Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Faz-se importante salientar que a divisão entre Filosofia e Teologia é algo ainda
moderno. No período medieval existiu uma filosofia que buscava resolver questões
dogmáticas por vias racionais, ou questionava o dogmatismo cristão pelas mesmas
vias. Buscou-se, acima de tudo, como em qualquer outro momento da filosofia, a
verdade.
A partir de então, Agostinho, se sente atraído por outros horizontes, que lhe
impulsionam a buscar um conhecimento segundo a filosofia eclesiástica que vinha
surgindo, resignificando os ensinamentos de Platão e Plotino, abandonando a doutrina
maniqueísta até tornar-se um dos principais Padres da Patrística.
É evidente, até um pouco obvio para nós, que existem lembranças em nosso
ser. Qualificadas, articulam entre si segundo influencias de algumas representações
abstratas, ruminando o que se passou. Não constitui um simples recordar do passado.
É função sim, da memória, relembrar; mas suas capacidades não se prendem a isto.
Para além de uma simples recordação, a memória é reveladora de nossa existência;
um lugar propício para um fecundo encontro consigo mesmo e com Deus, que habita
em nosso interior. Como diz Santo Agostinho no parágrafo 12:
Essas palavras possuem uma carga de beleza tão admirável, que não ouso citá-
la de forma ramificada. Cito sem retirar uma palavra sequer, tal como o corpo do texto
se constitui. Devido a sua magnitude, é evidente em Agostinho uma admiração sem
limites, como ele mesmo vai falar posteriormente no decorrer do texto ora citado.
A questão sobre o que é o homem, é uma questão sobre a própria pergunta, que
envolve o mistério de onde a filosofia emerge como epistemologia do ser e do universo.
Porém, o autoconhecimento de um determinado indivíduo se concretiza na medida em
que este refaz o seu caminho, a partir de suas memórias, e transcende interiormente
superando aquilo que já não é, pois mudou por consequência do resgate de suas
lembranças. Seria então, a capacidade de resignificar os elementos propostos pela
realidade.
Por fim, no último parágrafo Agostinho afirma que nele reside “não os próprios
objetos, mas as suas imagens.” E que conhece com que sentido do corpo lhe foi
impressa cada imagem. Entretanto, não são os objetos que ocupam a memória e sim
suas imagens, ou seja, as ideias. O mundo suprassensível se concretiza na matéria,
que por sua vez, reflete na memória.
Sobre a relação da filosofia tomista com a aristotélica, vejamos o que diz Urbano
Zilles:
No que diz respeito aos principais temas abordados por Tomás de Aquino em
suas empreitadas filosóficas, alguns conceitos assumem maior destaque, bem como
nos auxiliam para uma melhor compreensão de seus ensinamentos. São eles:
3
O primeiro é somente Deus, pois possui como próprio o ato de ser; o segundo é o mundo e o homem, por
possuírem o ser apenas por participação.
ente no sentido de que todo ente é inteligível. Mas
isso pode ser dito em dois sentidos: de um lado,
para afirmar que existe uma verdade ontológica 4, e
por outro lado (...) uma verdade lógica 5. A verdade
de um ente depende do grau de ser que possui;
neste sentido, Deus, que é sumo ente, é também
suma verdade. Por fim, tudo o que é, é também
bom porque é fruto da bondade difusiva de Deus.
Nessa luz Deus se apresenta como Sumo bem.”
(grifo nosso)
Para inicio de conversa, Tomás evidencia as teses de que pareceria não existir
verdade nos sentidos, e elenca pensamentos correspondentes à defesa deste ponto de
vista. Para Anselmo a verdade consiste na retidão, perceptível exclusivamente à
inteligência; Agostinho demonstra que a verdade do corpóreo não é conhecida pelos
sentidos e por tal motivo não residirá nos sentidos. A contratese seria, obviamente, que
a verdade reside também nos sentidos.
Sabemos que a verdade pode ser tanto relativa, imutável quanto real, e
dependendo de tal situação, corresponder-se-á de forma relacional ou não, com os
sentidos. A verdade em relação ao conhecedor é relativa; com a fonte, imutável;
conforme o objeto, real. Podemos então, observar, que a verdade ainda que existindo,
é desvelada diversamente.
Com efeito, o filósofo Sávio Laet de Barros Campos, em seu ensaio “Da Verdade
em Santo Tomás” partilha sobre a verdade conhecida pelo intelecto e sobre a
impossibilidade de conhecimento da verdade sobre os sentidos. Vejamos:
6
“Ora, esta conformidade, o sentido não a conhece de modo algum (...)”.
7
“Quanto ao intelecto, ele pode conhecer sua conformidade com a coisa inteligível.”
secundum quod cognoscit de aliquo quod quid est
(...)”8.
8
“No entanto, não é pelo fato de conhecer a essência da coisa que ele (o intelecto) apreende essa conformidade
(...)”
AGOSTINHO. Confissões
MIRANDA, José Carlos de; A memória em Santo Agostinho: Memoria Rerum, Memoria
Sui, memoria Dei. Revista Humanitas – vol. LIII, Coimbra: 2001, P. 225 – 246.