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FRAGILIDADE

NO PACIENTE
IDOSO

CINTHIA
MÉDICE
NISHIDE DE
FREITAS
EGLI BELINAZZI QUADRADO
ROBERTO DISCHINGER
MIRANDA

 INTRODUÇÃO
Caracterizada como uma síndrome de declínio espiral de energia,
a fragilidade cursa com alterações relacionadas ao envelhecimento, como
sarcopenia, desregulação neuroendócrina e disfunção imunológica. A reserva
homeostática debilitada e a capacidade reduzida do organismo de enfrentar um
número variado de estressores acarretam maior vulnerabilidade da saúde para
desfechos desfavoráveis, como incapacidade, institucionalização, quedas e
morte.
Todo paciente acima de 70 anos de idade e/ou que tenha apresentado perda
de peso maior do que 5% no último ano por doença crônica deve ser triado
para fragilidade. O aporte proteico e calórico adequado para pacientes frágeis
está bem indicado. No entanto, o ganho funcional relacionado à força e
melhora da massa muscular é mais significativo se associado ao exercício
físico. O essencial é ter em mente que o foco deve ser a prevenção.

 OBJETIVOS
Ao final da leitura deste artigo, o leitor será capaz de

 definir a fragilidade no idoso;


 descrever a fisiopatologia da fragilidade;
 identificar as manifestações clínicas da fragilidade;
 avaliar o impacto da fragilidade no prognóstico e nos desfechos clínicos;
 diferenciar fragilidade, incapacidade e comorbidade;
 propor medidas preventivas na fragilidade;
 realizar o manejo terapêutico eficaz da fragilidade na cardiologia.
 ESQUEMA CONCEITUAL

 FRAGILIDADE
A fragilidade, uma síndrome de declínio espiral de energia, apresenta
alterações relacionadas ao envelhecimento, como sarcopenia, desregulação
neuroendócrina e disfunção imunológica. A reserva homeostática debilitada e a
capacidade reduzida do organismo de enfrentar um número variado de
estressores levam a uma maior vulnerabilidade da saúde para desfechos
desfavoráveis.1 Assim, os idosos frágeis têm menor capacidade de se adaptar
ao estresse, como doença aguda ou trauma, o que aumenta o risco de
complicações, quedas, institucionalização, incapacidade para atividades da
vida diária (AVDs) e morte.2

LEMBRAR

A fragilidade nos idosos é considerada uma síndrome geriátrica e pode ser


precursora de muitas outras síndromes, como delirium, incontinência urinária,
fraturas e quedas. Assim, o idoso frágil aumenta sua suscetibilidade a eventos
estressores aparentemente pequenos.

DEFINIÇÕES E CONCEITOS
Diversos autores propuseram, nas últimas décadas, critérios próprios para
a definição de fragilidade, o que impediu a definição de critérios universais.

O ponto de vista mais difundido sobre a fragilidade a define como uma


síndrome médica com múltiplas causas e fatores contribuintes, caracterizada
por diminuição da força endurance e redução das funções fisiológicas,
aumentando a vulnerabilidade do indivíduo para o desenvolvimento de
dependência e/ou morte.3
Os indivíduos frágeis compõem um subconjunto de idosos portadores de maior
suscetibilidade a desfechos adversos de saúde, como morte, incapacidade e
hospitalização, em virtude da redução de sua capacidade para responder a
condições de estresse. A vulnerabilidade também os predispõe a doenças
crônicas, anorexia, sarcopenia, osteopenia, déficits cognitivos e incapacidade.

EPIDEMIOLOGIA
A prevalência da fragilidade varia conforme a ferramenta utilizada. Nos EUA, a
fragilidade varia de 4 a 16% em homens e mulheres com 65 anos ou mais,
chegando a 30% entre os idosos com mais de 90 anos.1
No Brasil, o estudo Fragilidade em Idosos Brasileiros (Fibra) observou uma
prevalência de fragilidade de 7,3% em homens e 10% entre as mulheres com
idade superior a 65 anos.4 Apesar de uma tendência de maior prevalência
entre as mulheres, a mortalidade é maior entre os homens. Existem alguns
fatores associados ao aumento da prevalência da fragilidade, como:5
 idade avançada;
 baixo nível educacional;
 tabagismo ativo;
 terapia de reposição hormonal;
 estado civil solteiro;
 depressão ou uso de antidepressivos;
 nível cognitivo baixo.

