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3º ano, Turma A

Patrícia Carneiro da Silva

DIREITO PROCESSUAL CIVIL II


Professor Doutor Miguel Teixeira de Sousa
NÃO DISPENSA CONSULTA DAS AULAS PRÁTICAS DA PROF. FILIPA CALDAS

I – O OBJECTO DO PROCESSO
O objecto do processo é composto por dois elementos: o pedido e a causa de pedir. O
seu estudo é relevante, desde logo, por três ordens de razão:
o Importa saber se temos apenas um ou, antes, vários objectos
o Importa saber se esse objecto se modifica, ou pode modificar, durante a
pendência da causa
o Importa saber se as acções são iguais, por terem objectos iguais (desde logo pela
possível aplicação dos arts 580º e 581º CPC)
O pedido é um elemento essencial da petição inicial, na medida em que é através dele
que se estabelecem os limites da sentença, se a acção for julgada procedente – art 609º,
nº 1 CPC. Este representa a forma de tutela jurisdicional que é requerida para uma
situação jurídica. No processo declarativo, pode estar em causa a simples apreciação
da existência ou inexistência de facto ou de direito, a condenação na realização de uma
prestação ou, ainda, a constituição, modificação ou extinção de uma situação jurídica
(art 10º, nº 2 CPC). O pedido é sempre constituído por uma pretensão material e por
uma pretensão processual, na medida em que se deve referir à tutela de uma situação
jurídica de direito material, enquanto se refere também a um efeito jurídico. Note-se,
ainda assim, que o tribunal não está vinculado à qualificação jurídica feita pelas partes,
pelo que poderá corrigir o pedido erradamente formulado (art 5º, nº 3 CPC). O pedido,
em si mesmo, tem pressupostos processuais:
o Inteligibilidade – art 186º, nº 2, al a) CPC, que trata da aptidão da petição inicial;
o Idoneidade – o pedido tem de incidir sobre qualquer matéria com relevância
jurídica, pelo que não pode estar em causa algo pertencente à ordem moral ou
à ordem do trato social. Tem de haver algo juridicamente regulável, sob pena de
excepção dilatória (art 577º, al b) CPC);
o Determinação – só nos casos previstos na lei (art 586º CPC) são admitidos
pedidos genéricos (art 587º CPC). Fora esses, o pedido deve sempre ser certo,
ou seja, deve referir-se a um objecto individualizado e determinado.
Outra questão que se coloca no que concerne ao pedido é a questão da sua identidade:
a identidade de vários pedidos depende sempre dos respectivos efeitos jurídicos (art
581º, nº 3 CPC). Por exemplo, são idênticos dois pedidos de condenação na realização
de uma mesma prestação, assim como o pedido de apreciação do direito de propriedade
é parcialmente idêntico ao pedido de reivindicação do mesmo prédio (art 131º, nº 1 CC).
Já a causa de pedir representa o conjunto de factos necessário para individualizar a
pretensão do autor. Por exemplo, numa acção de reivindicação, a causa de pedir será o
facto de que resulta a aquisição, originária ou derivada, da propriedade. Vigorando o
princípio do dispositivo, estes factos são vinculativos para o Tribunal.
Existem três tipos de factos, com um regime específico relativamente aos poderes do
tribunal:

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o Factos necessários – integram a causa de pedir e são aqueles em que se


baseiam as excepções. Estes devem ser alegados pelas partes e não podem ser
investigados pelo tribunal;
o Factos complementares – não integrando a causa de pedir, resultam da
instrução e decisão da causa e concretizam ou complementam factos alegados
que integram a causa de pedir. Os mesmos só podem ser utilizados pelo
tribunal se a parte interessada der assentimento, estando submetidos à
disponibilidade das partes. Os factos complementares são os que permitem a
proceder a ação, tendo de ser os suficientes para sustentar os necessários
(relacionam-se, por isso, com o valor da concludência).
o Factos instrumentais – têm uma grande importância em termos probatórias,
pelo que não integram a causa de pedir. Não têm, obrigatoriamente, que ser
alegados pelo autor na petição inicial (art 5º, nº 2 CPC; excecionalmente, pode
entender-se ser obrigatório, diz o Professor Miguel Teixeira de Sousa, quando
sejam determinantes para o conhecimento de um facto necessário: por
exemplo, erro ou dolo, que só pode ser provado mediante factos instrumentais).
Os factos instrumentais podem ser adquiridos pelo tribunal durante a marcha
do processo, não sendo delimitadores do conhecimento do tribunal;
Às partes cabe avaliar quais os factos essenciais para a causa de pedir. Os factos
complementares são bastante relevantes para efeito do objecto do processo, pois que
são aqueles que caracterizam os factos alegados (EXEMPLO: pode não ser suficiente dizer, para
uma acção de despejo, que “A reside no imóvel” – poderá ser necessário complementar a informação,
dizendo “A reside no imóvel há dois anos”).
Note-se que a causa de pedir é diferente daquilo
que é necessário para a acção ser considerada procedente.
Não representam duas causas de pedir diferentes aquelas em que se invocam os
mesmos factos para concluir por classificações distintas. Assim sendo, se o autor,
invocando certos factos, sob determinada classificação e, na improcedência da acção,
alegar os mesmos factos para concluir por uma classificação diferente, a causa de pedir
é a mesma.
A função da causa de pedir é discutida pela Doutrina, cujo estudo levou à criação de
duas teorias:
o Teoria da individualização – a petição inicial basta-se com o pedido (todas as
possíveis causas de pedir podiam ser consideradas no processo), pelo que a
causa de pedir não tem de ser substancializada com factos, já que a alegação
de factos é um problema de êxito da ação. A sentença, ao responder, afirmativa
ou negativamente, à pretensão decidia em absoluta sobre a existência ou
inexistência da situação jurídica afirmada pelo autor;
o Teoria da substanciação – o objetivo da causa de pedir é defender a substância,
ou seja, o pedido terá de descrever os factos. Aqui, enquadram-se as doutrinas
dos Professores Miguel Teixeira de Sousa e José Lebre de Freitas:
• Prof. Miguel Teixeira de Sousa: a causa de pedir comporta todos os
factos que sejam necessários para individualizar a pretensão material
alegada pelo autor. Esta é uma perspetiva mais restrita (bastam os
factos necessários a individualizar a pretensão do autor e não os que
sejam necessários à procedência da ação). Os factos complementares e
instrumentais, apesar de poderem ser considerados pelo tribunal (art

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5º/2) e alegados pelas partes, não integram a causa de pedir.


Paralelamente às três categorias de factos, o Professor distingue os
factos principais, compostos pelos factos essenciais e pelos factos
complementares.
▪ a) os factos instrumentais têm uma função probatória, pelo que
não terão de ser mencionados na petição inicial. Tê-lo-ão, no
entanto, sempre que sejam necessários ao conhecimento de um
facto essencial, por exemplo nos casos de erro e dolo.
▪ b) os factos complementares/concretizadores são os factos que
complementam/concretizam factos alegados e que integram a
causa de pedir.
• Prof. José Lebre de Freitas – integram a causa de pedir todos os factos
que constam da previsão da norma, sendo essa a solução que decorre
da lei, nos termos do art 581º/4 (que remete para as normas de direito
substantivo em cuja previsão se contém o facto para o qual estatuem o
efeito jurídico pretendido). Os factos essenciais, para efeitos do artigo
5º/1, são todos aqueles de que depende a procedência da ação. A
afirmação da situação jurídica tem de ser fundada em factos que, ao
tanto integram, tal como os outros factos alegados pelas partes, a
matéria fáctica da causa, como exercem a função de individualizar a
pretensão para o efeito da conformação do objeto do objeto. Antunes
Varela concorda com esta posição: exige, sempre, a indicação do título
(facto jurídico) em que se baseia o direito do autor, contrariamente à
teoria da individualização, que deste prescinde sempre que não seja
necessário para identificar o direito invocado pelo autor.
Assim, o autor deve, na petição inicial, expor os factos que servem de
fundamento ao pedido. Esses constituem a causa de pedir e esta
delimita o pedido para o efeito de, juntamente com este e com as partes,
identificar a causa.

FORMAS DE PEDIDO
Existem várias modalidades de pedido:
o Pedido único/pedido múltiplo – o pedido é único quando é apenas um; é
múltiplo quando é mais que um, podendo isso corresponder a uma cumulação
objectiva ou a um concurso de objectos processuais;
o Pedido certo/pedido genérico – o pedido é certo quando o seu objecto é uma
prestação individualizada (reporta-se a um bem concreto) ou determinada (está
definida na sua espécie e quantidade); o pedido é genérico quando se refere a
uma quantidade indeterminada, indeterminação que pode resultar da
referência a uma universalidade de facto ou de direito (p.e. a venda de uma
biblioteca não exige a individualização de todos os livros que a compõem), ou
ainda a um montante pecuniário indeterminável (p.e. autor sofreu um acidente
e não sabe ainda que tratamentos terá de fazer, não sendo assim possível
calcular a indemnização). O Professor Miguel Teixeira de Sousa relembra que o
art 569º CC se sobrepõe ao Código de Processo Civil, pelo que o autor não é

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obrigado a concretizar o montante indemnizatório. Exige-se, sim, alegação dos


danos, para que se possa depois calcular a indemnização.
Perante um pedido indevidamente genérico, ocorre uma de duas situações:
• Indeterminação leva a inteligibilidade, situação na qual há ineptidão da
petição inicial;
• Pedido é inteligível, mas necessita de concretização ou individualização,
o Tribunal pode convidar o autor a concretizar ou individualizar o pedido
(art 590º CPC).
o Pedido total/pedido parcial – o pedido é total se abranger a totalidade dos
efeitos jurídicos; é parcial se apenas abranger uma parcela dos mesmos. A
formulação de um pedido parcial pode indiciar litigância de má fé (se esse
desdobramento de pedidos tiver como objectivo, por exemplo, contornar a
competência dos tribunais). A parcialidade pode ser:
• Aberta – a petição diz “tenho direito a 100€, mas peço 10€”
• Oculta – autor pede 10€, omitindo que tem direito a mais 90€.
o Pedido de prestação vincenda – é o pedido em que a parte formula o pedido de
condenação da contraparte numa prestação cujo cumprimento ainda não é
exigível, ou seja, em que a parte requer uma condenação in futurum1. Este tipo
de acções estão previstas no art 10º, nº 2, al b) e especialmente previstas no art
557º CPC. O valor da causa é determinado com base no art 300º CPC. Esta
condenação in futurum representa uma excepção (art 610º, nº 1 CPC) à regra
geral, segundo a qual a inexigibilidade da prestação obsta à procedência da
acção condenatória. Note-se que o próprio art 557º determina as condições em
que as acções in futurum são dotadas de interesse processual e que a falta
deste, como se sabe, leva a excepção dilatória e consequente absolvição do réu
da instância. Pergunta-se: poderá o réu invocar este interesse processual contra
o autor, em sede de pedido reconvencional? Melhor: poderá o réu invocar
direitos ainda não exigíveis se estiverem preenchidas as condições do 557º
CPC? Determina-se que, não tendo a iniciativa da acção partido do réu, esta
parte não poderá aproveitar a acção contra ele proposta para fazer valer contra
o autor direitos que ainda não são exigíveis. O valor da causa resulta da soma
dos valores da prestação vincenda e da prestação vencida, como decorre do art
297º/2.

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A acção de condenação in futurum é admissível quando:
• A falta de título executivo no momento do vencimento da prestação possa causar grave prejuízo
ao credor (art 472º, nº 2 CPC)
• No âmbito de uma venda a prestações, a parte, conjuntamente com a condenação relativa às
prestações já vencidas mas não cumpridas, pretende obter a condenação do comprador nas
prestações vincendas (art 557º, nº 1 CPC)
• A parte pretender obter a condenação da contraparte na sanção pecuniária compulsória (art
829º-A CC)

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RELAÇÕES ENTRE OBJECTOS – PEDIDOS MÚLTIPLOS


Podem identificar-se várias relações distintas entre objectos processuais. Desde logo,
temos a relação de identidade: a identidade entre dois objectos processuais poderá
ser total, se eles coincidirem completamente na causa de pedir alegada e no pedido
formulado. Se a isso juntarmos a identidade de partes, teremos um caso de
litispendência ou de caso julgado.
Se a identidade entre objectos for meramente parcial, pode verificar-se uma de duas
situações:
o Relações de consumpção – o objecto de uma acção posterior inclui-se no
objecto de uma acção anterior. Por exemplo, uma acção de simples apreciação
da propriedade do imóvel é consumida por uma acção de reivindicação (art
1311º CC) que incida sobre esse mesmo imóvel. A relação de consumpção
justifica a arguição de excepção de litispendência ou de caso julgado (arts 580º
e 581º CPC);

o Relações de prejudicialidade – aqui, o julgamento de um objecto


processual depende da apreciação de um outro objecto. Assim acontece, por
exemplo, se estando pendente uma acção de apreciação da propriedade de um
imóvel, o mesmo autor instaurar contra o mesmo réu uma acção de
reivindicação do mesmo imóvel. A acção de mera apreciação é prejudicial
perante esta acção de reivindicação. A prejudicialidade pode ser:
• Homogénea – verifica-se apenas entre objectos do mesmo âmbito do
processo civil;
• Heterogénea – constitui-se entre um objecto do domínio do processo
civil e um outro de âmbito diverso (por exemplo, do âmbito do processo
administrativo).
A relação de prejudicialidade pode verificar-se entre objectos de várias acções. Se
assim for, pode o tribunal no qual foi instaurada a acção dependente ordenar a
suspensão da instância (art 272º, nº 1 CPC). Assim, por exemplo, no caso de estar
pendente uma acção de resolução do contrato de arrendamento, o juiz de uma acção
de preferência na venda instaurada pelo arrendatário pode suspender a instância até
ser decidida a acção de despejo. Esta possibilidade evita decisões contraditórias. Ainda
assim, não deve proceder-se a essa suspensão se houver indícios de que a causa
prejudicial foi proposta apenas e só para suspender a instância ou se a causa
dependente estiver tão avançada que os prejuízos resultantes da suspensão superam
as vantagens (art 272º, nº 2 CPC).
Pode verificar-se uma relação de prejudicialidade, também, entre elementos do
objecto de uma mesma acção (art 92º, nº 1 CPC). Se isso acontecer, o juiz autonomiza
do objecto da acção a questão prejudicial e remete as partes para o processo
competente (penal ou administrativo). Ainda que tal feito traga vantagens – desde logo
a possibilidade de essa questão ser resolvida no tribunal com mais competência para
tal – a verdade é que o decretar dessa relação de prejudicialidade e consequente envio
da questão para o respectivo tribunal é um poder discricionário do juiz.
Entre objectos, pode também verificar-se uma relação de concurso. Esta existe se
os objectos processuais se referirem a um mesmo efeito jurídico. Por exemplo, se são

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concorrentes dois direitos potestativos que permitem a anulação de um mesmo acto


jurídico ou duas pretensões que se referem à mesma prestação, há concurso. O
concurso pode ser:
• Concurso stricto sensu – o autor invoca duas situações jurídicas referidas a um
mesmo efeito jurídico e o resultado pretendido é obtido desde que a acção
proceda quanto a um deles. Por exemplo, se o autor alega como fundamento
para divórcio tanto a violação de deveres conjugais como a separação de facto
durante mais de três anos, o divórcio será decretado se procedente qualquer
um dos fundamentos. Aí, o concurso de objectos representa uma relação de
alternatividade entre os mesmos.
• Concurso de títulos de aquisição – nem sempre há alternatividade entre
objectos no caso de concurso. Por exemplo, se o credor tem direito à prestação
tanto por via de contrato como por ser sacador de uma letra de câmbio, as
pretensões são concorrentes, pois que se referem à mesma prestação, mas não
são autónomas2 entre si, pelo que não se podem considerar alternativas.
Poderá ainda haver uma relação de cumulação, em que no mesmo processo são
apresentados vários objectos processuais referidos a distintos efeitos jurídicos. A
cumulação objectiva distingue-se da relação de concurso entre objectos por, agora,
estarem em causa efeitos jurídicos distintos.
cumulação simples
(art 555º)
inicial cumulação alternativa
(art 553º)
Cumulação
objectiva cumulação subsidiária
cumulação stricto
sucessiva
sensu
simples

Coligação alternativa

subsidiária

Os pressupostos processuais terão de ser avaliados perante cada um dos objectos


cumulados, pelo que a cumulação se pode desfazer pelo indeferimento liminar da
petição inicial ou pela absolvição do réu da instância relativamente a apenas um desses
objectos. Ainda assim, há excepções a esta apreciação autónoma: desde logo, o
patrocínio é obrigatório nas causas cujo valor excede a alçada do tribunal de primeira
instância pelo que, como na cumulação simples o valor da causa se determina pelo
valor de todos os objectos, o patrocínio pode ser obrigatório numa situação em que o
não seria quanto a cada um dos pedidos. Também quanto à competência relativa há
excepção: a cumulação objectiva exige apenas a competência absoluta do tribunal para
apreciar todos os objectos cumulados, pelo que o tribunal relativamente competente
para um dos objectos sê-lo-á para todos os demais.

