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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ

19ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI


RUA MAUÁ, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 - E-mail: 19CC@tjpr.jus.br

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002586-83.2021.8.16.0056

APELANTE: HOT BEACH SUÍTES OLÍMPIA – EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO SPE LTDA

APELADO: OSCAR NETTO BOEING e VERGÍNIA CELESTE CENEDESE BOEING

RELATOR: DESEMBARGADOR SUBSTITUTO ANDERSON RICARDO FOGAÇA EM REGIME


DE COLABORAÇÃO, NA CADEIRA DO DESEMBARGADOR ANDREI DE OLIVEIRA RECH

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA C/C LUCROS


CESSANTES. ATRASO NA ENTREGA DE OBRA. CULPA EXCLUSIVA
DA REQUERIDA EM RAZÃO DE INADIMPLEMENTO CONTRATUAL.
MULTA CONTRATUAL. INVERSÃO. POSSIBILIDADE. LUCROS
CESSANTES – POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM MULTA
COMPENSATÓRIA – VALOR DA MULTA NÃO SE EQUIPARA AO
DOS LUCROS CESSANTES NO CASO. TEMA REPETITIVO 970 DO
STJ. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. CASO EM QUE NÃO SE
CONFIGURA DANO IN RE IPSA. MERO ATRASO NA OBRA NÃO
GERA O DANO MORAL. NECESSÁRIA A COMPROVAÇÃO DE
SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE DEMONSTRE O ABALO MORAL A
JUSTIFICAR CONDENAÇÃO DESTA NATUREZA. NÃO VERIFICADO.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. A conclusão e entrega no prazo acordado gera uma natural expectativa de


lucro, expectativa esta que prescinde de prova, já que é incontroverso o
atraso na entrega e a responsabilidade objetiva da ré.

2. Ainda que a multa esteja prevista unicamente em favor do promitente


vendedor, cabível a sua inversão de modo a indenizar o consumidor pelo
inadimplemento contratual.

3. A cumulação de multa com lucros cessantes só caracteriza o bis in idem em


caso de a multa ter um valor equivalente aos lucros cessantes, o que não é o
caso em questão.

4. O inadimplemento contratual por parte da vendedora, por si só, não pode


ser considerado fato gerador de dano moral, sendo necessária a
demonstração de sentimento de dor pessoal que ultrapasse o mero dissabor
do cotidiano.
1. RELATÓRIO

Trata-se de ação indenizatória c/c lucros cessantes proposta por OSCAR NETTO
BOEING e VERGINIA CELESTE CENEDESE BOEING em face de HOT BEACH SUITES
OLIMPIA - EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO.

Narram os autores que, em 19/10/2015, adquiriram 3 (três) frações imobiliárias de


multipropriedade da ré, sob os números HBS-M812-I, HBS-M912-E e HBS-M914-H, com previsão de
entrega em 19/10/2018, admitindo a tolerância de mais 180 dias, ou seja, o prazo máximo de entrega
seria em 19 de abril de 2019, o que não ocorreu. O pacote adquirido foi o denominado máster, que dá
direito à utilização durante 2 (duas) semanas no ano.

Alegam, ainda, os requerentes que tiveram prejuízo desde o ano de 2018, uma vez
que tinham a intenção de investir o dinheiro no imóvel para alugar suas cotas para terceiros. Em razão de
o contrato estar praticamente quitado, os requerentes não buscam a rescisão contratual, mas sim a
indenização. Objetivam, portanto, a inversão da multa contratual, o pagamento de lucros cessantes e a
indenização por danos morais.

Foi proferida sentença de procedência (mov. 80.1), na qual o juízo a quo ressaltou
que o empreendimento foi entregue para uso em junho de 2021, sendo, portanto, a mora exclusiva da ré.
Assim, a multa prevista no contrato foi invertida.

Ainda, condena a ré ao pagamento de lucros cessantes, sob a fundamentação de


que os requerentes foram impedidos de usufruir das 3 unidades imobiliárias como bem entendessem, por
duas semanas nos anos de 2019, 2020 e 2021, totalizando, portanto, 18 (dezoito) semanas a serem
indenizadas, após a liquidação da sentença.

