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INDIVIDUALISMO E HOLISMO

NA METODOLOGIA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS

As ciências sociais, no decorrer de sua história, se viu dividida em dois


princípios metodológicos que se opõem e disputam o predomínio nas universidades,
publicações e institutos de pesquisa. Estes dois princípios metodológicos são o
holismo e o individualismo. O nosso objetivo, no presente trabalho, é apresentar
uma visão crítica e breve destes dois princípios metodológicos e por fim observar a
existência de uma alternativa à eles.
Por isso, este trabalho será dividido em três partes: na primeira, será
apresentado o holismo metodológico com suas principais variantes nas ciências
sociais e procedimentos metodológicos; na segunda, será apresentado, da mesma
forma, o individualismo metodológico; na terceira e última, será realizada uma
análise crítica destes dois princípios tendo como referencial a teoria marxista da
sociedade.
A escolha entre os diversos autores e representantes de cada concepção
levou em consideração o critério da importância para a história das ciências sociais,
buscando, dentro do possível, abordar o maior número de autores em cada
concepção. Sem dúvida, alguns pensadores importantes, segundo o critério acima
colocado, foram omitidos e outros foram abordados de forma extremamente
resumida, mas não poderia ser de outra forma, levando-se em consideração a
quantidade elevada de autores e os limites do presente trabalho.
Cabe observar que no presente estudo nos limitaremos a analisar o holismo e
o individualismo apenas no âmbito das ciências sociais. Isto significa, entre outras
coisas, que as abordagens holistas e individualistas existentes na filosofia e nas
ciências naturais serão deixadas de lado, pois sua extensão foge aos limites
impostos a este trabalho, embora, por vezes, possa aparecer aqui e ali alguma
referência à filosofia e às ciências naturais.
O HOLISMO METODOLÓGICO
O nascimento da sociologia ocorreu concomitantemente com o surgimento do
holismo metodológico. A sociologia ganhou o seu nível mais elevado de
sistematização e de cientificidade a partir da obra de Émile Durkheim, As Regras do
Método Sociológico. Sem dúvida, antes de Durkheim havia uma “sociologia em

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estado embrionário” nas obras de Saint-Simon, Comte, Tarde, Spencer, entre
outros, mas é com ele que a sociologia torna-se sistemática e científica. Também
antes dele já existia um “holismo metodológico embrionário”, tais como o de Comte e
Spencer em muitos pensadores sociais, bem como em filósofos e cientistas naturais,
mas é com Durkheim que ele é sistematizado e ganha forma de uma metodologia
sociológica.
O termo fundamental utilizado por Durkheim que deixa explícito o seu holismo
metodológico é o de fato social. Para Durkheim, os fatos sociais são coisas
exteriores que exercem coerção sobre os indivíduos Tal como colocou Anthony
Giddens: “os fatos sociais são externos em relação aos indivíduos e exercem
coerção sobre eles. Em As Regras, prosseguindo no tema do caráter naturalístico da
sociologia, Durkheim sugeriu que essas características do fato social correspondem
à externalidade do mundo físico e às coerções ou resistências que ele oferece aos
nossos atos - posição da qual mais tarde se afastou em parte. Cada indivíduo nasce
numa sociedade já organizada e que por isso lhe modela o desenvolvimento
pessoal: uma sociedade pode ter uma organização estável, em aspectos
discerníveis, no correr de vários séculos, enquanto gerações de indivíduos vivem
suas vidas e morrem. Um indivíduo, portanto, é apenas um elemento de uma
totalidade, uma unidade de um sistema muito maior. As propriedades da totalidade
não de deduzem das propriedades dos indivíduos que se combinam para formá-la.
Durkheim procurou mostrar que o princípio envolvido nisso pode ser iluminado por
analogia com a combinação de entidades químicas. As propriedades do hidrogênio e
do oxigênio, consideradas isoladamente, são muito diferentes das propriedades que
surgem quando eles se combinam para formar a
Assim se vê em Durkheim uma oposição entre indivíduo e sociedade, em que
há a primazia da sociedade sobre o indivíduo. Aqui se encontra uma concepção de
sociedade que tem uma importante conseqüência para sua estruturação do método
sociológico. A idéia de que a sociedade molda o indivíduo é referente à realidade
social, ou seja, ela se refere a uma determinada concepção de sociedade ou de
relação entre indivíduo e sociedade. Esta concepção de sociedade possui
ressonâncias sobre a estruturação durkheimiana do método sociológico.
Desta forma, ao considerar o papel proeminente da sociedade em relação ao
indivíduo, ao postular esta determinada concepção da realidade social, Durkheim

