinham 16 anos enquanto 50 (33,3%)
tinha 17 anos ou mais. Quanto à classificação por sexo, observou-se diferença mínima no quantitativo entre a participação

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masculina e feminina, contento respectivamente 83 (53%) meninos e 67 (47%) meninas.


Os alunos voluntários expuseram suas concepções acerca do preconceito de gênero quanto a participação das
“meninas” durante as aulas de Lutas na EFE. Todos responderam a mesma pergunta, antes e após, participarem do bloco de 12
aulas, envolvendo 6 modalidades diferentes de Lutas, sendo uma teórica e outra prática, subsequente. Ambas com duração de
50 minutos cada, no período de 5 semanas. Foi questionado se a participação das meninas nas aulas de Lutas era um fator
positivo ou negativo, e o porquê da resposta.
Para realizar as intervenções pedagógicas foram elaborados os planos de aula teórica contendo informações históricas,
filosóficas e técnicas, além de vídeos e ilustrações sobre as seguintes modalidades: Huka-huka, Sumô, Judô, Jiu-Jitsu, Greco-
Romana (Lutas de Agarre); Capoeira, Karatê, Taekwondo, Muay-Thai, Boxe (Lutas de Percussão/Toque); e Esgrima com
Sabre, Florete e Espada (Lutas com Implemento), conforme classificação de Casado (1999). Nas aulas práticas, foram
aplicados os Jogos de Combate, propostos por Santos (2012), como método didático de ensino, que contemplam jogos com
objetivos e regras pré-estabelecidas, e envolvem movimentos característicos das AM&EC e predominância da ludicidade.
Os dados obtidos foram planificados no Software Excel 2000 e analisados, estatisticamente, com o Software
Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 24.0. Realizou-se a Análise de Conteúdo (AC), proposta por Bardin
(2011), baseada na pré-análise, exploração do material e a interpretação dos dados.
Foi utilizado o teste do Qui-quadrado para identificar diferenças significativas entre os momentos pré e pós-
intervenção pedagógica. Foram avaliadas, quantitativamente, a associação existente entre as variáveis qualitativas, as
frequências observadas e as frequências esperadas, sendo que, em todas as avaliações, foi considerado o Índice de Confiança
(IC) = 95%, (p=0. 05).

3. Resultados e Discussão
Após realizadas as intervenções pedagógicas obtivemos resultados bastante expressivos acerca da interface entre o
preconceito de gênero em referência a participação feminina nas aulas na EFE. Identificamos, no primeiro momento, a
mudança na compreensão dos estudantes sobre a participação das meninas nas aulas de Lutas, como fator positivo ou negativo,
conforme nos mostra o Gráfico 1:

Gráfico 1 – Percepção dos escolares sobre a participação das alunas nas aulas de lutas.

Fonte: Autores.

Evidenciamos, no momento anterior a intervenção pedagógica, que 120 (80%) estudantes de ambos os sexos,
apontavam como fator negativo, a participação das meninas nas aulas de Lutas; enquanto apenas 30 (20%) alunos entendiam
ser um ponto positivo a presença delas durante as aulas de Lutas na escola. Este olhar demasiadamente negativo e
preconceituoso pode contribuir sobremaneira na inibição e no afastamento das alunas quando se trata deste conteúdo da
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Educação Física.
No estudo de Lima (2017) foi detectada grande resistência em relação a participação feminina nas aulas de Educação
Física no ensino médio, envolvendo 29 discentes, sendo 15 meninas e 14 meninos, numa escola estadual, em Piritiba-BA. Ele
revelou que 89,64% dos discentes avaliaram como negativa a presença ativa das meninas na quadra, enquanto apenas 10,34
avaliaram-na como positiva. Contudo, o conteúdo ministrado foi Futebol e o número de participantes foi consideravelmente
inferior comparado ao presente estudo. No presente estudo, o número de participantes foi cinco vezes superior e a temática
desenvolvida foi um conteúdo atual, inusitado e atraente.
Devemos salientar, no entanto, a transformação ocorrida no pensamento dos estudantes que passaram a compreender a
presença das meninas nas aulas de Lutas como um fator extremamente positivo para todos os envolvidos. Este fato ficou
comprovado ao verificarmos que todos os 150 alunos acolheram a presença feminina nas aulas de Lutas no ambiente
educacional. Assim, destacamos a visão de So et al. (2018) que pregam a construção do conhecimento sobre Lutas,
desarticulando-as de questões sexistas e visando o rompimento de estereótipos de gênero; e ainda sugerem ações com permutas
constantes de duplas e participação simultânea dos envolvidos nas atividades com o propósito de diminuir a sensação de
vigilância e julgamento dos demais, promovendo maior exploração dos jogos de oposição direta entre os oponentes.
Nesta acepção, este estudo corrobora integralmente, tanto no aspecto conceitual quanto na práxis, apresentada pelos
autores supracitados, visto que, o mesmo infringe o preconceito de gênero ao proporcionar aos estudantes momentos de
aprendizado significativo, com alto teor cultural e intercâmbio social. A execução do plano de aula elaborado a partir de uma
proposta curricular, previamente estruturada, e posteriormente, contemplada nos livros didáticos se concretiza no denominado
“Currículo em Ação”, determinado por Sacristán (1998).
O segundo resultado obtido no estudo, enaltece de forma singular o potencial anti-sexista das Lutas em relação a
atuação das meninas durante as aulas de Educação Física. A impressionante transformação no pensamento sexista e
comportamento hostil dos estudantes nos remete à Sacristán (1998) que destaca o papel da educação como elemento de
transformação do aprendiz, ou seja, o aluno processa as informações, adquire e assimila conhecimentos, os internaliza, e então,
passa a analisar e compreender os fatos, discernindo-os, para posteriormente, elaborar suas próprias concepções e adotar nova
postura diante da realidade que o cerca.
No Gráfico 2, enfatiza esta transformação do entendimento dos estudantes após vivenciarem as aulas teóricas e
práticas sobre as AM&EC na EFE.

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Gráfico 2 - Percepção dos estudantes quanto a participação feminina nas atividades de lutas na EFE, antes e após as práticas
pedagógicas.

Fonte: Autores.

O “risco de machucar” foi apontado por 80% estudantes (n=120), como o principal fator negativo relacionado a
participação das meninas nas atividades de Lutas. Nota-se que há um explícito julgamento por parte dos estudantes nesta
afirmativa, pois eles associam a resposta a uma suposta fragilidade e sensibilidade excessivas quanto a integridade física delas,
conforme constatamos em alguns dos testemunhos recolhidos dos alunos: “[...] não é bom elas participar, elas podem se
machucar” (A32); “[...] Isso não pode acontecer, elas são muito sensíveis” (A09).
Neste quesito encontramos fragmentos culturais e tradicionais que desfavorecem a inclusão das meninas nas aulas
com o tema Lutas, revelando um alto grau de intolerância dos integrantes do estudo. Furlan e Santos (2008) afirmam que,
desde o período de introdução dos esportes na EFE no Brasil, os meninos são reconhecidos pela força, hegemonia e poder,
enquanto as meninas são enxergadas como vulneráveis, submissas e dóceis, ou seja, fisicamente inferiores quando comparada
a eles.
Os resultados encontrados na presente investigação corroboram com aqueles obtidos na pesquisa de So et al.(2018),
os quais pretendiam analisar a mobilização das meninas do 7º ano do ensino fundamental, com o conteúdo Lutas, numa escola
municipal, na periferia de Bauru (SP), os resultados apontaram que o medo de se machucar como um fator limitante da
participação feminina, além de revelar uma prática pedagógica docente que reforça a distinção entre meninos e meninas, e
utiliza conceitos e tradições que valorizam o corpo padronizado, fortalecendo atitudes preconceituosas.
O “medo de se machucar” foi confirmado no estudo de Lima (2017) com entrevistas a adolescentes cuja maioria
afirmou não gostar das aulas de Lutas, devido à inferioridade da competência atlética delas quando comparada aos
adolescentes do sexo masculino.
Na pesquisa etnográfica de Uchoga e Altmann (2016), que objetivou entender como se dão as relações de gênero nos
diferentes blocos de conteúdo de EFE, realizado em duas escolas estaduais, do município de Campinas (SP), constatou-se que,
professores de Educação Física, diretores da escola e pais, reforçam preconceitos de gênero clássicos, quando justificam a
ausência das meninas nas aulas, com o discurso do “medo de se machucar”, embora não utilizem este argumento para os
meninos.
A grande maioria dos professores de EFE se prendem nessa prerrogativa para justificar a ausência das AM&EC em
suas aulas; sendo que, neste cenário deveria prevalecer o compromisso do professor no trato pedagógico do eixo temático
AM&EC no exercício profissional, explorando potencial educativo deste conteúdo em prol da formação integral do aluno
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(Miranda & Dos Reis, 2020).


No que se refere às capacidades e habilidades exigidas durante a execução das ações peculiares às Lutas, observadas
na segunda resposta no gráfico, verificamos mudanças significativas. Os estudantes subestimaram o acervo motor e o potencial
cognitivo das meninas sem se quer, conhecerem ou terem vivenciado alguma das atividades propostas no estudo. Apenas 19
(12,6%) alunos acreditavam que as meninas eram capazes e habilidosas o suficiente para participaram das tarefas propostas,
conforme esclarecem as respostas: “[...] elas não vão conseguir fazer, elas são fracas e só atrapalham” (A10); “[...] elas não
sabem jogar nada, ainda mais lutar, aí que não sabem mesmo” [...](A144); “[...] eu só joguei queimado e nunca lutei, acho que
não dou conta.” (A83); “As mulheres tem um temperamento muito forte, e já pensou uma mulher brava e que saiba lutar. Sou
contra.” (A70).
A seletividade é uma das maiores mazelas introduzidas nas aulas de EFE (Rizzo, 2017). Lima (2017) assegura que,
quando se trata de Lutas na EFE, as meninas são abolidas da prática não apenas pelo fato de serem mulheres, mas pelo nível de
habilidade e a fragilidade delas serem equiparadas as do gênero masculino. Para Furlan e Santos (2008) os meninos, durante a
prática esportiva, se reconhecem como superiores as meninas, presumidamente pelas chances que lhes são concedidas, e a elas,
limitadas.
Entretanto, após conhecerem, na teoria, ações específicas de algumas modalidades de AM&EC e executarem as
tarefas lúdicas e bem simples com confronto direto entre dois oponentes, os estudantes perceberam que a “proposta de lutar”
era divertida, interessante e não exigia um domínio de técnicas específicas de alguma AM&EC; mas requeriam sim, alta
demanda de concentração, percepção e tomada de decisões simultâneas e constantes dos envolvidos no embate.
De forma formidável, os estudantes transpuseram esta barreira do prejulgamento e se entregaram, cada vez mais, às
Lutas, na medida em que se avançava a programação. Foi registrado, ao final do estudo, que praticamente o dobro de
estudantes (21,39%) passaram a compreender que a capacidade e habilidade das meninas de participar das aulas de Lutas são
compatíveis com as dos meninos, e não estão vinculadas ao gênero. Inclusive, vários meninos apresentaram limitações na
motricidade e lentidão nas tomadas de decisões durante os confrontos, por não terem vivenciados experiências semelhantes,
nas aulas de EFE.
Inúmeras habilidades podem ser adquiridas por meio da prática e aperfeiçoadas à medida em que aluno pratica e
entende o porquê dessa prática. Assim, os docentes são os protagonistas em oferecer oportunidades de práticas diferenciadas a
todos os alunos. Neste aspecto, Souza Souza Júnior e Darido (2002), consideram fundamental o desempenho do professor de
EFE em fomentar a formação cidadã, proporcionando as mesmas oportunidades de aprendizado e vivências motoras a todos os
alunos, independente do gênero.
Outrossim, destacamos as opiniões de alguns integrantes do estudo acerca desta questão: [...] “É muito importante que
o sexo feminino mostre que não é um sexo frágil, e tem tanta capacidade quanto os meninos, de ter um bom desenvolvimento”
(A40); [...] “elas pareciam fracas, que não tinham força, mas lutei com uma e foi difícil demais, mas ganhei” [...] (A68); [...]
“teve um menino que quase perdeu pra elas, mas o tempo acabou”[...] (A122); [...] “elas tem que participar sim, muitas delas
são mais habilidosas que eu” (A09).
O resultado mais substancial e de maior significância estatística está vinculado aos “direitos iguais” de participação
entre pessoas de diferentes gêneros. A discrepância entre os resultados encontrados foi gigantesca. Se antes das intervenções,
7,4% dos alunos (n=10) afirmavam que todos tinham o mesmo direito de participar das aulas de Lutas; ao término da
programação, constatou-se um aumento exorbitante, seis vezes maior, com 42% dos estudantes (n=60) se manifestando em
favor da condição de igualdade de direitos de participação naquele contexto educacional.
Sublinhamos aqui, alguns trechos escritos pelos estudantes no pós-intervenção, revelando seus pensamentos sobre a
questão de igualdade de direitos: “[...] porque as meninas têm os mesmos direitos que os meninos.” (A55); “[...] mostrou que

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nas lutas todos somos iguais, independente do gênero, todos somos iguais.” (A70). “[...] todos tem que participar, a aula é para
nós e para as meninas também” (A92); “[...] Todos somos iguais, hoje em dia as mulheres também têm o conhecimento sobre
as lutas” (A141).
Os apontamentos supracitados vão ao encontro com o pensamento de Silva et al. (2020) ao ratificar as Lutas enquanto
componente curricular fundamental no processo de eliminação de estereótipos e de promoção da igualdade de direitos nas
aulas de EFE. Santos et al. (2019) declaram a participação das meninas nas aulas de Lutas, como fator confrontante à ideia de
preconceito de gênero e contribui para a emancipação feminina na construção e ampliação do seu espaço na sociedade,
diminuindo a desigualdade de gênero e garantindo o direito de oportunidades a todos (Santos et al., 2019).
Para Reis e Eggert (2017), a Educação é um direito de todos sem subdivisões por orientação sexual ou identidade de
gênero, e reforça o papel dos Estados no papel de oferecer acesso igualitário à Educação e tratamento igual, desenvolvendo
assim, o respeito aos direitos humanos, proteção adequada contra exclusão, violência e discriminação. Todos têm o direito de
viver experiências motrizes, “se movimento logo existo” (Lima et al., 2017, p.441).
Corroborando com esta acepção, Coledam et al. (2014) destacam a relevância da educação conjunta, entre meninos e
meninas, com direito e igualdade de oportunidades entre os gêneros, independente do conteúdo e atividade proposta. No
presente estudo identificamos que as AM&EC favorecem o contato entre os estudantes, dentro de um contexto de regras
acordadas entre os participantes e o professor, e possibilita ainda, não só a participação feminina, mas a interação dos gêneros
de maneira respeitosa e consciente, mesmo no confronto direto entre eles: menina versus menino.
Do resultado crucial da investigação emanou uma nova consciência consolidada pelos estudantes com referência às
Lutas no campo educacional. A concepção formada por eles após as intervenções pedagógicas elucida e robustece as AM&EC
como um elemento indispensável na educação, pois 55 (36,61%) estudantes passaram a compreender e valorizar a essência das
Lutas, por meio dos princípios filosóficos e os valores pessoais agregados à prática de diversificadas modalidades, como uma
ferramenta que contribui substancialmente no combate ao preconceito de gênero, ao afirmarem que as Lutas, literalmente,
“rompem preconceitos”.
Destacamos esta emancipação intelectual ao revelarmos os dizeres alguns discentes: “[...] Chega dessa história que
lutar é coisa de menino e não de menina, chega desse pensamento machista” (A22); “[...] pois mostra que não há espaços para
machismo na educação física e que alguns paradigmas estão sendo quebrados” (A62); “[...] elas são mais interessadas que os
meninos (A88)”; “[...] Fomos incluídas” (A05); “[...] foi bom para eles verem que tem meninas que conseguem lutar”
Romper preconceitos é sinônimo de inclusão. Incluir significa a reestruturação das culturas, políticas, e
principalmente, da prática escolar e docente, muitas vezes elitista e excludente. A luta contra ações sexistas nas aulas de EFE
se concretiza a partir de uma perseverança de ações de inclusão percebidas e internalizadas pelos estudantes no ambiente
escolar e na contextualização de cada temática desenvolvida na aula, propriamente dita (Carvalho, 2019; Silva et al., 2020).
A inclusão social através do desporto remete para o desenvolvimento de competências pessoais, sociais, motoras ou
outras, em que as boas práticas se dirigem à promoção do desporto formativo e privilegia os princípios éticos do desporto e
valores associados junto de crianças e jovens em meio escolar (Marivoet, 2014).
Certificamos, neste estudo, uma expansão e um fortalecimento das relações sociais entre os alunos, principalmente, os
de gêneros distintos. O método adotado durante as aulas de Lutas favoreceu o intercâmbio entre os participantes, pois havia a
necessidade de alternar os componentes a cada confronto, e não era permitido manter a disputa com o mesmo adversário;
impelindo-os a se inter-relacionar, fomentando a construção das redes de sociabilidade.
O estudo de Marivoet (2010) corrobora com os achados da atual investigação, pois ressalta o papel do esporte como
instrumento que vem agregar inúmeras formas de culturas e com grande potencial de aproximação das pessoas. Esta
aproximação leva o indivíduo a socialização, ou seja, a inclusão, e a pessoa constrói uma base de respeito, interação, igualdade,

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aprendizagem.
Tais princípios/valores apreendidos no ambiente de ensino eram replicados em outros espaços sociais, pois, a
estruturação destes valores decorre das relações que se estabelecem ao nível dos valores presentes nos diferentes espaços
sociais, em especial, a “família, os amigos e o clube” desportivo, tendo presente as sociabilidades aí dinamizadas” (Marivoet,
1997, p. 106).
Os estudantes, apesar de se encontrem no mesmo ambiente durante um período considerado suficiente para se
socializarem e estabelecerem maior aproximação, tal fato não ocorre, pois são formados vários subgrupos na turma. Em
contrapartida, as ações executadas nas aulas de Lutas proporcionaram aos alunos momentos peculiares de inter-relação pessoal,
até então, nunca vivenciados.
Nesta perspectiva, Brás (2010) ressalta que o corpo é o instrumento principal dessa cultura de combate durante as
aulas de Educação Física e serve como produto social neste contexto de socialização, e afirma que “o corpo enquanto produto
social tem necessariamente que ser situado no tempo e no espaço, pois estes condicionam a percepção que se tem acerca dele.
É na sociedade que nós buscamos as nossas ideias, é a partir daí que nós criamos o nosso organismo mental” (Brás, 2010, p.3).
Bourdieu (1980) identificou as redes de relações sociais entre indivíduos do mesmo grupo, bem como, a quantidade e
a qualidade de desses relacionamentos e verificou que, as relações estabelecidas entre os indivíduos pertencentes a um
determinado grupo não advêm apenas da partilha das relações objetivas ou do mesmo espaço socioeconómico, mas também
das trocas materiais e simbólicas, cuja instauração e perpetuação pressupõe o reconhecimento dessa proximidade.
Diante deste fato, nos remetemos à Sacristán (1998), por acreditar que todo aprendizado adquirido na escola tem a
função imprescindível de perpetuar no âmbito social, o qual abrande a família e a sociedade, concretizando, dessa forma, a
aprendizagem significativa, caracterizada pelo autor como a aprendizagem que agrega valores e envolve sentimentos que serão
repassados em diferentes contextos educacionais formais e informais.

4. Conclusão
Com base neste estudo de caso, é possível concluir que existe a latência do preconceito direcionado a
mulheres/discentes, arraigado por questões históricas, culturais, sociais e legislativas que marcaram épocas. Considerando os
resultados apresentados, conclui-se que o conteúdo Lutas pode ser uma importante ferramenta educacional no combate aos
estereótipos e preconceitos, reafirmando a necessidade de defender uma educação voltada ao respeito às diferenças,
nomeadamente na EFE, e consequentemente “lutar” para/pela promoção da dignidade da pessoa humana. Os resultados mais
expressivos deste estudo evidenciam que, no período anterior a intervenção os discentes tinham a percepção negativa quanto a
participação das meninas nas aulas de Lutas, bem como grande maioria associava este conteúdo ao risco das meninas se
machucar. Entretanto, após a intervenção os discentes passaram a veiculá-lo, a uma prática onde ambos os gêneros têm diretos
iguais, além de associarem a um instrumento capaz de romper preconceitos e estereótipos, como pode ser observado nos
argumentos dos discentes.
Entendemos que houve algumas limitações na pesquisa como a ausência da descrição rigorosa das aulas ministradas e
a composição amostral abraçar somente os alunos no último ano do ensino médio.
Entretanto, sugerimos que novas investigações sobre a unidade temática Lutas, no âmbito educacional, precisam se
concretizar, tendo em vista o ensino básico no geral, com o propósito de quebrar paradigmas acerca das Lutas e com intuito de
propagar seu potencial educativo.

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Revista Pensar a Prática | ISSN: 1980-6183 DOI 10.5216/rpp.v24.67744

Inserção das lutas na educação física


escolar da cidade de Muriaé-Mg1

Insertion of fights in school physical education in the


city of Muriaé-Mg

Inserción de las luchas en la educación física escolar de la


ciudad de Muriaé-Mg

Nicoly Rocha Ferreira


Centro Universitário Faminas, Muriaé, Minas Gerais, Brasil
E-mail: nicoly.999@hotmail.com

Júlia Loth Costa


Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil
E-mail: julia.lothc@gmail.com

Tassiana Aparecida Hudson


Centro Universitário Faminas, Muriaé, Minas Gerais, Brasil
E-mail: tassianahudson@hotmail.com

Juliana Fernandes Filgueiras Meireles


Kennesaw State University, Kennesaw, Georgia, EUA.
E-mail: eujuly90@hotmail.com

Resumo: O objetivo deste trabalho foi verificar se os professores de


Educação Física escolar utilizam o conteúdo Lutas em suas aulas na
cidade de Muriaé - MG. Participaram da pesquisa sete professores de
educação física de escolas públicas e privadas. Foi aplicada uma entrevista
semiestruturada e os dados foram analisados através da Análise de
Conteúdo. Observou-se que apenas dois professores desenvolvem o
conteúdo lutas em suas aulas. Falta de preparo e conhecimento foram
apontados como os principais motivos para a não abordagem desse

1 O presente trabalho não contou com apoio financeiro de nenhuma natureza para sua realização.

Revista Pensar a Prática. 2021, v.24:e67744


Revista Pensar a Prática | ISSN: 1980-6183 DOI 10.5216/rpp.v24.67744

conteúdo nas aulas. Concluiu-se que as lutas ainda são pouco utilizadas
nas aulas de Educação Física escolar e que a formação de professores é
um ponto chave para a solução dessa defasagem.
Palavras-chave: Educação Física Escolar. Lutas Corporais. Pesquisa
Qualitativa.

Abstract: The objective was to verify if teachers of Physical Education


at school use the content Fight in their classes in the city of Muriaé -
MG. Seven physical education teachers from public and private schools
participated in the research. A semi-structured interview was applied
and the data were analyzed through Content Analysis. It was observed
that only two teachers develop the content fights in their classes. Lack of
preparation and knowledge were pointed out as the main reasons for not
addressing this content in class. It was concluded that the struggles are
still little used in school Physical Education classes, and that the training
of teachers is a key point for the solution of this gap.
Keywords: School Physical Education. Body Fights. Qualitative Study.

Resumen: El objetivo fue verificar si los profesores de Educación Física


en la escuela utilizan el contenido Lucha en sus clases en la ciudad
de Muriaé - MG. En la investigación participaron siete profesores de
educación física de escuelas públicas y privadas. Se aplicó una entrevista
semiestructurada y los datos se analizaron mediante Análisis de
Contenido. Se observó que solo dos docentes desarrollan las luchas de
contenido en sus clases. La falta de preparación y conocimiento fueron
señalados como los principales motivos para no abordar este contenido
en clase. Se concluyó que las luchas aún son poco utilizadas en las clases
de Educación Física escolar, y que la formación de los docentes es un
punto clave para la solución de esta brecha.
Palabras Clave: Educación Física Escolar. Peleas Corporales. Investigación
Cualitativa.

Submetido em: 15-02-2021

Aceito em: 16-09-2021

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Inserção das lutas na educação física escolar da cidade de Muriaé-Mg
Nicoly Rocha Ferreira • Júlia Loth Costa • Tassiana Aparecida Hudson • Juliana Fernandes Filgueiras
Meireles

Introdução

A Educação Física escolar objetiva ensinar a cultura corporal


historicamente construída, a partir de conteúdos norteadores:
as Brincadeiras e os Jogos, os Esportes, as Ginásticas, as Danças,
as Lutas e as Práticas corporais de aventura (BRASIL, 2017). Para
Rufino e Darido (2015), cabe ao professor possibilitar a vivência
desses conteúdos para que seja possível uma reflexão crítica sobre
as diferentes práticas ao seu redor. A Educação Física escolar vai
além do ensino do gesto motor correto que, por sua vez, também
não pode ser desconsiderado (BATISTA; MOURA, 2019). Assim, o
professor deve problematizar, interpretar, relacionar e analisar
com seus alunos as amplas manifestações da cultura corporal, de
tal forma que estes compreendam os sentidos e os significados
das práticas corporais.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) são documentos norteadores que indi-
cam uma sistematização de conteúdos a serem desenvolvidos na
Educação Física escolar (BRASIL, 1998; 2017). As lutas estão pre-
sentes nesses documentos, os quais orientam sobre como esse
conteúdo deve ser trabalhado em todos os níveis da educação bá-
sica (RUFINO; DARIDO, 2011).
Os PCNs são um referencial para o Ensino Fundamental e
Médio em todo o país, não sendo obrigatório, mas auxilia o traba-
lho do professor norteando as atividades que serão realizadas em
aula. Seu objetivo é garantir aos alunos o direito de desfrutar dos
conhecimentos necessários para o exercício da cidadania (BRASIL,
1998). Nos PCNs, as lutas são definidas como disputas em que os
oponentes devem ser subjugados a partir de movimentos especí-
ficos das lutas, como, por exemplo, o desequilíbrio e a combinação
de ações de ataque e defesa. Ademais, caracterizam-se por uma
regulamentação específica a fim de punir atitudes de violência e
deslealdade (BRASIL, 1998).

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A BNCC é o documento norteador mais recente e tem como


objetivo principal garantir a educação com igualdade por meio das
competências fundamentais para a formação do cidadão ao longo
da educação básica (BRASIL, 2017). Este documento visa orientar
a formulação dos currículos das escolas delimitando os conteúdos
que devem ser ensinados em todo o país. No componente curri-
cular de Educação Física, as práticas corporais são divididas em
seis unidades temáticas: as Brincadeiras e os Jogos, os Esportes, as
Ginásticas, as Danças, as Lutas e as Práticas corporais de aventura
(BRASIL, 2017).
Na proposta da BNCC, as lutas são abordadas como categoria
da unidade temática “Esporte”, descritas como “esportes de com-
bate” e apresentadas também de forma específica como uma das
unidades temáticas denominada “Lutas”, presente nos anos finais
do Ensino Fundamental II. É nessa fase de escolarização que os
alunos têm maior capacidade de abstração e de acessar diferen-
tes fontes de informação, e essas características permitem aos
estudantes maior aprofundamento nos estudos das práticas cor-
porais na escola. As lutas são descritas como práticas corporais
em que os participantes empregam técnicas específicas com dife-
rentes objetivos direcionados ao oponente, incluindo lutas do con-
texto comunitário e regionais, lutas brasileiras e de outros países
(BRASIL, 2017).
Segundo Moura et al. (2019), o conteúdo lutas deve estar pre-
sente nas propostas pedagógicas da Educação Física escolar desde
a educação infantil até o ensino médio, dado que é uma manifesta-
ção da cultura corporal que não pode ser excluída desse contexto.
Embora façam parte do eixo curricular, as lutas ainda são pouco
ensinadas no ambiente escolar (MOURA et al., 2019). Alguns argu-
mentos são frequentemente utilizados para justificar a ausência
do ensino deste conteúdo nas escolas, como incitação a aspectos
de violência, a falta de materiais específicos e a ausência de espa-
ços adequados (BARROS; GABRIEL, 2011; RUFINO; DARIDO, 2015).
É raro algum professor de Educação Física que, além dos esportes
coletivos de quadra (handebol, vôlei, futsal e basquete), trabalhe

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algum conteúdo referente às lutas, o que, de acordo com Moura


et al. (2019), é justificado devido à ausência de conhecimento dos
professores na área. Todavia, o ensino das lutas na escola não exi-
ge do professor conhecimentos de um treinador ou lutador, uma
vez que não se trata de formação de atletas. Há a necessidade de
que o professor seja um profissional capaz de proporcionar aos
seus alunos conhecimentos acerca das lutas enquanto manifesta-
ções da cultura corporal de movimento (RUFINO; DARIDO, 2015).
Os jogos de lutas, por exemplo, são práticas criadas com o ob-
jetivo de reproduzir golpes e atos das lutas que podem ser traba-
lhados nas escolas. Eles auxiliam o desenvolvimento integral do
aluno ao propiciar uma comunicação através do contato corporal
e dos gestos das lutas (GOMES, 2013; RUFINO; DARIDO, 2015). A
ludicidade inerente aos jogos também se faz presente nesse de-
senvolvimento do aluno, visto que, no universo da criança, a brin-
cadeira proporciona um processo de ensino simplificado tornando
possível a aprendizagem (OLIVEIRA et al., 2017). Algumas propos-
tas também incluem a conceituação de algumas modalidades de
lutas, a história de determinadas práticas, diferença entre lutar e
brigar, curiosidades sobre as lutas, entre outras (RUFINO; DARIDO,
2015). De acordo com Pereira et al. (2020), o jogo pode ser consi-
derado uma ótima estratégia para o ensino das lutas na escola,
contribuindo para a quebra de paradigmas sobre o conteúdo.
Somado ao fato que o ensino das lutas no ambiente escolar,
em sua maioria, não tem sido abordado de forma satisfatória,
existe também uma defasagem de estudos proponentes a res-
peito dessa temática (LOPEZ; GOLIN; RIBEIRO, 2019). Por isso, o
presente estudo tem como objetivo verificar se os professores de
Educação Física escolar trabalham o conteúdo lutas em suas au-
las, bem como analisar como este conteúdo tem sido desenvol-
vido por eles, por meio do relato desses professores sobre suas
dificuldades, possibilidades e métodos de ensino.

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Métodos

Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, explorató-


ria e transversal (THOMAS; NELSON; SILVERMAN, 2012). O projeto
foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos
do Centro Universitário UNIFAMINAS (parecer número: 3.433.073).
Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido (TCLE), consentindo com a participação voluntária.
A amostra do presente estudo foi composta por professores
de Educação Física de escolas públicas e particulares de Muriaé -
MG. As escolas foram contatadas a fim de solicitar a autorização
para a realização das entrevistas. Após autorizada, a pesquisadora
responsável estabeleceu contato por telefone com os professores
de Educação Física para explicar os objetivos e procedimentos da
pesquisa, bem como convidá-los para participar. Todos os partici-
pantes foram informados que a entrevista seria gravada em áudio
e que seria iniciada após a autorização a partir da assinatura do
TCLE. Após a concordância, o dia e horário para as entrevistas fo-
ram estabelecidos, vale ressaltar que todas foram realizadas sem-
pre pela mesma pesquisadora e não foi delimitado tempo limite
para o término da mesma. A gravação foi realizada com o grava-
dor do aparelho Motorola Moto G6 Play.
Ao todo, foram entrevistados 7 professores de Educação Física
de 3 escolas públicas e 2 escolas particulares. A princípio buscou-
-se selecionar professores de instituições privadas e públicas para
que fosse possível coletar informações de instituições com reali-
dades diferentes, cabe destacar que essas instituições de ensino
foram selecionadas por conveniência. O tamanho amostral foi
considerado a partir do princípio da saturação, no qual a frequên-
cia de respostas semelhantes entre os entrevistados se torna um
critério para interromper o recrutamento de novos (FONTANELLA;
RICAS; TURATO, 2008). Foram incluídos professores de Educação
Física em qualquer nível de ensino da Educação Básica e àqueles

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que não foi possível realizar a entrevista, seja por desistência ou


incompatibilidade de horários, foram excluídos.
A coleta de dados foi realizada por meio de uma entrevista
semiestruturada, a qual teve como objetivo investigar, sob o ponto
de vista dos professores, como a modalidade lutas se insere no
contexto escolar na cidade de Muriaé - MG. Esse roteiro continha
perguntas destinadas à caracterização da amostra, tais como: ida-
de, tempo de formado e de atuação e nível de ensino em que atua.
Ademais, foram incluídas perguntas direcionadas aos conteúdos
abordados nas aulas, metodologias utilizadas, compreensão acer-
ca do conteúdo lutas, possibilidades pedagógicas e dificuldades
para sua inserção. O roteiro foi submetido à avaliação de cinco
professores especialistas em pesquisa qualitativa que deram a sua
aprovação para a versão final.
Para a análise dos dados, a transcrição foi feita na íntegra e
utilizou-se a técnica de Análise de Conteúdo proposta por Bardin
(2011). Em seguida, o material foi explorado e seguindo as dife-
rentes fases da análise de conteúdo: 1) pré-análise - refere-se a
operacionalizar e sistematizar as ideias iniciais; 2) exploração do
material - consiste na decomposição, codificação ou enumeração
dos dados em função de regras previamente formuladas; 3) trata-
mento dos resultados e interpretação - caracteriza-se pela realiza-
ção de inferências. A partir da leitura, as falas foram agrupadas em
categorias, configurando a análise de conteúdo categórica.

Resultados e Discussão

Ao todo, foram entrevistados 7 professores de Educação


Física, sendo 2 mulheres e 5 homens, cuja idade variou de 25 a 56
anos e o tempo de trabalho no contexto escolar entre 1 e 30 anos.
As características descritivas de cada professor entrevistado estão
expostas no Quadro 1.

