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ESCOLA TÉCNICA MADRE TEREZA

Aluno(a): Adria Belo


Daniele Pereira
Crislene Costa
Katiele Thomaz
Nerlane Marques

PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA INTEGRAL À SAÚDE DA MULHER

Macapá-AP
2023
RESUMO
O Programa de Assistência Integral à Saúde Mulher (PAISM) foi lançado pelo Ministério da
Saúde em 1983, sendo anunciado como uma nova e diferenciada abordagem da saúde da
mulher. Paradoxalmente, o PAISM constitui-se também na primeira vez em que o Estado
brasileiro propôs explicitamente, e implantou, embora de modo parcial, um programa que
contemplava a regulação da fecundidade. Isso suscitou suspeitas acerca de possíveis
intenções ocultas de controle da natalidade. Porém, analisando brevemente a história desse
Programa e seu significado social, conclui-se que o PAISM foi pioneiro, inclusive no cenário
mundial, ao propor o atendimento à saúde reprodutiva das mulheres, no âmbito da atenção
integral à saúde, e não mais a utilização de ações isoladas em planejamento familiar. Por isso
mesmo, os movimentos de mulheres, de imediato, passaram a lutar por sua implementação.
Seu conteúdo inclui plenamente a definição de saúde reprodutiva adotada pela Organização
Mundial da Saúde em 1988, ampliada e consolidada no Cairo em 1994 e em Beijing em
1995. Consequentemente, a adoção do PAISM representou, sem dúvida, um passo
significativo em direção ao reconhecimento dos direitos reprodutivos das mulheres, mesmo
antes que essa expressão ganhasse os diversos foros internacionais de luta.
Palavras-chave: Saúde Reprodutiva; Saúde da Mulher; Política de Saúde; Controle da
Natalidade
PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA INTEGRAL À SAÚDE DA MULHER
Em termos de políticas públicas, a atenção à saúde da mulher no Brasil, até o surgimento do
Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), traduziu-se na preocupação
com o grupo materno-infantil que, inclusive, sempre permaneceu como o mais enfatizado por
essas políticas. O enfoque central dos vários programas de saúde materno-infantil estava em
intervir sobre os corpos das mulheres-mães, de maneira a assegurar que os corpos dos filhos
fossem adequados às necessidades da reprodução social
Nesse contexto, aparentemente de forma surpreendente, surgiu, em 1983, o PAISM, sendo
anunciado como uma nova e diferenciada abordagem da saúde da mulher, baseado no
conceito de "atenção integral à saúde das mulheres" (AISM). Esse conceito implica o
rompimento com a visão tradicional acerca desse tema, sobretudo no âmbito da medicina,
que centralizava o atendimento às mulheres nas questões relativas à reprodução.
Paradoxalmente, entretanto, esse programa constituiu-se também na primeira vez em que o
Estado brasileiro propôs, oficial e explicitamente, e efetivamente implantou, embora de modo
parcial, um programa que inclui o planejamento familiar dentre suas ações, ou seja, um
programa que contemplava o controle da reprodução.
Além disso, as próprias circunstâncias e as características do processo pelo qual se constituiu
o PAISM fazem dele, ainda hoje - passados 13 anos desde o seu lançamento e constatada a
sua não implantação efetiva em todo o país - constante objeto de estudo e discussão.
Neste trabalho, o que se pretende é refletir sobre o significado do PAISM para a abordagem
da saúde reprodutiva no Brasil.
O SIGNIFICADO SOCIAL DO PAISM
O momento em que o PAISM foi lançado era de grande efervescência no Brasil, com intensa
atuação de movimentos sociais e da sociedade civil, em geral, lutando pelo restabelecimento
da democracia. Em decorrência disso, e considerando o conteúdo e os antecedentes do
Programa, é possível observar que ele reuniu condições para se constituir em um evento
socialmente relevante, um fato capaz de mobilizar muitos setores da sociedade para discuti-
lo, aprovando-o ou não.