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Exemplo tem em conta lei antiga: o art 17º LULL dizia que as excepções oponíveis pelo devedor à
pretensão emergente do contrato de mútuo seriam também invocáveis contra a pretensão cambiária.

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CUMULAÇÃO INICIAL
CUMULAÇÃO INICIAL SIMPLES
Na cumulação simples, o autor requer a procedência simultânea de todos os pedidos
cumulados e a produção de todos os seus efeitos – art 555º, nº 1 CPC. Esta modalidade
de cumulação objectiva é, em princípio, uma faculdade que assiste à parte. No entanto,
nem sempre é assim: pode acontecer que recaia sobre a parte um ónus de cumulação
de pedidos (exemplo do art 1792º nº 2 CC).
No âmbito da cumulação simples, os efeitos que respeitam a cada um dos pedidos
devem ser diferentes – não só em termos jurídicos, mas também em termos
económicos, sob pena de cumulação aparente. Significa isto que, numa acção que
cumula vários pedidos, o seu valor é a quantia que corresponde à soma de cada um
dos respectivos valores, o que mostra que cada um tem a sua finalidade económica.
Para que seja possível haver cumulação objectiva simples, é necessário que se verifique
um conjunto de pressupostos processuais:
o Não exclusão por lei, como acontece quanto às acções de investigação da
maternidade e da paternidade (arts 1814º e 1869º CC), onde se exige que as
acções sejam especialmente (exclusivamente) instauradas com esse propósito.
• Falta do pressuposto: se for violada a previsão legal que exclui a
cumulação, deve aplicar-se analogicamente o disposto no art 37º, nº 4.
No entanto, se o tribunal não for absolutamente competente ou a forma
de processo não for compatível com todos os pedidos, as consequências
da cumulação ilegal são consumidas pela falta desses requisitos;
o Compatibilidade processual – exige-se que o tribunal seja absolutamente
competente para todos os objectos apresentados (art 555º, nº 1, 2ª parte e art
37º, nº 1 CPC). Mais que isso, exige-se adequação das formas de processo a que
corresponde cada um dos pedidos (arts 470º, nº 1, 2ª parte e 37º, nº 1, 2 e 3
CPC).
• Falta do pressuposto: pode resultar de incompetência absoluta do
tribunal ou da inadequação das formas do processo para um/uns do(s)
pedido(s). Havendo despacho liminar, dá-se o indeferimento parcial da
petição. Já no momento do despacho saneador, verificar-se-á uma
excepção dilatória3 que levará à absolvição do réu da instância quanto
ao(s) objecto(s) para os quais o tribunal é absolutamente incompetente.
o Compatibilidade substantiva – tem de se verificar uma concordância prática
entre os efeitos decorrentes dos objectos cumulados, ou seja, estes não podem
ser contraditórios (arts 555º, nº 1, 1.ª parte e 186º, nº 2, alínea c) CPC). Por
exemplo, não pode haver cumulação entre o pedido de resolução do contrato e
o pedido de cumprimento do mesmo.
• Falta do pressuposto: a incompatibilidade substantiva resulta da falta
de concordância prática entre os efeitos por eles produzidos, o que gera
ineptidão da petição inicial e absolvição do réu da instância (arts 186º,
nº 1, 576º, nº 2, 577º, alínea b), 578º e 278º, nº 1, alínea b) CPC)

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Se for um caso de incompatibilidade entre as formas de processo, estamos perante um caso de
inadequação formal, que representa uma excepção dilatória inominada

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o Conexão objectiva – não é requerida, mas é desejável, por aplicação analógica


do art 37º, nº 4 (e não do art. 38.º CPC)

CUMULAÇÃO INICIAL ALTERNATIVA


Na cumulação alternativa, a parte requer a procedência de todos os objectos
cumulados, mas pretende apenas obter, segundo a escolha do réu, a produção dos
efeitos de um desses – art 553º CPC. Tal acontece, por exemplo, se o autor pedir a
condenação do réu na entrega de um quadro ou de uma jóia: o réu entregará um ou
outro. O valor destas acções é calculado apenas com base no pedido de maior valor
(art 297º CPC). Note-se que esta situação é diferente daquela em que o autor interpõe
vários pedidos, sabendo de antemão que um ou mais que um não poderão proceder,
mas deixando ao tribunal a possibilidade de optar pela procedência de algum (ou alguns)
dele(s). Estes casos são, inclusive, casos de ineptidão da petição inicial por
indeterminação do pedido.
Para que seja possível haver cumulação objectiva alternativa, é necessário que se
verifique um conjunto de pressupostos processuais:
o Alternatividade substantiva – exige-se que os pedidos possam ser apresentados
alternativamente (art 553º, nº 1 CPC)
• Falta do pressuposto: ocorre quando os objectos não são alternativos. À
falta de alternatividade deve ser aplicada, por analogia, a consequência
da contradição substantiva na cumulação simples (ineptidão da petição
inicial e consequente absolvição do réu da instância).
o Compatibilidade processual – aplicação analógica do art 555º CPC
• Falta do pressuposto: consequências idênticas à da falta deste
pressuposto na cumulação simples (havendo despacho liminar, dá-se o
indeferimento parcial da petição. Já no momento do despacho
saneador, verificar-se-á uma excepção dilatória)
o Conexão objectiva – não se exige, até porque a própria relação de
alternatividade substantiva dispensa a necessidade de qualquer outra conexão
entre objectos.

CUMULAÇÃO INICIAL SUBSIDIÁRIA


A cumulação subsidiária é aquela em que o autor requer a procedência de um objecto
(principal) e, subsidiariamente, a de um outro (objecto subsidiário). Aqui, são
apresentados vários objectos, mas o objecto que é formulado subsidiariamente só é
apreciado se o objecto principal for julgado improcedente. O valor da causa é o
correspondente ao objecto principal – art 297º CPC.
Note-se que a cumulação subsidiária não é uma cumulação condicional, pois que todos
os pedidos estão pendentes desd’o início da instância. Esta modalidade de cumulação
encontra-se prevista no art 554º CPC e ocorre, por exemplo, quando o autor intenta
uma acção de reivindicação de um imóvel e, subsidiariamente, pede o reconhecimento
do seu direito de usufruto sobre o mesmo. Geralmente, a improcedência parcial do
objecto principal não leva à apreciação do objecto subsidiário.
Mesmo que o objecto subsidiário nunca venha a ser apreciado, o mesmo encontra-se
pendente até ao fim da acção, o que pode ter consequências ao nível da litispendência.

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O termo da pendência do objecto subsidiário dá-se com o trânsito em julgado da


decisão sobre o objecto principal, devendo ser reportado ao momento da propositura
da acção (aplicação analógica do art 276º CC). Já quanto ao prazo de prescrição a que
eventualmente está sujeito o direito alegado como subsidiário, parece que sempre que
a subsistência do objecto subsidiário não seja prejudicada pela procedência do objecto
principal, há lugar à aplicação analógica do art 327º, nº 2 CC: durante a pendência da
causa, mantêm-se a interrupção da prescrição; após decisão sobre a procedência do
objecto principal, começa a correr novo prazo prescricional.
Para que seja possível haver cumulação objectiva subsidiária, é necessário que se
verifique um conjunto de pressupostos processuais:
o Compatibilidade processual – exige-se a compatibilidade processual entre os
objectos cumulados, ou seja, exige-se competência absoluta do tribunal e
compatibilidade de formas de processo (remissão do art 554º, nº 2 para o art
37º, nº 1 CPC e emissão do art 554º, nº 2 para o art 37, nº 1, 2 e 3 CPC)
• Falta de pressuposto: havendo despacho liminar, dá-se o indeferimento
parcial da petição. Já no momento do despacho saneador, verificar-se-á
uma excepção dilatória
o Conexão objectiva – o valor da acção é apenas o correspondente ao objecto
principal, pelo que não se justifica que, numa acção cujo valor é assim
determinado, se possa apreciar um objecto subsidiário totalmente diferente do
principal. Ainda assim, este não é um pressuposto que resulte expressamente
da lei. Podendo satisfazer-se de maneira diferente, podemos dizer que este
pressuposto se encontra verificado nas situações em que entre objectos se
verifica uma das situações previstas no art 36º CPC. Tal como no caso da
cumulação simples, a conexão objectiva não é exigida.
Uma vez que o objecto subsidiário apenas é analisado caso o objecto principal seja
julgado improcedente, cabe saber se se mantém, também aqui, a regra de apreciação
dos pressupostos processuais perante cada um dos objectos em separado. A
pendência do objecto subsidiário desde o início da acção parece justificar que assim se
faça, pelo que os pressupostos processuais serão, também perante esse, avaliados nos
momentos normais – despacho liminar e despacho saneador.

CUMULAÇÃO SUCESSIVA
A cumulação sucessiva acontece quando, ao objecto inicial da acção é cumulado, e
momento posterior e por iniciativa de uma das partes, um outro objecto. Esta situação
difere da modificação do objecto: no primeiro caso, temos a apresentação de um novo
objecto a par do inicial; no caso da modificação, o que temos é um objecto a ser
substituído por outro.
O autor pode apresentar, no regime de cumulação simples, alternativa ou subsidiária,
um outro objecto e pode invocar, a par do inicial, um outro objecto. Esta é a situação
de CUMULAÇÃO STRICTO SENSU. Esta pode surgir, portanto, pela superveniência de
factos susceptíveis de integrar uma causa de pedir (situação na qual a ocorrência
desses factos se dá após o momento normal de invocação em juízo – superveniência
objectiva – ou o conhecimento pela parte apenas se dá posteriormente –
superveniência subjectiva).

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Diferentemente, pode acontecer que o réu alegue uma excepção peremptória ou


deduza pedido reconvencional, situação em que terá de apresentar um objecto
distinto do que é invocado pelo autor. A cumulação de novo objecto baseada em factos
supervenientes é sempre admissível até ao encerramento da fase de discussão e
julgamento – art 588º CPC, nº 1 CPC. Não sendo os factos supervenientes, a cumulação
sucessiva stricto sensu só é permitida nas condições referidas pelos arts 264º e 265º
CPC, analogicamente aplicáveis. Mais que isso, exige-se a verificação de todos os
pressupostos requeridos para a respectiva modalidade de cumulação inicial simples,
alternativa ou subsidiária.

MODIFICAÇÃO DO OBJECTO
Consiste na substituição do objeto inicial por um outro objeto. Ao contrário do que
sucede na cumulação objectiva, aqui, o processo continua a ter um único objeto. Esta
possibilidade é uma manifestação da disponibilidade das partes sobre o objeto,
configurando-se como uma exceção ao princípio da estabilidade da instância.

MODIFICAÇÃO DO PEDIDO
o Modificação qualitativa – dá-se a substituição do pedido formulado por um
novo pedido: o autor substitui a situação jurídica invocada;
o Modificação quantitativa – pode implicar a ampliação ou a redução do pedido
inicialmente formulado. A ampliação implica uma maior quantificação do
pedido e a redução implica uma menor quantificação do pedido;
o Modificação consensual – se as partes estão de acordo, o pedido pode ser
alterado ou ampliado em qualquer momento da tramitação da ação em
primeira ou em segunda instância (art 264º CPC). Esta não pode colidir com o
interesse público e, se for admissível e estivermos perante pedidos múltiplos,
há que verificar os requisitos da cumulação respetiva posteriormente à
modificação.
o Modificação unilateral (sem culpa) – situações de superveniência objetiva
(factos que ocorreram depois da ação) e subjetiva (factos que ocorreram antes,
mas o autor não os conhecia). Há lugar à aplicação do art 588º:
• Se souber antes da audiência prévia, deve alegar na audiência prévia;
• Se souber depois da audiência prévia, deve alegar na audiência final;
• Se for admissível e estivermos perante pedidos múltiplos, há que
verificar os requisitos da cumulação respetiva posteriormente à
modificação;
o Modificação unilateral (com culpa) – no caso de ampliação, se a ampliação for
o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo (art 265º, nº 2 CPC);
no caso de redução, a qualquer momento (art 265º, nº 2 CPC). Se for admissível
e estivermos perante pedidos múltiplos, há que verificar os requisitos da
cumulação respetiva posteriormente à modificação.

MODIFICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR


o Modificação qualitativa – causa de pedir invocada é substituída por outra que
é subsumível a uma diferente qualificação jurídica;

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

o Modificação quantitativa – a parte amplia ou reduz a causa de pedir alegada,


ou seja, pode resultar da invocação ou da desistência de alegação de factos que
integram a causa de pedir complexa;
o Modificação consensual – se existir acordo na modificação, a causa de pedir
pode ser alterada ou ampliada em qualquer momento da tramitação da ação
em primeira ou segunda instância (art 264º);
• Excepção: se da alteração resultar perturbação inconveniente para a
instrução discussão e julgamento;
• Se for admissível e estivermos perante pedidos múltiplos, há que
verificar os requisitos da cumulação respetiva posteriormente à
modificação;
o Modificação unilateral (com culpa) – é admissível no caso de o autor pretender
alterar ou ampliar a causa de pedir em consequência de confissão feita pelo réu
e aceite pelo autor (art 265º, nº 1). Se o objectivo for a redução, tal é possível
por analogia do art 265º, nº 2 CPC. Se for admissível e estivermos perante
pedidos múltiplos, há que verificar os requisitos da cumulação respetiva
posteriormente à modificação;
o Modificação unilateral (sem culpa) – situações de superveniência objetiva
(factos que ocorreram depois da ação) e subjetiva (factos que ocorreram antes,
mas o autor não os conhecia). Quanto à aplicação do art 588º:
• Se souber antes da audiência prévia, deve alegar na audiência prévia;
• Se souber depois da audiência prévia, deve alegar na audiência final.
Se for admissível e estivermos perante pedidos múltiplos, há que verificar os
requisitos da cumulação respetiva posteriormente à modificação.

Do art 573º decorre o princípio da concentração da defesa: o que não é alegado na


contestação morre.
Todas as exceções peremptórias que o réu quer invocar, tê de ser invocadas na
contestação (vale igualmente para as impugnações de facto). Os factos não alegados
na contestação precludem – princípio da preclusão da defesa.
A única exceção à impossibilidade de alegação de factos é a superveniência: ao autor
permite-se a modificação do pedido e da causa de pedir em caso de culpa e
superveniência – ainda se permite, nos termos dos arts 264º e 265º); o réu apenas pode
alegar factos novos em razão de superveniência.

VÍCIOS DO OBJECTO PROCESSUAL


Podem verificar-se vícios da causa de pedir, vícios do pedido e, ainda, de
incompatibilidade intrínseca.
o Vícios da causa de pedir – podem verificar-se quando a causa de pedir não
existe ou é totalmente ininteligível (art 186º, nº 1º, al a) CPC). A nulidade que
resulta da ininteligibilidade da causa de pedir é sanável através da ampliação
da matéria de facto na réplica, se o processo o permitir. Se o autor não
fundamentar suficientemente o seu pedido, não há falta de causa de pedir, mas
antes lugar a convite ao aperfeiçoamento.
o Vícios do pedido – se o pedido faltar ou for ininteligível, a petição inicial é
inepta. Considera-se não haver qualquer pedido se a parte não requer tutela

11
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

jurisdicional para a situação que invoca. A ininteligibilidade do pedido decorre


de uma formulação contraditória.
o Incompatibilidade intrínseca – a petição inicial é inepta se houver
incompatibilidade entre a causa de pedir alegada e o pedido formulado – art
186º, nº 1, al b) CPC. Note-se que isto é um caso de incompatibilidade jurídica,
diferente da situação em que a causa de pedir é insuficiente para fundamentar
o pedido (situação que leva à improcedência da acção) e que, sendo manifesta,
poderá levar ao indeferimento da petição inicial.
A ineptidão da petição inicial gera a nulidade do processo, a qual constitui uma
excepção dilatória. Esta ineptidão pode ser conhecida oficiosamente pelo tribunal, mas
as partes só a podem arguir até à contestação (inclusive) – art 198º, nº 2 CPC.
Posteriormente, em sede de despacho saneador, essa levará à absolvição do réu da
instância.

