Você está na página 1de 11

ACESSIBILIDADE E MOBILIDADE URBANA UMA VIA SUSTENTÁVEL

(1) Leonardo Pinto de Oliveira,

(2) Oscar Ferreira

(1) Pesquisador, Professor de Arquitetura e Urbanismo do UniCEUB, Doutor, Faculdade de


Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, Laboratório de Sustentabilidade
LASUS, UnB-ICC Norte – Subsolo, Brasília, DF

(2) Pesquisador, Professor de Arquitetura e Urbanismo do UnB, Mestre e Doutorando,


Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, Laboratório de
Sustentabilidade-LASUS, UnB-ICC Norte – Subsolo, Brasília, DF

RESUMO

Um dos maiores desafios quando nos referimos às questões de acessibilidade e


mobilidade urbana é a inclusão de todas as parcelas da população no cotidiano das cidades.
De maneira geral, a acessibilidade é o elemento fundamental e o cerne do processo que irá
garantir a mobilidade urbana. Atendendo a todos os habitantes em seus direitos fundamentais;
a inclusão social, a igualdade de oportunidades e o exercício da cidadania. O presente trabalho
traz uma estruturação nos conceito do Desenho Universal. Considerando que o objetivo do
desenho universal é simplificar a vida das pessoas, para tal, os produtos, as comunicações e o
meio edificado deve ser utilizado cada vez mais por um número maior de usuários, sobretudo,
de forma autônoma. Aos usuários não se faz nenhuma distinção considerando todas as idades,
estaturas e “capacidades”. Para tais pressupostos, nosso trabalho traz a reunião dos conceitos
do desenho universal à leitura do espaço urbano em suas quatro escalas e percepção.
Apresentando as indicações de modalidade e acessibilidade para cada uma destas escalas de
percepção e instituindo a questão de mobilidade e acessibilidade não apenas como uma
questão de acesso físico, mas sim, de acesso à cultura e ao patrimônio cultural do nosso país.

ABSTRACT

One of the biggest challenges of urban mobility and accessibility is the inclusion of all
portions of the population in the daily life of cities. In General, accessibility is the fundamental
element of the process that will ensure that promoting urban mobility. With accessibility, all
inhabitants will be safe in their fundamental rights; social inclusion, opportunities and
citizenship. This work brings a structuring in concept of universal design. Universal design mark
is simplified the people lives, products, communications and built environment should be used
by a larger number of users and, above all, autonomously. Users do not make any distinction
considering all ages, statures and "capacities". Our work brings the meeting of the concepts of
universal design to the reading of urban space in its four scales and perception and presenting
the prescriptions of modality and accessibility for each of these scales of perception. However,
mobility and accessibility is not only a matter of physical access, but rather, access to culture
and cultural heritage of our country.
RELEVÂNCIA QUANTO AO TEMA: ACESSIBILIDADE E MOBILIDADE

Antes de introduzir o tema deste trabalho gostaria de justificar o termo utilizado para
designar pessoas com deficiência e a razão de tratá-las desta maneira de agora em diante. Em
pleno século XX utilizou-se o termo “inválido” para designar pessoas com alguma diferença em
relação ao padrão do homem normal. Felizmente, os valores sociais têm mudado com grande
velocidade e, hoje, o termo não é mais visto em lugar algum. Além do citado, outros termos já
foram utilizados para designar pessoas com deficiência, em inglês, a palavra usada é “disable”,
em língua portuguesa utilizamos os termos: inválido; incapacitado; incapaz; defeituoso;
deficiente; excepcional; pessoas deficientes; portadores de deficiência; pessoas com
deficiência; portadores de direitos excepcionais; pessoais especiais; portadores de
necessidades especiais, mais recentemente, pessoas com necessidades especiais e,
atualmente, pessoas com deficiência.

Quais as razões para se utilizar o termo “pessoa com deficiência” e não os outros? Em
alguns casos a justificativa é óbvia: termos como incapacitado ou defeituosos são, claramente,
pejorativos e preconceituosos. Segundo SASSAKI (2005, p.4), o uso do termo “pessoa com
deficiência” agrega valores às pessoas, tais como:

1. O uso do poder pessoal para fazer escolhas, tomar decisões e assumir o


controle das situações;
2. O uso de sua responsabilidade para contribuir com seus talentos mudando a
sociedade rumo à inclusão de todas as pessoas com ou sem deficiência.