As reações contrárias ou suspeitosas com relação ao lançamento do Programa estiveram
pulverizadas em diferentes setores da sociedade, como alguns grupos de mulheres, algumas
facções dentro de partidos políticos, membros do setor acadêmico em geral e da categoria
médica, especialmente profissionais ligados à Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil
(BEMFAM). De modo geral, essas reações estavam vinculadas a uma possível contradição
entre o conteúdo explícito do Programa (integralidade e universalidade em que supostamente
se embasaria) e as suspeitas de que o PAISM, na verdade, não passaria de um disfarce do
Governo para agir no sentido de controlar a natalidade da população.
Os que questionavam a integralidade e universalidade do programa destacavam a contradição
entre a denominação "integral" e os objetivos explicitados no conteúdo, que estariam
concentrados nos problemas de saúde decorrentes da atividade sexual e reprodutiva da
mulher. Mesmo aqueles que não centravam suas críticas nesse aspecto, consideravam que o
"integral" estava mal aplicado, porque o Programa persistia na visão, amplamente já
difundida na sociedade, de que a mulher se define pela sua capacidade de reprodução. A
exclusão do homem do Programa apresentado pelo Ministério da Saúde implicaria a noção de
que só a mulher era responsável pela reprodução, e que se o PAISM se pretendia integral e
universal deveria ser, na verdade, de atenção à saúde do adulto.
Esse argumento também era utilizado pelos setores que associavam o PAISM a intenções
controlistas, porém com uma interpretação mais abrangente. Argumentavam que, à primeira
vista, o PAISM parecia não estar voltado para a redução da natalidade, porque estaria
preocupado em atender às necessidades integrais de saúde das mulheres. Entretanto, na
verdade, o que se pretendia era atender as mulheres que tivessem atividade sexual e risco de
engravidar, justamente para controlar sua fecundidade.
Para esses críticos, as intenções controlistas ficavam claras nos próprios objetivos declarados
do Programa, voltados apenas para situações relacionadas à atividade sexual, gravidez, parto,
puerpério e contracepção. Para eles, a exclusão do homem não comprometia apenas a
integralidade e universalidade do Programa, mas indicava fortemente a intenção controlista
oculta. Isto porque o homem só estaria sendo lembrado quando se falava da vasectomia, e
apenas quando a mulher estivesse impedida de usar outras formas de anticoncepção.
Consideravam que, na verdade, o PAISM partia do pressuposto, já tradicional, de que a
mulher era a grande responsável por regular o processo reprodutivo, de maneira que cabia
atuar sobre ela massiva e intensamente a fim de alcançar um controle demográfico. Em suma,
consideravam que o governo, hesitante em assumir publicamente seu desejo de controlar a
natalidade, estaria usando o Programa proposto para justificar-se.
Entre as reações mais favoráveis ao PAISM esteve a dos grupos organizados de mulheres em
geral, que, logo de início, passaram a lutar pela implantação do Programa, considerando-o
uma resposta satisfatória, naquele momento, às suas crescentes e expressivas demandas por
uma atenção à saúde das mulheres não centralizada no cuidado materno-infantil,
especialmente desvinculada do controle da reprodução.
Essa reação pode ser constatada, por exemplo, através de documentos produzidos em
reuniões promovidas pelo movimento de mulheres como a Carta de Itapecirica, produzida a
partir de um encontro de mulheres acontecido em outubro de 1984.Nesse documento, a partir
do diagnóstico de que as condições de saúde da mulher no Brasil eram precárias,
reivindicava-se um programa integral, que atendesse às mulheres desde a infância até a
velhice, incluindo a saúde mental e as doenças causadas pelo trabalho dentro e fora de casa.
Esse programa deveria ter a preocupação de integrar prevenção e cura. Nesse sentido, entre
os encaminhamentos propostos pelo grupo reunido, enfatizou-se que fosse incentivado o
controle popular na implantação do PAISM.