III – A PROVA
ENQUADRAMENTO GERAL E DIREITO PROBATÓRIO
Toda a apreciação da causa pressupõe matéria de facto e matéria de direito. Nesta
última, pode haver necessidade de prova. A definição de prova decorre do Código Civil
(art 341º), sendo que o Código Civil de 1867 definia a prova como a demonstração dos
factos alegados em juízo.
Podemos falar de prova em vários sentidos, mesmo que jurídicos:
o Actividade destinada a demonstrar a veracidade dos factos alegados em juízo
(sentido probatório);
o Meios de prova (sentido do art 341º CC);
o Sentido de resultado (“o facto ficou provado”)
A prova visa formar na mente do juiz a convicção da veracidade dos factos alegados.
Assim sendo, os meios de prova representam os elementos que fornecem a informação
que permite a criação dessa convicção. No fundo, a função da prova é a de demonstrar
de forma convincente uma afirmação de facto.
Para efeitos de prova, considera-se qualquer facto jurídico – qualquer facto que integre
uma previsão legal. Isto significa que podem constituir objecto de prova factos materiais
(acontecimentos determináveis no termo e no espaço), factos hipotéticos (p.e interesse
contratual negativo) e ainda factos psíquicos (como sejam as intenções, a vontade ou
os sentimentos). Se for necessário, aquando da prova, ter em conta regras técnicas ou
científicas, o tribunal pode recorrer-se de prova pericial.
Se há actividade probatória, há direito probatório. Este, por sua vez, pode ser material
ou formal:

DIREITO PROBATÓRIO FORMAL E MATERIAL


O direito probatório material diz respeito a: delimitação do objecto da prova,
repartição do ónus da prova, admissibilidade dos meios de prova e critérios de
avaliação da prova. Este está regulado na legislação civil, e não na legislação processual.

12
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

Aqui se encontram regulados os meios de prova, que podem ser:


o Típicos – previstos na lei (documentos, confissão, testemunhas, inspecção
judicial, apresentação de coisas);
o Atípicos – não previstos na lei ou que podem ser utilizados sem a observância
do procedimento probatório (art 345º, nº 2 CC).
A prova pode ainda ser pré-constituída ou constituenda, consoante a prova se constitua
antes do início do processo (por exemplo o documento que comprova a propriedade
do autor sobre a coisa) ou durante o processo (por exemplo a prova testemunhal).
Já o direito probatório formal trata da apresentação e do modo de produção da
prova em juízo – do procedimento probatório. No fundo, estão em causa os meios de
prova admissíveis para a demonstração da realidade dos factos (essencialmente, arts
423º e seguintes CPC).

MODALIDADES DA PROVA
Existem várias modalidades de prova:
o Prova directa – aquela em que é demonstrado o próprio objecto da prova;
o Prova indirecta – aquela em que o objecto da prova é indirectamente mostrado,
ou seja, demonstrado através de um outro facto (p.e. provar o facto y, facto
controvertido, através da demonstração do facto z, do qual o facto y se infere).
Esta modalidade de prova é realizada através de factos instrumentais, podendo
ser:
• Presunções legais – o facto instrumental é a base de uma presunção
legal. Estas podem ser iliíveis (iuris tantum) ou inilidíveis (iuris et de iure).
As presunções legais conduzem à inferência de um facto, pois que o juiz
é levado a inferir pela lei um facto desconhecido de um outro que é
conhecido. Por não ser formada qualquer convicção sobre a realidade de
um facto, as presunções legais não são meios de prova, mas antes meios
de dispensa da prova do facto presumido;
• Prova prima facie – é a chamada prova de primeira aparência, na qual o
facto provado permite deduzir o objecto da prova através do curso
típico dos acontecimentos. Esta tem por base presunções naturais ou
judiciais, presentes nos arts 349º e 351º CC. Através desta, é feito um
“juízo crítico sobre factos conhecidos”. A prova prima facie exige que o
tribunal verifique a adequação causal entre o facto instrumental e
objecto de prova e, depois, caso se verifique adequação, deve ser
apreciada e avaliada, nos termos gerais, a prova realizada quanto ao
facto instrumental. Este tipo de prova é essencialmente utilizado para
fazer prova de uma conduta negligente ou para demonstrar uma relação
causa/efeito.
GRAUS DE PROVA
A finalidade da prova é formar a convicção do tribunal sobre a realidade de um facto.
Assim, pode falar-se em grau de prova, representando este o grau de convicção exigida
ao tribunal. O grau de prova não depende dos meios de prova usados pelas partes.

13
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

Mais que isso, este estabelece a medida da convicção que é necessária para que o
tribunal possa julgar determinado facto como provado.
Neste âmbito, pode distinguir-se entre:
o Prova stricto sensu – é aquela que se funda na convicção da realidade do facto,
exigindo uma convicção que não é compatível com a admissão de que a
realidade possa ser distinta da que se considera provada. Esta não impede que
o tribunal forme a sua convicção com base na probabilidade da realidade do
facto, mas pretende que o grau de convicção permita excluir outra configuração
da realidade que foi considerada provada.
o Mera justificação – esta basta-se com a demonstração de que o facto é
verosímil ou plausível, pelo que só se exige que o tribunal forme a convicção da
probabilidade do facto. Esta só é suficiente nas situações previstas na lei (por
exemplo no caso das providências cautelares).
o Princípio de prova – este é o menor grau de prova, valendo apenas como facto
corroborante para a prova de um facto. Aqui, não temos o suficiente para
estabelecer qualquer prova, mas antes para coadjuvar, em conjugação com
outros elementos, a prova de um facto. Por vezes, a lei exclui o próprio valor de
princípio de prova (p.e. art 1603º, nº 1 CC)

DIREITO À PROVA
O direito à prova decorre, desde logo, do direito de acesso à justiça e aos tribunais (art
20º CRP). Às partes incumbe o ónus de apresentar o rol de testemunhas, de requerer
quaisquer outras provas e de alterar os requerimentos probatórios que haja
apresentado nos articulados. Em contrapartida, é-lhes garantida audiência
contraditória em matéria probatória (art 415º CPC). O direito à prova não afasta o
poder probatório dos tribunais, que concentram em si a possibilidade de realizar as
diligências consideradas necessárias pelo juiz para o apuramento da verdade (art 6º
CPC).
Este direito não é absoluto. O mesmo cede perante as ilicitudes da prova e a proibição
da mesma – as provas ilícitas são as que são obtidas de forma ilegal ou cuja produção
constitui um ilícito; as provas proibidas são as que, apensar de não serem ilícitas, não
podem ser produzidas em processo.
Como exemplos de provas ilícitas temos, atendendo ao modo de obtenção, todas as
que são conseguidas por via dos métodos descritos no art 32º, nº 8 CRP
(analogicamente aplicável ao processo civil). É exemplo de prova ilícita por produção
por via de ilícito a que implica a quebra do sigilo profissional. Regra geral, as provas
ilícitas não são susceptíveis de valoração em tribunal, pelo que não poderão servir de
fundamento a qualquer decisão. Ainda assim, decorre do art 32º, nº 8 CPR que a prova
só será qualificada como nula quando a intromissão na vida privada, no domicílio, na
correspondência ou nas telecomunicações deva ser considerada abusiva.
Diferente são as provas proibidas. Ainda assim, a consequência dessa sua proibição é
idêntica ao que antes vimos – há uma proibição da sua valoração pelo tribunal.
Todas as pessoas têm, em matéria de prova, o dever de prestar a sua colaboração – art
417º CPC, dever de colaboração esse que é expressão do dever de colaboração com a

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

administração e com a justiça, sobre o qual rege o art 202º, nº 3 CRP. A violação deste
dever leva, desde logo, à aplicação de sanções (como a condenação em multa e o
recurso a meios coercitivos admissíveis). O direito à prova também cede perante
interesses superiores, razão pela qual é legítima a recusa de colaboração se a
obediência importar violação da integridade física ou moral das pessoas, se levar à
intromissão na vida privada, familiar, etc.

CONTRATOS PROBATÓRIOS
Os contratos probatórios são os negócios processuais através dos quais as partes
regulam os factos que carecem de prova ou a repartição do ónus da prova de
determinado facto. Podem também servir para estipular os meios de prova admissíveis
para a prova de um certo facto.
o Contratos sobre o objecto da prova – definem os factos sobre os quais deve
recair a produção de prova das partes. Regra geral, as partes indicam os factos
que admitem por acordo e aqueles que consideram controvertidos, sendo
apenas necessária prova destes últimos.
o Contratos sobre o ónus da prova – estão previstos no art 345º, nº 1 CC, servindo
essencialmente para inverter a repartição legal do ónus e atribuindo o risco da
falta ou insuficiência de prova à parte que não está legalmente onerada.
o Contratos sobre os meios de prova – através destes, as partes podem admitir
um meio de prova diferente dos que estão legalmente previstos para a prova
daquele facto ou excluir um meio de prova legalmente admissível para essa
prova (art 345º, nº 2 CC).
Para que seja possível celebrar um contrato probatório, é necessário que se verifiquem
certos requisitos. Alguns destes são comuns a todos os tipos de contrato, outros são
específicos de cada um.

CONTRATOS REQUISITOS GERAIS REQUISITOS ESPECIAIS


Não podem dispensar o documento
Sobre o objecto da prova escrito que seja legalmente exigido para
a prova do facto
Exige-se a circunstância de só
Sobre o ónus da prova poderem recair sobre situações Não pode agravar sensivelmente a
jurídicas disponíveis (art 345º, posição probatória das partes;
nº 1 e 2 CC)
Não pode agravar sensivelmente a
Sobre os meios de prova posição probatória das partes;

Não podem contrariar disposições


legais de ordem pública4
Os contratos probatórios, quando válidos, são vinculativos não apenas para as partes,
mas para o tribunal.

4
São de ordem pública todos os poderes probatórios do tribunal, a forma legal ad substantiam, a
inadmissibilidade de prova testemunhal em substituição de documento e ainda as inabilidades para depor
como testemunha. Também estão excluídos acordos pelos quais as partes definem o valor probatório.

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

OBJECTO DA PROVA
O objecto da prova é delimitado pelos factos alegados pelas partes, pois que estes são
invocados em cumprimento do ónus de alegação, com a expectativa de que se possa,
se necessário, cumprir o ónus da prova quanto a eles. A apreciação do pedido
formulado depende dos factos invocados na causa de pedir e dos respectivos factos
complementares (art 5º CPC). No seu conjunto, esses acabam por ser os factos
principais. Junto a esses estarão os factos instrumentais que já não condicionam a
apreciação (não só porque o tribunal pode usar outros factos probatórios, mas também
porque os factos principais podem ser provados directamente, sem a mediação de
factos instrumentais). Em conclusão, entende-se que o objecto da prova só pode ser
constituído pelos factos principais alegados pelas partes.
Nem todos os factos principais precisam de ser provados, pelo que nem todos eles
integram o objecto da prova (arts 410º e 596º CPC). Os factos que necessitam de prova
são, antes de mais, os factos controvertidos – aqueles que, tendo sido alegados por
uma das partes, foram impugnados pela outra. Assim sendo, pode concluir-se que o
objecto de prova se encontra na disponibilidade das partes, pois que a sua definição
depende da conduta que estes assumem em juízo (art 574º CPC). Também se excluem
do objecto da prova os factos que não sejam relevantes para a decisão, ainda que os
mesmos não sejam impugnados – art 574º CPC. Também não carecerão de prova os
factos que sejam abrangidos pela força de caso julgado, por se integrarem no âmbito
de uma decisão anterior vinculativa para as partes.
A modificação do pedido ou da causa de pedir implica uma modificação do objecto da
prova se, em função do novo objecto do processo, houver que provar factos novos ou
se tornar desnecessária a prova de certos factos.
Há também que atender às situações em que a prova é dispensada. Desde logo, os
factos que não estão submetidos ao ónus de alegação não necessitam de ser provados
pela parte (p.e. factos de conhecimento oficioso ou factos notórios). Mais, os factos que
as partes não têm o ónus de alegar não necessitam de ser provados (art 414º CPC).
não carecendo de prova, a falta de impugnação destes factos é irrelevante.
o Factos notórios – estes não estão submetidos ao ónus de alegação e de prova
(arts 412º e 5º CPC). São factos notórios os factos de conhecimento de uma
opinião pública medianamente informada no tempo e lugar da causa (p.e. factos
históricos ou naturais). Estes, ainda assim, aceitam prova em contrário;
o Factos funcionais – são os factos conhecidos pelo tribunal pelo exercício da
função jurisdicional. Estes diferem dos factos conhecimento privados do juiz.
o Factos oficiosos – são os factos que, apesar de não serem notórios nem de
conhecimento funcional, o tribunal pode conhecer, por força da lei,
independentemente da alegação das partes. Não tendo as partes o ónus de
alegação, também não podem estes ser onerados com o ónus da prova.

ÓNUS DA PROVA
O ónus da prova pode ser entendido em sentido objectivo e subjectivo:
o Ónus da prova objectivo – trata das consequências da não realização da prova,
ou seja, da falta de convicção do tribunal sobre a realidade de um facto. Perante

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

uma situação de dúvida insanável acerca da veracidade dos factos, devem


operar as regras de ónus da prova objectivo, pois que, mesmo nesses casos, o
tribunal não fica isento do dever de proferir uma decisão. Através destas regras,
é possível definir qual a decisão que o tribunal deve tomar, ainda que haja
dúvida sobre a realidade do facto (“perante a dúvida irredutível sobre a
realidade do facto que é pressuposto de aplicação de uma norma jurídica, o
tribunal decide como se estivesse provado o facto contrário”). Exige-se,
portanto, um exercício de ficção jurídica;
o Ónus da prova subjectivo – refere-se à determinação da parte onerada com a
prova do facto, ou seja, à repartição do ónus da prova pelas partes da acção.
Através das regras do ónus da prova subjectivo, define-se a actuação das partes
em juízo, pelo que estamos perante regras de conduta. Ao contrário do que
sucede com o ónus da prova objectivo (cuja aplicação se estende a processos
regidos pela disponibilidade das partes e pela inquisitoriedade judiciária), a
vertente subjectiva apenas tem aplicação nos processos submetidos, àquela
disponibilidade.
A repartição do ónus da prova condiciona a actividade probatória da parte – em
coadunação com o ónus de alegação, incumbe à parte o ónus da prova relativamente
aos factos cuja subsunção a uma norma jurídica lhe atribui um efeito favorável.
o Os factos constitutivos devem ser provados pela parte que, com fundamento
neles, alega uma situação jurídica – art 342º, nº 1 CC. A prova dos factos
impeditivos, modificativos ou extintivos incumbe à parte contra a qual é
invocada uma situação jurídica – nº 2. Assim sendo, não é a parte que nega os
factos invocados pela contraparte que está onerada com a prova de que esses
factos não são verdadeiros, mas a parte que os alega que tem o ónus de provar
que eles são verdadeiros.
o Os factos impeditivos, modificativos ou extintivos devem ser provados pela
parte que, com esse fundamento, nega a situação subjectiva afirmada pela
contraparte (art 342º, nº 2 CC). O ónus da prova recai sobre a parte que os alega
em seu benefício. A regra ignora, portanto, o facto de estes serem factos
negativos.
No entanto, os factos negativos podem ser de prova bastante difícil, pelo que há que
averiguar se é necessário constituir uma excepção à distribuição do ónus da prova
imposta pelo art 342º CC. Conclui-se que, na ausência de previsão legal, parece difícil
ir além de solicitar ao tribunal alguma razoabilidade na apreciação da prova do facto
negativo.
Quanto à apreciação negativa, a alegação dos factos constitutivos da situação negada
pelo autor compete à parte passiva, sendo o réu a parte onerada com a demonstração
dos factos constitutivos (art 343º, nº 1 CC), e cabendo ao autor a prova dos factos
impeditivos, extintivos ou modificativos. Nas ações de simples apreciação negativa,
quanto à repartição do ónus da prova, é a de distribuir a prova dos factos por ambas
as partes, consoante a sua relevância para a procedência ou improcedência da ação. Há
que lembrar que o réu deve utilizar a reconvenção para pedir, caso o deseje, a
apreciação positiva do direito negado pelo autor (art 266º, nº 2, al a) CPC).

