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O Problema da Definição de Arte (“O que é a arte?

”)

O primeiro problema que qualquer teoria da arte tem de enfrentar é o problema da própria definição de “arte” ou de “obra de arte” (O que é a arte?). Para isso, devemos ter em conta uma distinção fundamental entre dois usos comuns da
palavra “arte”: um sentido classificativo (descritivo) e um sentido valorativo (avaliativo). Dizer que algo é uma obra de arte no sentido classificativo (descritivo) é dizer simplesmente que esse objeto pertence a uma determinada classe. Ao
passo que dizer que algo é uma obra de arte no sentido valorativo (avaliativo) é reconhecer que esse objeto, além de pertencer à categoria das obras de arte, é um bom exemplar dessa categoria, ou seja, é uma boa obra de arte.
Como podemos então definir “arte”? Pode-se definir Arte?
Uma boa definição (explícita) de arte terá de identificar as condições necessárias (características que todos as obras de arte possuam) e suficientes (características que só as obras de arte possuam).

Várias teorias (respostas) ao problema

Teorias essencialistas Teorias não essencialistas

(Há uma essência da arte) (Não há uma essência da arte)

(propriedades intrínsecas - inerentes - que fazem com que um objeto seja arte) • (o que faz com que um objeto seja arte são propriedades extrínsecas - o contexto social ou

histórico) Tentam encontrar fora das obras de arte, nas suas propriedades relacionais, as condições
para algo poder ser classificado como arte, independentemente do seu valor artístico. Não importa
se a(s) Caixa(s) Brillo, de Warhol são boa ou má arte. O que é relevante descobrir é o que faz
delas arte.

• Procura-se, portanto, um critério classificativo e não um critério avaliativo de arte.

Teoria da arte como representação Teoria da arte como expressão Teoria da arte como forma Teoria institucional da arte Teoria histórica da arte
significante

Teses Algo é arte se, e só se for a representação Algo é arte se, e só se, é a expressão Algo é uma obra de arte se, e só se X é arte se, e só se, for um artefacto ao qual foi Algo é uma obra de arte se, e só se, um dos
artística de algo. imaginativa de emoção. tem forma significante. atribuído, pelo mundo da arte, do estatuto de obra de seus proprietários tem a intenção séria de
arte. que isso seja encarado como obra de arte,
Candidato isto é, seja encarado da mesma forma como
foram corretamente encaradas obras de arte
anteriores.

Argumento 1. Se a arte é frequentemente 1. A arte é a estimulação de A argumentação de Bell (forma Argumento (representação canónica): Argumento (representação canónica):
baseada em referências da emoções, ou expressão de lógica):
emoções.
1. A única diferença relevante entre as coisas de 1. X é arte se, e só se, tiver alguma
vida real (retratos,
2. Mas a arte não é a estimulação
1. Todas as obras de arte Brilho comum e as coisas de Brilho de conexão com outras obras de arte
paisagens, acontecimentos

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históricos, ...), então os de emoções. visual têm alguma Andy Warhol é o facto de os últimos, ao anteriores.
artistas usam essas 3. Logo, a arte é a expressão de propriedade comum, ou contrário dos primeiros, estarem inseridos no 2. Se (1), então a tal conexão baseia-
referências como ponto de emoções. quando falamos de “arte” contacto de instituição social do mundo da se ou na semelhança exterior, ou
partida para as suas obras referimo-nos a coisas sem arte   no tipo de prazer/experiência que
de arte. A premissa 1 defende que a produção sentido. 2. Se a única diferença relevante entre as coisas proporciona, ou no facto de se
2. Se os artistas usam essas artística envolve sempre determinadas 2. É falso que quando falamos de brilho comum e as coisas de brilho de Andy pretender que o mesmo seja
referências como ponto de emoções e que podem ser feitas duas de “arte” nos referimos a Warhol é o facto de os últimos, ao contrário tratado/encarado como obras de
partida para as suas obras coisas com a emoção: estimulá-la ou coisas sem sentido dos primeiros, estarem inseridos no contacto arte exteriores foram
de arte, então as obras de expressá-la. 3. A propriedade comum a de instituição social do mundo da arte, então corretamente encaradas/tratadas.
arte são uma representação todas as obras de arte é a aquilo que que faz com algo seja arte é o facto 3. A conexão com outras obras de
Na premissa 2, Collingwood afirma que
artística de algo. forma significante, ou a de estar inserido no contexto de instituição arte anteriores não consiste na
a arte não é estimulação de emoções,
3. Se a arte é frequentemente representação, ou a social do mundo da arte.  semelhança exterior ou no tipo de
através de uma distinção entre arte
baseada em referências da expressão de emoções. 3. Logo, aquilo que faz com que algo seja arte é o prazer/experiência
sem sentido próprio e em sentido
vida real (retratos, 4. Nem a representação nem a facto de estar inserido no contexto da proporcionado.
impróprio.
paisagens, acontecimentos expressão de emoções são instituição social do mundo da arte.   4. Logo, a conexão com outras obras
históricos, ...), então as prioridade comuns a todas de arte anteriores consiste no
obras de arte são uma as obras de arte. facto de se pretender que o
representação artística de 5. Logo, a prioridade comum a mesmo seja tratado/encarado
algo. todas as obras de arte é a como obras de arte anteriores
forma significante. foram corretamente
encaradas/tratadas.

