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Recursos

Terapêuticos Físicos
Mecanismos Neurais da Dor, Eletroterapia e Ultrassom

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Igor Phillip dos Santos Glória

Revisão Textual:
Prof.ª Esp. Adrielly Camila de Oliveira Rodrigues Vital
Aline Gonçalves
Mecanismos Neurais da Dor,
Eletroterapia e Ultrassom

• Mecanismos Neurais da Dor;


• Dor Fisiológica – Nocicepção;
• Via Aferente de Transmissão da Informação Nociceptiva;
• Manifestações Clínicas dos Tecidos.
• Eletroterapia e Ultrassom;
• TENS (Transcutaneous Electrical Nerve Stimulation);
• Ultrassom Terapêutico;
• Corrente Interferencial (CI);
• Correntes Diadinâmicas de Bernard (CDB).

OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Proporcionar entendimento sobre os aspectos referentes à neurofisiologia da dor, tipos,
características e formas de avaliação da dor;
• Proporcionar ao aluno o entendimento sobre os aspectos referentes à eletroterapia
analgésica e ao uso do ultrassom, seus efeitos, indicações e contraindicações.
UNIDADE Mecanismos Neurais da Dor, Eletroterapia e Ultrassom

Mecanismos Neurais da Dor


A palavra dor, originária do latim “dolor”, é definida pela International Association
for the Study of Pain (IASP) como uma “uma experiência sensorial e emocional
desa­gradável associada a dano tecidual real ou potencial, ou descrita em termos de
tal dano” (IASP, 1994). Este conceito permite a constatação de que a dor é uma
expe­riência única e individual, modificada pelo conhecimento prévio de um dano que
pode ser existente ou presumido. Desta maneira, a dor é uma experiência subjetiva
que pode estar associada à lesão real ou potencial nos tecidos, podendo ser descrita
tanto em termos destas lesões quanto por ambas as características (GARCIA, 2010).

Nocicepção: conjunto de eventos neurais por meio do qual os estímulos nocivos são de-
tectados, convertidos em impulsos nervosos e transmitidos da periferia para o SNC. No en-
céfalo, particularmente no cérebro, os estímulos associados à lesão real ou potencial são
interpretados como dor.

Figura 1 – Receptores sensoriais Figura 2 – Calibre dos axônios


Fonte: Adaptado de CURI; PROCOPIO, 2009 Fonte: Adaptado de CURI e PROCOPIO, 2009

Dor Fisiológica – Nocicepção


O componente fisiológico da dor é chamado nocicepção, que consiste dos proces-
sos de transdução, transmissão e modulação de sinais neurais gerados em resposta a
um estímulo nocivo externo. De forma simplificada, pode ser considerado como uma
cadeia de três neurônios, com o neurônio de primeira ordem originado na periferia
e projetando-se para a medula espinhal, o neurônio de segunda ordem ascende pela
medula espinhal e o neurônio de terceira ordem projeta-se para o córtex cerebral
(MESSLINGER, 1997; TRANQUILLI, 2004).

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Os dois sistemas de modulação nociceptiva mais importantes são mediados por
receptores NMDA (N-Metil-D-Aspartato) e opioides, distribuídos por toda extensão
do sistema nervoso central. Entre os três principais subtipos de receptores opioides,
os receptores μ e δ podem inibir ou potencializar eventos mediados pelos recepto-
res NMDA, enquanto o receptor κ antagoniza a atividade mediada por receptores
NMDA (RIEDEL; NEECK, 2001).