Além de ter sido escolhido, em 2000, na cidade de Recife, por pessoas com
deficiências a forma como gostariam de ser tratadas, pois não carregam (portador) uma
deficiência. De acordo com a Norma Brasileira, NBR – 9050 (2004, p. 02), o termo
acessibilidade significa a “possibilidade e condição de alcance, percepção e entendimento para
a utilização com segurança e autonomia de edificações, espaço, mobiliário, equipamento
urbano e elementos.” E acessível é todo “espaço, edifício, equipamento urbano ou elemento
que pode ser alcançado, acionado, utilizado, vivenciado por qualquer pessoa, inclusive aquelas
com mobilidade reduzida. O termo acessível implica tanto acessibilidade física como de
comunicação” (NBR-9050, 2004, p. 02).

A realização, em 1981, do “ano internacional das pessoas deficientes” marcou um


importante momento para a inclusão social no Brasil e no mundo. Setores organizados da
sociedade brasileira e mundial realizaram campanhas em busca da inclusão social e
econômica desse grupo significativo em termos quantitativos da população, porém até então
segregado. Um dos aspectos relevantes levantados naquele ano de intensa atividade foi o
esclarecimento de parte da sociedade das dificuldades enfrentadas dia-a-dia por pessoas com
necessidades especiais referentes às barreiras arquitetônicas que dificultam ou mesmo
impedem o direito, garantido pela constituição, de ir e vir.
No entanto, estas leis só foram devidamente regularizadas em 2004, com a promulgação
do Decreto no 5.296, de 02 de dezembro, que regulamenta o cumprimento das leis citadas
acima e ainda estabelece os prazos para sua efetivação, bem como, as penalidades por sua
não observância. Vinculada ao decreto presidencial está a norma brasileira NBR-9050 que, a
partir de então, passou a ser obrigatória. O país encontra-se hoje em pleno processo de
adaptação e em compasso com outros países latinos americanos e europeus.

A mobilidade urbana é a realização do direito de “ir e vir” a todos os cidadãos, garantido


pelo o instrumento da acessibilidade universal ao espaço público. Assim, a acessibilidade é
condição fundamental nos projetos de infra-estrutura e transporte público. Segundo Xavier, a
acessibilidade é inevitável no processo de construção das cidades. Acrescento que o princípio
fundamental é garantir a mobilidade urbana e veremos que para tal é necessário recorrer à
acessibilidade em todas as escalas de circulação. Prosseguir com estas reflexões se faz
necessário entender conceitos intrínsecos à mobilidade urbana e à acessibilidade universal. O
primeiro é o conceito do Desenho Universal. Especialistas do Centro de Design Universal na
Universidade Estatal da Carolina do Norte consideram que o objetivo do desenho universal é
simplificar a vida das pessoas, e para tal, os produtos, as comunicações e o meio edificado
deve ser utilizado cada vez mais por um número maior de usuários. E, sobretudo, de forma
autônoma. Aos usuários não se faz nenhuma distinção considerando todas as idades,
estaturas e “capacidades”. O desenho universal traz um aspecto de fundo que é desenvolver
uma teoria que traga princípios, parâmetros e soluções para o “acesso” de todos aos edifícios,
áreas urbanas, à informação e aos meios de comunicação, aos móveis e utensílios domésticos.

O Desenho Universal é o projeto, a produção de produtos e de meios físicos a serem


utilizados por todas as pessoas, até ao limite máximo possível, sem necessidade de se recorrer
a adaptações ou a desenhos específicos. Especificamente, o Desenho Universal considera
como seus pressupostos:

Equiparação nas possibilidades de uso: O desenho útil às pessoas com habilidades e


capacidades diferenciadas;
Flexibilidade no uso: Atender a uma ampla gama de indivíduos, preferências e habilidades;
Uso Simples e intuitivo: O uso deve ser de fácil compreensão, independentemente de
experiência, nível de formação, conhecimento do idioma ou da capacidade de concentração do
usuário;
Captação da informação: Deve comunicar eficazmente ao usuário as informações
necessárias, independentemente de sua capacidade sensorial ou de condições ambientais;
Tolerância ao erro: Minimizar o risco e as conseqüências adversas de ações involuntárias ou
imprevistas;
Mínimo esforço físico: A solução proposta pelo Desenho Universal deve ser, na medida do
possível, utilizar os equipamentos com um mínimo de esforço, de forma eficiente e confortável;
Dimensão e espaço para uso e interação: Oferecer espaços e dimensões apropriados para
interação, alcance, manipulação e uso, independentemente de tamanho, postura ou mobilidade
do usuário.

