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233
ECG de Ponta a Ponta
ECG como você nunca viu

Gustavo Galli Reis


Cláudio Caetano de Faria Junior
João Augusto Silva Brustulin

1˚ Edição
Versão Simplificada
E-book

2020
Equipe MedClass - medclass@medclass.org - IP: 177.100.62.233
Editor

Gustavo Galli Reis

Doutor em Ciência pela Universidade de São Paulo (USP) e Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia
(IDPC)

Título de Especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) / Associação


Médica Brasileira (AMB)

Título de Especialista em Estimulação Cardíaca pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular


(SBCCV) / AMB

Docente de Cardiologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)

Pesquisador pelo Grupo Eletrofisiologia Cardíaca Londrina

Editores associados

Cláudio Caetano de Faria Junior

Título de Especialista em Cardiologia pela SBC / AMB

Título de Especialista em Eletrofisiologia Clínica Invasiva pela Sociedade Brasileira de Arritmias


Cardíacas (SOBRAC) / AMB

Título de Especialista em Estimulação Cardíaca pela SOBRAC / AMB

Pesquisador pelo Grupo Eletrofisiologia Cardíaca Londrina

João Augusto Silva Brustulin

Título de Especialista em Cardiologia pela SBC / AMB

Título de Especialista em Eletrofisiologia Clínica Invasiva pela SOBRAC / AMB

Preceptor do Internato de Cardiologia pela PUCPR

Pesquisador pelo Grupo Eletrofisiologia Cardíaca Londrina

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Colaboradores

Cesar Eumann Mesas

Doutor em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo

Título de Especialista em Cardiologia pela SBC / AMB

Título de Especialista em Eletrofisiologia Clínica Invasiva pela SOBRAC / AMB

Chefe do Serviço de Eletrofisiologia do Hospital Universitário do Norte do Paraná (HURNP)

Docente de Cardiologia pela Universidade Estadual de Londrina (UEL)

Pesquisador pelo Grupo Eletrofisiologia Cardíaca Londrina

George Arouche Câmara Lopes

Médico pela Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA)

Residência Médica em Anatomia Patológica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São


Paulo (FMUSP)

Fellow na Harvard School

MBA pela Fundação Getúlio Vargas (FGV)

Professor de Patologia pelo Grupo Educacional São Lucas

Eliane Andréa Galli dos Reis

Artista Plástica

Designer

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Prefácio

Este material é uma introdução descomplicada a eletrocardiografia. Nossa equipe esteve preocupada
com uma escrita simples, direta e em uma sequência que julgamos apropriada para os alunos que
estão aprendendo eletrocardiograma (ECG), em todos os níveis.

Em muitos momentos você poderá observar que fugimos das explicações e imagens tradicionais dos
materiais já existentes.

O ECG de 12 derivações é um método diagnóstico de valor inestimado, sem dúvida representa um


marco para a medicina diagnóstica. A invenção deste método é de autoria do médico holandês Willem
Einthoven (1903). Apesar de existir há mais de 100 anos e de fazer parte da formação dos profissionais
de saúde desde o início, o aprendizado de ECG continua um grande desafio para milhares de
estudantes.

Como apenas 12 derivações podem, ao mesmo tempo, trazer tanta informação e tanta dificuldade?

Entender a atividade elétrica do coração manifesta no ECG é sem dúvida alguma um desafio. Com as
ferramentas certas ficará muito mais fácil vencê-lo.

É comum os alunos ficarem perdidos na imensidão de informação sobre o assunto. Uma falha
frequente que detectamos é a tentativa de decorar determinados padrões patológicos do ECG sem
compreender a base eletrocardiográfica, sem ter noção espacial das manifestações elétricas.

A característica principal deste material é a didática, nos empenhamos em traduzir a atividade elétrica
do coração através de uma linguagem lógica, sequencial e filtrada.

Saber interpretar ECG de uma maneira precisa e rápida é fundamental para todo profissional de saúde,
especialmente para médicos que atuam em pronto atendimento, unidade básica de saúde, unidade
de atendimento pré-hospitalar, unidade de terapia intensiva, semi-intensiva e unidade coronária.

