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Alterações fisiológicas do envelhecimento – 10/10/2020

As alterações fisiológicas vão ter impacto na manifestação de sintomas, interferir com a medicação
e a qualidade de vida. O que é um idoso – definição com idade cronológica? Legalmente
(fenómenos sociais – reforma – a aptidão para o trabalho é menor) é uma idade igual ou superior a
65 (ou 67), mas é um conceito muito subjetivo. Enquanto médicos, não nos importa tanto a idade
cronológica, mas a biologia – e a forma como envelhecemos é diferente. Em termos médicos e
sociais é importante desprendermo-nos da idade cronológica – gera estigmas sociais não
adequados, até porque a deterioração funcional e cognitiva já não acontece tão cedo em virtude
dos progressos em Medicina. A idade cronológica não é, por si só, um fator preditor de
dependência, morbilidade e mortalidade.
O envelhecimento é, por isso, um processo natural e gradual que acontece desde o nascimento e
que corresponde à perda progressiva de funções biológicas e dos mecanismos de reserva fisiológica
do organismo – o que aumenta a vulnerabilidade a efeitos adversos pela capacidade de
homeostasia limitada – equilíbrio instável que a qualquer momento pode ser comprometido –
fragilidade (condição central da geriatria).
O envelhecimento como processo global pode ser
primário – dependente dos nossos fatores genéticos
(incontornável e próprio da espécie humana, pode ser
deletério, com significado mais funcional, como a
presbiopia (>40a) ou psicológico – embranquecer do
cabelo, rugas afetam psicologicamente ainda que seja
fisiológico) – e secundário, dependente de vários fatores
externos e internos que aceleram o envelhecimento 
estes fatores, à partida, são controláveis e podem ser prevenidos.
O envelhecimento primário termina em morte  podemos ou
não atravessar uma fase de incapacidade. As alterações do
envelhecimento podem-se ir acumulando e, juntamente com a
doença, dar um grau de incapacidade, que é contra o que
devemos lutar. Por vezes, a barreira entre o fisiológico e o
patológico não está bem estabelecida e há alterações que geram
muita controvérsia entre os peritos  envelhecimento renal: há
deterioração da TFG e outras funções e há peritos que acham
que é fisiologia e outros
patologia – na prática, é importante saber que há esse declínio
e agir em conformidade.
Ao longo do tempo há acumulação de alterações bioquímicas,
morfológicas e funcionais com implicações clínicas. O
envelhecimento é natural e não se deve tentar “retroceder”
(anti-ageing). Podemos atrasar alterações, sobretudo
esteticamente  em nada mudam a fisiologia do organismo.
É uma degradação diferenciada porque não acontece ao mesmo tempo em todos os órgãos (físico
vs. Cognitivo). A diminuição da função, ainda que não seja doença, compromete os mecanismos de
manutenção da homeostasia – depende de fatores externos e internos. Quanto ao peso dos fatores
ambientais vs. Genéticos: apenas ¼ (25%) depende de fatores genéticos, o que significa que os
outros 75% podem ser alvo da nossa alteração.
O envelhecimento acontece de forma celular e extracelular, atingindo todos os sistemas de órgãos.
Composição corporal
Tem muito impacto na resposta aos fármacos, na
capacidade de se moverem. Há um aumento da
massa gorda e diminuição da massa magra: água –
tendencialmente desidratados; músculo – menor
mobilidade, força; óssea – maior risco de quedas e se
osso tem fragilidade há maior risco de fraturas;
massa funcional das vísceras – menor reserva
funcional e mais risco de doença).
O aumento da massa
gorda acontece sobretudo a nível abdominal.
Massa muscular: diminui em percentagem de 1-2% por ano a partir
dos 50, diminui o seu número e as que ficam, tornam-se mais
pequenas/atrofiadas. Além disso, surge tecido fibrótico, que não tem
funcionalidade  impacto na força muscular e possibilidade de
desenvolver sarcopénia e fragilidade. Não é normal os idosos serem
dependentes.

Antropometria = alterações nas medidas do corpo


- microfraturas dos corpos das vértebras
- alterações das articulações principais

- diminuição do peso sobretudo por substituição da massa


óssea e muscular (+pesadas) por TA. Ao longo da vida vamos
aumentando de peso, atingimos planalto entre 35-65 anos e
depois diminui, tanto em homens como mulheres.
Consequentemente, vamos ter alterações no IMC – declina a
partir dos 65-75 anos.