Segundo Pisera (2005), o primeiro processo da nocicepção é a decodificação de


sensações mecânica, térmica e química em impulsos elétricos por terminais nervosos
especializados, denominados nociceptores. Os nociceptores são terminações nervo-
sas livres dos neurônios de primeira ordem, cuja função é preservar a homeostasia
tecidual, assinalando uma injúria potencial ou real. Os neurônios de primeira ordem
são classificados em três grandes grupos, segundo seu diâmetro, seu grau de mielini-
zação e sua velocidade de condução:
• Fibras A: são fibras de diâmetro grande (maior que 10 μm), mielinizadas e de
condução rápida, responsáveis por sensações inócuas (Figura 2);
• Fibras A: são dediâmetros intermediários (2 a 6 μm), mielinizadas. Sua velocida-
de de condução é intermediária, modulando a primeira fase da dor: mais aguda
ou semelhante à pontada;
• Fibras C: são fibras de diâmetro pequeno (0,4 a 1,2 μm), não mielinizadas e
de velocidade de condução lenta, responsáveis pela segunda dor ou dor difusa,
queimaçaõ persistente.

Via Aferente de Transmissão


da Informação Nociceptiva
Classificação
A dor pode ser classificada de três formas: aguda, crônica e referida, sendo as duas
primeiras as mais citadas por diversos autores, porém alguns autores também incluem
a dor referida como um dos tipos. Por isso, pensar que a dor é classificada como aguda
e crônica não deixa de também estar correto, afinal alguns estudiosos a definem dessa
forma. Em razão disso, aqui vamos explicar e diferenciar os três tipos de dores.

Dor Aguda
É caracterizada por ser uma dor bem localizada pelo paciente, mediada por vias de
condução rápida, principalmente a via tipo A-Delta, pode estar associada a aumento do
tônus muscular, aumento da frequência cardíaca e da frequência respiratória. Esse tipo
de dor tende a durar enquanto o estímulo estiver presente na região, sendo a intensidade
da dor muitas vezes proporcional à intensidade do estímulo. Um exemplo de dor aguda
é quando a pessoa sofre um trauma do hálux contra algum objeto, quanto maior for a
intensidade do trauma, maiores são as chances dessa dor ser de grande intensidade.

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Dor Crônica
É caracterizada por uma “sensação contínua ou recorrente com duração mínima
de 3 meses”. Esse tipo de dor, diferente da dor aguda, não tem a função de promo-
ver um sinal de alerta, mas sim, comumente promove comprometimento funcional,
sofrimento do paciente e uma incapacidade progressiva. Ela pode vir associada, o
que é muito comum, de outras alterações, tais como:
• Depressão;
• Catastrofização;
• Redução da função;
• Redução da qualidade de vida;
• Incapacidade laboral;
• Sensibilização central;
• Cinesiofobia.

A dor crônica ainda pode ter uma classificação de acordo com a sua fisiopatologia em:
• Dor nociceptiva: quando a causa da dor é por algum estímulo nocivo, que per-
manece por muito tempo;
• Dor neuropática: quando a causa da dor é decorrente de alguma alteração neural;
• Dor psicológica: quando são fatores emocionais os principais causadores da
sintomatologia dolorosa do paciente.
• Síndrome da dor mista ou dor mista: quando um ou mais desses fatores estão
presentes no paciente ocasionando a sintomatologia da dor. Essa é sem sombra
de dúvidas o tipo mais frequente de dor crônica, pois diversos pacientes possuem
fatores que se somam e contribuem para o surgimento e manutenção da dor por
tempo prolongado. Isso já nos mostra que a abordagem de tratamento para esse
paciente será mais complexa e necessitará de uma avaliação bem minuciosa.

Muito se pergunta do “por que” as dores crônicas são tão persistentes e perma-
necem por tanto tempo se o nosso corpo sempre tende a buscar a cura. Existem
algumas teorias e explicações fisiológicas para isso:

Em uma delas ocorre redução de produção e liberação de opioides endógenos,


encefalinas e endorfinas desses pacientes. Trata-se de potentes neurotransmissores
capazes de promover analgesia agindo em nosso sistema nervoso central, uma vez
que se a sua produção estiver reduzida consequentemente não haverá essa analge-
sia central endógena. É muito comum que pacientes com dor crônica apresentem
uma redução na prática de atividade física e até quadro de cinesiofobia, sendo estes
fatores que contribuem para a piora do quadro, uma vez que a prática regular de ati-
vidade física estimula a produção de endorfinas pelo nosso sistema nervoso central.