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Quadro 1- Caracterização da amostra


Indivíduo Idade Tempo de Tempo de Anos escolares de atua- Escola de
formado atuação como ção atuação
professor
P1 54 anos 29 anos 26 anos E.F. anos iniciais Pública
P2 26 anos 5 anos 3 anos E.F. anos finais Pública
P3 42 anos 15 anos 15 anos E.F. anos finais e E.M. Pública
P4 56 anos 31 anos 30 anos E.M. Pública
P5 26 anos 5 anos 2 anos E.F. anos iniciais Particular
P6 25 anos 4 anos 2 anos E.F. anos finais Pública
P7 25 anos 3 anos 1 ano E.F. anos iniciais e E.M. Particular

Fonte: os autores (2021).


Legenda: P- Professor; E.F. – Ensino Fundamental; E.M. - Ensino Médio.

A partir da análise das entrevistas, com o intuito de responder


aos objetivos do presente estudo, foram criadas três categorias
como exposto na Figura 1. Cada uma dessas categorias está retra-
tada e discutida separadamente em seguida.

Figura 1. Divisão das categorias identificadas a partir das falas dos professores

Fonte: os autores (2021).

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Possibilidades para a aplicação do conteúdo lutas nas


escolas

Nesta categoria, buscou-se trazer as possibilidades para apli-


cação do conteúdo lutas nas escolas de acordo com o relato dos
professores entrevistados. Através das entrevistas constatou-se
que os professores trabalham o conteúdo lutas nas suas aulas,
mesmo que de forma teórica, por vídeos, imagens ou levando
os alunos a lugares em que acontecem a prática das lutas, como
demonstrado nas falas a seguir: “[...] Possibilidades é apenas no
contexto teórico. Convido pessoas de fora para que mostre as lu-
tas aos alunos [...]” (P.1). “[...] Trazer vídeos das diversas lutas para
meus alunos [...]” (P.4). “[...] Conhecimento teórico e levar meus
alunos até uma academia de lutas para que vivenciem um pouco
[...]” (P.7).
As aulas teóricas são indispensáveis, pois fornecem aos alu-
nos a compreensão histórica e cultural dos conteúdos, mas cabe
ao professor proporcionar aos alunos a aprendizagem das di-
mensões da Educação Física, estabelecendo uma conexão entre
teoria e prática, conforme descrito por Rufino e Darido (2015), o
conteúdo lutas pode ser abordado dentro das três dimensões do
conhecimento: A Dimensão Conceitual dos conteúdos diz respeito
ao “saber”, ou seja, o aluno precisa conhecer as diversas modalida-
des existentes, suas regras e histórias. A Dimensão Procedimental
refere-se ao “saber fazer” que é caracterizada pela aprendizagem
dos movimentos característicos das lutas. A Dimensão Atitudinal
trata-se do “saber ser”, ou seja, aos valores e atitudes, abordando
questões como, por exemplo: o respeito ao próximo e aos limites
do próprio corpo, e reconhecer a diferença entre lutas e brigas
(RUFINO; DARIDO, 2015). Durante a prática docente, mesmo que
ocorra maior ênfase em um ou outro, as dimensões do conheci-
mento são indissociáveis. Assim, enquanto se aplica aula prática,
realizando exercícios específicos, o professor pode trabalhar todas
as dimensões ao explicar sobre os objetivos daqueles movimen-

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tos, a importância e benefícios para o corpo, bem como sua histo-


ricidade e importância para o indivíduo (RUFINO; DARIDO, 2015).
De acordo com Nascimento e Almeida (2007), em alguns casos,
as lutas são apresentadas nas escolas por terceiros como forma de
projeto ou aula extra oferecida ao aluno como disciplina optativa
e, em escolas particulares, apresentam um custo adicional. Neste
caso, as lutas são abordadas como se fosse um conteúdo alheio à
disciplina de Educação Física e do Projeto Político Pedagógico da
escola. Conforme relatado por um dos entrevistados, esta parece
ser uma prática recorrente: “[...] O colégio disponibiliza um pro-
fessor de lutas, onde é uma disciplina optativa com um valor a ser
pago a parte e que ocorre em contraturno [...]“ (P.5).
O conteúdo lutas é abordado nos PCNs (BRASIL, 1998) como
componente da cultura corporal que deve ser tratado nas aulas de
Educação Física escolar de maneira lúdica. Sendo assim, o profes-
sor de Educação Física escolar é o profissional mais indicado, visto
que as lutas ensinadas por professores especialistas em lutas, por
exemplo, podem priorizar os aspectos técnicos e à padronização
de movimentos em detrimento de uma aprendizagem integral do
conteúdo e uma reflexão crítica, afastando-se da essência da pro-
posta das lutas na Educação Física escolar. Nascimento e Almeida
(2007) apontam maneiras de como iniciar o conteúdo lutas em
sala de aula, que pode ser por meio de uma apresentação teórica
e diálogo com os alunos para que relatassem as experiências e
conhecimentos sobre o conteúdo, de maneira que as aulas pos-
sam abranger também o conhecimento prévio do aluno e o seu
contexto.
De acordo com Gomes et al. (2013) e Lopes e Kerr (2015), as
lutas podem ser introduzidas no contexto escolar a partir de jogos
que dispõem de elementos das lutas. Algumas formas de abor-
dagem do conteúdo lutas foram relatadas pelos professores: “[...]
Trabalho com as lutas de forma recreativa por exemplo, realizo
briga de galo, faço cabo de guerra, são exercícios de adaptação em
termos de combate, disputa [...]” (P.3).

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Um fator importante na inclusão das lutas nas escolas diz res-


peito ao desenvolvimento de valores como a autoconfiança e a
coragem (UENO; SOUZA, 2014). Dentre os professores entrevista-
dos, um deles, que além de ser praticante também ministra aulas
de caratê, relatou sobre valores, ações e hábitos desenvolvidos
através das lutas e a importância de incluir este conteúdo em seu
planejamento:

[...] é um conteúdo que não fica de fora do meu planejamento


de forma nenhuma e destaco dois fatores para isto, é uma mo-
dalidade que trabalha a concentração e o mais importante para
mim em termos de lutas que é a disciplina, isso, sem dúvidas,
ajudará os alunos nas demais matérias [...] (P.3).

Embora o conteúdo lutas seja componente obrigatório da


Educação Física escolar (BRASIL, 2017), dos 7 professores entre-
vistados apenas 2 abordam de forma completa em suas dimen-
sões conceituais, procedimentais e atitudinais. É preciso que todos
os conteúdos, assim como as lutas, sejam abordados e explora-
dos em todas as dimensões do conhecimento para garantir uma
aprendizagem completa.

Fatores restritivos para a aplicação do conteúdo lutas


nas escolas
Nesta seção, buscou-se destacar ao longo das falas dos pro-
fessores alguns fatores que dificultam o ensino das lutas nas es-
colas. Para Nunomura (1998), conteúdos como ginásticas, lutas,
danças, entre outras, são quase inexistentes no ambiente esco-
lar, muitas vezes essa ausência é justificada pela falta de materiais
específicos, como no estudo de Costa et al. (2019), por exemplo.
Rufino e Darido (2015) destacam que a ausência ou escassez de
equipamentos específicos para a prática dificulta a aplicação des-
ses conteúdos na Educação Física escolar, como pode ser verifica-

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do na fala de um dos professores:” [...] Os materiais para a prática são


escassos [...]” (P.2).

Outro fator que foi apontado pelos professores como empeci-


lho é a falta de conhecimento sobre o conteúdo. Segundo Moura
et al. (2019), em sua revisão de literatura, os obstáculos em abor-
dar as lutas nas escolas são provenientes, em partes, da formação
do professor de Educação Física, como apresentado em alguns re-
latos: “[...] falta de conhecimento específico da minha parte [...]”
(P.1). “[...] a falta de conhecimento da minha parte, tenho uma
compreensão vaga, apenas sei o que foi ensinado na faculdade
[...]” (P.5). “[...] minha falta de conhecimento sobre como trabalhar
este conteúdo nas aulas [...]” (P.7).
A insegurança ao tratar do conteúdo lutas é uma das causas que
dificulta sua inclusão nas aulas de Educação Física (NASCIMENTO;
ALMEIDA, 2007; RUFINO; DARIDO, 2015). Contudo, se este conteú-
do faz parte da cultura corporal, ele deve ser tratado no ambiente
escolar de forma integral e possibilitar à criança e adolescentes ex-
perimentarem e refletirem sobre os diferentes tipos de movimen-
tos pertencentes às lutas, proporcionando aos alunos uma apro-
priação do conteúdo como prática corporal (OLIVEIRA et al., 2017).
Conforme relata Alencar (2015), as modalidades de lutas, ape-
sar de fazerem parte da matriz do eixo curricular ainda são pouco
praticadas no ambiente escolar. Segundo Finco e Maciel (2020),
em muitas escolas a Educação Física escolar se resume ao ensino
dos esportes coletivos de quadra, denominados de “quarteto fan-
tástico”: Futsal, Vôlei, Basquete e Handebol. Estes conteúdos são
reconhecidos como indispensáveis durante as aulas, sendo mais
valorizados e aceitos pelos alunos, como apresentado no relato
de um dos professores entrevistados: “[...] o futsal que não pode
faltar nas aulas [...]” (P.4).
Outro fator que contribui para a não inserção do conteúdo
lutas é a associação à violência. Para Carreiro (2005), o próprio
professor desiste de abordar a atividade, pois muitas vezes não
consegue esclarecer a si e aos outros (pais, família, escola) sobre

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a associação errônea entre o conteúdo e a violência. Gomes et al.


(2013) alertam que esta se apresenta revestida não apenas de pre-
conceito, mas de concepções limitadas e distorcidas sobre o que a
atividade pode significar no contexto pedagógico. Por ter sua prá-
tica associada à violência, as aulas de lutas têm sido, no decorrer
dos anos, vistas como algo que irá despertar nos alunos o instinto
de “briga e confusão”.
Contraditoriamente, no presente estudo, durante as entre-
vistas, os professores não demonstraram como fator limitante o
estigma de violência: “[...] Não acho que a violência como todos
afirmam, seja o empecilho para ensinar o conteúdo, pois ele seria
ensinado de forma educativa [...]” (P1).
Dos professores entrevistados, apenas um demonstrou receio
em trabalhar, especificamente com o ensino médio devido à inci-
tação à violência: “[...] tenho o receio de gerar violência entre os
alunos por já serem maiores, já existe algumas diferenças entre
alguns [...]” (P4).
Outro empecilho apontado por um dos professores e muito
recorrente nas aulas de Educação Física é o interesse do professor:

[...] O principal empecilho é a boa vontade de quem está à fren-


te, ou seja, a boa vontade do educador em incluir as lutas no seu
planejamento. É muito mais fácil o professor jogar uma bola na
quadra e deixar o tempo rolar, não dá trabalho, não precisa se
preparar [...] (P.3).

Cabe destacar que o professor citado é praticante e especia-


lista na modalidade caratê e, por isso, abordar o conteúdo Lutas
possa ser considerado mais acessível para ele. Todavia, Moura et
al. (2019) apontam que são necessárias mais pesquisas referentes
ao conteúdo lutas na escola, visando o auxílio dos professores em
suas práticas pedagógicas. Apesar da crença dos professores de
que é preciso ter uma vivência prévia das lutas como especialista,
além da preferência de professores e alunos por outras práticas
corporais, sabe-se que todos os conteúdos precisam ser ensina-

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dos de forma integral, possibilitando ao aluno conhecer e refletir


sobre as diversas práticas existentes.

Aspectos pedagógicos e metodológicos

Embora existam inúmeros estudos que objetivam aprimorar


as metodologias de ensino da Educação Física, ainda existem res-
quícios de fatos ocorridos em momentos distintos da história que
se manifestam nas aulas de Educação Física. Desta forma, o re-
pensar da prática docente requer um estudo sobre as questões
do passado, para que se possa entender os fatos atuais (FARIAS;
SHIGUNOV; NASCIMENTO, 2001).
Nesta categoria, buscamos destacar os conteúdos e as abor-
dagens utilizadas pelos professores entrevistados, a fim de com-
preender a prática docente dos professores e seus desdobra-
mentos. No ensino da Educação Física escolar existe diversos
documentos normativos que visam fundamentar e qualificar a
prática docente (BRASIL, 1998; 2017). A utilização dos documentos
normativos pelos professores é relatada em algumas falas: “[...]
conteúdos que fazem parte dos documentos norteadores [...]”
(P.2). “[...] conteúdos presentes nos documentos norteadores [...]”
(P.6). “[...] conteúdos trazidos pelos documentos norteadores [...]”
(P.7).
Quando questionados sobre a metodologia de ensino, a maio-
ria citou que trabalham do “mais simples” para o “mais complexo”,
o método analítico e o global: “[...] do mais fácil para o mais difícil
[...]” (P.5). “[...] do mais simples para o mais difícil [...]” (P.6). “[...]
método global e analíticos [...]” ( P.1). “[...] método analítico e global
[...]” (P.7).
Sobre as metodologias empregadas pelos professores entre-
vistados, acredita-se que as formas de ensino foram provenien-
tes da formação desses professores. Libâneo (2016) afirma que
os métodos de ensino são as ações do professor pelas quais se

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estabelecem as atividades dos alunos para alcançar objetivos de


trabalho docente em relação a um conteúdo específico. O método
é o meio com o qual se atinge o propósito de ensinar, em que cada
professor desenvolve seu procedimento.
O professor não deve optar por um único modelo para suas
aulas, é possível adotar outros métodos, que sejam mais inte-
ressantes e adequados para o momento. No presente estudo, 3
dos 7 professores aplicam o método “do mais fácil para o mais
difícil” nas aulas de Educação Física, demonstrando uma escassez
de conhecimento de outros métodos de ensino. É imprescindível
que os professores conheçam as diversas metodologias de ensi-
no para que haja uma aprendizagem efetiva e integral dos alunos
(BATISTA; MOURA, 2019)
O método de ensino pode estar relacionado ao ano de forma-
ção do professor. No último século ocorreram muitas propostas
metodológicas para a Educação Física, e todas essas tendências
até hoje influenciam o profissional (BOSCATTO; IMPOLCETTO;
DARIDO, 2016). Inúmeras mudanças ocorreram nas teorias da
Educação Física com o passar do século, todavia na prática não
foram observadas muitas mudanças (OLIVEIRA et al., 2020).
De acordo com os relatos, os professores que se formaram há
menos tempo citaram a utilização dos documentos norteadores,
provavelmente por terem contato com esses documentos durante
o curso e o mesmo não ocorreu com os professores com 26 anos
ou mais de formados, talvez por não existirem ainda esses docu-
mentos na época da formação. Sobre a metodologia, apenas um
professor com a formação mais antiga citou o método utilizado e
independente do ano de formação eles apresentaram as mesmas
metodologias de ensino, os métodos global e analítico. Este fato
pode demonstrar muitas vezes a defasagem nos cursos que abor-
dam algumas metodologias em detrimento de outras. Os métodos
utilizados pelos professores estão embasados no conhecimento
que possuem e na experiência docente. Em muitos casos, a pouca
ou nenhuma utilização de novos métodos se dá ao fato de desco-

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nhecerem, o que significa a necessidade de atualização pedagógi-


ca dos professores de Educação Física (LIBÂNEO, 2016).
Independente da disciplina a ser ministrada, é fundamental
que o professor busque atualizar seus conhecimentos. O aluno
deve se sentir seguro e reconhecer os objetivos e a importância
dos conteúdos para seu processo de formação a fim de formar
indivíduos críticos em relação às práticas corporais que os cercam.

Considerações finais

As lutas fazem parte da cultura corporal, portanto se trata de


um conteúdo obrigatório que deve estar presente nas aulas de
Educação Física escolar, possibilitando aos alunos o acesso a este
campo do conhecimento. A partir dos objetivos propostos, verifi-
cou-se que apenas 2 professores desenvolvem o conteúdo lutas
de forma completa em suas aulas, e que alguns abordam apenas
a forma teórica ou convidam professores especialistas de alguma
modalidade para ensinar as lutas.
Neste estudo, foi possível verificar que, apesar da temática lu-
tas ser um conteúdo da Educação Física escolar, seu ensino encon-
tra-se em defasagem. Os professores entrevistados descreveram
dificuldades a respeito da inclusão das lutas nas escolas, assim
como ressaltaram algumas possibilidades para o seu ensino.
Os fatores restritivos para o ensino das lutas na escola obser-
vados nos relatos dos professores foram: falta de conhecimento
dos professores sobre o conteúdo, falta de material e espaço ade-
quado e insegurança do professor. Mesmo reconhecendo a exis-
tência desses empecilhos, os professores apresentaram algumas
possibilidades para aplicação do conteúdo lutas, sendo por meio
de jogos de lutas, de aulas teóricas, através de vídeos ou convi-
dando pessoas externas para demonstrar algumas modalidades
de lutas.

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A formação defasada dos professores também foi apontada


como um fator limitante, a maioria teve contato com o conteúdo
apenas durante a graduação sem procurar por alguma formação
continuada. Vale ressaltar que, apenas dois professores relataram
que sistematizam o conteúdo nos aspectos conceituais, atitudinais
e procedimentais, abordando-o de forma integral.
As lutas precisam ser compreendidas enquanto manifestação
da cultura corporal de movimento e que deve ser garantida ao
aluno na Educação Física escolar. Além disso, o professor precisa
desmistificar o fato de que para ensiná-las seja necessário o domí-
nio de alguma modalidade específica, como treinador ou pratican-
te por exemplo. Estes fatores não são necessários para o objetivo
da Educação Física escolar, é preciso que ele conheça os princípios
comuns entre as lutas e as diversas formas de ensiná-las nas esco-
las, para que propicie ao aluno a oportunidade de vivenciá-las e se
apropriar dessa prática corporal.
Cabe destacar que o estudo foi conduzido em um local e rea-
lidade específicos e incluiu um número reduzido de entrevistados.
Embora este seja um aspecto característico de estudos qualitati-
vos, aconselha-se a realização de estudos futuros em diferentes
contextos para verificar a inserção do conteúdo lutas nas escolas.
Esta pesquisa possui relevância para a área pois fornece infor-
mações pertinentes sobre a inserção desse conteúdo nas escolas,
os empecilhos vivenciados e as metodologias utilizadas, a fim de
auxiliar a atuação dos professores, bem como nos cursos de for-
mação, nas ações dos gestores e da comunidade escolar, tendo
em vista um ensino de qualidade.

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Publisher
Universidade Federal de Goiás. Faculdade de Educação Física
e Dança. Publicação no Portal de Periódicos UFG. As ideias expres-
sadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não
representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da
universidade.

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Lutas na educação física escolar

Lutas na educação física escolar: metodologia através dos


parâmetros curriculares nacionais - PCNs
Jefferson Campos LOPES* *Universidade de Tras-
http://dx.doi.org/10.11606/1807-5509201900030401 -os-Montes e Alto Dou-
Camilo Antonio Monteiro BUENO** ro, Vila Real, Portugal.
Maria Luiza Salzani FIORINI** **Faculdade de Ensino
Superior do Interior
Daniel MARTÍNEZ-ÁVILA*** Paulista, Marília, SP,
Brasil.
***Universidade Esta-
dual Paulista Júlio de
Mesquita Filho, Marília,
Resumo SP, Brasil.

O objetivo deste artigo é descobrir como os profissionais de educação física escolar desenvolvem os
procedimentos de ensino e aprendizagem das lutas (Karatê-do, Judô, Taekwondo, lutas associadas) na
diretoria de ensino Público do Governo do Estado de São Paulo (Santos, Bertioga, Cubatão e Guarujá).
Assim o presente estudo tem como objetivos específicos: a) identificar os conhecimentos para as aulas de
lutas; b) se trabalham junto com os PCNs nos blocos de conteúdo; c) quais são as maiores dificuldades.
Participou deste estudo um total de 112 profissionais graduados em educação física. Os dados foram
obtidos por meio de questionário estruturado com perguntas fechadas e de observação de aulas de
Educação Física. Através da análise dos resultados obtidos, pode-se entender como é apresentado às
lutas aos alunos na educação física escolar.

Palavras-chave: Lutas; Educação Física Escolar; Pedagogia; Aprendizagem.

Introdução
As lutas estão cada vez mais presentes no cotidiano sendo muito diversificadas e difundidas em clubes e
do ser humano, e é evidente que elas estão ocupando academias, ou seja, estabelecimentos não formais de
seu espaço na vida das crianças e dos adolescentes ensino3. Tal como indicam Correia e Franchini4, o
nas escolas. Nos dias de hoje, não é raro vermos termo “Luta” designa um investimento diversificado
crianças colecionando figurinhas de super-heróis ou de representações e significados que lhe confere
até mesmo brincando de luta na recreação. Segundo uma dimensão polissêmica. Neste mesmo estudo,
Breda, et al.1 o surgimento das lutas não é possível, os autores também discutem os termos “Artes
uma vez que não se trata de uma ação isolada de um Marciais” e “Modalidades Esportivas de Combate”
homem ou grupo que a propôs, mas, sim, de uma e propõem a expressão “Lutas, Artes Marciais e
construção sociocultural que foi modificado e dando Modalidades Esportivas de Combate (LAMEC)”
novos significados ao longo do tempo. Partindo como um universo amplo de manifestações
do princípio onde todo ataque gera uma ação de antropológicas de natureza multidimensional e
defesa, seja contra uma fera ou um inimigo, a caça complexa. As Lutas, Artes Marciais e Modalidades
ou o combate na guerra, usamos o corpo como Esportivas de Combate (LAMEC), tal como é
armas, de forma organizada como as modalidades indicado pelos mesmos autores, e também no
conhecidas, ou instintiva, emanada da necessidade estudo Fonseca, Franchini e Del Vecchio5, são
do ser humano em proteger o seu próprio corpo2. citadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais –
Podemos dizer também que as lutas são uma das PCN6-8 como conteúdos da Educação Física Escolar
mais elementares manifestações corporais, da qual (EFE), mas pouco desenvolvidas neste contexto,
fazem parte também os esportes, as danças, as e também na Proposta Curricular de Educação
ginásticas, entre outros. No contexto brasileiro, elas Física do Estado de São Paulo9. No entanto, os
estão presentes por meio de variadas modalidades, Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) tornam-

Rev Bras Educ Fís Esporte, (São Paulo) 2019; Jul-Set 33(3):401-412  •  401
Lopes JC, et al.

se importantes ferramentas de auxílio pedagógico tentem levar seus oponentes para fora de um espaço
ao professor de EFE. previamente delimitado; repitam essa atividade com
A definição de lutas que os Parâmetros companheiros mais altos, mais leves, mais fortes
Curriculares Nacionais (PCN’s) adota é a seguinte: levar para desenvolverem estratégias de ataque e
defesa13.
As lutas são disputas em que o(s) oponente(s) Darido14, ao problematizar a Educação Física
deve(m) ser subjulgado(s), mediante técnicas no Ensino Médio, em um livro com as Orientações
e estratégias de desequilíbrio, contusão, Educacionais Complementares aos Parâmetros
imobilização, ou exclusão de um determinado Curriculares Nacionais, afirmou que:
espaço na combinação de ações que gerem
ataque e defesa. Caracterizam-se por uma Alguns estudantes podem não ter tido
regulamentação específica, a fim de punir anteriormente oportunidades adequadas de
atitudes de violência e/ou deslealdade.(p.70)10 participar de atividades de movimento mais
sistematizadas e organizadas, quer em jogos,
A luta é um dos conteúdos da Educação Física, esportes, lutas, ginásticas, quer em atividades
a ser trabalhado no primeiro ciclo (1ª e 2ª séries) rítmicas e expressivas. Nessas circunstâncias,
e segundo ciclo (3ª e 4ª série), conforme disposto desempenho e eficiência não devem ser
nos PCNs. A partir da abordagem das dimensões radicalmente determinantes.(p.152)14
conceituais, procedimentais e atitudinais, trata-se de
oferecer aos alunos a oportunidade de participação Nas últimas décadas, a educação física vem
em diversos jogos e lutas, respeitando as regras e não passando por mudanças quanto à seleção
discriminando os colegas; a utilização de habilidades dos conteúdos no âmbito escolar, visando o
em situações de jogo e lutas, tendo como referência desenvolvimento de novas experiências corporais
de avaliação o esforço pessoal, e o desenvolvimento e uma habilidade de conviver entre os diferentes
das capacidades físicas durante os jogos e lutas11. aspectos de uma sociedade moderna. Neste caminho
Para o terceiro ciclo (5ª e 6ª séries) e quarto ciclo em seus estudos15 apontam que as aulas de educação
(7ª e 8ª série), a luta e a ginástica compõem o mesmo física no contexto escolar devem promover nos
bloco de conteúdo12. Especificamente sobre a luta, alunos o gosto pela prática de atividades físicas,
os indicativos presentes no PCNs são para abordar: o que depende em muito de vários fatores como
1) aspectos histórico-sociais das lutas: compreensão novos currículos, métodos diferenciados, as
do ato de lutar; vivência da luta no contexto relações intrapessoais e interpessoais e ao estimulo
escolar; 2) construção do gesto nas lutas: perceber empregado pelo professor bem como o foco do
e desenvolver as capacidades físicas e as habilidades aluno. Neste âmbito das diferentes abordagens,
motoras presentes nas lutas; 3) participação em atualmente, nas escolas públicas estaduais do Estado
jogos, lutas, e esportes dentro do contexto escolar de São Paulo, encontra-se a Proposta Curricular
de forma recreativa e, também, forma competitiva; (PC) para educação física baseada na concepção
4) aquisição e aperfeiçoamento de habilidades da “cultura de movimento”. Este enfoque cultural
específicas a jogos, esportes, lutas e ginásticas. ganhou destaque “por levar em conta as diferentes
Algo interessante, previsto no PCNs, para o manifestações dos alunos em variados contextos e
final do quarto ciclo, é a expectativa de o aluno por pregar a pluralidade de ações, sugerindo uma
“adotar atitudes de respeito mútuo, dignidade relação sobre a noção de desenvolvimento dos
e solidariedade na prática dos jogos, lutas e dos mesmos conteúdos e da mesma forma”(p.42)16.
esportes, buscando encaminhar os conflitos de A PC está vinculada ao documento denominado
forma não-violenta, pelo diálogo, e prescindindo Matriz de Avaliação Processual17, o qual define os
da figura do árbitro”(p.89)12. componentes curriculares da Educação Básica. A
Com relação ao emprego das lutas como um matriz explicita os conteúdos, as competências e
conteúdo das aulas de Educação Física, no Ensino habilidades que devem ser desenvolvidos ao longo
Médio, espera-se que o aluno amplie a compreensão do percurso escolar.
e a atuação nas manifestações da cultura corporal. Ao traçar um paralelo entre a Matriz de Avaliação
Por isso, nesse período, os alunos devem ser Processual (Educação Física) e as lutas, tema desse
desafiados por meio de inúmeras atividades. No artigo, identificou-se o seguinte panorama sobre as
caso das lutas, é possível propor os alunos que: possibilidades para trabalhar o conteúdo lutas nas

402  •  Rev Bras Educ Fís Esporte, (São Paulo) 2019; Jul-Set 33(3):401-412
Lutas na educação física escolar

aulas de Educação Física: que tais aspectos podem ser encontrados através
• 8ºano Ensino Fundamental – 1º bimestre: da postura social, responsabilidade, respeito,
Conteúdo: luta (judô, caratê, taekwondo, boxe perseverança e determinação nos alunos que
ou outra); princípios técnicos e táticos; principais praticam. Tal fato pode ser explicado, como
regras; processo histórico exemplo, através dos princípios do Taekwondo
Situações de aprendizagem (competência/ como: Cortesia; Integridade; Perseverança, Auto-
habilidade): identificação do conhecimento a controle e Espírito Indomável22.
respeito do conceito de luta Os estudos sobre os saberes docentes, Tardif e
Avaliação processual: reconhecer as diferenças Lessard23 apresentam possibilidades de aproximação
entre uma luta e outra (luta x briga/violência) com a problemática a ser investigada nesta
• 3ª série Ensino Médio – 1º bimestre: pesquisa. Guardadas as características específicas do
Conteúdo: luta – modalidadede luta já conhecida trabalho docente escolar, procuramos demonstrar
pelos alunos: capoeira, caratê, judô, taekwondo, a peculiaridade e as possíveis aproximações que
boxe ou outra o trabalho pedagógico das lutas e artes marciais
Situações de aprendizagem (competência/ apresentam para refletir sobre os saberes docentes
habilidade): conhecendo e vivenciando o boxe operacionalizados pelos mestres no cotidiano. A
Avaliação processual: relacionar imagens à produção do conhecimento fundamentada nestas
denominação dos golpes, técnicas e táticas do boxe; matrizes teóricas, está orientada para construir
identificar preconceito e discriminação na prática discursos sobre a prática pedagógica a partir do
de luta que os autores dizem e fazem para ensinar. Estes
Nota-se que, na PC, o tema lutas está contemplado fundamentos trazem subsídios para compreender
para ser abordado no 8ºano do Ensino Fundamental com maior profundidade as características e as
e na 3ª série do Ensino Médio. fontes dos saberes concretamente mobilizado pelos
Em se tratando da atuação profissional, com a mestres e as possibilidades de transformação da
criação do Conselho Federal de Educação Física prática.
(CONFEF), a maior parte dessas atividades passou As lutas ou modalidades de combate, como
a ser de responsabilidade dos profissionais de também são conhecidas, podem ser trabalhadas
Educação Física e daqueles que comprovadamente nas três dimensões dos blocos de conteúdo, sendo
atuavam com essas atividades antes da criação elas a procedimental que seria o saber fazer, ou
desse conselho profissional18. Assim, Correia e seja, a vivência prática do conteúdo em si; também
Franchini19 descrevem que as discussões em que aparecem às dimensões conceituais que estão
pese sobre o profissional que deve atuar nessa área, ligadas ao saber sobre o que está fazendo, ou seja,
no entanto, é preciso considerar que poucos cursos refere-se a fatos, conceitos, princípios e o próprio
de graduação em Educação Física apresentam contexto histórico pelo qual passou o conteúdo a ser
disciplinas específicas voltadas para as artes marciais estudado; e por último as dimensões atitudinais que
e quando o fazem tratam, quase que exclusivamente estão ligadas às normas, valores e atitudes adotadas
de uma ou duas modalidades, mais especificamente pelos alunos24.
o judô e a capoeira. Dessa forma, o presente estudo traz o seguinte
Sendo assim, as lutas são consideradas um problema de pesquisa: como são trabalhadas as lutas
conteúdo indiscutivelmente importante, por na rede pública de ensino de São Paulo segundo
preparar o aluno para conviver em sociedade, os parâmetros curriculares nacionais? O objetivo
aprendendo a manter o controle do seu corpo foi descobrir como os profissionais de educação
através da sua mente, tornando um cidadão crítico física escolar desenvolvem os procedimentos de
e solidário nos momentos propícios a esta ação. ensino e aprendizagem das lutas (Karatê-do, Judô,
Dessa forma, a cultura humana inserida no âmbito Taekwondo, lutas associadas) na diretoria de ensino
escolar, em particular nas aulas de educação física, Público do Governo do Estado de São Paulo
seria também transmitida através delas, por meio (Santos, Bertioga, Cubatão e Guarujá). Assim o
da evolução histórica, como se pode conferir nas presente estudo teve como objetivos específicos: a)
indicações dos Parâmetros Curriculares Nacionais identificar os conhecimentos para as aulas de lutas;
– PCN’s20. b) se trabalham junto com os PCNs nos blocos de
Ferreira21 relata em seu estudo que as lutas conteúdo; c) quais são as maiores dificuldades que
abrangem aspectos afetivos e sociais, de modo os professionais encontraram.

Rev Bras Educ Fís Esporte, (São Paulo) 2019; Jul-Set 33(3):401-412  •  403
Lopes JC, et al.

Método
Em relação aos aspectos éticos, o trabalho questionário, com os 112 participantes, ocorreu
foi submetido e aprovado pelo comitê de ética de forma grupal, por meio de uma Orientação
da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Técnica (OT), reunião de formação continuada
campus de Marília sob o número 5406, junto que visa o desenvolvimento técnico e pedagógico
ao departamento de Ciência da Informação. Os dos professores e coordenadores da Secretaria de
participantes assinaram o Termo de Consentimento Educação do Estado de São Paulo, na qual foi
Livre e Esclarecido. explicada a pesquisa.
O presente estudo trata-se de uma pesquisa 2. Observação de aulas de educação física nas
descrita a qual possui abordagem qualitativa quais foi trabalhado o conteúdo lutas/modalidades
e quantitativa, privilegiando a compreensão de combate: teve o objetivo de identificar como os
dos sentidos e significados da vivência dos professores de educação física desenvolviam as aulas
participantes, em um ambiente específico. Os na temática das lutas. O procedimento de observação
seguintes procedimentos foram realizados para a foi realizado com 51 professores de educação física,
coleta dos dados: dentre os 112 participantes, selecionados em função:
1. Aplicação de questionário: objetivou-se da disponibilidade em participar; da concordância
identificar a opinião dos professores participantes em ter a aula observada; de no momento da
sobre lutas/modalidades de combate na educação realização da pesquisa estar trabalhando com o
física escolar. Para tanto, um instrumento com 13 conteúdo lutas nas aulas e, também, mediante a
perguntas fechadas foi elaborado. O questionário foi autorização da direção escolar. As observações,
encaminhado para três juízes, professores doutores impressões e interpretações, sobre as aulas, foram
com experiência no tema, para avaliar o constructo registradas em um diário de campo, organizado a
das questões e das alternativas de resposta. Além partir de um roteiro dividido em aspectos descritivos
disso, uma aplicação-teste foi realizada com 10 e aspectos reflexivos das observações. O roteiro está
professores de educação física. A aplicação do descrito na QUADRO 1, a seguir:

QUADRO 1 -Roteiro para registro das observações.