FISIOPATOLOGIA
Alguns fatores ocasionam a desregulação dos mecanismos homeostáticos do
indivíduo com fragilidade (Quadro 1).
Quadro 1
DESREGULAÇÃO DOS MECANISMOS
HOMEOSTÁTICOS DO IDOSO FRÁGIL

Fatores Características

Envelhecimento fisiológico Danos


moleculares e
celulares
Condições individuais Genética e
comorbidades
específicas
Condições ambientais Isolamento,
privação do
ambiente e/ou
circunstâncias
desfavoráveis à
deambulação
Mecanismos epigenéticos Informação
genética extra
que ajuda ou
inibe
determinados
genes

Fried e colaboradores propuseram um modelo fisiopatológico para o


desequilíbrio energético da fragilidade (Figura 1).

Figura 1 — Ciclo da fragilidade.


Fonte: Adaptada de Fried e colaboradores (2001).1
LEMBRAR

Os principais sistemas envolvidos na fragilidade são os sistemas


musculoesquelético, hormonal, imunológico e sistema nervoso central (SNC) e
autonômico (SNA).

Sistema musculoesquelético

A perda de peso no idoso pode acontecer por diversos motivos — doenças


agudas ou crônicas, fatores psicológicos e sociais, alteração no olfato e
paladar, depressão, demência e edentulismo —, mas deve-se atentar para
a anorexia do envelhecimento.

A anorexia do envelhecimento é um processo sindrômico, importante no


desenvolvimento e na progressão da sarcopenia, caracterizado por perda do
apetite e redução da ingesta alimentar secundária a alterações em áreas
cerebrais como o hipotálamo, que não responderia adequadamente aos
mecanismos periféricos de regulação do apetite.6
A alteração do sistema muscular, como perda de massa muscular ou
sarcopenia, parece ser o elemento–chave na fragilidade. A perda de peso
estabelece com a sarcopenia uma relação autoperpetuante, uma vez que o
fator nutricional pode desequilibrar ainda mais a capacidade muscular e o
desempenho motor.

A sarcopenia é uma síndrome caracterizada pela perda progressiva e


generalizada da força e da massa muscular. Representa um estado de saúde
que ocasiona grande perda de mobilidade, aumento do risco de quedas e
fraturas, perda da independência e aumento do risco de morte.7–9
O European Working Group on Sarcopenia in Older People (EWGSOP)
desenvolveu um consenso para definição e diagnóstico da sarcopenia,
sugerindo sua divisão em estágios para avaliação da gravidade e do manejo
clínico.10
A pré-sarcopenia ocorre quando houver apenas a diminuição da massa
muscular. Já a sarcopeniaocorre quando houver, além da diminuição da massa
muscular, diminuição da força muscular ou diminuição da velocidade de
marcha. Já a sarcopenia severa está presente quando os três itens — massa
muscular, diminuição da força muscular ou diminuição da velocidade de
marcha — estão diminuídos (Tabela 1).10
Tabela 1
ESTÁGIOS DA SARCOPENIA

Estágio Massa Força Desempenho


muscular muscular
Pré- ↓ — —
sarcopenia
Sarcopenia ↓ ↓ ou ↓
Sarcopenia ↓ ↓e ↓
severa
Fonte: Adaptada de Cruz-Jentoft e colaboradores (2010).12
O envelhecimento promove um aumento na gordura visceral e intramuscular. A
infiltração de gordura no músculo, um processo chamado de marmorização,
diminui a qualidade do músculo e seu desempenho.11
Em condições como malignidade, artrite reumatoide e envelhecimento, ocorrem
a perda de massa magra e a preservação ou aumento da massa gorda,
definindo, assim, a obesidade sarcopênica.12 Um estudo realizado por
Baumgartner demonstrou que idosos obesos e sarcopênicos apresentam maior
risco de incapacidade.13

A maioria das doenças cardiovasculares (DCVs) tem como fator de risco a


obesidade. Por isso, muitas vezes, os pacientes são orientados sobre a perda
de peso, que deve ser acompanhada, para se certificar de que não há perda
significativa de massa magra.