Outra teoria está por trás de uma maior sensibilização no sistema nervoso central,
o que é denominado como sensibilização central e, também, no aumento do número
e da sensibilidade dos nociceptores.

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Dor Referida
Ocorre quando a dor é estimulada em uma região ou um órgão, porém ela é re-
latada (sentida) pelo paciente em uma região distante. Esses quadros álgicos, se não
forem muito bem avaliados, poderão provocar erros diagnósticos.

Anginas cardíacas, em que o problema está no coração do paciente, porém ele


relata uma dor na região do peito que pode se estender pelo membro superior
esquerdo e até na região cervical.

Da mesma forma, problemas no ureter podem representar dor para o paciente


na região ântero-lateral do abdômen e póstero-lateral da coluna lombar, sempre do
mesmo lado do ureter afetado.

Por isso, uma boa avaliação clínica será sempre fundamental para o correto diag-
nóstico do tipo e da causa da dor do paciente.

Manifestações Clínicas dos Tecidos


Os tecidos do nosso corpo reagem e apresentam diferentes características quando
lesionados, desta forma, destacam-se as principais características dos principais teci-
dos. Lembrando sempre de que cada informação relatada pelo paciente é de extrema
importância na hora da avaliação fisioterapêutica. Por isso, se atentem a cada sinal
e sintoma apresentado e relatado pelo seu paciente.

Dor Discal
• Dor matinal, paciente relata que a dor é pior quando acorda. Isso ocorre devido
à retenção de líquido durante o período noturno e aumento da pressão onde há
uma lesão discal;
• Rigidez que melhora com movimentos;
• Dor que surge durante a manobra de Valsalva (pressão);
• Dor mais intensa em posição bípede, menor sentado e menor deitado (depen-
dendo da localização da lesão);
• Dor normalmente aguda em forma de pontada;
• O paciente tende assumir uma posição antálgica, demonstrando uma alteração
postural em proteção da área lesionada;
• Pode levar a uma dor neural (irradiada), quando há compressão de raiz ou de
canal medular.

Dor Neural
• Paciente relata parestesia e/ou sensação de choque;
• A dor tende obedecer a um trajeto anatômico neural bem definido;
• Piora quando o nervo é colocado em tensão e/ou estiramento;
• Característica de ser fina e filiforme;

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• Quando o nervo tem uma redução da sua complacência, a dor é menos difusa
e mais aguda;
• Dor surge já no início da amplitude de movimento;
• Em casos de lesão (neuropraxia, axonotmese e neurotmese), a sensibilidade à mo-
tricidade pode estar comprometida nos locais correspondentes a esta inervação.

Dor Óssea
• A dor geralmente é local;
• Dor aguda, que piora à palpação, em casos de inflamação;
• Dor difusa e com histórico de traumas repetitivos de impacto, em casos de fraturas
por estresse;
• Dor piora com atividades de impacto ou com cargas;
• Pode causar bloqueio articular em casos de lesões ósseas em regiões intra-articulares.

Dor Muscular
• Dor em forma de queimação e localizada;
• Pode surgir devido a alterações posturais, movimentos repetitivos;
• Dor intensa à palpação;
• Dor piora ao aumento de tensão muscular.

Eletroterapia e Ultrassom
A eletroterapia é definida por Agne (2005) como a aplicação de energia eletro-
magnética ao organismo (de diferentes formas), com o objetivo de produzir reações
biológicas e fisiológicas, que contribuem para melhorar as reações metabólicas e ce-
lulares que compõem o tecido. Por isso a aplicação de tal recurso facilita o processo
de cicatrização tecidual.

