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Caso 01.

Terras Férteis Ltda e Marciano dos Céus celebraram contrato de


arrendamento agrícola. Contudo, Marciano deixou de efetuar o pagamento das
parcelas do arrendamento. Em razão do inadimplemento, o arrendador propôs ação de
execução de título extrajudicial na qual foi penhorado um imóvel de propriedade de
Marciano. Marciano, em sede de Embargos à Execução, alegou a impenhorabilidade
do bem sob o fundamento de que é seu único imóvel, caracterizando assim bem de
família. Terras Férteis em sua manifestação postulou que fosse mantida a penhora,
afirmando que o bem está sujeito a penhora, haja vista trata-se de imóvel de elevado
valor, tendo sido avaliado, pelo Oficial de Justiça, em R$ 2.500.000,00 (dois milhões e
quinhentos mil reais); que a dívida atualizada importa em R$ 100.000,00 (cem mil
reais) e que com o produto da alienação do bem seria possível efetuar o pagamento do
débito e com o saldo possibilitaria a Marciano a aquisição de outro imóvel.
Considerando a situação hipotética, com fundamento da legislação e entendimento dos
Tribunais, responda: se é possível a penhora do imóvel de propriedade de Marciano.

RESPOSTA:
Importa acentuar que a impenhorabilidade do bem de família não é absoluta, neste
processo, observamos um bem de valor notável, o título executado corresponde somente
a 4% (quatro per cento) do valor total do imóvel. O magistrado Ademir Modesto, ao ser
relator em caso semelhante nos autos nº 2075933-13.2021.8.26.0000, aduziu sobre a
impenhorabilidade de bens de alto valor que: “fere o princípio da igualdade, porque
coloca devedores ricos e pobres em posições assimétricas, pois, enquanto os primeiros
podem concentrar toda sua fortuna num único imóvel para blindá-lo contra a penhora,
os segundo ficam sujeitos à constrição se, necessitando adquirir um segundo imóvel,
igualmente simples como aquele onde reside, visando complementar sua renda, não tem
a proteção da Lei nº 8.009/90 em relação à parte de seu patrimônio”. Ora, segundo este
entendimento, compreendemos a necessidade de relativizar a legislação, impor a
hermenêutica jurídica, dado que nessa excepcionalidade não podemos executar a lei de
maneira fria. Portanto, resta óbvio que proceder com a penhora do referido bem não
descaracterizará a importância de preservar os bens de família, pois com o restante do
valor da penhora, o executado terá liquidez o suficiente para garantir uma moradia
descente para seus dependentes, extinguindo a possibilidade de ferir a Suprema Carta
Magna e seus princípios.
A seguir, professora, a compreensão jurisprudencial do TJSP:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. BEM DE FAMÍLIA.


IMÓVEL DE VALOR VULTOSO. PENHORA.
POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL. RESERVA DE
PARTE DO VALOR AO DEVEDOR. NECESSIDADE.
VALOR QUE DEVE SER GRAVADO COM CLÁUSULA
DE
IMPENHORABILIDADE. PRESERVAÇÃO DO PATRI
MÔNIO MÍNIMO E DA DIGNIDADE HUMANA DO
DEVEDOR.
1.- A interpretação sistemática e teológica do art. 1º da Lei nº.
8.009/90, mediante ponderação dos princípios constitucionais
que informam a impenhorabilidade do bem de família e
garantem o direito de ação com duração razoável do processo, à
luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, permite
a penhora de imóvel de valor vultoso (R$ 24.000.000,00), ainda
que destinado à moradia do devedor. 2.- A penhora de bem de
família de valor vultoso, no entanto, exige que se reserve ao
devedor valor condizente com sua situação social , visando a
possibilitar-lhe a aquisição de outro i móvel para morar com
dignidade. 3.- A reserva de par te do produto da alienação do
imóvel penhorado deve ser gravada com cláusula de
impenhorabilidade, vis ando a dar cumprimento ao
disposto no art. 1º. da Lei nº. 8.009/90, conforme sua
interpretação conforme à Constituição Federal. 4.- Decisão
reformada. Agravo parcialmente provido.

Caso 02. Maria celebrou um contrato de locação de um imóvel residencial com João.
Catarina, sua melhor amiga, figurou como fiadora da relação contratual. Passados
alguns meses Maria deixou de efetuar o pagamento dos aluguéis, dando azo a
propositura de ação de despejo e cobrança. Como João não localizou nenhum
patrimônio em nome de Maria, requereu a penhora de um imóvel de Catarina.
Catarina se opôs ao pedido, alegando que o imóvel é o apartamento em que ela reside
e se trata de seu único bem imóvel, configurando assim bem de família e que, portanto,
não poderia ser penhorado.

RESPOSTA:
Cumpre salientar que a responsabilidade do fiador é subsidiária, portanto, uma vez
que não foi encontrado bens pertencentes a Maria, correta a sentença que trouxe
Catarina a execução. Ao que concerne a penhora do seu bem de família, esta deve
proceder favorável em face do Exequente, dado que, há expressa exceção de
impenhorabilidade na Lei 8.0009/90:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de


execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra
natureza, salvo se movido:
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato
de locação.

Caso 04. Ana propôs ação de execução de título extrajudicial em face de Pedro, no
valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais). Em razão de Pedro não efetuar o
pagamento do débito no prazo legal, Ana requereu a penhora de valores existentes em
nome de Pedro junto a instituições financeiras. Por meio do sistema Bacenjud foi
realizada a penhora de R$ 23.000,00 (vinte e três mil reais) que estavam depositados
em conta corrente de titularidade de Pedro. Pedro alegou a impenhorabilidade dos
valores, afirmado se tratar de salário. Considerando a situação hipotética, com
fundamento da legislação e entendimento dos Tribunais, responda se é possível a
penhora de salário:

RESPOSTA:
Segundo artigo 833 do Código de Processo Civil, inc. IV, são impenhoráveis os
salários, pois prejudicaria o executado em suas necessidades básicas, ferindo, portanto,
bases constitucionais sobre a dignidade humana. No entanto, recentemente os tribunais
têm buscado meios para contornar esse entendimento, como em alguns casos,
permitindo a penhora de pequena percentagem salarial, quando observado que o
referido montante não cause real prejuízo diante sua ausência. Vislumbre, professora, a
flexibilização da lei:

"1. A Corte Especial do STJ tem entendimento de que há


possibilidade de mitigação da impenhorabilidade absoluta
da verba salarial, desde que preservada a dignidade do
devedor e observada a garantia de seu mínimo existencial.
Precedentes: AgInt no REsp 1847503/PR e REsp 1705872/RJ.
2. Na espécie, o credor buscou bens do devedor para saldar a
dívida, inclusive mediante pesquisa via BACENJUD,
RENAJUD ERIDF e INFOJUD, sem sucesso, e, além disso, o
processo tramita por mais de 10 (dez) anos, sem que se obtenha
êxito na direção da satisfação do crédito. 2.1. Considerando-se
que a penhora no percentual de 10% (dez por cento) do salário
do devedor não tem o condão de comprometer a sobrevivência
deste e de sua família, mantendo a dignidade destes, e que o
atual entendimento firmado no âmbito do Superior Tribunal de
Justiça admite a mitigação da impenhorabilidade absoluta de
verba salarial, deve ser deferida a constrição em tal patamar."

Acórdão 1326665, 07483276520208070000, Relator: ALFEU
MACHADO, Sexta Turma Cível, data de julgamento:
10/3/2021, publicado no DJE: 26/3/2021.

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