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deveria, naturalmente, transferir esta concepção para o núcleo do seu método
sociológico. Sem dúvida, podemos dizer que foi isto que ocorreu.
O método sociológico de Durkheim se estruturou como um holismo
metodológico. Para Durkheim, se a sociologia quiser o status de ciência, cujo
modelo é o das ciências naturais, deverá retratar os fatos sociais como eles são.
Como eles são? Eles são predominantes sobre os indivíduos, são coercitivos e
objetivos. As representações coletivas (o exemplo mais utilizado por Durkheim é o
da religião) e a educação são fatos sociais, sendo, portanto, predominantes sobre os
indivíduos, exercendo coerção sobre eles[4].
Se a realidade dos fatos sociais demonstra que eles estão acima dos
indivíduos e exerce coerção sobre eles, então o método sociológico deve tomar isto
como o seu princípio metodológico básico. O objeto do conhecimento, assim
concebido, fornece a base empírica que fundamenta o método sociológico. Esta
“base empírica” fundamenta o método sociológico se transforma em um modelo a
ser utilizado pelo sujeito do conhecimento como instrumento para compreender a
realidade social. É por isso que o sociólogo deve tratar os fatos sociais como coisas.
Cabe ao sociólogo superar as pré-noções e os preconceitos e apreender a
realidade de forma objetiva. Isto significa que o sociólogo deve reconhecer o caráter
objetivo e coercitivo dos fatos sociais, ou em outras palavras, que o todo (a
sociedade) predomina sobre as partes (os indivíduos).
Como se compreende, neste contexto, as ações individuais? Como sendo
determinadas socialmente, pois os padrões morais impostos pela sociedade são
mobilizadores. O ser humano tem, segundo Durkheim, uma dupla natureza: uma
individual e outra social. A primeira manifesta o seu lado egoísta que é superado
pelo processo de socialização ao qual o indivíduo é submetido desde sua infância.
Tal como colocou Durkheim,  ”toda educação consiste num esforço contínuo
para impor às crianças maneiras de ver, de sentir e de agir às quais elas não
chegariam espontaneamente, - observação que salta aos olhos todas as vezes que
os fatos são encarados tais quais são e tais quais sempre foram. (...). Se, com o
tempo, esta coerção deixa de ser sentida, é porque pouco a pouco dá lugar a
hábitos, a tendências internas que a tornam inútil, mas que não a substituem senão
porque dela derivam”.

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Por conseguinte, o holismo metodológico de Durkheim remete ao estudo da
totalidade da sociedade. As ações individuais existem mas são consideradas como
sendo produzidas socialmente. É por isso que o método sociológico de Durkheim
preconiza o estudo dos fatos sociais como coisas objetivas, exteriores e coercitivas.
A obra de Durkheim exerceu e continua exercendo uma grande influência
sobre a sociologia e a metodologia das ciências sociais. Além da sua influência
sobre a corrente funcionalista, da qual foi o primeiro representante, também
influenciou outras correntes e pensadores, tal como o seu sobrinho Marcel Mauss.
Este retoma de Durkheim o termo fato social e o altera inserindo-o no interior de sua
concepção que se diferencia da de Durkheim em alguns aspectos.
Nesta concepção, a cultura é um todo que funciona, tal como um organismo.
Sendo assim, tudo que é parte integrante da totalidade integrada tem uma função.
Esta função, por sua vez, tem como finalidade a reprodução do todo. Malinowski diz
que: “definindo o Kula como a atividade primária e mais importante, e as demais
como secundárias, quero fazer ver que essa prioridade está implícita nas próprias
instituições. Ao estudar o comportamento dos nativos e todos os costumes em
questão, vemos que o Kula constitui, sob todos os aspectos, o objetivo principal: as
datas são fixadas, as atividades preliminares estabelecidas, as expedições
organizadas, a organização social determinada, não em função do comércio, mas
sim em função do Kula. A grande festa cerimonial ao iniciar-se uma expedição,
refere-se ao Kula; a cerimonia final da avaliação e contagem dos espólios refere-se
ao Kula e não aos objetos obtidos pelo comércio. Finalmente, a magia, que constitui
um dos principais elementos de todo esse processo, refere-se exclusivamente
ao Kula e isto se abriga até mesmo ao conjunto de mágicas com que se encantam
as canoas. Alguns dos rituais mágicos do ciclo são executados tendo por objetivo as
próprias canoas; outros tem por objetivo o Kula. A construção de canoas está em
conexão direta com uma expedição do Kula”
Desta forma, a relação entre indivíduo e cultura (sociedade) é marcada por
uma relação de subordinação. O indivíduo está subordinado à sociedade. Esta é
uma totalidade orgânica que tem a finalidade de se reproduzir e os indivíduos são os
agentes determinados desta finalidade. A realidade social confirma o método
funcionalista e holista.