Por fim, este material foi criado como apoio ao estudante que está realizando o curso completo “ECG
de Ponta a Ponta”. Este conteúdo resumido é um excelente ponto de partida para abrir a mente ao
aprendizado do ECG.

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Sumário

Capítulo 1. Noções Fundamentais

Capítulo 2. Eletrocardiograma Normal

Capítulo 3. Sobrecargas

Capítulo 4. Bradicardia e Bloqueios Atrioventriculares

Capítulo 5. Bloqueios de Ramo do Feixe de His e dos seus Fascículos

Capítulo 6. Taquiarritmias de QRS estreito

Capítulo 7. Taquiarritmias de QRS largo

Capítulo 8. Isquemia, Corrente de Lesão e Necrose

Capítulo 9. Organizando o Laudo do ECG

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CAPÍTULO 1
Noções Fundamentais

1. Conceitos: o que você precisa saber para iniciar seu entendimento do eletrocardiograma
(ECG)

O coração funciona como uma “bomba” ejetando sangue pouco oxigenado aos pulmões e na
sequência enviando o sangue rico em oxigênio para os demais órgãos.
Cada batimento cardíaco, ou seja, cada atividade mecânica do coração é precedida por uma
atividade elétrica que, em situação de normalidade, acontece de forma regular e sequencial.

1.1. Anatomia Básica do Sistema Elétrico do Coração

O coração humano está localizado no mediastino médio. Possui uma posição oblíqua em
relação à caixa torácica e seu ápice está direcionado para baixo, para esquerda e para frente.
Aproximadamente 2/3 de sua massa está à esquerda da linha média do tórax.
O coração humano possui um complexo e especializado sistema elétrico capaz de propagar de
modo rápido e eficaz a atividade elétrica do coração.
Na Figura 1, podemos observar estruturas importantes deste sistema. Na porção superior do
átrio direito, próximo da desembocadura da veia cava superior, há um grupamento de células
capazes de gerar atividade elétrica de maneira automática, esta estrutura é chamada de Nó
Sinoatrial (NSA). A atividade elétrica oriunda do NSA se propaga para o átrio esquerdo através
dos Feixe de Bachmann, despolarizando os átrios da direita para a esquerda. Esta atividade
elétrica se propaga, da mesma forma, do NSA para o Nó Atrioventricular (NAV) por meio dos
Feixes Internodais. No final da diástole (fase de relaxamento ventricular) ambos os átrios se
contraem simultaneamente.
O estímulo elétrico oriundo dos átrios chega ao NAV onde, habitualmente, há uma lentificação
na passagem do estímulo. Vale lembrar que o NAV também possui um grupamento de células
com a capacidade de automatismo, semelhante ao NSA, mas com uma frequência automática
menor.
Após a despolarização do NAV, o estímulo elétrico se propagada aos ventrículos através do
Feixe de His, Ramos Direito e Esquerdo, Fascículos e Fibras de Purkinje.

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Este sistema permite que a atividade elétrica seja transmitida rapidamente para todo o
coração, despolarizando as células cardíacas no menor tempo possível.
Graças a rede elétrica descrita e as conexões entre células miocárdicas, o coração funciona
como dois sincícios, um atrial e outro ventricular, contraindo como “blocos”.
Vale ressaltar que a despolarização e contração ocorrem fisiologicamente do endocárdio para
o epicárdio.

Figura 1: Anatomia do Sistema Elétrico do Coração. NSA= Nó Sinoatrial; NAV= Nó Atrioventricular;


RE: Ramo Esquerdo do Feixe de His; FASE= Fascículo Anterossuperior Esquerdo; RD= Ramo Direito

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1.2. O Eletrocardiograma de 12 Derivações

O ECG é um método diagnóstico capaz de registrar a atividade elétrica do coração por meio
de eletrodos adequadamente posicionados na superfície corporal (Figura 2).
O registro desta atividade elétrica se dá através de papel quadriculado (impresso ou
digitalizado) (Figura 3).