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

Quanto aos critérios especiais estipulados para esta matéria, cabe desde logo referir
que, em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos de
direito. Assim sendo, o facto deve ser qualificado como constitutivo quando houver
dúvidas sobre se é de exigir a sua prova àquele que alega o correspondente direito ou,
antes, àquele contra o qual o direito é invocado.
No atinente aos prazos de caducidade, estipula o art 343º/2 CC que o prazo de
propositura da ação é considerado pela perspetiva do seu decurso, pelo que é
qualificado como facto extintivo.
INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA
Dá-se a inversão do ónus da prova sempre que não for sobre a parte normalmente
onerada com a prova do facto que recai o ónus de o demonstrar. O ónus da prova não
acompanha o ónus de alegação, pois que a prova não incumbe à parte favorecida com
a demonstração do facto e onerada com a sua alegação, mas à parte que pode beneficiar
do facto contrário.
A dificuldade de prova não fundamenta a inversão do ónus da prova, mas a lei procura
preveni-la de duas maneiras:
o Estabelecimento de presunções legais – benefício para a parte onerada com a
prova do facto presumido (350º/1 CC)
o Permissão do julgamento segundo a equidade em situações em que a prova
do facto é difícil ou impossível
O ónus da prova inverte-se quando haja dispensa ou liberação do ónus da prova – art
344º, nº 1 CC.

APRECIAÇÃO DA PROVA
Na avaliação da prova, feita por via dos meios de prova, é possível consagrar um
sistema de prova legal e um sistema de prova livre.
o Prova legal – o valor da prova realizada através de um dos meios de prova está
legalmente fixado. Assim sendo, o tribunal está vinculado a atribuir a essa
prova o respectivo valor, que pode ser positivo (a lei impõe que o tribunal
atribua à prova um certo valor) ou negativo (a lei proíbe que o tribunal atribua
valor à prova produzida). No âmbito do valor positivo, este pode ser tarifado ou
fixo, variando consoante a prova que se considera suficiente para provar a
primeira. Neste âmbito de prova de valor positivo, a prova pode ser:
• Prova legal bastante – a impugnação da prova é conseguida através da
contraprova, o que exige colocar-se em dúvida a veracidade do facto (art
346º CC)
• Prova legal plena – a impugnação da prova só pode ser obtida mediante
prova do contrário, isto é, através da demonstração da não veracidade
do facto (art 347º CC)
• Prova legal pleníssima – não exige contraprova, nem prova do contrário.
É o caso das presunções inilidíveis (art 350º, nº 2 in fine CC). Ainda assim,
note-se, a contraparte pode impugnar, qualquer que seja o tipo de

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

presunção, a prova do facto probatório. Fazendo-o, ainda que a


presunção seja inilidível, consegue impugnar a sua base.
o Prova livre – aqui, o valor a conceder à prova realizada não está legalmente
fixado, pelo que depende da convicção que o julgador formar com base na
mesma (art 607º CPC). Nestes casos, a prova é avaliada por via do princípio da
livre apreciação. Esta possibilidade de livre apreciação está excluída nas
situações em que a lei exija qualquer formalidade especial (por exemplo, a
prova livre não é admissível na prova de transmissão de um imóvel, pois que esta
exige escritura pública ou documento particular autenticado). A apreciação da
prova livre é feita com base nas regras da experiência5 e, por vezes, do senso
comum. Toda a prova que resulta da liberdade de apreciação do tribunal vale
como prova bastante, pelo que cederá perante contraprova (art 346º CC).

VALORAÇÃO DA PROVA
PROVA DOCUMENTAL
Representa a apresentação de um objecto elaborado pelo homem com o fim de
reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto – art 362º CC.
o Escritos – aqueles que corporizam, em escrita normal ou cifrada, uma declaração
de ciência ou de vontade.
• Autênticos (art 363º, nº 2 CC) – em termos de força probatória formal6,
estes assumem forma de prova plena, uma vez que se presume que o
documento provém da autoridade a quem é atribuído (art 370º CC). A
presunção em causa assume prova do contrário, de acordo com o nº2.
Já quanto à força probatória material7 dos documentos autênticos, é
também de prova plena, pois que estes só cedem perante a prova do
contrário através da demonstração da falsidade do documento (arts
371º e 372º, nº 2 CC). Note-se que a força plena apenas abrange os factos
atestados pela entidade documentadora, pelo que não se estende à
veracidade dos mesmos (se o notário atesta que o vendedor recebeu o
preço da coisa, o valor de prova plena apenas abrange o facto de o
vendedor ter emitido essa declaração e de o notário a ter atestado – não
abrange o facto de o vendedor ter efectivamente recebido o preço).
Assim sendo, podemos deparar-nos com situações de falsidade material
(situações em que a entidade refere como praticado um acto que não o
foi) ou com situações de falsidade ideológica (situações em que a
entidade atesta um facto que não se verificou perante ela).
• Particulares (art 363º, nº 3 CC) – têm um valor probatório diferente
consoante sejam autenticados ou não autenticados

5
Diferente de preconceitos ou pré-juízos
6
Respeita à genuinidade dos documentos autênticos
7
Respeita antes ao valor probatório dos factos exarados ou atestados pela entidade documentadora

19
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

▪ Documentos autenticados – têm a força probatória de


documentos autênticos, pelo que fazem prova plena quanto aos
factos praticados ou atestados (arts 377º e 371 CC)
▪ Documentos não autenticados – têm força probatória formal
quando a letra e assinatura forem reconhecidas pela parte
contra a qual o documento é apresentado. Se tal se verificar,
assumem força probatória material plena quanto às declarações
atribuídas ao seu autor, que só pode ser impugnada pela prova da
falsidade do documento (art 376º, nº 11, in fine CC). Já quanto
aos documentos particulares não assinados, estes são
livremente apreciados pelo tribunal.
Se a lei exige, como forma ad substantiam, documento autêntico, autenticado ou
particular, só estes podem ser usados como meio de prova – art 364º, nº 1 CC. No
entanto, se a forma for ad probationem, esse documento já pode ser substituído, nos
termos do nº 2.

PROVA POR CONFISSÃO


A prova por confissão consiste no reconhecimento pela parte da veracidade de um
facto desfavorável (e favorável à parte contrária) – art 352º CC. A confissão só é eficaz
se for feita por pessoa com capacidade e poder para dispor do direito a que o facto
confessado se refere, como nos diz o nº 1 do art 353º CC.
A confissão pode ser judicial ou extrajudicial (art 355º, nº 1):
o Confissão judicial – aquela que é feita em juízo, seja espontânea ou provocada
o Confissão extrajudicial – aquela que é feita fora do processo.
No que toca ao seu conteúdo, a confissão pode ser simples, qualificada ou complexa:
o Confissão simples – o facto é reconhecido sem qualquer reserva ou condição,
bem como sem a invocação de qualquer facto susceptível de afectar o seu efeito;
o Confissão qualificada – aquela em que o facto é reconhecido com outra
qualificação ou eficácia jurídica;
o Confissão complexa – aquela em que tanto se verifica o reconhecimento do
facto como é alegado um outro facto que destrói o efeito da confissão
A confissão é irretratável e indivisível. Assim sendo, a mesma não pode, depois de
feita, ser retirada e, para além disso, não pode ser aceite apenas parcialmente (art 360º
CC). O valor da confissão, por sua vez, é diferente consoante a confissão seja judicial
ou extrajudicial: a confissão judicial escrita tem o valor de prova plena (art 359º, nº 1
CC); a confissão judicial não escrita tem o valor de prova livre (art 358º, nº 4 CC), a
confissão extrajudicial tem um valor dependente do meio pelo qual é comunicada (se
exarada em documento autêntico ou particular considera-se provada nos termos
aplicáveis a esses documentos, se não escrita tem o valor de prova livre, se provada por
testemunhas também).

PROVA PERICIAL
Consiste na percepção e apreciação de factos através do parecer de uma pessoa
especialmente qualificada num certo domínio técnico ou científico, que é o perito (art

20
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

368º CC). A prova pericial pode ser requerida pelas partes ou ordenada oficiosamente,
tendo uma força probatória livremente apreciada pelo tribunal (art 391º CC).
PROVA TESTEMUNHAL
Consiste no depoimento de uma pessoa que emite uma declaração de ciência relativa
a um ou a vários factos. Esta é admissível em todos os casos em que não seja directa
ou indirectamente afastada (art 392º CC). A prova testemunhal é livremente apreciada
pelo tribunal, nos tem
PROVA POR APRESENTAÇÃO DA COISA
Consiste na exibição de uma coisa móvel ou imóvel. A sua valoração, se não houver
regra especial, assume a força de prova livre (art 607º CPC).
VALOR EXTRAPROCESSUAL DA PROVA
A prova realizada num processo pode ser utilizada num outro processo pendente entre
as mesmas partes (art 421º CPC). Desse valor extraprocessual exclui-se a prova
documental, dada a facilidade com que a mesma é produzida no processo, e a prova
por inspecção judicial. Já a prova por confissão só pode valer num outro processo como
confissão extrajudicial, nos termos do art 358º CC.
O valor extraprocessual da prova só é admitido quando estão preenchidas certas
condições: desde logo, quando o próprio processo em que as provas se produziram
não exclua a possibilidade do seu aproveitamento para outros (razão pela qual as
provas realizadas no seio de procedimentos cautelares nunca podem ser utilizadas
noutros processos). Mais que isso, pode exigir-se que as garantias das partes, no
processo em que ela foi realizada, não sejam inferiores as do processo em que a prova
se pretende fazer valer – art 421º CC. Finalmente, o valor extraprocessual da prova
requer que o processo em que foi realizada não tenha sido anulado na parte referente
à prova.

FALTA DE PROVA
Se o processo se rege pela disponibilidade das partes, o ónus da prova objectivo
coincide com o ónus da prova subjectivo – a dúvida sobre a realidade de um facto é
resolvida contra a parte a quem o facto aproveita (art 346º CC e art 414º CPC). Assim
sendo, havendo falta ou insuficiência de prova, o tribunal ficciona a prova do facto
contrário e decide com base nesse facto.
A ordem da apreciação pelo tribunal da prova depende do tipo de acção instaurada
pelo autor. Se estamos perante uma acção de apreciação positiva, de condenação ou
constitutiva, então incumbe-lhe a prova do facto constitutivo da situação jurídica
alegada e apenas perante esta prova se devolve à parte passiva a prova do facto
impeditivo, modificativo ou extintivo. Assim sendo, a posição probatória do réu
depende da prova produzida pelo autor – se o autor não prova o facto constitutivo, a
acção é julgada improcedente, mesmo que o réu não prove qualquer facto impeditivo,
modificativo ou extintivo. No entanto, se o autor faz prova do facto constitutivo, o réu
pode: (i) impugnar, por contraprova (art 346º CC) ou por prova do contrário (art 347º

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

CC); (ii) provar, em correspondência com o respectivo ónus de alegação, um facto


impeditivo, modificativo ou extintivo da situação jurídica invocada (art 342º, nº 2 CC).
Ao autor de uma ação de apreciação negativa cabe a prova da inexistência da situação
jurídica ou do facto impeditivo, extintivo ou modificativo desta situação e somente
perante esta se devolve à contraparte a prova do facto constitutivo dessa situação (arts
342º e 343º CC). Ao réu cabe o ónus da prova dos factos constitutivos da situação
jurídica negada pelo autor se pretender que, sendo a ação julgada improcedente, se
reconheça a existência da situação jurídica (e não só a falta de prova da inexistência
dessa situação) devendo, para tal, formular o pedido reconvencional.
Se o autor da ação de apreciação negativa não prova o facto impeditivo, extintivo ou
modificativo, a ação é julgada improcedente, mas só fica decidida a falta de prova da
inexistência da situação jurídica (e não a prova da existência dessa situação jurídica),
pelo que o autor pode propor uma outra ação com fundamento num outro facto
impeditivo, modificativo ou extintivo da situação negada. Já se o autor da ação de
apreciação negativa não prova o facto impeditivo, extintivo ou modificativo, mas o réu
prova o facto constitutivo da situação jurídica alegada na reconvenção, a ação é
julgada improcedente e, além disso, fica estabelecida a existência da situação negada
pelo autor.

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

III – TRAMITAÇÃO DO PROCESSO – ACÇÃO DECLARATIVA COMUM

Articulados • Art 147º, nº 1: os articulados são as peças em que as partes


expõem os fundamentos da acção e da defesa e formulam os
fase inicial pedidos correspondentes
(arts 552º e ss) • Petição inicial; Citação do réu; Contestação; Réplica

• Pretende-se verificar e garantir a regularidade do


Gestão processo. rocede-se à identificação do objecto do
processual litígio, à decisão daquilo que pode já ser decidido e à
enumeração dos temas que requerem prova
fase intermédia subsequente
(arts 590º e ss) • Despaço pré-saneador; Audiência Prévia; Despacho
saneador
Instrução, • As partes alegam a matéria de facto e de direito
discussão e relevante para a decisão final. Tomam-se as
julgamento diligências necessárias à prova dos factos alegados
pelas partes (instrução)Audiência final (discussão);
fase final Sentença (julgamento)
(arts 599º e ss)
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

FASE DOS ARTICULADOS – fase inicial


Diz-nos o art 147º CPC que os articulados são peças em que as partes expõem os
fundamentos da acção e da defesa e formulam os pedidos correspondentes.
Existem diversos tipos de articulados, variando estes em função das condições da sua
apresentação, do seu possível conteúdo e da função que desempenham. Temos, então:
• Articulados normais – correspondem às duas primeiras peças escritas que
podem surgir em todas as acções: a petição inicial (arts 552º e ss CPC) e a
contestação (arts 569º e ss CPC).
• Articulado eventual – corresponde à réplica (art 584º CPC). Este não depende
da vontade do autor, apenas podendo surgir se, na contestação, o réu tiver
formulado um pedido reconvencional ou, antes, se estivermos perante uma
acção de simples apreciação negativa.
• Articulados supervenientes – são os que permitem trazer ao processo factos
que tenham ocorrido depois da apresentação dos articulados (arts 588º e 589º
CPC). A sentença deverá tomar estes factos em consideração, por deverem ser
tomados em consideração os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do
direito que se produzam posteriormente à proposição da acção (art 611º CPC).
• Articulados de aperfeiçoamento – a sua origem prende-se com um convite feito
pelo juiz, quando este entende que há insuficiência ou imprecisão na exposição
ou concretização da matéria alegada. Este articulado serve, portanto, para
completar ou corrigir o que já foi apresentado (art 590º, nº 2, b))
Estas peças escritas designam-se por articulados por terem de ser apresentados por via
de proposições numeradas – art 147º, nº 2 CPC. Com o Código de 2013, uma das
inovações que se fizeram sentir foi a obrigatoriedade de as partes indicarem os
respectivos meios de prova logo na petição inicial (art 552º, nº 2 CPC) e na contestação8
(art 572º, al d)).
Também o modo de apresentação das peças escritas em juízo é diferente, pois que hoje
funciona como regra aquilo que antes era apenas uma faculdade – estando as partes
patrocinadas por mandatário, a apresentação de peças escritas nos autos é
obrigatoriamente feita por transmissão electrónica de dados (art 144º, nº 1 CPC).

PETIÇÃO INICIAL
A petição inicial é o articulado utilizado pelo autor para formular a sua pretensão de
tutela jurisdicional, sendo aqui que este alega os respectivos fundamentos de facto e
de direito. É a petição inicial que dá início ao processo, pelo que nenhum processo
começa sem a sua apresentação – a entrada da petição inicial determina o momento
de início da instância (art 259º, nº 1 CPC).
Quanto ao conteúdo e à estrutura da petição inicial, rege o art 552º CPC. O mesmo
estabelece os requisitos a respeitar na feitura deste articulado, podendo daí extrair-se
que a petição inicial se estrutura em quatro partes fundamentais:

8
Anteriormente, esta parte do processo era feita em momento posterior, pois que havia um momento
processual tido como adequado para a indicação dos meios de prova.

1
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

o Endereço – contém a designação do Tribunal e do juízo onde a acção é proposta.