TENS (Transcutaneous Electrical


Nerve Stimulation)
A Estimulação Elétrica Nervosa Transcutânea (TENS) é definida pela Associação de
Terapia Física Americana como a aplicação de estímulos elétricos sobre a superfície da
pele para o controle da dor, e trata-se de um método não invasivo, de baixo custo, seguro
e de fácil manuseio. Atualmente, pela grande aplicabilidade clínica do recurso, a TENS
é considerada a mais comum e importante forma de eletroanalgesia clínica. Por ser de
fácil administração, ter poucos efeitos colaterais e/ou contraindicações, essa ferramenta
é usada frequentemente para produzir alívio da dor (SHEILA KITCHEN, 2003).

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Tecnicamente, trata-se de uma corrente de baixa frequência, pulsada, que apre-
senta uma forma de onda bifásica, simétrica. Essa característica propicia a estimu-
lação de receptores nervosos e apresenta um componente de corrente direta igual a
zero, ou seja, as áreas sob as ondas positivas e negativas são iguais, não produzindo
efeitos polares, sendo denominada como corrente elétrica não polarizada (DAYHAN
SILVEIRA, 2008).

Figura 3 – Desenho do formato da onda da TENS


Fonte: Reprodução

Mecanismos de Ação
A estimulação elétrica transcutânea é uma técnica de analgesia aplicada em uma
variedade de frequências, intensidades e duração de pulso, podendo ser aplicada no
modo burst (frequências alternadas). Acredita-se que a TENS promova analgesia
predominantemente por meio do mecanismo da teoria das comportas, proposta por
Melzack e Wall, que provoca analgesia mediante a ativação seletiva das fibras táteis
de diâmetro largo (A-beta), sem ativar fibras nociceptivas de menor diâmetro (A-delta
e C). A atividade gerada nas fibras A-beta inibe a atividade em curso dos neurônios
nociceptivos no corno dorsal da medula espinal.

Outras teorias para o efeito analgésico da eletroterapia incluem o aumento na


produção de opioides endógenos e melhora da microcirculação local. Estudos têm
demonstrado que a baixa frequência de TENS ativa especificamente receptores opio-
ides μ, receptores serotoninérgicos e receptores muscarínicos espinais. Por outro
lado, a analgesia produzida pela alta frequência de TENS ativaria receptores delta-
-opioides e receptores muscarínicos na coluna dorsal da medula espinal, além da
ativação de receptores delta-opioides supraespinal.

Figura 4 – Esquema mostrando a ativação das fibras A-Beta, provocando


inibição das fibras tipo C e A-Delta, denominada teoria das comportas
Fonte: Adaptado de MELZACK e WALL, 1965

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Modalidades de aplicação da TENS


A eletroanalgesia com o uso da TENS pode ser feita de diferentes modos, sendo
cada um indicado no melhor momento terapêutico. A seguir, vamos descrever os
principais modos de aplicação do TENS e uma tabela para facilitar o entendimento
sobre ele.
• TENS Convencional: Aplicado com a frequência entre 80 e 150 Hz, baixa in-
tensidade, 60 a 100 μs, estimulando de forma contínua as fibras mielinizadas, de
condução rápida do estímulo. Importante ressaltar que a baixa intensidade não
deve provocar contrações musculares, muito menos sensação desagradável pelo
paciente, sendo sempre ajustada de acordo com a sensibilidade do indivíduo.
Nesse tipo de estimulação, a analgesia é imediata ou já começa a surgir após 10-
15 minutos de aplicação, efeito que perdura de 20 a 30 minutos até duas horas,
razão pela qual esse método é preferencialmente aplicado no tratamento de do-
res agudas, tais como dores inflamatórias, pós-operatórias e miofasciais agudas;