Sistema endócrino

Muitas das alterações hormonais que acontecem no envelhecimento estão


relacionadas à fragilidade. A redução na síntese desses hormônios leva ao
declínio de atividade anabólica celular, plasticidade neuronal, massa e força da
musculatura esquelética.
As principais alterações hormonais e suas consequências na fragilidade estão
no Quadro 2.
Quadro 2
PRINCIPAIS ALTERAÇÕES HORMONAIS E
SUAS CONSEQUÊNCIAS NA FRAGILIDADE

Redução na síntese  Resulta na diminuição da


e secreção força e mobilidade.
do GH e do
peptídeo IGF-1
Redução nos  O DHEA e DHEA-
hormônios S estão diminuídos e,
adrenais por serem importantes
(DHEA, DHEA-S) anabólicos e
e aumento do precursores dos
cortisol hormônios sexuais,
estão relacionados
com a força muscular.
 Sua diminuição leva ao
aumento gradual do
cortisol, que estimula
o catabolismo,
acarretando perda de
peso e anorexia.
Diminuição da  Atua no anabolismo e na
25hidroxivitamina função da célula
D muscular.
Intolerância à  Acontece principalmente
glicose e pela lipossubstituição
resistência à da massa magra.
insulina
GH: hormônio do crescimento; IGF-1: fator de crescimento semelhante à
insulina 1; DHEA: de-hidroepiandrosterona; DHEA-S: sulfato de de-
hidroepiandrosterona.
Fonte: Adaptado de Clegg e colaboradores (2013),2Cappola e colaboradores
(2013);14 Puts e colaboradores (2005).15

Alterações imunológicas

A correlação entre fragilidade e alterações imunológicas são fortes e


consistentes. Acredita-se que esse papel central na fisiopatologia da fragilidade
ocorre pela hiper-responsividade imune após um estímulo inicial, que resulta
em dano celular, anorexia e carabolismo.2
As principais citocinas envolvidas são a interleucina 6 (IL-6) e a proteína C-
reativa (CRP), cujos níveis séricos encontram-se elevados em indivíduos
frágeis. Além disso, a fragilidade está associada a uma resposta humoral
inadequada, o que explica a baixa resposta vacinal após vacinação
para influenza e pneumococo.2
Outros sistemas

Há também a relação da fragilidade com a desregulação do SNA, bem como a


perda de reserva fisiológica nos sistemas cardiovascular (SCV), respiratório,
renal, hematopoiético e de coagulação.
A divisão dos sistemas orgânicos é útil para se entender didaticamente a
fragilidade. Compreender que as alterações acontecem de forma integrada e
abrangente é essencial para o entendimento da fragilidade.

DIAGNÓSTICO DE FRAGILIDADE
Sugere-se que todo paciente acima de 70 anos de idade e/ou que tenha
apresentado perda de peso maior do que 5% no último ano por doença crônica
deve ser triado para fragilidade.3
Os principais testes de triagem sugeridos serão descritos a seguir.

Questionário Fatigue, Resistance, Ambulation, Illnesses e Loss of Weight

O questionário FRAIL é simples, de fácil acesso e aplicabilidade, composto por


perguntas e respostas fáceis, não necessitando de instrumentos para sua
aplicação (Quadro 3).
Quadro 3
QUESTIONÁRIO FRAIL

F Fadiga (fatigue)
Você se sente fatigado?
R Resistência (resistance)
Não consegue subir um lance de escadas?
A Aeróbico (aerobic)
Não consegue caminhar um quarteirão?
I Doenças crônicas (illnesses)
É portador de mais de cinco doenças?
L Perda de peso (loss of weight)
Perdeu mais de 5% do peso nos últimos 6
meses?
Maior ou igual a três itens: frágil; um ou dois: pré-frágil.
Fonte: Adaptado de Morley e colaboradores (2012).16

Questionário Study of Osteoporotic Fractures

O Study of Osteoporotic Fractures (SOF) é um questionário simples e fácil de


ser aplicado (Quadro 4).
Quadro 4
THE STUDY OF OSTEOPOROTIC
FRACTURES

Questionário  Perda de 5% de peso no


último ano
 Incapacidade de levantar da
cadeira cinco vezes
seguidas sem usar os
braços
 Resposta negativa à
pergunta: “Você se sente
com energia?”
Dois ou mais itens: frágil.
Fonte: Adaptado de Ensrud e colaboradores (2008).17