Assim, entende-se que a apresentação da petição inicial implica uma
determinação anterior do foro competente.
o Intróito – o autor identifica as partes (nomes, domicílios ou sedes, números de
identificação civil e fiscal, profissões, locais de trabalho, estado civil9…). Também
deve ser identificada a forma do processo (comum/especial).
o Narração – é a parte nuclear da petição inicial. Aqui, o autor deve expor os factos
essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de
fundamento à acção. Aqui, releva também o disposto no art 5º CPC, do qual
resulta que às partes cabe alegar os factos essenciais (factos de cuja verificação
depende a procedência da pretensão deduzida) que constituem a causa de pedir.
Não há qualquer ónus de alegação dos factos instrumentais (factos que apenas
permitem a prova indiciária dos factos essenciais), pelo que não é esperado que
o autor os alegue neste momento do processo10. Se a narração fáctica não
cumprir cabalmente o ónus que impede sobre o autor, verifica-se uma de duas
possibilidades:
• A alegação é de tal forma deficiente que não permite identificar o tipo
legal, caso em que há absolvição do réu da instância por ineptidão da
petição inicial (excepção dilatória);
• A alegação, embora deficiente, permite essa identificação, caso em que
o autor será convidado a aperfeiçoar o articulado, nos termos do art
590º, nº 4 CPC.
o Conclusão – parte da petição destinada à formulação do pedido, o qual expressa
a concreta tutela jurisdicional pretendida pelo autor.

VER – PEDIDO E CAUSA DE PEDIR; FORMAS DO PEDIDO; RELAÇÕES ENTRE OBJECTO;


VÍCIOS DO OBJECTO & MODIFICAÇÃO DO OBJECTO
Página 2 e seguintes – “O objecto do processo”

A petição inicial deve ser apresentada em juízo para que se dê início à acção. O
momento relevante para esse efeito é, então, o momento de recepção da petição pela
secretaria (art 259º, nº 1 CPC). Tendo a petição inicial de obedecer a certos requisitos,
há que determinar qual deve ser a actuação da secretaria caso parte desses não se
verifiquem. Assim, pode a secretaria recusar a recepção da petição inicial, se se
verificar qualquer dos casos previstos no art 558º CPC. Este é, note-se, um controlo
meramente formal da petição – à secretaria não cabe recusar a pretensão a pretexto
de incompetência do tribunal (kompetenz-kompetenz), por erro na forma de processo
escolhida ou por erro no valor atribuído à acção.
Se o autor entender que a recusa por parte da secretaria é injustificada, pode reclamar
para o juiz, nos termos do art 559º CPC. Atendendo o juiz à reclamação, a petição

9
Este ponto tem relevância, desde logo, para efeitos do art 34º CPC
10
A menos que só através de factos instrumentais seja possível conhecer um facto essencial

2
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

considera-se recebida; não o fazendo, o autor poderá recorrer para a Relação, ainda
que o valor da causa não ultrapasse a alçada da instância (art 559º, nº 2 CPC).
Recebida a petição inicial, a mesma é apresentada à distribuição, com o objecivo de
repartir de forma igualitária o serviço judicial (art 203º CPC). Realizada esta, procede-
se à autuação do processo, integrando-se nesse a petição inicial e os documentos que a
acompanham.
O juiz pode determinar que a petição inicial lhe seja presente para despacho logo que
recebida em juízo – art 590º, nº 1 CPC. Nesse caso, estaremos perante uma
manifestação do exercício das competências de gestão processual que a lei confere ao
juiz (art 6º CPC). Consequentemente, haverá lugar ao proferir de despacho de
indeferimento liminar, no âmbito do qual o juiz pode já indeferir a petição. O
indeferimento liminar pode acontecer por uma de duas razões:
o O pedido é manifestamente improcedente, sendo possível ao juiz constatar, por
simples leitura da petição, que a pretensão do autor está condenada à
improcedência – dá-se um julgamento antecipado do mérito da causa
o Foram violados pressupostos processuais geradores de excepções dilatórias
insusceptíveis de sanções e que o juiz pode conhecer oficiosamente (por
exemplo, há ilegitimidade singular, incompetência absoluta ou ineptidão da
petição inicial).
O despacho de indeferimento liminar admite sempre recurso para o Tribunal da
Relação, independentemente do valor da causa – art 629º, nº 3, al c) CPC. Aceite o
recurso, deve o despacho ordenar a citação do réu – art 641º, nº 7 CPC. Mais, havendo
indeferimento liminar, o autor goza da possibilidade de apresentar nova petição,
dispondo de 10 dias a contar da notificação do despacho de indeferimento liminar para
tal – art 590º, nº 1 e art 560º CPC.
Para além de poder deferir ou indeferir a petição, o juiz pode convidar o autor ao
aperfeiçoamento da mesma, quando as irregularidades sejam supríveis.

CITAÇÃO DO RÉU
Recebida a petição inicial e cumpridas as formalidades introdutórias, o processo deverá
seguir o seu curso. Assim sendo, há que proceder à citação do réu, de modo a que seja
dado a conhecer ao réu a acção instaurada pelo autor e que este tenha possibilidade
de se defender (art 219º, nº 1 CPC). Com a citação, assegura-se o princípio do
contraditório e o inerente exercício do direito de defesa (art 3º).
A secretaria promoverá oficiosamente as diligências necessárias à citação – arts 562º e
226º, nº 1 CPC. O art 561º CPC prevê a figura da citação urgente, que se verifica quando
a mesma tem prioridade sobre as restantes. O pedido de citação urgente deverá ser
formulado pelo autor na petição inicial, cabendo ao juiz determinar a urgência da
citação quando considere justificado o requerimento.
No acto de citação devem ser disponibilizados ao réu o duplicado da petição inicial e
as cópias dos documentos que a acompanhem. Mais, deve o réu ser informado sobre
as consequências da falta de contestação – arts 219º, nº 3 e 227º CPC.
A citação do réu pode assumir diferentes modalidades:

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

o Citação pessoal – é feita na própria pessoa do citando, por um dos modos


presentes no art 225º, nº 2 e 3 CPC
o Citação edital – tem lugar não só quando o citando se encontre em parte incerta,
mas também quando sejam incertas as pessoas a citar (art 225º, nº 6 CPC). Este
tipo de citação obedece às formalidades exigidas pelos arts 240º a 244º CPC.
Parte dos efeitos da citação são os referidos no art 564º CPC. Estes podem ser divididos
entre efeitos substantivos e efeitos adjectivos ou processuais:
o Efeitos substantivos – a citação faz cessar a boa fé do possuidor contra quem
tenha sido proposta a acção (art 564º, al a) CPC e art 1260º, n 1 CC); interrompe
a prescrição, nos termos do art 323º, nº 1 CC; nas obrigações puras, vale como
interpelação, gerando o vencimento da obrigação e constituindo o devedor em
mora (art 805º, nº 1 CC)
o Efeitos adjectivos – a citação torna estáveis os elementos essenciais da causa
(art 564º, al b) e art 260º CPC). Estes elementos correspondem aos sujeitos
(autor e réu), à causa de pedir (facto jurídico concreto que fundamenta a
pretensão) e o pedido (pretensão formulada em juízo pelo autor). Note-se,
contudo, que essa estabilidade não representa imutabilidade. Outro efeito
adjectivo é a inibição que resulta para o réu de propor contra o autor acção
destinada a apreciar a mesma questão jurídica, sob pena de litispendência (art
564º, al c) CPC)
Note-se que, ainda que a citação venha a ser anulada, os efeitos por ela produzidos
mantêm-se desde que o réu venha a ser nova e regularmente citado nos 30 dias
seguintes ao trânsito em julgado do despacho de anulação – art 565º CPC.
Ainda que a regra seja a oficiosidade da citação, a verdade é que há casos (excepcionais)
em que a citação não pode ser realizada pela secretaria sem que haja despacho prévio,
sendo esses os casos do art 226º, nº 4 CPC. Nestes casos, uma interferência liminar do
juiz só se pode verificar se a citação pessoal do réu se frustrar e haja necessidade de
decretar a via edital ou quando tenha sido pedida a citação urgente do réu. Nos
restantes casos, em sede de acção declarativa comum, essa intervenção do juiz só pode
ocorrer mais tarde.
Há que fazer uma referência final às espécies de notificações:
o Notificações dependentes – destinam-se às próprias partes, para lhes dar
conhecimento de certo facto ou para as chamar a juízo com o intuito de estas
praticarem um facto concreto;
o Notificações avulsas – aquelas que são levadas a cabo independentemente de
qualquer acção, sendo sempre precedidas de despacho que as ordene (art 256º,
nº 1 CPC)

CONTESTAÇÃO
Na contestação o réu opõe-se ao pedido formulado pelo autor. Essa oposição pode ser
frontal (ou directa), se contradisser os factos apresentados na petição inicial ou afirmar
que esses factos não levam, nem podem levar, ao efeito jurídico pretendido pelo autor
(art 571º, nº 2 primeira parte); ou pode ser lateral (ou indirecta), se alegar factos que
inibem o tribunal de conhecer do mérito da causa (arts 571º, nº 2 e 576º, nº 1 e 2 CPC)

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

ou se alegar factos que impeçam, modifiquem ou extingam o direito invocado pelo autor
(arts 571º, nº 2 in fine e 576º, nº 1 e 3 CPC).
A defesa do réu pode, desde logo, ser feita por excepção ou por impugnação.

DEFESA POR IMPUGNAÇÃO


Impugnar significa contrariar. Na defesa por impugnação, portanto, o réu contradiz os
factos alegados pelo autor ou afirma que tais factos têm um significado jurídico
distinto daquele que o autor lhes quer atribuir.
A oposição que caracteriza este meio de defesa pode ser de facto ou de direito:
o Impugnação de facto – o réu não aceita os factos articulados pelo autor. Pode
fazer-se por uma de três vias:
Em todos estes casos,
• Negando genericamente os factos visados, apelidando-os de puramente
o réu não aceita falsos – inexatidão absoluta ou negação directa;
como verdadeiros os • Negando-os indirectamente, integrando-os num contexto diferente do
factos invocados: ou apresentado pelo autor – inexatidão relativa ou negação indirecta;
por serem falsos, ou
por não serem • Invocando a figura do simples desconhecimento (art 574º, nº 3 CPC). Por
exactamente como via desta, o réu afirma que não sabe se determinado facto é real: não o
descritos, ou ainda nega perentoriamente, mas também não o aceita. Esta forma de
porque os impugnação só é admissível quanto a factos que não sejam pessoairou
desconhece
de que o réu não deva ter conhecimento.
o Impugnação de direito – o que está em causa é a qualificação jurídica que o
autor atribui aos factos narrados. Aqui, aceitando os factos como verdadeiros,
o réu alega que deles não resulta o efeito jurídico pretendido pelo autor (alega-
se inconcludência da pretensão).
Em todos os casos descritos, o réu tem como objectivo a absolvição total ou parcial do
pedido, por força da improcedência, total ou parcial, da acção.

DEFESA POR EXCEPÇÃO


Aqui, o réu aceita os factos como verdadeiros. Ainda assim, faz chegar ao processo
novos factos, susceptíveis de poder absolvê-lo da instância ou de impedir, modificar
ou extinguir o direito pretendido pelo autor.
As excepções podem ser dilatórias ou peremptórias:
o Excepções dilatórias (defesa processual, art 576º, nº 2 CPC) – obstam a que o
tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição do réu da
instância ou à remessa dos autos para o tribunal (art 576º, nº 2). Estas excepções
são enunciadas no art 577º CPC, tendo a lista que aí se estende carácter
meramente exemplificativo.
• Incompetência absoluta ou relativa do tribunal – a primeira gera
absolvição do réu da instância (art 99º, nº 1 CPC) e a segunda leva ao
reencaminhamento do processo para o tribunal competente (art 105º,
nº 3 CPC);
• Nulidade de todo o processo – surge quando há ineptidão da petição
inicial (art 186º CPC) pois que, sendo essa a base de qualquer processo,
a sua irreversível insuficiência inquinará todo o processo;
• Falta de personalidade ou capacidade judiciária de alguma das partes

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

• Falta de autorização ou deliberação que o autor devesse obter – se


estamos perante situações nas quais o representante da parte necessita
de autorização ou deliberação prévia para poder praticar certos actos e
essa não existe. Esta é passível de sanação (art 29º CPC).
• Ilegitimidade das partes – exige-se que estejam em juízo os verdadeiros
titulares da relação material litigiosa. Pode ser sanada, situação na qual
deixa de consubstanciar uma excepção;
• Coligação ilegal de autores ou de réus – ocorre quando entre os pedidos
não se verifique a conexão exigida pelo art 36º CPC. É sanável (art 38º);
• Pluralidade subjectiva subsidiária, fora dos casos do art 39º
• Falta de constituição de advogado por parte do autor e de falta,
insuficiência ou irregularidade do mandato – também sanável (arts 41º
e 48º CPC);
• Litispendência e caso julgado (arts 58º a 582º CPC)
O tribunal deve conhecer oficiosamente de todas as excepções dilatórias, como
disposto no art 578º CPC, excepto a da incompetência absoluta decorrente da
violação de pacto privativo de jurisdição de tribunal arbitral voluntário e a
incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo art 104º CPC (aí, a
excepção deverá ser invocada pelo réu para que o tribunal a possa apreciar).
o Excepções peremptórias (defesa material, art 576º, nº 3 CPC) – são alegados
factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico visado pelo
autor, tendo como consequência a absolvição, total ou parcial, do pedido (art
571º, nº 2 in fine e art 573º CPC). Aqui, o réu traz ao processo factos novos que
impedem que o direito invocado pelo autor seja válido e eficaz. Estão
subordinadas ao princípio da disponibilidade das partes, pois que mesmo que
os factos susceptíveis d constituir uma excepção peremptória constem do
articulado apresentado pelo autor, o tribunal não pode extrair deles qualquer
consequência que não seja invocada pelo réu (art 5º CPC).
• Excepções peremptórias impeditivas – alegam-se factos que obstam ao
preenchimento de uma previsão legal e, assim, impede-se que se
verifique uma certa consequência jurídica. É o caso da invocação da
invalidade do negócio, de erro na declaração, de erro sobre a pessoa ou
objecto, o dolo ou, ainda, a coacção moral e a incapacidade acidental;
• Excepções peremptórias extintivas – são aquelas que destroem as
consequências jurídicas decorrentes do preenchimento de determinada
previsão legal. É o caso de uma condição resolutiva, da prescrição (não
extingue o direito do autor, mas antes a possibilidade de exigir a
prestação), da caducidade e ainda de todas as causas de extinção das
obrigações (extinguem o direito do autor);
• Excepções peremptórias modificativas – são aquelas que determinam
uma modificação do objecto invocado pelo autor: o objecto invocado
pelo autor modificou-se. É o caso da condição suspensiva, da aceitação
da modificação do contrato oposta ao pedido de resolução e do direito
de retenção.

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES DA DEFESA


→ Concentração da defesa na contestação:
O art 573º determina que toda a defesa deve ser deduzida na contestação. Daqui
resulta que o réu deve incluir na sua peça processual todos os meios de defesa de que
disponha, seja a defesa direta, seja a defesa indireta, em vez de reservar algum deles
para momento ulterior do processo, que utilizaria apenas no caso de improcedência dos
primeiramente invocados.
Associados ao princípio da concentração da defesa na contestação, e como sua
consequência, encontramos os princípios da preclusão e da eventualidade. Do
princípio da preclusão resulta que todos os meios de defesa não invocados pelo réu na
contestação ficam prejudicados, não podendo ser alegados mais tarde. O princípio da
eventualidade determina que, dado o risco da preclusão, o réu irá dispor todos os seus
argumentos defensionais de maneira a que cada um deles seja atendido no caso (ou
na eventualidade) de qualquer dos anteriores improceder.
A regra da concentração da defesa na contestação conhece algumas limitações, que o
próprio art 573º refere. Tais limitações reconduzem-se a duas espécies:
o Defesa separada, prevista no art 573º, nº 1 – aquele que, por imposição legal,
deve ser deduzida no prazo da contestação, mas fora desta;
o Defesa posterior, prevista no art 573º, nº 2 – aquela que pode ser deduzida após
a apresentação da contestação e que configura três modalidades:
• Defesa superveniente – defesa fundada em factos objetiva ou
subjetivamente supervenientes (arts 588º e 589º CPC);
• Defesa autorizada por lei;
• Defesa oficiosa – defesa na qual se integram todos aqueles meios
defensionais de que o tribunal pode conhecer oficiosamente.