ASPECTOS DESCRITIVOS DAS ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE CAMPO

Aspectos Descrição
Aparência física, formas de vestir, estilo de falar e agir,
1. Retrato do sujeito
maneiras de ser
Desenhos, croquis, fotografias do espaço, dos móveis, das
2. Descrição do espaço fisico/material
paredes, das janelas e portas, elementos nas paredes
Aparência física, formas de vestir, estilo de falar e agir,
3. Descrição dos alunos
maneiras de ser
4. Quantidade de alunos por turma Número de alunos presentes na aula

5. Tempo de aula Tempo total em minutos

ASPECTOS REFLEXIVOS DAS ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE CAMPO

Aspectos Formas

1. Grupos de conteúdos Conceitual, atitudinal e procedimental

2. Posicionamento do professor no espaço da aula No meio da quadra, ao lado, em frente e sentado

3. Satisfação dos alunos Totalmente, parcialmente ou nada

4. Problema na aula Situações comportamentais e físicas

5. Metodologia do professor Formas de aplicar a aula

6. Criação de novas atividades em lutas pelo professor Tipo de atividade

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Lutas na educação física escolar

Participantes da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, na


qual foi explicada a pesquisa.
Os participantes foram 112 professores de educação
física, sendo eles de ambos os sexos e com idade entre Analise de Dados
18 anos e 60 anos. Todos esses professores lecionavam
em escolas pertencentes à diretoria de ensino da baixada Os dados advindos dos questionários foram
santista (Santos, Bertioga, Cubatão e Guarujá), da registrados utilizando o programa Excel e tratados
Secretaria Estadual de Educação do estado de São estatisticamente pelo programa SPSS 18.0, sendo
Paulo. utilizada estatística descritiva dos resultados.
Os critérios para a seleção dos profissionais foram: a) Com relação à observação das aulas de educação
professores com mais de dois anos como concursados; física, a análise pautou-se nos dados registrados no
b) lecionarem no ensino fundamental ou médio; c) roteiro para registro das observações.
participarem de uma Orientação Técnica (OT), reunião Buscou-se, ainda, sempre que possível, confrontar
de formação continuada que visa o desenvolvimento os apontamentos observados ao longo das aulas com
técnico e pedagógico dos professores e coordenadores as informações dos questionários.

Resultados
Nesse estudo fizeram parte 112 professores de mais enquanto apenas 20% disseram ter 32
educação física da rede pública onde 52 (média anos ou menos. A renovação é lenta, temos um
de idade é de 39,6) foram do sexo masculino e professorado maduro, o que por um lado é bom,
60 do sexo feminino (média de idade é de 34,5) pois denota maior experiência e conhecimento
totalizando com média geral de 36,9 de idade. dos procedimentos e conteúdos relacionados ao
Identificamos o maior intervalo de idade entre trabalho em educação. Por outro lado, como a
os participantes a faixa de 30 a 40 anos. Em renovação é pequena, motivada por fatores como
pesquisa feita pela Fundação Lemann e o Instituto baixos salários, condições inadequadas de trabalho
Ibope Inteligência juntamente a professores de e baixo reconhecimento social.
escolas públicas brasileiras espalhadas por todo Em se tratando pelo tempo de carreira como
o território nacional25 diz que a média de idade professor, na FIGURA 1, observamos que a
dos professores brasileiros é de 40,8 anos. No maioria dos professores tem mais de sete anos
tocante a faixa etária dos docentes, onde há como profissional graduado, trazendo assim uma
uma preocupação quanto ao fato de que 80% experiência na profissão muito grande na área de
dos professores pesquisados terem 33 anos ou educação física escolar.

FIGURA 1 - Tempo de formação dos professores.

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Lopes JC, et al.

Segundo dados da Prova Brasil26 onde 34% dos as IES públicas são de período integral e por último
professores no Brasil tem sua formação a mais de 7 a maior facilidade de disputa de ingresso no ensino
anos confirmando nossa pesquisa. As licenciaturas superior28.
são cursos que, pela legislação, têm por objetivo Os PCN’s propõem uma reorganização para
formar professores para a educação básica: educação a educação física, no que se refere ao currículo,
infantil (creche e pré-escola); ensino fundamental; trazendo o movimento como um aspecto central.
ensino médio; ensino profissionalizante; educação Como componente curricular da Educação Básica,
de jovens e adultos; educação especial25. Neste a educação física começa a ser pensada de forma
caminho a formação de professores profissionais para integrada, valorizando o corpo e a mente dos
a educação básica tem que partir de seu campo de alunos. Nesse contexto, os PCN’s29 explicam que
prática e agregar a este os conhecimentos necessários instala-se um novo ordenamento legal na proposição
selecionados como valorosos, em seus fundamentos da atual Lei de Diretrizes e Bases, que orienta
e com as mediações didáticas necessárias, sobretudo para a integração da Educação Física na proposta
por se tratar de formação para o trabalho educacional pedagógica da escola.
com crianças e adolescentes27. Já, na FIGURA 2, tínhamos como perguntas
Podemos observar que a grande maioria dos a relação entre teoria e prática nos conteúdos
professores é oriunda de Instituição de Ensino da luta, utilização dos PCN’s no quesito luta, e
Superior (IES) particulares. Podemos dizer que se houve subsídios suficientes para os diversos
a escolha pela IES privada envolve vários fatores, conteúdos dos blocos. A grande maioria das
dentre eles: número do aumento delas de 197% respostas foi de pouca utilização. Assim estas três
em relação a 18% das públicas, uma maior perguntas nos mostram que mesmo nos últimos
disponibilidade de financiamento (FIES/ProUNI), 5 anos da entrada das lutas na grade curricular
o aumento das IES privadas nas maiorias dos estados das IES ainda existem uma lacuna muito grande
brasileiros, a maioria dos jovens brasileiros começam entre a teoria e a prática bem como organização
a trabalhar cedo, estudando no período noturno. Já das possibilidades das lutas.

FIGURA 2 -Proposta pedagógica dos conteúdos voltados para lutas dentro dos PCN’s.

Observamos que a maioria dos professores teve modo que possa efetivamente garantir a formação
em suas aulas sobre lutas na parte conceitual que do cidadão a partir de suas aulas de Educação Física
traz como informações as definições, história, escolar. A aprendizagem dos conteúdos conceituais,
regras, curiosidades e modelos de competições. procedimentais e atitudinais não se realizam,
Para garantir um ensino de qualidade além de nem se efetivam separadamente, mas por inter-
diversificar os conteúdos na escola é preciso relações30. Partindo deste princípio, vale ressaltar
aprofundar os conhecimentos, ou seja, tratá- também que os professores além da sua formação
los nas três dimensões, abordando os diferentes profissional em educação física, estes possuem ou
aspectos que compõem as suas significações. Esses não conhecimento e experiências sobre as lutas,
conteúdos não devem ser ensinados e aprendidos uma vez que para ser trabalhado determinado tipo
pelos alunos apenas na dimensão do saber fazer de conteúdo, torna-se necessário tal conhecimento
(dimensão procedimental dos conteúdos), mas de técnicas específicas das modalidades de combate
devem incluir um saber sobre esses conteúdos (Judô, Karatê, Taekwondo, lutas associadas) que
(dimensão conceitual dos conteúdos) e um saber envolvem golpes e métodos de como ensiná-lo sem
ser (dimensão atitudinal dos conteúdos), de tal o perigo de contusão entre os participantes.

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Lutas na educação física escolar

Com relação a elaboração do conteúdo, agrupado no todo31. Já Balzano32 expõe que o


perguntamos qual método é aplicado nas aulas, método global ensina alguma habilidade motora
onde vemos na FIGURA 3 um empate nas formas desde o início, utilizando o jogo como forma
de misto e parcial, pois devem ser oriundas da de aprendizagem e permitindo a vivência; mas
metodologia de ensino através de esportes onde sempre deve ser levado em conta o espaço físico
são direcionadas com a melhor forma encontrada para prática e o material a ser utilizado. No
na aplicação da realidade em suas aulas em método fragmentado há uma dificuldade no
cada escolha feita no ambiente de trabalho. O uso das ações, pois estas devem ser divididas em
método deve ser assumido conscientemente, partes menores sem alteração do todo. No caso
sistematizado, planejado e pedagogicamente das lutas como dividir o todo sem ter a noção
conduzido. Dentre os tipos estabelecidos, o das partes. Aqui percebemos que o método
método parcial consiste no ensino por partes parcial foi o mais utilizado entre os professores,
por meio do desenvolvimento dos fundamentos por dividirem os conteúdos apresentados na PC,
e das habilidades motoras que compõem o jogo seguidos pelos métodos mistos, fragmentados,
por etapas, para chegar ao final da aprendizagem global e outro.

FIGURA 3 -Método das aulas de lutas/artes marciais aplicado pelos professores.

Na FIGURA 4 se trata da relação de como os caso ele não tenha nenhuma experiência e formação
professores trabalham a parte teórica, já que a específica em algum tipo de luta, menos conteúdo
mesma resume o conteúdo da própria formação prático ele conseguirá apresentar, encontrando
nas IES, onde a parte conceitual pode abranger tal situação, o professor poderá evitar acidentes
a história e as regras, são as mais trabalhadas, com sua prática inadequada, concentrando apenas
justamente por ser mais fácil ao conhecimento nas histórias e regras de algumas modalidades de
da informação através da internet ou de sites combate, conforme mostra o gráfico a seguir.
específicos. As teorias cognitivas parecem se adequar Na FIGURA 5, as perguntas vão em direção
melhor às necessidades dos educandos e dos de como a escola contribui na parte de estrutura
educadores, uma vez que trabalham diretamente e qual a dificuldade nas aulas para serem
com os pontos de ancoragem dos alunos, visando ministradas, assim, observamos que a metade das
à organização e estruturação da matéria de escolas dão estrutura e que a maior dificuldade
forma eficiente e significativa para o aprendiz. A vista pelos professores é a participação das
aprendizagem significativa processa-se quando um aulas pelos alunos, talvez esta também pode
novo conteúdo é correlacionado a estes pontos de ser entendida pela dificuldade dos docentes em
ancoragem, havendo, portanto, a necessidade do lidar com as lutas e falta de experiência prática
professor estruturar o conteúdo a ser passado de destes em transmitir o conteúdo, podendo
modo progressivo, em situações mais simples para desencadear um baixo entusiasmo pelos alunos
situações mais complexas. Assim quanto maior por apresentarem pouco conteúdo prático, além
informação sobre o conteúdo das lutas o professor da falta de planejamento das aulas. Podemos
apresentar, maior será seu empenho e dedicação entender os tópicos citados, mais ainda, quando
para o conhecimento do assunto, já que o mesmo citamos outros tipos de problemas que podem
terá que transmitir o conteúdo aos seus alunos, estar inseridos na categoria outros.

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Lopes JC, et al.

FIGURA 4 -Tipo de informação transmitida aos alunos relacionada as lutas/artes marciais.

FIGURA 5 -Dificuldades do professor em ministrar o conteúdo.

A seguir, na FIGURA 6, analisamos que quando o que pode ser observado nos cursos de formação
se fala em capacitação, a maioria entende que deve é que as disciplinas teóricas não são trabalhadas
ser composta por parte teórico-prática para um em conjunto com a prática, é que se mostra na
melhor aproveitamento, onde os professores possam FIGURA 6. Quando se procura relacionar a teoria e
ter condições de conduzir cada vez mais suas aulas a prática, geralmente é de maneira superficial através
com excelência e satisfação aos alunos. Entendemos de conceitos amplos ou através de pesquisas na qual
que a formação dos professores os conhecimentos tem como referência uma comunidade diferente da
teóricos e práticos são muito importantes, porém qual ele irá exercer a profissão.

FIGURA 6 -Maneiras de lecionar o conteúdo programático.

Observações Nos aspectos descritos que foram intitulados


“descrição do espaço físico”, observou-se que
Especificamente sobre a observação das aulas de as grandes maiorias dos locais são em quadras
educação física, dos 51 professores, cabe detalhar poliesportivas onde todas são cobertas com
o que foi registrado. telhas de zinco e abertas nas laterais. Geralmente

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Lutas na educação física escolar

os banheiros não ficam próximos, bem como os lados da quadra ou um dos lados específicos
a hidratação com água também. Em algumas devido à luz ou à chuva e somente pouco preferem
quadras existem uma mini arquibancada e somente ficar sentados.
um espaço foi adaptado para as lutas numa sala. No quesito “satisfação dos alunos” classificou-se
Quanto ao material nenhum dos professores possui da seguinte forma: grande parte de alunos satisfeitos,
algo que podemos aproximar da especificidade de outra grande parte de alunos parcialmente
determinada luta. satisfeitos, que faziam com vontade, alegria e
Quanto a “descrição dos alunos” eram prazer, e somente uma pequena porcentagem de
adolescentes de ambos os sexos que, na grande não satisfeitos, que geralmente eram os que não
maioria, estão trajados de forma apropriada não queriam fazer nenhuma atividade e ficavam sem
totalmente para as aulas de educação física, mas nenhum esforço ou motivação.
para o contexto escolar. Como analisamos a faixa Na “metodologia do professor”, identificou-se
etária que envolve de 15 a 17 anos, vemos que todos a organização da aula em três momentos sendo
têm seus grupos de referências e escolhas pessoais. que, a maioria dos professores, num primeiro
No quesito “quantidade de alunos por turma e momento, realizou uma conversa sobre o que seria
o tempo de aula” as turmas tinham um número a aula com suas explicações e alguns fez algum tipo
aproximado de no mínimo 35 alunos e no máximo de aquecimento ou alongamento para início das
45, com a presença de um único professor de atividades. Num segundo momento eram feitas
educação física. Sendo que as aulas tinham o tempo as atividades especificas voltadas para as lutas e no
máximo de 50 minutos onde podem ser aulas último momento havia a volta à calma e alguns
duplas e divididas o mesmo número em outros realizam uma reflexão com conversa entre os alunos
dias da semana. sobre o que sentiram.
Quanto aos aspectos reflexivos estes foram No último quesito a “criação de novas atividades
direcionados para a visão do pesquisador na forma em lutas pelo professor” observou-se que quase
que o professor de educação física realizava a aula 24% dos professores que faziam as atividades
voltada para as lutas. que estavam em seus livros didáticos e que, mais
Quanto ao “posicionamento do professor da metade, realizava ou criava atividades novas
no espaço da aula” observou-se que a maioria das seguintes maneiras: apostilas com desenhos,
se posicionou de frente aos alunos, pois veem e confecção de materiais, filmes, imitação de animais
podem ser vistos pelos alunos, outros preferem e reflexões sobre o comportamento.

Discussão
Dentre os dados analisados no presente trabalho, Exclusão dos menos hábeis; Preferência pela bola
foi possível citar dificuldades que os professores de sempre para os meninos. Outros fatores que estão
educação física possam vir a ter ao submeter-se a interligados com a falta de interesse das meninas
uma proposta pedagógica das lutas na escola, uma pelas aulas de educação física, segundo Alves34 a
delas é a auto exclusão de alunos do sexo feminino metodologia de ensino inadequada, conteúdos que
no ensino médio. Andrade e Devide33, realizaram não favorecem a aprendizagem, falta de interação
um estudo com alunos do sexo feminino no ensino entre o professor e aluno, postura desinteressada do
médio que frequentavam as aulas de educação educador, falta de coordenação de área, orientação,
física. Os autores ressaltaram que muitos motivos supervisão ou até mesmo a direção da escola junto
podem contribuir para a exclusão dessas alunas nas a ausência sobre o real papel da educação física no
aulas de educação física, como: ambiente físico contexto escolar que identifique o professor. Tais
inadequado (quadras pequenas e sem vestiários); fatores entre os alunos contribuem para a falta de
aulas frequentemente repetitivas e desorganizadas; disciplina entre os mesmos e com a escola.
falta de habilidades e desprazer com os esportes Antunes35 relata que: “A indisciplina quase
oferecidos; brutalidade masculina; professores de sempre emana de três focos: a escola e sua estrutura,
educação física que não participavam das aulas; o professor e sua conduta e o aluno e sua bagunça”35.
Desigualdade de habilidades do sexo oposto; Com esta linha de raciocínio, Pereira36 descreve que

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Lopes JC, et al.

no cotidiano escolar observa-se o comportamento nossas vidas, colaborando no desenvolvimento do


do aluno no ambiente de ensino é reflexo das caráter na formação pessoal.
experiências vividas no meio familiar e social. É Para que os profissionais que mesmo não
comum encontrar alunos problemáticos filhos tenham tido uma experiência acadêmica e pessoal
de famílias desestruturadas, onde um dos pais é direcionada para esta prática adequada à realidade
ausente por algum motivo ou não dão a devida da teoria/prática, é necessário que seja investido de
importância para a vida escolar e social do filho. forma regular e mais objetiva em seus conhecimentos
Apesar dessa importante observação, não se pode através de melhorias na graduação (formação inicial)
atribuir esse fator como sendo a única causa do e capacitações profissionais (formação continuada),
problema. Dessa forma os professores vivenciam para que assim adquirindo segurança e embasamento
constantemente situações de apreensão, incerteza, teórico-prático, comecem a ter condições de
insegurança e conflito, que envolvem indisciplina e estimular em suas aulas a pratica de lutas como
se apresentam no cotidiano da escola37. Vale ressaltar uma ferramenta importante no aprendizado da
que entre os 13 e os 18 anos, aproximadamente, cultura corporal e suas reflexões na vida pessoal e
os jovens sofrem modificações fisiológicas que os na sociedade. Partindo do mencionado, torna-se
transformam, passando a agir de maneira diferente importante elaborar novas abordagens a partir de
tanto individualmente quanto nos grupos dos quais outras experiências práticas, que, com certeza, irão
começam a participar. Ainda Estrela38, afirma nos remeter a novas questões, considerando cada
que a manifestação de indisciplina trazida pelos realidade. Com certeza novas questões ou problemas
adolescentes é uma forma de ganhar status entre deverão ser apresentados e encarados como pontos
os grupos existentes na escola, fazendo com que se de partida para reestruturarmos nosso fazer
torne conhecido no ambiente escolar. Concordamos pedagógico, pois dentro da educação o processo de
que o problema não é estabelecer a ordem e sim adotar uma postura de constante aprendizado deve
de que forma isso é estabelecido, e do modo que ir em direção do compreender que o movimento é
está sendo feito percebe-se que o educador acaba se eterno de conhecimento, onde o caráter provisório
excedendo, gerando nos educandos os mais variados está sempre passível de ser observado/modificado de
sentimentos, uns se sentem amedrontados, outros acordo com as realidades, concepções e momentos
angustiados e dificilmente há algum aluno com um históricos específicos. É preciso entender as lutas
sentimento de admiração39. Nesse sentido explica como uma das mais novas ferramentas pedagógicas
que existem duas formas de se respeitar alguém, existentes que ajuda o professor no dia a dia a
uma dessas formas é através do medo, de se sentir aumentar estas possibilidades, tornando-as mais
inferior, acuado e a outra por conta da admiração, eficientes e reflexivas onde com certeza poderão
do bem-estar, do gostar da outra pessoa. contribuir para uma nova postura diante desta nova
Para a construção de uma proposta pedagógica forma de cultura corporal que no caso seria as lutas/
integrada, a nova lei responsabiliza a própria escola e artes marciais.
o professor pela adaptação da ação educativa escolar A partir da pesquisa realizada foi possível
às diferentes realidades e demandas sociais. Sendo constatar os procedimentos de ensino e
assim, os professores devem promover diferentes aprendizagem das lutas pelos profissionais da
práticas corporais para os alunos, mostrando-lhes educação física escolar na diretoria de ensino
as diferentes culturas e dando-lhes oportunidades público do governo do estado de São Paulo
de vivenciar essa variedade de conteúdo, a educação (Santos, Bertioga, Cubatão e Guarujá). Tanto pelo
física então seria mais valorizada, não apenas pelos questionário quanto por meio de observação nas
alunos, mas também, pelos pais e professores das aulas conclui-se que: a maioria dos professores
demais disciplinas. utilizou a história, regras e terminologia específicas
As artes marciais por serem características dos de algumas modalidades de combate; a maioria dos
orientais, e praticadas por longos anos, tem a sua base professores não trabalhou junto com os PCNs nos
formadora aliada na disciplina, hierarquia e respeito, blocos de conteúdos; com relação as dificuldades
onde mestres e alunos interagem pelas técnicas encontradas, a falta de prática e conhecimento
aprendidas durante horas de treinamento e repetição por maior parte dos professores foi o que mais se
de movimentos. Através destes ensinamentos, destacou frente ao ensino das lutas.
desenvolvemos o equilíbrio e o controle emocional De acordo com os dados obtidos, conclui-se,
para determinadas situações que possa ocorrer em ainda, que as lutas, enquanto conteúdo da educação

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Lutas na educação física escolar

física escolar, proposto pelos PCN’s e como parte brasileira e da valorização de uma área que ainda
integrante do currículo do Estado de São Paulo hoje se encontra desvalorizada que é a Educação
poderiam ser mais desenvolvidas nas aulas. Física escolar. Por meio de sua atuação, o professor,
Com isso, vale ressaltar que a Educação Física pode reiterar a relevância do papel da Educação
deve ter sua responsabilidade social pautada na Física na escola e atender a seu compromisso de
ética, para dessa maneira assumir o seu papel maneira sublime e com qualidade, afirmando seu
de corresponsável pela qualidade da educação valor como educador/educando.

Abstract
Fighting sports in physical education: methodology based on the Brazilian curricular guidelenes - PCN

The aim of this paper is to find out how professionals in physical education develop teaching procedures
for fighting education (Karate-do, Judo, Taekwondo, and related fighting) in public schools of São Paulo
state (Santos, Bertioga, Cubatão and Guarujá). The specific objectives of this study are: a) to identify the
knowledge for fighting classes; b) if the work together with PCN’s in the content blocks; c) to find out the
major difficulties. A total of 112 professionals holding undergrad degrees in physical education participated
in this study. The data was collected using a structured questionnaire with closed questions and capacity
(a total of 8 hours). Through the analysis of the results, how fights are presented to students in school
physical education is understood.

Keywords: Fights; Physical Education; Pedagogy; Learning.

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endereço de correspondência:
Camilo Antonio Monteiro Bueno
Av: Hygino Muzzi Filho, 737
Marilia - São Paulo – BRASIL Submetido: 07/06/2016
CEP: 17525-900 Revisado: 11/01/2018
E-mail: bueno.camilo@gmail.com Aceito: 07/05/2018

412  •  Rev Bras Educ Fís Esporte, (São Paulo) 2019; Jul-Set 33(3):401-412
LUTAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR:
UMA EXPERIÊNCIA NO ENSINO MÉDIO

MSDA. PAULA NUNES CHAVES


Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação
Física da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN

MS. IVANA LÚCIA DA SILVA


Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN
Professora do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte

DRA. ROSIE MARIE NASCIMENTO DE MEDEIROS


Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN
Professora do Departamento de Educação Física
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN

Resumo | Este relato é produto de uma prática pedagógica do conteúdo


lutas balizada nas três dimensões do conteúdo realizada durante o estágio
supervisionado IV. Foram aplicadas quatro aulas de Educação Física para
o 2º ano do Ensino Médio do Instituto Federal de Educação Ciência e Tec-
nologia - Campus Central – localizado em Natal/RN no mês de novembro
de 2013. Foram planejadas duas aulas de karatê e duas de boxe alicerçadas
na concepção de aulas abertas à experiência que preconiza possibilidades
e criações de movimentos. Apontamos a possibilidade de inserção efetiva
das lutas enquanto conteúdo da Educação Física escolar, independente da
formação acadêmica e pessoal do professor, bem como a ampliação da
aprendizagem para além da técnica, englobando criticamente aspectos
socioculturais das lutas.
Palavras-chave | Lutas; Educação Física Escolar; Dimensões do Conteúdo.

80 Cadernos de Formação RBCE, p. 80-91, set. 2014


INTRODUÇÃO

O relato de experiência presente nesse escrito resulta de uma prática


pedagógica de lutas balizada nas três dimensões do conteúdo (procedi-
mental, conceitual e atitudinal), que se estendeu durante quatro aulas de
Educação Física aplicadas no Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia (IFRN) – Campus Central – localizado na cidade de Natal/
RN no mês de novembro de 2013. A prática pedagógica é resultado da
disciplina Estágio Supervisionado Obrigatório IV, ofertada para os gra-
duandos em Educação Física (Licenciatura) da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte (UFRN). Essa disciplina é de caráter obrigatório e
objetiva proporcionar a atuação docente dos graduandos nas séries do
Ensino Médio através do planejamento conjunto com o professor que
está atuando na escola e com os orientadores acadêmicos.
No campo de estágio, o processo se dá, primeiramente, com a ob-
servação da turma e das aulas do professor regente. Após esse momento,
o aluno estagiário constrói os planos de aula de forma conjunta com o
professor regente, dicutindo-o também com o orientador acadêmico nas
reuniões sistematizadas da disciplina, que ocorrem geralmente, a cada
15 dias, para avaliar o andamento do estágio. Depois desse planejamento,
as aulas são ministradas pelo granduando estagiário sob a supervisão
do professor regente, que funciona como mediador, quando necessário.
E, por fim, as aulas realizadas são descritas no relatório de estágio, e a
experiência é socializada ao final da disciplina com os outros alunos.
Destacamos aqui, a importância da professora regente no processo do
estágio aqui descrito, realizando o planejamento das aulas com a estagiária
sempre após os encontros iniciais de observação da turma, apontando
possíveis falhas e dando contribuições para os planos de aula. Para além
do planejamento, sua observação crítica da prática pedagógica realizada
pela aluna estagiária, bem como a discussão das dificuldades encontra-
das, dos limites e dos êxitos das aulas ministradas foram imprencindíveis
para a experiência de aprendizado pedagógico e didático, que é o grande
objetivo do estágio.

Cadernos de Formação RBCE, p. 80-91, set. 2014 81


Ao principiar o relato é preciso destacar que essa experiência
configura-se enquanto tentativa de romper com o esquecimento frequente
do conteúdo lutas nas aulas de Educação Física escolar, tendo em vista
que, como nos fala Nascimento e Almeida (2007) as lutas aparecem na
instituição escolar por realizações de terceiros, através de oficinas, volun-
tariado, ou outras iniciativas desvinculadas da disciplina Educação Física
na escola. Para além de inserir as lutas efetivamente enquanto conteúdo,
a experiência pretendeu também superar uma perspectiva reducionista
desse conteúdo atrelado unicamente à dimensão procedimental, à aqui-
sição de técnicas corporais precisas voltadas para competições escolares,
primando pelo rendimento em detrimento dos aspectos socioculturais
que envolvem o universo das lutas.
No decorrer do texto, apresentamos o cenário no qual se sucedeu
a experiência, descrevendo o processo de planejamento, aplicação das
aulas, seus resultados e reverberações para pensar o conteúdo lutas nas
aulas de Educação Física no Ensino Médio.

CENÁRIO DA PRÁTICA

As aulas foram ministradas para uma turma do 2º ano do Ensino


Médio do curso técnico em informática do IFRN-Central, turno matutino,
composta por 34 meninos e 09 meninas. Foram planejadas duas aulas de
karatê e duas de boxe, executadas em dois encontros, o primeiro se suce-
deu na sala de lutas, enquanto o segundo aconteceu na sala de dança, ou
seja, a intervenção durou duas semanas devido à carga horária semanal
de duas aulas que, no caso da turma em questão aconteciam no mesmo
dia e em horários seguidos.
Ao centrarmos nossa atenção no planejamento e na escolha do
conteúdo, temos que, para além das lutas fazerem parte do conteúdo
programático da escola para o segundo ano, outros fatores influenciaram
esta escolha, a saber: a tematização de um conteúdo não hegemônico nas
aulas e à contraposição aos obstáculos colocados para as lutas na Educa-
ção Física escolar. Ao versar sobre a temática, Darido e Rosário (2005)

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apontam as lutas entre as atividades com pouca tradição no universo da
Educação Física na escola. Nesse sentido, autores como Nascimento e
Almeida (2007); ao tematizarem a pouca recorrência das lutas na Edu-
cação Física escolar em seus escritos, destacam a falta de vivência dos
professores com as lutas em sua vida pessoal bem como no âmbito da
formação acadêmica como um dos principais obstáculos. Somatizamos
também a ênfase no aspecto técnico e de treinamento para a formação
de atletas na escola, sem legitimação enquanto conteúdo da Educação
Física. E foi na tentativa de romper com esses aspectos acima, que ousa-
mos experienciar as lutas com os alunos.
Nessa direção, ao justificarmos essa ousadia, bem como a esco-
lha pelas modalidades de karatê e boxe dentro do vasto conjunto das
lutas, destacamos a importância da vivência de experiências exitosas
em ambas as lutas durante a formação inicial na graduação. No caso
do karatê, apontamos uma disciplina optativa intitulada “metodologia
do karatê”, que foi cursada no semestre anterior ao estágio, dando pos-
sibilidades para atuação no campo da Educação Física escolar. Quanto
ao boxe, sua escolha se deu pela vivência mais pontual de uma aula
dentro da disciplina optativa conciência corporal, cursada de forma
concomitante ao estágio.

EXPERIENCIANDO O CONTEÚDO LUTAS NO ENSINO MÉDIO

Considerando o quadro histórico recente apontado por Darido e


Rosário (2005) da priorização da dimensão procedimental dos conteúdos
nas aulas de Educação Física, em detrimento dos conceitos e atitudes, ao
planejarmos as intervenções do conteúdo não hegemônico lutas na escola,
atentamos para a construção de intervenções que contivessem as três
dimensões do conteúdo (conceitual, procedimental e atitudinal), enten-
dendo a importância das mesmas para a formação integral do educando.
Ao nos reportarmos ao primeiro encontro, que ocorreu no dia oito
de novembro na sala de lutas do IFRN, temos que inicialmente foi realiza-
da uma conversa sobre a história do Karatê Do, seus lemas e competições

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com a passagem de alguns vídeos de kumite1 e kata2, sempre considerando
os conhecimentos prévios dos alunos, predominando a dimensão concei-
tual. Estes responderam que achavam que o Karatê tinha se originado na
China e, a partir do que os alunos falavam realizávamos a mediação com
os aspectos históricos desta arte marcial, sua origem japonesa, precursor,
chegada no Brasil, seus lemas e aspectos filosóficos. Esse último item foi
interessante para provocar os alunos sobre a importância dessa filosofia,
do respeito para com o adversário e o quanto esses aspectos ainda estão
sendo ou não preconizados nas práticas marciais na atualidade.
Após esse momento, passamos um trecho do filme Karatê Kid, no
qual o personagem senhor Myagui, explana que: Quando karatê é usado
somente para conseguir troféu de plástico, karatê não significa nada. Os
alunos concordaram com tais aspectos, discutindo sobre a questão da
competitividade excessiva e do esquecimento dos aspectos filosóficos
das lutas e fazendo uma analogia com o MMA e seus aparatos mercado-
lógicos, estabelecendo assim, a predominância da dimensão atitudinal.
Ao final dessa primeira parte, tranversalizamos o conteúdo lutas
com o conhecimento sobre o corpo, ao questionarmos se eles sabiam o
que acontecia com a frequência cardíaca quando praticamos alguma ati-
vidade física. Eles responderam que aumentava, mas não sabiam explicar
o motivo. Explanamos brevemente sobre e realizamos o procedimento
de aferição “em repouso”. Então, deu-se início à parte da aula na qual
predominava a dimensão procedimental através da vivência dos jogos
pré-desportivos para as lutas. Esses jogos são importantes na medida em
que incorporam elementos do esporte e proporcionam maior equidade
entre os alunos, colaborando para um maior respeito às individualida-
des, corroborando também com o plano atitudinal (NASCIMENTO e
ALMEIDA, 2007). Esse Fato pode ser observado na vivência dos alunos
pela participação massiva dos mesmos, inclusive das meninas que no
Ensino Médio sempre se esquivam das experiências corporais.