Figura 2: Posicionamento dos 10 eletrodos que irão formar as 12 derivações do ECG. MSD= Membro Superior
Direito; MSE= Membro Superior Esquerdo; MID= Membro Inferior Direito; MIE= Membro Inferior Esquerdo;
Derivações Precordiais de V1 a V6. De modo padrão V1 está localizado na borda esternal direita (4 EIC); V2
na borda esternal esquerda (4 EIC); V3 na metade do trajeto entre V2 e V4; V4 na linha hemiclavicular
esquerda (5 EIC); V5 linha axilar anterior esquerda (5 EIC); V6 linha axilar média esquerda (5 EIC)

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Figura 3: Registro da Atividade Elétrica do Coração em Papel Quadriculado. Padrão 25 mm/s; 10 mm/mV.
Observe as 12 derivações (plano frontal + horizontal). Observe também que na porção inferior do traçado é
registrado uma derivação longa, esta, tem como finalidade principal a análise de arritmias. Habitualmente
é selecionado DII para o registro longo.

1.3. O papel de Registro

Por padronização do método, o ECG é registado em papel quadriculado, vale lembrar que cada
quadrado grande é constituído por 5 quadrados pequenos.
O lado do quadrado pequeno possui 1 mm e corresponde, na horizontal, a 40 milissegundos
(ms) ou 0,04 segundos (s) de duração. Na vertical 1 mm equivale a 0,1 mV de voltagem (Figura
4).
Os critérios utilizados para a interpretação do ECG pressupõem a padronização da gravação,
sendo assim, ao analisar um ECG, é necessário que o registro tenha sido adquirido com uma
velocidade de 25 mm/s e uma amplitude (voltagem) de 10 mm/mV (Figura 3, porção inferior
esquerda).

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1 mm

0,1 mV 1 mm

0,5 mV

0,04 s

0,2 s
Figura 4: Medidas referentes ao papel quadriculado. 0,04 segundos = 40 milissegundos

1.4. Sequência de Ativação Elétrica

Em situação de normalidade, a ativação elétrica cardíaca se faz no sentido craniocaudal (dos


átrios para os ventrículos). No ECG, estes fenômenos são registrados em ordem alfabética por
meio da onda P (despolarização dos átrios), complexo QRS (despolarização dos ventrículos),
onda T (repolarização ventricular) e onda U (final da repolarização ventricular) (Figura 5).
Vale ressaltar que os átrios também se repolarizam (poderíamos falar em onda “T atrial”), no
entanto este fenômeno é desprezível em termos de registro eletrocardiográfico. Alguns
autores atribuem a ausência de visualização da repolarização atrial pelo fato da mesma ocorrer
simultaneamente com o complexo QRS e assim ficar “oculta”. Sabe-se que esta justificativa
não é totalmente verdadeira, pois, em situações de bloqueios atrioventriculares (BAV), onde
os complexos QRS estão ausentes, a onda P não é seguida por onda “T atrial” visível.

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1.5. Intervalos

É importante citar que, para a análise eletrocardiográfica, os valores de normalidade diferem


de acordo com sexo e especialmente de acordo com a faixa etária do paciente. Neste material
a análise foi direcionada para o ECG de adultos (Figura 5).
A onda P, em situação de normalidade, deve ocorrer com duração menor que 120 ms (3
quadrados pequenos).
O intervalo PR (condução AV) deve ocorrer entre 120 e 200 ms. Vale lembrar que o NAV
apresenta característica de condução decremental e lentificação fisiológica na condução dos
átrios para os ventrículos.
Se a ativação ventricular for muito precoce (intervalo PR curto) pode-se estar diante da
presença de uma via acessória. Se, por outro lado, a ativação ventricular se fizer tardiamente
(intervalo PR longo) ou se estiver ausente (P sem QRS), há a presença de algum grau de
bloqueio AV (funcional ou anatômico).
É fundamental ressaltar que cada ativação atrial (P) deve gerar obrigatoriamente uma ativação
ventricular (QRS), na razão 1:1. Qualquer cenário diferente deste deve ser cuidadosamente
analisado.
Os ventrículos possuem uma vasta rede elétrica capaz de despolarizar ambos os lados
rapidamente com duração do complexo QRS inferior à 120 ms. Quando há lesão anatômica ou
funcional deste sistema haverá atraso na despolarização ventricular gerando complexos QRS
de duração aumentada (bloqueio de ramo ou de seus fascículos).
A onda T não possui uma duração específica, ela é normalmente assimétrica, de início mais
lento e final mais rápido. A sua polaridade costuma acompanhar a polaridade do QRS e a
amplitude corresponde a 10 a 30 % da amplitude do QRS.
Por fim, uma análise importante, especialmente no que diz respeito ao risco de arritmias
ventriculares, é a medida da duração do intervalo QT. Este intervalo deve ter o valor corrigido
pela frequência cardíaca (QTc). Dentre as literaturas mais utilizadas, considera-se como
intervalo QT corrigido normal, uma duração menor que 450 ms para homens e menor que 470
ms para mulheres.
Intervalo QTc menor que 430 ms é considerado curto.
Existem algumas fórmulas para a correção do intervalo QT, a mais estudada e utilizada é a
fórmula de Bazzet (Figura 6), no entanto, sabe-se que esta fórmula perde a precisão quando
se está analisando um ECG com a frequência cardíaca inferior a 60 bpm ou superior a 90 bpm.