→ Ónus de impugnação:
O outro princípio a ter em atenção na defesa do réu é o ónus de impugnação. Nos
termos do art 574º, nº 1 CPC, na contestação, o réu irá tomar posição definida perante
os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor.
O réu tem de impugnar os factos que não reconheça ou não aceite. Tal impugnação
não carece, porém, de ser motivada, através de uma contraversão dos factos articulados
pelo autor. Basta a mera negação expressa do(s) facto(s) alegado(s). Se o réu não tomar
posição sobre aqueles factos, entende-se que os admite como exatos, nos termos do
artigo 574º, nº 2.
O ónus da impugnação está sujeito a algumas exceções. Desta forma, apesar de não
impugnados, não se têm como admitidos por acordo os factos que se encontrem em
manifesta oposição com a defesa considerada no seu conjunto, os factos sobre os quais
não seja admissível confissão (art 354º CC) e, ainda, os factos que só possam ser
provados por documento escrito (art 574º, nº 2, 2ª parte).
A parte final do artigo 574º, nº 2 CPC determina ainda que a admissão de factos
instrumentais pode ser afastada por prova posterior.

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

CONTESTAÇÃO RECONVENÇÃO
Nos termos do art 266º, nº 1, o réu pode aproveitar a contestação para formular
pedidos contra o autor. Estaremos, nesse caso, perante a figura da reconvenção, na
qual o réu (reconvinte), sendo titular de uma pretensão autónoma contra o autor
(reconvindo), a faz valer nesse processo. Há, portanto, uma inversão de posições das
partes ou, nas palavras de José Alberto dos Reis, um “cruzamento de ações”.
A reconvenção tem um carácter facultativo. Com efeito, porque o pedido corresponde
a uma ação própria, o réu pode optar entre fazê-lo valer em reconvenção e deduzi-lo
em separado. No entanto, esta faculdade concedida ao réu está sujeita a certos limites
e à observância de determinados requisitos.

a) Requisitos objetivos da reconvenção:


Os requisitos objetos de admissibilidade da reconvenção respeitam à natureza desta,
exigindo a lei que entre o pedido original e o pedido reconvencional se verifique uma
determinada conexão, uma certa afinidade, pois “seria inadmissível que ao réu fosse
lícito enxertar numa ação pendente uma outra que com ela não tivesse conexão
alguma”. Esta matéria é regulada pelo art 266º, nº 2 CPC:
o Quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à
ação ou à defesa – o pedido reconvencional encontra a sua base de sustentação
num facto jurídico que faz já parte do processo, pois foi para aí levado pelas
alegações do autor, na petição, ou do próprio réu, na defesa. O réu na
contestação pode formular diversos tipos de pedidos, desde o pedido de
absolvição ao pedido reconvencional, passando pelo pedido de procedência das
exceções alegadas. Porém, quando, a propósito desta matéria, se fala em
pedido, pretende-se apenas referir aquele que corresponde a uma pretensão
autónoma. Por isso, mediante cada um desses pedidos, e a fim de determinar a
sua natureza reconvencional ou não, recorre-se ao seguinte critério: se tal
pedido é um efeito necessário da alegação defensional, equivalendo apenas a
tirar proveito completo dessa, diz-se que esse pedido não é uma reconvenção;
se, ao invés, o pedido formulado pelo réu consiste numa verdadeira pretensão
autónoma formulada contra o autor, aí teremos um pedido reconvencional.
o Quando o réu se propõe a tornar efetivo o direito a benfeitorias ou despesas
relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida – pode surgir, por exemplo, numa
ação de reivindicação de um prédio, se o réu, que nele fez obras de conservação,
pretender o respetivo reembolso, ou se for pedida a restituição de uma coisa
depositada e o réu depositário pretender que o depositante (autor) lhe pague as
despesas de conservação da coisa.
o Quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a
compensação, seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado
excede o do autor – regula as condições em que o réu, demandado para o
pagamento de certa quantia em dinheiro, se afirma simultaneamente credor do
autor e pretende ver reconhecido o seu próprio crédito na mesma ação. Em

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

função do montante do contra crédito por si invocado, no confronto com o


crédito do autor, pode o réu obter dois tipos de efeitos: pode obter a
compensação, quando o seu contra crédito seja igual ou inferior ao crédito do
autor e, assim, a sua absolvição total ou parcial do pedido; ou pode o réu obter,
além da sua absolvição total do pedido (pela compensação integral dos
créditos), a condenação do autor no pagamento do valor correspondente ao
excesso.
o Quando o pedido do réu tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito
jurídico que o autor se propõe obter – aqui, instaurada a ação pelo autor com
determinado objetivo, o réu não só se defende do pedido, impugnando ou
excecionando, como, em manifesta atitude de contra-ataque, formula uma
pretensão autónoma cujo conteúdo corresponde precisamente ao pedido do
autor, se bem que em sentido inverso. Teremos um pedido reconvencional
desta natureza quando, numa ação em que o autor pede que o tribunal declare
o seu direito de propriedade sobre um imóvel, o réu, além de impugnar tal
direito, pretende que se declare pertencer-lhe a mesma propriedade.

b) Requisitos processuais da reconvenção:


O primeiro requisito respeita à competência do tribunal, o que se justifica pela
circunstância de todos os tribunais terem definidos por lei os respetivos âmbitos de
competência. Por isso, para que ao réu seja possível deduzir reconvenção é necessário
que o tribunal onde o processo está pendente se revele competente para conhecer
também da questão reconvencional. É este o sentido do art 93º, nº 1, ao fazer
depender a reconvenção da competência do tribunal em razão da nacionalidade, da
matéria e da hierarquia, sem o que o autor reconvindo será absolvido da instância
reconvencional. A lei dispensa, no entanto, por razões óbvias, a competência em razão
do território.
O segundo requisito de ordem processual diz respeito à forma do processo, como se vê
pelo art 266º, nº 3, que exige que ao pedido original e ao pedido reconvencional
corresponda a mesma forma processual.

REVELIA DO RÉU
Depois de citado, o réu pode ou não contestar, embora tal decisão não seja de menor
importância. Quando não contesta a ação, o réu entra em revelia, correspondendo a
revelia ao estado em que se encontra o réu não contestante. A este propósito,
podemos falar em revelia absoluta e revelia relativa. Além disso, podemos falar em
revelia operante e revelia inoperante. A natureza absoluta ou relativa não determina
o regime da operância ou inoperância, isto é, dos efeitos da revelia. Por outras palavras,
podemos ter uma revelia absoluta e o seu efeito ser operante, bem como podemos ter
uma revelia relativa e o seu efeito ser inoperante.
A revelia diz-se absoluta quando, além de não deduzir oposição, o réu não constitui
mandatário nem intervém de qualquer forma no processo (artigo 566.º). A revelia é

9
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

relativa quando o réu, embora não deduzindo contestação, constitui mandatário no


processo ou intervém, de algum modo, na ação.
Este estado de revelia produz efeitos quer na situação processual do demandado, quer
na própria tramitação da ação. Em função desses efeitos, temos a considerar a revelia
operante e a revelia inoperante.

1. Revelia operante:
O réu, mais do que ter o direito, tem o ónus de contestar a ação, na medida em que a
revelia (sendo operante) produz efeitos que lhe são desfavoráveis.
A revelia operante tem por efeito a confissão dos factos articulados pelo autor, tal
como estabelece a parte final do art 567º, nº 1 CPC, sendo que este regime tem lugar
quando o réu, apesar de não contestar, foi ou deva considerar-se citado regularmente
na sua própria pessoa, ou, pelo contrário, haja juntado procuração a mandatário
judicial, no prazo da contestação. O efeito deste comportamento omissivo do réu é a
chamada “confissão tácita ou ficta”. Tal confissão distingue-se da confissão judicial
expressa, que consiste numa declaração de ciência, através da qual se reconhece um
facto cuja prova pertence à parte contrária (arts 355º e ss CC). Por sua vez, a confissão
a que conduz a revelia operante não depende de qualquer declaração nesse sentido,
bastando a própria inércia do demandado. Nos termos legais, não tendo o réu
contestado e considerando-se confessados os factos alegados pelo autor, restará
apenas decidir a causa conforme for de direito (art 567º, nº 2 CPC).
Cumpre ressalvar que o estado de revelia operante em que se encontra o réu, embora
seja suscetível de potenciar tal desfecho, não conduz, sem mais, à procedência da
ação. Em suma, na revelia operante há confissão dos factos, mas não do direito.
A operância da revelia gera o encurtamento da ação. Confessados os factos, por
ausência de contestação, não há mais articulados. Além disso, são suprimidas todas as
etapas ou atos processuais cuja existência radica num quadro de litígio acerca dos
factos da causa e à necessidade de produzir prova quanto aos mesmos.
Nessa conformidade, proferido que seja o despacho judicial a dar como verificada a
revelia e a fixar os efeitos da sua operância, o art 567º, nº 2 CPC prevê que o processo
passe imediatamente para um momento de alegações escritas sobre a matéria de
direito – única vertente ainda em aberto, pois a matéria de facto está assente, após o
que é proferida sentença, julgando a causa conforme for de direito.
A revelia operante provoca uma alteração na estrutura normal do processo. Não tendo
havido contestação, já não há lugar a mais articulados. Não se realizará a audiência
prévia, nos termos do art 592º, nº 1, al a) CPC. No entanto, será proferido despacho
saneador destinado a conhecer imediatamente do mérito da causa, de acordo com o
art 595º, nº 1, al b) CPC.

2. Revelia inoperante:
A cominação fixada na lei para a revelia do réu conhece algumas exceções, o que
significa que, em determinadas circunstâncias, apesar de o réu não ter contestado, nem
por isso se consideram confessados os factos articulados pelo autor. Estamos então

10
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

perante a revelia inoperante. Consequentemente, o autor não está dispensado da


prova dos fundamentos fáticos da ação.
Nos termos da alínea a) do art 568º, a revelia não opera quando, havendo vários réus,
algum deles contestar, relativamente aos factos que o contestante impugnar. Nesta
hipótese, basta que um dos réus conteste a ação para os factos por ele impugnados
não poderem ser considerados como confessados em relação a esse e aos demais réus.
Note-se que este benefício concedido aos réus revéis se circunscreve à matéria
impugnada pelo réu contestante. Por isso, os factos da petição inicial que não hajam
sido efetivamente impugnados são dados como assentes, em relação a todos os réus
(art 574º, nº 2 e 568º, al a) CPC) Por outro lado, as exceções eventualmente deduzidas
pelo réu contestante, apenas a este aproveitam.
Nos termos da primeira parte da alínea b) do art 568º, a revelia é inoperante quando
o réu ou alguns dos réus seja incapaz e a causa esteja no âmbito da sua incapacidade.
Estamos no domínio de ações que versam sobre matéria para a qual o demandado
carece de capacidade jurídica. Simultaneamente, para evitar uma eventual discrepância
no julgamento da matéria de facto, estende-se tal benefício aos co-réus que sejam
igualmente revéis.
Importa ter em consideração que a falta de contestação do incapaz, através do seu
representante, não implica, desde logo, a afirmação de que o mesmo se encontra em
revelia, embora inoperante por força deste artigo. É que, detetada a inércia dos
representantes legais do incapaz, há ainda que dar cumprimento ao disposto no artigo
21º, nº 1, citando o Ministério Público e correndo novo prazo para a contestação. Só
no caso de o Ministério Público também não oferecer contestação é que se assume
que o réu incapaz entra em revelia, apesar de inoperante.
De acordo com o disposto na 2ª parte da al b) do art 568.º, a revelia é também
inoperante quando o réu ou algum dos réus tenha sido citado editalmente e
permaneça em revelia absoluta. Dado o caráter não pessoal desta forma de citação, e
por não haver a certeza de que o réu tenha tido efetivo conhecimento da ação que
pende contra si, a lei opta por não sujeitar o réu revel assim citado ao regime da revelia
operante. No entanto, sendo seguro que o réu tem consciência de que foi demandado
em juízo, perde justificação qualquer proteção acrescida. Verificada a falta de
contestação, há que começar por cumprir o disposto no art 21º, nº 1 CPC, citando-se o
Ministério Público para defender o réu, correndo novamente prazo para a contestação.
Se também o Ministério não apresentar contestação, então sim, assume-se que o réu
fica submetido ao regime da revelia inoperante, nos termos indicados. Por fim, o
benefício concedido ao réu citado editalmente e que se encontre em revelia absoluta
é alargado aos co-réus revéis.
A quarta situação de inoperância da revelia está prevista na alínea c) do art 568º e
ocorre quando a ação tenha por objeto relações jurídicas subtraída ao domínio da
vontade das partes. No domínio de ações que envolvem matéria de natureza
indisponível, a previsão da inoperância da revelia evita que as partes consigam, por
falta de contestação, um efeito jurídico que não poderiam obter, quer por via de
confissão em juízo, quer por via extrajudicial.

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

Finalmente, estabelece a al d) do art 568º que a revelia não produz efeitos quando se
trate de factos para prova dos quais se exija documento escrito.

RÉPLICA
A réplica representa o terceiro articulado do processo declarativo comum, cabendo a
sua apresentação ao autor. Este é um articulado meramente eventual, na medida em
que só pode ter lugar em duas situações: quando o réu haja formulado pedido
reconvencional na contestação, servindo a réplica para ao autor deduzir toda a sua
defesa quanto à matéria da reconvenção – art 584º, nº 1 CPC; quando, em acção de
simples apreciação negativa, o autor queira impugnar os factos constitutivos que o réu
tenha alegado e alegar os factos impeditivos ou extintivos do direito invocado pelo réu,
como dispõe o art 584º, nº 2 CPC.
O prazo de apresentação da réplica é de 30 dias a contar da notificação da contestação
(art 585º CPC). Em termos estruturais, a réplica é em tudo semelhante aos articulados
anteriores. A falta da sua apresentação, dada a função que a mesma desempenha, leva
ao efeito fixado pelo art 574 CPC, ou seja, a que tais factos se considerem admitidos
por acordo (art 587º, nº 1 CPC).

(Articulados supervenientes)
Decorre do art 611º, nº 1 CPC que a sentença deve tomar em consideração os factos
constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se produzam após a
propositura da acção.
Ainda que o momento normal para alegação dos factos seja a petição inicial, pode
acontecer que determinados factos constitutivos do direito ocorram depois da
apresentação da mesma. Para além disso, pode acontecer que surjam factos extintivos,
impeditivos ou modificativos desse direito. Esses factos serão apelidados de factos
supervenientes. Obrigando o art 611º a que estes sejam introduzidos no processo,
surge a figura dos articulados supervenientes (arts 588º e 589º CPC).
O articulado superveniente está sujeito a despacho liminar, podendo ser rejeitado pelo
juiz nos casos previstos no art 588º, nº 4 CPC. Sendo recebido, é notificada a parte
contrária, para que seja garantido o direito ao contraditório.

PROVIDÊNCIAS CAUTELARES
O reconhecimento da existência de um direito pode demorar tanto tempo que a
decisão, quando proferida, acaba por perder o seu efeito prático. Assim sendo, a parte
final do art 2º, nº 2 prevê, para além das acções, os “procedimentos necessários para
acautelar o efeito útil da acção”. São estes os procedimentos cautelares, referidos nos
arts 362º e seguintes CPC.
Há duas coisas que têm de estar sempre presentes relativamente às providências
cautelares:
o A ideia é serem rápidas, pelo que não é adequada a feitura de perícias. Os meios
de prova principais, neste âmbito, são a prova testemunhal, os documentos e a
confissão.

12
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

o A decisão do juiz é sempre fraca – o juiz apenas conhece superficialmente a


situação, pelo que a sua decisão nunca será definitiva. Assim, é fácil
compreender que a providência cautelar está sempre agarrada a uma acção
principal (excepto no caso da inversão do contencioso) – princípio da
instrumentalidade. Assim, das duas uma: ou o autor propõe uma acção e
percebe que não poderá ficar à espera, pelo que pede uma providência cautelar
para tutelar provisoriamente o seu direito; ou a parte vê acontecer uma
situação na qual precisa de ajuda urgente dos tribunais e pede primeiro a
providência cautelar, só depois pedindo a acção principal11.
No âmbito das providências cautelares vigora ainda o princípio da mínima interferência
na esfera jurídica do inquirido, pelo que todas as decisões tomadas deverão ser o mais
reversíveis possível. Se a providência cautelar já tiver sido requerida e, depois, o juiz
entender na acção principal que o requerente não tem aquele direito e demonstrou
pouca prudência quando fez o seu pedido, este terá de pagar uma indemnização ao
requerido – art 374º CPC.

