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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DA

COMARCA DE ITABORAÍ/RJ.

Processo nº.

já qualificados nos autos da ação em epígrafe, ora intermediados por sua mandatária,
vem, com o devido respeito a Vossa Excelência, com suporte no art. 278, parágrafo único, art.
525 inc. IV, art. 832 e art. 833, inc. I, todos do CPC c/c art. 1º. da Lei nº 8009/90, ofertar a
presente:

IMPUGNAÇÃO À PENHORA

em razão das justificativas de direitos e de fato, abaixo evidenciadas.

Preliminarmente, insta consignar que a impenhorabilidade do bem de família é matéria


de ordem pública; portanto, tal arguição pode ser oposta em qualquer instância, juízo ou
tribunal, por meio de simples petição ou pelos meios incidentais até o exaurimento da execução.

I – ASPECTOS FÁTICOS

Em face do débito exequendo, a penhora solicitada pelo impugnado às fls. 203 fora
deferida ante a r. decisão de fls. 208, de titularidade do impugnante. Esse bem fora adquirido
em de junho de 2006, consoante se extrai da certidão de registro de imóveis carreada em ID
45.

Esse bem, para além disso, é utilizado como sua residência única, bem assim como
entidade familiar.

Sem dúvida, trata-se de bem impenhorável.

II – NO ÂMAGO
3.1. Da ilegalidade da constrição judicial

Com esta impugnação ao cumprimento da decisão de fls.208, busca-se afastar a


constrição do imóvel objeto da matrícula nº. 31450 do Cartório de Registro de Imóveis desta
Comarca.

O Impugnante, de pronto, apresenta documentos que os apresenta como possuidor e


titular direto daquele bem, máxime por meio das faturas de cobrança de luz, água e telefone,
com diferentes datas e períodos, todas enviadas ao endereço do imóvel questionado.

Do outro lado, constata-se, mediante certidões cartorárias, que o bem indicado à


penhora é o único imóvel que lhe pertence.

Desse modo, inconfundível que possa haver a penhora do bem de família e, por esse
motivo, há de ser declarada nula, máxime por afronta ao art. 833, inc. I, do CPC e art. 1º da Lei
8.099/90. Com efeito, encontra-se sobejamente comprovado que o imóvel constrito é o único
de propriedade do executado, ora Impugnante.

Ademais, serve como utilidade pela entidade familiar, para moradia permanente, nos
exatos termos da Lei nº. 8.009/90 (art. 1º). Por esse ângulo, deve ser reconhecida sua
impenhorabilidade vez que se mostra como bem de família.

Em texto de clareza solar, estabelece a Lei 8009/90 que:

Lei nº. 8.009/90


Art. 1º - O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é
impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal,
previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos
que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei.

Portanto, a norma regente da matéria preceitua que, mesmo diante de crédito de natureza
existencial, como ocorre com o crédito trabalhista, há resistência ante valores de igual ou maior
magnitude, como a proteção constitucional à casa, abrigo inviolável do cidadão, espaço de
proteção à família. Esse diploma legal, com dito, trata de proteger valores sociais, tais como os
aludidos ao direito à moradia e à manutenção da unidade familiar. (CF/88, arts. 6º e art. 226 e
parágrafos).

Não se descure, no ponto, o magistério de Haroldo Lourenço, quando professa, ad


litteram:
42.5.4. Bem de família legal (Lei 8.009/1990) A Lei 8.009/1990 instituiu a
impenhorabilidade do imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar,
não respondendo por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária
ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus
proprietários e nele residam, ressalvadas as hipóteses dos arts. 3º e 4º da mencionada
lei. Considera-se residência, para os efeitos de impenhorabilidade, um único imóvel
utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente (art. 5º). A
Lei 8.009/1990 não abordou, expressamente, se tal impenhorabilidade engloba o
único imóvel residencial de elevado valor. Com a reforma de 2006, tentou-se, sem
êxito, mudar essa realidade, como se extrai do veto realizado no art. 650, parágrafo
único, do CPC/1973. Buscou-se instituir uma penhorabilidade no imóvel acima de
1.000 salários mínimos, devolvendo-se o equivalente a 1.000 salários mínimos para
o devedor, sob cláusula de impenhorabilidade. A doutrina, de maneira unânime,
critica tal veto, pois a alteração consagraria uma guinada axiológica importante no
direito brasileiro. O STJ, contudo, mantém o entendimento de que não há restrições
sobre o valor do imóvel do bem de família, podendo ser luxuoso ou de alto padrão,
ressalvando a hipótese de penhora de parte do imóvel, caracterizado como bem de
família, quando for possível o desmembramento sem sua descaracterização A lei
protege a entidade familiar, devendo seu conceito ser interpretado de maneira ampla,
pois o STF, na conclusão do julgamento da ADPF 132 e ADIN 4277, interpretando,
conforme a Constituição Federal, o art. 1.723 da CC/2002, excluiu qualquer
significado que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo
como entidade familiar. [ ... ]

De mais a mais, consoante a dicção do Estatuto de Ritos:

Art. 833. São impenhoráveis:


I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;

Portanto, é forçoso concluir que o imóvel gravado de penhora não


integra o patrimônio do devedor, ora segundo embargado, apesar de ser possível que
permaneça em sua posse.

