Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
TERAPIA COGNITIVO-
COMPORTAMENTAL NA
PREVENÇÃO AO SUICÍDIO
2
havendo decréscimo a partir dos anos 2000 em nível mundial. No entanto o Brasil
não acompanhou essa estatística positiva, apresentando taxa de mortes por
suicídio superior à taxa de crescimento populacional, com um aumento de 20%
entre os anos 2000 e 2012, aproximando-se do número de 6 mortes para cada
100 mil habitantes ano, tendo como expoentes os adultos jovens do sexo
masculino.
Há estudos que apresentam a ideação suicida como um fator constante
entre a população que busca ajuda terapêutica ou se encontra, em algum
momento, hospitalizada, constituindo-se em importante fator a ser observado e
considerado como sinal de alerta.
É importante ter claro que falar em lucidez de consciência na
intencionalidade suicida é vago e pouco confiável, pois há inúmeros e diferentes
fatores que influenciam esse momento, e em alguns momentos críticos essa
lucidez é difícil de ser mantida.
Quando se estuda o comportamento suicida, é necessário ter cautela ao
caracterizar as pessoas. Por exemplo, há quem trabalhe com profissões de risco,
e nem por isso apresentam ideação, comportamento ou intenção suicida. No
entanto pode-se pensar ainda em dois termos:
3
Observa-se que o ato suicida apresenta, via de regra, agressividade e
impulsividade. Mann, Brent e Arango (2001) relatam que pesquisas revelaram que
o ácido 5-hidroxi-indolacético (5-HIAA), que é um metabólito da serotonina,
encontrava-se em níveis abaixo do esperado no líquido cefalorraquidiano de
pessoas que tinham tentado o suicídio. Essas pesquisas, que se iniciaram da
década de 1970, continuaram a ser desenvolvidas e hoje apontam que a relação
entre agressividade – impulsividade e o baixo nível de 5–HIAA – se mantém
estável ao longo da vida e pode estar ligada tanto à genética quanto a fatores de
privação materna ou abuso físico na infância. Pessoas com essa característica
em níveis de serotonina podem apresentam até 5 vezes mais risco de cometerem
o suicídio.
Labonté e Turecki (2010) trazem à luz a importância de se incorporar os
fatores ambientais nas causas genéticas que propulsionam o suicídio. Uma série
de estudos recentes têm mostrado alterações na estrutura do DNA associadas ao
comportamento suicida. Essas alterações, chamadas de epigenéticas, ocorrem
por meio de mecanismos moleculares que, em função de fatores ambientais, não
alteram os genes em si, mas sua ativação ou desativação (expressão genética).
Estima-se que a hereditariedade possa apresentar uma taxa de 55%.
A taxa de concordância para o suicídio em gêmeos monozigóticos, por
exemplo, pode ser 17 vezes maior que a observada em gêmeos dizigóticos.
4
porque se aprende por modelagem (veremos a seguir) e a proximidade ao fato, o
qual costuma gerar impacto emocional, em especial se a pessoa que o cometeu
tem valoração moral para aquela que o observa (ídolo, história de vida
semelhante, familiar etc.), o que pode dar início ou despertar a ideação suicida.
3.2 Modelagem
5
Então, podemos entender que os suicídios que recebem atenção pública podem
sim influenciar pessoas que já possuíam em seu repertório algum nível de
comportamento suicida, inclusive porque geram expectativas de atenção
póstuma, sentimento de pena, de elevação do seu status social ou ainda de
vingança.
Almeida (2000, p. 38) nos informa que estudos comprovam que o efeito da
modelagem “depende do número de modelos, das características do modelo (e.g.,
idade, sexo e estatuto social), a intensidade com que o comportamento do modelo
é reforçado e as características do observador”.
A autora continua:
Almeida (2000) conta ainda em seu estudo que obteve como resultado de
sua pesquisa que entre os adolescentes que tinham amigos que haviam tentado
suicídio alguma vez, a ideação suicida era maior que entre os adolescentes que
não possuíam amigos com tentativas ou ideações anteriores.
6
Figura 1 – Adolescente e suicídio
8
autolesivo, que podem ser as seguintes:
10
questões relacionadas a cada etapa de aprendizagem. É importante também
compreender as funções parentais para orientar, caso necessário, seus pacientes
nas demandas que possam surgir com filhos ou dependentes.
O ideal é que o jovem sinta, por parte dos pais ou responsáveis, que ele
possui certa autonomia e que esta deve ser reforçada a cada novo contrato,
permitindo que ele saiba que os pais têm confiança de que sua palavra é
verdadeira e de que cumprirá o contrato. No entanto, vale salientar que os papéis
parentais lhe reservam a autoridade para o direcionamento da educação, e por
isso, deve-se realizar uma supervisão eventual em gavetas, armários e celular.
Em caso de quebra de contrato, os pais devem refletir com o filho as
consequências de suas ações, perdendo os direitos conquistados até aquele
momento. Com base nisso, juntos devem pensar e buscar encontrar novas
alternativa e repertórios de comportamento para que paulatinamente os direitos
da autonomia perdida sejam reconquistados e conquistados novos.
Mais especificamente em relação à internet e às redes sociais, deve haver
vigilância sobre como as relações e as conversas se desenvolvem, com a
finalidade de orientação e proteção, estando atentos ao conteúdo acessado, a fim
de que sejam evitados jogos suicidas, relações de abuso, pornografia, pessoas
mal-intencionadas etc., bem como observar se há e qual o nível de
comprometimento em relação aos jogos, seja como vítima, seja como vitimizador.
No entanto, frisa-se também que a vigilância é passageira. Quanto mais
comportamentos adaptativos o jovem apresentar no ambiente familiar, acadêmico
e entre seus pares, bem como quanto mais se verificar que ele esteja agindo com
idoneidade em relação às informações prestadas, menor deve ser a vigilância.
