Muita gente tem dúvidas a respeito dos crimes contra a
liberdade sexual e, por vezes, acabam misturando as coisas
incorrendo em erro. Diante disto, neste breve artigo vamos ver as principais diferenças dos crimes do art. 213, 215 e 216A.
O crime de Estupro(art. 213) que consiste em “Constranger
alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” tem por principal elemento a prática da violência e da grave ameaça mesmo que não haja a conjunção carnal, bastando, apenas, o constrangimento a sua prática ou qualquer outro ato libidinoso com pena de reclusão de 6 a 10 anos. Caso essa conduta resulte lesão corporal grave ou gravíssima ou a vítima for menor de 18 ou maior de 14 anos a pena será de reclusão de 8 a 12 anos. E, se resultar morte a pena será de reclusão de 12 a 30 anos. A Violação Sexual Mediante Fraude (art. 215) também chamada de estelionato sexual consiste em “ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”. Nesse crime a vítima é levada à prática de conjunção carnal ou ato libidinoso sem sua anuência, sendo impedida ou dificultada a manifestação de sua vontade por meio de fraude praticada pelo agente, sem violência ou grave ameaça. Se a finalidade dessa conduta for à obtenção de lavagem econômica será aplicada, além da reclusão de 2 a 6 anos, multa. O Assédio Sexual (art. 216-A) por sua vez é “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. Esse tipo de crime acontece, geralmente, no ambiente de trabalho, onde a funcionária é assediada por seu patrão ou outro funcionário em grau de superioridade. No qual, é constrangida com investidas por estes no intuito de obter relações sexuais, gerando grande sofrimento psicológico à vítima que, por medo de perder o emprego se encontra numa situação extremamente delicada. Vale salientar que neste crime não há a violência e a grave ameaça (elementos do tipo penal de Estupro). Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual, este é o que possui menor pena. Detenção de 1 a 2 anos, podendo ser aumentada em 1/3 se a vítima for menor de 18 anos. Com isso, finalizamos este sucinto artigo, não esgotando o conteúdo do tema abordado é claro, expondo as principais características de cada crime do rol de Crimes Contra a Liberdade Sexual disposta no Decreto Lei 2.848/40 - Código Penal.
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Neste mês de novembro, a Justiça do Rio Grande do Sul
condenou um médico por posse sexual mediante fraude a três anos de reclusão. De acordo com a apuração probatória, uma paciente, agricultora, dirigiu-se à clínica, pois sentia fortes dores em sua coluna.
O réu, médico especialista na moléstia, mandou que a paciente
virasse de costas e abaixasse suas roupas. Ato contínuo, passou um gel em suas genitálias e disse estar seguindo o procedimento normal, oportunidade em que a vítima, por se sentir desconfortável e com dores, virou-se e se deparou com o médico despido, penetrando-a.
Aparentemente, não houve violência nem grave ameaça e o réu
foi condenado em primeira instância por posse sexual mediante fraude, condenação essa mantida pelo TJ/RS, majorando a pena para três anos de reclusão, em regime aberto[1].
O crime de posse sexual mediante fraude (também conhecido
como “estelionato sexual”) está tipificado no artigo 215, caput, do Código Penal, sendo recentemente modificado pela Lei 12.015/09, tendo seu nomen iuris alterado para violação sexual mediante fraude. Com esta reforma, subtraiu-se a expressão “mulher honesta” (acertadamente, afinal tal expressão não condiz com o avanço de nossa cultura) e exige-se, então, que o agente se valha da fraude ou de qualquer outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vítima, para com ela ter conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso.
Aqui, imperioso ressaltar que a vontade da vítima não é
vencida pela violência ou grave ameaça, pois a dor reclamada foi a do ato sexual, mas sim por um engodo criado pelo agente capaz de ludibria-la (que pode ser homem ou mulher) sobre a legitimidade da relação sexual.
Já o crime de estupro, por sua vez, está tipificado no
artigo 213 (forma simples) e parágrafos (formas qualificadas), do Código Penal e exige, expressamente, que o agente empregue violência ou grave ameaça à vítima, a fim de constrangê-la a ter conjunção carnal ou praticar qualquer outro ato libidinoso. Logo, a expressão “mediante violência ou grave ameaça” é o que distingue os dois crimes ora tratados.
Dessa forma, tem-se que, no caso sub studio, o réu não obrigou
a examinada, mediante violência ou grave ameaça, a com ele ter conjunção carnal. Por outro lado, valendo-se de sua formação médica, ludibriou a vítima para que com ela pudesse ter o ato carnal, ainda que não autorizado. O tipo penal do artigo 215, CP, não exige autorização daquela, mas demanda apenas que o engodo dificulte ou impeça a livre manifestação quanto à relação sexual. Com efeito, o médico, por meio de um ardil consistente em camuflar uma relação sexual em um suposto exame médico de coluna, conseguiu iniciar a prática da relação sexual, deixando vestígios que foram comprovados nos exames periciais específicos.
A pena máxima cominada em abstrato para o crime de violação
sexual mediante fraude é de seis anos de reclusão, tendo o TJ/RS aplicado apenas três, ainda em virtude do recurso ministerial, haja vista a pena em primeira instância ter sido aplicada no mínimo legal, seguindo a conhecida política da aplicação da pena mínima.
Alguns magistrados, desconsiderando a expressa disposição do
artigo 59, caput, CP, não analisam as circunstâncias do crime, a personalidade do agente, sua culpabilidade, conduta no momento da dosimetria da pena. Apenas a aplicam em seu mínimo legal. O caso em questão com todo respeito ao E. Tribunal, que ainda ampliou a pena imposta no r. decisum de primeira instância, demanda uma aplicação mais severa da lei, haja vista o alto grau de reprovabilidade da conduta do réu, além de constituir um reclamo da comunidade. Trata-se de um profissional da área da saúde que tem o dever e a obrigação de minorar ou curar doenças e, deliberadamente, ludibriou a boa-fé de uma agricultora, mantendo com ela conjunção carnal. Tanto é que, ainda com a majoração, ao condenado foi imposta uma pena de três anos, a ser cumprida em regime aberto. Vale dizer, para a sociedade em geral emana uma sensação de injustiça ou, pelo menos, de ausência de resposta do Poder Judiciário em casos graves que contaminam nosso convívio social.