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Uma dica valiosa, a derivação D II é a mais utilizada para a realização das medidas dos
intervalos citados. Para a medida do intervalo QT as derivações DII e V5 são as mais
recomendadas.

QRS
P T
U

2
3
4

Figura 5: Intervalos:
1 = Duração onda P
2 = Duração intervalo PR
3 = Duração complexo QRS
4 = Duração intervalo QT

*medidas em ms

**velocidade de gravação de 25 mm/s

***necessário corrigir o QT pela FC

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Qtc = QT / √𝑹𝑹

Figura 6: Fórmula de Bazzet. QT= duração intervalo QT em segundos; QTc= duração do intervalo QT
corrigido; RR= duração entre dois complexos QRS em segundos

1.6. Vetores

Quando uma frente de despolarização elétrica vai em direção (se aproxima) de uma
determinada derivação, gera no ECG o registro de uma onda positiva. Quando, ao contrário,
esta frente de ativação foge de uma determinada derivação, gera uma onda negativa.
Em breve será demostrado o ponto de vista de cada derivação. Por exemplo: o ponto de vista
da derivação DI é do MSE, se a despolarização atrial ocorrer da direita para a esquerda, como
no ritmo sinusal, aparecerá no ECG uma onda P positiva. Esta mesma onda P, vista da direta,
como por exemplo aVR, será negativa, pois a frente de ativação está fugindo de aVR (Figura
7).
Este raciocínio básico de vetores serve tanto para a onda P quanto para o QRS.

Figura 7: Vetores. A polaridade da onda P e do complexo QRS de acordo com o sentido da frente de
ativação

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1.7. Planos e Derivações

1.7.1. Plano Frontal


Dividido em derivações bipolares (DI, DII, DIII) (Figura 8) e derivações unipolares aumentadas
(aVR, aVL, aVF), estas últimas referentes à: Right = Direita; Left = Esquerda e Foot = Pé.

1.7.2. Plano Horizontal


Formado pelas derivações precordiais unipolares, registram o potencial elétrico de cada um
dos seis pontos torácicos (V1, V2, V3, V4, V5, V6). De maneira simplista, estes eletrodos
representam os polos positivos e, portanto, serão considerados o “ponto de vista da
derivação” (Figura 2).
É de extrema importância saber qual o “ponto de vista” de cada derivação, por exemplo, DI é
uma derivação construída pelos polos (eletrodos) posicionados entre os membros superiores.
O polo positivo está localizado no MSE e é ele que se considera o “ponto de vista” da derivação.
Na figura 9, estão representados os “pontos de vista” (polos positivos) das diversas derivações.

Figura 8: Triângulo de Einthoven. Eletrodos colocados nos membros superiores e no MIE formam um
triângulo. Cada par de eletrodo forma uma derivação bipolar do plano frontal (DI, DII e DIII).

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Figura 9: Derivações do Plano Frontal. Notem que é necessário um polo positivo e um polo negativo para o
registro elétrico. No entanto, o polo positivo que é considerado o “ponto de vista”. No caso das derivações
unipolares aumentadas (aVR, aVL, aVF), o polo negativo é formado pela somatória de dois eletrodos.