1. Combate propriamente dito.


2. Formas sequenciais de movimentos, luta com adversário imaginário.

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Nesse sentido, no primeiro jogo solicitamos que cada aluno enchesse
um balão e amarrasse no tornozelo com um barbante, e explicamos que
nas lutas, e especificamente no karatê, é imprescindível saber atacar e
defender-se, prestar atenção no adversário, no outro, e que por isso, no
jogo era preciso tentar estourar o balão do outro e tentar proteger o seu
ao mesmo tempo. Após esse jogo, entregamos dois pegadores de roupa
para cada um e solicitamos que colocassem na camisa, clarificando que
a brincadeira consistia em tentar pegar o maior número de pegadores e
proteger os seus.
Logo após a vivência dos jogos pré-desportivos, aferimos nova-
mente a frequência cardíaca e os alunos ficaram surpresos com o aumento
significativo da mesma, perguntamos a eles porque isso acontecia e eles
responderam que quando se corre ou se faz alguma atividade física,
cansamos mais e a frequência aumenta. Então, explicamos o processo
de forma mais aprofundada e perguntamos também qual jogo foi mais
fácil, eles responderam o do balão, porque os pegadores são menores e,
consequentemente mais difíceis de pegar. No entanto, foi perceptível que
os alunos gostaram de ambos os jogos e foram envolvidos pelo lúdico.
O momento seguinte da aula consistiu na vivência dos fundamentos
básicos do karatê. Iniciamos mostrando as bases e falando da importância
das mesmas para as lutas, para o karatê e inclusive para a vida, influen-
ciando no nosso equilíbrio corporal. Posteriormente, vivenciamos os tipos
de socos, defesas e chutes básicos do karatê. É preciso destacar que não
havia preocupação com a execução de uma técnica perfeita, na contramão
dessa perspectiva objetivávamos que os alunos vivenciassem cada um
à sua maneira, essa exploração e experiência corporal. É nesse sentido
que nos aproximamos da concepção de aulas abertas à experiência, nas
quais “É dada ao aluno a tarefa de buscar as diversas possibilidades de
movimento” (HIRAI, CARDOSO, 2006, p.119), diversidade essa que
balizou nossa intervenção.
No fim da aula, solicitamos que os alunos fizessem silêncio e se
deitassem de forma confortável no tatame, esquecendo os problemas,
tentando ouvir seu corpo e o silêncio do ambiente. Pedimos que fechassem

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os olhos e fossem relaxando os músculos dos pés, pernas, braços, tórax,
cabeça, enfim, que relaxassem o corpo inteiro, falando da importância de
na correria diária, conseguir proporcionar um momento de relaxamento,
de escuta de si e do outro, fato que as lutas também ensinam. Ao final da
aula indagamos o que eles acharam e nos surpreendemos ao perceber
que eles gostaram bastante da aula, e que se propuseram a vivenciá-la.
Nesse sentido, corroboramos com o pensamento de Cantanhede
et al (2010) ao observar que não devemos trabalhar apenas as capacida-
des físicas relacionadas ao karatê. Para além destas, precisamos atentar
para as capacidades de autoconhecimento corporal proporcionado pela
vivência, bem como utilizar o karatê para refletir e debater sobre uma
série de temáticas que envolvem essa arte marcial, como, por exemplo,
questões concernentes à saúde, ao gênero, violência, respeito, etc.
Outro aspecto a ser destacado da primeira intervenção que também
se repetiu na segunda consiste no fato de que as três dimensões do con-
teúdo não se encontram separadas, embora em alguns momentos uma
ou outra dimensão predomine em detrimento das demais; conceitos,
atitudes e procedimentos se interpelam, se associam e se transversalizam
na tentativa de construir um conhecimento significativo e coerente.
No segundo encontro que aconteceu na semana seguinte, ministra-
mos duas aulas sobre boxe e sua relação com o gênero. A estratégia nesse
encontro foi semelhante ao anterior, iniciamos com a predominância da
dimensão conceitual por meio de uma conversa sobre alguns aspectos
históricos e curiosidades sobre o boxe. Passamos um vídeo de Bruce
Lee, no qual ele fala sobre as artes marciais como expressão de si mesmo,
argumentando que desacredita nos estilos e divisões por pensar que cada
pessoa tem seu estilo de lutar. Os alunos gostaram bastante do vídeo e
um deles falou sobre o boxe chinês, tailandês, questionando qual iríamos
vivenciar. Respondemos que iríamos vivenciar o básico do boxe geral,
tendo em vista que não tínhamos grande experiência de vivência no boxe
e que também não nos prenderíamos aos estilos ou técnicas corretas e

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perfeitas, por acreditar, assim como Bruce Lee, que cada um se expressa
na luta de uma forma diferente. Além desse vídeo inicial, foi passado
também um vídeo que mostrava os aspectos e movimentos básicos do
boxe que seriam vivenciados posteriormente.
Após esse momento inicial, passamos para a vivência prática dos
movimentos básicos desta arte marcial. Fizemos uma roda, na qual foi
solicitada que cada aluno criasse e realizasse um alongamento. Destaca-
mos que muitos alunos repetiram alongamentos já conhecidos, enquanto
outros criaram formas de se alongar, sem regras pré-estabelecidas como
de costume.
Após o alongamento, ficamos de frente para o espelho e iniciamos a
vivência das bases, guarda e socos básicos do boxe (Jab, direto e cruzado),
realizando a diferenciação desses movimentos em comparação com o
karatê vivenciado no encontro anterior. Aprendemos cada um dos socos
individualmente e depois em sequência. A recordação da aula anterior
é importante para nos certificar que estamos realizando um trabalho
contínuo, sequencial e sistematizado.
Percebemos que alguns alunos tinham mais dificuldade de realizar
os movimentos de soco, principalmente no tocante à coordenação e ritmo
dos movimentos, no entanto, todos tentavam fazer à sua maneira, o que
mostra que estavam dispostos a vivenciar uma prática de luta diferente.
Após a vivência individual dos fundamentos básicos e de explanar e
praticar o movimento de esquiva, caracterizado enquanto defesa no boxe,
foi solicitado que os alunos praticassem em duplas os socos e o movimento
de esquiva, tomando cuidado com o ritmo e combinando com o colega
quem iria socar primeiro para que ninguém se machucasse, criando um
pequeno combate. Neste momento percebemos o quanto esse espaço de
criação instigou os alunos que se empolgaram querendo utilizar todos os
movimentos vivenciados na aula a partir de seu repertório e do repertório
do outro, respeitando-o e ajudando-o. Ao final, perguntamos o que eles
acharam da aula, se gostaram mais do boxe ou do karatê, e as opiniões

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foram bem divididas nesse último quesito. Eles destacaram também o
contentamento em conhecer e experienciar essas duas manifestações
da cultura de movimento, tendo em vista que apenas um aluno já havia
praticado o karatê e nenhum tinha vivência no boxe.
Ao final do segundo encontro passamos o trailer de três produções
cinematográficas, a saber: Menina de Ouro (2004), Billy Eliot (2000) e
Beautiful Boxer (2004), seguido de uma breve discussão. Perguntamos
aos alunos se eles conheciam os filmes e o que eles tinham em comum.
A maioria conhecia os dois primeiros, no entanto ninguém conhecia a
história do transexual lutador contada em Beautiful Boxer. Eles falaram
que os filmes versavam sobre boxe/esporte e preconceito, e a partir do
discurso deles discutimos e conversamos um pouco sobre a generificação
das práticas corporais e das lutas, principalmente do boxe e a relação deste
processo com a sexualidade e os estigmas destinados à mulher praticante de
boxe tendo em vista que “o próprio esporte, em geral, em sua origem é uma
prática social essencialmente masculina, e nesse contexto, o boxe aparece
como expressão máxima dessa afinidade” (ARAÚJO, CHAVES, 2013, p. 4).
Um fato interessante, que talvez seja reflexo da falta de discussão
sobre essas temáticas na escola e mais profundamente na própria área
da Educação Física, foi a não presença de meninas da turma no segundo
encontro. Elas participaram da primeira aula, no entanto, não compa-
receram na seguinte sobre o boxe. Provavelmente e infelizmente o boxe
tenha as afugentado. Outro fator que pode ter influenciado nesse quadro
foi o segundo encontro ter ocorrido no contra turno como aula extra.
Contudo, a professora titular da turma nos revelou a dificuldade de
participação das meninas nas aulas independente do conteúdo, de forma
que os meninos são sempre mais presentes e participativos, fato este, que
percebemos nitidamente nas aulas. Essa problemática é recorrente no
Ensino Médio e decorre de inúmeros aspectos que causam desmotivação,
alguns deles apontados por Martinelli et al (2006), como, por exemplo,
insatisfação com os conteúdos, cobrança pela técnica e competitividade,

88 Cadernos de Formação RBCE, p. 80-91, set. 2014


apresentação das modalidades esportivas sob a forma de jogo e falta de
atribuição de significado à disciplina.
Nessa direção, apontamos enquanto fator positivo a participação
ativa das meninas na primeira aula, nos jogos pré-esportivos e vivência
dos gestos técnicos do karatê. No tocante à ausência das mesmas na aula
seguinte, podemos depreender que o processo de inclusão e participação
do gênero feminino em práticas corporais atreladas culturalmente ao
universo masculino e na própria Educação Física escolar no Ensino Mé-
dio é bastante complexo. Nesse sentido, como nos fala Tibúrcio (2008),
aspectos naturalizados na cultura como os que atrelam às identidades
masculinas a característica da força e à mulher atributos como sensibili-
dade e fragilidade ainda produzem hierarquias e estigmas com os quais
nos confrontamos no cenário atual das aulas de Educação Física.
Nesse sentido, registramos que o processo de reversão desse qua-
dro demanda uma construção gradativa, com práticas pedagógicas e
corporais, estratégias e discussões que levantem essa problemática tanto
no âmbito da Educação Física na escola quanto no espaço de discussões
acadêmicas da área.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao finalizar esta experiência destacamos a possibilidade de traba-


lhar o conteúdo não hegemônico lutas na escola, sem a necessidade de
se prender à cobrança de habilidades ou gestos técnicos perfeitos destas
manifestações culturais. Além disso, é possível proporcionar aos alunos
um conhecimento amplificado e crítico, englobando as três dimensões do
conteúdo, e respeitando as individualidades de cada aluno que expressa
de forma diferenciada golpes, defesas e se movimenta de acordo com seu
repertório motor, cultural e de vida.
É justamente pelo fato da Educação Física na escola não objetivar
a formação de atletas ou lutadores, que podemos ministrar aulas deste

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conteúdo sem necessariamente possuir experiência vivencial como
lutador(a), proporcionando experiências significativas para o alunado,
utilizando estratégias como vídeos e jogos pré-esportivos. Por fim, desta-
camos que o relato aqui descrito se constitui em uma das inúmeras pos-
sibilidades da Educação Física na escola, possuindo avanços e limitações
decorrentes da tentativa sempre inacabada de aperfeiçoamento da nossa
prática docente. E que, embora tenha se constituído em uma experiência
curta de dois encontros, fica o registro de possíveis desdobramentos como
a apreciação dos filmes trabalhados em trechos para ampliar a discussão e
o conhecimento dos alunos, bem como o planejamento de mais vivências
diversificando a experiência a partir de diferentes lutas.

REFERÊNCIAS

CANTANHEDE, A.L.I. et al. O karate na escola como ferramenta educacional.


Um enfoque crítico. EFDeportes, Buenos Aires, Año 15, n. 148, set., 2010.
Disponível em: < http://www.efdeportes.com/efd148/o-karate-na-escola-como-
-ferramenta-educacional.htm >. Acesso em: 14 jul. 2014.

CHAVES, P.N.; ARAÚJO, A.C. Million Dollar Baby: Um marco na representação


Hollywoodiana do gênero no esporte. Recorde: Revista de História do Esporte,
Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, p.1-13, jul/dez, 2013.

HIRAI, Rodrigo Tetsuo; CARDOSO, Carlos Luiz. Para a compreensão da


Concepção de “aulas abertas” na Educação física escolar: orientada no aluno,
no processo, na problematização, na comunicação. Revista Motrivivência,
Florianópolis, v.18, n. 27, p. 119-136, Dez, 2006.

MARTINELLI, C. R. et al. Educação Física no Ensino Médio: motivos que levam


as alunas a não gostarem de participar das aulas. REMEFE: Revista Mackenzie
de Educação Física e Esporte, São Paulo, v. 5, n. 2, p.13-19, 2006.

NASCIMENTO, P.R.B.; ALMEIDA, L. A tematização das lutas na Educação


Física Escolar: restrições e possibilidades. Movimento, Porto Alegre, v. 13,
n. 03, p. 91-110, set/dez, 2007.

90 Cadernos de Formação RBCE, p. 80-91, set. 2014


ROSÁRIO, L.F.R.; DARIDO, S.C. A sistematização dos conteúdos da educação
física na escola: a perspectiva dos professores experientes. Motriz, Rio Claro,
v.11, n.3, p.167-178, set/dez, 2005.

TIBÚRCIO, Larissa Kelly de Oliveira Marques. Relações de gênero na educação


física escolar: breves inscursões in: PAIDÉIA: Revista Brasileira de Ensino de
Arte e Educação Física, 2008.

Recebido: 16 agosto 2014


Aprovado: 19 janeiro 2015
Endereço para correspondência:
Paula Nunes Chaves
Rua Pindorama, 73
Nossa Senhora da Apresentação
Natal – RN
CEP: 59114-215
paulinha_nunes3@hotmail.com

Cadernos de Formação RBCE, p. 80-91, set. 2014 91


Motrivivência Ano XX, Nº 31, P. 36-49 Dez./2008

Organização e Trato Pedagógico


do Conteúdo de Lutas na Educação
Física Escolar

Paulo Rogerio Barbosa do Nascimento1

Resumo Abstract
A sistematização do tema/conteúdo The systematization of the topic/
de lutas para a disciplina de content of wrestling for the subject
Educação Física escolar é uma of Physical Education at school is a
carência desta área de estudo. deficiency of this area of study. This
Este fato é considerado por alguns fact is considered by some teachers as
professores como restritivo ao trato limited to the pedagogical treatment
pedagógico deste tema/conteúdo. of such topic/content. We understand
Entendemos ser possível contrapor that it is possible to oppose such
esta suposta restrição, considerando: alleged limitation by considering: our
nossa concepção sobre a função da understanding of the function of Phy-
Educação Física escolar; um projeto sical Education at school, a curricu-
curricular de Educação Física; os lum for the suject, the time at school,
tempos escolares e as características and the characteristics of the student
do educando em cada etapa. Assim, in every phase. Thus, this topic/
este tema/conteúdo se justifica e pode content appears justified and can be
ser organizado, edificando-se uma organized by building a grounding so
base para que futuras intervenções that future pedagogical interventions

1 Prof. Licenciado em Educação Física - UNICRUZ/Cruz Alta-RS, Mestre em Educação nas Ciências
- UNIJUI/Ijuí-RS. Prof. Curso de Educação Física - UNIJUI/Ijuí-RS e do Curso de Educação Física
- URI/Santo Ângelo-RS. Contato: paulonascimento@urisan.tche.br
Ano XX, n° 31, dezembro/2008 37

pedagógicas tornem possível a sua make its presence and study in the
vivência e estudo no âmbito escolar. educational sphere possible. 

Palavras-chaves: Educação Física; Keywords: Physical Education; Wres-


Lutas; Conteúdo. tlings; Content. 

Introdução

A indicação do conteú- estudos e sistematizações que subsi-


do de “lutas” para a disciplina de diem o seu trato pedagógico efetivo
Educação Física escolar consta dos na escola.
Parâmetros Curriculares Nacionais A intenção deste estudo é
(PCNs), bem como é suscitada em esboçar uma possibilidade de organi-
reflexões pedagógicas de autores zação e também diretrizes para o trato
como Daolio (1996) e Soares (1995), pedagógico do conteúdo de lutas no
entre outros, que consideram a Ensino Fundamental, visualizando-o
“cultura corporal de movimento” num projeto curricular de Educação
objeto de estudo deste componente Física e adequando-o às respectivas
curricular. Na perspectiva dessas etapas escolares e características espe-
obras, as manifestações de “luta” cíficas do educando em cada etapa2,
são compreendidas como produções considerando: objetivos, conteúdos,
humanas carregadas de significados características das atividades a serem
construídos historicamente e que es- propostas e do método de ensino a
tabelecem relações constantes com e ser empregado.
nas sociedades onde estão inseridas,
são praticadas e desenvolvidas e, Metodologia
portanto, um significativo conteúdo
a ser estudado na escola. Metodologicamente, o
Indicações à parte, este caminho percorrido por esta elabo-
tema, no momento, necessita de ração compreendeu:

2 Para efeito de organização consideramos neste estudo as faixas etárias que dizem respeito a cada
etapa escolar, dentro de uma regularidade, embora não desconhecemos totalmente a realidade
encontrada no Brasil, que devido à repetência ou atrasos de aprendizagem faz com que alunos
de faixas etárias avançadas permaneçam em etapas escolares que, teoricamente, já deviam ter
sido superadas. Porém, em casos como estes, acreditamos que a necessidade passa a ser de (re)
adequarmos conteúdos, ou as formas de trabalhar estes conteúdos, procurando respeitar os tempos
de vida dos educandos (ARROYO, 2004).
38

1) Revisão de bibliografia, ciplina de Educação Física escolar


considerando autores que passa, inclusive, pelo entendimento
se ocupam do tema “lutas de que ela ocorre no e a partir do
e Educação Física”: um processo dinâmico de mudanças
autor que reflete sobre paradigmáticas na área de estudos
currículo e conteúdo na da Educação Física.
Educação Física escolar; Na atualidade, o conceito
autores que pensam a de “cultura” tem sido, segundo
tematização da cultura Daolio (2004, p. 2), “a principal
corporal de movimento na categoria conceitual da área de Edu-
Educação Física Escolar; e cação Física”. O autor, ao analisar o
autores que pensam espe- conceito de cultura em produções
cificamente a luta como acadêmicas relevantes da área,
conteúdo na Educação propôs como contribuição a visão
Física escolar; antropológica de Clifford Geertz,
2) Diálogo com a literatura, “que enfatiza a dimensão simbólica
estabelecendo coerências no comportamento humano, não
entre as compreensões um simbolismo individual fruto de
explicitadas pelos diversos ações humanas isoladas, mas um
autores estudados; processo coletivo de significações
3) Esforço propositivo no inserido na própria dinâmica cul-
sentido de organizar e/ tural da sociedade”. A principal
ou visualizar a presença mudança a partir desta concepção,
e as possibilidades de segundo o autor, é a visão de Educa-
trato pedagógico deste ção Física como “área que trata do
conteúdo na disciplina de ser humano nas suas manifestações
Educação Física escolar, culturais relacionadas ao corpo”,
considerando o referencial e não mais como “área que trata
teórico adotado. apenas do corpo e do movimento”,
exclusivamente a partir da matriz
O porquê das lutas enquanto dos conhecimentos biológicos.
Entendemos a Escola como
tema/conteúdo da Educação um espaço social no qual se fazem
Física escolar presentes contínuos processos de
significações. Concordamos com
A compreensão sobre o González (2004/2005), de que en-
porquê da indicação do trato peda- tre as funções da Escola está a de
gógico do conteúdo de lutas na dis- “introduzir o aluno no mundo so-
Ano XX, n° 31, dezembro/2008 39

ciocultural que a humanidade tem que a Educação Física possa


construído, com o objetivo de que proporcionar o estudo, a apro-
eles possam se incluir no projeto, ximação e a valorização de
sempre renovado, de re-construção diversas formas de produção e
desse mundo”. Posicionamo-nos no expressão cultural dos alunos e
de outros grupos [...].
sentido de que os conhecimentos a
serem tratados por este componente
Esta concepção paradig-
curricular não devem permanecer
mática que envolve o conceito de
restritos exclusivamente a três ou
“cultura”, em nosso entendimento
quatro conteúdos. É necessário
torna as manifestações de luta um
que a Escola e a Educação Física
conteúdo justificável e passível de
considerem a ampliação das pos-
ser tematizado na escola.
sibilidades de vivências e estudos
das práticas da cultura corporal
de movimento, democratizando o
A necessidade de organização
acesso ao conhecimento, vivências do conteúdo de lutas no cur-
e significações destas práticas. Seria rículo escolar
uma Educação Física que primas-
se por contemplar, como afirma No espaço de intervenção
Daolio (1996), uma pluralidade. da escola, na atualidade, o conte-
Ou, ainda, como assinalam Neira údo de lutas é pouco acessado e,
e Nunes (2006, p. 233), a partir de inclusive, o seu trato pedagógico
um lastro teórico multicultural, suscita questionamentos e preo-
cupações diversas por parte dos
vistas no tempo, na transfor- profissionais atuantes na disciplina
mação de seus significados, na de Educação Física.
sua apropriação para posterior Nascimento e Almeida
transformação, na construção (2007) citam um trabalho de pesqui-
permanente de práticas de sa realizado pelos alunos do curso
significação, as vivências das
de graduação em Educação Física
manifestações da cultura cor-
da Unijuí/Ijuí-RS e Santa Rosa/RS
poral instigadas poderão levar
os discentes a compreender e
e da Uri/Santo Ângelo-RS na disci-
formular opiniões a respeito do plina de Metodologia do Ensino de
mundo em que vivem e aces- Lutas, desenvolvido no primeiro
sar, mesmo que parcialmente, semestre do ano de 2006.
elementos de outras culturas. O trabalho, um quesito
Nesta perspectiva, acreditamos exigido na disciplina citada, cons-
40

tou de pesquisa de campo de caráter os conteúdos da área, verificaram


qualitativo, em que, balizados por que muitos conteúdos, como o de
algumas questões norteadoras, os “lutas”, não são referendados pela
acadêmicos entrevistaram profes- escola, devido à insegurança e à
sores de Educação Física que atuam falta de preparo e/ou domínio dos
em escolas locais. Basicamente, o professores.
que se buscou verificar foram as Ao tratamos a abordagem
concepções dos professores sobre pedagógica do conteúdo de lutas na
o conteúdo de lutas na disciplina escola, não podemos desmerecer que
de Educação Física, as intervenções há estranhamentos, como evidencia-
já realizadas e as formas como per- ram as pesquisas citadas. Os argumen-
cebem que o tema deve ser tratado tos favoráveis e contrários, porém,
pelo componente curricular. devem ser entendidos como elemen-
Entre outras constatações, tos importantes a serem analisados
foi possível perceber que a maioria no embate em torno da validação do
dos professores reconhece a indica- tratamento e da forma de tratamento
ção e a importância desse conteúdo, de um novo conteúdo no contexto da
porém, mencionam fatores limi- Educação Física escolar.
tantes para o seu trato pedagógico.
Citam a falta de subsídios teórico- Revisão de literatura
práticos, a ausência deste tema nos
seus cursos de graduação, a falta Encontramos na literatura
de vivência pessoal dessas práticas, da área de Educação Física algumas
assim como a preocupação com o tentativas de sistematizar o conte-
fator violência, que julgam estar údo de lutas, porém, em muitos
intrínseco a essas atividades3. Estes casos, com o foco voltado a uma
indicadores também foram percebi- ou outra modalidade de luta em
dos por Ferreira (2005), em trabalho específico.
de pesquisa semelhante. Rosário e Olivier (2000) fundamen-
Darido (2005), num trabalho que tou e sistematizou o conteúdo
objetivou compreender princípios de lutas para a Educação Infantil,
utilizados pelos professores de apresentando, inclusive, uma sé-
Educação Física para sistematizarem rie gradual de atividades ou jogos

3 Nascimento e Almeida (2007), em seus relatos de intervenção e análise contextualizada, de certa


forma relativizaram o argumento de que a “falta de vivência pessoal” em “lutas” por parte do
profissional de Educação Física e o fator “violência” impedem o trato pedagógico deste tema/
conteúdo na disciplina curricular de Educação Física.
Ano XX, n° 31, dezembro/2008 41

que contemplam diversas lógicas utilizando-se, para isto, atividades


das lutas (tocar/golpear, derrubar, de oposição ou jogos de luta. Esta
imobilizar). Essa elaboração situa- forma de conceber as atividades
se num projeto específico que visa para o trato com o conteúdo de
auxiliar na resolução de conflitos lutas, que tem como característica
em sala de aula, superar a violência principal a estimulação da inteligên-
e buscar a estruturação e a melhora cia tática, fica no extremo oposto a
das relações interpessoais. metodologias centradas na reprodu-
Carratalá (s/d), Amador ção e repetição de gestos específi-
(1995) e Castarlenas (1990), no cos das lutas, típicos nos processos
contexto espanhol, desenvolveram de especialização precoce.
suas propostas para o ensino do No Brasil, Júnior e Ferreira
judô. Em comum, estas propostas (1999), de maneira diferente dos
defendem o ensino do judô median- autores já citados, desafiaram-se a
te uma metodologia ativa, baseada pensar na sistematização de uma
na resolução de problemas, desvin- proposta de ensino do judô para a
culada da ideia de especialização Educação Física escolar, pautada
precoce, contrapondo-se aos mo- na ótica denominada de crítico-
delos metodológicos que primam superadora. Nesta proposta perpas-
pelo ensino técnico, desvinculado sa uma visível preocupação com
de ações contextualizadas de luta. o estudo de questões históricas,
Estes autores não explicitam em sociais e culturais relacionadas ao
suas propostas, preocupação direta judô, além das técnicas que lhe são
com questões de ordem histórica constituintes.
e sociocultural, que entendemos Também no Brasil, Souza
conter significativos conhecimentos e Oliveira (2001) apresentaram
a serem estudados. proposta de sistematização da ca-
Os trabalhos de Olivier poeira para o Ensino Fundamental
(2000), Carratalá (s.d), Amador e Médio, igualmente demonstrando
(1995) e Castarlenas (1990), os preocupação quanto a aspectos
últimos três elaborados com vistas históricos e socioculturais e com
ao ensino do judô, trazem em co- uma maior integração da Educação
mum a compreensão de que nos Física e o tema capoeira com outras
primeiros anos escolares devem disciplinas escolares. Estes autores
ser contempladas habilidades e ou propuseram um trabalho específico
competências genéricas de luta, com técnicas próprias da capoeira,
42

linearmente desenvolvidas, e ou corpo do trabalho, perpassam-no,


gradualmente compartimentaliza- constituindo no momento, a nos-
das nas específicas séries ou anos sa concepção de Educação Física
escolares. escolar, entendemos ser possível
Carreiro (2005) justifica explicitar de maneira fundamenta-
e fundamenta estratégias didáticas da, nosso entendimento atual sobre
possíveis para o trato pedagógico do a organização e trato pedagógico
tema “lutas” a partir da perspectiva deste conteúdo na escola.
da cultura corporal de movimento,
enfatizando o conhecimento em Categorias epistemológicas
detrimento de um mero fazer, pon- de referência para a constru-
tuando aspectos como lutas e mídia, ção do currículo escolar em
concentração e filosofia. O autor Educação Física
considera ainda o trato pedagógico
do conteúdo nas três dimensões: con- Primeiramente, optamos
ceitual, procedimental e atitudinal. em visualizar o lugar do conteúdo
Freitas (2007) teve como de lutas no currículo escolar de
uma das intenções de seu trabalho, Educação Física para depois espe-
demonstrar a “aplicabilidade da cificar os objetivos, exemplificar
motricidade das lutas no âmbito conteúdos para cada etapa escolar
escolar e sua importância”. O autor e delinear características das ativi-
cita “movimentos de lutas básicos” dades e do método de ensino.
que podem ser estimulados pelo Para situarmos os lugares
do conteúdo de lutas num projeto
professor de Educação Física: “chu-
de currículo escolar para o Ensino
tar, socar, cair, rolar, esquivar, agar-
Fundamental e assim melhor visu-
rar e projetar”. O trabalho nas três
alizá-los, levamos em consideração
dimensões do conteúdo também é categorias epistemológicas e seus
indicado pelo autor. desdobramentos, que foram expli-
Ao analisarmos estas pro- citadas por González (2004/2005)
duções acadêmicas e somarmos como referência para a construção
algumas de suas contribuições às de um Projeto Curricular-Guia para
reflexões pedagógicas preconizadas a Educação Física Escolar.
por Daolio (1996), Neira e Nunes As categorias epistemo-
(2006), Kunz (1994), Fensterseifer lógicas de referência e seus res-
(2001), Betti (1998), além de outros pectivos sub-eixos foram assim
autores que, mesmo não citados no especificadas:
Ano XX, n° 31, dezembro/2008 43

Categoria Motricidade

Sub-eixos Percepção do corpo e Habilidades motoras de Capacidade de jogo


ambiente base

Categoria Cultura Corporal de Movimento

Sub-eixos Esporte Ginástica Atividades rítmicas Jogo motor Atividades na


e expressivas natureza

Representações Sociais sobre as


Categorias
Práticas da Cultura Corporal de Movimento
Temas da cultura corporal de Temas da cultura corporal de
Sub-eixos
movimento - corpo e sociedade movimento e saúde

Organização e trato pedagógi- dades motoras básicas de exigência


co do conteúdo de “lutas” nas comum às lutas e estimular o desen-
respectivas etapas escolares volvimento da capacidade de tomada
de decisões específicas, que são de-
1) Anos iniciais do Ensino mandadas em situação de oposição,
Fundamental ou seja, a capacidade de jogo;
em uma segunda etapa: tematizar as
Considerando a categoria
lutas, compreendendo-as como cria-
epistemológica “motricidade” e seus
ções humanas, com características e
sub-eixos: “habilidades motoras de
base” e “capacidade de jogo”, assim lógicas diferenciadas, vivenciando-
como a categoria epistemológica as, (re)construindo-as e ou as (re)
“cultura corporal de movimento” e significando, num processo coletivo
o sub-eixo “esporte”, teremos para de estudo e apropriação das suas
os anos iniciais do Ensino Funda- lógicas e seus elementos básicos
mental os seguintes objetivos: que lhe são estruturantes.
numa primeira etapa: gradualmente Temos como possíveis
mobilizar e desenvolver as habili- conteúdos4 de ensino:

4 Ao exemplificar neste estudo (com o auxílio da literatura), como referência, alguns possíveis
conteúdos de ensino, não houve a preocupação em esgotá-los, nem em citá-los e classificá-los nas
dimensões conceituais, procedimentais e atitudinais. Cada professor, estudioso do tema, poderá
aprofundá-los e classificá-los de acordo com seus objetivos e planejamentos.
44

a) desempenhar papel de As atividades práticas a


atacante e defensor; situar- serem propostas devem, como
se nos espaços; deslocar- propõe Castarlenas (1990 apud
se nos diversos planos, ESPARTERO; GUTIÉRREZ, 2004),
atacando e defendendo; ser as atividades de luta não co-
coordenar seus desloca- dificadas (atividades de luta sem
mentos; mudar de posição a complexidade técnico-tática das
em função do adversário; lutas formais), o que podemos cha-
b) desenvolver e dispo- mar, segundo Amador (1995), de
nibilizar ações motoras jogos de oposição e ou jogos de
específicas (agarrar, reter, luta. Estas atividades contemplam
desequilibrar, imobilizar, ações motoras comuns às diversas
esquivar-se, resistir, livrar- formas de luta, como “empurrar,
se) e essenciais em situ- puxar, desequilibrar, golpear, etc”,
ação de ataque e defesa além de todas as questões de ordem
nas suas diversificações cognitiva e sócio-afetiva intrínseca
possíveis, combinando-as às mesmas (OLIVIER, 2000, p. 20;
e encadeando-as inteligen- CASTARLENAS, 1990 apud ESPAR-
temente com vistas aos TERO; GUTIÉRREZ, 2004, p. 7).
fins desejados; Nesta fase, conforme Da-
c) apreciar as distâncias, o olio (1996, p. 2), as atividades são
momento de intervenção vivenciais, pois “devem propiciar
e a retomada de curso nas uma ampla gama de oportuni-
suas ações, em função da dades motoras, a fim de que o
reação de seu oponente e aluno explore sua capacidade de
ou do resultado obtido; movimentação, descubra novas
d) compreensão, apropria- expressões corporais, domine seu
ção e construção das regras corpo em várias situações, experi-
e normas das atividades; mente ações motoras com novos
e) analisar e compreender implementos, com ritmos variados,
sobre a lógica intrínseca a etc”. Será construída a ideia de se
cada modalidade de luta; opor, de combater, de lutar, através
f) adaptar, construir, (re) do jogar, de forma gradual, ativa e
construir lutas a partir de contextualizada. É o que Amador
suas lógicas, adaptando- (1995, p. 366) denominou etapa de
as ao contexto da turma, “Pré-luta”, que comporta as fases de
da escola e da Educação aproximação macrogrupal e micro-
Física. grupal. Inicia-se com tarefas moto-
Ano XX, n° 31, dezembro/2008 45

ras com grau menor de oposição, o pectivos sub-eixos, teremos para os


que permite, inclusive, gerenciar o anos finais do Ensino Fundamental
aspecto principal que está intrínseco o seguinte objetivo: proporcionar o
às atividades de luta, que é o fator estudo e as vivências5 de elementos
medo ou o exagerar na ação que técnico-táticos básicos das práticas
fica mais evidente quando está em de capoeira, karatê e judô6 e estudar
jogo o contato corporal total. Aos as dimensões históricas, sociais,
poucos é possível passar a graus culturais e filosóficas, intrínsecas a
maiores de oposição até chegar à essas atividades, e outras questões
luta corpo a corpo que, para Ama- relacionadas.
dor (1995), se constitui na etapa de Os conteúdos podem ser
luta que comporta a fase de aproxi- assim visualizados:
mação dual. È importante começar a) conhecimentos sobre
a favorecer o desenvolvimento da o que estrutura as ativi-
capacidade de análise, modificação dades: rituais, filosofias,
e ou criação das regras e acordos códigos, símbolos, regras,
de forma coletiva nas atividades, organização;
assim como as (re)leituras das lutas b) conhecimentos da di-
mais conhecidas, adaptando-as ao mensão técnico-tática:
universo infantil e escolar. elementos técnicos bási-
cos (bases/posturas, gol-
pes de ataque, golpes de
2) Anos finais do Ensino Fun- defesa), princípios táticos
damental elementares (movimen-
tações intencionais de
Considerando a categoria caráter tático, contragol-
epistemológica “práticas da cultura pes, fintas, apreciação das
corporal de movimento” e o sub-ei- distâncias...);
xo “esporte”, assim como a catego- c) conhecimentos de cará-
ria epistemológica “representações ter crítico: brigas x espor-
sociais sobre as práticas da cultura tes de luta x artes marciais,
corporal de movimento” e seus res- a violência nas lutas, riscos