- Algumas alterações são só estéticas mas compromentem a


autoestima das pessoas
Sistema músculo-esquelético – funcionalidade e autonomia, com + significado para pessoas idosas em
termos das suas preocupações com o envelhecimento.

Há uma diminuição da massa óssea (fenómeno fisiológico =


osteopénia), é uma diminuição da reserva fisiológica que aumenta
risco de osteoporose se tiverem fatores genéticos ou ambientais
que aumentem o risco. Há um maior risco de fratura por queda e
fratura espontânea (corpos vertebrais  cifose, que altera estática
vertebral  + risco de quedas).

Nas articulações – fibrose e calcificação. Tudo em conunto leva à


diminuição da amplitude = menor flexibilidade dos movimentos.
Torna-se difícil a mobilização e, nas mãos  partir comprimido,
escrever devido às artoses nos dedos. + risco de osteoartrite (+
+patologia devido a alts fisiológicas).

Quanto aos músculos, as alterações comprometem sobretudo


membros inferiores.

Além da diminuição do número e tamanho das


fibras, há ainda alteração do TIPO das fibras
musculares (tipo 2, muita força durante pouco
tempo  tipo 1, pouca força durante muito tempo).
+ dificuldade em sprint/maratona. Têm ritmo mais
lento nas atividades

Há uma diminuição da qualidade muscular (menor força de preensão palmar


no dinamómetro) e da área muscular e.g. nos gémeos (menor mobilidade). A
diminuição da força muscular é mais acentuada que a diminuição da massa
muscular.  e preocupa-nos mais a função, que diminui primeiro.

Pele e anexos

Estas alterações da pele aumentam o risco de


desenvolver doença  “dermatoporose”

Tmb na pista de deficiência


de vitaminais e sais minerais
Sistema osteoarticular
- Osteoporose (quadro 2) e artroses (quadro 1)

- Fatores de risco de osteoporose (já não é fisiologia


mas patologia!) – os médicos podem atuar nos riscos
modificáveis – estratégias preventivas ou terapêuticas + ARTROSES + OSTEOPOROSE

- Alterações que ocorrem no pé vão ter grande impacto na dinâmica e estrutura da


coluna, equilíbrio  propicia as quedas.

Sistema cardiovascular
Coração:

- Aumento da dimensão e do peso do coração por hipertrofia ventricular esquerda (HTA!)  aumento de
30% desta massa entre 25-80 anos. O número de miócitos no entento diminui e, como o tecido esquelético,
é substituído por tecido adiposo e fibrótico  menor contratilidade cardíaca

- Dilatação da aurícula esquerda (maior risco de desenvolvimento de arritmias)  onde está nódulo SA. É
uma arritmia = patologia, sendo uma muito comum a FA precisamente porque AE aumenta de tamanho.

- Menor índice cardíaco, menor reserva cardíaca  aumento do risco de insuficiência cardíaca.

- Calcificações valvulares (mitral e aórtica)  sopros cardíacos que não significam doença, mas uma
alteração fisiológica. Alterações podem progredir  estenose e insuf valvular (patologia) e ++ risco de
endocardite infecciosa! Isto é, uma infeção urinária pode levar a microorg em circulação que facilmente se
instalam naquela válvula cardíaca! Risco maior de sépsis com mortalidade elevada.

- Alterações da condução elétrica: (1) pela alteração da conformação da aurícula e (2) alterações no sistema
cardionetor.

Sistema vascular: aterosclerose, calcificação vascular (++ risco HTA sistólica por diminuição da elasticidade
da parede vascular); hipotensão postural por menor eficácia dos reflexos barorrefletores (muitas vezes
antecede a ocorrência de quedas! Tonturas). HTA pode coexistir com hipotensão  dilema porque fármacos
anti HTA podem induzir hipotensão postural. A hipotensão (30-35% idosos >75 anos) pode ser agravada por
muitas outras condições: hipovolémia/desidratação (e tendencialmente já é!), sarcopénia e menor massa
muscular (menor ação músculos gemelares e retorno venoso  levantar de repente dá hipotensão e
quedas).