Na TENS convencional, o padrão de emissão de pulsos é, geralmente, contínuo,


embora possa também ser conseguida emitindo os pulsos em “disparos” ou “trens”,
e isso tem sido descrito por alguns autores como TENS pulsada ou TENS burst;
• TENS Acupuntura: Aplicado com baixas frequências, menores que 4 Hz, com
longas durações de pulso, 150 a 200 μs, intensidade em nível motor baixo.
De acordo com Starkey (2001, p. 237), esse modo “estimula a glândula hipófise
a liberar substâncias químicas que estimulam a produção de β-endorfinas que
reduzem a dor”. Isso ocorre porque a hipófise libera hormônio adrenocorticotró-
fico e β-lipotropina, que, por sua vez, liberam β-endorfinas que se ligam às fibras
Aβ e C, bloqueando a passagem da dor;

A estimulação nesse modo deve provocar contração muscular confortável ao


paciente, a duração do tratamento é de, aproximadamente, 30 minutos. Nesse
modo, a TENS pode ser indicada para dor crônica, dor provocada por lesão de
tecidos profundos, dor miofascial e por espasmo muscular (KITCHEN, 2003);
• TENS Breve-Intensa: A TENS é liberada em frequência de pulso elevada,
maior que 100 Hz, pulso de longa duração, 300 a 1.000 μs e intensidade no
nível motor, com duração de tratamento de até 30 minutos, o alívio da dor após
o tratamento é menor que 30 minutos, e é recomendada para redução da dor
antes de exercícios terapêuticos. O alívio da dor com esse modo é obtido por
meio da formação de uma alça de retroalimentação negativa dentro do sistema
nervoso central que, de forma geral, irá inibir a liberação da substância P, um
neurotransmissor que causa dor (STARKEY, 2001).

Contraindicações
• Dores cuja causa é desconhecida;
• Marca-passo cardíaco;

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• Deficit de sensibilidade;
• Processo infeccioso;
• Feridas abertas.

Ultrassom Terapêutico
Efeitos Físicos do Ultrassom
Quando emitidas as ondas sonoras pelo aparelho em contato direto com a pele,
há um efeito nas células e tecidos por dois mecanismos físicos: térmico e não térmico.
• Efeitos Térmicos: Quando o ultrassom percorre o tecido, uma porcentagem
dele é absorvida, e isso leva à geração de calor dentro daquele tecido. A quanti-
dade de absorção depende da natureza do tecido, seu grau de vascularização e
a frequência do equipamento. Tecidos com alto conteúdo de proteína absorvem
o ultrassom mais prontamente do que aqueles com conteúdo de gordura mais
alto, e quanto maior a frequência, maior a absorção. Um efeito térmico biolo-
gicamente significativo pode ser obtido se a temperatura do tecido for elevada
para 40 a 45 °C por pelo menos cinco minutos. O aquecimento controlado
pode produzir efeitos desejáveis, que incluem alívio da dor, redução da rigidez
articular e aumento do fluxo sanguíneo (KITCHEN, 2003);

A vantagem do uso do ultrassom para produzir esse efeito de aquecimento é que


o terapeuta tem controle sobre a profundidade na qual o aquecimento ocorre.
Para fazer isso, é importante que o terapeuta tenha conhecimento das medidas
de profundidade de meio-valor (ou seja, a profundidade de penetração da ener-
gia de ultrassom na qual sua intensidade diminuiu pela metade) e do aquecimen-
to seletivo dos tecidos (KITCHEN, 2003);
• Efeitos não térmicos: Segundo Kitchen (2003), existem muitas situações em
que o ultrassom produz efeitos biológicos sem, contudo, envolver mudanças
significativas na temperatura (por exemplo, baixa intensidade media espacial
e temporal). Há algumas evidências indicando onde os mecanismos não tér-
micos parecem exercer um papel primário na produção de algum efeito tera-
pêutico significante: estimulação da regeneração dos tecidos (DYSON et al.,
1968), reparo de tecidos moles (DYSON; FRANKS; SUCKLING, 1976; PAUL
et al., 1960), fluxo sanguíneo em tecidos cronicamente isquêmicos (HO-GAN,
BURKE; FRANKLIN, 1982), síntese de proteínas (WEBSTER et al., 1978) e
reparo ósseo (DYSON; BROOKES, 1983).