5 Segundo Sbórquia e Galhardo (2006), é possível abordar conteúdos de Educação Física através de
vivências. Nessas situações, “o interesse pedagógico não está centrado no domínio técnico dos
conteúdos, mas no seu domínio conceitual, na perspectiva de um saber sistematizado que supere o
senso comum, inserido num espaço humano de convivência, em que possam ser vivificados aqueles
valores humanos que aumentem o grau de confiança e de respeito entre os integrantes do grupo”.
6 Não é descartada a possibilidade de vivência de outras modalidades de luta, como a esgrima,
por exemplo.
46

dos esportes de luta, a do o senso crítico, estaríamos, con-


presença da mulher nos forme Neira e Nunes (2006, p. 233),
esportes de luta, a forma- possibilitando a tematização junto
ção do mestre em artes aos alunos deste tema/conteúdo, o
marciais/lutas, a multipli- que tem implicação na percepção
cação dos estilos de lutas, e estudo dos “sentidos produzidos
lutas clandestinas, doping culturalmente” e manifestados nes-
nas lutas, qualidade dos tas práticas, ou seja, “as relações
serviços prestados em de poder, as questões do consumo,
academias de lutas, méto- gênero, classe, entre outras”. Nos
dos de treinamento, artes aproximaríamos, assim, do enten-
marciais e a relação com o dimento de Fensterseifer (2001, p.
crime e a política... 272), de que a legitimidade escolar
Quanto às atividades a da Educação Física estaria na “pro-
serem desenvolvidas podemos dução de um conhecimento crítico
citar: pesquisas, leituras, debates, a partir de seus conteúdos”.
palestras, visitações, análises de Durante todo o processo
vídeo, de filmes ou de fotos, ence- de ensino-aprendizagem é preciso
nações, produção textual, produção estimular a capacidade de análise,
de áudio-visual, mostra fotográfica, reflexão, compreensão, co-decisão,
vivência prática de elementos téc- interação, diálogo, criação e (re)
nicos e aspectos táticos básicos e criação coletiva de novas possibili-
específicos (individualmente e em dades e acordos (DAOLIO, 1996).
duplas), releitura ou criação de ou- Acreditamos que a metodologia de
tras possibilidades de regras ou de ensino-aprendizagem, ao privilegiar
rituais, releitura ou criação de outras estes aspectos, amplia a estimulação
formas de ataque e defesa segundo e o desenvolvimento de capacida-
lógicas diferenciadas de luta. des e ou habilidades humanas para
A temática de caráter his- além da exercitação física somente,
tórico, cultural e social deve estar no sentido do estímulo-resposta,
mais presente nas etapas finais e para além da ênfase na aquisi-
do Ensino Fundamental, pois aí o ção do gesto motor específico de
educando já possui a capacidade determinada modalidade de luta,
de abstrair e relacionar fatos, as- visando ao rendimento esportivo
sim como uma maior capacidade exclusivamente. Isto significa,
de percepção crítica da realidade segundo Kunz (1994), que além
(DAOLIO, 1996). Ao trabalhar estas de uma competência objetiva/ins-
dimensões do conteúdo, estimulan- trumental é necessário oferecer a
Ano XX, n° 31, dezembro/2008 47

possibilidade de desenvolvimento seu cotidiano de vida, no caso de


das capacidades de interação social passarem num momento ou outro
e comunicativa. a terem contato com alguma ativi-
dade de luta, como praticante ou
Considerações Finais expectador7. É imprescindível que
da releitura de cada profissional,
Na perspectiva deste es- considerando as peculiaridades de
tudo, a escola definitivamente não cada contexto escolar, resultem in-
será o local de formação do “luta- tervenções práticas fundamentadas,
dor” de específica modalidade de e que as mesmas sejam socializa-
luta, e sim do cidadão que poderá: das, experimentadas, confrontadas,
experimentar, usufruir da experiên- debatidas e avaliadas, contribuindo
cia singular de se opor em situação assim para enriquecer o processo de
de combate corporal, contemplar e construção de um corpo de conhe-
formar opinião em relação a estas cimentos significativos a respeito
atividades e a respeito de suas tra- deste tema.
jetórias históricas, a forma como se
apresentaram no passado e se apre-
sentam na atualidade nos diversos Referências
segmentos sociais juntamente com
os significados que foram e lhe são AMADOR, F. La enseñanza de los
atribuídos. Esta possibilidade pode deportes de lucha. In: SÁNCHEZ,
ser fomentada a partir de vivências Bañuelos F. Didáctica de la
e leituras críticas, inicialmente es- Educación Física y el deporte.
timuladas na escola, que poderão Madrid: Gimnos, 1995.
ser posteriormente recuperadas ARROYO, Miguel G. Imagens
e reformuladas pelos alunos no quebradas: trajetórias e tempos de

7 Em conversa pessoal, um professor de Karatê, ao relatar como havia chegado até sua iniciação
nesta prática, explicou que inicialmente realizara uma observação duradoura, em várias academias
de Karatê, até se decidir a respeito daquela que mais lhe agradasse e combinasse com o conceito
que tinha desta luta. Tal atitude presume um conhecimento e posicionamento prévio a respeito do
Karatê por parte do professor citado, o que de certa forma lhe deu capacidade de julgamento. Se
a pessoa não tiver o mínimo de acesso e leitura crítica a respeito daquilo que se coloca para sua
apreciação, daquilo que está a praticar ou do que um dia poderá se tornar aprendiz, como no caso
de alguma prática de luta, será mais fácil de ser levada por modismos, aparências e estimulações
da mídia. Sabemos também que há certo descontrole na proliferação das chamadas “academias
de luta”, assim como uma gama enorme de atribuições de significados a estas práticas, que nem
sempre estão relacionadas a comportamentos sociais, considerados mais aceitáveis, ou a uma
relação mestre x discípulo das mais sadias. Esta estimulação do senso crítico, acreditamos, deva
fazer parte do trabalho pedagógico do professor de Educação Física.
48

alunos e mestres. 3. ed. Petrópolis, ESPARTERO, J.; GUTIÉRREZ, C. El


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Physical Education and Sport Journal
[v. 16 | n. 1 | p. 99-107 |2018]
RECEBIDO: 28-02-2018
APROVADO: 21-03-2018

ARTIGO ORIGINAL
DOSSIÊ LUTAS

Possibilidades do ensino das lutas na escola:


uma pesquisa-ação com professores de educação física
Possibilities of school fighting teaching:
an action research with physical education teachers
DOI:

Bernhardt Hegele, Fernando Jaime González, Robson Machado Borges


Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí)

RESUMO
Esta pesquisa buscou verificar quais são as consequências de uma experiência de formação colaborativa, nas concepções de
professores acerca da abordagem das lutas nas aulas de educação física escolar. Para tanto, operou-se metodologicamente
com a realização de uma pesquisa-ação com quatro docentes de Educação Física que atuam em escolas públicas no interior do
Rio Grande do Sul. Os professores, juntamente com um dos pesquisadores, constituíram um grupo de estudos que se reuniu
semanalmente em oito encontros, com o intuito de refletir sobre a abordagem das lutas na educação física escolar. Os resultados
indicam que, inicialmente, os professores não se sentiam em condições de tematizar as lutas na escola. Especialmente, porque
não tiveram um componente curricular específico em sua formação inicial. No entanto, após a realização do estudo, os docentes
compreenderam que é possível trabalhar com as lutas nas aulas de educação física. Os principais fatores que geraram essa
alteração foram o estudo dos jogos de lutas e sua classificação com base nas distâncias, a produção de tarefas durante os
encontros e a vivência corporal nas reuniões.
PALAVRAS-CHAVE: Lutas; Educação Física escolar; Pesquisa-ação.

ABSTRACT
This research sought to verify the consequences of a collaborative training experience, in the conceptions of teachers about
the approach of the struggles in the School Physical Education classes. For that, it was operated methodologically with the
accomplishment of an action research with four physical education teachers who work in public schools in the interior of
Rio Grande do Sul (Brazil). The teachers, together with one of the researchers, constituted a study group that met weekly in
eight meetings, in order to reflect on the approach of the struggles in physical school education. The results indicate that,
initially, the teachers did not feel able to thematize the struggles in the school. Especially, because they did not have a specific
curricular component in their initial formation. However, after the study, teachers understood that it is possible to work with the
struggles in physical education classes. The main factors that led to this change were the study of the games of fights and their
classification based on distances, the production of tasks during the meetings and the corporal experience in the meetings.
KEYWORDS: Fights; School Physical Education; Action research.

Direitos autorais são distribuídos a partir da licença


Creative Commons
(CC BY-NC-SA - 4.0)
HEGELE et al.
100 Possibilidades do ensino das lutas na escola: uma pesquisa-ação com professores de educação física

INTRODUÇÃO

As lutas corporais1 fazem parte da cultura corporal do brasileiro e, atualmente, são bastante difundidas
pelos meios de comunicação (televisão, jornais, rede mundial de computadores, entre outros). Os microdados
do suplemento de “Práticas de esporte e atividade física”, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(IBGE, 2017) permitem estimar que, entre as pessoas que declaram praticar esporte ou atividade física, 1,7%
praticam “lutas/artes marciais”.
Nessa linha, os eventos de luta na mídia, as propagandas das academias e dos clubes, os inúmeros
filmes com a temática, são cada vez mais comuns. Além de seu caráter contemporâneo e midiático, Rufino e
Darido (2015, p. 22) destacam a característica histórica e cultural das lutas afirmando que “[...] são práticas
historicamente importantes e que acompanharam os seres humanos ao longo do tempo, sendo umas das mais
elementares manifestações [da] cultura”.
Nesse sentido, entendemos que a escola – mais precisamente a Educação Física – precisa assumir a
responsabilidade de tematizar essa prática corporal histórica, como tema de ensino, conforme consta nos
Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), na Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2017) e é
defendido por vários autores (BETTI, 2013; GONZÁLEZ; FRAGA, 2012, entre outros). No entanto, o ensino das
lutas nas aulas de Educação Física escolar é algo bastante raro, uma vez que a maioria dos professores não o
desenvolve (MATOS et al., 2015; RUFINO; DARIDO, 2011). Com isso, “[...] há um distanciamento entre o que
é previsto para se ensinar e o que é efetivamente ensinado nas escolas” (MATOS et al., 2015, p. 119), mesmo
com o aumento das investigações sobre as lutas e as artes marciais nos últimos anos (HEROLD JÚNIOR, 2016).
Desse modo, as lutas se constituem como um dos temas da Educação Física escolar que encontram
maior resistência por parte dos professores, havendo preconceitos em relação ao seu ensino. Segundo Matos
et al. (2015), os preconceitos se relacionam com a falta de espaço, vestimentas e materiais adequados e,
também, pela associação às questões de violência. Sobre isso, Rufino e Darido (2015, p. 57) afirmam que “[...]
os preconceitos estão cristalizados, o que torna ainda mais difícil significá-los. Nesses casos, será necessário
‘lutar’ para quebrar determinados paradigmas que possam prejudicar o ensino das lutas na escola”.
Alguns desses preconceitos, relacionam-se com o fato de a formação inicial encontrar dificuldades
para assegurar aos professores condições efetivas de trabalho com essa temática. Afinal, “apesar da previsão
curricular oficial e da inclusão da discussão sobre lutas na formação de professores [...]” (RUFINO; DARIDO,
2015, p. 120), muitos docentes alegam que não tiveram um componente curricular acerca do assunto no
período de graduação em Educação Física. Outros, mesmo tendo, não se sentem preparados para desenvolver
o seu ensino para os alunos (MATOS et al., 2015).
Sobre as fragilidades da formação inicial em Educação Física, Castellani Filho (2011) entende que a
maioria dos cursos ainda tem uma lógica de formação profissional do século passado, o que dificulta uma
evolução da área no Brasil. Na mesma linha, Zeichner e Diniz-Pereira (2005, p. 66) alertam para os limites
da graduação, apontando que “não podemos confiar apenas no conhecimento gerado na universidade para
formação profissional [...]”. Segundo os referidos autores, é possível “[...] no máximo formar profissionais para
iniciarem sua prática” (ZEICHNER; DINIZ-PEREIRA, 2005, p. 66).
A quase inexistência do ensino das lutas nas aulas de Educação Física ganha um reforço na pouca
produção científica sobre o tema. Num estudo realizado por Correia e Franchini (2010), os autores constataram
que dos 2.561 trabalhos acadêmicos publicados em periódicos nacionais, entre 1998 e 2008, apenas 75, ou
seja, menos de três por cento, abordavam a temática das lutas.
Neste cenário, perece fundamental a realização de investimentos que contribuam para uma alteração
na concepção dos professores sobre o ensino das lutas na Educação Física escolar. Particularmente, a pesquisa-
ação tem sido apontada como um tipo de investigação bastante eficaz para o estudo com professores (BETTI,
2013; TRIPP, 2005). No entanto, em relação ao tema “lutas”, parecem raros os estudos colaborativos que se
1
Segundo Correia e Franchini (2010, p. 1) “o termo ‘Luta’ de forma recorrente e dinâmica implica um investimento diversificado de representações e
significados, o que por sua vez, lhe confere uma dimensão polissêmica. Como exemplificação, temos as noções de lutas de classe, dos trabalhadores,
pelos direitos da mulher, pela vida e outros mais”. Neste estudo, utilizamos o termo luta nos referindo a lutas corporais que são práticas geralmente
individuais e que apresentam características de enfrentamento físico direto entre adversários, com regras que conduzem as ações realizadas em um
ambiente estável e sem interferências naturais (RUFINO; DARIDO, 2015).

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Possibilidades do ensino das lutas na escola: uma pesquisa-ação com professores de educação física 101

dedicam a tentar uma alteração na situação atual2. Inquietados por esse contexto, realizamos uma investigação
que tem como objetivo verificar quais são as consequências de uma experiência de formação colaborativa, nas
concepções de professores acerca da abordagem das lutas nas aulas de educação física escolar.

MÉTODOS

A presente pesquisa está pautada em uma abordagem qualitativa. Especificamente, trata-se de uma
pesquisa-ação, “[...] pesquisa na qual as pessoas envolvidas têm participação ativa, e na qual há uma exigência
de conhecimento a ser produzido” (BETTI, 2010, p. 142). De acordo com Thiollent (2011, p. 20), trata-se de

[...] um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação
com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e participantes
representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.

Os sujeitos participantes deste estudo foram quatro professores, com formação em Educação Física,
que atuam em escolas de uma cidade da região Noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Os educadores, dois
homens e duas mulheres, juntamente com um dos pesquisadores, formaram um grupo de estudos. A seguir
descrevemos um breve histórico dos docentes.

- Professor A3: 44 anos, concluiu o curso de graduação em 1998. Atua como docente há 15 anos. Tem
mestrado em Ciências da Educação.
- Professora B: 29 anos, concluiu o curso de graduação em 2010. Atua como docente há dois anos.
- Professora C: 38 anos, concluiu o curso de graduação em 2000. Tem especialização em Educação Física
escolar e mestrado em Ciências do Movimento Humano. Atua como docente há dez anos.
- Professor D: 33 anos, concluiu o curso de graduação em 2009. Atua como professor há três anos. Possui
especialização em Fisiologia do Exercício.

Quadro 1. Temas estudados nos encontros4.


Encontro Temas centrais estudados/discutidos
- Apresentação da proposta de estudos.
1 - Construção coletiva do cronograma das reuniões.
- Conversa inicial sobre o entendimento de lutas na Educação Física.
- Preenchimento de um questionário sobre o contato com lutas na formação inicial.
2 - Escola enquanto instituição democrática.
- Por que ensinar lutas na Educação Física escolar?
- Preenchimento de um questionário sobre o contato com lutas na formação inicial.
3 - Escola enquanto instituição democrática.
- Por que ensinar lutas na Educação Física escolar?
4 - Dimensões dos conteúdos: conceitual, procedimental e atitudinal.
- Classificação das lutas com base nas distâncias.
5 - O que ensinar das lutas na Educação Física escolar?
- Como ensinar as lutas na Educação Física escolar?
6 - Métodos de ensino.
- Tipo de tarefas e sua produção.
7 - Papel do aluno na aula (ativo ou passivo).
- Intervenção do professor.
- Unidade didática.
8 - Plano de aula.
- Sistematização final dos encontros de estudos.

2
A dissertação de mestrado de Rufino (2012b) é um dos escassos estudos.
3
Visando a preservar a identidade dos participantes da investigação, seus nomes foram substituídos pelas letras A, B, C e D. Cabe ressaltar que os pro-
fessores autorizaram a divulgação dos resultados da pesquisa mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

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102 Possibilidades do ensino das lutas na escola: uma pesquisa-ação com professores de educação física

O processo de investigação ocorreu durante oito encontros do grupo de estudos, uma vez por semana,
com duas horas de duração cada dia. Durante as reuniões se procurou criar um clima de confiança, na tentativa
de que os docentes se sentissem confortáveis em dialogar e expressar suas opiniões sobre os assuntos
relacionados ao ensino das lutas na Educação Física escolar. Especificamente, os integrantes do grupo se
reuniam numa sala e dialogavam sobre suas concepções acerca do desenvolvimento das lutas como tema de
ensino da Educação Física. Para facilitar a compreensão do que foi realizado, apresentamos o Quadro 1 com a
síntese dos assuntos tratados nos encontros.
Como recursos para a produção de dados foram utilizados: a) as gravações dos encontros do grupo
de estudos, posteriormente transcritas na íntegra; b) anotações e proposições didáticas elaboradas pelos
docentes, recolhidas ao final das reuniões; c) um questionário sobre o contato com lutas na formação inicial;
d) registros sobre o desenrolar dos encontros, realizados no diário de campo do pesquisador.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para aferir os resultados do estudo, utilizamos uma análise de conteúdo com base em Silverman (2009).
Este autor entende que nesse tipo de análise os pesquisadores estabelecem uma série de categorias definidas,
de modo que, na pesquisa qualitativa, utilizam-se trechos e recortes não tabulados que ilustram categorias em
especial.
Nessa perspectiva, organizamos os resultados em um conjunto de três categorias: (1) o desconhecimento
sobre o ensino das lutas; (2) a relação entre o entendimento do papel da Educação Física na escola e o sentido
atribuído pelos professores aos assuntos/conteúdos estudados; (3) a mudança de concepção dos docentes
sobre o ensino das lutas na Educação Física escolar.
Acerca da primeira categoria, interpretamos que os professores não se consideravam em condições de
desenvolver o tema lutas nas aulas de Educação Física escolar, como se identifica na seguinte fala: “Não tenho
ideia de como ensinar lutas” (Prof. B). O principal motivo apontado por eles é que não tiveram um componente
curricular sobre lutas na formação inicial, pois entendem que seria essencial para ter ao menos uma base de
como trabalhar com essa temática na escola. Esse resultado é semelhante ao encontrado por Matos et al.
(2015), pois dos 26 entrevistados em seu estudo a maioria não cursou um componente curricular relacionado
as lutas na formação inicial.
Assim, é possível pensar que, em boa medida, a graduação não lhes ofereceu condições efetivas para
o ensino dessa temática, como se percebe nas seguintes locuções: “Metodologia das lutas, agora faz parte
do currículo, mas na minha época era optativa, então você não tem um conhecimento das lutas, eu nunca
ia dar aula de lutas, se eu nunca tive uma vivência, nunca soube ensinar” (Prof. C); “Essa proposta é bacana,
é interessante... Eu consegui só agora vivenciar com nosso grupo de estudos as lutas” (Prof. B). Esse achado
é idêntico ao encontrado por Lima (2018), uma vez que o principal motivo apontado pelos professores
participantes de sua pesquisa para não abordar lutas em suas aulas, vincula-se ao fato de não terem cursado
uma disciplina em sua formação inicial que ofereceu saberes suficientes para o ensino na escola. Na mesma
linha, Saldanha (2018) identificou que apesar de os docentes considerarem importante o ensino das lutas na
Educação Física, eles não desenvolvem o tema em suas aulas, pois não se sentirem preparados, apontando que
a graduação não lhes ofereceu os conhecimentos necessários.
Outras evidências sobre isso, são as respostas dos professores no questionário preenchido no segundo
encontro de estudos, em questões relacionadas ao contato com o tema lutas na graduação em Educação Física,
como se observa no Quadro 2.
Analisando a segunda categoria, foi possível identificar que o sentido atribuído pelos professores aos
assuntos estudados nos encontros tem relação direta com o entendimento deles sobre o papel da Educação
Física na escola. Dessa forma, para os docentes A e C – que têm atuações pautadas no entendimento de que a
4
Os assuntos foram propostos com base em González e Bracht (2012), González e Fensterseifer (2009, 2010), Rufino (2012a) e Rufino e Darido (2015).
Também, levamos em consideração a sugestão de Matos et al. (2015, p. 117): “[...] que as formações privilegiem as abordagens estruturadas em simi-
laridades e nos princípios das Lutas”.
5
González e Bracht (2012, p. 77) definem tarefa como “[...] o trabalho, ou atividade indicada pelo professor (eventualmente auto sugerida) a ser execu-
tada pelos alunos, que envolve dificuldades, esforço e/ou prazo determinado”.

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Possibilidades do ensino das lutas na escola: uma pesquisa-ação com professores de educação física 103

Educação Física é um componente curricular responsável por tratar dos diversos temas da cultura corporal de
movimento e por uma proposta de trabalho organizada em conteúdos curriculares e unidades didáticas – os
assuntos estudados foram compreendidos como mais um elemento para inserir na pluralidade de temas que
eles já desenvolvem, visando o aprendizado dos alunos.

Quadro 2. Respostas dos professores a questões relacionadas ao contato com o tema lutas na
graduação em Educação Física.
Professor Respostas dos professores
3) Na sua formação universitária existia uma disciplina específica sobre lutas? Não.
A 4) Como foram trabalhados os conteúdos de lutas na sua graduação? (...)5
5) O seu curso de graduação ofereceu condições para que você inclua a luta em suas aulas? Por quê? (...)
3) Na sua formação universitária existia uma disciplina específica sobre lutas? Não fiz nenhuma disciplina de
lutas.
4) Como foram trabalhados os conteúdos de lutas na sua graduação? Não foram trabalhados, pois não fiz
B nenhuma disciplina, mas lembro que tinha como optativa.
5) O seu curso de graduação ofereceu condições para que você inclua a luta em suas aulas? Por quê? Não sei.
Porque como era optativa não cheguei a fazer esta disciplina.
3) Na sua formação universitária existia uma disciplina específica sobre lutas? Não.
C 4) Como foram trabalhados os conteúdos de lutas na sua graduação? (...)
5) O seu curso de graduação ofereceu condições para que você inclua a luta em suas aulas? Por quê? (...)
3) Na sua formação universitária existia uma disciplina específica sobre lutas? Optativa apenas.
4) Como foram trabalhados os conteúdos de lutas na sua graduação? Como Disciplina optativa, a qual não
D cursei.
5) O seu curso de graduação ofereceu condições para que você inclua a luta em suas aulas? Por quê? Sim,
ofereceu como optativa e não fazendo parte da grade curricular.

Ao contrário, os professores B e D têm uma visão diferente do papel da Educação Física na escola,
pensam o componente curricular como um espaço de recreação sem o foco no aprendizado dos alunos. Eis
uma fala nessa linha: “Eu topo sim participar do grupo, mesmo sabendo que não vou usar nas aulas, mas vai
ser legal para aprender umas brincadeiras novas” (Prof. B). Nesse sentido, interpretamos que os docentes B
e D perceberam os assuntos estudados no grupo de estudos como um repertório de atividades para serem
“aplicadas” nas aulas, descontextualizadas de uma unidade de ensino estruturada para desenvolver um tema
específico.
Nessa perspectiva, parece necessário o cuidado ao desenvolver estudos colaborativos visando alteração
de concepção de professores de Educação Física para não desvincular um tema estudado do sentido que
os docentes atribuem ao componente curricular. A nosso ver, nesse estudo, a compreensão do papel dessa
disciplina na escola influenciou a concepção sobre uma possível utilização dos assuntos estudados.
Na última categoria estabelecida, constatamos o acontecimento de uma mudança de concepção dos
professores sobre o ensino das lutas na Educação Física escolar. Entendemos que os docentes aprenderam
mais acerca das lutas do que sabiam antes do estudo. Os professores A e C, especialmente, compreenderam
que é possível trabalhar com esse tema na escola numa perspectiva crítica e reflexiva, possibilitando assim
o aprendizado dos alunos. Nesse sentido, pensamos que quatro fatores principais tiveram destaque nesse
processo: 1) o estudo dos jogos de lutas; 2) o estudo da classificação das lutas com base nas distâncias; 3)
a produção de tarefas durante os encontros; 4) a vivência corporal das lutas pelos professores durante as
reuniões.
A produção de conhecimento conceitual dos docentes sobre das lutas começou a ocorrer a partir do
momento em que foram estudados os jogos de lutas, como possibilidade de abordar aspectos universais dessa
prática corporal6. Com isso, eles perceberam que é possível desenvolver as lutas como uma criação histórica
da humanidade através de enfrentamentos corporais e não apenas com algumas modalidades específicas7
5
Utilizamos o símbolo (...) para representar questões “em branco”, uma vez que não foram respondidas pelos professores
6
Como aponta Gomes (2008, p. 11), destacando aspectos vinculados à lógica interna, “[...] as Lutas dispõem de princípios condicionais (contato pro-
posital, fusão ataque/defesa, oponente/alvo, imprevisibilidade e regras) determinantes para a compreensão e leitura da dinâmica interna de qualquer
prática de Luta, que solicitam o pensamento tático e a criação de técnicas para solução dos problemas num combate”.
7
Segundo Gomes (2008, p. 11) “[...] o ensino fragmentado em modalidades na iniciação tende a restringir o universo de possibilidades inerentes aos

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104 Possibilidades do ensino das lutas na escola: uma pesquisa-ação com professores de educação física

(esportes de combate8), como se percebe na manifestação do professor D: “Até fica fácil pelas dinâmicas
de fazer, porque antes, as lutas tu já pensa em soco e chute, em se machucar, daí tu pensa, não vou levar
pra escola lutas se tu não consegue trabalhar, mas essas atividades são bem simples, bem lúdicas, daí tu já
consegue trabalhar”. Segundo Matos et al. (2015), alguns professores participantes do seu estudo entendem
que atividades relacionadas às lutas estimulariam atitudes impróprias, como a agressividade.
Contudo, foi a partir do momento em que o grupo estudou a classificação das lutas com base nas
distâncias e nas ações estabelecidas9, que os professores tiveram uma compreensão mais clara da possibilidade
de trabalhar com o tema na Educação Física escolar, sem precisar ser faixa preta ou ter experiência com algum
tipo de esporte de combate. Percebemos isso através das expressões e declarações dos professores, como
por exemplo: “[...] ter a classificação das lutas pra mim foi o auge da coisa, do nosso estudo, no sentido de
dar significado” (Prof. C); “Como é legal agora poder fazer essa distinção com essa classificação, daí já é outro,
tu vai garantir uma de cada, pode trabalhar muito melhor” (Prof. A); “Nossa, a gente não tinha nem ideia de
que as lutas podiam ser classificadas desse jeito” (Prof. A); “Bom, lutas também entram numa classificação,
a classificação é essa, daí eu posso, qualquer luta que eu for trabalhar, a gente encaixa nessa classificação....
Agora eu já posso fazer uma unidade didática.... Bem legal assim” (Prof. C).
Essas falas indicam que a pesquisa começou a oferecer os frutos mais concretos, pontualmente a
partir do estudo da classificação das lutas com base nas distâncias, ocorrido no quinto encontro. Matos et
al. (2015, p. 124) defendem que classificações desse tipo “[...] permitem ao professor melhor sistematizar
seu planejamento no sentido de abordar as Lutas partindo de seus princípios operacionais, envolvendo,
desta forma, muitas modalidades diferentes, mas com características semelhantes”. Assim, ao realizar outro
trabalho nessa perspectiva acreditamos que esse conteúdo, em particular, poderia ser trabalhado mais cedo,
despertando previamente o interesse e a própria evolução do conhecimento dos professores.
Na mesma linha, uma opção metodológica positiva que colaborou na mudança de concepção dos
docentes foi solicitar que produzissem tarefas durante os encontros. O fato de experimentar a proposição
de atividades em grupo, de acordo com a classificação de lutas, como consta no Quadro 3, proporcionou um
domínio maior sobre o tema. Essa ação pode gerar boas possibilidades para trabalhar com as lutas em suas
aulas de educação física na escola.

Quadro 3. Produção de tarefas* durante os encontros.


Professor(a) Tarefas propostas pelos professores
Curta: Um de frente para o outro de joelhos. Vence a luta aquele que conseguir
apenas com as mãos desequilibrar o adversário colocando-o no chão, ou tirando
A um dos joelhos do chão.
Média: Em pé um de frente para o outro. Vence a luta aquele que conseguir tocar
três vezes as costas do adversário.
Curta: Cada aluno num quadrado do tatame, agarram-se as mãos, um empurran-
do o outro, quem tirar o oponente do tatame ganha.
B Média: Pega lenços: colocar o lenço atrás da bermuda, um tenta roubar do outro,
quem pegar mais ganha.
Curta: Briga de galo: Em duplas, frente a frente, agachados. Ao sinal devem
tentar desequilibrar o adversário com o uso das mãos, permanecendo sempre em
movimento (pequenos saltinhos).
C Média: Varal: em duplas, cada um da dupla com um prendedor de roupa preso
na camiseta (ombros). Ao sinal o objetivo é retirar os prendedores do adversário.
Podem ser feitos de forma individual (contra grupo) cada um cuidando todos.
Curta: Dois a dois, em pé, cada aluno apoia as mãos no ombro do colega. Em de-
terminado sinal o aluno deve empurrar, utilizando apenas a força, o colega para
fora do espaço determinado.
D Média: Dois a dois, os alunos frente um ao outro, ao sinal cada aluno deve tocar
com a mão o ombro do colega, e ao mesmo tempo não deixar que o colega toque
o seu ombro. Sendo ataque e defesa.
* Em função do limite de espaço desse texto, apresentamos apenas as proposições de tarefas para dois tipos de
distâncias, conforme a classificação de Rufino e Darido (2015).

conteúdos deste conhecimento [...]”.


8
González e Bracht (2012, p. 24) definem esportes de combate como “[...] disputas nas quais uns tentam vencer os outros por meio de toques, dese-
quilíbrios, imobilização, exclusão de um determinado espaço e, dependendo da modalidade, por contusões, combinando ações de ataque e defesa (por
exemplo: boxe, esgrima, jiu-jítsu, judô, karatê, luta, sumô, taekwondo etc.)”.
9
Em sua dissertação de mestrado, Gomes (2008) apresenta – de modo inovador no Brasil – um levantamento das classificações atribuídas às lutas,
pautando-se nas ideias de diversos autores, principalmente de Espartero (1999).

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Possibilidades do ensino das lutas na escola: uma pesquisa-ação com professores de educação física 105

Um quarto fator que influenciou na alteração de concepção dos professores sobre o ensino das
lutas na educação física escolar, foi a vivência corporal durante os encontros de estudo. A condição de eles
desempenharem corporalmente tarefas em que precisavam realizar ações táticas e técnicas, visando o corpo
do oponente para superá-lo, possibilitou uma melhor apropriação dos assuntos estudados conceitualmente,
como manifesta o professor A: “Agora, tipo, lendo o livro e com essas práticas nos encontros, dá pra ter uma
baita noção”. De algum modo, a ideia de ensinar lutas passou a fazer sentido para os docentes. Como apontado
em Borges (2014), se os professores precisam ser ensinados a ensinar, isso precisa ocorrer também na prática.
Nesse contexto, entendemos que após o estudo os docentes passaram a acreditar na possibilidade de
trabalhar com o tema lutas na Educação Física escolar e demonstraram certo domínio a respeito dos assuntos
discutimos nos encontros. Assim, ocorreu uma alteração do fato de que os professores não se sentiam
preparados para desempenhar o ensino das lutas na escola, para o entendimento de que agora compreendem
a possibilidade de se trabalhar com o tema em suas aulas. O professor A, inclusive, realizou uma aula sobre
lutas com seus alunos na escola em que atua, com base nas vivências corporais que o grupo de estudos teve
no quinto encontro e relatou:

A turma de quinta, minha agora, fiz a aula daquele dia que nós fizemos lá... Foi bem tranquilo assim,
expliquei os jogos de luta, de curta, média, longa distância, o que eles compreendiam de lutas e tal.
Daí cada um deu a sua opinião, daí expliquei aquele resumo de lutas e fiz umas atividades práticas. Fiz
aquela de colocar o colete atrás, daí essa eles gostaram mais [...].

Com isso, é possível pensar que professores que historicamente não desenvolvem a abordagem das
lutas nas aulas de Educação Física escolar, podem passar a realizar tal ação se forem oferecidas condições
efetivas para tanto. Dito de outro modo, a partir do momento no qual os docentes tomam contato com uma
proposta para o ensino das lutas que faça sentido para eles, os professores têm condições – após um tempo de
estudos – de trabalhar com um tema no qual não adquiriram conhecimento na formação inicial. Como defende
Behrens (2007), a concepção que constitui a ação docente pode ser mudada ao longo do percurso profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho consistiu em verificar quais são as consequências de uma experiência de
formação colaborativa, nas concepções de professores acerca da abordagem das lutas nas aulas de Educação
Física escolar. Inicialmente, identificamos que os docentes não se percebiam em condições de tematizar as
lutas nessa disciplina por não se sentirem preparados, uma vez que julgavam não possuir conhecimento
suficiente. Especialmente, porque não tiveram um componente curricular sobre a temática na formação inicial.
Após a realização da investigação os resultados indicam que os docentes aprenderam mais sobre as lutas do
que sabiam antes do estudo, particularmente em relação ao conhecimento conceitual. Mais precisamente,
perceberam que é possível trabalhar com as lutas na escola pautados em classificações e aspectos universais
dessa prática corporal. No mesmo sentido, compreenderam a importância de tratar das lutas numa perspectiva
crítica e reflexiva.
Os principais elementos que permitiram a alteração de concepção dos docentes foram o estudo dos
jogos de lutas e de sua classificação com base nas distâncias, a produção de tarefas e a vivência corporal
durante os encontros. Esse conjunto de fatores permitiu entender que é possível o ensino das lutas na escola
sem ter uma experiência como lutador em um esporte de combate específico.
Durante o processo de estudo, percebemos que o sentido atribuído pelos docentes aos assuntos
estudados nos encontros está diretamente relacionado com o entendimento que possuem sobre o papel da
Educação Física na escola. Com isso, conjeturamos que os professores farão diferentes usos do conhecimento
adquirido com esse estudo. Para os docentes A e C o estudo serviu como uma possibilidade de desenvolver um
tema de ensino através de determinados conteúdos conceituais ao ensinar lutas na Educação Física escolar,
enquanto que para os educadores B e D, constitui-se mais como um receituário de tarefas para aplicar com os
alunos. Numa investigação futura, pretendemos analisar de que modo os professores utilizarão o conhecimento
adquirido com essa formação continuada.

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____________________________________
Autor correspondente: Robson Machado Borges
E-mail: robsonmachadoborges@gmail.com

Recebido: 28 de fevereiro de 2018.


Aceito: 21 de março de 2018.

*****

Caderno de Educação Física e Esporte, Marechal Cândido Rondon, v. 16, n. 1, p. 99-107, jan./jun. 2018.
http://e-revista.unioeste.br/index.php/cadernoedfisica/index
POSSÍVEIS DIÁLOGOS ENTRE A EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR E
O CONTEÚDO DAS LUTAS NA PERSPECTIVA DA CULTURA
CORPORAL

Luiz Gustavo Bonatto Rufino, Universidade Estadual Paulista - UNESP, Rio Claro, São
Paulo – Brasil
Suraya Cristina Darido, Universidade Estadual Paulista - UNESP, Rio Claro, São Paulo –
Brasil

RESUMO
O objetivo deste estudo foi analisar o contexto da temática das lutas na Educação Física
escolar, considerando a concepção de cultura corporal e as dimensões dos conteúdos,
estabelecendo assim possíveis “diálogos” entre estas práticas e a Educação Física. Para
isso, foi realizada uma revisão de literatura abordando os seguintes tópicos:
compreendendo as lutas, a temática das lutas na cultura corporal, ensinando as lutas na
escola e as lutas nas três dimensões dos conteúdos. Concluímos que é preciso inserir as
lutas na escola, levando-se em conta a questão das dimensões dos conteúdos,
possibilitando que, além dos procedimentos, seja empregado também conceitos e atitudes
em relação ao ensino destes conteúdos.