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A escola funcionalista em antropologia foi desenvolvida por outro pesquisador
que assumiu grande importância na história desta disciplina científica.  Trata-se de
A. R. Radcliffe-Brown. Ele define sua concepção de vida social comparando-a com a
vida orgânica e assim define o significado dos termos “totalidade” e “função”: “a vida
de um organismo concebe-se como sendo o funcionamento da sua estrutura. É
através de e por meio da continuidade desse funcionamento que esta continuidade
de estrutura se mantém.
Durkheim se desenvolveu e se tornou mais sistemático com as obras de
Mauss, Malinowski e Radcliffe-Brown. Ocorre, porém, que uma nova forma de
holismo metodológico veio a surgir e ocupar grande parte do espaço antes ocupado
pela abordagem funcionalista: o estruturalismo.
O método estrutural surge na lingüística através da obra de Ferdinand de
Saussure. Este cria, com sua lingüística estrutural, as distinções entre língua e fala,
sincronia e diacronia. O método estrutural focaliza os elementos invariantes e
permanentes da linguagem, ou seja, sua estrutura. Claude Lévi-Strauss buscou
transferir o método estrutural da lingüística para a etnologia. Além da lingüística
estrutural de Saussure, a fonologia de Trubetzkoy lhe proporcionou muitos
elementos metodológicos que ele incluiria em sua antropologia estrutural, que seria
uma nova forma de holismo metodológico
O método estruturalista de Lévi-Strauss se fundamenta sob o pressuposto da
existência de estruturas inconscientes. Entretanto, o termo inconsciente, aqui, não
possui o mesmo significado que se encontra na psicanálise freudiana, embora
apresente elementos comuns com a psicanálise estruturalista de Jacques Lacan,
segundo a qual “o inconsciente é a linguagem”
Para Lévi-Strauss, a atividade inconsciente do espírito, ou o espírito humano
invariante, se caracteriza por impor formas a um conteúdo. Essa formas são as
mesmas para todos os espíritos e isto torna possível atingir a estrutura inconsciente
que está na base de todas as instituições. Isto quer dizer, entre outras coisas, que
as estruturas inconscientes são invariantes e universais.
Segundo Jean Piaget, “antes de mais nada, é preciso constatar que se, nessa
perspectiva, tudo é ‘estruturável’, as ‘estruturas’ não corresponderão, entretanto,
senão a certas ‘formas de formas’ entre outras, obedecendo aos critérios limitativos,
porém especialmente compreensivos, de constituir totalidades possuindo suas leis

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enquanto sistemas, de exigir que essas leis se estribem em transformações e,
sobretudo, de assegurar à estrutura sua autonomia e sua auto-regulação”

A abordagem estruturalista compreende a totalidade como um “todo


estruturado de forma hierárquica” cujo centro hierárquico reside no mundo simbólico
(ou no mundo das idéias ou da linguagem). Esta abordagem, que também não deixa
de ser metafísica, pois cria uma autonomização do simbólico em detrimento do real,
se fundamenta numa analogia entre linguagem e sociedade e esta última passa a
ser vista como uma “linguagem secundária”, ou seja, nesta abordagem realiza-se a
subsunção da sociedade à linguagem.
Entretanto, existe duas coisas comuns à ambas as abordagens: elas são
holistas e utilizam como procedimento metodológico a analogia, em que a sociedade
é considerada análoga ao organismo ou à linguagem, o que significa que um e outro
se tornam modelos aos quais a sociedade é subsumida. O indivíduo, aqui, surge
como uma figura apagada, sem poder explicativo e, por conseguinte, valor
metodológico. Entretanto, o indivíduo seria recuperado por um outro tipo de
abordagem: o individualismo metodológico.
O INDIVIDUALISMO METODOLÓGICO
O individualismo metodológico também nasce simultaneamente com a ciência
econômica. Adam Smith, com o seu elogio da divisão social do trabalho, ao instaurar
uma coincidência entre interesse individual e interesse geral, marca o nascimento do
individualismo metodológico nas ciências sociais[17].
Para Adam Smith, o interesse geral é a soma dos interesses individuais e o
indivíduo perseguindo os seus fins egoístas e racionais acaba por servir ao bem
estar geral da população. Este “dado da realidade” torna-se um instrumento
metodológico que permite compreender esta mesma realidade. Embora Adam Smith
não tenha criado uma metodologia científica de forma sistemática e sob estes
pressupostos, isto é verificável em seu procedimento analítico e será o ponto de
partida para a elaboração do individualismo metodológico feito posteriormente de
forma sistematizada. Se o mercado baseado nas ações individuais coloca em
funcionamento a economia nacional, então torna-se desnecessário qualquer
regulação estatal desta. A análise, por conseguinte, deve centralizar-se sobre as