Escala clínica de fragilidade

A escala clínica de fragilidade é uma ferramenta de triagem rápida que pontua


entre um (robusto) e sete (fragilidade grave) com base no autorrelato de
comorbidades e na necessidade de ajuda com as AVDs (Quadro 5).
Quadro 5
ESCALA CLÍNICA DE FRAGILIDADE

Grupo Característica Descrição

1 Robusto Indivíduo
ativo, com
energia,
exercita-se
regularmente e
tem bom
desempenho
para sua idade.
2 Bem Indivíduo sem
doença ativa,
desempenho
levemente
inferior ou
grupo um.
3 Bem, mas com Portador de
comorbidades doença(s), mas
com bom
controle
clínico.
4 Aparentemente Independente,
vulnerável mas com
menor
disposição,
maior lentidão.
5 Fragilidade leve Necessidade de
ajuda
para AIVDs.
6 Fragilidade Necessidades
moderada para AIVD e
para ABVD.
7 Fragilidade grave Completamente
dependente
para AIVDs ou
mesmo em
condição de
terminalidade.
AIVDs: atividades instrumentais da vida diária; ABVDs: atividades básicas da
vida diária.
Fonte: Adaptado de Rockwood e colaboradores (2005).18
Escala de fragilidade do Cardiovascular Health Study

A escala de fragilidade do Cardiovascular Health Study (CHS) é relativamente


simples e objetiva. Requer o dinamômetro para avaliar a força de preensão
palmar, o espaço físico e o tempo para medida da velocidade de marcha.1
A velocidade de marcha é um marcador de fragilidade muito sensível, portanto,
os pacientes que apresentam uma marcha menor de 0,6m/s apresentam risco
de incapacidade funcional e piores desfechos.1

LEMBRAR

Predizer a mortalidade com base em idade, sexo e velocidade de marcha se


mostrou tão eficaz quanto os modelos baseados em idade, sexo, uso de
dispositivo de marcha, autopercepção de funcionalidade ou idade, doenças
crônicas, história de tabagismo, PA, índice de massa corporal (IMC) e
hospitalização.19

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
As condições clínicas mais comuns a serem consideradas nos indivíduos com
perda de peso, fraqueza e perda de funcionalidade estão listadas no Quadro 6.
Quadro 6
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

Condições  Depressão
clínicas a  Neoplasias
serem  Doenças reumatológicas:
avaliadas polimialgia reumática e vasculite
 Doenças endocrinológicas:
hipotireoidismo, hipertireoidismo
e DM
 DCVs: HTA, IC, DAC e DVP
 Doença renal
 Deficiência nutricional
 Doenças neurológicas: doença de
Parkinson e demência vascular
DM: diabetes melito; DCVs: doenças cardiovasculares; HTA: hipertensão
arterial; IC: insuficiência cardíaca; DAC: doença arterial coronariana; DVP:
doença vascular periférica.
É de extrema importância a diferenciação entre fragilidade, incapacidade e
comorbidade. Para avaliação inicial de um paciente frágil, são sugeridos alguns
testes laboratoriais, como:

 hemograma completo;
 perfil metabólico;
 função hepática (incluindo albumina);
 vitamina B12;
 vitamina D;
 hormônio estimulador da tireoide (TSH).

Incapacidade é a dificuldade ou dependência para realizar atividades


necessárias a uma vida independente, incluindo tarefas de autocuidado, como
tomar banho e se vestir, além de outras essenciais a uma vida com qualidade.
Comorbidade é a coexistência de duas ou mais doenças. Os indivíduos com
doenças crônicas apresentam maior risco de complicações e são mais
vulneráveis. Já a fragilidade está associada a maior risco de incapacidade e
comorbidades. (Figura 2)

Figura 2 — Incapacidade, comorbidade e fragilidade


Fonte: Elaborada pelos autores.