Palavras-Chave: Educação Física escolar; Lutas; Diálogos; Cultura corporal.

POSSIBLE DIALOGUES BETWEEN SCHOOL PHYSICAL


EDUCATION AND FIGHT´S CONTENDS IN BODY CULTURE
PERSPECTIVE

ABSTRACT
The objective of this study was to analyze the context of fights in Physical Education
classes, in school, considering the conception of body culture and the content dimension,
establishing possible “dialogues” between the theme of fights and Physical Education. For
this study we did a review of literature including the following topics: understanding the
fights, the theme of fighting in body culture, teaching the fights at school and the fights in
the tree dimensions of contents. We concluded that the fights must be inserted as one
content at school, considering the dimensions of contents, allowing that beyond the
procedures, the teachers could use the concepts and attitudes while they teach these
contents.

Key-Words: School Physical Education; Fights; Dialogues; Body culture.

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 1, p. 145-170, jan../mar. 2013.144
ISSN: 1983-9030
POSIBLE DIÁLOGOS ENTRE LA ESCUELA DE EDUCACIÓN
FÍSICA Y LO CONTENIDO DE LAS LUCHAS IN LA PERSPECTIVA
DE LA CULTURA DEL CUERPO

RESUMEN
El objetivo de este estudio fue analizar el contexto de las luchas en las clases de Educación
Física en la escuela, teniendo en cuenta la concepción de la cultura del cuerpo y la
dimensión del contenido, establecer posibles "diálogos" entre el tema de las peleas y la
Educación Física. Para este estudio se hizo una revisión de literatura, incluyendo los
siguientes temas: La comprensión de las luchas, el tema de las luchas en la cultura del
cuerpo, la enseñanza de la luchas en la escuela y las luchas en las dimensiones de los
contenidos. Llegamos a la conclusión de que las luchas debe entrar en escuela, teniendo en
cuenta la cuestión de las dimensiones de contenido, permitiendo, además de los
procedimientos, también se emplea conceptos y actitudes hacia el aprendizaje de ese
contenido.

Palabras-Clave: Escuela de Educación Física; Luchas; Diálogos; Cultura del cuerpo.

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 1, p. 145-170, jan../mar. 2013.145
ISSN: 1983-9030
Não é no silêncio que os homens se fazem, mas
na palavra, no trabalho, na ação-reflexão”
Paulo Freire1

INTRODUÇÃO
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs2, o diálogo é um dos
principais instrumentos de uma democracia justa, permitindo espaço ao consenso e ao
dissenso. Dialogar pede capacidade de ouvir o outro e de se fazer entender. Portanto, a
democracia deve valorizar o diálogo como forma de esclarecer conflitos.2 Tamanha a
importância dada ao diálogo que este é um dos blocos de conteúdos do tema transversal
ética, juntamente com o respeito mútuo, a solidariedade e a justiça. Deve-se valorizar o
diálogo visando o esclarecimento e a superação de conflitos.2

Ao optarmos por estabelecer “diálogos” entre a área da Educação Física e a temática das
lutas, pretendemos apresentar algumas características sobre o ensino desses conteúdos.
Para os PCNs2 não há nem reais descobertas, nem real aprendizagem se estas não forem
fruto de rica comunicação entre indivíduos. Portanto, para que haja mudanças e
transformações da práxis escolar desses conteúdos, é preciso, antes de tudo, dialogar,
discutir e debater sobre eles, possibilitando que uma visão crítica seja criada em relação ao
ensino das lutas na escola.

Na verdade, o conteúdo das lutas, de acordo com alguns autores da área, ainda é pouco
explorado por grande parte dos professores de Educação Física escolar. As lutas são uma
das mais elementares manifestações da cultura corporal, juntamente com as danças, os
jogos, os esportes, as atividades rítmicas, as brincadeiras, dentre outros. São práticas
corporais construídas ao longo da história por razões de sobrevivência e de vivências
lúdicas.

Entretanto, há inúmeras divergências em relação ao que ensinar sobre lutas dentro da área
da Educação Física escolar. Talvez este seja um dos fatores relacionados que limitam o seu
tratamento nas aulas de Educação Física na escola. Devido à divergência existente na área
sobre qual terminologia que deve ser aplicada (lutas, artes marciais ou modalidades
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esportivas de combate), optamos por caracterizar essa temática como lutas. Essa
denominação corrobora com Rufino e Darido3:406 que afirmam:

Mais relevante não é a discussão sobre qual terminologia está mais


correta ou deve ser empregada em relação à outra e sim discutir sobre a
inserção desses conteúdos, [lutas, artes marciais, modalidades esportivas
de combate] que fazem parte da cultura corporal, nas aulas de Educação
Física.

Segundo Carreiro4 dentre os conteúdos que podem ser apresentados na Educação Física
escolar, as lutas são um dos que encontram maior resistência por parte dos professores,
com argumentos como: falta de espaço, falta de material, falta de vestimentas adequadas e
associação às questões de violência. O autor sugere ainda que o professor que não conhece
o conteúdo das lutas apropriadamente, pode também aprender sobre ele em livros, revistas,
internet e até mesmo com os próprios alunos.

Aprender com os alunos e atualizar-se é certamente uma prerrogativa indispensável para


qualquer professor. Contudo, é comum ainda a existência de cursos de Educação Física
que formem profissionais com nenhum conhecimento específico dos conteúdos das lutas.

Do mesmo modo, Del Vecchio e Franchini5 consideram que a dificuldade em tratar com os
conteúdos das lutas na escola deve-se, em grande parte, à formação do profissional de
Educação Física que, em muitos casos, frequenta uma graduação deficiente em relação à
esses conteúdos, restringindo-se à apenas uma modalidade (como o judô ou a capoeira, por
exemplo), ou mesmo nem havendo a aplicação desses conteúdos no ensino superior.

Até mesmo quanto aos professores universitários que ministram esses conteúdos há
algumas considerações, comparados aos docentes de outras disciplinas. Para Del Vecchio e
Franchini5 a maior parte dos docentes que ministram conteúdos de lutas nas universidades
teve contato direto com estes conteúdos na qualidade de praticante.

Se, por um lado, essa característica ameniza o problema do domínio de conhecimentos


específicos por parte de quem irá transmiti-los, por outro, essa não é uma prática comum
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ISSN: 1983-9030
em relação ao ensino de outras disciplinas como fisiologia do exercício, biomecânica e
aprendizagem motora, por exemplo, que são disciplinas ministradas na maioria das vezes
por docentes que as estudaram como tópico central em seus programas de pós- graduação.5

Essa característica dos docentes de lutas pode trazer um outro problema, no qual seja: o do
direcionamento da disciplina para um único estilo ou modalidade de luta5. Desse modo, o
ensino dos conteúdos da temática das lutas torna-se restrito àquelas pessoas que tiveram
contato com esses conteúdos, ou seja, praticantes ou ex-praticantes, reiterando-se que,
mesmo assim, a tendência é que essas pessoas ensinem apenas a modalidade na qual
tiveram mais contato, utilizando como recurso principal unicamente as suas experiências
enquanto ex-praticantes/atletas e não conhecimentos científicos inovadores que permitam
compreender os aspectos pedagógicos do ensino das lutas na escola.

O professor que ensinará estes conteúdos no Ensino Superior é, portanto, de fundamental


importância à disseminação desses conteúdos por parte dos profissionais que serão
formados por ele, sobretudo aqueles que darão aulas nas escolas. Com relação aos
professores de Educação Física escolar, de acordo com Carreiro,4 é esperado que eles
sintam-se capacitados a apresentar mais uma forma de expressão da Cultura Corporal, que
é a temática das lutas, não sendo necessário ter formação em nenhuma modalidade
específica (ser faixa preta de alguma modalidade, por exemplo).

Portanto, não é necessário que o professor de Educação Física escolar tenha profundos
conhecimentos das lutas para que elas possam ser tratadas na Educação Física escolar,
contanto que o professor tenha uma formação que o possibilite ter contato com esses
conteúdos, como os conceitos básicos, as formas de ensinar e assim por diante.

Além dos problemas em relação à formação profissional, há também outro agravante com
relação ao ensino dos conteúdos das lutas. A escassez no número de produção científica na
área é um fator muito importante a ser considerado também. Esta carência de produção
científica foi analisada por Correia e Franchini.6 Os autores realizaram um estudo onde

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descreveram a questão da produção acadêmica em lutas, artes marciais e modalidades de
combate no Brasil.

Para isso, eles analisaram 11 periódicos nacionais (a escolha dos periódicos baseou-se no
questionamento sobre quais periódicos eram utilizados para pesquisas nessa área à 17
profissionais/estudantes envolvidos com as lutas) no período de 1998 até 2008 (optou-se
pelo ano de 1998 pois foi neste ano que a profissão de Educação Física foi regulamenta por
lei, a lei número 9696 de primeiro de setembro de 1998, e, conjuntamente com isso, foi
criado o Conselho Federal de Educação Física, o CONFEF).6

Os resultados indicam que do total de 2561 trabalhos publicados nestes periódicos ao


longo desse tempo, apenas 75 (2,93%) abordavam a temática das lutas, artes marciais e
modalidades esportivas de combate em seu título, resumo ou nas palavras chaves.6

Em relação às áreas de estudo, a pesquisa baseou-se nas proposições de Tani7 que dividiu a
estrutura acadêmica da Cinesiologia, Educação Física e Esporte em: Biodinâmica do
Movimento Humano, Comportamento Motor Humano e Estudos Sócio-Culturais do
Movimento Humano, áreas consideradas de caráter básico para este autor, e a área de
Pedagogia do Movimento Humano e Adaptação do Movimento Humano (para a Educação
Física) e o Treinamento Esportivo e a Administração Esportiva (para o Esporte), todas
estas áreas consideradas de caráter aplicado.7

Desta forma, constatou-se o predomínio dos estudos conduzidos na área de Biodinâmica,


tendo 40% do total de estudos da área, seguidos pelos Estudos Sócio-Culturais do
Movimento Humano, com 32% e Comportamento Motor com 8%. Nas áreas de caráter
mais aplicado, a Pedagogia do Movimento Humano teve 10,7%, o Treinamento Esportivo
teve 8%, a Administração Esportiva teve 1,3% e a Adaptação do Movimento Humano não
teve nenhum estudo produzido.6

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Estes resultados apontam para um baixo número de artigos voltados às lutas/ artes
marciais/modalidades esportivas de combate e, dentre as modalidades mais pesquisadas
estão o judô e a capoeira, duas modalidades bastante tradicionais no Brasil.6

Ainda para Correia e Franchini6 a compreensão da multidimensionalidade destas


manifestações corporais, implica na mobilização de saberes das mais diversas áreas.
Portanto, é necessário que haja mais pesquisas nestas áreas, principalmente nas áreas com
menor número de produção, como é o caso da área de Pedagogia do Movimento Humano e
que estas pesquisas tenham procedimentos metodológicos especializados e que possam
chegar a uma parcela maior de pessoas que estão atuando, ou seja, intervindo na prática da
profissão.6

Além da questão da formação profissional e da carência de produção científica na área, há


ainda outro agravante, associado com os outros dois fatores: o ensino das lutas é pautado
normalmente por questões ligadas a tradição oral e apartadas de questões científicas.

Permeados por inúmeros questionamentos e dispostos a solucionar alguns “conflitos”


através de “diálogos” sobre essa temática, poderíamos nos indagar: afinal, é possível
ensinar os conteúdos da temática das lutas nas aulas de Educação Física? O que
poderíamos ensinar desses conteúdos na Educação Física escolar? Qual é a atual visão da
Educação Física sobre esses conteúdos?

Sendo assim, o objetivo desse texto foi contextualizar o panorama atual das lutas na
Educação Física escolar por meio de uma revisão de literatura sobre estudos que
conceituem estas manifestações como representações da cultura corporal, analisando as
possibilidades de implementações destes conteúdos nas aulas de Educação Física escolar,
estabelecendo, desta maneira, “diálogos” entre o conteúdo das lutas e a área da Educação
Física na escola.

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COMPREENDENDO AS LUTAS
A compreensão das lutas em sua pluralidade de significados não é uma tarefa fácil e requer
que sejam considerados inúmeros fatores. Primeiramente, é preciso levar em conta que, em
se tratando desses conteúdos, não é possível desmistificá-los e racionalizados, devido ao
universo simbólico de representações e idéias que fazem parte dessa temática. Assim, até
mesmo definir o que são lutas torna-se arriscado, considerando-se que ao definirmos,
limitamos a nossa compreensão.

O dicionário Luft,8:431 por exemplo, define o ato de lutar (do latim luctari) como:
“combater/ pelejar, brigar/ disputar, competir/ trabalhar arduamente, esforçar-se,
empenhar-se”. Já o substantivo luta é definido como “ação de lutar/qualquer combate
corpo a corpo/guerra, peleja/antagonismo/esforço, empenho.”

Já para Iedwab e Standefer9 a luta também é patriotismo, religião, filosofia e, sobretudo, o


modo de ser de um indivíduo. Os autores afirmam também que o tema central das lutas é a
resolução dos conflitos que fazem parte da nossa vida.

Há dentro do contexto das lutas marciais, muita tradição, muito misticismo, muitas
histórias envolvidas. Há relatos (embora não comprovados) de feitos sobre humanos,
histórias de façanhas inacreditáveis, lutadores que foram verdadeiros heróis, e assim por
diante. Até mesmo em alguns filmes sobre lutas observa-se, por diversas vezes, lutadores
capazes de realizar feitos incríveis como derrotar sozinhos uma quantidade muito grande
de oponentes, de uma só vez.

Por outro lado, nos últimos anos tem aumentado o número de artigos científicos, livros,
dissertações, teses e trabalhos de conclusão de curso, embora ainda seja muito aquém do
que poderia e deveria ser. Estes estudos possibilitam a racionalização de determinadas
características das lutas, sobretudo fora do meio escolar, nas questões que tangem o
treinamento e a preparação de atletas de lutas, a fisiologia das modalidades de lutas, o
comportamento motor dos praticantes, dentre outros estudos.

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Desse modo, podemos destacar um conflito existente entre os conhecimentos oriundos da
tradição das lutas com os estudos científicos realizados sobre essas práticas.
Exemplificando: se outrora alguns professores/mestres de lutas exigiam treinamentos
árduos e que duravam horas e até dias (fato evidenciado em alguns filmes sobre essa
temática, por exemplo), atualmente questões relacionadas aos princípios do treinamento
esportivo foram acrescentadas, desmistificando as antigas formas de treinar. Se um lutador
de kung fu precisava ficar diversas horas realizando determinadas posições, hoje sabe-se
que ele deve periodizar o seu treinamento, por exemplo.

Breda et al.10 constata que durante séculos as lutas foram ensinadas de forma rústica e
disciplinadora e sofreram poucas mudanças dentro dos processos de ensino-aprendizagem.
Os autores acreditam que a ciência e a pedagogia têm contribuído muito para o
desenvolvimento do esporte, aproximando-o das lutas, buscando enriquecer as aulas de
lutas com a inserção dos conhecimentos da Educação Física, assim como enriquecer as
aulas de Educação Física com os conhecimentos das lutas.10

Podemos considerar que a racionalização provocada pelos estudos científicos eliminou


algumas características das tradições das lutas, como a menor ênfase à alguns elementos
como a saudação, a meditação, as técnicas de cunho mais holístico, dentre outras. Embora
o âmbito escolar não permeie essas divergências, o ensino das lutas na escola não pode
desconsiderá-las. Tanto as questões da tradição quanto da racionalização podem trazer
benefícios ao ensino das lutas, dependendo da forma como forem considerados, estudados
e tratados pelo professor.

É preciso considerar que a perspectiva sobre as lutas mudou com o passar do tempo e
novas formas de lutar foram surgindo enquanto que outras modalidades foram extintas.
Algumas modalidades atingiram o patamar de esportes olímpicos, como o judô, o
taekwondo, o boxe amador, a esgrima e wrestling (luta olímpica). Atualmente, com os
avanços da área do treinamento esportivo, como os princípios do treinamento e sua
periodização, por exemplo, ampliaram-se as possibilidades de aprendizagem e rendimento
nas modalidades.

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Para Betti11:186 o método científico representa um importante caminho de legitimação da
práxis do profissional de Educação Física porque permite problematizar afirmações
genéricas como, por exemplo: “atividade física é boa para a saúde”, ou “o judô é bom
para descarregar a agressividade”. Ou seja, não é possível excluir as inúmeras
colaborações que a ciência e a racionalização podem trazer para a área das lutas.

Contudo, não se pode também restringir e racionalizar demais a concepção das lutas a
ponto de não considerar a sua dimensão cultural e simbólica. As lutas possuem
significados plurais e diversos, não sendo possível compreendê-las única e exclusivamente
através da racionalização do conhecimento.

Betti12 (1994), por exemplo, afirma que o ser humano realiza constantemente atividades
simbólicas para poder dar valor e orientar suas ações e as lutas são, claramente, atividades
envoltas em um universo simbólico plural e abrangente, variando de acordo com a visão
que cada sociedade emprega sobre cada modalidade existente. O autor considera que todas
as noções usadas para caracterizar e explicar o comportamento humano são consequência
ou derivam de universos simbólicos, não podendo ser reduzidas a impulsos biológicos,
instintos psicanalíticos ou reforço de satisfação.

Portanto, a compreensão das lutas enquanto um fenômeno polissêmico e abrangente só é


possível se considerarmos os diversos aspectos que os relacionam como as questões
tradicionais e científicas relacionadas à estas práticas corporais.

Há um grande número de lutas, cada uma com sua própria história e embasada em
inúmeros significados diferentes. Desde o passado, cada sociedade compreendeu o
fenômeno das lutas de um modo diferente, promovendo assim uma infinidade de práticas,
algumas bem diferentes entre si, enquanto outras apresentam diversas similaridades.

Porém, é preciso considerar também que muito do que se afirma sobre as lutas pode não
ser verdadeiro. Correia13 considera que do ponto de vista do senso comum, afirmações

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como as de que as lutas são milenares, provenientes do oriente, possuem filosofia, geram
saúde, disciplinam as pessoas, pregam uma cultura de paz, etc. são constituídas de
“pretensões generalizantes” porque não correspondem à práxis social.

Em relação à afirmação que todas as lutas são provenientes do oriente, esta também pode
ser uma afirmação questionada já que nem todas vieram do oriente como, por exemplo, o
Sambo que é proveniente da Rússia, o Huka-Huka proveniente dos índios brasileiros e o
Krav Maga oriundo de Israel.

Quanto à perspectiva da saúde, destaca-se, por exemplo, que o treinamento para


competição em modalidades de lutas pode não gerar saúde e muito pelo contrário, provocar
uma série de lesões, como afirmam Ide e Padilha14 ao constatarem que o jiu jitsu
desportivo, por exemplo, é uma modalidade que pode ser considerada como altamente
lesiva aos seus praticantes, acarretando problemas de luxações em algumas articulações
como os ombros, além de lesões nas vértebras cervicais e lesões causadas pela asfixia dos
estrangulamentos. Afirmar também que as lutas promovem uma cultura de paz é
desconsiderar os aspectos históricos que relacionam as lutas com as guerras, conflitos e
batalhas.13

Correia13 aponta que as lutas foram criadas para a guerra e não para o âmbito escolar.
Poderíamos pressupor que, da mesma forma que as lutas não foram criadas para a escola,
outras modalidades como o futebol, por exemplo, prática bastante empregada nas aulas de
Educação Física escolar, também não foi criada visando a escola.

Portanto, para que as práticas de lutas sejam aplicadas nas aulas de Educação Física
escolar, deve haver modificações ou uma transformação didático-pedagógica, como
denomina Kunz.15 Dessa forma, Correia13 considera que ainda é necessário um longo
processo de apropriação relacionado às lutas por parte dos profissionais de Educação
Física, propiciando um aproximação acadêmica e profissional no que se relaciona à essas
temáticas.
Para este autor:

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Demandamos na atualidade por elementos teóricos e práticos mais
consistentes e coerentes para uma imperiosa transformação/transposição
didática [...]. Assim, talvez possamos diminuir nossa ignorância [...]
sobre essas manifestações [lutas, artes marciais, modalidades esportivas
de combate] e dar um tratamento mais responsável e menos
demagógico/caricato para essas importantes objetivações culturais que
compõem o patrimônio universal expresso pela cultura e, sobretudo,
explorá-las como elementos indispensáveis ao desenvolvimento
humano.13:30

A TEMÁTICA DAS LUTAS NA CULTURA CORPORAL


As lutas, as danças, as atividades rítmicas, os esportes, os jogos, as atividades circenses, as
atividades de aventura, dentre outras, são manifestações inseridas na esfera da Cultura
Corporal, fazendo parte do modo de ser das pessoas e das sociedades, de diferentes formas,
ao longo da história. É preciso permitir ao aluno o contato e vivências significativas com
esses conteúdos, possibilitando-os articular reflexões críticas sobre estas práticas.

Darido e Souza Júnior16 destacam que a área da Educação Física escolar ultrapassa a idéia
de estar voltada apenas para o ensino do gesto motor correto. Muito mais do que isso, cabe
ao professor de Educação Física problematizar, interpretar, relacionar, analisar com seus
alunos as amplas manifestações dessa Cultura Corporal, de tal forma que estes
compreendam os sentidos e significados impregnados nas práticas corporais.

Ao longo dos anos, a concepção de Educação Física dentro do âmbito escolar foi se
modificando. Para Soares,17 por exemplo, a Educação Física na escola é um espaço de
aprendizagem e, portanto, de ensino. Mas ensinar o quê?

Soares17 afirma que historicamente a Educação Física ocidental moderna tem ensinado o
jogo, a ginástica, as lutas, a dança, os esportes. Estes são conteúdos clássicos que
permaneceram através do tempo transformando inúmeros de seus aspectos, para se afirmar
como elementos da cultura, como linguagem singular do homem no tempo.17

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Na clássica obra da área da Educação Física intitulada como Metodologia do Ensino da
Educação Física, a temática das lutas e da capoeira (colocada de forma separada) também
aparece. De acordo com Soares et al.18:38

[...] a perspectiva sobre a cultura corporal [...] busca desenvolver uma


reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo
que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizadas pela
expressão corporal: jogos, danças, lutas, exercícios ginásticos, esporte,
malabarismo, contorcionismo, mímica e outros, que podem ser
identificados como formas de representação simbólica de realidades
vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente
desenvolvidas. (grifo nosso).

Há também a visão apresentada nos Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs.19 Para os


PCNs da Educação Física, esse componente curricular pode ser entendido como uma área
que trata de um tipo de conhecimento, denominado de Cultura Corporal de movimento e
que tem como temas o jogo, a ginástica, o esporte, as lutas, a dança, a capoeira e outras
temáticas.19:26 (grifo nosso).

Os PCNs19 afirmam ainda que as lutas são disputas em que o(s) oponente(s) deve(m) ser
subjugado(s), com técnicas e estratégias de desequilíbrio, contusão, imobilização ou
exclusão de um determinado espaço na combinação de ações de ataque e defesa.
Deve-se ressaltar que a definição dos PCNs19 inclui as lutas apenas nas questões que
tangem as vivências práticas dessas modalidades como o equilíbrio ou desequilíbrio,
técnicas de contusão ou exclusão de espaços, dentre outras, não mencionando, assim,
outras formas de se abordar as lutas na escola como, por exemplo, incluir na definição
questões como: o que são lutas ou questões relacionadas à história das modalidades,
condutas dos praticantes, dentre outras possibilidades.

A Proposta Curricular do Estado de São Paulo para a área da Educação Física20 também
aborda a temática das lutas, compreendendo-a com parte inerente da Cultura Corporal.
Nela, é proposto que a Educação Física trate da cultura relacionada aos aspectos corporais,
que se expressam de diversas formas, dentre as quais os jogos, a ginástica, as danças e
atividades rítmicas, as lutas e os esportes20. (grifo nosso).
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ISSN: 1983-9030
Embora afirme que não pretende restringir e sim diversificar os conteúdos, a proposta do
Estado de São Paulo20 propõe que se trabalhe com a temática das lutas de forma genérica a
partir apenas do quarto semestre do sétimo ano (antiga sexta série).

Há ainda a proposição de algumas modalidades como o judô, o caratê, o taekwondo e o


boxe para o oitavo ano (antiga sétima série) além da proposição do conteúdo da capoeira
para o nono ano (antiga oitava série). Já no Ensino Médio, a temática das lutas aparece
apenas no primeiro semestre do terceiro ano, sendo enfatizada também no terceiro
semestre desse mesmo ano.20

O Estado do Rio Grande do Sul também elaborou uma proposta curricular de apoio ao
professor da rede estadual de ensino daquele estado. Na proposta relacionada à área da
Educação Física, conteúdos sobre a temática das lutas também são abordados. As práticas
esportivas, as ginásticas, as lutas, as atividades lúdicas, as práticas corporais expressivas,
entre outras, se firmaram ao longo dos anos como objetos de estudo próprios da Educação
Física.21:114 (grifo nosso).

Quanto ao conteúdo das lutas, a proposta os classifica como pertencentes às práticas


corporais sistematizadas. Dividem-se os saberes das lutas em dois: os saberes corporais
que compreendem o saber praticar e o conhecer e os saberes conceituais, que
compreendem os saberes técnicos e críticos.21

A proposta considera que os conteúdos abordados pelos professores de Educação Física na


escola devem ser os mais amplos possíveis, tratando de diversas temáticas referentes à
Cultura Corporal, não objetivando que os alunos tornem-se praticantes ou profundos
conhecedores de uma ou outra prática corporal, mas sim que eles possam conhecer,
vivenciar e discutir sobre o mais variado número de práticas referentes à Cultura
Corporal.21

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ISSN: 1983-9030
Exemplificando, podemos considerar que uma determinada luta pode ser escolhida pelo
professor como objeto de estudo de uma das unidades didáticas que tratam desses
conteúdos. Tal escolha implicará a proposição de um fazer corporal em aula que leve os
alunos a conhecerem tal prática, mas sem a pretensão de investir em um nível de
apropriação que lhes permita praticar, fora da escola, a arte marcial estudada21. Entretanto,
a temática das lutas aparece somente como componentes das sétimas e oitavas séries,
(denominadas atualmente de oitavo e nono ano) durante apenas 8% do tempo relativo ao
ensino dos conteúdos da Educação Física destes anos, com opções como o judô, o caratê, a
capoeira e o taekwondo.

Finalmente, há a visão de Betti22 que também destaca a temática das lutas em sua
conceituação sobre a Educação Física na escola. Para este autor a Educação Física na
escola é:
uma disciplina que tem por finalidade propiciar aos alunos a apropriação
crítica da cultura corporal de movimento, visando formar o cidadão que
possa usufruir, compartilhar, produzir e transformar as formas culturais
do exercício da motricidade humana: jogo, esporte, ginásticas e práticas
de aptidão física, dança e atividades rítmicas/ expressivas, lutas/ artes
marciais, práticas alternativas.22:64 (grifo nosso).

É interessante observar que em todas as propostas analisadas, a temática das lutas aparece
de forma autônoma em relação ao conteúdo dos esportes, embora as lutas mais difundidas
e praticadas em nossa sociedade e que aparecem na mídia, são as formas esportivas de
modalidades de combate.

Talvez, o fato do conteúdo das lutas aparecerem de forma separada aos conteúdos dos
esportes nas definições de Cultura Corporal apresentadas, seja uma forma de garantir a
aplicação desses conteúdos na escola, mesmo que muitas lutas sejam também modalidades
esportivas. Essa pode ser uma forma de permitir que os alunos se apropriem destes
conteúdos nas aulas de Educação Física, além dos outros conteúdos referentes à Cultura
Corporal.

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 1, p. 145-170, jan../mar. 2013.158
ISSN: 1983-9030
Dentre todas as propostas analisadas anteriormente4,17-22 fica evidente a inserção da
temática das lutas como um importante conteúdo a ser ensinado nas aulas de Educação
Física na escola, como uma das práticas que compõem o universo da Cultura Corporal.

Todavia, há ainda muitas incertezas sobre quais são as práticas relacionadas às lutas que
devem ser efetivamente selecionadas para as aulas de Educação Física na escola e quando
isso deve ocorrer nos espaços e tempos escolares. Sabe-se que as lutas são importantes,
porém não há estudos que indiquem quando ensiná-las e, principalmente, o que ensinar
das lutas ao longo do processo de escolarização.

Este fato é exemplificado com a inserção da temática das lutas em séries espaçadas, sem
uma sequência lógica de ensino desses conteúdos. Algumas propostas inserem as lutas em
séries e semestres sem uma clara explicação para isso, como a proposta do Estado do Rio
Grande do Sul21 que considera as lutas como conteúdos apenas das sétimas e oitavas séries
(atuais oitavo e nono ano).

Para facilitar a compreensão a respeito da falta de critérios com relação à escolha das
modalidades por parte de alguns referenciais de proposição do ensino destes conteúdos,
elaboramos um quadro que aborda quais modalidades de lutas são abordadas por algumas
propostas de inserção das lutas na escola.

Quadro 1 - Apresenta quais modalidades de lutas são incluídas nas proposições referentes a
alguns autores
Autores Judô Caratê Capoeira Boxe Taekwondo Esgrima
Soares et al.18 ✓

PCNs19 ✓ ✓ ✓ ✓

São Paulo20 ✓ ✓ ✓ ✓ ✓

Rio Grande ✓ ✓ ✓ ✓
21
do Sul

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O Quadro 1 demonstra que apenas algumas modalidades de lutas foram adotadas, dentro
de um universo muito mais amplo, nos possibilitando realizar alguns questionamentos.
Entre tantas modalidades de lutas existentes, quais são aquelas que devem ser incluídas
nas aulas de Educação Física escolar? Mais importante ainda seria nos perguntarmos:
quais devem ser os critérios utilizados para a inclusão ou exclusão de modalidades de
lutas na escola? Por fim, poderíamos questionar: o que ensinar de cada uma dessas
modalidades inseridas nas aulas de Educação Física escolar?

Evidentemente que as lutas são mais um conteúdo, dentro do universo amplo e plural da
Cultura Corporal. No entanto, um número maior de estudos e trabalhos deve ser conduzido
de modo que seja considerado o universo da escola, as características dos alunos, a
relevância social dos conteúdos, além de outras características.

ENSINANDO AS LUTAS NA ESCOLA


Antes de qualquer coisa devemos nos perguntar: é possível ensinar as lutas na escola? De
acordo com as propostas analisadas e a opinião dos autores apresentados sim, é possível.
Então, por que na prática o ensino dos conteúdos das lutas é algo tão pouco difundido e por
que muitos professores não ensinam estes conteúdos em suas aulas?

Há certamente um conjunto de fatores intrinsecamente relacionados, num continuum que


vai desde a formação profissional deficiente em relação a esses conteúdos, até o
preconceito que ainda existe em relação a determinadas modalidades, passando pela falta
de infra-estrutura das escolas, o apoio da direção e até as expectativas dos alunos e da
comunidade em geral sobre qual é o papel da Educação Física na escola.
Porém, isso não significa que essa situação deva ser mantida. É direito dos alunos se
apropriarem desses conteúdos, ao longo dos anos de educação formal dentro da escola e é
dever do professor ensinar esses conteúdos, não pautados em apenas uma modalidade.
Mais ainda, é dever da escola, através de seu projeto político pedagógico inserir esses
conteúdos nas aulas de Educação Física. A prerrogativa que se abre não é mais se é
possível ou não ensinar esses conteúdos, e sim o que ensinar desses conteúdos.

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Primeiramente, deve-se ter claro que a função da escola não é formar atletas, muito menos
lutadores e/ou competidores de uma ou outra modalidade esportiva de combate. Deve-se
prezar, a princípio, pela formação do cidadão que irá apropriar-se da Cultura Corporal em
suas diferentes formas de manifestação (sendo as lutas apenas uma delas). Visa-se, com
isso, a formação de pessoas éticas e autônomas.19

Portanto, a tarefa da escola vai além da simples apropriação ou execução de golpes,


movimentos, gestos técnicos, enfim, os procedimentos estabelecidos. Sendo assim, ensinar
as lutas é muito mais do que ensinar os alunos a submeterem seus companheiros por meio
de golpes ou movimentos de oposição; ensinar as lutas transcende os movimentos e gestos.
Ensinar as lutas é ampliar a visão sobre elas, possibilitando que sejam adquiridas novas
visões e novos olhares a respeito dessa temática. Isso só é possível através da ampliação
dos conteúdos.

Como exemplo da inserção destes conteúdos na escola há a proposição de Darido e Souza


Júnior16 que incluem esta temática como um possível conteúdo a ser ensinado na escola.
Os autores ilustram algumas vivências, jogos e brincadeiras sobre estas práticas,
permitindo que os professores de Educação Física escolar (mesmo aqueles que possuem
menos contato com esta temática) possam trabalhar com as lutas através de diferentes
formas e vivências.

Os autores propõem ainda que sejam tratados outras questões além das vivências de jogos,
brincadeiras e outras dinâmicas, como, por exemplo: conceituação de algumas
modalidades de lutas, a história de determinadas práticas, a questão da diferença entre lutar
e brigar, algumas curiosidades sobre as lutas, dentre outras questões.16

AS LUTAS NAS TRÊS DIMENSÕES DOS CONTEÚDOS


Proposto por Coll,23 as três dimensões dos conteúdos é uma forma de ampliar a visão sobre
as possibilidades a serem ensinadas na escola, expandindo assim o papel da educação, indo
além de uma ou outra dimensão.

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Coll23 classifica os conteúdos em três dimensões, cada uma respondendo à um
questionamento, sendo eles:
• O que se deve saber? (Dimensão conceitual);
• O que se deve fazer? (Dimensão procedimental);
• Como se deve ser? (Dimensão atitudinal).

Dessa forma, a dimensão conceitual do ensino das lutas poderia abranger os aspectos dos
conceitos sobre as diferentes modalidades, suas regras, estudos e análises sobre as corretas
formas de se realizar determinados movimentos, fatos históricos sobre as diferentes
modalidades, dentre outras possibilidades.