Sistema respiratório
- Caixa torácica mais rígida, menos móvel  expande menos por: cifose, alterações diâmetro AP e
transverso, deterioração da elastina nos pulmões, cartilagens e articulações da caixa torácica calcificam!
Menos flexibilidade. Músculos respiratórios com menos força (diafragma menos móvel)  + rigidez

- Número de alvéolos diminui (menos superfície para trocas gasosas) 


menor função respiratória

- Alterações nos brônquios (menos função cílios  acumulação de muco!).


Diminui reflexo de tosse (+ risco de se engasgarem ao alimentar e aspirarem
alimentos para árvore respiratória)  pneumonia de aspiração.

- Menor SI  maior risco de infeções respiratórias!

Sistema digestivo
Boca: perda de peças dentárias, menor paladar e olfato, menos saliva  malnutrição

Endocrinológicas: anorexia fisiológica (faz parte do natural)

Esófago: diminuição da coordenação neuromuscular  disfagia, regurjitamento, dor retroesternal

Estômago: menor Hcl, fator intrínseco (logo menor absorção B12  Fundamental para hemácias, maior risco
de anemias), atraso do esvaziamento gástrico  saciedade precoce. Se a pessoa fez gastrectomia (e.g antes
fazia-se para úlcera) alia-se a menor superfície gástrica com estas alterações  suplementar B12.

Intestino: menor peristaltismo, + risco de obstipação, desenvolvimento de divertículos (podem inflamar =


diverticulite, infetar e obrigar a cirurgias de ressecção com conseq graves)

Fígado: menos tecido hepático e menor débito hepático  diminuição síntese albumina (imptt para
transporte de hormonas e fármacos) e menor secreção biliar.

Sistema renal
- Glomerulosclerose (menos nefrónios, glomérulos e do seu tamanho!)  menor perfusão renal e TFG 
leva à diminuição da excreção de produtos nitrogenados e de fármacos (++ sua toxicidade). Controverso se
deve ser encarado como fisiológico ou patológico!

- Disfunção dos túbulos (imptt para secreção, regulação de iões e


água)  menor capacidade de concentração/diluição da urina 
beber 10L água num idoso é sobrecarga hídrica, descompensação
cardíaca (edema agudo do pulmão) e, no outro extremo, ir para o
deserto = fácil desidratação porque não poupa água!

- Diminuição da excreção de valências ácidas e de K = hiponatrémia,


hipercaliémia

Sistema urinário (função miccional depende de vários órgãos).


Sistema nervoso central  os idosos estimam muito suas
capacidades cognitivas!

Acontecem alterações estruturais e funcionais

ESTRUTURAL FUNCIONAL

- Alterações da personalidade (“cada


vez mais teimoso”) – atrofia do córtex
pré-frontal fisiológica  conflitos entre
familiares, mas é uma alt normal

- Atrofia LT, hipocampo  memória

- Diminuição geral dos NT (++


colinérgico)

- Maior tempo de
reação!!  quedas

- Multitasking +
difícil, + dificuldade
em aprender coisas
novas, menor
memória de
trabalho mas a de
longo prazo está
mantida e
consolidada, bem
como semântica e
conhecimento 
menos fluência (sei
a palavra mas não
me lembro dela)

Órgãos sensoriais
Sistema endocrinológico

Sistema imunitário

- Há dois picos para doenças


autoimunes: na juventude e há um
segundo pico nos idosos por causa
destas alterações do SI

- Menor resposta às vacinas, pelo


que + precoce é melhor (Zona,
pneumocócica)

- risco de anemia: menos B12 e


menor regeneração MO (mas
anemia NÃO É NORMAL do
envelhecimento!) – contagem Hb
devia ser adaptada
Sistema reprodutor

- Próstata aumenta de tamanho mas é por


susbtituição por tecido fibroso! E pode causar
problemas de retenção urinária

- Vaginites na mulher  dispareunia: dor nas


atividades sexuais
Síndromes Geriátricas
- Doenças crónicas idoso: diabetes, DPOC, AVC,
doenças oncológicas, insuf renal e cardíaca. Quando
pensamos no idoso, além das alterações fisiológicas e
das doenças crónicas, surgem outras condições que
não são propriamente fisiológicas nem crónicas/aguda
 dificuldade em designar por doença: síndromes
geriátricas (que até podem ser causadas por DC ou alts
fisiológicas).