TRATAMENTO E PREVENÇÃO
O estabelecimento de metas com os pacientes e seus familiares é crucial para
prestar assistência ao indivíduo frágil. Para isso, é necessário estabelecer
prioridades individuais, ponderar os riscos e os benefícios das intervenções,
adequar o atendimento médico às necessidades desses pacientes vulneráveis
e manter os valores e objetivos do indivíduo em mente.

LEMBRAR

A Avaliação Geriátrica Ampla (AGA) pode ajudar a orientar o plano de


tratamento e a intervenção nos doentes frágeis.20
As intervenções potenciais podem ser benéficas ao longo do espectro da
fragilidade. Os pacientes robustos devem tratar adequadamente suas doenças
crônicas, gerenciar as doenças agudas e assegurar o rastreio de doenças e
cuidados preventivos. Já os pacientes frágeis necessitam de uma avaliação
detalhada e direcionada sobre procedimentos e hospitalizações que possam
trazer sobrecarga desnecessária e diminuição da qualidade de vida.21

Poucas são as intervenções terapêuticas comprovadamente capazes de


modificar o curso da fragilidade. O essencial é ter em mente que o foco deve
ser a prevenção. As principais abordagens terapêuticas comprovadamente
capazes de modificar o curso da fragilidade são exercícios físicos, abordagem
nutricional e intervenções farmacológicas.

Exercício físico

Os benefícios demonstrados do exercício físico em idosos incluem maior


mobilidade, melhor desempenho das AVDs, melhora da marcha, diminuição de
quedas e melhora da densidade mineral óssea e do bem-estar geral.22
O benefício do exercício em indivíduos frágeis foi visto em diversos estudos,
entre eles, uma pesquisa, que envolveu 1.635 adultos idosos sedentários da
comunidade, com idade entre 70 e 89 anos. Nessa pesquisa foi elaborado um
programa de atividade física estruturado e de intensidade moderada, incluindo
atividades de treinamento aeróbico, resistido e de flexibilidade.23
Esse programa foi comparado com um programa de educação em saúde
composto por oficinas e exercícios de alongamento. Esse estudo demonstrou
que o programa de atividade física reduziu a incapacidade de locomoção
(definida como a incapacidade de andar 400 metros) durante um período de
dois anos, tanto nos indivíduos frágeis como naqueles não frágeis.23

LEMBRAR

Embora os indivíduos funcionalmente dependentes ou frágeis possam não


conseguir atingir os níveis mínimos de atividade recomendados, mesmo as
atividades modestas e de fortalecimento muscular podem diminuir a
progressão das limitações funcionais. Assim, eles devem ser incentivados e
desafiados a melhorar seu desempenho e aumentar gradualmente o número
de repetições, resistência ao peso e duração da atividade, conforme
tolerabilidade.

Abordagem nutricional

O aporte proteico e calórico adequado para pacientes frágeis também está


claramente indicado. No entanto, o ganho funcional relacionado à força e
melhora da massa muscular é mais significativo se associado ao exercício
físico.

O grupo de estudos PROT-AGE recomenda a ingestão proteica diária de 1 a


1,2g/kg de peso para indivíduos acima de 65 anos, quantidade considerada
necessária para manter a massa muscular. Para os idosos fisicamente ativos,
sugere-se 1,2g/kg ao dia. Caso doenças agudas ou crônicas estejam
presentes, a necessidade proteica sobe para 1,2 a 1,5g/kg ao dia, exceto na
doença renal crônica (DRC), que apresenta indicações específicas.25
Além da quantidade, deve-se considerar a qualidade da proteína. As pesquisas
evidenciam que as proteínas com alto conteúdo de leucina e de rápida digestão
são mais efetivas para promover a restauração e o crescimento muscular.

Intervenções farmacológicas

É importante discutir a desprescrição e evitar a polifarmácia. Assim, a avaliação


periódica do regime farmacológico é essencial para um idoso, em especial,
para os frágeis. Deve-se descontinuar um medicamento que não tem mais
indicação de uso, interromper medicamentos com efeitos colaterais que
possam contribuir para fragilidade e substitui-los por agentes mais seguros.
Várias intervenções hormonais e nutricionais foram avaliadas em relação à
terapia medicamentosa, como testosterona, hormônio do crescimento e
vitamina D.