Quando se fala de acessibilidade e mobilidade é comum associar a questão aos


problemas dos cidadãos deficientes. É um exagero pensar neste nível. Devemo-nos preocupar
em garantir o acesso a todos os cidadãos: idosos, obesos, altos, baixos e, inclusive, mães
circulando carros de bebês. Contudo, é especial o tratamento às pessoas com deficiência ou
pessoas com mobilidade reduzida. Estas duas definições ficam aqui introduzidas como
melhor caracterização e substituição ao termo: portadores de necessidades especiais.
Portar uma necessidade especial é um termo muito genérico e pode definir necessidades
especiais como usar temporariamente um instrumento de imobilização em sua perna ou seu
dedo. Ambos os casos necessitam de condições especiais de uso e mobilidade distintas.
Considero que a adoção destes dos termos se torna mais apropriado para tratar os assuntos
da mobilidade urbana e acessibilidade ao edifício.

MOBILIDADE

A mobilidade determina por que razões e por quais maneiras as pessoas se deslocam
pela cidade. Tradicionalmente se considerava a mobilidade urbana como sendo objeto de
estudo da área dos transportes e sistema viário. De fato continua sendo, porém outras
questões devem ser consideradas no projeto urbanístico e de urbanização. Segundo
Vasconcelos (2001), os fatores principais que interferem na mobilidade das pessoas são a
renda, o gênero, a idade, a ocupação e o nível educacional. Não obstante às questões
socioeconômicas, nossa preocupação foca na condição universal da mobilidade. A
preocupação relativa ao acesso universal e a mobilidade urbana ganha outra demanda que
suplanta a capacidade de resolução do sistema viário e dos transportes, entre esta a garantia
de mobilidade às pessoas desigualmente capazes, pessoas com deficiência e com mobilidade
reduzida. O projeto urbanístico e a urbanização de uma cidade serão os instrumentos
fundamentais para garantir as necessidades inerentes à acessibilidade universal.
Especificamente a Mobilidade urbana se traduz na capacidade que o indivíduo terá em transitar
pela cidade, por Rota Acessível, de sua origem até seu destino, seja este um edifício ou um
espaço público. O conceito então da rota acessível é construído como sendo a possibilidade de
circulação livre, desobstruída de qualquer barreira, capaz de garantir o trânsito de forma
autônoma inclusive às pessoas com deficiência e/ou com mobilidade reduzida.

Para isso, devemos saber os níveis de mobilidade estabelecidos em uma cidade e


posteriormente sugerir estratégias para que a Rota Acessível seja garantida. Neste sentido
gostaríamos de introduzir primeiramente a classificação sugerida por Romero (2001), Quadro
01, em sua análise realizada na pesquisa de Viabilidade Ambiental da Urbanização do Distrito
Federal. A autora sugere um processo de observação, desenvolvendo um método de
aproximações. Segundo a própria autora, “uma espécie de zoom que se inicia com a visão
panorâmica da grande massa urbana termina no edifício e utiliza como parâmetro o grau de
proximidade do usuário na sua interação com o ambiente construído”, esta escala de
aproximação vai da cidade ao edifício passando pelo setor e o lugar.

ESCALAS DE CLASSIFICAÇÃO
Escala da Cidade Macro escala da grande dimensão das estruturas urbanas;
Escala do Setor Escala intermediária da área ou do sítio;
Escala do Lugar Micro escala de dimensões específicas do lugar;
Escala do Edifício Micro escala de dimensões específicas dos edifícios.
Fonte: Bustos Romero 2001

Quadro 01 – Escalas de Classificação

Para efetiva utilização desta classificação na sugestão e na condução de processos que


garantam a mobilidade urbana devemos entender que:

Escala da Cidade: Considera a perspectiva da grande forma física e organizacional, a


variedade ambiental, o macro sistema de transporte e circulação e a permanência e
continuidade do construído;
Escala do Setor: Apresentam relações morfológicas e respectivas respostas ambientais, a
acessibilidade, a homogeneidade, a funcionalidade etc.;
Escala do Lugar: Confere identidade ao espaço otimizando as relações pessoais
especificando as funções.
Escala do Edifício: Própria da percepção e do uso do edifício. O edifício se coloca como
elemento inserido nas demais escalas.