1.8. Eixo Elétrico do Coração

Uma vez que a ativação elétrica se inicia no NSA (átrio direito) e se propaga para a esquerda e
para baixo, há a formação de um vetor elétrico resultante, tanto nos átrios quanto nos
ventrículos.
O eixo elétrico normal da onda P (átrios) está entre 0 e + 90˚.
Neste momento, iremos priorizar a avaliação do eixo elétrico resultante da despolarização
ventricular (QRS). Considera-se normal um eixo de despolarização ventricular entre -30˚ e +90˚
(Figura 10).

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1.9. Sistema Hexaxial

O sistema Hexaxial de Bailey tem a finalidade de calcular o eixo elétrico médio (vetor
resultante) do coração. É construído através do triângulo de Einthoven e das derivações
aumentadas (em conjunto formam o plano frontal) (Figura 10).
Conhecer o eixo elétrico é fundamental para uma boa análise do eletrocardiograma. Muitas
alterações patológicas do coração causam desvio do eixo cardíaco para a direita (> 90˚) ou para
a esquerda (< -30˚). Vale citar que existem situações não patológicas de desvio do eixo
cardíaco, como por exemplo o biotipo do paciente. Nos pacientes brevilíneos, o eixo cardíaco
tende a ficar horizontalizado (< -30˚), nos longilíneos tende a ficar verticalizado (> 90˚).
Mais precisamente, eixo entre -30˚ e – 90˚ está desviado para a esquerda, entre 90˚ e 180˚
está desviado para a direita e entre -90˚ e -180˚ apresenta desvio extremo do eixo.
Uma maneira mais prática, que resolve a maioria dos casos, é verificar se o eixo está no
primeiro quadrante (0 a + 90˚). Isto ocorre se a polaridade do QRS predomina positiva em DI
(zero grau) e positiva em aVF (+ 90˚). Se isto ocorrer é sabido que o eixo está normal.
Para uma análise mais precisa, o eixo elétrico pode ser estimado, passo a passo, da seguinte
forma:

Passo 1: Procurar a derivação mais isodifásica do plano frontal (Figura 11);

Passo 2: Procurar a derivação que está perpendicular à encontrada no passo 1. É nesta


derivação que será encontrado o eixo elétrico (Figura 12);

Passo 3: Ver qual a polaridade do QRS na derivação encontrada no passo 2. Se o QRS for
positivo, o eixo acompanha o sentido da derivação, se for negativo, o eixo está no sentido
contrário (Figura 13).

As figuras irão ajudar o melhor entendimento da localização do eixo.


Vale ressaltar que existem alguns artifícios (macetes) para a análise do eixo cardíaco. Estes,
são explorados no curso ECG de Ponta a Ponta.

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Figura 10: Sistema Hexaxial de Bailey. Cada derivação corresponde a um determinado ângulo, observe que o
sinal (+) se refere ao sentido da derivação. Por exemplo: se a polaridade do QRS em aVR for positiva, o eixo está
apontando para -150˚. Por outro lado, se a polaridade do QRS em aVR for negativa, o eixo está apontando para
+30˚. *Em vermelho, as setas indicam os limites de normalidade do eixo cardíaco.

A B C

Figura 11: Passo 1: Pesquisa da derivação com QRS isodifásico. A= QRS negativo; B= QRS isodifásico; C= QRS
positivo.

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DII

aVL

Figura 12: Passo 2: Supondo que a derivação mais isodifásica seja DII (azul), o eixo elétrico está perpendicular a
DII (aVL, em vermelho).

Figura 13: Passo 3: A derivação aVL aponta para o MSE (+). Se o QRS de aVL estivesse positivo, o eixo estaria no
sentido de aVL (- 30˚), como o QRS de aVL está negativo, o eixo está a + 150˚.

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2. Ritmo Cardíaco

O ritmo cardíaco é determinado pela estrutura que apresenta a despolarização mais precoce
no coração.
Duas estruturas cardíacas são formadas por grupamento de células especializadas, as
chamadas células marcapasso, responsáveis pelo início automático da atividade elétrica
cardíaca.
Estas estruturas são denominadas NSA e NAV. Dentre elas, o NSA é a estrutura com
automatismo mais rápido e que, hierarquicamente, comanda o ritmo do coração.
Quando o estímulo elétrico é iniciado no NSA, a FC em repouso considerada normal, para
adultos, é de 50 a 100 bpm.
Durante nosso estudo você aprenderá a identificar um ECG cuja ativação elétrica foi iniciada
no NSA. É possível, em situações de anormalidade, que a ativação elétrica se inicie em um foco
ectópico atrial, no NAV ou até mesmo nos ventrículos. Estes cenários serão explorados em
outros capítulos.