Por fim, quanto aos danos morais, estabelece a juíza que a situação ultrapassou
mero dissabor. Assim, condena a ré ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de danos
morais.

A ré apresentou apelação alegando, primeiramente, a inexistência de lucros


cessantes, bem como questionando o valor fixado. Além disso, insurge-se quanto à inversão da cláusula
penal, uma vez que não há previsão contratual. Ainda, afirma que, em caso de condenação ao pagamento
da multa, não se pode condenar em lucros cessantes, pois configuraria bis in idem.

Por fim, alega que não há o dever de indenização por danos morais, uma vez que
não há dano à moral, à imagem ou à dignidade dos requerentes. Subsidiariamente, requer a diminuição
do valor da condenação a título de danos morais, tendo em vista a razoabilidade e proporcionalidade.

Apresentadas as contrarrazões, vieram-me os autos.

É o que se tinha para relatar.

2. FUNDAMENTAÇÃO
Mediante análise dos autos, vislumbra-se que os requisitos intrínsecos e extrínsecos
de admissibilidade recursal estão presentes no recurso, motivo pelo qual dele conheço.

2.1 DOS LUCROS CESSANTES

Quanto aos lucros cessantes, a apelante afirma que apesar de os autores terem
mencionado na inicial que adquiriram as frações de tempo do imóvel para obter proveito econômico,
todas as reservas por eles feitas até então foram destinadas ao uso próprio. Ressalta que não se pode
alugar a terceiros por conta própria, sendo necessária a disponibilização ao pool hoteleiro, o que nunca
foi feito pelos autores.

Afirma, ainda, que o valor da indenização pelos aluguéis que poderiam ter recebido
foi calculado com base no apresentado pela parte autora, ou seja, as diárias praticadas pela ré (R$
1.900,50), porém, esse valor não pode prosperar, já que devem ser abatidas algumas despesas.

No entanto, em caso de manutenção da condenação em lucros cessantes, afirma


que o período considerado não pode contabilizar o ano de 2021, já que os autores usufruíram do imóvel
nesse ano. Aduz que o atraso na entrega do imóvel só pode alcançar o período ao qual o proprietário tem
direito, ou seja, duas semanas por ano – totalizando 6 semanas no total, uma vez que são 3 unidades
imobiliárias. Assim, em vez de 18 semanas, como na sentença, devem ser consideradas somente 12
semanas para indenização, referentes aos anos de 2019 e 2020.

Em suma, são feitos três questionamentos: quanto à validade da condenação por


lucros cessantes; quanto ao valor fixado em sentença; e quanto à inclusão do ano de 2021 na condenação.

2.1.1 Quanto à possibilidade da condenação

Primeiramente, quanto à possibilidade da condenação, entendo que os argumentos


da apelante não merecem prosperar. No caso em questão, o atraso na entrega do imóvel impossibilitou os
autores de lucrarem com o aluguel da sua fração imobiliária, independentemente do método de realização
(uso próprio ou cessão ao pool hoteleiro). Nos termos do art. 402 do Código Civil, “as perdas e danos
devidos ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de
lucrar”.

Ainda, em relação a contratos de promessa de compra e venda, a jurisprudência do


STJ é firme no sentido de que, “descumprido o prazo para a entrega do imóvel, o prejuízo do comprador
é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento dos lucros cessantes.
Esse entendimento, inclusive, vem sendo aplicado por este Colegiado aos casos de atraso na entrega de
lote não edificado” (AgInt no REsp 1818212/SP, Rel.: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, T3 -
TERCEIRA TURMA, julgado em: 22/03/2021, DJe 25/03/2021).

O fato de os autores terem usufruído do imóvel em momento posterior para uso


próprio não impede o pagamento de lucros cessantes, uma vez que esse fato não demonstra, por si só, que
os autores não teriam alugado o imóvel nos anos anteriores.
A jurisprudência desta Corte tem acatado os pleitos de indenização em lucros
cessantes em casos como o presente, uma vez que, constatada a mora por parte da construtora, o prejuízo
do comprador e o direito ao ressarcimento são presumidos, configurando-se a denominada “perda de uma
chance”.