Como é cediço, a propriedade resolúvel é aquela que está sujeita a


uma condição resolutória (arts. 127 e 128 do Código Civil). Assim, até que
verificada tal condição, a propriedade sobre o bem é do credor fiduciário, e não
do devedor.

Não é outro o entendimento consolidado no Tribunal de Regional do Trabalho


da 3ª Região. Senão vejamos:
EMENTA: PENHORA DE BEM IMÓVEL ALIENADO FIDUCIARIAMENTE.
IMPOSSIBILIDADE. A alienação fiduciária de bem imóvel é regida pela Lei nº 9.514/97 que,
em seu artigo 22, dispõe que a alienação fiduciária "é o negócio jurídico pelo qual o devedor,
ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da
propriedade resolúvel de coisa imóvel.". O bem alienado fiduciariamente deixa de
integrar o patrimônio do devedor, que sobre ele mantém somente a posse direta;
é o credor fiduciário que figura na relação jurídica como autêntico proprietário
do bem, possuindo o seu domínio resolúvel até a quitação total da dívida
contraída. Portanto, sua penhora é inadmissível, porque afeta direito de
propriedade de terceiro, situação que não se altera com o pedido de penhora sobre direitos
que a executada teria em face do referido contrato.

(TRT da 3.ª Região. Processo n.º 0141200-79.2008.5.03.0042 AP. Órgão


Julgador: Nona Turma. Relator: Convocado Alexandre Wagner de Morais Albuquerque.
Publicação: 01/08/2018)

EMENTA: BEM ALIENADO FIDUCIARIAMENTE. PENHORA INTEGRAL OU


PARCIAL. CONSTRIÇÃO PRESENTE OU FUTURA NO CURSO DE FINANCIAMENTO
BANCÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. O bem adquirido em alienação fiduciária em
garantia não pertence ao devedor fiduciante até a quitação total do
financiamento junto ao credor fiduciário, motivo pelo qual se torna impossível a
penhora de direito não pertencente ao executado. Tal vedação irradia-se mesmo em
face das prestações já pagas ou dos incertos e futuros direitos decorrentes de eventual excussão
do bem, promovida pelo banco fiduciário, em caso de mora ou inadimplemento contratual do
devedor fiduciante, ora executado.

(TRT da 3.ª Região. Processo n.º 0006100-32.2001.5.03.0032 AP. Órgão


Julgador: Terceira Turma. Relator: Camilla G.Pereira Zeidler. Publicação: 01/06/2018)

INDISPONIBILIDADE. BEM IMÓVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM


GARANTIA. O credor fiduciário figura na relação jurídica como autêntico
proprietário do bem, possuindo o seu domínio resolúvel em desfavor do devedor
até a quitação total da dívida contraída, quando então este último adquire a
propriedade. Assim, não se revela viável a pretensa penhora sobre bem alienado
fiduciariamente, pois ele não integra o patrimônio do executado.

(TRT da 3.ª Região. Processo n.º 0011496-19.2017.5.03.0035 AP. Órgão


Julgador: Setima Turma. Relator: Cristiana M. Valadares Fenelon. Data de Julgamento: 19 de
abril de 2018)

RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. OMISSÃO


DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INEXISTÊNCIA. PENHORA DE DIREITOS DO
DEVEDOR SOBRE IMÓVEL GRAVADO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM
GARANTIA. IMÓVEL DE ALTO PADRÃO. IRRELEVÂNCIA. APLICAÇÃO DA
REGRA DA IMPENHORABILIDADE. POSSIBILIDADE. RECURSO
DESPROVIDO. 1. A discussão versa em saber se os direitos econômicos do devedor
fiduciante sobre o imóvel objeto do contrato de alienação fiduciária em garantia
podem receber a proteção da impenhorabilidade do bem de família em execução de
título extrajudicial (contrato de confissão de dívida) promovido por terceiro. 2. Nos
termos do art. 1.022 , I , II e III , do CPC/2015 , destinam-se os embargos de
declaração a expungir do julgado eventual omissão, obscuridade ou contradição, ou
ainda a corrigir erro material, não se caracterizando via própria ao julgamento da
causa. 3. Segundo a orientação jurisprudencial desta Corte, para efeito da proteção do
art. 1º da Lei n. 8.009 /1990, basta que o imóvel sirva de residência para a família do
devedor, sendo irrelevante o valor do bem. Isso porque as exceções à regra de
impenhorabilidade dispostas no art. 3º do referido texto legal não trazem nenhuma
indicação nesse sentido. Logo, é irrelevante, a esse propósito, que o imóvel seja
considerado luxuoso ou de alto padrão. 4. A intenção do devedor fiduciante, ao
oferecer o imóvel como garantia ao contrato de alienação fiduciária, não é, ao fim e
ao cabo, transferir para o credor fiduciário a propriedade plena do bem, diversamente
do que ocorre na compra e venda, mas apenas garantir o adimplemento do contrato
de financiamento a que se vincula, objetivando que, mediante o pagamento integral
da dívida, a propriedade plena do bem seja restituída ao seu patrimônio. 5. Por isso,
em se tratando do único imóvel utilizado pelo devedor fiduciante ou por sua família,
para moradia permanente, tais direitos estarão igualmente protegidos como bem de
família, em ação de execução movida por terceiro estranho ao contrato garantido
por alienação fiduciária, razão pela qual, enquanto vigente essa condição, sobre
ele deve incidir a garantia da impenhorabilidade a que alude o art. 1º da Lei 8.009
/1990. 6. No caso, sendo o recorrido possuidor direto do imóvel dado em garantia do
contrato de alienação fiduciária firmado para aquisição do próprio imóvel e
constatado pelo Tribunal de origem que o bem destina-se à residência do executado e
de sua família, há de ser oposta ao terceiro exequente a garantia da impenhorabilidade
do bem de família, no que tange aos direitos do devedor fiduciário. 7. Recurso especial
desprovido. STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 1726733 SP 2017/0239594-2 .
Jurisprudência • Acórdão • Data de publicação: 16/10/2020.

E, sem prejuízo, se dúvidas restarem acerca das alegações e comprovações acostadas,


poderá o Sr. Oficial de Justiça diligenciar ao imóvel para vistoriá-lo e constatar que se trata, ali,
de imóvel residencial onde reside o Executado e sua família. E, desde o presente momento,
anui o Executado e requer a expedição de mandado de constatação.

Corroborando a tese de impenhorabilidade do bem de família, por se tratar de matéria


expressamente disposta em Lei Federal, eis os ensinamentos do professor César Fiúza:

“O objetivo do legislador foi o de garantir a cada indivíduo, quando nada, um teto


onde morar mesmo que em detrimento dos credores. Em outras palavras, ninguém
tem o direito de jogar quem quer que seja na rua para satisfazer um crédito. Por isso
o imóvel residencial foi considerado impenhorável. Trata-se aqui, do princípio da
dignidade da pessoa humana. O valor personalidade tem preeminência neste caso,
devendo prevalecer em face de um direito de crédito inadimplido.”

Oportuno ressaltar-se, a importância que o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana


assume no ordenamento jurídico, devendo-se estendê-lo não como forma supletiva das lacunas
da lei, mas sim como fonte normativa, apta a exercer sua imperatividade e cogência nas relações
jurídicas.

Conclui-se, portanto, Nobre Magistrado, que o processo de execução não deve servir
como instrumento de flagelo do devedor, posto que lhe deva ser assegurado os direitos básicos
outorgados pela lei, como o direito à moradia e, principalmente, o direito a gozar de vida digna,
o que se restabelecerá, no caso presente, desconstituindo-se o ato pelo qual foi constrito o bem
de família, na medida em que se afigura direito indisponível.

Como se infere ante a tudo quanto exposto, o prosseguimento da hasta implicará na


realização de medidas que tornarão definitiva a expropriação do único imóvel de família
pertencente ao Executado, no qual reside com sua família.

Portanto, suplica o Executado para que Vossa Excelência digne-se apreciar a matéria
bem como as provas acostadas aos autos e determine a diligência de oficial de justiça, para que
seja reconhecido o bem de família e consequentemente deferido o cancelamento da penhora
sobre este bem onde reside com a família.

Desta feita, ante tudo quanto exposto, resplandece a impenhorabilidade do bem de


família, com base no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, sendo assim, o pedido do
Executado é TOTALMENTE PROCEDENTE.

III - DO PEDIDO

Por todo o exposto, requer-se:

1. A expedição de mandado de vistoria a ser cumprido por Oficial de Justiça;

2. Requer seja a presente pretensão DEFERIDA para o fim de obter o cancelamento definitivo
da penhora realizada no imóvel objeto da matrícula nº. 31450, do Cartório de Registro de
Imóveis da Comarca de Itaboraí/RJ.
Rio Bonito, 29 de janeiro de 2024.

Nesses termos, pede deferimento.


JULIANA CARVALHO DA SILVA RODRIGUES
OAB/RJ 196.907

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