Objeções A definição é demasiado restritiva  É demasiado inclusiva: É viciosamente circular  Oferece uma definição viciosamente circular de  Não explica o aparecimento da
INC A definição de arte é demasiado arte, pois para sabermos o que é arte, temos de primeira obra de arte
Se olharmos para as definições de
inclusiva, pois ao defender que a arte é saber o que é o mundo da arte, e para sabermos o Se algo é arte caso seja visto como o
A representação é uma condição forma significante e emoção estética
o que existe na mente d artista, implica que é o mundo da arte temos de saber o que é eram as obras anteriores, é difícil
necessária, mas não suficiente da concluímos que se trata de uma
implausivelmente que a psicoterapia é arte.
arte pois pode haver definição viciosamente circular além explicar a existência da primeira obra
arte, quando evidentemente não é.  A definição de arte é inútil, porque se qualquer
representação sem haver arte. A de pouco informativa.
coisa pode ser uma obra de arte, então
de arte.
representação é uma condição Isto porque, na psicoterapia, fazemos
- Algo tem forma significante se, e aparentemente não temos boas razões para nos  Não se exige que os artistas
uma reconstrução e organização dos
necessária, mas não suficiente da só se, causa emoção estética. E, algo preocuparmos com a distinção entre arte e não- tenham o direito de propriedade
nossos pensamentos/emoções vagos.
arte pois pode haver causa emoção estética se, e só se, arte.
sobre as suas obras
representação sem haver arte. tem forma significante.  Impossibilita a existência de arte primitiva e de
Existem contraexemplos à teoria,
arte solidária pois sustenta que não pode haver
• Exemplo: Podemos negar a  É demasiado restritiva: arte à margem de uma determinada prática
nomeadamente alguns graffitis feitos
primeira premissa que é uma É demasiado restritiva, pois exclui do socialmente instituída chamada “mundo da arte” em paredes que não pertencem aos
Há obras de arte com formas de
condicional, “Se x é arte então é domínio da arte várias correntes artistas (assim, o direito de
objetos comuns.
representa algo” artísticas. Por causa da distinção entre propriedade não é uma condição
a arte e o ofício, afirmando que a arte Se a única coisa que importa para as
A condicional expressa na primeira necessária).
religiosa, por exemplo, não é arte, pois obras de arte são as suas
premissa, “Se x é arte então é esta pretende estimular uma emoção (a propriedades formais, então arte  Objeção 3
representa algo” parece envolver devoção religiosa) no seu público. Como feita a partir de objetos comuns não Algumas formas de encarar a arte no
um problema: a representação necessariamente ligadas, exclui as seria considerada arte. Logo, as passado já não são válidas
pode ser uma condição necessária artes aleatória, conceptual e percetiva, propriedades formais de um objeto atualmente.
da arte, mas não suficiente. Se a por exemplo, as que não transmitem não são a única coisa relevante para o
representação fosse também uma nenhum tipo de emoção. estatuto de um objeto enquanto obra  Objeção 4
condição suficiente, teríamos de de arte. Implica impulsivamente que as
admitir que só a arte é capaz de falsificações são genuínas obras de
representação de algo. Ora, mas tal  Comete a “falácia intencional”

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não é verdade, o que se capta Collingwood afirma que para distinguir O conteúdo pode ser relevante arte.
facilmente com contraexemplos. arte de não-arte, o critério a ter em
Muitas vezes é impossível apreciar o
(emblemas de clubes desportivos, conta são as intenções que o artista
valor de uma obra de arte
brincadeiras de crianças aos tinha quando a produziu. No entanto,
concentrando-se apenas nas suas
médicos e enfermeiros, etc.). assim, apenas o próprio artista sabe
propriedades formais e ignorando
dizer ao certo o que pretendia ao criar
inteiramente o seu conteúdo
a sua obra. Desta forma, o auditório
representativo ou expressivo.
também não sabe ao certos o que o
artista pretende transmitir, podendo
apenas dar um palpite sobre o assunto.

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