Os mecanismos físicos que parecem estar envolvidos na produção desses efeitos


não térmicos são um ou mais dentre estes: cavitação, correntes acústicas e ondas
estacionadas.

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Fonoforese
A fonoforese é definida como a migração de moléculas de drogas através da pele
sob a influência do ultrassom. Teoricamente, a fonoforese é possível utilizando as for-
ças de correntes acústicas que existem no campo de ultrassom. Para isso é necessária
a aplicação do ultrassom em conjunto com algum medicamento tópico, prescrito pelo
médico do paciente. É provável que a fonoforese dependa não apenas da frequên-
cia, intensidade, ciclo líquido e duração do tratamento do ultrassom (MITRAGOTRI
et al., 2000), mas também da natureza da molécula da droga propriamente dita.

São necessárias pesquisas para esclarecer quais parâmetros de ultrassom são


mais eficientes para facilitar a difusão de drogas tópicas e quais drogas podem ser
usadas de modo mais efetivo.
• Frequência: A frequência do equipamento tem total relação com a profundidade
para onde a energia poderá ser direcionada e qual mecanismo físico estará ativo.
A regra básica é que, quanto mais alta a frequência, mais superficial a profundida-
de de penetração, levando à rápida atenuação do ultrassom e causando um efeito
biológico, principalmente, por meio de mecanismos térmicos. Deve-se observar,
além disso, que a quantidade de atenuação depende também da natureza do teci-
do através do qual o ultrassom percorre. Os tecidos com alto conteúdo de proteína
absorvem energia mais prontamente do que aqueles com alto conteúdo de gordu-
ra ou água. Colocando essa informação em prática, o terapeuta confrontado com
uma lesão de pele superficial escolheria um aplicador de 3 MHz, e com uma lesão
muscular mais profunda exigiria um aplicador de 1 MHz;
• Modo de aplicação: O ultrassom pode ser aplicado no modo pulsado ou contí-
nuo, tendo cada um sua melhor indicação clínica. O ultrassom pulsado tem um
efeito importante na redução da quantidade de calor gerado nos tecidos. Existe
controvérsia sobre quais são os mecanismos principais por meio dos quais o
ultrassom estimula as lesões a se regenerarem. Os efeitos térmicos não são
desejáveis quando o local de lesão tem um suprimento sanguíneo comprometi-
do ou baixo (por exemplo, tendão). Nesse caso, a regeneração deve ser obtida
usando mecanismos não térmicos, ou seja, pulse o ultrassom para reduzir a mé-
dia temporal (reduzir o aquecimento), ao mesmo tempo, mantendo a média de
pulsos em um nível alto o suficiente para obter um efeito biológico. Outro ponto
importante é evitar a utilização do ultrassom contínuo quando há aumento da
temperatura local, como nos casos de processos inflamatórios agudos.

Contraindicações ao uso do ultrassom


• Útero em gestação;
• Gônadas;
• Tumor e/ou suspeita;
• Anormalidades vasculares, por exemplo, trombose venosa profunda, embolia,
aterosclerose grave;

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• Quadros infecciosos;
• Região dos olhos;
• Próximo ao gânglio estrelado;
• Pacientes hemofílicos não protegidos por reposição de fator;
• Áreas sobre proeminências ósseas subcutâneas;
• Placas epifisárias;
• Áreas anestésicas.

Corrente Interferencial (CI)


A Corrente Interferencial (IC) foi desenvolvida na década de 1950, pelo Dr. Hans
Nemec, em Viena, e foi tornando-se cada vez mais popular no Reino Unido durante
a década de 1970 (GANNE, 1976). Embora a definição atual de IC não seja padroni-
zada na literatura, ela pode ser descrita como a aplicação transcutânea de correntes
elétricas alternadas de média frequência com a amplitude modulada em baixa fre-
quência para fins terapêuticos. A partir dessa definição, observa-se que a IC é uma
forma de estimulação elétrica nervosa transcutânea (vide Capítulo 17).