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ações individuais que ocorrem na esfera do mercado, que não passa de uma soma
das ações individuais.
A chamada economia neoclássica ou marginalista retomaria e aprofundaria
tais posições num sentido mais metodológico, privilegiando a “psicologia do
consumidor” como elemento explicativo da procura de produtos e serviço e os
“elementos
Independentemente do tipo de sentido que orienta a ação social, podemos
dizer que trata-se de um sentido subjetivo. Este sentido, por sua vez, é fornecido
pelo indivíduo que executa a ação e este é, portanto, o fundamento do
individualismo metodológico de Weber.
Outro representante do individualismo metodológico em sociologia é Vilfredo
Pareto. Para este autor, a ação social pode ser fruto de uma conduta lógica ou de
uma conduta não-lógica, sendo que só esta última é relevante para a pesquisa
sociológica. A conduta não-lógica do indivíduo é comandada pelo que Pareto chama
de resíduos ou então por interesses (que, no entanto, não passam de tipos
particulares de resíduos). O que são resíduos? Eles “são modificações e
refinamentos do instinto, formados pela experiência; assim, a sexualidade é um
instinto, mas as proibições do incesto e o ascetismo sexual são resíduos” As ações
sociais, como condutas não-lógicas, são predominantes e são dirigidas por
sentimentos, interesses e/ou resíduos. Estas ações são executadas, obviamente,
por indivíduos.
Nas ciências sociais contemporâneas, o individualismo metodológico ressurge
não só através da metodologia weberiana mas também a partir de novas correntes
de pensamento. Entre estas correntes, se destacam: de um lado, a chamada “pós-
modernidade”, tal como proposta, entre outros representantes, por Michel
Maffesoli[24]; de outro, pela etnometodologia e pelo “marxismo analítico”.
É interessante ressaltar a relação do chamado “marxismo analítico” como o
individualismo metodológico, já que Marx não foi incluído como um representante do
holismo metodológico e nem do individualismo. A posição de Marx, ao nosso ver, tal
como procuraremos demonstrar adiante, é oposta tanto ao individualismo quanto ao
holismo. Porém, alguns auto-intitulados “marxistas” defendem com afinco o
individualismo metodológico (assim como outros defendem o holismo, embora não
explicitamente).

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O chamado “marxismo analítico” ou “marxismo de escolha racional” buscam
“reformular” a teoria marxista com a adoção do individualismo metodológico[26].
Embora alguns representantes desta corrente façam algumas ressalvas ao
individualismo, este é sem dúvida o traço distintivo desta forma de “marxismo”. Os
“marxistas analíticos” questionam três aspectos da teoria marxista clássica e
consideram que somente a substituição destes aspectos pela contribuição de
elementos da filosofia analítica e da ciência social positivista poderão salvá-lo.
Quais são estes três aspectos? São o holismo metodológico, a explicação
funcional e a dedução dialética. Deixaremos de lado estes aspectos por três
motivos: em primeiro lugar, tais aspectos, ao nosso ver, não estão presentes no
marxismo original (Marx) e sim em algumas correntes pretensamente marxistas; em
segundo lugar, eles podem ser resumidos a um só termo: holismo metodológico, ao
qual o individualismo busca refutar e substituir, sendo isto será tratado mais adiante;
em terceiro lugar, por não ser relevante de acordo com os objetivos aqui propostos.
Portanto, o individualismo metodológico invade também o campo marxista.
Ele defende que a análise da ação individual é fundamental para explicar a relação
entre indivíduo e sociedade. Isto porque os adeptos desta concepção consideram
que é o indivíduo em relação com os demais indivíduos que dão vida e forma à
sociedade. Instaura-se, assim, a primazia do indivíduo sobre a sociedade. Estamos,
aqui, no extremo oposto do holismo metodológico.
O objeto do conhecimento deixa de ser o “todo metafísico” do holismo
metodológico e passa a ser as suas partes constituintes, que são os indivíduos. Se
na concepção de sociedade se sustenta que esta se caracteriza pela soma das
ações individuais, então isto deve ser integrado no plano metodológico através da
adoção de uma postura individualista. Aliás, a idéia de soma possui uma presença
constante neste tipo de abordagem quando se refere à sociedade.
O sujeito do conhecimento, por sua vez, também não deve se submeter a
nenhuma concepção “holista”, “coletiva” ou “abstrata” que sirva de mediação entre
ele e o seu objeto. Daí a vocação empiricista do individualismo metodológico. Existe
uma negação de qualquer tentativa de generalização mais ampla, pois não se pode
fugir do caráter não generalizador da realidade social vista sob uma perspectiva
individualista.