Como exemplos da aplicação da dimensão conceitual no ensino das lutas na escola


poderíamos considerar questões como: diversos tipos de modalidades existentes, formas de
classificação das modalidades, diferentes origens para as diferentes práticas, as regras de
determinadas modalidades, análise das modalidades consideradas olímpicas, pesquisas de
modalidades desconhecidas, conceitos biomecânicos e fisiológicos envolvidos como a
melhor forma de aplicação de alguns golpes e formas de se treinar estas modalidades,
dentre inúmeras outras possibilidades.

Já a dimensão procedimental do ensino das lutas corresponde ao saber fazer, ou seja, os


procedimentos, os movimentos e gestos técnicos realizados nas modalidades, tanto
individuais quanto em dupla e/ou grupo, correspondendo assim a tudo que relaciona-se ao
saber fazer. Exemplos de aplicação da dimensão procedimental nas aulas de Educação
Física abrangendo o tema das lutas também são muito variados como: vivências relativas a
questões de oposição, ganho ou perda de espaço, quedas, atividades individuais como
simulação de técnicas de chutes e socos, atividades em dupla, em grupos (como o
tradicional cabo de guerra), realização de brincadeiras e jogos pré-desportivos relacionados
à temática das lutas, dentre outras muitas possibilidades.

Por fim, a dimensão atitudinal compreende as atitudes e valores que devem ser ensinados
em relação às lutas, como as condutas éticas, valores e princípios orientadores das práticas

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como o respeito mútuo, a solidariedade, dentre outros. Há também vários exemplos de
aplicação da dimensão atitudinal nas aulas de Educação Física na escola sobre a prática das
lutas como: respeito ao companheiro, diferenciação entre luta e briga, discussão de termos
como “porrada”, “massacre” e “guerra”, discussões a respeito da hierarquia imposta à
algumas modalidades, questões relativa ao respeito aos limites do próprio corpo no que
tange alguns golpes e posições de algumas práticas, a ética necessária para não se utilizar
os conhecimentos aprendidos com outras pessoas em outros ambientes, dentre outras
possibilidades.

Deve-se destacar que, embora as dimensões sejam divididas em três, na prática do


processo de ensino-aprendizagem elas devem estar atreladas uma a outra, não sendo
possível aplicar o ensino das lutas em cada dimensão de forma separada e/ou isolada e sim
interagindo-as entre si, promovendo assim a ampliação da visão, facilitando a
aprendizagem dessas práticas.

Embora muitos caracterizem as lutas como práticas holísticas que promovem o respeito, a
disciplina, dentre outros valores, é preciso destacar que essas modalidades, assim como os
demais esportes, não são por si só provedoras desses valores, dependem de como o
professor ensinará esses conteúdos.

Bracht24:64 traz uma importante contribuição a esse respeito ao afirmar que, se por um lado,
o esporte pode promover a socialização, por outro, ele pode espelhar as condições de uma
sociedade autoritária, aceitando as regras impostas onde o princípio de rendimento se
impõe a todos os outros.

Bracht24 afirma ainda que o esporte pode desenvolver idéias e valores que levem ao
conformismo e ao respeito incondicional de regras, promovendo uma educação que leve ao
acomodamento, uma educação a serviço da classe dominante. Porém, o autor considera
que embora não seja possível mudar o sistema (capitalista) é possível realizar algumas
mudanças dentro do sistema possibilitando que o esporte, sobretudo aquele praticado na
escola, não seja voltado única e exclusivamente ao rendimento.

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Para Bracht25 os professores de Educação Física devem entender que o que determinará o
uso que o indivíduo fará do movimento não é determinado pela condição física, habilidade
desportiva, flexibilidade, etc., e sim pelos valores e normas de comportamento introjetados,
pela condição econômica e pela posição na estrutura de classes de nossa sociedade.

Nessa visão, podemos considerar que o esporte é uma construção histórico-social humana
em constante transformação e fruto de múltiplas determinações. Em relação ao esporte na
escola, podemos considerar que enquanto atividade escolar ele só tem sentido se integrado
ao projeto pedagógico da escola25.
Portanto, as lutas, assim como todos os outros conteúdos da Educação Física escolar,
dependem não só de como são tratados pelo professor, mas também de como estão
estabelecidos no projeto político pedagógico da escola, sobretudo considerando se há a
ampliação de significados sobre esta temática ou não.

Dessa forma, as dimensões dos conteúdos são uma forma de ampliar o conhecimento sobre
os aspectos das lutas, não restringindo o ensino aos aspectos apenas procedimentais, o
“saber fazer”, mas indo além, transcendendo para os conhecimentos das outras dimensões,
como as atitudes e os conceitos. Nas palavras de Freire:1:45
O que importa, na formação docente, não é a repetição mecânica do
gesto, este ou aquele, mas a compreensão do valor dos sentimentos, das
emoções, do desejo, da insegurança a ser superada pela segurança, do
medo que, ao ser ‘educado’, vai gerando a coragem.

É claro que para isso o professor deve ter uma formação acadêmica e continuada adequada
para lidar com esses conteúdos, não necessitando que, para isso, eles sejam praticantes
assíduos em modalidades de combate, e sim que eles possam ter conhecimentos das lutas
nas três dimensões dos conteúdos e que saibam como transmitir esses conhecimentos para
os alunos numa perspectiva formadora.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O professor só pode ensinar aquilo que ele conhece, que lhe é familiar, aquilo que ele tem
domínio mas, sobretudo, ele só ensinará aquilo que for válido e verdadeiro a seus próprios
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olhos26. Sem conhecer e compreender as lutas enquanto um fenômeno plural e abrangente,
o seu ensino continuará sendo negado aos alunos, mesmo com a presença das lutas nas
propostas curriculares dos estados e da posição dos autores analisados.

Continuar-se-á então com a mesma cadência (ou decadência) em torno das possibilidades
do que se ensina/aprende nas aulas de Educação Física escolar em relação a esse tema
(salvo algumas exceções), ou seja, continuará o não ensino desses conteúdos, ou então a
limitação à apenas algumas modalidades, sem o aprofundamento sobre os diversos
aspectos que o universo das lutas abrangem, seja em termos biológicos, em termos
históricos, em termos de condutas éticas, dentre outros.

Ampliar a visão sobre esse tema é uma forma de ensinar as lutas de maneira melhor, mais
qualificada, mais abrangente e visando ir além dos preceitos práticos, compreendendo,
além da dimensão procedimental, as dimensões conceitual e atitudinal. Mais do que isso,
deve-se compreender as lutas para ensinar mais do que as lutas em si. Breda et al.10
afirmam que os alunos tem o direito de aprender a lutar e aprender mais que lutar, aprender
a ser.

De fato as lutas oferecem inúmeras possibilidades tanto de prática quanto de metáforas


para a vida. Tanto é que o conceito de “luta” não é limitado única e exclusivamente à
concepção esportiva, lutar vai além de ser apenas um esporte.

Estas “metáforas” com o termo do lutar nos permite abordar outras questões, indo além de
considerar o lutar apenas como práticas corporais. Lutar é opor-se, é enfrentar, é resistir.
Lutar é a arte da não aceitação, mesmo que para isso, muitas vezes seja necessário primeiro
ceder, para depois vencer. Para Freire1 lutar é enfrentar, é opor resistência e isso faz parte
da vida, indo muito além das práticas corporais em si.

Destacamos a frase de Rubem Alves, escrita no prefácio do livro de Marcellino27:11


intitulado “Pedagogia da Animação”:
Poesia é coisa fraca. E o mundo em que vivemos exige que sejamos
fortes. Que pode a poesia contra a dureza da pá e da esquadria, contra a
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força do cimento e do dinheiro? Não sabem eles que é da beleza da
poesia que nascem os guerreiros. Lutam melhor aqueles em cujos corpos
moram os sonhos. Para se lutar não basta ter corpo e saber competentes: é
preciso ter alma.

Portanto, a luta é imprescindível ao homem. Aliás, Bertolt Brecht caracteriza as pessoas


que lutam por toda a vida como “seres imprescindíveis”. É claro que esta visão extrapola
os conceitos estabelecidos sobre lutas, artes marciais e modalidades esportivas de combate,
porém, como o intuito foi estabelecer possíveis diálogos, muitas vezes necessitamos
ampliar a nossa visão para que os diálogos possam existir e, se há algo que o conceito do
lutar nos possibilita, esse algo é a capacidade de acreditar que “é possível”. Acreditar que
é possível mudar, que é possível não aceitar e que podemos enfrentar. Conforme afirmou
Rubem Alves: “para se lutar não basta ter corpo e saber competentes: é preciso ter
alma”,27pois a vida pode ser considerada como a dinâmica de uma luta, tornando-se
impossível dissociar o lutar do viver.

Dessa forma, tratar os conteúdos das lutas nas aulas de Educação Física é necessário, como
foi visto. Mas é necessário saber que lutas são estas e como serão ensinadas, quais
modalidades e, certamente, o que e o porquê de serem ensinadas essas modalidades.

É preciso que as lutas, juntamente com os outros conteúdos da Cultura Corporal sejam
aplicadas nas aulas de Educação Física na escola nas diversas séries, em diversos
semestres, promovendo para os alunos, algo que eles ainda não têm em relação à essa
temática, que é a vivência de diferentes modalidades, a apropriação crítica da cultura
envolta nessas práticas e a ampliação dos conteúdos, promovidos pelas dimensões dos
conteúdos.

Todavia, é fato que a Educação Física ainda não se apropriou adequadamente dos
conteúdos relacionados às lutas considerando a questão do que ensinar sobre elas na
escola. Em meio a embates sobre legitimação de aplicação profissional, falta de produção
acadêmica e uma precária formação profissional, há o âmbito escolar, local que embora
tenha encontrado algumas convergências em relação ao trato dos conteúdos da área da

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Educação Física, ainda está longe de ser um ambiente de avanços em relação à
implementação de conteúdos como as lutas.

É preciso que o professor compreenda a importância da inserção das lutas na escola e


entenda que os conteúdos são necessários, fazem parte da Cultura Corporal, são elementos
dessa cultura e os alunos têm o direito de conhecê-los e vivenciá-los. Entretanto deve-se
ressaltar que, se os alunos têm o direito de conhecer esses conteúdos, os professores têm o
dever de ensiná-los, e para isso eles devem compreendê-los e transformá-los, para a melhor
apropriação por parte dos alunos, numa troca que faça com que ambos, alunos e
professores cresçam, se transformem e aprendam, já que como Paulo Freire1:23 afirmou:
“quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”.

REFERÊNCIAS
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Paulo: Paz e Terra, 1996.

2
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros
curriculares nacionais: apresentação dos temas transversais e ética. Brasília, 2000.

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conteúdos nas aulas de educação física escolar. In: IV COLÓQUIO DE PESQUISA
QUALITATIVA EM MOTRICIDADE HUMANA: AS LUTAS NO CONTEXTO DA
MOTRICIDADE, 4.; III SIMPÓSIO SOBRE O ENSINO DE GRADUAÇÃO EM
EDUCAÇÃO FÍSICA: 15 ANOS DO CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA UFSCar;
SHOTO WORKSHOP, 5., 2009, São Carlos. Anais... São Carlos: UFSCar, 2009. CD
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4
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5
DEL VECCHIO, F. B.; FRANCHINI, E. Lutas, artes marciais e esportes de combate:
possibilidades, experiências e abordagens no currículo da Educação Física. In: SOUZA
NETO, S.; HUNGER, D. Formação profissional em Educação Física: estudos e
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6
CORREIA, W. R.; FRANCHINI, E. Produção acadêmica em lutas, artes marciais e
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acadêmica. Motus Corporis, Rio de Janeiro, v. 3, n. 2, p. 9-49, 1996.

8
LUFT, C. P. Minidicionário Luft da língua portuguesa. 20. ed. São Paulo: Ática, 2000.

9
IEDWAB, C.; STANDEFER, R. Um caminho de paz: um guia das tradições das artes
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10
BREDA, M. et al. Pedagogia do esporte aplicada às lutas. São Paulo: Phorte, 2010.

11
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da filosofia da ciência. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, v.19, n. 3, p.
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12
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Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Santa Maria, v. 16, n. 1, p. 14-21. 1994.

13
CORREIA, W. R. Lutas e artes marciais na escola: questões insólitas. In: COLÓQUIO
DE PESQUISA QUALITATIVA EM MOTRICIDADE HUMANA: AS LUTAS NO
CONTEXTO DA MOTRICIDADE, 4.; SIMPÓSIO SOBRE O ENSINO DE
GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA: 15 ANOS DO CURSO DE EDUCAÇÃO
FÍSICA DA UFSCAR, 3.; SHOTO WORKSHOP, 5., 2009, São Carlos. Anais... São
Carlos: UFSCar, 2009. CD ROM.

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IDE, B. N.; PADILHA, D. A. Possíveis lesões decorrentes da aplicação das técnicas do
jiu jitsu desportivo. Lecturas, Educación Física y Deportes: revista digital, Buenos Aires,
ano 10, n. 83, 2005. Disponível em: <http://www.efdeportes.com/efd83/jiu.htm>. Acesso
em: 15 fev. 2010.

15
KUNZ, E. Transformação didático-pedagógica do esporte. Ijuí: Ed. da Unijuí, 1994.

16
DARIDO, S. C; SOUZA JÚNIOR, O. Para ensinar Educação Física: possibilidades de
intervenção na escola. Campinas: Papirus, 2007.

17
SOARES, C. L. Educação Física escolar: conhecimento e especificidade. Revista
Paulista de Educação Física, São Paulo, supl. 2, p. 6-12, 1996.

18
SOARES, C. L. et al. Metodologia do ensino da Educação Física. São Paulo: Cortez,
1992.

19
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física, 3º e 4º ciclos. Brasília, 1998.
v.7b.

20
SÃO PAULO. Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Proposta Curricular do
Estado de São Paulo: Educação Física, ensino fundamental, ciclo ii e ensino médio. São
Paulo, 2008.

21
RIO GRANDE DO SUL. Secretaria de Estado de Educação. Referenciais Curriculares
do Estado do Rio Grande do Sul: linguagens, códigos e suas tecnologias. Porto Alegre,
2009. v.2.

22
BETTI, M. Educação Física escolar: ensino e pesquisa ação. Ijuí: Ed. da Unijuí, 2009.

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 1, p. 145-170, jan../mar. 2013.169
ISSN: 1983-9030
23
COLL, C. Os conteúdos na reforma. Porto Alegre: Artmed. 2000.

24
BRACHT, V. A criança que pratica esporte respeita as regras do jogo... capitalista.
Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Campinas, v. 7, n. 2, p. 62- 68, 1986.

25
BRACHT, V. Esporte na escola e esporte de rendimento. Movimento, Porto Alegre, ano
7, n. 12, p. 14-24, 2000.

26
FORQUIN, J. C. Escola e cultura: as bases sociais e epistemológicas do conhecimento
escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

27
MARCELLINO, N. C. Pedagogia da animação. Campinas: Papirus, 1989.

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 1, p. 145-170, jan../mar. 2013.170
ISSN: 1983-9030
PRODUÇÃO CIENTÍFICA NACIONAL SOBRE O ENSINO DE
LUTAS NO AMBIENTE ESCOLAR: ESTADO DA ARTE

Guilherme da Silva Gasparotto, Universidade Federal do Paraná – UFPR, Paraná -


Brasil
Sérgio Luiz Carlos dos Santos, Universidade Federal do Paraná – UFPR, Paraná – Brasil

RESUMO
Objetivou-se verificar quantitativamente a produção científica nacional sobre o ensino de
lutas na escola. Foi realizada busca sistematizada em bases indexadoras de periódicos
científicos nacionais, bem como em todas as revistas de estrato A e B do sistema
Qualis/Capes. A busca retornou 11 artigos que foram categorizados em: ensino de lutas na
formação do professor; possibilidade de abordagens das lutas na escola; benefícios
proporcionados pela vivência das lutas na escola. Foi possível perceber que o número de
pesquisas relacionadas ao ensino de lutas nos últimos dez anos é pequeno e há necessidade
de aumento quantitativo de pesquisas capazes de desenvolver o tema na escola visando o
encorajamento dos professores de Educação Física na utilização desta ferramenta
pedagógica.

Palavras-Chave: Ensino; Revisão; Artes marciais.

NATIONAL SCIENTIFIC PRODUCTION ON TEACHING OF


FIGHTS IN SCHOOL ENVIRONMENT: STATE OF THE ART

ABSTRACT
The objective was to verify quantitatively the national scientific production on teaching
fights at school. Was performed systematic search in indexing databases of national
scientific journals and in all journals strata A and B in system Qualis/Capes. The search
returned 11 articles that were categorized to: teaching fights in teacher undergraduation;
possibility of address the issue fights at school; benefits provided by the experience of
fights learning at school. It could be observed that the number of researches related to
teaching fight the past ten years is little and there need to increase quantitative research can
develop the issue in school to the encouragement of Physical Education teachers in using
this educational tool.

Key-Words: Teaching; Review; Martial arts.

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 4, p. 46-58, out./dez. 2013. 112
ISSN: 1983-9030
PRODUCCIÓN CIENTÍFICA NACIONAL DE ENSEÑANZA DE
LUCHAS EN LA ESCOLA: ESTADO DEL ARTE

RESUMEN
El objetivo fue determinar cuantitativamente la producción científica nacional en la
enseñanza de luchas en la escuela. Búsqueda sistemática fue realizada en bases de datos de
indexación de revistas científicas nacionales y en todo sistema Qualis / Capes em revistas
con estratos A y B. La búsqueda ha dado 12 artículos se clasificaron en: enseñanza de
luchas en la formación del profesorado; posibilidad de enfoque de luchas en la escuela, los
beneficios proporcionados por la experiencia de las luchas en la escuela. Se pudo observar
que el número de investigaciones relacionadas con la enseñanza de las luchas de los
últimos diez años es poca y hay necesidad de aumentar la investigación cuantitativa capaz
de desarrollar el tema en la escuela, al estímulo de los profesores de Educación Física en el
uso de esta herramienta educativa.

Palabras-Clave: Educación; Revista; Artes marciales.

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ISSN: 1983-9030 113
INTRODUÇÃO
Frequentemente é apontado pela literatura que um adequado desenvolvimento de crianças
e adolescentes em idade escolar, nos domínios social, psicológico, cognitivo e biológico
está relacionado a efetivos estímulos externos, capazes de auxiliar nesta tarefa.1-2 Neste
sentido, o ambiente escolar é apontado como espaço determinante no que diz respeito à
demanda e direcionamento destes estímulos.3

Dentre as atividades oferecidas, a disciplina de Educação Física demonstra ser importante


ferramenta no processo de desenvolvimento dos alunos em idade escolar, visto a
quantidade e variedade de estímulos capazes de ser vivenciados neste ambiente. Segundo
Rosário e Darido,4 o objeto de intervenção da Educação Física Escolar é o corpo em
movimento e nesta perspectiva, o aluno tem a possibilidade de aprender sobre o mundo em
que está inserido a partir de vivências proporcionadas contextualizadamente durante estas
aulas.

A partir da concepção da importância de conteúdos adequados e resgate histórico-social de


movimentos pertencentes ao enfoque da Educação Física, o Ministério da Educação, por
meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais,5 baseados em estudos de diversos autores,6-8
define como conteúdos estruturantes da disciplina: a ginástica, os jogos, o esportes, a dança
e a luta sendo que tais assuntos devem ser discutidos, ensinados e apreendidos de maneira
a relacioná-los aos diversos conteúdos articuladores.

Apesar de se entender que a abordagem dos diferentes conteúdos é igualmente importante


para disponibilizar amplo acervo de movimentos e bases culturais apresentadas por cada
tema, por vezes algumas modalidades, em geral “esportes coletivos”, são supervalorizadas
frente às outras no processo de ensino-aprendizagem.9 Tal fato pode ser reflexo ou refletir
pouco empenho e entusiasmo de estudiosos e pesquisadores na produção de estudos
referentes aos conteúdos “desvalorizados”.

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ISSN: 1983-9030 114
Neste contexto, é possível citar o caso do ensino do conteúdo lutas na escola, em que a
insegurança causada pela valorização do conhecimento técnico frente aos outros domínios
da cultura corporal acerca do tema poderia afastar os professores desta abordagem e,
consequentemente, no interesse à pesquisa sobre o assunto.
Com base nestes pressupostos, torna-se importante verificar quanto e como é representado
cientificamente o estudo destas modalidades, subestimadas no âmbito prático do ensino
escolar, com intuito de entender quais os fatores capazes de influenciar a abordagem e a
qualidade desta pelo professor de Educação Física escolar. Nesta perspectiva o objetivo
deste estudo foi verificar quantitativamente a produção científica nacional sobre a temática
do ensino de lutas na escola e os principais temas desenvolvidos por estes estudos.

MATERIAIS E MÉTODOS
Esta pesquisa trata-se de uma revisão sistemática de estudos publicados em periódicos
nacionais, sobre a temática de ensino de lutas. Foram realizadas buscas nas bases de
documentos científicos: Scielo, Periódicos Capes, Google Scholar no intervalo de 10 anos,
período de 2004 a 2013. Na base Scielo utilizou-se os termos booleanos para os definição
de “Ensino” OR “Aprendizagem” AND “Artes Marciais” OR “Lutas” OR Jogos de
Oposição” OR “Jogos de Combate” AND “Escola” OR “Escolar”. Tanto na base
Periódicos Capes e Google Scholar foram realizadas todas as combinações possíveis entre
os termos para retorno de estudos que abordassem a temática no campo de busca
“Assunto”.

Além das buscas nas bases de artigos científicos, foi realizada verificação minuciosa pelos
periódicos relacionados no sistema Qualis/Capes. Todas as revistas com temática
relacionadas à Educação Física escolar classificadas nos estratos A e B foram pesquisadas
com os termos relacionados ao ensino de lutas, já mencionados.

Foram incluídos artigos que abordaram o ensino de lutas no ambiente escolar ou a


discussão do tema no currículo acadêmico, que tenham sido publicados em periódicos
nacionais. Os artigos selecionados para revisão foram categorizados em três eixos de
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abordagem, segundo o tema proposto: ensino de lutas na formação do professor;
possibilidade de abordagens das lutas na escola e benefícios proporcionados pela vivência
das lutas na escola.
A sequência metodológica para seleção dos artigos pertinentes aos critérios atribuídos foi:
busca pelos termos, seleção após leitura dos títulos, seleção após leitura dos resumos e por
fim seleção após leitura do artigo completo.

RESULTADOS
Além da busca pelos termos nas bases de artigos científicos foram verificadas 28 revistas
com temática relacionada à Educação Física escolar.

O número de artigos selecionados em cada etapa do processo está exposto na Figura 1


abaixo.

BUSCA NAS BASES DE


219 Artigos
DADOS SELECIONADAS

LEITURA DOS TÍTULOS


42 Artigos

LEITURA DOS RESUMOS


14 Artigos

LEITURA DOS ARTIGOS


COMPLETOS

BUSCA NOS PERIÓDICOS DO


SISTEMA QUALIS/CAPES 12 Artigos

Figura 1: sistema de busca dos artigos pertinentes.

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As publicações relacionadas ao tema se concentraram em sete periódicos, no período de
dez anos, como está apresentado na Tabela 1.

Tabela1 - Distribuição dos artigos de acordo com o periódico e ano de publicação

PERIÓDICO 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Movimento 2 1
Pensar a Prática 1
Conexões 1
Fiep Bulletin 1 1
Motrivivência 1 1
Mov. e Percepção 1
Cad. Form. RBCE 1
RBEFE 1
Legenda: RBEFE: Revista Brasileira de Educação Física e Esporte.
Cad. Form. RBCE. Cadernos de Formação da Revista Brasileira de Ciências do Esporte

Os trabalhos abordaram três diferentes temáticas referentes aos domínios do ensino de


lutas na escola. Os temas abordados encontram-se relacionados no Quadro 1.

Quadro 1 - Distribuição dos estudos de acordo com a temática

TEMÁTICA AUTOR ANO TIPO DE ESTUDO

Ensino de Artes Marciais/Lutas na Trusz; Nunes 2007 Pesquisa documental


formação do professor Nascimento; Almeida 2007 Pesquisa-Ação
Rufino; Darido 2013 Revisão de literatura
Luna; Silva; Ferreira; Ruffoni 2013 Questionário fechado
Rufino; Darido 2011 Revisão de literatura
Lima Júnior, Chaves Júnior 2011 Intervencional
Gomes; Morato; Duarte; 2010 Qualitativo – Entrevista
Possibilidade de abordagens das Almeida semi-estruturada
Artes Marciais/Lutas na escola Ferratone; Cazetto 2010 Relato de experiência
Silveira Júnior; Cardoso 2004 Exploratória-Descritiva
Rufino; Darido 2012 Revisão de literatura
Rosa; Ruffoni; Luna 2010 Revisão de literatura
Benefícios proporcionados pela Cazetto 2008 Resenha
vivência das Artes Marciais/Lutas
na escola

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DISCUSSÃO
Diante da quantidade de artigos encontrados após a busca, é possível perceber o pequeno
número de publicações científicas, nos últimos dez anos, com o objetivo de investigação
sobre o ensino de lutas no ambiente escolar. Diante da importância mencionada pelos
PCNs,5 que apontam as “lutas”, como um dos assuntos fundamentais para
desenvolvimento do ensino da Educação Física escolar, este dado torna-se preocupante se
considerado que a base de apoio para a prática do ensino é por vezes obtida nos estudos
que sugerem métodos e considerações importantes sobre o tema. Nesta perspectiva, diante
de uma quantidade pequena de material à disposição do professor para consulta e
julgamento da pertinência em seu contexto, a ação muitas vezes bem intencionada, é
baseada no empirismo e possivelmente realizada de forma equivocada ou simplesmente
não é tomada, prejudicando o público de maior interesse, o aluno, que deixa de vivenciar
um conteúdo importante da cultura corporal.

Os estudos incluídos na pesquisa foram categorizados sobre três perspectivas de


abordagem do ensino de lutas na escola: quanto à formação do professor que atuará no
ensino, quanto às possibilidades de abordagem da temática e sobre os benefícios
proporcionados pela vivência do conteúdo. Sobre a formação do professor, dois estudos
abordaram criticamente a forma como é vista a disciplina de “lutas” na graduação, entre
eles Trusz e Nunes10 citam a necessidade de que o curso de graduação em Educação Física
proporcione ao estudante, visando disponibilizar um profissional capacitado, formação
abrangente, eclética fundamentada em princípios pedagógicos, sociológicos, biológicos e
filosóficos, capaz de entender as relações entre seu desenvolvimento morfo-funcional e o
ser social e politizado. Neste contexto, Nascimento e Almeira11 mostram a necessidade de
se entender que o professor não precisa ser um especialista ou praticante de artes marciais
para desenvolver o tema de forma que os alunos tirem proveito para sua aprendizagem.

Del Vecchio e Franchini22 apontam para o fato que, a dificuldade do professor em trabalhar
com o ensino de lutas se deve pela deficiência dos cursos de graduação na abordagem do
conteúdo “lutas” que muitas vezes se resume em uma só modalidade, como Capoeira ou
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Judô. Segundo o mesmo autor, em muitos casos, essas disciplinas são ministradas de forma
extracurricular por ex-praticantes da modalidade e estão fora do projeto político
pedagógico da instituição.

Sobre as possibilidades de abordagens no ensino de lutas na escola autores de sete estudos


teceram suas considerações. Rufino e Darido13 entendem que diante das especificidades
histórico-culturais, diferentemente de como muitas vezes é tratado hoje, o conteúdo “lutas”
deveria ser apresentado desvinculado ao ensino do esporte na escola. Cazeto21 sinaliza
ainda, o importante conteúdo articulador relacionado ao ensino desta temática, a questão na
violência na escola. Não obstante, um importante foco de pesquisas e atuações práticas no
ensino de artes marciais/lutas na escola que se forma hoje é a questão das mídias atuando
sobre grandes eventos de Mixed Martial Arts (MMA).

A respeito do desenvolvimento das modalidades no ambiente escolar Rufino e Darido12


propõem:
É preciso que as lutas, juntamente com os outros conteúdos da Cultura
Corporal sejam aplicadas em aulas de Educação Física na escola nas
diversas séries, em diversos semestres, promovendo para os alunos, algo
que eles ainda não têm em relação à essa temática, que é a vivência de
diferentes modalidades, a apropriação crítica da cultura envolta nessas
práticas e a ampliação dos conteúdos, promovidos pelas dimensões dos
conteúdos.

Para os outros autores que pesquisaram as abordagens possíveis relacionadas ao ensino de


lutas no ambiente escolar, parece consenso que o ensino deve ocorrer sob a perspectiva não
somente do ensino das técnicas da modalidade específica como também, todo acervo
cultural, sócio-afetivo e cognitivo que o tema pode proporcionar. Estes autores citam ainda
a possibilidade de atividades lúdicas voltadas para os jogos de oposição ou jogos de
combate, além das diversas modalidades.13-18 Santos et al.23 aponta os Jogos de Oposição
como uma metodologia recente capaz de promover o ensino dos esportes de combate,
desvinculando do estereótipo de violência e competitividade, concebido previamente.
Segundo este autor, a terminologia artes marciais deve ser revista quando proposto no
ensino escolar, visto sua origem na mitologia – Marte: Deus da Guerra. Da mesma forma a
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terminologia luta, já que luta é um termo genérico e pode apresentar diversas conotações, a
sugestão seria de denominar este conteúdo como jogos de oposição.

Por fim, três estudos propuseram os benefícios proporcionados pela aprendizagem das
“lutas” na escola.19-2 Sem grandes surpresas os três estudos citam a importância da prática
das Artes Marciais/Lutas no contexto escolar quanto ao desenvolvimento motor e
cognitivo, assim como é sabido da importância das atividades físicas para o
desenvolvimento destas variáveis, quando administradas adequadamente. Entretanto, de
forma especial, o conteúdo é abordado pelos autores quanto à possibilidade de trabalhar
fatores inerentes à prática das “Lutas”. Como aponta Rosa et al.20, situações de medo,
autocontrole emocional, ansiedade, canalização de agressividade, respeito e hierarquia são
especialmente vivenciados neste tipo de atividade. Além disto, estes autores lembram
ainda, a imensa carga cultural e filosófica que as Artes Marciais trazem de contribuição dos
outros povos para o Brasil, a se citar a Capoeira, o Judô, o Jiu-Jítsu, entre tantas outras.
Rufino e Darido19 contribuem para a prática do professor quando expõem que o ensino
deste conteúdo deve estar pautado em eixos norteadores: por que ensiná-las? o que ensinar
das Lutas? como ensiná-las? e como avaliá-las? Com base nisto se poderá efetuar o
julgamento crítico necessário para um ensino efetivo.

CONCLUSÕES
Diante deste estudo, foi possível perceber que o número de pesquisas relacionadas ao
ensino de lutas nos últimos dez anos é pequeno perto da importância dada à temática pelas
próprias instituições que regulamentam e sugerem os temas inerentes ao estudo da
Educação Física escolar no Brasil. Além disso, observou-se que elas estão concentradas em
somente alguns periódicos nacionais.

A maior quantidade destes estudos discutem as possibilidades de abordagens com o ensino


do conteúdo apontando para o direcionamento de menor valorização das técnicas
específicas das modalidades e possibilidade de desenvolvimento de valores socioculturais,
afetivos e cognitivos. Não obstante, possibilita o desenvolvimento de assuntos evidentes na
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sociedade contemporânea, como atuação midiática em grandes eventos e a violência
gratuita.

Parte dos estudos tratou da contribuição pedagógica do ensino do tema, como o


desenvolvimento psicomotor perante a prática, além da carga cultural advinda das artes
marciais praticadas no Brasil.

Pensando na formação adequada dos profissionais, dois autores abordaram a metodologia


de trabalho na disciplina de lutas durante a graduação do profissional, atribuindo a pouca
e/ou ineficiente prática na escola à deficiência de desenvolvimento desta disciplina na
durante a formação.
Este estudo sugere a necessidade de aumento quantitativo de pesquisas capazes de
desenvolver o tema lutas nas escolas, sob a perspectiva de uma sistematização, visando o
encorajamento dos professores de Educação Física na utilização desta ferramenta
pedagógica ainda pouco explorada diante da falta de conhecimento e insegurança dos
profissionais.

REFERÊNCIAS
1
SCALHA, T. B. et. al. A importância do brincar no desenvolvimento psicomotor: relato de
experiência. Revista de Psicologia da UNESP, Assis, v. 9, n. 2, p. 79-92, 2010.

2
KREBS, J. R.; DESIREE, C. J.; ZÊNITE, M. Contexto de desenvolvimento e a percepção
espacial de crianças. Movimento, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 195-212, 2011.

3
DAOLIO, J. Educação Física e o conceito de cultura. Campinas: Autores Associados,
2004.

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 4, p. 112-124, out./dez. 2013.
ISSN: 1983-9030 121
4
ROSÁRIO, L. F. R.; DARIDO, S. C. A sistematização dos conteúdos da Educação Física
na escola: a perspectiva dos professores experientes. Motriz, Rio Claro, v. 11 n. 3 p.167-
178, 2005.

5
BRASIL. Ministério da Educação e Desporto. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Educação Física. Brasília, 1998.

6
BETTI, M. Janela de vidro: educação física e esportes. 1997. Tese (Doutorado em
Educação Física) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1997.

7
BRACHT, V. Educação Física e aprendizagem social. Porto Alegre: Magister, 1992.

8
CASTELLANI FILHO, L. Considerações acerca do conhecimento (re)conhecido pela
Educação Física escolar. Revista Paulista de Educação Física, São Paulo, supl. n. 1,
1995.

9
SANTOS, M. A. G. N.; NISTA-PICCOLO, V. L. O esporte e o ensino médio: A visão dos
professores de educação física da rede pública. Revista Brasileira de Educação Física e
Esporte, São Paulo, v. 25, n. 1, p. 65-78, 2011.

10
TRUSZ, R. A.; NUNES, A. V. A evolução dos esportes de combate no currículo do curso
de Educação Física da UFRGS. Movimento, Porto Alegre, v. 13, n. 1, p. 179–204, 2004.