Mobilidade em Quatro Escalas

A Escala da Cidade - Os Veículos da Inclusão: A Preocupação característica desta escala,


no que tange a mobilidade urbana, é a maneira que as pessoas, independente de suas
capacidades, podem de maneira autônoma, transitar por ela. A ênfase dada às pessoas com
deficiência e com mobilidade reduzida não exclui a garantia da mobilidade aos demais usuários
do espaço urbano. Isso é feito pela especificidade exigida para garantir os direitos universais
às minorias. O desenho universal não deve preterir as minorias em favor à maioria. O empenho
é pela busca do atendimento da diversidade. Pessoas com Restrição de Mobilidade possuem
necessidades especiais para se deslocar pela cidade, em função da idade, estado de saúde,
estatura etc. Pessoas com Deficiência Física, Mental, Sensorial, Orgânica e Múltipla dependem
do entendimento de sua realidade para a cidade oferecer condições de mobilidade.

Neste ambiente temos então a preocupação de transitar pela grande forma física e
organizacional da cidade. Os meios que utilizamos para esta atividade são: o transporte público
e o privado. Em vista a uma Rota Acessível, há de se prever os percursos característicos e
exigidos pelo plano urbanístico de uma cidade, ou mesmo pela condição urbana da cidade e
garantir o trânsito entre os setores desta. Na atual conjuntura e no sentido de contribuir com a
estrutura de mobilidade e acessibilidade urbana, devemos verificar:
O traçado das rotas acessíveis garantindo as necessidades básicas de locomoção entre os
setores da cidade e a possibilidade de acesso aos diversos usos da vida cotidiana. Deve-se
considerar a capacidade de mobilidade própria de cada usuário em função da idade, saúde,
estatura, e etc.;
Os meios de transporte, públicos ou privados, capazes de promover o trânsito e que este
garanta o acesso de todos os usuários. Neste conceito, introduzimos outro denominado:
Ajudas técnicas como sendo todo e qualquer aparato introduzido na rota acessível capaz de
facilitar a acessibilidade e a mobilidade urbana;

A sinalização adequada garantindo a informação completa a todos os usuários da rota


acessível. Da mesma maneira, os meios de comunicação se preocupam cada vez mais com as
condições de exposição das informações, todos os usuários do espaço urbano devem ter a
garantia de informação referente ao direcionamento e chegada dos destinos desejados.

A Escala do Setor - O Passeio Garantido: A escala do setor, própria para o trânsito das
pessoas ao acessar os diversos lugares da cidade: largos, praças, alamedas, etc. Em nossa
análise quanto à mobilidade urbana escala do setor nos servirá para refletirmos sobre as ações
necessárias a garantir o passeio autônomo do usuário. Diferentemente da escala da cidade,
aqui, a circulação não compreende grandes distâncias e muito provavelmente não será
realizada com a ajuda técnica dos veículos de transporte. O passeio será o foco de trabalho
nesta escala. O passeio no sentido do trânsito livre das pessoas pelas vias e espaços públicos
da cidade. Mais especificamente o elemento principal que trabalhado nesta escala é a calçada
e o passeio público. Semanticamente, calçada e passeio se encontram definidas de forma
semelhante.

Calçada: “Caminho pavimentado, lateral, ao longo das ruas, em nível pouco superior a estas,
destinado ao trânsito de pedestres” e;
Passeio: “Parte lateral e um pouco elevada de algumas ruas, destinada ao trânsito de quem
anda a pé; calçada”.