Testosterona
A reposição de testosterona melhorou a massa muscular e a força em
homens hipogonadais e eugonadais, em especial, quando combinada com
exercício físico.

Devido às potenciais complicações da testosterona como suplementação —


como aumento do risco de infarto agudo do miocárdio (IAM), acidente vascular
cerebral (AVC) e efeitos imprevisíveis na próstata —, ela deve ser utilizada
apenas como reposição nos casos de hipogonadismo.25

Hormônio do crescimento

A suplementação do hormônio do crescimento (GH) não demonstrou eficácia


em melhorar a força muscular e os desfechos clínicos em idosos frágeis, não
sendo indicado como tratamento.26

Vitamina D

Várias metanálises de estudos randomizados mostram que a suplementação


de vitamina Dreduz o número de quedas.27,28 Além de melhorar o equilíbrio e
preservar a força muscular,29 pode desempenhar um papel na prevenção ou no
tratamento da fragilidade. Uma vez que a vitamina D parece desempenhar um
papel importante na manutenção do tecido muscular e nervoso, novos estudos
para avaliar a associação entre vitamina D e fragilidade são importantes.

 DOENÇAS CARDIOVASCULARES E FRAGILIDADE


O CHS demonstrou que os indivíduos com DCVapresentam maior
probabilidade de serem frágeis. Esse estudo identificou maior prevalência de
fragilidade nos pacientes com DCV, como insuficiência cardíaca (IC), doença
arterial coronariana (DAC) e isquemia cerebral transitória (ICT). Mesmo
naqueles indivíduos sem história de DCV, a presença de preditores também
estava mais presente nos pacientes frágeis:30

 índice tornozelo-braço (ITB) menor que 0,9;


 alterações no eletrocardiograma (ECG);
 alterações sugestivas de isquemia cerebral na ressonância magnética
(RM).
Outro estudo demonstrou que além da utilidade clínica dos escores de
Framingham para risco cardiovascular (RCV), doença coronariana e AVCem
prever o risco de morte e DCV, esses escores também podem ajudar a
identificar idosos com predisposição à fragilidade.31
Uma metanálise com 54.250 idosos evidenciou uma relação entre fragilidade
e DCV, sendo que, assim como a fragilidade pode levar à DCV, esta pode levar
à fragilidade. A metanálise observou que a presença de fragilidade confere um
aumento incremental na mortalidade.32
Outra questão muito importante na cardiologia, quando se trata de fragilidade,
é a PA. Uma coorte na Inglaterra analisou prontuário de 144.403 pacientes,
com idade acima de 80 anos, de 2001 a 2014, em um seguimento de 5 anos.
Ocorreram 51.808 mortes durante o período de follow-up, sendo que a taxa de
mortalidade aumentava conforme crescia o grau de fragilidade, além disso, a
PA tende a reduzir nos anos próximos ao fim de vida, independentemente do
uso de anti-hipertensivos.33 Ou seja, talvez a queda da PA seja mais um
marcador de fragilidade.

LEMBRAR

O papel da avaliação da fragilidade na prática clínica pode ser melhorar as


estimativas de RCV, que tendem a ser menos acuradas na população idosa,
pela sua heterogeneidade.

 FERRAMENTAS PARA IDENTIFICAR A FRAGILIDADE EM


IDOSOS
Embora não haja um padrão-ouro para o diagnóstico de fragilidade, foram
desenvolvidos vários instrumentos para caracterizar e definir a fragilidade nos
idosos do ponto de vista sindrômico. Essas ferramentas são utilizadas para
identificar idosos com alto risco de eventos adversos relacionados a
procedimentos e intervenções. Atualmente, dois são os modelos mais
utilizados:

 fenótipo da fragilidade, desenvolvido por Fried e colaboradores;1


 índice de fragilidade por acúmulo de déficits, elaborado por Rockwood e
colaboradores.18
Acredita-se que a fragilidade física ou fenotípica resulte do declínio biológico
multissistêmico, levando a sintomas específicos, como perda de peso, fraqueza
e velocidade da marcha. A acumulação de déficit ou fragilidade do índice é a
combinação de comorbidades, situações sociais e deficiências somadas para
avaliar o risco.