3. Frequência Cardíaca

A frequência cardíaca em repouso difere entre as faixas etárias. Em adultos, é considerado


normal uma FC de repouso entre 50 e 100 bpm. FC inferiores a 50 bpm são denominadas
bradicardias, FC superiores a 100 bpm são consideradas taquicardias.
O sistema elétrico é uma rede hierarquizada, o NSA (marcapasso fisiológico) possui um
automatismo que é maior que o NAV. Este sistema segue o seguinte racional, se uma
determinada estrutura não dispara (despolariza), as estruturas abaixo dela tentam “assumir”
o comando elétrico do coração como uma medida de defesa. Quanto mais inferior (caudal) é
iniciado o batimento, mais lento costuma ser a FC de disparo.
Para o cálculo da frequência cardíaca no ECG, no caso de ritmos regulares, pode-se utilizar as
seguintes regras:
a. 1500 / n quadrados pequenos:
b. 300 / n quadrados grandes (Figura 14)

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QRS QRS

P T P

Figura 14: Cálculo da FC. Entre 2 complexos QRS há distanciamento de 17 quadrados pequenos. FC=
1500/17 = 88 bpm.

Para o cálculo da FC em ritmos irregulares, como na fibrilação atrial, é necessário fazer uma
média baseada no número de complexos QRS durante 6 segundos (Figura 15).

Figura 15: Cálculo da FC em ritmos irregulares. Deve-se contar o número de complexos QRS existentes durante
6 segundos de registro. É necessário utilizar uma derivação com gravação prolongada (por exemplo DII longo).
Como cada quadrado grande tem 200 ms, serão necessários 30 quadrados grandes para obter 6000 ms, ou
melhor, 6 segundos. O número de complexos QRS encontrados deve ser multiplicado por 10. Neste exemplo
temos uma FC aproximada de 70 bpm (7 × 10).

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4. O Coração: da Despolarização à Contração

As células vivas em repouso apresentam uma diferença de potencial elétrico entre os lados da
membrana celular, sendo o interior negativo em relação ao exterior, chamado potencial de
repouso. No coração, esta diferença de potencial pode ser de 50 mV nas células automáticas,
até 90 mV a 100 mV nas células de condução.
O potencial de repouso é fundamental para a homeostase celular. A inversão ou anulação
momentânea das cargas elétricas pode gerar sinais elétrico propagados capazes de deflagrar
e controlar uma atividade tecidual organizada, como a contração muscular. Esta modificação
momentânea e propagada do potencial de repouso é chamada de potencial de ação.
O potencial de ação é um fenômeno passivo (sem gasto de energia) que se propaga
rapidamente por toda a membrana celular e de uma célula a outra. Adicionalmente o potencial
de ação também se propaga dentro da célula por todo o retículo sarcoplasmático, liberando
cálcio. Quando, num determinado local da membrana, por efeito de algum estímulo, o
potencial de repouso é reduzido em 20 mV a 25 mV, surge o potencial de ação, que
rapidamente se propaga por toda a célula.
As células cardíacas apresentam intensa interdigitação com as células vizinhas visíveis na
microscopia ótica, como linhas escuras chamadas “discos intercalares”. Essas regiões são ricas
em desmossomos e conexinas, as quais promovem grande aumento da condutância iônica.
Por conta disso, graças a essas junções, as células cardíacas transmitem o estímulo elétrico
diretamente de uma célula à outra.

Disco Intercalar

Célula Contráctil do Coração

Figura 16: Representação esquemática simplificada da ativação elétrica de uma célula cardíaca à outra.

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Referências

I. Pastore CA, Pinho JA, Pinho C, Samesima N, Pereira-Filho HG, et.al. III Diretrizes da
Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Análise e Emissão de Laudos
Eletrocardiográficos. 2016. Vol 1 (4), Supl.1.
II. Mateos JCP. Marca-passos, desfibriladores e ressincronizadores cardíacos: noções
fundamentais para o clínico. 2014. Ed. Atheneu.

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