11
NASCIMENTO, P.; ALMEIDA, L. A. tematização das lutas na Educação Física Escolar:
restrições e possibilidades. Movimento, Porto Alegre, v. 13, n. 3, p. 91-110, 2007.

12
RUFINO, L. G. B.; DARIDO, S. C. Possíveis diálogos entre a educação física escolar e o
conteúdo das lutas na perspectiva da cultura corporal. Conexões, Campinas, v. 11, n. 1, p.
145-170, 2013.

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ISSN: 1983-9030 122
13
RUFINO, L. G. B.; DARIDO, S. C. A separação dos conteúdos das “lutas” dos
“esportes” na Educação Física escolar: necessidade ou tradição? Pensar a Prática,
Goiânia, v. 14, n. 3, p 1-17, 2011.

14
LUNA, I. M. et. al. Lutas na escola: uma visão dos acadêmicos em educação física. Fiep
Bulletin. Disponível em:
< http://www.fiepbulletin.net/index.php/fiepbulletin/article/view/2905>. Foz do Iguaçu, v.
83, 2013.

15
LIMA JUNIOR, H. C.; CHAVES JUNIOR, S. R. Possibilidades das lutas como conteúdo
na educação física escolar: o confrontamento em uma abordagem pedagógica com alunos
de 6ª série em um colégio estadual do município de Guarapuava-PR. Cadernos de
Formação RBCE, Florianópolis, v. 2, n. 1, p. 69-80, 2011.

16
GOMES, M. S. P. et. al. Ensino das lutas: dos princípios condicionais aos grupos
situacionais. Movimento, Porto Alegre, v. 16, n. 02, p. 207-227, 2010.

17
FERRATONE, S.; CAZETTO, F. F. Lutas e Artes Marciais na Escola: um relato de
experiência sobre o aprofundamento nos conteúdos. Movimento e Percepção, Espírito
Santo do Pinhal, v. 11, n.17, 2010.

18
SILVEIRA JÚNIOR, E. R.; CARDOSO C. L. QIGONG: Uma contribuição para a
Educação Física escolar. Motrivivência, Florianópolis, n. 23, p. 83-101, 2004.

19
RUFINO, L. G. B.; DARIDO, S. C. Pedagogia do esporte e das lutas: em busca de
aproximações. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, São Paulo, v. 26, n. 2,
p. 283-300, 2012.

20
ROSA, T. S.; RUFFONI, R.; LUNA, I. Lutas na escola: valiosa ferramenta pedagógica
para o segundo segmento do ensino fundamental. Fiep Bulletin. Disponível em:

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 4, p. 112-124, out./dez. 2013.
ISSN: 1983-9030 123
<http://www.fiepbulletin.net/index.php/fiepbulletin/article/view/236>. Foz do Iguaçu, v. 81,
2011.

21
CAZETTO, F. F. Lutas e Artes Marciais na Escola. Motrivivência, Florianópolis, n. 31,
p. 251-255, 2008.

22
DEL VECCHIO, F. B.; FRANCHINI, E. Lutas, artes marciais e esportes de combate:
Possibilidades, Experiências e Abordagens no currículo da Educação Física. In: Souza
NETO, S.; HUNGER, D. Formação profissional em Educação Física: estudos e
pesquisas, Rio Claro, Biblioética, 2006.

23
SANTOS, S. L. C. et. al. Juegos de oposición: nuevas metodologias para la enseñanza de
deportes de combate . Revista de Ciencias del Deporte, v. 7 (Suppl.), p. 45-62, 2011.

24
MACHADO, S. T. et. al. As práticas de desinvestimento pedagógico na Educação Física
escolar. Movimento, Porto Alegre, v. 16, n. 2, p. 129-147, 2010.

Recebido em: 12 jul. 2013


Aceito em: 19 nov. 2013
Contato: Guilherme da Silva Gasparotto
guilhermegptt@gmail.com

Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 11, n. 4, p. 112-124, out./dez. 2013.
ISSN: 1983-9030 124
REFLEXÕES ACERCA DO ENSINO DE LUTAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA

MARCHI, Enair1
VEIGA, Mateus Martinelli da2
ANTUNES, Fabiana Ritter3

RESUMO
O presente artigo tem como objetivo refletir e sintetizar as aprendizagens discutidas no decorrer
da disciplina de Lutas. Temos por base os debates realizados em aula e a análise das respostas
obtidas em um questionário realizado para um acadêmico do curso de Educação Física.
Enfatizando a importância dessa prática nas escolas e em outros ambientes. Tendo em vista que
as lutas são alvo de tabus e preconceitos, mas com benefícios evidentes. No entanto, os
acadêmicos saem da graduação se sentindo inseguros para ministrarem aulas dessa prática e
apontando que precisam procurar uma especialização para isso.
Palavras-chave: Arte Marcial; Ensino; Lutas.

INTRODUÇÃO
Em consideração ao contexto atual, algumas pessoas acreditam que as lutas são
socialmente incorretas. Porém há uma crescente população que está revertendo esse
contexto, sejam eles professores de Educação Física, praticantes, admiradores e/ou
adeptos a essa prática, todos concordam que quando ele é praticado de forma correta tem
inúmeros benefícios, não somente físicos, mas também sociais.
Por esse motivo buscamos contextualizar o ensino de lutas por profissionais da
Educação Física para entender por que muitos deles se sentem despreparados e
desmotivados para realizarem essa prática. Para complementar o assunto realizamos uma
entrevista com um estudante da área, a fim de evidenciar o exposto.
Lutas/arte marcial aqui abordado como esporte de combate, onde o objetivo de
jogo (meta para pontuar) está centrada no corpo do adversário, possui regras,
institucionalizadas, que visam manter a segurança e proporcionar a igualdade de ambos
os competidores em conquistar a vitória. Essa prática desaprova as brigas que são atos de
violência, desrespeito, hostilidade e que na maioria das vezes é considerado legalmente
como um crime contra outro ser humano.

METODOLOGIA
No presente momento no qual vivemos em um mundo acelerado e enérgico, onde
ninguém mais tem tempo para os outros, as pessoas estão se distanciando cada vez mais,
isso tudo exerce uma grande influência sobre os jovens, fazendo com que eles se tornem
cada vez mais agressivos e hostis com os outros, muitos pensam que as lutas podem ser
algo negativo para esses jovens agressivos, podendo fazer com que se tornem piores do
que já são. Segundo Carneiro et al. (2015) a palavra arte marcial tem origem na mitologia
Romana, segundo o qual a palavra marcial faz menção ao deus da guerra, que é
representado pelo planeta Marte, levando isso em conta, temos a arte da guerra.

1
Acadêmica do curso de Educação Física, Unijuí, Alecrim/RS, enair.marchi@sou.unijui.edu.br
2
Acadêmico do curso de Educação Física ,Unijuí, Santa Rosa/RS, mveiga2@bol.com.br
3
Docente do Curso de Educação Física da Unijuí, RS, fabiana.antunes@unijui.edu.br

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Revista Saúde Viva Multidisciplinar da AJES, Juína/MT, v. 4, n. 5, jan./jun. 2021. 14
Conforme Pacheco (2012) às artes marciais são um forte mecanismo que está à
disposição e que podemos e devemos utilizar para ajudar os jovens a controlarem a sua
agressividade, de acordo com os resultados obtidos houve uma redução nessa atitude dos
entrevistados, já na prática de outros jogos, se comprovou que essa agressividade
aumentava, porém em decorrência das artes marciais, os jovens estão mais calmos, e são
mais capazes de se controlarem, sem agir ou reagir de forma agressiva diante de uma
situação estressante.
Segundo Oliveira (2019, p.14),

[...] as lutas desenvolvem capacidades físicas importantes nos alunos,


assim como as principais capacidades motoras essenciais para seu
desenvolvimento saudável, como lateralidade, noção corporal, espacial
e temporal, coordenação geral, flexibilidade e outros benefícios.
Capacidades cognitivas também são desenvolvidas como raciocínio,
atenção e percepção. Além do quesito social e afetivo que estimulam a
socialização, trabalho em equipe e formação de opinião.

Quando falamos sobre Educação Física escolar, temos por referência um dos
principais documentos norteadores da educação brasileira, a Base Nacional Comum
Curricular, ela apresenta como 10ª competência específica de educação física para o
ensino fundamental (BRASIL, 2018, p.223), “experimentar, desfrutar, apreciar e criar
diferentes brincadeiras, jogos, danças, ginásticas, esportes, lutas e práticas corporais de
aventura, valorizando o trabalho coletivo e o protagonismo”. Com objetivos focado em
lutas do país e do mundo. Como o ensino médio consiste no aprofundamento das
aprendizagens até o momento, as lutas surgem num contexto mais amplo e reflexivo.
Tendo em vista que o ensino das lutas tanto na escola como na academia
favorece positivamente os alunos, pois ela não estimula a agressividade, o desrespeito e
o vandalismo. Buscamos investigar por que ainda existem tantas controvérsias, tabus,
mesmo que essa prática ganhe a cada dia novos praticantes, em relação a outras
modalidades esportivas como o futebol a quantidade de adeptos é inferior e pode oferecer
benefícios tanto quanto.
Este trabalho foi realizado na forma de um questionário, já estruturado e
finalizado pela professora da disciplina de lutas, porém, a professora nos deixou livres
para modificar e alterar a estrutura do mesmo, sem alterar o seu sentido e sem alterar o
objetivo do questionário que é descobrir mais sobre o que o acadêmico de Educação
Física entende sobre a temática de lutas.
Segundo Gil (2008) o questionário é uma da muitas técnica de investigação que
é constituída por uma série de questões que são entregues a pessoa pesquisada, com o
objetivo de descobrir informações sobre os mais diversos temas e assuntos, englobando
desde sentimentos e emoções, até comportamento passado ou presente, o cita alguns
benefícios do questionário, entre eles encontramos: a parte da pessoa pesquisada poder
responder o questionário quando for mais conveniente para ela, a possibilidade atingir
um público muito amplo, o anonimato, entre muitos outros.
O questionário foi enviado para o entrevistado pelo WhatsApp, por conta da distância e
também pelo momento que a sociedade vive relacionada à pandemia de Covid-19 ao qual
a Organização Mundial da Saúde recomenda o distanciamento social para reduzir o
número de contágio do vírus. Preferimos realizar este instrumento de comunicação,
explicamos para o entrevistado do que se tratava esse questionário, deixamos ele bem à
vontade para poder responder sem pressa ou preocupação, ele pôde ser franco em suas
respostas, pois explicamos que a sua identificação seria mantida em sigilo, isso o levou a
responder com mais calma e tranquilidade, podendo dar a sua opinião e a sua visão em

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Revista Saúde Viva Multidisciplinar da AJES, Juína/MT, v. 4, n. 5, jan./jun. 2021. 15
suas respostas. No entanto ficamos à disposição para eventuais dúvidas.
As perguntas ao entrevistado foram questões abertas as quais ele teria total
liberdade de respondê-las. De forma geral, pode-se perceber através das respostas que em
sua graduação o curso oferece condições para que as Lutas sejam inseridas dentro do
espaço escolar quanto fora dele, entretanto, o ensino é muito superficial e no momento
não tem intenção de trabalhá-las em sua profissão, porém se futuramente vir a trabalhar
precisará buscar conhecimentos e aprofundamentos maiores para conseguir se sentir
confortável no processo de ensino e aprendizagem de seus alunos.
Dessa forma, esse acadêmico concorda que as artes marciais trazem inúmeros
benefícios para o corpo humano, benefícios esses que são tanto físicos, quanto mentais, e
ele acredita que o ensino das lutas deveria ser ensinado nas escolas, porém, o acadêmico
relata que não teve nada sobre lutas em sua educação básica, e isso, infelizmente não
acontece apenas em uma ou outra, mas sim, em quase todas as escolas do Brasil, o ensino
de lutas para as crianças é fundamental, mas ainda hoje temos muito preconceito sobre
essa temática.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o presente trabalho, conseguimos perceber alguns dos muitos benefícios que
as artes marciais trazem para os indivíduos, não importando em que idade se encontram,
não fazendo diferenças entre homens ou mulheres, o mais importantes é o que a arte
marcial exercita o corpo humano como um todo, melhorando o sistema muscular, o
sistema ósseo, o sistema cardiovascular, entre outros, podemos citar também a
capacidade das artes marciais promoverem o autocontrole em seus praticantes, levando
assim aos artistas marciais a serem calmos e controlados em situações onde outras
pessoas estão nervosas e extremamente estressadas.
Sabe-se que a Educação Física escolar não tem por função tornar os alunos
atletas, mas estimular além do senso crítico, o gosto pelas práticas esportivas, tendo em
vista seus benefícios para ter uma vida saudável. No entanto, o aluno se tornará adepto a
prática que se identificar, por isso a escola deve oferecer o maior número de
conhecimentos esportivos possíveis. Quando um professor não ministra aula de lutas,
além de privar esse conhecimento, ele permite que o aluno tenha uma ideia errônea sobre
essa prática.
Ao analisarmos as respostas do acadêmico entrevistados, podemos perceber que
muitas escolas não oferecem lutas na educação infantil ou no ensino médio, o contato
que esses indivíduos teriam com as lutas teria que ser intermediado por academias ou
quiçá na faculdade, mesmo que tivesse na faculdade, o que é o nosso caso por fazermos
educação física, fica evidente que apenas uma disciplina de lutas em apenas um semestre
é pouquíssimo para se aprofundar na temática, até mesmo é pouco para aprendermos
sobre os muitos estilos de artes marciais que existem, também é possível perceber que o
conhecimento que adquirimos em apenas uma disciplina é algo muito superficial e fraco,
pois temos muitos assuntos e muitos pormenores para serem tratados em tão pouco
tempo, por isso que é preciso buscar esse conhecimento mais especializado além da
graduação, se queremos no futuro trabalhar com as lutas.
Essa disciplina de lutas, juntamente com este trabalho nos propiciou muitas vivências e
experiências positivas, foi de fundamental importância para a nossa caminhada como
acadêmicos, futuros profissionais da educação física e principalmente como pessoas,
aprendemos muito uns com os outros, com a professora e com todos os professores,
mestres, convidados que tivemos durante as aulas, cada uma dessas pessoas enriqueceu
este conteúdo, e mais ainda que isso, conseguiram trazer muitos aprendizados que

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Revista Saúde Viva Multidisciplinar da AJES, Juína/MT, v. 4, n. 5, jan./jun. 2021. 16
perpassam as lutas, trouxeram histórias, experiências, nos contaram a sua história, o seu
modo de ver as artes marciais, nos contaram sobre as histórias de origem das artes
marciais, a do boxe, a da capoeira, do kung fu, e muitas outras. Nos trouxeram noções
básicas de como nos tornamos melhores e mais aptos para trabalhar com essa prática.

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Revista Saúde Viva Multidisciplinar da AJES, Juína/MT, v. 4, n. 5, jan./jun. 2021. 17
ISSN 2318-5104 | e-ISSN 2318-5090
CADERNO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE
Physical Education and Sport Journal
[v. 16 | n. 1 | p. 109-115 |2018]
RECEBIDO: 02-02-2018
APROVADO: 21-03-2018

RELATO DE EXPERIÊNCIA
DOSSIÊ LUTAS

Tematizando as lutas na educação física escolar:


relato de uma prática pedagógica no contexto do PIBID
Fights as themes in physical education classes: report of a pedagogical
approach in the context of PIBID
DOI:

Marlon Messias Santana Cruz1, Abília Ana Castro Neta2, Drieli Fernandes Boa Sorte1,
Joice Tainá de Jesus Santos1, Ana Gabriela Alves Medeiro1
1
Universidade do Estado da Bahia (UNEB)
2
Universidade Estadual do Sudoeste Baiano (UESB)

RESUMO
Este estudo foi desenvolvido no âmbito do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência no contexto do subprojeto
“Educação Física escolar: construindo possibilidades pedagógicas a partir de uma perspectiva cultural” do curso de licenciatura
em Educação Física da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) – Campus XII. As ações pedagógicas foram desenvolvidas em
uma instituição de ensino básico da rede pública, situada no município de Guanambi (BA), compreendido no período de março
a novembro de 2017. As informações necessárias à elucidação do problema da pesquisa foram produzidas no contexto da
intervenção pedagógica e posteriormente sistematizadas e analisadas. Essas informações foram coletadas por meio de registros
reflexivos – ou diários de bordo – realizados cotidianamente, nos quais foram transcritos detalhes relativos ao desenvolvimento
das aulas. Foi utilizado também, como fonte para a obtenção dos resultados, a gravação em áudio das discussões e rodas
de conversa. A partir dos desdobramentos decorrentes das problematizações e da avaliação realizada ao final do ano letivo,
identificamos nos alunos uma possível desconstrução das representações ou signos da cultura dominante, inicialmente presentes
em seus discursos. Ao final, identificamos, a partir das problematizações e vivências, que alguns discursos estereotipados a
respeito das lutas se desestabilizaram.
PALAVRAS-CHAVE: Currículo; Educação Física Escolar; PIBID.

ABSTRACT
This study was developed within the scope of the Institutional Scholarship Initiative Program in the context of the subproject
“Physical School Education: building pedagogical possibilities from a cultural perspective” of the undergraduate course in
Physical Education of the University of the State of Bahia (UNEB) - Campus XII. The pedagogical actions were carried out in
a public elementary school located in the municipality of Guanambi-Ba, from March to November 2017. The information
needed to elucidate the research problem was produced in the context of pedagogical intervention and Later systematized and
analyzed. This information was collected through reflective records - or daily logs - carried out daily, in which details related to
the development of the classes were transcribed. It was also used, as a source for obtaining the results, the audio recording of
discussions and talk wheels. From the developments resulting from the problematizations and the evaluation carried out at the
end of the school year, we identified in the students a possible deconstruction of the representations or signs of the dominant
culture, initially present in their discourses. In the end, we identified, from the problematizations and experiences, that some
stereotyped discourses about the struggles were destabilized.
KEYWORDS: Curriculum; Physical Education; PIBID.

Direitos autorais são distribuídos a partir da licença


Creative Commons
(CC BY-NC-SA - 4.0)
CRUZ et al.
110 Tematizando as lutas na educação física escolar: relato de uma prática pedagógica no contexto do PIBID

INTRODUÇÃO

Nos cursos de licenciatura, a aproximação da universidade com a realidade escolar é uma necessidade
formativa, mas esse contato muitas vezes fica restrito ao momento do estágio curricular supervisionado. Nesse
contexto, nota-se o surgimento de iniciativas políticas que visam fortalecer essa aproximação, e uma delas é o
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID).
O PIBID é um programa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) que
tem por finalidade fomentar a iniciação à docência, contribuindo para o aperfeiçoamento da formação de
docentes em nível superior e para a melhoria da qualidade da educação básica pública brasileira.
Este estudo foi desenvolvido no âmbito do PIBID no contexto do subprojeto “Educação Física escolar:
construindo possibilidades pedagógicas a partir de uma perspectiva cultural” do curso de licenciatura
em Educação Física da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) – Campus XII , cujo propósito consiste em
contribuir para a construção da legitimidade da Educação Física na escola, a partir da efetivação de uma prática
pedagógica orientada por princípios democráticos e de valorização da diversidade, que possibilite uma leitura
crítica da realidade social.
As ações pedagógicas do subprojeto sustentam-se no currículo cultural da Educação Física, proposto por
Neira e Nunes (2008; 2009) a partir do referencial teórico dos Estudos Culturais e do Multiculturalismo Crítico.
O currículo cultural da Educação Física tem como objetivo a formação de um sujeito ativo-crítico socialmente,
que seja suficientemente capaz de se posicionar e lutar por condições de vida e por relações sociais mais
democráticas.
A partir desta perspectiva, buscamos neste trabalho apresentar e refletir acerca do trato pedagógico do
conteúdo “lutas” nas aulas Educação Física no campo do PIBID - UNEB - Campus XII. Consideramos que o trato
pedagógico com as lutas é uma tarefa que se apresenta primordial, pois tal prática vem sendo negligenciada
no contexto escolar, em decorrência de argumentos como falta de competência técnica sobre tal conteúdo,
infraestrutura ausente ou inadequada, vinculação das lutas com violência e agressividade e até mesmo a
resistência dos próprios alunos (FERREIRA, 2006).
Nesse sentido, o trabalho com lutas, quando realizado, se restringe a uma análise conceitual de tal
conteúdo. Transformar tal situação, além de possível, é essencial, pois negar tais vivências aos estudantes é
limitar-lhes o direito ao repertório cultural existente na sociedade. Constitui uma barreira para compreenderem,
analisarem e questionarem as inúmeras manifestações relacionadas a temática que se impõe no cotidiano.
Para tanto, o trato pedagógico com as lutas, demanda muito mais competência cognitiva do que técnica.
Mobilizar tais competências é essencial para a prática pedagógica, ao passo que o professor deve tematizar
as práticas corporais dos vários grupos que coabitam a sociedade, engajado na luta por mudanças sociais,
priorizando procedimentos democráticos para a definição dos temas e atividades de ensino, além de valorizar
experiências de reflexão crítica sobre a ocorrência social das práticas corporais, aprofundando e ampliando os
conhecimentos dos alunos mediante o confronto com outras representações.

MÉTODOS

Este estudo se consiste em um relato de experiência que, segundo Cavalcante e Lima (2012, p. 96), “é
uma ferramenta de pesquisa descritiva que apresenta uma reflexão sobre uma ação ou um conjunto de ações
que abordam uma situação vivenciada no âmbito profissional de interesse da comunidade científica”.
Os procedimentos de intervenção pedagógica foram norteados pelos princípios do currículo cultural da
Educação Física. Primeiramente, no processo denominado de mapeamento, levantamos os conhecimentos
que os alunos possuem sobre determinada prática corporal. Portanto, durante o mapeamento, não há padrão
ou roteiro obrigatório a ser seguido.
O segundo processo é a tematização, que implica em abordar, interpretar, reconstruir, conferindo-lhes
novos significados sobre o tema selecionado. Assim, são convidados, por meio de problematizações e debates,
a produzirem novas formas de vivenciar a prática em questão, em conformidade com as formas de regulação

Caderno de Educação Física e Esporte, Marechal Cândido Rondon, v. 16, n. 1, p. 109-115, jan./jun. 2018.
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Tematizando as lutas na educação física escolar: relato de uma prática pedagógica no contexto do PIBID 111

que ocorrem no âmbito das aulas, e a relacionarem esse processo com as formas como a prática corporal
investigada se manifesta na sociedade mais ampla. Esse procedimento é denominado de ressignificação.
As ações de aprofundamento e ampliação dos saberes referentes à prática corporal tematizada, por sua
vez, permitem aos alunos conhecer aspectos culturais referentes à política, à história, aos saberes populares e
científicos, entre tantos outros que o trabalho possa requerer.
Por fim, outra possibilidade de ação pedagógica que o currículo cultural da Educação Física nos
direciona são os registros e avaliação. A avaliação no currículo cultural se caracteriza pela adoção de uma
postura etnográfica, para além das observações, os professores registram as ações didáticas desenvolvidas,
os encaminhamentos efetuados e as respostas dos educandos. Também recolhem e arquivam exemplares dos
materiais produzidos pelos alunos durante as aulas.
A sistematização e análise dos resultados desta experiência foram feitas por meio de registros reflexivos
– ou diários de bordo – realizados cotidianamente, nos quais foram transcritos detalhes e impressões relativas
ao desenvolvimento das aulas e aos seus acontecimentos. Nesta perspectiva, Soldati (2005) afirma que através
desta técnica é possível apresentar os problemas que surgiram durante o estudo, descrevendo as atividades
desenvolvidas, comentários, reflexões e medidas utilizadas para superar os desafios e obstáculos encontrados.
Utilizamos também, como fonte para a obtenção dos resultados, a gravação em áudio das discussões
e rodas de conversa. Para isso, foi feito o uso de um gravador na realização das intervenções pedagógicas,
para que fosse ampliado o poder de registro das falas dos alunos e a captação de elementos de comunicação
que pudessem ser significativos, tais como pausas de reflexão, dúvidas ou entonação da voz, aprimorando a
compreensão da narrativa. Autores como Patton (1990) e Rojas (1999) corroboram com este indicativo, pois o
gravador preserva o conteúdo original e aumenta a acurácia dos dados coletados.
As aulas que resultaram na elaboração deste relato ocorreram no período compreendido entre março
a novembro de 2016. A temática estudada nesse período letivo foram os esportes olímpicos, em função dos
Jogos Olímpicos decorrentes no momento. O cenário do estudo foi uma instituição de ensino básico da rede
pública situada no município de Guanambi (Bahia), com uma turma do 2° ano do ensino fundamental I.

A PRÁXIS PEDAGÓGICA

A prática pedagógica se configurou a partir de diferentes momentos interdependentes entre si.


Organizadas pela temática geral dos Jogos Olímpicos, iniciamos o desenvolvimento da prática pedagógica com
a temática Esportes Olímpicos, problematizamos junto ao tema megaeventos esportivos e seus legados para a
sociedade, e as análises sobre os aspectos sócio/históricos do país.
No decorrer do processo de tematização do conteúdo esportes olímpicos, realizamos discussões,
problematizações, vivências e experimentações práticas, cuja finalidade foi despertar novas informações
acerca desse fenômeno que permeia a cultura corporal, trocar experiências e expandir os conhecimentos
iniciais. Tematizar, na visão de Freire (1980) apud Neira (2010), implica procurar o maior compromisso possível
do objeto de estudo numa realidade de fato, social, cultural e política. O que se pretendeu com a tematização
foi uma compreensão profunda da prática corporal em foco e o desenvolvimento da capacidade crítica dos
alunos enquanto sujeitos de conhecimento, desafiados pelo objeto a ser conhecido.
Nossos recursos visuais como slides, vídeos e fotos, nos deram maiores possibilidades de identificarmos
discursos a respeito da luta como prática corporal. Dessa forma, estimulamos as crianças a relatarem seus
saberes, refletirem sobre os mesmos, na intenção de possibilitarmos uma reflexão crítica.
Conforme Nascimento (2005), quando o fenômeno lutas aparece na escola, isso acontece pelas
aberturas preconizadas por essa instituição para terceiros realizarem, em seu espaço, oficinas, voluntárias ou
não, desvinculadas do componente curricular Educação Física e do projeto político pedagógico da escola.

No espaço de intervenção escolar, podemos afirmar que o tema/conteúdo de lutas é pouco acessado
e, inclusive, o seu trato pedagógico suscita questionamentos e preocupações diversas por parte dos
profissionais atuantes na Educação Física (NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007, p. 92).

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Na tentativa de rompermos estes paradigmas, nas semanas posteriores tematizamos este conteúdo,
especificamente as lutas presentes nos Jogos Olímpicos, a saber: boxe, esgrima, judô, luta olímpica e taekwondo.
Para este relato, nos deteremos somente nas aulas com o conteúdo judô.
Ao tematizarmos o judô, discutimos acerca das suas origens, seus praticantes, quais grupos sociais
pertencem, em quais espaços se realizam, quais os procedimentos envolvidos. Foram feitas diversas
problematizações acerca das representações sociais inerentes a essa prática. Identificamos nos discursos dos
alunos que as lutas, de modo geral, eram eminentemente violentas. Marginalizavam esta prática corporal e a
associavam como sinônimo de agressão e/ou briga.

“Luta é briga, tia!” (ALUNO A)

Fato que nos levou a problematizar tais representações a fim de refletirmos sobre a marginalização desta
prática corporal na Educação Física escolar e no contexto social mais amplo. As vivências foram realizadas
por meio de brincadeiras com movimentos inerentes à luta. Segundo Neira (2011, p. 123), “no que tange
às vivências corporais multiculturalmente orientadas, sua característica distintiva com relação às demais
propostas do componente é a prática acompanhada de leitura e interpretação”.
Para ampliar e aprofundar os conhecimentos a respeito da prática corporal em foco foram planejados
momentos para assistir documentários e filmes, pesquisas na internet, em livros ou revistas, entrevistas com
participantes, visitas a locais de prática, entre outras. Atividades como essas prescindem de uma busca pessoal
do professor para que oriente os alunos acerca dos materiais, formato, procedimentos, pessoas envolvidas,
etc. É o momento da recontextualização pedagógica (BERNSTEIN, 1996), ocasião em que o docente trabalha
com textos culturais que contêm informações distintas, divergentes das acessadas pelos estudantes, o que faz
gerar um ambiente contra hegemônico.
Corroborando com estes apontamentos, apresentamos aos alunos alguns discursos de lutadores
profissionais – por meio de imagens, vídeos, etc. – que desconstruíam uma imagem eminentemente violenta
das lutas. Além disso, agendamos uma visita a um local onde são desenvolvidas lutas distintas com a finalidade
de ampliarmos o conhecimento acerca das mesmas. Para isso, propusemos que entrevistássemos professores
e praticantes da academia de lutas visitada.
As atividades de ensino voltadas para o aprofundamento possibilitam um entendimento maior dos
significados comumente atribuídos à prática corporal objeto de estudo. As atividades de ensino voltadas para
a ampliação procuram confrontar os conhecimentos culturais inicialmente disponíveis com outros, estimulam
o contato com discursos diferentes e enriquecem as leituras e interpretações realizadas.
Ao término do conteúdo lutas realizamos uma avaliação, onde foi analisado todo o processo de ensino/
aprendizagem. Indagamos acerca da diferença existente entre luta e briga.

“Na luta uma pessoa respeita a outra, cumprimenta. Na briga não...”


“A briga machuca!”
“Na luta tem respeito, na briga não tem!”
(Transcrições na íntegra da fala de alunos)

Questionamos também sobre o que eles aprenderam com o judô.

“Todas as pessoas podem participar: as crianças, os adolescentes, os adultos, as


mulheres e os idosos.”
“Tem que derrubar, tia!”
“O judô não deixa a gente brigar!”
(Transcrições na íntegra da fala de alunos)

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Entrecruzando as falas dos alunos no início das nossas problematizações com os discursos ao término
das mesmas, identificamos uma possível desconstrução da imagem deturpada – eminentemente violenta e
marginalizada – que estes possuíam acerca das lutas. Na prática pedagógica aqui relatada, a problematização
esteve presente na tentativa de confrontar as representações que os alunos tinham a respeito da violência
no âmbito das lutas. Ao final, conseguimos proporcionar uma reflexão sobre a marginalização desta prática
corporal e de seus praticantes no contexto social mais amplo. A partir das problematizações e vivências, alguns
discursos estereotipados a respeito das lutas se desestabilizaram. Neste sentido, relata Neira (2011, p. 116):

[...] quando problematiza os temas da cultura corporal, o currículo se transforma em um espaço de


crítica cultural, no qual se propicia o questionamento sobre tudo que possa ser “natural e inevitável”. A
ideia é colocar em xeque e permitir novos olhares sobre aquilo com que usualmente lidamos de modo
acrítico.

Assim, o Currículo Cultural da Educação Física vem desestabilizar o currículo dominante, colocar sua
própria identidade em questão, pois a partir do momento que o papel do mesmo é expor a cultura marginalizada
dos grupos subjugados da sociedade, aceitar as culturas vivenciadas pelos alunos e potencializar as vozes,
ele vem dizer que o ambiente escolar deve reconhecer e oferecer espaço para um debate do processo da
constituição das identidades dos alunos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Um dos apontamentos dos Estudos Culturais para a pedagogia consiste no direcionamento dos olhares
para as relações de poder. Neste sentido, ao dar a devida atenção a essas relações, torna-se necessário
analisar sua origem, por meio de indagações que entrevejam a mudança já que a submissão dos diferentes
não corrobora com os princípios democráticos propostos na atualidade para as escolas.
Nossas ações eram constantemente planejadas, refletidas, analisadas, num processo contínuo, sujeito a
adaptações conforme as necessidades dos sujeitos envolvidos, aproximando e confrontando os conhecimentos
dos alunos, promovendo o reconhecimento das diferenças, ao potencializar os interesses e as características
socioculturais dos discentes.
Ao tematizarmos o conteúdo lutas, emergiram questões que nos possibilitaram problematizar
representações e relações muitas vezes carregadas de opressão, submissão, estereótipo e preconceito, que
adentram os espaços da escola e as vivências “naturalizadas” das manifestações da cultura corporal que se
concretizam nesse contexto. A partir dos desdobramentos decorrentes das problematizações e da avaliação
realizada ao final do ano letivo, identificamos nos alunos uma possível desconstrução das representações ou
signos da cultura dominante, inicialmente presentes em seus discursos.
Foi possível apreender que o processo de desnaturalização apresentado nesse relato de experiência,
resultantes das ações pedagógicas desenvolvidas (tematização, ressignificação, aprofundamento, ampliação,
registros e avaliação), não é um fator comum que se concretize nas aulas de Educação Física Escolar, pois
suscita o rompimento de paradigmas existentes, construídos social, cultural e historicamente na área.
A partir dos desdobramentos da prática pedagógica aqui relatada é possível verificar que nos colocamos
como professores-pesquisadores. No decorrer do projeto, o professor-pesquisador continua mapeando os
saberes e conhecimentos dos alunos, e de forma contínua, com idas e vindas, vai compondo o currículo,
prioritariamente a partir das questões dos alunos em relação ao tema. Também como professor-etnógrafo,
pois vai a campo, observa, estuda, se envolve, pesquisa em diversas fontes. Os alunos também assumem o
papel de pesquisadores e etnógrafos, a medida em que vão coletando informações, assistindo aos vídeos,
aprendendo conceitos, táticas, técnicas, conhecendo locais de prática, aprofundando, ampliando, registrando
e ressignificando.

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Por tudo isso, corroboramos com os apontamentos de Neira (2011) ao defender uma noção curricular
aberta ao diálogo cultural, na busca contínua por uma Educação Física da diferença, que desestabiliza o
acomodado e desconstrói as certezas, por meio de um currículo que não se configura como uma proposta
definitiva, mas como um caminho a seguir, pois outros são possíveis e necessários para uma prática pedagógica
não estática.

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Autor correspondente: Marlon Messias Santana Cruz


E-mail: marlonmessias@hotmail.com

Recebido: 02 de fevereiro de 2018.


Aceito: 21 de março de 2018.

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