A conclusão e entrega no prazo acordado gera uma natural expectativa de lucro,


expectativa esta que prescinde de prova, já que é incontroverso o atraso na entrega e a responsabilidade
objetiva da ré. Assim, entendo que é possível a condenação em lucros cessantes.

2.1.2 Quanto ao valor da condenação

Quanto ao valor exato da condenação, não conheço do recurso no ponto. Isso


porque a recorrente questiona em apelação o cálculo de valores apresentados pela parte autora na inicial,
e não algo que consta na sentença. Isso porque a referida decisão não fixa um valor exato de indenização
- quanto à condenação por lucros cessantes, o juízo decidiu no seguinte sentido:

“Considerando serem 3 (três) unidades imobiliárias diversas, tem-se que os


autores tiveram perda de 6 (seis) semanas em cada ano, o que totaliza 18 (dezoito)
semanas nos 03 anos (2019, 2020 e 2021). Esse é o período que deve ser
indenizado pelo réu aos autores, após, liquidação de sentença.”

Como se pode verificar, não há valor fixado, devendo os cálculos serem feitos após
liquidação de sentença. Ressalte-se, ainda, que em sede de contestação a ré nada questionou acerca dos
valores apresentados na inicial.

2.1.3 Quanto à indenização referente a 2021

Por fim, em caso de manutenção da condenação, a ré questiona o pagamento de


indenização referente ao ano de 2021, uma vez que, conforme consta em seus sistemas internos, os
apelados usufruíram do imóvel nesse ano.

Da análise dos documentos anexados aos autos, verifica-se que, de fato, os autores
possuíam reservas para utilizar os 3 imóveis entre o final de novembro e início de dezembro do ano de
2021. Apesar de os apelados alegarem a preclusão da produção de prova nesse ponto, consta na
contestação a comprovação da reserva realizada, e não somente na apelação.

A apresentação da reserva para o referido período já demonstra que o ano de 2021


não é passível de indenização. Ora, conforme exposto acima, a indenização por lucros cessantes se
fundamenta na perda de uma chance, o que não ocorreu no ano de 2021. Ainda que o empreendimento
tenha sido entregue somente na metade do ano, ainda restou um período de aproximadamente 6 meses
para utilização, seja para uso próprio ou para locação a terceiros. Dessa forma, não há a necessidade de se
comprovar a efetiva utilização do imóvel, mas a simples possibilidade de se realizar a reserva já
demonstra que seria possível a locação do imóvel, se assim os apelados desejassem.
Dessa forma, acolho o pedido subsidiário do apelante, para o fim condená-lo ao
pagamento de indenização por lucros cessantes referentes apenas aos anos de 2019 e 2020, totalizando,
portanto, 12 semanas (6 semanas para cada ano).

Ressalte-se que essa condenação deve ser equivalente ao que os requerentes


efetivamente receberiam em caso de locação a terceiros através de disponibilização dos imóveis ao pool
hoteleiro, o que não corresponde, necessariamente, às diárias praticadas pela requerida, na medida em
que há tarifas e despesas que são cobradas ao disponibilizar o imóvel para o pool, não correspondendo ao
valor das diárias efetivamente pagas pelos usuários. O valor deve ser liquidado em fase de execução de
sentença.

2.2 DA INVERSÃO DA MULTA

A sentença acolheu o pedido da parte autora para inversão da multa fixada em


contrato. Assim, condenou a ré ao pagamento de multa compensatória de 2% ao mês, sobre o valor da
fração ideal do imóvel, desde o momento em que foi efetivado o atraso na entrega até o momento da
expedição do habite-se.

Insurge-se a apelante afirmando que há previsão contratual de multa apenas para a


hipótese de inadimplência dos promissários compradores. Ainda, a apelante afirma que, havendo a
condenação ao pagamento da multa, não se pode haver a condenação por lucros cessantes, a fim de se
evitar o bis in idem.