Como agenciadores da mobilidade urbana faremos algumas distinções entre estes dois
elementos. Trataremos aqui as calçadas, em seu sentido amplo, como o conjunto de elementos
ao longo das vias que reúne guia ou meio-fio, guia ou meio-fio rebaixada, faixa de serviço,
soleira, passeio, sinalizações táteis de alerta e direcionais, entre outros. Ressalvando que o
termo faixa de serviço se destina para nomear a área onde serão colocados os postes,
placas, telefones públicos, caixas de correio, lixeiras e demais elementos necessários e de uso
público; área de soleira será a área onde ajustaremos o nível da calçada ao nível da cota de
soleira das edificações e o passeio ficará reservado para a área da calçada livre e qualquer
barreira para o trânsito de todas as pessoas. Cabe aos projetos nesta escala a preocupação
com o estágio intermediário entre calçada e o acesso aos veículos de transporte usados para a
transposição de grandes distâncias, em outras palavras as vagas de estacionamento devem
ser bem projetadas para garantir todas esta peculiaridades de estacionamento.
A Escala do Lugar - O Chegar Seguro: O Lugar é capaz de conferir identidade ao espaço
otimizando as relações pessoais especificando as funções, as praças exemplificam esta
condição. Seja qual for a característica da praça: De passagem, de descanso, de poder, de
contemplação ou outra a essência do lugar é preservada. Para as questões da mobilidade
urbana devem ser avaliadas sob a ótica do uso da chegada no lugar e do uso do mesmo. Aqui,
além das calçadas, ouros elementos se tornam protagonistas. Para garantir o desenho
universal os acessos ao lugar devem ser previstos, as sinalizações, os percursos na
qualidade de rota acessível do lugar, a utilização dos espaços, atrativos, de descansos ou
outros, por todas as pessoas inclusive as com deficiência ou mobilidade reduzida, o mobiliário
urbano adequado aos usos e aos usuários. Porque uma praça, próxima a um setor residencial,
que possui vocação para ser espaço de convívio urbano está condenada apenas a servir uma
parcela da população. Prestemos a atenção aos mobiliários tradicionalmente usados nas
praças de nossas cidades, reparemos na sinalização de elementos, alerta ou direcionamento;
ou mesmo, nos brinquedos dos parques infantis. Verifiquemos agora se estes promovem a
mobilidade urbana e acessibilidade universal ou se comprometem a inclusão social.

A Escala do Edifício - O direito ao acesso: A escala do edifício garantirá o acesso às


edificações e se constitui um tema próprio da acessibilidade. O importante é que o acesso à
edificação configura não apenas uma questão prática e funcional como um direito de acesso de
cidadania onde, por exemplo, temos serviços públicos abrigados dentro de edificações.
Seguimos com o estudo específico da acessibilidade

ACESSIBILIDADE

Segundo a lei 10.098/2000, em seu Art. 2º, define acessibilidade como a “possibilidade
e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e
equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de
comunicação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida.”

No entanto, para se compreender acessibilidade é preciso definir o conceito de


deficiência. O Decreto 5.296/2004 define como pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida
aquelas que se enquadram nos itens do Capítulo II, Artigo 5º. Parágrafo 1º que envolve
deficiência física, deficiência auditiva, deficiência visual e mental. Segundo dados do CENTRO
DE VIDA INDEPENDENTE (1994), no VI - Seminário Internacional sobre Acessibilidade ao
Meio Físico – SIAMF, oitenta por cento da população brasileira não apresenta as
características definidoras do homem padrão. São pessoas idosas, obesas, pessoas com
capacidade física reduzida, pessoas muito altas ou muito baixas, além das que apresentam
alguma necessidade especial. São pessoas muitas vezes excluídas do pleno direito ao
exercício da cidadania. E que podem, mesmo, estar excluídas do amparo legal. No entanto,
segundo LIMA (2006), mesmo que não existisse legislação específica sobre acessibilidade, a
exclusão e o preconceito são inaceitáveis. Dentre os princípios constitucionais da
administração pública estão: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência,
apresentados no art. 37, inciso I da Constituição Federal. Vamos nos ater a um deles e seus
desdobramentos: legalidade. Segundo este princípio o administrador público deve
obrigatoriamente atuar dentro dos limites da lei e apenas nestes limites, além do que, está
sujeito a agir sempre para o bem comum e o interesse público, pois não pode deixar de
respeitar os outros preceitos da administração, como moralidade e eficiência. Portanto, ao
desobedecer ao decreto 5.296/2004 o administrador público responsável pela gestão ou
execução de obras não poderá desrespeitar as leis infraconstitucionais 10.098/2000 e
10.048/2000, sob pena de executar ato ilegal, ao desrespeitar a constituição federal. Qualquer
construção pública ou intervenções em edificação pública existente não poderá, pelo princípio
da legalidade, desobedecer aos ditames do Decreto 5.296/2004.