REQUISITOS E FUNÇÕES DAS PROVIDÊNCIAS CAUTELARES


Desde logo, exige-se que o requerente demonstre ao tribunal que a demora na acção
principal causará danos graves na sua esfera jurídica – periculum in mora. Para
averiguar se este requisito está ou não verificado, é necessário ver se o direito fica ou
não prejudicado pela demora na acção principal. Para além disso, exige-se que o
tribunal, para poder decretar a providência cautelar, considere que é plausível que o
direito do requerente existe – fumus boni iuris (“aparência de bom direito”).
Por fim, é sempre exigida a verificação do princípio da proporcionalidade, pois que o
juiz tem de ter a certeza que o dano que vai resultar para o requerido da concessão
daquela providência é inferior ao benefício que daí se retirará para o requerente.
Note-se que a proporcionalidade não é um requisito para todas as providências
cautelares, mas apenas para as providências não especificadas (ou comuns) e para as
providências especificadas que o digam expressamente, pois que perante aquelas que
nada digam não se aplicará, nem subsidiariamente, o princípio em causa.
Note-se que, no âmbito das providências cautelares, não vigora o princípio do pedido
(art 376º, nº 3, 1ª parte CPC). Disto resulta que o juiz tem liberdade, por exemplo, para,
se a parte pedir um arresto, decretar uma providência comum. Da mesma maneira, se
a parte requerer uma providência cautelar, mas o juiz achar que é suficiente ordenar
o requerido a pagar uma caução, pode este substituir a providência por essa medida.
O princípio da instrumentalidade, já aqui referido, acaba por ter duas manifestações
distintas:
o Instrumentalidade funcional – a providência cautelar é instrumental da acção
principal, ou seja, a finalidade da providência cautelar é sempre a de assegurar
que a acção principal tem ainda utilidade e, portanto, que o direito que está a
ser invocado na acção principal ainda pode ser efectivado. As providências
cautelares estão finalisticamente orientadas para a garantia da utilidade da

11
Note-se que, se depois de decretada a providência cautelar, o autor não apresentar uma acção principal
dentro do prazo correcto, a providência caduca, precisamente por ser uma decisão provisória.

13
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

acção principal, pelo que é o juiz que deve procurar qual a melhor providência
cautelar para exercer essa função. Existem três funções prosseguidas pelas
providências cautelares:
• Função de garantia – garantia do património, para depois o direito de
crédito ainda se poder exercer (arresto)
• Função de antecipação – aquilo que vai ser dado na acção principal
começa a ser dado antes de esta ter terminado (alimentos provisórios)
• Função de regulação provisória – o tribunal não dá exactamente aquilo
que as partes querem, mas cria uma situação intermédia entre aquilo que
o requerente quer e aquilo que o requerido quer, servindo essa para
assegurar o direito durante esse período de tempo.
o Instrumentalidade hipotética – a providência cautelar está sempre na
dependência de uma acção principal, e a sua eficácia depende da procedência
ou não desta. Se o juiz decretar uma providência cautelar e, depois, o juiz da
acção principal considerar que afinal o requerente não tinha o direito que o juiz
até achou plausível que tivesse, então a providência cautelar extingue-se por
caducidade. Quando o juiz pondera entre decretar ou não a providência
cautelar, faz um juízo sobre a possibilidade de acção proceder ou não (faz um
juízo hipotético daquilo que pode ou não acontecer na acção principal).

CLASSIFICAÇÕES
A primeira classificação a reter é a que distingue entre providências conservatórias e
providências antecipatórias. As providências conservatórias são as que visam
conservar a situação de facto anterior, por forma a prevenir uma alteração que se
antevê como prejudicial. Dentro destas, temos: o arresto, o arrolamento, o embargo
da obra nova e a suspensão das deliberações sociais, tendo todas estas por finalidade
manter a situação existente. Em oposição a estas, as providências antecipatórias são
as que visam obstar a que se verifiquem prejuízos pela demora da decisão definitiva,
sendo por isso uma antecipação provisórias dos efeitos dessa decisão. Em causa estão
os alimentos provisórios, o arbitramento da reparação provisória e a restituição
provisória da posse.
Uma das maiores distinções a fazer nesta matéria é a que existe entre providências
cautelares especificadas e providências cautelares não especificadas.

PROVIDÊNCIAS CAUTELARES ESPECIFICADAS – art 362º, nº 3


A estas aplicar-se-á o disposto no capítulo referente a essa matéria e,
subsidiariamente, o regime geral. A única excepção a essa regra é a que está presente
no art 376º, nº 1 CPC, que remete para o art 368º, nº 2 CPC, referente à regra da
proporcionalidade.
o Providências cautelares de garantia
• Arresto (arts 391º a 396º CPC) – emprega-se quando o credor tenha
justo receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito, por
dissipação ou ocultação de bens por parte do devedor. Representa, no
fundo, uma apreensão judicial dos bens, à qual são aplicáveis as

14
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

disposições relativas à penhora (art 391º, nº 2 CPC)12. Tem um


contraditório diferido, sendo primeiro o arresto decretado e só depois
ouvido o requerido. Tem como efeito principal a colocação de bens
suficientes para satisfação da dívida.
• Arrolamento (arts 403º a 409º CPC) – havendo justo receio de extravio,
ocultação ou dissipação de bens, móveis ou imóveis, ou de
documentos, pode requerer-se o arrolamento. De acordo com o art
403º, nº 2 CPC, o arrolamento é dependência da acção à qual interessa a
especificação dos bens ou a prova da titularidade dos direitos
relativamente às coisas arroladas. Difere do arresto porque, enquanto
nesse se pretende assegurar o pagamento do crédito do requerente e,
para isso, se apreendem os bens, no arrolamento pretende-se antes
conservar os próprios bens. O arrolamento é sempre pedido na
dependência de uma acção principal, em que o autor pede os bens.
• Restituição da posse (arts 1377º e ss + art 1279º CC) – destina-se aos
casos de esbulho violento, em que o possuidor esbulhado pode pedir
que seja restituída provisoriamente a sua posse, cabendo-lhe alegar os
factos que constituem a posse, o esbulho e a violência. Também esta é
decretada antes de haver direito ao contraditório.
o Providências cautelares de regulação provisória
• Suspensão de deliberação (arts 380º a 383º CPC) – se uma associação
ou sociedade tomar deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao
contrato, qualquer dos sócios pode requerer, no prazo de 10 dias, que
a execução dessas deliberações seja suspensa, justificando a qualidade
de sócio e demonstrando que essa execução pode causar dano
apreciável.
• Embargo de nova obra (arts 397º a 402º CPC) – aquele que se julgue
ofendido no seu direito de propriedade, singular ou comum, ou em
qualquer outro direito real ou pessoal de gozo, em consequência de
obra, trabalho ou serviço novo que lhe causa ou ameace causar prejuízo,
pode requerer, no prazo previsto, a sua suspensão.
o Providências cautelares de carácter antecipatório
• Alimentos provisórios (arts 384º a 387º CPC) – o titular do direito pode
requerer a fixação da quantia mensal que deve receber a título de
alimentos provisórios, enquanto não houver pagamento da primeira
prestação definitiva.
• Arbitramento de reparação (arts 388º a 390º CPC) – como dependência
da acção de indemnização fundada em morte ou lesão corporal, podem
os lesados, bem como os titulares do direito a que se refere o nº 3 do
art 495º CC, requerer o arbitramento de quantia certa, sob a forma de
renda mensal, como reparação provisória do dano.

12
Isto significa que não são susceptíveis de arresto os bens absolutamente impenhoráveis (art 736º CC)
ou os bens relativamente impenhoráveis (art 737º CC)

15
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

INVERSÃO DO CONTENCIOSO
O princípio segundo o qual os procedimentos cautelares são sempre dependência de
uma causa principal pode sofrer – desde de 2013 – uma excepção. Essa excepção é,
precisamente, a inversão do contencioso (art 364º, nº 1 CPC).
Nestes casos, as providências cautelares deixam de depender da acção que teria por
fundamento o direito acautelado. Assim sendo, a providência pode consolidar-se como
composição definitiva do litígio e, portanto, o requerente fica dispensado de propor a
acção respectiva. Na prática, há uma inversão do ónus de propor a acção principal: a
acção principal pode ser proposta, mas pelo requerido.
Para que possa existir inversão do contencioso, exige-se que:
o Tal seja requerido pela parte (art 369º, nº 2 CPC)
o O juiz tem que estar convencido, nos mesmos termos em que tem de estar
convencido na acção principal – o juiz declara a providência cautelar e, se estiver
realmente convencido, declara depois a inversão do contencioso. Exige-se então
que estejamos já no âmbito da prova stricto sensu e no convencimento de que
o direito existe (passados os crivos do periculum in mora e do fomus boni iuris.
o A natureza da providência cautelar o permita – diz o art 376º, nº 4, de entre as
providências especificadas, quais aquelas em que se pode verificar uma
inversão do contencioso. Apenas pode haver inversão do contencioso quando a
providência cautelar decretada corresponda exactamente àquilo que o autor
quer obter na acção principal.
Diz o Professor Miguel Teixeira de Sousa que, por razões de lógica, só pode haver
inversão do contencioso nos casos em que primeiro surge a providência cautelar e
apenas depois disso seria intentada a acção principal – não faz sentido decretar a
inversão do contencioso nas situações em a acção já foi proposta, pois que a inversão
do contencioso representa exactamente uma decisão do juiz através da qual este decide
a dispensa de o requerente propor acção principal.
Se o requerido tomar a opção de propor a acção principal, que tipo de acção teremos?
O Professor Miguel Teixeira de Sousa entende que esta acção se poderá configurar de
duas maneiras:
o O requerente propõe a acção principal e, nesta, pede a impugnação da decisão
que foi tomada em sede de providência cautelar. Aqui, a causa de pedir da
impugnação é constituída pela ideia de que os fundamentos em que o juiz
fundou a sua decisão de considerar que o direito do requerente existia estão
errados.
o O requerido propõe uma segunda acção normal, mas que em si mesma seja
incompatível com aquilo que foi decidido na providência cautelar. Se a acção
do requerido proceder, então, indirectamente, ataca a providência cautelar
decretada.
Outra questão que se pode colocar é a que resulta da existência do princípio da
preclusão – no processo civil, as coisas têm um momento para serem feitas, pelo que,
não sendo feitas em sede própria, não podem ser feitas em momento posterior.
Pergunta-se: se o requerido, na providência cautelar, não invocar algum facto
modificativo, extintivo ou impeditivo do seu direito, pode depois vir a invocá-lo na
acção principal? Mesmo depois de ter sido invertido o contencioso? O Professor Miguel

16
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

Teixeira de Sousa entende que sim – a preclusão não opera entre a providência
cautelar e a acção principal, mesmo que tenha sido decretada a inversão do
contencioso.

NEGÓCIOS PROCESSUAIS
São actos processuais de carácter negocial que constituem, modificam ou extinguem
uma situação processual. Estes podem ser, desde logo, preparatórios ou
interlocutórios, consoante sejam concluídos antes da propositura da acção ou durante
a pendência da causa.

CONFISSÃO DO PEDIDO
É o negócio unilateral pelo qual o réu reconhece o fundamento do pedido formulado
pelo autor (art 283º, nº 1 CPC). A confissão do pedido não pode ser submetida a
condição e é, desde logo, diferente da confissão de um facto. Mais, confessar todos os
factos não implica confissão do pedido. EXEMPLO: A é do Sporting e odeia pessoas do Benfica.
A propõe uma acção contra B, que é benfiquista, e diz: B é do Benfica. Eu odeio pessoas do Benfica. Estar
na presença de pessoas do Benfica causa-me danos, pelos quais eu quero uma indemnização de B.
Confessar um facto significa B dizer que é verdade que é do Benfica; confessar todos os factos significa B
dizer que é do Benfica, que A odeia pessoas do Benfica e que, de facto, A sofre danos por estar na sua
presença. Isso não significa que B confesse que A tem direito a uma indemnização – não há confissão do
pedido.
Pode ser total ou parcial, consoante o âmbito do reconhecimento realizado pelo réu
(art 283º, nº 1 CPC). Diz o Professor Miguel Teixeira de Sousa que, em termos de
interpretação do negócio jurídico, devemos entender que a confissão de um pedido
depois da condenação do réu equivale ao próprio dizer “estou satisfeito com a
sentença, não vou recorrer” – o réu não deve, ainda assim, confessar sempre que esses
actos reproduzam o conteúdo da decisão proferida, por falta de interesse processual.

DESISTÊNCIA DA INSTÂNCIA
É o negócio unilateral através do qual o autor renuncia à obtenção da tutela
jurisdicional requerida, pelo que se extingue a instância sem o autor marcar posição
quanto à situação jurídica por ele alegada em juízo. A desistência apenas faz cessar o
processo que se instaurara (art 285º, nº 2 CPC), dependendo normalmente da
aceitação do réu (art 285º, nº 1 CPC), que a deverá comunicar ao tribunal. Tal já não
será assim se o réu não tiver contestado ou estiver em revelia, situações nas quais pode
sempre haver desistência da instância, mesmo sem consentimento.
Não tendo havido contestação, o autor poderá desistir da instância até à sentença,
pois que se presume que, se o réu tivesse algo a dizer, tinha contestado. Note-se que,
depois de haver decisão favorável ao réu, a desistência da instância configura um
abuso do autor – a contestação é um ónus (e não um dever), e permitir essa atitude por
parte do autor teria implicações práticas muito relevantes. A desistência da instância
não cessa o direito do autor de voltar a propor a ação e não implica dizer que o réu
está, ao aceitar a desistência, a renunciar ao seu pedido reconvencional. Diz o
Professor Miguel Teixeira de Sousa que não podemos ler a aceitação do réu da

17
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

desistência da instância como uma renúncia ao pedido reconvencional, a menos que o


pedido reconvencional esteja na dependência do pedido principal.
Na desistência da instância, não cessa o direito do autor de voltar a propor a acção –
art 285º, nº 2: os efeitos retroagem ao início.

DESISTÊNCIA DO PEDIDO
É o negócio unilateral através do qual o autor reconhece a falta de fundamento do
pedido formulado. Aqui, há um reconhecimento pelo autor de que a situação jurídica
alegada não existe ou se extinguiu. A desistência do pedido pode ser total ou parcial
(art 283º, nº 1 CPC). Para além disso, esta é livre, mantendo-se o pedido reconvencional
(a menos que este fosse dependente do pedido formulado pelo autor). Na desistência
do pedido, não pode o autor voltar a propor nova ação – art 285º, nº 1 CPC.
Na desistência do pedido, ao contrário do que acontece na desistência da instância, não
é exigida a autorização do réu. O fundamento para tal reside na ideia de que a
desistência do pedido é sempre favorável ao réu – o réu ganha sempre mais com a
desistência do pedido do que ganharia se o autor não tivesse desistido. Já no que toca
à desistência da instância, o réu até pode ter interesse em que aquele problema seja
resolvido, ou até achar que vai ganhar.

TRANSACÇÃO
Transacção é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante
recíprocas concessões – podem envolver a extinção ou modificação de direitos
diversos do direito controvertido (art 1248º CC).

QUANDO SE FALA EM DESISTÊNCIA DA ACÇÃO FALA-SE DE DESISTÊNCIA DA


INSTÂNCIA E DO PEDIDO

SENTENÇA
A sentença representa uma decisão do tribunal, através da qual se põe fim ao processo.
A sentença compõe-se em três partes:
o Relatório – o juiz identifica as partes e enuncia os pedidos deduzidos, bem como
as questões relativas à causa de pedir e excepções, tanto suscitadas pelas partes,
como as que ao tribunal cumpre oficiosamente conhecer (art 607º, nº 2 CPC)
o Fundamentação – o juiz descrimina os factos que considera provados, determina
as normas jurídicas aplicáveis, interpreta-as e aplica-as (art 607º, nº 3 CPC), em
obediência ao disposto no art 205º, nº 1 CRP.
o Decisão – o juiz, consoante os casos, absolve o réu da instância ou responde ao
pedido feito pelo autor (art 607º, nº 3 CPC), nele condenando ou dele
absolvendo.
A sentença comporta o resultado de um julgamento de matéria de facto e de um
julgamento de direito. Na decisão de facto, o tribunal declara quais os factos, dos
alegados pelas partes e instrumentais que considere relevantes, que julga provados
(total ou parcialmente) e quais os que julga não provados. Essa convicção deve ser
fundamentada, correspondendo ao resultado da análise crítica das provas e à

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Patrícia Carneiro da Silva

especificação das razões que o levaram à decisão tomada sobre a verificação de cada
facto (art 607º, nº 4, 1ª parte). A fundamentação exerce uma dupla função: reforçar o
reexame da causa pelo tribunal superior e reforçar o autocontrolo do julgador. Mais, o
juiz deverá ainda considerar os factos cuja prova resulta da lei (art 607º, nº 4, 2ª parte
CPC), ou seja, da assunção de um meio de prova com força probatória pleníssima, plena
ou bastante.
Já no que toca à decisão de direito, a aplicação do direito pressupõe o apuramento de
todos os factos da causa que, tidos em conta os pedidos e as excepções deduzidas,
sejam relevantes para o preenchimento das respectivas previsões normativas. A esses
factos, o juiz aplica o direito, sempre com respeito pelo art 3º, nº 3. A sentença começa
assim pelo conhecimento das questões que possam conduzir à absolvição do réu da
instância (art 608º, nº 1 CPC). Não havendo lugar à absolvição da instância, segue-se a
apreciação do mérito da causa – o juiz responde agora aos pedidos deduzidos pelo
autor e pelo réu reconvinte, relacionando as causas de pedir invocadas e as excepções
peremptórias deduzidas pelo réu ou pelo autor reconvido, bem como as que deva
conhecer a título oficioso (art 608º, nº 2 CPC).
Acessoriamente, a sentença condena nas custas do processo a parte que lhe tenha
dado causa (arts 527º, nº 1 e 607º, nº 6 CPC), que será, em princípio, a parte vencida
(será o autor se o réu, embora vencido, não tiver contestado).