Esta última lista foi uma


extensão aos 5 i’s, que são
condições que devem ser
consideradas.
São muito frequentes em
idosos, em vários
contextos: nos hospitais,
nas instituições (++fre, porque são os idosos mais vulneráveis = menor
reserva fisiológica) mas também na comunidade. Num estudo que incluiu 3 síndromes geriátricos
(quedas, incontinência urinária e depressão), mesmo em idades não muito avançadas (65-81), 35%
deles incluíam pelo menos 1 síndrome geriátrica e 8% tinham 2 ou + = elevada prevalência!
Nos internados, há algumas que são bastante comuns – úlceras de pressão, incontinência de
esfíncteres, imobilidade/instabilidade e quedas. Isto aumenta o risco de incapacidade, o risco de
haver uma institucionalização em seguida e um impacto negativo na qualidade de vida.
Nos SU, as síndromes geriátricas também são altamente prevalentes (são ¼ dos motivos de
consulta).
Etiologia e fisiopatologia – não são doenças bem estabelecidas, podem ser a manifestação de
diferentes doenças e podem ser uma manifestação clínica atípica de uma doença aguda, crónica ou
crónica/agudizada. Ex: uma queda pode ser uma manifestação de pneumonia. Não é um conjunto
bem definido de sinais e sintomas e não há uma manifestação clínica comum, mas os diferentes
fatores fisiopatológicos podem interagir entre sim e levar a um quadro clínico bem definido.
A síndrome geriátrica não segue um modelo linear de explicação; poderia ser explicado por um
modelo concêntrico em que há vários FR que concorrem para um fenótipo clínico, mas o que
melhor explica é o modelo interativo, em que há um sinergismo e diferentes interações entre os FR
– para os quais nós dirigimos várias intervenções, interferindo com outros FR e entre si - há quem
defina que este é um modelo conceptual unificador entre síndromes geriátricas e fragilidade – a
fragilidade (principal síndrome geriátrico) e as restantes síndromes têm fatores de risco partilhados
 ou seja, interferir nestes FR partilhados e que sejam modificáveis vai ser uma estratégia muito
eficaz – devemos atuar preventivamente muito antes de aparecerem sinais e sintomas, sobretudo
na aterosclerose, inflamação, sarcopénia e desregulação multissistémica.
As síndromes geriátricas surgem muitas vezes em associação a doenças crónicas, e há doenças
crónicas que predispõem ao aparecimento de SG – ciclo vicioso geriátrico.
- Na DM podem surgir em simultâneo
algumas SG (demência – doença
cerebrovascular por descompensações,
neuropatia diabética, glicosúria e Sist
Urinário)
- Habitualmente SG aparecem
cumulativamente e várias ao mesmo tempo,
porque são multifatoriais

Diagnóstico – faz-se pela HC e pelo exame objetivo;


- Na HC pode ser preciso falar com familiares, mas interrogar SEMPRE o idoso para não causar
estigmas. Fazer uma pesquisa sistemática de SG e avaliação dos sistemas;
- Podemos, para nos auxiliar, usar escalas de rastreio/avaliação – escalas que dependem do
avaliador, da instituição, do nível assistencial (lar vs hospital) e do tipo de doentes.
- A forma ideal de as diagnosticar é a AVALIAÇÃO GERIÁTRICA GLOBAL.
- Incluir nas notas de diagnóstico todas as SG para poder ser seguido!

Caso clínico – quedas (SG paradigmática) repetidas devem ser abordadas na sua CAUSA
- Há várias situações (SU, lares,
internamento) em que podem ser detetados
SG;
- As estratégias devem ser adaptadas à
individualidade de cada idoso: impacto de X
problema é diferente de pessoa para pessoa
 e assim varia a nossa intervenção
- Por exemplo, imobilidade pode resultar de
muitas doenças diferentes (de um AVC –
hemiparésia – ou de gonartroses)  logo, a intervenção vai ser diferente para o mesmo problema.
 A incontinência urinária é um problema que vai ser percepcionado de diferentes formas num
idoso autónomo ou num mais dependente (podendo neste levar à depressão), enquanto que no
autónomo a medicação (que nem era assim tão precisa) leva a alterações cognitivas, agravando
outro SG.

Prognóstico – é bastante considerável, pelo que devemos intervir!

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