Outra fonte que permite vislumbrar como o PAISM foi recebido pelos movimentos de
mulheres são artigos de opinião publicados na imprensa. Nesses artigos enfatizavam-se
aspectos políticos em relação à viabilização e implantação efetiva do Programa. Parecia haver
consenso de que se tratava de uma proposta inovadora, abrangente, voltada a assistir às
precárias condições de saúde das mulheres no Brasil, independentemente de estarem ou não
no ciclo reprodutivo. O problema sempre levantado era o de como implementar o plano,
como ativar a vontade política do governo, de forma que houvesse recursos humanos e
materiais adequados para a implementação do PAISM.
Também era comum a esses artigos situar a discussão sobre o plano apresentado pelo último
governo ditatorial em termos das lutas que se travavam naquele momento, em busca de um
projeto democrático duradouro para toda a sociedade brasileira. Apesar do consenso sobre a
qualidade do PAISM, esses artigos também remetiam à discussão acerca da necessidade de
contextualizá-lo no embate mais amplo, que se dava no sentido de conquistar e assegurar a
democracia.
Quanto às relações do PAISM com a discussão sobre planejamento familiar/controle da
natalidade, os artigos em questão não revelavam uma preocupação expressiva com elas.
Parece claro para as articulistas, em especial para Carmen Barroso, que a inclusão das
atividades de anticoncepção atendia a um anseio das próprias mulheres brasileiras, e não
tinha sido recebida por elas com desconfiança. Não se ignorava, porém, a possibilidade de
existirem intenções ocultas na adoção do PAISM, mas Barroso considerava isso superável
diante do conteúdo e da filosofia do Programa. A seu ver, ele não representava perigo de
coerção, uma vez que as atividades de anticoncepção nele previstas estavam condicionadas à
sua inserção no conjunto mais amplo das ações voltadas à atenção integral à saúde da mulher.
Os argumentos colocados por Carmem Barroso refletiam a postura dos movimentos de
mulheres em torno do direito à anticoncepção. Durante a década de 70, a posição de tais
movimentos esteve marcada pelo combate à ideia de planejamento familiar presente na
atuação da BEMFAM, de que a pobreza somente seria superada se os brasileiros tivessem
menos filhos. Logo nos primeiros anos da década de 80, os movimentos de mulheres
passaram a colocar a questão em outros termos, deslocando o eixo da discussão para situar a
anticoncepção no contexto da atenção integral à saúde.
Os movimentos intensificavam, então, o questionamento acerca de qual tipo de atendimento à
saúde as mulheres precisavam e queriam receber. As reivindicações eram feitas justamente a
partir da queixa de que, em geral, os médicos encaravam as mulheres principalmente, quando
não apenas, como úteros gravídicos.
Foi a partir da interlocução entre representantes dos movimentos de mulheres com pessoal da
área da saúde, sobretudo os profissionais ligados ao grupo da UNICAMP, aqui já referido,
além de sanitaristas, sociólogas e psicólogas, que se consolidou a ideia de atenção integral à
saúde da mulher, que passou a vigorar no PAISM.
Nessa interlocução, as mulheres argumentaram que o conceito de integral deveria enfatizar
não só a integração do colo, do útero e das mamas, mas também de outros aspectos não
físicos da vida das mulheres. O que elas defendiam era que o integral se referisse também ao
contexto social, psicológico e emocional das mulheres a serem atendidas. Em termos
pragmáticos, que o médico, ao prestar assistência, concebesse a mulher como um ser
completo, não apenas portadora de um corpo, mas vivendo um momento emocional
específico e inserida em um determinado contexto socioeconômico. Além disso, os
movimentos de mulheres insistiram em que o PAISM incluísse ações definidas de educação
sexual e em saúde, para afastar qualquer possibilidade de ele ser usado para o controle
populacional coercitivo.