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Qual é esta diferença? Se a grande diferença no interior do holismo
metodológico se encontra no seu termo fundamental, que é o de totalidade, então a
grande diferença no interior do individualismo metodológico deve se encontra,
também, no seu termo fundamental, que é o de indivíduo.
Para alguns adeptos do individualismo metodológico, o indivíduo é um
ser racional. As motivações dos indivíduos são racionais, bem como sua conduta. O
indivíduo se move e age de acordo com o que lhe é vantajoso e benéfico e esta
ação é produto de um planejamento racional do indivíduo. Esta é a posição de A.
Smith, da economia neoclássica e do chamado “marxismo analítico”.
Para outros adeptos do individualismo metodológico, o indivíduo é um
ser passional ou irracional. Embora este último termo possa parecer muito forte, é o
único que pode unir perspectivas diferentes, tais como a de Weber, Simmel,
Maffesoli, Pareto.
O que isto significa? Significa que a “ação orientada racionalmente com
relação a valores” tem como motivação estes últimos e a racionalidade cumpre
meramente uma função mediadora. Em outras palavras, os elementos racionais
deste tipo de ação social apenas realizam uma mediação entre o substrato irracional
que a motiva e a sua concretização efetiva. O elemento fundamental aqui é o
irracional e não o racional.
Resta apenas um tipo de ação social, que é a ação racionalmente orientada
para fins. Segundo Weber, “age racionalmente com relação a fins aquele que orienta
sua ação conforme o fim, meios e conseqüências implicadas nela e nisso avalia
racionalmente os meios relativamente aos fins, os fins com relação às
conseqüências implicadas e os diferentes fins possíveis entre si. Em qualquer caso,
pois, é aquele que não age afetivamente (sobretudo emotivamente) nem com
relação à tradição. Por outro lado, a decisão entre os diferentes fins e
conseqüências concorrentes e conflitantes pode ser racional com relação a valores.
Neste caso, a ação é racional com relação a fins somente nos seus meios” 
Neste último caso, não está descartado o aspecto irracional da ação, pois sua
“racionalidade” pode ser apenas um meio para execução de fins valorativos. Isto
tudo significa que permanece a existência de um substrato irracional também neste
tipo de ação social. Desta forma, em todos os tipos de ação social pode estar
presente o fundamento “irracional” que acompanha os indivíduos. Existe a

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possibilidade, segundo Weber, de haver uma ação puramente racional, porém, este
seria um “caso limite”.
Somando-se a isto o fato de que os tipos de ação social são tipos ideais
nunca presentes em estado puro na realidade a racionalidade da ação social deve
ser considerada um elemento marginal.
Do ponto de vista histórico, a ação racional direcionada para fins é
equivalente a dominação burocrático-legal o que significa que ela está ligada à
burocratização e ao cálculo econômico capitalista. Esta “racionalidade instrumental”,
para a sociologia romântica de Max Weber, aparece como um “desencantamento do
mundo”. Na concepção weberiana de racionalidade, ela é um instrumento cada vez
mais utilizado para servir a fins irracionais. Ocorre, porém, que o problema não se
encontra nos fins e sim nos meios, ou, em outras palavras, o problema se revela
quando os meios se tornam fins em si mesmos e é isto que produz o
desencantamento do mundo.
Portanto, as duas concepções de individualismo metodológico se distinguem
por uma ser “racionalista” e a outra “irracionalista”, o que significa que uma aceita a
união, embora de forma limitada, entre o indivíduo e a sociedade num nível de
elaboração metodológica e outra recusa tal possibilidade, negando a existência de
leis e a possibilidade de união entre as ciências sociais e as ciências naturais e, por
conseguinte, qualquer tentativa de generalização.

BIBLIOGRAFIA
Althusser, Louis.  A Favor de Marx. 2a edição, Rio de Janeiro, Zahar, 1979.
Anderson, Perry. A Crise da Crise do Marxismo. 3a edição, São Paulo,
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