Vem sendo relatado que a IC tem a vantagem de reduzir a resistência da pele e,


assim, o desconforto normalmente incorrido pelas correntes tradicionais de baixa fre-
quência, ao mesmo tempo produzindo efeitos de baixa frequência nos tecidos (LOW;
REED, 2000). Alega-se, também, que a IC permite o tratamento de tecidos profun-
dos (GOATS, 1990; HANSJUERGENS, 1986; LOW e REED, 2000; NIKOLOVA,
1987; WILLIE, 1969). As duas alegações anteriores, exclusivas da IC, são, em gran-
de parte, sem base e têm sido questionadas (ALON, 1987).

Princípios Físicos da Corrente Interferencial


A corrente IC é essencialmente uma corrente de frequência média (normalmente,
cerca de 4000 Hz) cuja amplitude aumenta e diminui de maneira rítmica em baixa
frequência (ajustável entre 0 (zero) e 200-250 Hz). A IC é produzida mesclando duas
correntes de média frequência que ficam levemente fora de fase, seja aplicando-as de
modo que “interfiram” nos tecidos ou de modo alternativo, mesclando-as dentro do
estimulador antes da aplicação (corrente “pré-modulada”). Uma corrente é, normal-
mente, de frequência fixa, por exemplo, 4000 Hz, e a outra corrente é ajustável, por
exemplo, entre 4000 e 4200 Hz.

Parâmetros de Tratamento
• Frequência de amplitude modulada: A frequência de amplitude modulada
(AMF), ou “frequência de batida”, é tradicionalmente considerada como sendo o
componente efetivo da IC, simulando as correntes de baixa frequência e criando
a estimulação diferencial de nervos e certos tipos de tecidos;

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• Aplicação quadripolar/bipolar: A IC pode ser produzida aplicando as duas


correntes de média frequência através de quatro eletrodos (método quadripolar),
de modo que essas se cruzem dentro dos tecidos, ou alternativamente, mesclan-
do as duas correntes no estimulador antes da aplicação através de dois eletrodos
(método pré-modulado ou bipolar).

Eletrodos de sucção ou tipo placa


A IC é frequentemente aplicada através de eletrodos que são mantidos no lugar
usando uma unidade de sucção intermitente. De modo alternativo, podem ser usados
eletrodos chatos de borracha siliconada impregnados com carbono.

Contraindicações
• Marca-passo;
• Sinais de TVP;
• Região abdominal em mulheres gestantes;
• Quadros infecciosos;
• Feridas abertas.

Correntes Diadinâmicas de Bernard (CDB)


Chamadas de correntes diadinâmicas de Bernard, são correntes monofásicas pul-
sáteis, polarizadas, desenvolvidas na França, no início dos anos 1950, de baixa frequ-
ência oscilando entre 50 e 100 Hz. As correntes diadinâmicas promovem respostas
excitatórias, mas, em função de sua longa duração de fase, ela é muito desconfortável.

Tipos de CDB
• Monofásica: Corrente alternada em 50 Hz, retificada em semionda, em que o
paciente sentirá uma sensação de forte fibrilação (penetrante e resistente). Eletroesti-
mulação muito indicada para o tratamento de dores musculares e efeito circulatório;
• Difásica (DF): Corrente alternada em 100 Hz, retificada em onda completa, em
que o paciente terá uma sensação forte de fibrilação e formigamento que desa-
parece subitamente. Muito indicada para promover analgesia, principalmente
de ordem espasmolítica;
• Curtos períodos (CP): Corrente modulada em períodos de 1 s em DF e 1 s em
MF, gerando uma percepção clara da alternância entre DF e MF. Nesse tipo, o
efeito circulatório se torna mais potente;
• Longos períodos (LP): MF combinada com segunda MF, variando amplitude
(0 (zero) e valor máximo). Nessa corrente não há sensação brusca de alternância.
Indicada para o tratamento de dores de origem espasmolítica e capacidade de
promover um efeito analgésico mais duradouro;

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• Ritmo sincopado (RS): Corrente MF com pausas intercaladas, usada para diag-
nósticos e eletroestimulação.