Diante do exposto, é possível depreender que o lançamento do PAISM teve um amplo
significado social, constituindo-se em elemento catalizador de debates, bastante importantes
naquele momento histórico de democratização da sociedade brasileira.
Parece evidente que o ponto crucial do conteúdo do PAISM foi mesmo a inclusão da
anticoncepção como uma das atividades da assistência integral à saúde da mulher. Isto porque
essa inclusão se contrapôs à abordagem do planejamento familiar que era largamente
praticada no país até então, norteada pelas concepções disseminadas pela BEMFAM.
Historicamente, pelo tradicional enfoque dado à regulação da reprodução via o controle do
corpo feminino, é compreensível que se tenham levantado suspeitas sobre a vinculação do
PAISM à questão do controle populacional, sobretudo em vista do momento em que o
programa foi lançado, exatamente quando o governo brasileiro sofria pressões externas para
adotar uma política demográfica explícita, e justamente durante uma CPI para investigar o
crescimento populacional. Essas suspeitas foram rebatidas com veemência pelo Ministério da
Saúde, mas não apenas por ele. A propósito disto, é importante dar voz àqueles que foram
responsáveis diretos pelo conteúdo do programa. A Dra. Ana Maria Costa, uma das
elaboradoras do programa, escreveu: "O Programa de Assistência Integral à Saúde da
Mulher surge em 1983, representando uma esperança de resposta ao dramático quadro
epidemiológico da população feminina. Neste sentido grandes esforços foram empreendidos
pelos movimentos sociais, particularmente o de mulheres, visando à implantação daquela
prática assistencial, convencidos de que aquele modelo assistencial proposto pelo PAISM, é
capaz de atender às necessidades globais da saúde da mulher".
Nesse mesmo sentido pronunciou-se em uma entrevista pessoal outro dos elaboradores do
PAISM, o Dr. Anibal Faúndes. Para ele, tais suspeitas sobre as possíveis intenções encobertas
do programa revelavam, da parte dos que as levantavam, "uma escandalosa ignorância"
acerca da situação da saúde das mulheres brasileiras no momento em que o PAISM foi
lançado. Segundo o Dr. Faúndes, especificamente em relação à anticoncepção, naquela época
já estava constatada a inadequação do uso de pílulas, utilizadas por um grande número de
mulheres, compradas livremente nas farmácias ou distribuídas indiscriminadamente por
entidades como a BEMFAM; também já se alertava sobre a "progressão perversa" da
prevalência da ligadura tubária. Entretanto, justamente quando se propôs a ampliação das
opções anticoncepcionais para evitar essas distorções, e a colocação das atividades de
contracepção no contexto de uma atenção integral à saúde das mulheres, e sob supervisão do
Ministério da Saúde, é que se levantaram suspeitas de que se pretendia controlar a natalidade
no país.
Parece, portanto, que está mais próximo da realidade entender a inclusão das atividades de
contracepção no PAISM como a estratégia política que o governo brasileiro encontrou para
administrar e manter sob controle pressões externas e internas presentes no momento em que
o programa foi lançado. Vale lembrar que o governo, através do Ministério da Saúde, foi
impelido a responder às demandas sociais no sentido de assumir uma posição clara quanto ao
seu envolvimento nas questões relativas ao crescimento populacional e à regulação da
fecundidade. Nesse sentido, pode-se dizer que foi obrigado a sair de sua posição ambígua
mantida nessa área, sustentada desde os anos 50.
É possível supor que, caso o governo, atendendo às pressões externas, propusesse uma
política de controle da natalidade naquele momento de efervescência social e política, a
oposição interna a tal medida criaria ainda mais problemas para o regime militar, que já
desgastado preparava-se para abandonar o cenário nacional. Ao contrário, ao lançar o
PAISM, o governo pode responder às pressões externas para que adotasse uma política
relacionada à regulação da fecundidade, com um programa que preservava a sua posição
oficial no cenário internacional, defendida em Bucareste, 1974. Ao mesmo tempo, atendeu
intensas reivindicações dos movimentos de mulheres, cuja atuação era expressiva naquele
momento histórico. De fato, a adoção do PAISM conseguiu surpreender até a oposição, que,
em grande medida, reconheceu os méritos da proposta.
