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Aspectos Biológicos da Fragilidade e suas

relações com a Funcionalidade e Vulnerabilidade


Social
● A partir de estudos longitudinais, pode-se observar que muitos idosos alcançavam a velhice
avançada em boas condições de saúde e funcionalidade;
● Década de 1990: “ser frágil” foi sendo gradativamente substituído por “tornar-se frágil”,
acreditando-se ser essa estrutura uma condição que, embora relacionada, é independente da
presença de multimorbidade, incapacidade e vulnerabilidade essencialmente social;
● 1992 - Conferência:
- discussão sobre fisiologia da fragilidade;
- controvérsias sobre sua definição e compreensão limitada de sua etiologia;
- ocasionaria o atraso da adoção de estratégias preventivas, pois essa síndrome
constituía a maior ameaça a uma expectativa de vida ativa;

● Fried et. al. (1998), Fried et.al. (2001) e Fried et. al. (2010) sugeriram que fragilidade e
“failure to thrive" representavam o continuum de uma síndrome clínica, sendo o segundo sua
manifestação mais extrema associada a ineficácia de recuperação e proximidade com a morte.

O que é Fragilidade? Explicando sua biologia


● Canadian Initiative on Frailty and Ageing: Decorrente do acúmulo de vários fatores -
doenças potencialmente não relacionadas, disfunções subclínicas e deficiência em
determinados órgãos, partes ou sistemas do organismo;
● Fried et. al (2001), Fried e Walston (2003) e Fried et. al. (2010) - processo
fisiopatológico único, resultante de alterações em uma série de mecanismos
biológicos que leva a modificações de múltiplos sistemas e, eventualmente, ao
rompimento do equilíbrio homeostático.
● Os sistemas são inter-relacionados; formam uma rede de regulação homeostática que
apresenta, quando integra, habilidade compensatória aos estressores, graças à sua
reserva e resiliência.
● Desregulação de múltiplos sistemas e diminuição da efetividade dessas interconexões
podem conduzir à perda dessas reservas e, consequentemente, comprometer a
manutenção da homeostase diante dos estressores.
● Quando a fragilidade surge? - quando a capacidade fisiológica para responder de
maneira apropriada a situações dinâmicas estressoras (exercícios, temperaturas
extremas, doenças agudas) mostra-se insuficiente ou inadequada, possivelmente
associada ao intervalo e à complexidade de resposta ao estressor que, agora, o
organismo é incapaz de elaborar.
● Estreitamento regulatório: ocorre a diminuição na efetividade das respostas
compensatórias.
● A perda de reserva agregada em múltiplos sistemas pode conduzir a um declínio
global na habilidade do organismo como um todo em tolerar estressores, aumentando,
assim, o risco de ocorrência de desfechos adversos associados à fragilidade.
● Tais mudanças levariam a uma espiral negativa de declínio funcional. Os principais
sistemas envolvidos incluíram os que mantêm a estabilidade na produção, distribuição
e utilização de energia - processos hormonais, imunológicos, inflamatórios e
neurológicos.
● Diminuição da energia - comprometimento funcional e progressivo declínio no
funcionamento físico.

● Organismo saudável: rede homeostática complexa, adaptando-se, de forma rápida e


flexível, a diferentes tipos de perturbações internas e externas.
● Mecanismo patogenético único, bem definido, proposto por Fried et. al. (1998) e
Fried et.al. (2001) como um ciclo decrescente de energia, cujas manifestações clínicas
aumentariam à medida que a fragilidade se agravasse.

Evidência do Fenótipo da Fragilidade


● Perda de peso não intencional;
● Redução da força de preensão - fraqueza;
● Redução da velocidade de marcha;
● Baixa atividade física;
● Fadiga auto relatada;

● O declínio nas reservas em múltiplos sistemas não explica necessariamente a


síndrome de fraqueza, perda de peso e declínio da atividade, bem como as
anormalidades observadas no equilíbrio e na marcha.
● A integração desses sinais e sintomas clínicos ocorreria como um segundo estágio da
fragilidade quando a reserva acumulada declinaria a um nível limítrofe.
● Esta síndrome pode, portanto, ser compreendida como um continuum que avança de
um estado latente de alterações fisiológicas para a síndrome clinicamente aparente.
● Três sistemas fisiológicas parecem ser componentes integrais da fragilidade e centrais
na compreensão das causas relacionadas com a maior vulnerabilidade aos estressores
associados à síndrome;
● São eles: sarcopenia ou perda de massa muscular, disfunção imunológica e
desregulação neuroendócrina.

Sistema imunológico: composto por um complexo e interativo grupo de órgãos, tecidos e


células que agem em conjunto para defender o organismo contra agressões externas de
maneira rápida e apropriada.
A produção de anticorpos declina com o avançar da idade e, por atuarem na primeira linha de
defesa do organismo contra todos os tipos de antígenos, quando em níveis mais baixos,
tornam os indivíduos idosos mais vulneráveis ao ataque e à propagação de infecções.

