Você está na página 1de 3

Temos um governo a ganhar

Por Bruno Costa – Militante do PT/DF e Assessor da Liderança do PT no Senado Federal

A primeira importante vitória do governo Lula no Parlamento se deu antes mesmo de Lula
tomar posse, uma vez que Bolsonaro praticamente abandonou o exercício da Presidência da
República após a derrota eleitoral e deixou um cenário orçamentário de terra arrasada para o
futuro governo.

Nesse contexto, a Proposta de Emenda à Constituição n° 32, de 2022, chamada PEC da


Transição, ganhou centralidade política, e foi aprovada com ampla maioria de votos no Senado
Federal e na Câmara dos Deputados ainda em dezembro de 2022, abrindo espaço fiscal para
que o futuro governo pudesse assegurar o funcionamento da máquina pública e financiar
políticas públicas fundamentais, como o novo Bolsa Família, em 2023.

Naquele momento muitos jogos estavam sendo jogados nos bastidores da política, como a
composição do futuro governo e de sua base de sustentação parlamentar, mas também a
disputa pelo comando da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. A decisão da Bancada
do PT na Câmara de apoiar a reeleição de Arthur Lira (PP-AL) para a presidência da Câmara, e
da Bancada do PT no Senado de apoiar a reeleição de Rodrigo Pacheco (PSD/MG) para a
presidência do Senado, embora passíveis de críticas, tornaram o ambiente mais favorável à
aprovação da PEC da Transição.

Além de abrir espaço fiscal da ordem de R$ 145 bilhões para o exercício financeiro de 2023, a
PEC da Transição estabeleceu que o Presidente da República deveria encaminhar ao Congresso
Nacional, até 31 de agosto de 2023, projeto de lei complementar com o objetivo de instituir
regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade macroeconômica do País e criar as
condições adequadas ao crescimento socioeconômico, prevendo a automática revogação do
Teto de Gastos após a sanção da lei complementar.

Assim sendo, aprovado e sancionado o PLP 93/2023 (regime fiscal sustentável), encaminhado
pela equipe econômica do governo Lula ao Parlamento, restará revogado o Teto de Gastos
instituído no pós-golpe, uma vez que o próprio PLP 93/2023 estabelece um novo tipo de teto
para os gastos públicos, que permite o crescimento dos gastos em momentos de crescimento
da arrecadação e de cumprimento das metas de superávit primário, mas que estabelece uma
série de travas quando as metas não forem cumpridas, de modo que a capacidade do governo
de implementar medidas econômicas anticíclicas em momentos de estagnação econômica
será comprometida.

Outro jogo que estava sendo jogado com bastante vigor pela extrema-direita era a tentativa de
impedir a posse de Lula e desencadear um novo golpe militar no Brasil. Os acampamentos
montados em frente aos quarteis das Forças Armadas pelo Brasil afora, o quebra-quebra
promovido em Brasília quando da diplomação de Lula e a instalação de artefato explosivo em
um caminhão de combustível próximo ao Aeroporto Internacional de Brasília foram os
antecedentes do que viria a ocorrer no dia 08 de janeiro de 2023, com a complacência
criminosa das forças de segurança pública: a invasão e destruição das sedes do Três Poderes
da República. A ausência de reação popular organizada ao movimento golpista tornou a
democracia brasileira refém da institucionalidade.
A PEC da Transição foi aprovada, uma multidão acompanhou a posse de Lula, o movimento
golpista foi temporariamente debelado e o comando das duas casas do Congresso Nacional foi
definido: Arthur Lira e Rodrigo Pacheco foram reeleitos presidentes da Câmara dos Deputados
e do Senado Federal, respectivamente, com o apoio das bancadas do PT.

Neste momento, a pauta prioritária do governo Lula no Parlamento é a aprovação do PLP


93/2023, que institui o novo arcabouço fiscal. A proposição foi bastante piorada pelo relator
da matéria na Câmara dos Deputados, o Deputado Claudio Cajado (PP/BA), considerado um
parlamentar da confiança de Arthur Lira (PP/AL).

Em seu relatório, Cajado tornou o regime fiscal proposto pela equipe econômica do governo
Lula mais austero, incluindo a complementação da União ao Fundeb e os recursos destinados
ao pagamento do piso salarial da Enfermagem dentro do teto, a pressionar as despesas com
outras políticas públicas. Na proposição original do governo, a complementação da União ao
Fundeb e os recursos destinados ao pagamento do piso salarial da Enfermagem estavam foram
do teto. Mas de que teto estamos falando, se prometemos a revogação do Teto de Gastos na
campanha eleitoral? De um novo teto, que permite o crescimento das despesas em cenários
econômicos favoráveis, mas que limita essas despesas em caso de descumprimento das metas
fiscais.

O PLP 93/2023, na forma do relatório do Claudio Cajado, já foi aprovado no Plenário da


Câmara dos Deputados, por 372 votos a 108, e a Bancada do PT na Câmara dos Deputados
optou por não apresentar destaque de bancada ao texto-base, ou seja, por não tentar
modificá-lo. A matéria foi remetida ao Senado Federal.

A oposição ao governo, por sua vez, busca retirar o foco da agenda governamental através de
comissões parlamentares de inquérito, como a CPMI destinada a investigar os atos de ação e
omissão ocorridos em 8 de janeiro de 2023, quando da invasão e destruição das sedes dos Três
Poderes da República, em Brasília; a CPI do MST na Câmara; e a CPI das ONGs no Senado. O
funcionamento simultâneo de tantas CPIs pode prejudicar a agenda do governo no Parlamento
e revela a fragilidade da base de sustentação parlamentar do governo, embora sempre seja
possível fazer dos limões uma limonada.

O que fica evidente, no entanto, é a necessidade de equilibrar luta institucional e luta política
na sociedade. A depender única e exclusivamente da correlação de forças no Parlamento, a
balança tende a ser sempre desfavorável à classe trabalhadora. Cabe à classe trabalhadora,
através de suas organizações políticas, tentar participar da escrita da história com muita
mobilização e luta.

Na área da educação, temos de enfrentar o debate do novo Plano Nacional de Educação, do


Sistema Nacional de Educação, da Lei de Responsabilidade Educacional, do Custo Aluno
Qualidade como parâmetro para o financiamento do padrão de qualidade reivindicado pelo
texto constitucional, do Piso Salarial do Magistério Público da Educação Básica e de o que fazer
com o Ensino Médio. A mobilização dos profissionais da educação e dos estudantes será
fundamental para que o novo PNE, o SNE, a LRE, o CAQ e o EM avancem no sentido de efetivar
o direito à educação pública, gratuita e de qualidade. A mobilização também será fundamental
para que uma eventual atualização da Lei do Piso Salarial do Magistério Público da Educação
Básica não signifique retrocesso para as professoras e os professores das escolas públicas.

Como observa István Mészáros na obra A educação para além do capital,


[...] a dinâmica da história não é uma força externa misteriosa
qualquer e sim uma intervenção de uma enorme multiplicidade de
seres humanos no processo histórico real, na linha da “manutenção
e/ou mudança” [...] de uma dada concepção de mundo que, por
conseguinte, atrasará ou apressará a chegada de uma mudança
social significativa.

Em outras palavras, temos um governo a ganhar.

Você também pode gostar