Em contrapartida a toda a legislação já construída em nosso país, bem como, às


normas de acessibilidade, em especial, as normas da Associação Brasileira de Normas
Técnicas - ABNT NBR 9050, NBR 143434 e tais ainda não foram suficientes para garantir a
acessibilidade a um vasto patrimônio cultural construído ao longo da história, e que hoje se
apresenta na forma de museus, centros culturais, bibliotecas, parques, entre outros.
Segundo CANO (2002), outros países, em especial a Espanha, também construíram uma
grande gama normativa e legal para dar suporte à vida e à cidadania das pessoas com
deficiência. No entanto, além das leis e das normas que deliberam e oferecem aos cidadãos a
liberdade ou o direito de ir e vir, se, de fato, um indivíduo não for capaz de colocar em prática
seus desejos e interesses, ou seja, desfrutar de sua liberdade, a cidadania está incompleta e o
direito individual desrespeitado. Portanto, mais do que liberdade temos que permitir ao cidadão,
com ou sem deficiência, autonomia.

En nuestro país está bastante desarrollada la normativa relativa a la accesibilidad y


existen trabajos de recopilación de la legislación actualmente vigente, pero no debemos
olvidar que para llevar a cabo cualquier acción, es la autonomía personal, no la libertad
el requisito más importante; y esto solo es posible a través de una formación en
sintonía con el tiempo y la cultura que estamos insertos. Cualquier pauta de
accesibilidad debe encaminarse a que la persona disponga de la suficiente autonomía
para actuar según sus intereses. (CANO: 2002, p.24)

A acessibilidade e o patrimônio cultural

O acesso à educação, à cultura e aos bens culturais é um direito de todos os cidadãos


assegurado pela Constituição Federal no Art. 215: O Estado garantirá a todos o pleno exercício
dos direitos culturais, o acesso às fontes da cultura nacional, apoiará e incentivará a
valorização e a difusão das manifestações culturais. Tais fontes configuram o patrimônio
cultural brasileiro definido no Art. 216: Constitui patrimônio cultural brasileiro os bens de
natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade
brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e
viver; III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos,
edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V - os conjuntos
urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico,
ecológico e científico. (BRASIL, 1988, p. 206). Com este objetivo, o Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional - IPHAN editou a Instrução Normativa n°1, de 25 de novembro de
2003, onde apresentou considerações básicas a respeito da adaptação de bens culturais
imóveis acautelados em nível federal tendo como base as Leis Federais no. 10.048/2000 e no.
10.098/2000, bem como, as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT.
Uma das diretrizes da IN-1 considerou a necessidade do desenvolvimento de estudos
baseados na avaliação de propostas bem sucedidas de adaptação, normas internacionais,
técnicas e novas tecnologias de acessibilidade com vistas à elaboração de métodos de
avaliação das condições de acessibilidade real dos bens culturais imóveis. Com a
obrigatoriedade instituída pelo Decreto no. 5.296/2004 todo projeto de natureza arquitetônica e
urbanística é obrigado a obedecer às diretrizes de acessibilidade, bem como atender às
especificidades do desenho universal e às normas definidas pela ABNT, em especial, a Norma
Brasileira – NBR-9050.

Permitir o acesso universal ao patrimônio cultural, em especial, o patrimônio


arquitetônico, bem como, sua plena compreensão e, ao mesmo tempo, preservar as
edificações em sua integridade, autenticidade, características físicas, espaciais e respeitar o
caráter de obra de arte é o paradoxo que se interpõe ao arquiteto e o que se pretende
investigar. Em 13 de janeiro de 1937, criou-se por ato do então presidente da república, Getúlio
Vargas, o Serviço do Patrimônio Artístico e histórico Nacional – SPHAN. Dirigido inicialmente
por Rodrigo Melo Franco de Andrade, o serviço do patrimônio foi ponto de convergência dos
modernistas brasileiros preocupados com a preservação de nossa cultura, tais como: Mário de
Andrade, redator a pedido do ministro Gustavo Capanema do anteprojeto de lei que criará o
SPHAN, Manuel Bandeira, Lúcio Costa e Carlos Drummond de Andrade. E contaria adiante
com as participações de Oscar Niemeyer, Carlos Leão e Ítalo Campofiorito, entre outros.

A atuação do SPHAN, atualmente IPHAN, preservou e inscreveu no livro de


tombamento mais de mil bens, sendo que entre eles encontram-se sítios urbanos, como: Ouro
Preto, Sabará e Mariana. Em 1984, tombou-se pela primeira vez um terreiro de candomblé, o
terreiro da Casa Branca em Salvador - BA. E, a partir da década de 1990, as preocupações de
preservação voltaram-se também para o patrimônio imaterial.