VÍCIOS DA SENTENÇA
Podemos desde logo identificar os chamados vícios da essência – são casos de aparência
de decisão, em que o acto judicial não tem, pelas circunstâncias, sequer aparência de
acto judicial. A consequência é a inexistência do acto, verificando-se tal desvalor
quando:
o Há falta de poder jurisdicional do judiciante
o Há absoluta inteligibilidade da decisão
o Há falta de forma, podendo não haver sequer aparência social de sentença
Para além destes, há ainda os vícios de limites, todos eles presentes no art 615º CPC. A
sua consequência é a nulidade, que tem de ser alegada e invocada (sob pena de se
sanar). Decorre do art 615º, nº 4 CPC que, para invocar uma nulidade, em regra, se pede
recurso ordinário (para o órgão superior). Se não houver possibilidade de recurso, faz-
se uma reclamação (para o órgão que proferiu a decisão). Se o recorrente pedir recurso
com base num dos casos do art 615º e o juiz entender que o caso seria outro, não
poderá dele conhecer oficiosamente (a menos que haja falta de fundamentação – al
b)). Seguem-se os vícios de conteúdo, que são erros no julgamento. Estes podem ser de
dois tipos:
o Erro material – inexactidão ou omissão de elementos do processo, ou situações
em que se presumem divergências entre a vontade do juiz e o que ele
efectivamente escreveu (art 6º, nº 4 CPC). este tipo de erro pode ser ratificado
por iniciativa das partes ou do juiz (arts 613º, nº 1 e 614º, nº 1 CPC), mas esta
não permite alterar o que já foi decidido. Não sendo interposto recurso, pode
ter lugar a todo o tempo (art 614º CPC)

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Patrícia Carneiro da Silva

o Erro judicial – divergência entre a realidade e aquilo que foi afirmado em juiz. É
impugnável através de reclamação, se não couber recurso ordinário (art 616º)

EFEITOS DA SENTENÇA – CASO JULGADO


O poder jurisdicional do juiz esgota-se a partir do momento em que é decretada a
sentença – art 613º, nº 1 CPC. Ainda assim, existe um período durante o qual a sentença
pode ser alterada, por iniciativa das partes. Passado o prazo, a decisão transita em
julgado, pelo que se torna imutável (insusceptível de recurso). Geralmente, o prazo para
pedir recurso é de 30 dias, pelo que se pode dizer que, ao fim de 30 dias, a decisão
transita em julgado – art 638º CPC –, ganhando força de caso julgado.
Há dois tipos de força de caso julgado:
o Força de caso julgado formal – a decisão já não pode ser alterada dentro daquele
processo, pelo que se o juiz tomou uma decisão no despacho saneador, essa já
não poderá ser alterada na sentença.
o Força de caso julgado material – emana também para fora do processo. No
fundo, outros juízes que venham a debater-se com aquela questão
posteriormente, não poderão contrariar a decisão já tomada (art 619º CPC).
Todas as decisões tomadas pelo tribunal, ao transitar em julgado, ganham força de caso
julgado formal. Só as decisões de mérito ganham, também, força de caso julgado
material. Isto significa, no fundo, que quando uma decisão ganha força de caso julgado
material, ela tem também força de caso julgado formal. O contrário, porém, já não
acontece.

CASO JULGADO FORMAL


EXEMPLO: O juiz, no despacho saneador, conhece dos vários pressupostos processuais.
O réu alega ser parte ilegítima, mas o tribunal acha e justifica que as partes são legítimas.
Essa decisão não pode ser depois alterada na sentença. A legitimidade, que não é uma
questão de mérito, transitou em julgado, ganhando força de caso julgado formal, pelo
que não pode ser alterada dentro daquele processo.
NOTA
O juiz profere despacho saneador no qual conhece da legitimidade das partes e, a
meio da audiência, o autor desiste da instância. O autor pode, depois, propor nova
acção, na qual o novo tribunal não está vinculado a decidir que as partes são
legítimas. Não há força de caso julgado material.

Relativamente ao caso julgado formal, há um caso específico em que é a força de caso


julgado que produz o despacho saneador. Este despacho existe em todos os processos,
acaso, resultando do art 595º, nº 3 CPC que, no caso de o juiz estar a conhecer de
excepções dilatórias e nulidades processuais, o despacho transita logo em julgado,
ganhando força de caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas.
O despacho saneador genérico não tem qualquer força.
Assim, se o juiz, no despacho saneador, disser que o tribunal é competente, que as
partes são legítimas e têm competência, quando chegamos à sentença, o juiz pode

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Patrícia Carneiro da Silva

decidir que afinal não é competente, porque a decisão que tomou não apreciou
concretamente a questão da competência, apenas genericamente.

CASO JULGADO MATERIAL


O caso julgado material traduz-se na força que determinada decisão do tribunal traduz
para fora do processo. Comporta dois efeitos:
o Efeito negativo ou excepção de caso julgado – arts 580º, nº 1 e 581º CPC – se
depois de uma acção em que as partes já discutiram, o tribunal já decidiu e essa
decisão já transitou em julgado, uma das partes vier a propor nova acção, com
o mesmo pedido13, mesma causa de pedir e mesmas partes, o juiz deve
absolver o réu da instância. Em causa está uma excepção dilatória de
conhecimento oficioso. Este é o efeito negativo do caso julgado material
porque aquilo que a excepção de caso julgado faz é impedir que determinada
causa prossiga, quando o juiz não poder sequer conhecer do mérito da causa
(por não se poder pronunciar sobre uma questão já decidida).
o Efeito positivo ou autoridade de caso julgado – actua quando o pedido da
segunda acção, apesar de não ter o mesmo objecto, comporta um fundamento
que depende da primeira acção. Aqui, o juiz vai continuar a conhecer do mérito
da causa, mas há uma questão em relação à qual ele não poderá decidir em
contrário. EXEMPLO: A propõe uma acção contra B, em que pede ao tribunal
para declarar que A é proprietário da casa. O tribunal declara. De seguida, A
propõe uma acção em que pede a B uma indemnização pelos danos que causou
durante a ocupação da sua casa – o segundo pedido não é igual ao primeiro, mas
quando o juiz estiver a decidir a segunda acção, tem já por assente que a casa é
de A14. É um efeito positivo porque obriga o juiz a ter uma determinada pré-
compreensão quando decide a segunda causa. Este tem efeitos em relação a
terceiro, sob a condição de essa autoridade de caso julgado não ser incompatível
com o direito que o terceiro está a tentar fazer valer na segunda acção.

ÂMBITO TEMPORAL DO CASO JULGADO


Quando o juiz decide do mérito da causa, está a dizer-nos que aquele direito em
específico existe nesse momento, ou seja, no momento me que é encerrada a
discussão em primeira instância – art 611º e art 604º, nº 3. A questão que se coloca é
saber o que acontece quando, entre o momento de encerramento da audiência e a
sentença, as circunstâncias mudam. Lembre-se, desde logo, que depois do
encerramento da discussão em primeira instância não podem ser trazidos novos factos
ao processo (art 588º CPC).

13
SÓ O PEDIDO CONTRÁRIO CONTRADITÓRIO É QUE É CONSIDERADO O MESMO PEDIDO – A pede ao
tribunal para delcarar que é proprietário, o que o tribunal faz. Depois, B, que era réu na primeira acção,
pede ao tribunal para declarar que A não é proprietário daquela casa, no mesmo período temporal.
Ainda que pareçam pedidos diferentes, a verdade é que o direito que o pedido tem por objecto é
exactamente o mesmo. No fundo, B pede exactamente a mesma coisa, mas formulada em “não”.
14
Perante esta situação, na PI, A deve dizer que a casa é sua, que B causou estes danos, agiu com culpa,
etc., e que a circunstância de a casa ser sua é uma situação da qual o tribunal não pode conhecer por
autoridade do caso julgado, julgando a sentença em anexo.

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Quando o juiz toma a decisão da sentença, tem em conta três tipos de factos:
1. Aqueles de que tem conhecimento logo no início da acção;
2. Aqueles que conhece durante a acção;
3. Aqueles que foram alegados no início da acção, e que eram mentira, mas que se
tornaram verdadeiros durante o decorrer da acção.
Caso o autor venha pedir o cumprimento de uma obrigação e o cumprimento se dê
entre o encerramento, discussão e julgamento e a sentença, só depois, quando o autor
na acção executiva pedir a penhora dos bens do réu, é que o réu poderá alegar que já
cumpriu. Significa isto que, ainda que já tenha havido cumprimento, irá ser emitida
sentença condenatória.
As excepções a esta realidade são as acções de parentalidade e as de simples
apreciação, podendo nestas últimas o autor criar a sua própria referência temporal
(EXEMPLO: A pede ao tribunal que declare que este foi proprietário entre Setembro de
2009 e Agosto de 2010 – o momento de referência do tribunal não é o encerramento da
discussão em primeira instância, mas antes aquele que o autor pediu).

LIMITES OBJECTIVOS DO CASO JULGADO


Os fundamentos da decisão não têm força de caso julgado. Assim, imaginemos que A
quer que o tribunal declare a sua propriedade, que adquiriu por via de contrato de
compra e venda. O tribunal dá razão a A – a única coisa que faz caso julgado é que A é
proprietário. Isto significa que, se A propuser segunda acção, não poderá fazer-se valer
da prova já feita de que o contrato existe, porque isso sozinho não faz caso julgado. No
entanto, se A fizer valer noutra acção que é proprietário, a existência e validade do
contrato de compra e venda enquanto título aquisitivo já vem atrás. Em suma: os
fundamentos não valem sem a decisão principal, mas quando se invoca a decisão
principal, esta traz sempre atrás de si os fundamentos.
Esta regra encontra quatro casos excepção:
1. Relações sinalagmáticas – A e B celebram um contrato de compra e venda de
uma maçã por 1€. A propõe uma acção contra B a dizer que este tem de lhe
entregar o dinheiro. O tribunal diz que B não tem que pagar porque o contrato é
nulo, não pedindo nenhuma das partes para que o tribunal declare
expressamente essa nulidade. Posteriormente, B vem propor uma acção contra
A para que este lhe entregue a maçã. Pode o tribunal considerar que A tem de
entregar a maçã? Regra geral, sim – se A invocasse a nulidade da acção era um
fundamento, pelo que não tem força de caso julgado só por si. No entanto, nas
relações sinalagmáticas, a regra não se a plica. A excepção em causa funda-se no
princípio da justiça: não faz sentido que B não tivesse que cumprir a sua parte e
A tivesse que cumprir a dele.
2. Relações de subsidiariedade – o autor tem ao seu dispor, dados pela lei, vários
mecanismos a que pode recorrer. Por exemplo, quando há cumprimento
defeituoso de um contrato, o credor pode fazer-se valer da anulação do
contrato, da redução do preço, da substituição da coisa, etc. Se o credor apenas
pede a anulação do contrato por cumprimento defeituoso, mas o tribunal
considera que a anulação não é proporcional, porque o defeito é demasiado

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Patrícia Carneiro da Silva

pequeno, o credor pode a seguir propor nova acção em que pede a redução do
preço. Diferente é a situação em que o credor pede a anulação do contrato por
cumprimento defeituoso e o tribunal nega o pedido por a coisa se encontrar em
perfeitas condições. Aqui, não pode o credor propor nova acção, porque este é
um fundamento válido para todas as outas alternativas. Com base nisto, diz o
Professor Miguel Teixeira de Sousa que, se o fundamento com que a primeira
alternativa improcedeu fizer com que as outras também improcedam, o
fundamento poderá ser utilizado noutras acções, mesmo que não tenha sido
formulado por um pedido autónomo.
3. Excepções peremptórias modificativas – as excepções peremptórias
modificativas dão aso a condenações in futurum. O tribunal, por um lado,
condena dizendo ao réu que tem que pagar, mas absolve dizendo que o réu não
tem que pagar já (apenas quando uma certa condição se verificar, por exemplo).
O autor propõe nova acção a dizer que a condição já se verificou, logo, o réu tem
de pagar. Já não terá que se discutir se o réu tem a obrigação de pagar quando
se verifica a condições, pois que isso é um fundamento que fica assente na
primeira acção;
4. Relações de prejudicialidade – estamos perante uma primeira acção que é
prejudicial de uma segunda. Tanto a primeira como a segunda têm por
fundamento o mesmo facto. Neste caso, há fundamentos assentes na primeira
acção que podem ser aproveitados para a segunda.

LIMITES SUBJECTIVOS DO CASO JULGADO


A saber:
o Excepção de caso julgado exige que as partes sejam as mesmas, a autoridade de
caso julgado já não;
o As partes estão de certeza vinculadas ao caso julgado
Há situações em que um terceiro fica vinculado pelo caso julgado.
o Eficácia sob condição – A propõe uma acção contra B, em que pede a declaração
da propriedade de A. Numa segunda acção, B propõe contra A acção de
declaração da mesma propriedade. As acções têm o mesmo período temporal.
Não é o mesmo pedido porque, na primeira, está a conhecer-se do direito de A
e, na segunda, do direito de B (não há excepção de caso julgado). No entanto,
não podem as duas acções proceder. A segunda acção não procederá porque, se
B achava que era proprietário, enquanto réu, tinha o ónus de ter alegado o facto
constitutivo da sua propriedade. Se B já sabia que era proprietário, devia ter
alegado a sua propriedade. Assim sendo, embora não haja excepção do caso
julgado, a segunda acção não procederá porque há para B preclusão factual, de
onde decorre o caso julgado material da primeira acção. Imagine-se agora que B
propõe acção contra C. Nesse caso, não haverá preclusão factual, pois que C não
tinha qualquer ónus de alegar a sua propriedade na primeira acção, pois que ele
nem era parte. Também não há excepção de caso julgado porque não estamos
perante as mesmas partes. Assim, conclui-se que pode um terceiro ser
confrontado com uma autoridade de caso julgado em que não esteve.

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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva

o Eficácia absoluta – uma decisão tem eficácia absoluta quando é uma decisão que
tem os interessados muito bem delimitados e todos os interessados estiveram
na acção (por exemplo, acções de parentalidade)
o Extensão a partes materiais – uma parte material é alguém que não esteve no
processo, mas que tem exactamente a mesma qualidade jurídica que alguém
que esteve. Ocorre na situação dos sucessores, quer por morte, quer inter vivos.
A queles que sucedem num direito também ficam vinculados pelo caso julgado
que foi proferido em relação àquele direito anteriormente.
o Extensão a terceiros materiais – vem sempre prevista na lei, e somente nos
casos em que é favorável a terceiro é que pode ser aplicada. Existem duas
situações possíveis:
• Relações subordinadas – finanças
• Relações paralelas – devedores solidários
EXEMPLO: A é fiadora de B; C propõe uma acção contra B para que este lhe
pague e o tribunal considera a acção procedente. Não pode C utilizar esta
sentença para obrigar A a pagar também – a lei diz expressamente que, quando
for desfavorável não pode ser oposto ao fiador. Mas, se o tribunal considerasse
que B não devia nada, poderia A invocar o caso julgado quando C lhe fosse exigir
o pagamento – aqui já era favorável.

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