FENÓTIPO DA FRAGILIDADE
O fenótipo da fragilidade foi validado em 2001 por Fried e colaboradores
no CHS. Os participantes foram avaliados anualmente, por cerca de sete anos.
Nesse estudo, cinco sinais e sintomas foram chamados de marcadores
fenotípicos da fragilidade:1

 fraqueza;
 exaustão ou sensação de menor energia;
 lentificação na marcha;
 redução do nível de atividade física;
 perda de peso não intencional.
Os participantes foram então divididos em categorias frágeis, com três ou mais
critérios, pré-frágeis, um ou dois critérios e não frágeis, sem nenhuma dessas
categorias.
Nesse estudo do CHS,1 os indivíduos frágeis apresentaram maior incidência de
doenças, hospitalização, quedas, perda de capacidade funcional e morte.
O Quadro 7 sintetiza o fenótipo de fragilidade conforme o CHS.
Quadro 7
FENÓTIPO DA FRAGILIDADE

Fraqueza  Redução da força de


muscular preensão palmar
 Avaliado com
dinamômetro manual
no membro superior
dominante
 Abaixo do percentil 20 da
população, corrigido
por gênero e IMC
Redução da  Tempo gasto para
velocidade de caminhar em linha reta
marcha 4,6 metros
 Abaixo do percentil 20 da
população, corrigido
por gênero e estatura
Perda de peso  Perda de mais de 4,5kg
não em 1 ano ou 5% do
intencional peso corporal
Sensação de  Duas perguntas retiradas
exaustão do CES-D: “Eu me
sinto cansado em tudo
que faço?” e “Não
posso continuar dessa
forma”
 A resposta é positiva para
qualquer uma das
perguntas
Atividade  Questionário MLTA
física baixa  Abaixo do percentil 20 da
população em
kcal/semana
IMC: índice de massa corporal; CES-D: Center of Epidemiological Study Center
Scale; MLTA: Minessota Leisure Time Activities.
Fonte: Adaptado de Fried e colaboradores (2001).1
LEMBRAR

Atualmente, a ampliação da abordagem para o diagnóstico de fragilidade vem,


cada vez mais, incluindo os domínios cognitivo, funcional e social como fatores
importantes relacionados à vulnerabilidade e à redução da capacidade de
enfrentamento de eventos estressores.
Um estudo recente com pacientes no pós-operatório de cirurgia cardíaca
avaliou o impacto da fragilidade na incidência de delirium. Esse estudo utilizou
o critério modificado de fragilidade (MFC), que acrescenta a avaliação de
depressão pela Escala de Depressão Geriátrica (GDS-5) e avaliação de
comprometimento cognitivo pelo Montreal Cognitive Assessment
(MoCA).34 Esse estudo demonstrou um aumento de 3 a 8 vezes no risco
de delirium nos pacientes frágeis.

ÍNDICE DE FRAGILIDADE POR ACÚMULO DE DÉFICITS


O índice de fragilidade por acúmulo de déficits foi criado a partir do Canadian
Study of Health and Aging (CSHA), desenhado para avaliação epidemiológica
da população idosa.18 Foram analisados 2.305 idosos, por 5 anos seguidos,
com objetivo de criar uma nova ferramenta de avaliação da fragilidade,
composta por outras variáveis, como funcionalidade, humor e cognição.
De forma diferente do modelo de fenótipo, o índice de fragilidade por acúmulo
de déficits considera informações da avaliação geriátrica ampla (AGA) e utiliza
um total de 70 itens. Apesar de ter uma abordagem ampla, sua aplicabilidade,
na prática clínica, é difícil.

 CONCLUSÃO
A fragilidade é uma síndrome geriátrica, definida pela presença de déficits
funcionais, frequentemente associada à sarcopenia, multimorbidade e
polifarmácia. O idoso frágil tem maior suscetibilidade a fatores estressores
aparentemente pequenos, levando a outras patologias, como delirium,
incontinência, fraturas e quedas. Assim, trata-se de uma condição clínica que
deve ser conhecida por todas as especialidades médicas, no intuito de
prevenção e diagnóstico precoce.
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Como citar a versão impressa deste documento

Freitas CMN, Quadrado EB, Miranda RD. Fragilidade no paciente idoso. In:
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Sousa ACS, Martins ADM, organizadores. PROCARDIOL Programa de
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