Planejar, projetar e construir para adaptar o patrimônio nacional às normas relativas à


acessibilidade significa avaliar até o presente momento (segundo dados do IPHAN) as
intervenções desenvolvidas em vinte e seis cidades brasileiras. A saber: Alcântara (MA), Belém
(PA), Cachoeira (BA), Congonhas (MG), Corumbá (MS), Diamantina (MG), Goiás (GO), Icó
(CE), Oeiras (PI), Olinda (PE), Ouro Preto (MG), Pelotas (RS), Penedo (AL), Porto Alegre (RS),
Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Laranjeiras (SE), Lençóis (BA), Manaus (MA), Mariana (MG),
Natividade (TO), Salvador (BA), São Cristóvão (SE), São Francisco do Sul (SC), São Paulo
(SP) e Serro (MG).

CONCLUSÃO

A apresentação do tema sobre a acessibilidade e mobilidade urbana sob os aspectos


das escalas de percepção, instrumentará futuros trabalhos sobre o assunto subsidiando o
pesquisador de forma a atuar especificamente nas peculiaridades de cada escala. Além disso,
fica declarada a importância de entender o tema com a sua importância plena que sobrepõe às
preocupações físicas da acessibilidade e mobilidade presentes nas normas atuais. As questões
relativas ao acesso universal e ao desenho universal incluem questões de ordem não
materiais. Devemos estender às normas e à legislação existente preocupação do acesso a
cultura promovendo o crescimento da inclusão social.

BIBLIOGRAFIA

1. BOITO, Camillo. Os restauradores. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002.


2. BRANDI, Cesare. Teoria da Restauração. Cotia-SP: Ateliê Editorial, 2004. 261p.
3. CALADO, Luís. O aço na recuperação de edifícios. In: PATRIMONIUM - nº 2, janeiro
de 1998. Portugal: Direcção Geral do Patrimônio – DGPATR/Ministério das
Finanças/Secretaria de Estado do Tesouro e das Finanças, 1998.
4. CHOAY, Françoise. 2001. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação
Liberdade/UNESP, 2001.
5. CURY, Isabelle (org.). Cartas patrimoniais. Rio de Janeiro: IPHAN, 2000.
6. D’OSSAT, Guglielmo De Angelis. Estudo de Monumentos do ponto de vista
histórico, artístico e técnico. Roma: Faculty of Architecture of Rome/ICCROM, 1982.
7. DE SITTER, W.R. Costs for Service Life Optimization: The Law of Fives, In: Durability
of Concrete Structures, Workshop Report. Copenhagen: Ed. Steen Rostam, 18-20
May, 1984.
8. FUNARI. Pedro Paulo A. Os desafios da destruição e conservação do patrimônio
o
cultural no Brasil. Texto especial n 013, outubro, 2000.
9. GENTIL, Vicente. Corrosão. Rio de Janeiro: LTC, 1982.
10. HELENE, Paulo Lago. Manual para reparo, reforço e proteção de estruturas de
concreto. São Paulo: PINI, 1992.
11. HOUAISS, Antônio. Villar, Mauro. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.
Instituto Houaiss de Lexicografia e Banco de Dados da Língua Portuguesa S/C Ltda.
Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001.
12. JOHN, Vanderley M., CREMONINI, Ruy Alberto. O processo construtivo e a
Manutenção dos edifícios. In: Encarte Técnico IPT/PINI. São Paulo: IPT, 1985.
o
13. LICHTENSTEIN, Norberto B. Patologia das construções. In: Boletim técnico, n .
08/86. São Paulo: EPUSP, 1986.
14. OLSHANSKY, S. Jay. CARNES, Bruce A. BUTLER, Robert N. Se os humanos
fossem feitos para durar. Scientific American Brasil. Edição Nº 4, 2002, disponível
em: <http://www2.uol.com.br/sciam/conteudo/materia/materia_4.html>. Acesso em:
02/03/2007.
15. RUSKIN, John. s.d. Las siete lampadas de la arquitectura. Buenos Aires: El Ateneo.
16. SOUZA, Vicente Custódio Moreira de. RIPPER, Thomaz. Patologia, recuperação e
reforço de estruturas de concreto. Editora PINI, São Paulo, 1998.
17. VIÑUALES, Graciela Maria. A preservação do patrimônio – novo campo
o
profissional. Texto especial n . 132, maio, 2002.

Você também pode gostar