Por outro lado, a vigilância deve aumentar à medida que o oposto se confirmar
como verdadeiro: quanto mais comportamentos inadequados, problemas de
relacionamento interpessoal, familiar e acadêmico ele apresentar e quanto mais
mentiras suas são flagradas.
Em 2019, frente às demandas apresentadas pelos jogos suicidas, a
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) aprovou um Projeto de Lei
(847/2019) que aumenta a punição para crimes de indução a comportamentos
autolesivos ou ao suicídio. O crime diz respeito à indução, instigação,
constrangimento ou ameaça por meio da internet a qualquer pessoa, para que
esta pratique comportamento autolesivo ou suicídio. Para tal, a pena prevista é de
11
4 anos mais multa, e pode dobrar se a vítima for menor de 18 anos, maior de 60
anos ou apresentar deficiência mental.
12
Faz-se necessário considerar que, embora Louza Neto (2007) considere
serem sete as dimensões do suicídio, algumas dessas fases podem ser omitidas,
tais como as etapas 3 e 4, expressão dos pensamentos e planejamento,
consecutivamente. Outras ainda podem ser vivenciadas em conjunto, caso das
etapas 5 e 6, tentativas de suicídio e atos impulsivos. Diria ainda que ambos
podem ser o mesmo. A diferença que Louza Neto (2007) faz, no primeiro caso, é
como se fosse um treino e, no segundo caso, ela não planejou e apenas partiu
para o tudo ou nada, mas ambos são passíveis de serem aperfeiçoados com o
intuito de chegar ao fim da vida.
Contudo a tentativa deve ser encarada com grande afinco e seriedade, uma
vez que, nos casos em que a pessoa chega ao ato do suicídio, as pesquisas
comprovam que em até 30% das ocorrências ela teve alguma ou várias tentativas
de suicídio antes. Dessa forma, o ditado de “Quem quer se matar, se mata, não
faz isso...” é falaciosa e não deve ser expressado, uma vez que pode incitar a
outra pessoa a tentar novamente a fim de provar que era real sua intenção
(Botega, 2005). Ainda é necessário considerar que, apesar de o suicídio não ser
catalogado como um transtorno mental, pode ser considerado que pessoas livres
de patologias também venham a tentar ou cometer o suicídio, porém leva-se em
consideração que, se a pessoa chegou a esse extremo, é porque não estava
necessariamente saudável.
Para que possamos enxergar o outro, é necessário refletir sobre si mesmo,
sobre nossas crenças, valores e mitos. Há vários comentários que tecemos a
respeito da pessoa que tenta ou que expressa seu desejo em morrer, no entanto
nesse momento não sabemos a dor da pessoa e os motivos que ela tem para
pensar ou agir dessa forma.
Uma vez que compreendemos ser necessário falar sobre o suicídio,
devemos também ter grande cautela sobre como tratamos esse assunto.
Igualmente é de grande valia pensar sobre a dor da outra pessoa. Considere duas
pessoas, uma com dores de cabeça (enxaqueca) e outra que levou uma
martelada, bateu a porta do carro, ou fechou uma porta qualquer sobre um de
seus dedos. Já imaginou? Quem lhe parece que sente a maior dor: a pessoa que
prendeu seu dedo com a força de algum objeto ou a que está com enxaqueca? A
resposta é que não há necessidade de sentir qualquer uma das duas dores para
saber que a dor maior é sempre a de quem a está sentindo. O que está em
questão não é a violência da dor, mas sim se a pessoa sentiu essa dor ou não!
13
Não importa se o problema da pessoa que está em sofrimento é grande ou
pequeno, demasiado ou pouco intenso. O fato é que ela está sentindo dor e isso
deve ser levado em consideração
5.2 Conclusão
Vimos nesta aula que existe o Efeito Werther, e que muito se aprende por
modelagem. Se assim compreendermos, podemos também chegar à conclusão
14
de que a modelagem e a reflexão podem ser positivas quando valorizam a
resiliência de pessoas que conseguiram superar o comportamento suicida. Na
ópera de Mozart A Flauta Mágica, o personagem principal desiste de se matar e
por isso comumente chama-se este fenômeno, que é contrário ao Efeito de
Werther, de Efeito de Papageno.
Para Botega (2015), uma das estratégias de prevenção ao suicídio é
contextualizar a morte, não a colocando como um ato de heroísmo, mas
ressignificando-a, quando for o caso, esclarecendo que a busca pelo suicídio é a
busca desesperada por aliviar a dor, e que há outras maneiras de reconhecer,
acolher e transformar essa dor em algo que possa tornar-se produtivo na vida da
pessoa. É importante falar sobre sentimentos e emoções, sobre estratégias e
comportamentos funcionais, bem como sobre sonhos, expectativas e sentido de
vida.
Falando sobre o tema, de forma responsável, com conhecimento amplo e
ético, é possível abrir espaço de reflexão, de reconhecimento de dores, que a
própria pessoa não enxergava e que a motivavam a ter comportamento suicida.
Assim, abre-se espaço criativo para reestruturar-se, ressignificar-se e encontrar
ou reencontrar sentido de vida.
15
REFERÊNCIAS
KREITMAN, N.; SMITH, P.; TAN, E. Attempted suicide in social networks. British
Journals of Preventive and Social Medicine, v. 23, 116-123, 1969.
MANN, J.J.; BRENT, D. A.; ARANGO, V. The neurobiology and genetics of suicide
and attempted suicide: a focus on the serotonergic system.
Neuropsychopharmacology, v. 24, n. 5, p. 467-77, maio, 2001.
18