Ocorre que o STJ, ao julgar os Recursos Especiais nº 1.635.428/SC e 1.498.484


/DF, firmou o entendimento de que, em caso de inadimplemento (absoluto ou relativo), se houver
omissão do contrato, cabe a inversão da cláusula penal (moratória ou compensatória) que prevê multa
exclusivamente em benefício da promitente vendedora do imóvel. Assim, mostra-se abusiva a prática de
estipular cláusula penal exclusivamente ao consumidor, para a hipótese de mora ou de inadimplemento
contratual absoluto, ficando isento de tal reprimenda o fornecedor em situações de análogo
descumprimento da avença; Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. COMPRA E


VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. ATRASO NA ENTREGA. NOVEL LEI N.
13.786 /2018. CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES ANTERIORMENTE À
SUA VIGÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. CONTRATO DE ADESÃO. OMISSÃO DE
MULTA EM BENEFÍCIO DO ADERENTE. INADIMPLEMENTO DA
INCORPORADORA. ARBITRAMENTO JUDICIAL DA INDENIZAÇÃO,
TOMANDO-SE COMO PARÂMETRO OBJETIVO A MULTA ESTIPULADA EM
PROVEITO DE APENAS UMA DAS PARTES, PARA MANUTENÇÃO DO
EQUILÍBRIO CONTRATUAL. 1. A tese a ser firmada, para efeito do art. 1.036 do
CPC/2015, é a seguinte: No contrato de adesão firmado entre o comprador e a
construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o
inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da
indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas
(obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento
judicial. 2. No caso concreto, recurso especial parcialmente provido. (REsp
1614721/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO,
julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

Assim, mesmo que a multa esteja prevista unicamente em favor do promitente


vendedor, cabível a sua inversão de modo a indenizar o consumidor pelo inadimplemento contratual.

Ainda, quanto à cumulação da multa com os lucros cessantes, o STJ definiu, no


mesmo julgamento em sede de recursos repetitivos supracitado, que não se pode cumular quando o valor
da multa for equivalente ao valor do aluguel, ou seja, a multa fixada deve ser mensal, em um valor que se
equipare aos lucros cessantes.

Nos termos da tese firmada no Tema 970, “A cláusula penal moratória tem a
finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, estabelecida em valor
equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes”.

Ainda, no julgamento do referido tema, consta no voto do Exmo. Relator Min. Luis
Felipe Salomão o seguinte:

Nessa linha de intelecção, diante de alentado estudo apresentado em palestra


proferida no auditório do STJ, em 25/4/2018, a douta Ministra Maria Isabel
Gallotti, pontuou, in verbis:

Aqui também se põe a mesma observação: a definição da tese há de levar em


consideração a natureza da cláusula penal e não apenas o rótulo a ela dado no
contrato. Se a cláusula penal incide todos meses, tendo como base de cálculo o
valor do total do contrato, vale dizer, o valor do imóvel, é certo que se destina a
coibir a mora da empresa na entrega do imóvel, mas também compensa o prejuízo
sofrido mensalmente com a privação do uso do imóvel, cujo valor locatício, como
é notório, não ultrapassa no mercado, em regra, de 0,5% a 1% ao mês do valor do
bem.

Diversa é a situação de multa moratória incidindo sobre o valor total do bem,


mas apenas uma única vez, quando, então, naturalmente, não compensará a
despesa (ou a perda da fruição) mensal do consumidor em decorrência do não
cumprimento do prazo de entrega.

[...]

Deveras, embora o mais usual seja a previsão de incidência de multa por mês de
atraso, é inegável que há casos em que a previsão contratual de multa limita-se a
um único montante ou percentual para o período de mora (por exemplo, multa
de 2% do preço do imóvel, atualizado pelos mesmos índices contratuais), que
pode ser insuficiente à reparação integral do dano (lucros cessantes) daquele que
apenas aderiu ao contrato, como orienta o princípio da reparação integral (art.
944 do CC) e os arts. 389, 395 e 403 do CC.

Nessa hipótese, segundo penso, em nome da própria preservação da segurança


jurídica, não parece, à luz do disposto no art. 416 do CC, que ambas as partes da
relação contratual possam meramente ignorar a cláusula penal moratória
convencionada prefixando os danos regulares do cumprimento imperfeito da
obrigação, visto que "a segurança das relações jurídicas depende da lealdade, da
equivalência das prestações e contraprestações, da confiança recíproca, da
efetividade dos negócios jurídicos, da coerência e clarividência dos direitos e
deveres" (RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.
32).

