Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Também tem sido muito mais difícil criticar o autismo do que rótulos
como o TDAH, uma vez que o autismo não tem nenhum tratamento
farmacêutico especí co ligado a ele e, portanto, a questão do con ito
de interesses não é tão facilmente visível. Desde a expansão do
autismo para o TEA, temos um verdadeiro pacote misto de
apresentações, problemas e níveis de funcionamento. Quando vejo
tal expansão de “diagnóstico”, co descon ado de que não estamos
lidando com um diagnóstico, mas sim com um produto de marca que
tem apelo no mercado e que, por isso, é vulnerável ao que eu chamo
o “efeito de banda elástica”, onde os limites podem ser esticados de
forma quase interminável.
No ano após Kanner ter proposto pela primeira vez o “autismo” como
diagnóstico, o pediatra vienense Hans Asperger publicou um artigo
em 1944, amplamente ignorado na época, no qual descrevia quatro
crianças sem de ciência intelectual facilmente reconhecível, mas
com problemas de comunicação social. Asperger trabalhou na
Áustria ocupada pelos nazis, numa sociedade organizada pela
ideologia nazi. Como os nazis estavam preocupados com a tarefa de
classi car os tipos humanos, o trabalho de Asperger deve ser
entendido como parte desse esforço.
No nal dos anos 70, a psiquiatra Lorna Wing viu uma semelhança
em algumas pessoas que ela via e naquelas descritas pelo Asperger.
As ideias da Dra. Wing cruzaram-se com outro psiquiatra, Michael
Rutter, e formaram a base para a expansão do conceito de autismo
em perturbações do espectro do autismo (TEA).
A revisão dos artigos seminais de Wing and Rutter revela até que
ponto esta expansão do conceito de autismo não foi o resultado de
quaisquer novas descobertas cientí cas, mas sim de novas
ideologias. Por exemplo, no seu artigo de 1981 propondo o
diagnóstico da “síndrome de Asperger”, Wing descreve seis histórias
de casos que parecem ter pouco em comum com os quatro casos
Asperger descritos no seu artigo de 1944, para além de partilhar uma
falta de empatia social.
O que irão as gerações futuras olhar para trás e dizer hoje sobre a
infância? Irão interrogar-se sobre a crueldade de criar estas
instituições obrigatórias que as crianças têm de frequentar durante a
maior parte dos primeiros 18 anos de vida, onde se espera que se
conformem às expectativas cada vez mais estreitas de
comportamentos baseados na idade, etc.? No mínimo, parece
legítimo especular sobre como as forças econômicas atuais e as
escolhas de estilo de vida in uenciaram a nossa própria visão da
infância, como isto pode afetar a forma como pensamos e criamos
as crianças de hoje, e como isto, por sua vez, pode impactar o seu
comportamento real.
À medida que cada vez mais mulheres são trazidas para o local de
trabalho – uma necessidade econômica para aumentar a força de
trabalho necessária para servir as economias de mercado – é
necessário desenvolver novas formas de autoestima para que essa
mudança no papel social da mulher seja sustentável. Como
resultado, a carreira pro ssional das mulheres tem agora mais estima
do que o papel da maternidade, que tem perdido cada vez mais o seu
estatuto de papel culturalmente valorizado dentro de uma sociedade
individualista. Este movimento para fora da esfera familiar e para a
esfera pública e do trabalho não foi igualado por um movimento
inverso correspondente de homens para fora da esfera pública e do
trabalho, para mais papéis familiares e acolhedores.
Mas, talvez haja boas razões para acreditar que a ciência tenha
levado a avanços que justi cam esta tecni cação. Talvez possamos
justi car a utilização do TEA como uma categoria por razões
cientí cas?
Artigo anterior