Por outro lado, o PAISM se insere no contexto das mudanças ocorridas nas políticas de saúde
nos anos 80, decorrentes da intensa discussão que vinha se realizando desde os anos 70 sobre
universalidade e integralidade, no âmbito do Movimento Sanitário. Tais mudanças
aconteceram à medida que, paulatinamente, foram se incorporando os conceitos de
universalidade e integralidade às políticas públicas na área da saúde. O Plano Prev-Saúde,
lançado em 1980, mas que nunca chegou a ser implementado, incluía as principais teses de
descentralização, hierarquização e regionalização da atenção à saúde, oriundas do Movimento
Sanitário.
Na sequência dessas mudanças, ao final de 1981 a Presidência da República criou o Conselho
Nacional de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP), que em 1982 propôs o
Plano de Reorientação da Assistência Médica da Previdência, que insistia na descentralização
e utilização prioritária dos serviços públicos na cobertura assistencial à clientela. A partir
desse plano foram lançadas, ainda 1982, as ações integradas de saúde (AIS), que permitiam
avançar na adoção dos princípios de universalização, de equidade e de integração dos
serviços de saúde.
Quando o PAISM foi lançado, expressou pragmaticamente a aplicação dos princípios de
universalidade e integralidade, enfatizando a utilização das AIS. Nesse sentido, pode se dizer
que tal Programa representou um importante passo no caminho percorrido pelas ideias que
levaram à Reforma Sanitária, passando pela VIII Conferência Nacional de Saúde, em março
de 1986, e culminando com os debates na Assembleia Nacional Constituinte, sendo que na
Constituição de 1988 boa parte das reivindicações do Movimento Sanitário foram
contempladas, inclusive a garantia de que o Sistema Único de Saúde - SUS seria constituído.
O PAISM E A SAÚDE REPRODUTIVA NO BRASIL
Diante do que se discutiu até aqui, não há como deixar de reconhecer a importância do
PAISM na abordagem à saúde reprodutiva no Brasil. A sua relevância fica clara ao se
evidenciar o seu significado social, destacando-se a sua singularidade enquanto uma proposta
de mudança na maneira como até então a saúde das mulheres era tratada, bem como a
incorporação em seu conteúdo dos princípios de integralidade e universalidade da atenção à
saúde.
O conceito de atenção integral à saúde da mulher redimensiona o significado do corpo
feminino no contexto social, expressando uma mudança de posição das mulheres. Ao situar a
reprodução no contexto mais amplo de atenção à saúde da mulher vista como um todo, o
PAISM rompeu com a lógica que, desde há muito tempo, norteou as intervenções sobre o
corpo das mulheres. No contexto do PAISM, as mulheres deixaram de ser vistas apenas como
parideiras, e o cuidado de sua saúde não deveria mais restringir-se à atenção pré-natal, ao
parto e puerpério.
Além disso, em consequência desse novo enfoque, as ações voltadas à regulação da
fecundidade passaram a ser concebidas como parte da atenção completa à saúde que as
mulheres deveriam receber, e não mais como fins em si mesmas. Nesse sentido, o PAISM foi
pioneiro, inclusive no cenário mundial, ao propor o atendimento à saúde reprodutiva das
mulheres e não mais a utilização de ações isoladas em planejamento familiar. Embora a
proposta original do PAISM não explicite jamais a expressão "saúde reprodutiva", que seria
conhecida internacionalmente apenas no final dos anos 80, sua concepção de atenção integral
à saúde inclui plenamente a definição de saúde reprodutiva adotada pela Organização
Mundial da Saúde em 1988, ampliada e consolidada no Cairo em 1994 e em Beijing em
1995. Consequentemente, a adoção do PAISM representou, sem dúvida, um passo
significativo em direção ao reconhecimento dos direitos reprodutivos das mulheres, mesmo
antes que essa expressão ganhasse os diversos foros internacionais de luta.