Em contrapartida, o nível de autoanticorpos não relacionados com uma disfunção autoimune


identificável aumenta de acordo com a idade;
O número de marcadores de inflamações encontra-se elevado nos indivíduos idosos;
Esse aumento parece vir do declínio dos mecanismos regulatórios que permitem que as
células ativadas continuem secretando potentes agentes catabólicos bem depois de o estímulo
ter sido iniciado.
Exposição crônica a elevados níveis desses agentes pode contribuir com o ciclo de
fragilidade, pela influência catabólica no músculo e piora na desregulação neuroendócrina
mediante aumento da estimulação adrenocortical.
O somatório de aumento da vulnerabilidade a infecções com aumento do estado inflamatório
geraria um subgrupo de indivíduos especialmente vulneráveis a estressores, contribuindo,
assim, para o desenvolvimento da fragilidade.

Sistema neuroendócrino: funciona de maneira integrada com o sistema regulatório, que


monitora os estímulos internos e externos e mantém o equilíbrio homeostático.
A perda de complexidade dos sistemas com o envelhecimento está relacionada com a
diminuição de reserva e a variação e precisão de sua resposta.
O efeito agregado de sarcopenia, a disfunção imunológica e a desregulação neuroendócrina
possivelmente sejam a maior vulnerabilidade do organismo aos estressores e a menor
capacidade de adaptação, compensação ou adequação diante deles.
Cada um desses componentes exerce efeito significativo sobre os outros, conduzindo ou
acelerando o declínio em outros mecanismos regulatórios que, ao final, podem contribuir para
os desfechos clínicos da fragilidade independente de qualquer processo de doença específico.
Essas alterações subjacentes podem ser precipitadas por doenças, lesões ou medicações.]

Causas primárias de fragilidade:


modificações genéticas;
danos oxidativos ao DNA;
encurtamento dos telômeros;

Causas secundárias:
depressão;
câncer;
infecções crônicas;
insuficiência cardíaca congestiva (ICC);

Tudo isso levaria a desregulação neuroendócrina, imunológica, consequente sarcopenia,


desencadeando na síndrome.

Failure to thrive
Considerada um diagnóstico clinicamente significativo em muitos artigos de revisão, foi
importado da Pediatria na década de 1970 e incluído na Classificação Internacional de
Doenças, nona revisão (CID-9) em 1979 (R62.8 - Outras formas de retardo no
desenvolvimento fisiológico normal).

Na área da gerontologia foi, inicialmente, utilizado para descrever a condição de alguns


idosos residentes em ILPI´s que gradualmente apresentavam pouco apetite, perdiam peso,
afastaram-se das atividades sociais e evidenciaram declínio em sua condição física e
cognitiva.

Fragilidade e “failure to thrive” são termos muitas vezes utilizados de modo intercambiável.
No entanto, “failure to thrive” costuma ser mais utilizado para descrever o estágio final do
declínio decorrente da síndrome, quando ela se torna irreversível.

Particularmente, refere-se a um subgrupo de idosos frágeis, geralmente apresentando


incapacidade e dependência, com significativa perda de reserva e de resiliência, tornando-os
incapazes de responder às intervenções terapêuticas, o que lhes confere, assim, grande
possibilidade de óbito em um período inferior a 12 meses.

Fragilidade, Funcionalidade e Vulnerabilidade


Incapacidade, comorbidades e fragilidade se interrelacionam;

Vulnerabilidade: etimologicamente vem do latim.


vulnerar = ferir; vulnerabilis = que causa lesão;

Refere-se tanto a um grupo de pessoas momentaneamente incapazes de exercer sua liberdade


por uma contingência física ou como consequência de seu percurso de vida, como a um grupo
também incapaz, mas por consequências “sociais” e/ou “políticas”.

Assume diferentes formas e dimensões, destacando-se, entre elas:


biológica - contínuos desequilíbrios ocasionados por elementos desestruturantes causaria essa
tipologia; exige mais do sistema homeostático;
psicológica - dependente da construção da psique da pessoa com base em suas experiências
afetivas e imagináveis;
espiritual;
social, cultural e ambiental - produzidos pelo entorno sociocultural

Vulnerabilidade social: multidimensional; afeta diferentes formas e intensidades, indivíduos,


grupos e comunidades em planos distintos de seu bem-estar.
Resultante da combinação de fatores que produzem a deterioração do nível de bem estar de
pessoas, famílias ou comunidades em consequência da exposição a determinados tipos de
risco.

Portanto, a vulnerabilidade pode ser considerada dinâmica (compreensão dos eventos que
causam dano, das relações sociais, culturais, políticas e econômicas e da situação das
instituições, que revelarão os elementos sociais capazes de responder, absorver ou se ajustar
ao perigo, de forma que qualquer alteração em seus componentes possa aumentá-la ou
diminuí-la)

Resiliência: capacidade de adaptação às situações adversas ligadas aos recursos internos


(intrapsíquicos) e externos (ambiente, social e afetivo), que permitem aliar uma construção
psíquica adequada à inserção social.

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