Dessa forma, conforme fundamentação exposta, só caracteriza o bis in idem em


caso de a multa ter um valor equivalente aos lucros cessantes, o que não é o caso em questão.

Se total da multa devida pela ré fosse equivalente ao que consta no contrato para os
autores, ela seria de 2% ao mês sobre o valor da fração ideal, desde o início da mora até a entrega do
imóvel. Da análise da sentença, no entanto, a condenação à multa foi no importe de R$ 3.840,75, valor
este retirado da petição inicial.

Da análise da planilha de débito da inicial (mov. 1.1, pág. 10), o cálculo feito pelos
autores para chegar a essa quantia foi de 2% sobre a fração ideal de cada imóvel, atualizado até 2021,
porém, uma única vez. Isso significa que foi aplicada a multa apenas uma vez, somente no primeiro mês
de atraso, em vez de incidir a cada mês.

Assim, entendo que o valor fixado não equivale aos lucros cessantes, sendo
possível a cumulação de ambas as condenações. Esse é o entendimento desta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/ INDENIZAÇÃO.


COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSOS DE AMBAS AS
PARTES. –1 – RECURSO DAS RÉS. (1.1) REQUERIMENTO DE EXTINÇÃO DO
FEITO PARA HABILITAÇÃO DO CRÉDITO NOS AUTOS DA AÇÃO DE
RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE UMA DAS EMPRESAS DEMANDADAS.
QUESTÃO DECIDIDA ANTERIORMENTE E NÃO IMPUGNADA DE FORMA
ADEQUADA. PRECLUSÃO. APELO NÃO CONHECIDO NO PONTO. (1.2)
INSURGÊNCIA QUANTO À CONDENAÇÃO A RESTITUIR VALORES
DECORRENTES DE FINANCIAMENTO. QUESTÃO QUE NÃO FOI
ABORDADA NOS AUTOS. CONDENAÇÃO INEXISTENTE. AUSÊNCIA DE
INTERESSE RECURSAL. RECURSO NÃO CONHECIDO TAMBÉM NESSA
PARTE. (1.3) LUCROS CESSANTES PRESUMIDOS EM FACE DA
IMPOSSIBILIDADE DE OS COMPRADORES USUFRUIREM DO BEM.
PRECEDENTES. INDENIZAÇÃO QUE É DE RIGOR. SENTENÇA MANTIDA.
[...] (2.3) INVERSÃO DA CLÁUSULA PENAL. SENTENÇA INFRA PETITA.
NULIDADE RECONHECIDA. JULGAMENTO IMEDIATO DA MATÉRIA
(ARTIGO 1.013, 3º, III, DO CPC). POSSIBILIDADE DE INVERSÃO. TESE
FIXADA EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO (RESP N.º 1.614.721
/DF). CONTRATO QUE PREVIA MULTA DE 2% SOBRE O VALOR
INADIMPLIDO PELOS COMPRADORES E JUROS DE 1% AO MÊS.
CUMULAÇÃO COM LUCROS CESSANTES PERMITIDA DESDE QUE O
VALOR DA MULTA NÃO CORRESPONDA OU ULTRAPASSE O VALOR DO
LOCATIVO. CÁLCULO DA MULTA QUE RESULTARIA EM ZERO, NA
MEDIDA EM QUE OS COMPRADORES NADA DEVEM. PEDIDO EXPRESSO
NO SENTIDO DE QUE OS JUROS DE 1% AO MÊS INCIDISSEM ATÉ A
CONCLUSÃO DA OBRA. PEDIDO QUE RESTOU PREJUDICADO ANTE A
CONVERSÃO DA OBRIGAÇÃO EM PERDAS E DANOS. CASO CONCRETO EM
QUE NÃO HAVERIA INTERESSE DOS AUTORES NESSE PONTO. PLEITO
JULGADO IMPROCEDENTE. (2.4) DANOS MORAIS. ALEGAÇÃO DE FATOS
QUE NÃO PODEM SER IMPUTADOS ÀS RÉS, E, NO MAIS, PEDIDO
GENÉRICO. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. [...] (TJPR - 17ª Câmara Cível -
0024943-72.2014.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR FERNANDO
PAULINO DA SILVA WOLFF FILHO - J. 21.03.2022)

Pelo exposto, nego provimento ao pedido da apelante mantendo a inversão da


multa e a sua cumulação com os lucros cessantes.