É verdade, porém, e não se pode deixar de registrar, que a implementação efetiva do PAISM
em todo o território nacional não aconteceu. Dados disponíveis apontam a morosidade, o
descompasso entre a discussão, o planejamento e as medidas práticas, o que traduz a falta de
compromisso político para com a implementação do programa.
Entretanto, não se pode analisar tal fato de forma isolada e exclusiva. Vê-se a inoperância do
programa juntamente com o caos de todo o sistema público de saúde, que tem sido debatido
exaustivamente nos dias atuais. A saúde das mulheres não é bem tratada, da mesma maneira
que a saúde das crianças, dos homens, da população em geral, não recebe a atenção
necessária nos serviços públicos. O SUS não consegue firmar-se em termos de resultados
positivos e visíveis para a população em geral. A deterioração dos serviços públicos de saúde
é generalizada, e a expectativa de melhora não parece próxima. Portanto, o que tem se
passado com o PAISM não surpreende, embora deva ser lamentado pelo potencial de
melhoria na atenção à saúde das mulheres que está sendo desperdiçado.
Apesar dessa situação, as concepções em que o programa se sustenta sobreviveram ao tempo
e à negligência do poder público em seu processo de implantação, e continuam a ser
defendidas pelas pessoas genuinamente preocupadas com a saúde das mulheres. Mais do que
nunca, a proposta do PAISM é atual, amplamente respaldada nas posições defendidas no
Cairo e em Beijing por aqueles que se acham comprometidos com a defesa dos direitos
reprodutivos. Justamente por sua força conceitual, o PAISM não deve ser abandonado. Ao
contrário, devem-se redobrar os esforços no sentido de pressionar o governo a efetivar a sua
implementação em todo o país. Mais uma tarefa para as mulheres organizadas e, em geral,
para todos os que se interessam em promover um atendimento de boa qualidade à saúde
reprodutiva.
MÉTODOS CONTRACEPTIVOS DISPONIBILIZADOS NO SUS
O planejamento sexual e reprodutivo é condição importante para a saúde das mulheres e
homens adolescentes, jovens e adultos. Todos os indivíduos têm o direito de decidir de forma
livre e responsável se querem ou não ter filhos(as), quantos filhos(as) desejam ter e em que
momento de suas vidas. Desta forma, todos têm direito à atenção em planejamento
reprodutivo, ou seja, acesso aos métodos e técnicas para a concepção e a anticoncepção, mas
também a informações e acompanhamento por um profissional de saúde, num contexto de
escolha livre e informada. Também têm direito de exercer a sexualidade e a reprodução livre
de discriminação, imposição e violência.
Os métodos contraceptivos são recursos que podem ser comportamentais, medicamentosos,
ou cirúrgicos, usados pelas pessoas para evitar a gravidez indesejada. Existem métodos
femininos e masculinos, reversíveis e irreversíveis.
Os métodos reversíveis são aqueles que, como diz o nome, podem ser revertidos. Ou seja,
quando a pessoa deixa de utilizá-los, poderá engravidar. Já os métodos irreversíveis, como a
ligadura de trompas uterinas/ laqueadura e a vasectomia, são aqueles que, após utilizados, é
muito difícil a pessoa recuperar a capacidade de engravidar. Por isso, para optarem por esses
métodos as pessoas precisam estar seguras de que não querem mais ter filhos.
É importante lembrar que dentre todos os métodos contraceptivos, os preservativos feminino
e masculino são os únicos que oferecem proteção contra doenças sexualmente transmissíveis,
inclusive o HIV/aids e as hepatites virais.