Indicações
• Disfunções do aparelho locomotor;
• Espasmos musculares;
• Contraturas musculares;
• Redução de edema pós-lesão;
• Neuralgias e neurites periféricas.

Contraindicações
• Marca-passo;
• Pacientes com deficit de sensibilidade;
• Síntese óssea;
• Aplicação sobre feridas abertas ou lesões dermatológicas;
• Sinais de TVP;
• Quadros infecciosos.

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Livros
Práticas da Reabilitação Musculoesquelética
MAGEE, J.; ZACHAREZEWKI, J. E.; QUILLEN, W. S. Práticas da reabilitação
musculoesquelética. 1. ed. Barueri, SP: Manole, 2013.
Livro importante sobre diversos recursos práticos utilizados na reabilitação dos
pacientes com disfunções musculoequeléticas.
Agentes Físicos na Reabilitação: da Pesquisa à Prática
CAMERON, M. Agentes físicos na reabilitação: da pesquisa à prática. 3. Ed. São
Paulo: Elsevier, 2009.
Livro que aborda sobre dor e sobre a aplicabilidade clínica de diferentes agentes
físicos no traatmento de tal desfecho clínico.
Eletrofisiologia Clínica: Eletroterapia e Teste Eletrofisiológico
ROBINSON, A. J.; SNYDER-MACKLER, L. Eletrofisiologia clínica: eletroterapia
e teste eletrofisiológico. 2. ed. Porto Alegre: ArtMed, 1995.
Livro que retrata aspectos fisiológicos e aplicabilidade clínica da eletroterapia sobre
tais aspectos.
Influência do Resfriamento e do Aquecimento Local na Flexibilidade dos Músculos Isquiotibiais
BRASILEIRO, J. S.; FARIA, A. F.; QUEIROZ, L. L. Influência do resfriamento e do
aquecimento local na flexibilidade dos músculos isquiotibiais. Rev. bras. Fisio., v. 11,
n. 1, p. 57-61, 2007. (on-line)
A Utilização da Estimulação Elétrica Nervosa Transcutânea (TENS) no Tratamento da Espasticidade:
Uma Revisão Bibliográfica
SILVEIRA, D. W. da S.; GUSMÃO, C. A. A utilização da estimulação elétrica
nervosa transcutânea (TENS) no tratamento da espasticidade: uma revisão
bibliográfica. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, 2008.

 Leitura
Influência do resfriamento e do aquecimento local na flexibilidade dos músculos isquiotibiais
BRASILEIRO, J. S.; FARIA, A. F.; QUEIROZ, L. L. Influência do resfriamento e
do aquecimento local na flexibilidade dos músculos isquiotibiais. Rev. bras. fisioter.
2007, vol.11, n.1, pp.57-61.
Artigo sobre os efeitos da redução e do aumento da temperatura na região posterior
da coxa e tal influência na flexibilidade muscular.
https://bit.ly/2CWBtcG

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Referências
BÉLANGER, A. Recursos fisioterapêuticos: evidências que fundamentam a prática
clínica. 2. ed. São Paulo: Manole, 2012. (e-book)

HALL, J. E.; GUYTON, A. C. Guyton & Hall: tratado de fisiologia médica. 13. ed.
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KNIGHT, K. L. Crioterapia no tratamento das lesões esportivas. São Paulo:


Manole, 2000.

KITCHEN, S. Eletroterapia: prática baseada em evidências. São Paulo: Manole, 2003.

PRENTICE, W. E. Modalidades terapêuticas para fisioterapeutas. 2. ed. Porto


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