2.3 DO DANO MORAL

Quanto ao dano moral, a sentença condena a apelante ao pagamento de R$


8.000,00 (oito mil reais), afirmando que a situação ultrapassa mero dissabor. A apelante afirma que o
prejuízo decorrente do inadimplemento do contrato não gera dano à moral, à imagem ou à dignidade de
alguém.

Muito embora o fato de que o simples descumprimento contratual não provoca


danos morais indenizáveis, ou seja, não é presumido nos casos de atraso na entrega da obra, no
entendimento do STJ, ele pode ser configurado quando “houver circunstâncias excepcionais que,
devidamente comprovadas, importem significativa e anormal violação a direito da personalidade dos
promitentes-compradores.” (AgInt no REsp 1901862/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA
TURMA, julgado em 13/12/2021, DJe 17/12/2021).

Na hipótese dos autos, contudo, em razão de não ter sido invocado nenhum fato
extraordinário que tenha ofendido o âmago da personalidade dos recorrentes, não há que se falar em
abalo moral indenizável. Da análise dos autos, tanto em sede de contrarrazões quanto na inicial, os
autores resumem-se a defender que o dano moral no caso é presumido, decorrente do próprio
inadimplemento, ou seja, não demonstram situação concreta que tenha gerado um grave abalo moral.

É entendimento desta Corte que o mero inadimplemento contratual não gera danos
morais passíveis de reparação, ou seja, não se trata de dano moral in re ipsa, havendo necessidade de ser
demonstrado fato extraordinário que afete direito da personalidade, o que, ressalto, não se verificou no
presente caso.

Com efeito, embora seja presumível que os autores tinham o forte desejo de
receber o imóvel na data contratada, não consta dos autos nenhuma prova de que o inadimplemento
contratual tenha causado transtornos que excedam a esfera patrimonial.

Assim, o atraso na entrega do imóvel caracteriza apenas inadimplemento


contratual, não sendo presumido o dano moral.

É a jurisprudência desta Corte:

AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C REPARAÇÃO DE DANOS


MATERIAIS E MORAIS. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.
PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO.
RESPONSABILIDADE CIVIL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
APELAÇÃO CÍVEL (1). INSURGÊNCIA DO AGENTE FINANCEIRO.
RESPONSABILIDADE CIVIL RECONHECIDA PELOS DANOS CAUSADOS AO
CONSUMIDOR. ATUAÇÃO COMO EXECUTOR DE POLÍTICA
HABITACIONAL DO PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA JUNTO À CONSTRUTORA. DEVER DE
RESTITUIR VALORES ANTE A RESCISÃO CONTRATUAL COM O RETORNO
DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL.
MERO ATRASO NA OBRA NÃO GERA O DANO MORAL. NECESSÁRIA A
COMPROVAÇÃO DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE DEMONSTRE O
ABALO MORAL A JUSTIFICAR CONDENAÇÃO DESTA NATUREZA. NÃO
VERIFICADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO parcialmente. [...]. (TJPR
- 6ª Câmara Cível - 0023084-94.2019.8.16.0017 - Maringá - Rel.: CLAUDIO
SMIRNE DINIZ - J. 15.08.2022)

APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO CIVIL. CIVIL. CONSUMIDOR. ATRASO NA