A escolha do método anticoncepcional deve contar com o auxílio e orientação de um
profissional de saúde que oriente quais os métodos disponíveis, como utilizá-los, quais as
vantagens e desvantagens de cada um e avalie junto com a mulher, o homem ou os dois qual
o método mais indicado para cada situação. Estar bem-informado é fundamental para se fazer
a melhor escolha.
Os e as adolescentes também têm direito ao acesso aos métodos contraceptivos, inclusive a
pílula de emergência, e à confidencialidade e sigilo sobre sua atividade sexual e prescrição de
métodos contraceptivos, não sendo necessário o consentimento ou participação dos
pais/responsáveis nas consultas, conforme Estatuto da Criança e do Adolescente.
Pílula anticoncepcional combinada
São pílulas que contêm dois hormônios similares produzidos pelos ovários da mulher, o
estrogênio e a progesterona. Podem ser usadas por quase todas as mulheres com segurança e
eficácia. A pílula deve ser tomada, sem interrupções, durante 21 dias, de preferência no
mesmo horário, todos os dias.
As pílulas combinadas podem ser usadas por mulheres de qualquer idade, a partir da primeira
menstruação, desde que não apresentem nenhuma contraindicação para o seu uso.
Não deve ser utilizada durante a amamentação, pois interfere na qualidade e na quantidade do
leite materno.
Minipílula anticoncepcional
É uma pílula que contém apenas um dos hormônios, a progesterona. Mais indicada durante a
amamentação, iniciando o seu uso na 6ª semana após o parto.
Anticoncepcionais injetáveis
Os anticoncepcionais injetáveis também são feitos de hormônios similares aos das mulheres.
Existem dois tipos de injetáveis: injetável mensal e injetável trimestral.Tal qual as pílulas
anticoncepcionais, as injeções mensais são compostas de estrogênio e progesterona. Com a
interrupção da injeção mensal, a fertilidade da mulher, que é a capacidade de engravidar, logo
retorna, já com a trimestral, pode haver um atraso no retorno da fertilidade da mulher. A
injeção trimestral pode ser usada durante a amamentação e, nesse caso, seu uso deve ser
iniciado seis semanas após o parto. Com o uso da injeção trimestral, é muito frequente a
mulher ficar sem menstruar e, em média, o retorno da fertilidade pode demorar quatro meses
após o término do efeito da injeção.
Diafragma
O diafragma, método anticoncepcional de barreira e não hormonal, é um anel feito de silicone
ou látex, tem bordas firmes e flexíveis, praticamente não apresenta efeitos colaterais, nem
contraindicações. O método é uma opção importante para mulheres que não se adaptam aos
métodos hormonais e pode ser interrompido a qualquer momento. As mulheres são
diferentes, por isso existem diversos tamanhos de diafragma, sendo necessária a medição por
profissional de saúde. O diafragma deve ser colocado em todas as relações sexuais antes de
qualquer contato entre o pênis e a vagina e deve ser retirado oito horas após a última relação
sexual.
Dispositivo intrauterino – DIU
O DIU é um pequeno objeto de plástico revestido de cobre, colocado no interior da cavidade
uterina com fins contraceptivos, de caráter temporário e reversível. Ele não provoca aborto,
porque atua antes da fecundação.
É um método altamente eficaz, que não apresenta os efeitos colaterais do uso de hormônios e
pode ser utilizada para prevenir a gravidez por um período de até 10 anos. O DIU pode ser
retirado no momento em que a mulher desejar, permitindo que ela volte imediatamente à sua
capacidade de engravidar. Não interfere nas relações sexuais nem na qualidade ou
quantidade do leite materno. É contraindicado para mulheres que têm mais de um parceiro
sexual, ou cujos parceiros têm outros parceiros/parceiras, e não usam preservativo em todas
as relações sexuais.

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