ENTREGA DA OBRA. “AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL E RESTITUIÇÃO
DE VALORES PAGOS COM TUTELA DE URGÊNCIA C/C INDENIZAÇÃO POR
DANOS MORAIS”. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA APENAS PARA
DECLARAR A RESCISÃO CONTRATUAL. PRETENSÃO DE REFORMA DA
SENTENÇA PARA QUE SEJA DETERMINADA A DEVOLUÇÃO DOS VALORES
QUE TERIAM SIDO PAGOS – IMPOSSIBILIDADE – PROVA DOS AUTOS QUE
É INSUFICIENTE PARA CONSTATAR OS VALORES QUE O AUTOR TERIA
PAGADO À APELADA – COMPROVANTES APRESENTADOS QUE FAZEM
REFERÊNCIA A MODO DE PAGAMENTO, DATA E PESSOAS DISTINTAS DO
QUE AFIRMADO PELO AUTOR – SENTENÇA MANTIDA NESTE PONTO.
DANOS MORAIS – PEDIDO DE CONDENAÇÃO DA PARTE RÉ PELOS
DANOS MORAIS CAUSADOS AO APELANTE PELO ATRASO NA
ENTREGA DO IMÓVEL – HIPÓTESE QUE NÃO SE TRATA DE DANO
MORAL IN RE IPSA – NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO MÍNIMA
DOS DANOS ALEGADOS – PARTE AUTORA QUE NÃO SE DESINCUMBIU
DE SEU ÔNUS – DANOS MORAIS INDEVIDOS. FIXAÇÃO DE
HONORÁRIOS RECURSAIS. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 9ª Câmara
Cível - 0001827-21.2018.8.16.0058 - Campo Mourão - Rel.: DESEMBARGADOR
ROBERTO PORTUGAL BACELLAR - J. 14.08.2022)

Como descrito, no caso dos autos, embora tenha havido o descumprimento


contratual por parte da ré, os autores não se desincumbiram de seu ônus probatório do efetivo dano
ocorrido. Não havendo a comprovação de circunstância excepcional que resulte em abalo moral
indenizável, reformo a sentença neste ponto.

Diante do exposto, não restou demonstrada a ocorrência do dano moral, bem como
ficou estabelecido que é possível a inversão da multa contratual, afastando, porém, sua cumulação com
lucros cessantes.

Assim, voto pela reforma parcial da sentença a quo nos termos da fundamentação
exposta.

Uma vez que a sentença foi parcialmente reformada

2.4 DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS

Diante do parcial provimento do recurso, os honorários advocatícios fixados em


primeiro grau devem ser alterados. Extrai-se da sentença que o apelante havia sido condenado ao
pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios devidos ao patrono da
parte autora de 12% sobre o valor atualizado da condenação.

Pela sucumbência recíproca em sede recursal, cada parte deverá arcar com uma
parcela das custas processuais proporcional à sua sucumbência. Uma vez que os lucros cessantes foram
mantidos, porém com valor diminuído em 1/3, e os danos morais foram reformados totalmente, a
apelante deverá arcar com 60% e os apelados com 40% das custas e despesas processuais.

Ademais, quanto à verba honorária, a apelante deverá pagar ao advogado da parte


adversa o valor de 12% sobre a sua sucumbência, ou seja, sobre os lucros cessantes relativos aos anos de
2019 e 2020 somados à multa aplicada ao caso.
Ainda, os apelados deverão pagar ao advogado da parte adversa o valor de 12%
sobre a sua sucumbência, ou seja, sobre os lucros cessantes do ano de 2021 somados ao dano moral
revogado (R$ 8.000,00 – oito mil reais).

3. DISPOSITIVO

Diante do exposto, VOTO por CONHECERe DAR PARCIAL PROVIMENTO


ao recurso de Apelação de HOT BEACH SUÍTES OLÍMPIA – EMPREENDIMENTO
IMOBILIÁRIO SPE LTDA, para o fim de reformar a sentença para estabelecer que os lucros cessantes
deverão incidir nos anos de 2019 e 2020, bem como para excluir a condenação em indenização por dano
moral em favor dos autores da ação, mantendo, no mais, a sentença, nos termos da fundamentação.

4. ACÓRDÃO

Nesse sentido, acordam os Desembargadores da 19ª Câmara Cível do


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em JULGAR
CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO o recurso de HOT BEACH SUITES
OLIMPIA - EMPREENDIMENTO IMOBILIARIO SPE LTDA.

O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador José Hipólito Xavier


Da Silva, sem voto, e dele participaram o Desembargador Substituto Anderson Ricardo
Fogaça (relator), Desembargador José Américo Penteado De Carvalho e Desembargador
Domingos José Perfetto.

16 de maio de 2023

ANDERSON RICARDO FOGAÇA

RELATOR

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