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ESTUDO SOBRE A ESTRUTURAÇÃO DO EGO E DA PERSONALIDADE

DE ADOLESCENTES QUE SE AUTOMUTILAM


Antonio Augusto Pinto Junior1

Resumo

Atualmente na clínica tem-se verificado um elevado número de casos de destrutividade direcionada


ao próprio corpo. A automutilação é uma conduta em que o sujeito objetiva se machucar e deixar
marcas em seu corpo, e é um importante problema de saúde pública na adolescência. Em função do
exposto, torna-se necessário o desenvolvimento de pesquisas que visem compreender os aspetos
emocionais que podem estar associados à referida conduta. Assim, o presente projeto objetiva
realizar um estudo descritivo da estrutura de personalidade e do funcionamento psicológico de
adolescentes que se automutilam por meio da aplicação do Questionário Desiderativo e do
Questionário de Personalidade para Crianças e Adolescentes (EPQ-J). Deverão compor a amostra
por conveniência 50 adolescentes, de ambos os sexos, na faixa etária entre 12 e 16 anos, notificados
ou diagnosticados pela prática de automutilação e atendidos pelo Centro de Referência
Especializada de Assistência Social (CREAS) da cidade de Volta Redonda/RJ. Serão feitas
entrevistas individuais com os participantes e a aplicação dos dois referidos testes psicológicos. A
análise dos dados será realizada a partir da categorização e classificação das respostas aos
instrumentos aplicados, e da análise estatística para comparar os resultados de ambos os testes,
verificando, assim, a validade convergente entre eles. Por fim, os dados serão discutidos e
confrontados com os aportes da literatura pertinente com vistas a contemplar as possíveis
contribuições dessa avaliação psicológica para a compreensão dos aspectos emocionais de
adolescentes que se automutilam.

Palavras-chaves: Adolescência; Automutilação; Avaliação Psicológica; Testes Psicológicos.

1. Introdução e Justificativas

Percebe-se, atualmente, que dentre os problemas de saúde do adolescente a automutilação é


um fenômeno que vem preocupando os profissionais e a sociedade como um todo. Na clínica
contemporânea tem-se identificado um elevado número de casos de destrutividade em direção ao

1
Psicólogo, doutor em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano e pós doutor em Psicologia Clínica pela
Universidade de São Paulo. Professor Associado do Departamento de Psicologia do Instituto de Ciências Humanas e
Sociais da Universidade Federal Fluminense, Campus de Volta Redonda. Coordenador do Laboratório de Estudos e
Pesquisas sobre Infância e Adolescência (LEPIA).
1
próprio corpo. Mas esse problema não se reduz ao âmbito da psicologia clínica, psicanálise ou da
psiquiatria. Em uma busca no site de compartilhamento de vídeos “YouTube”, utilizando a palavra
chave “automutilação”, em junho de 2017, foram encontrados 10.800 vídeos incluindo muitos
autorrelatos de pessoas que se automutilam ou já se automutilaram. Já em relação às comunidades
do Facebook foram localizadas 142 páginas.

Ainda que tenha crescido o interesse por esse fenômeno, as dificuldades em delimitá-lo e
mensurá-lo são grandes, pois ao longo do tempo são encontradas inúmeras e diferentes definições
na literatura. No decorrer dos anos, surgiram noções mais abrangentes e outras mais delimitadas, na
tentativa de evitar equívocos e solucionar o desacordo conceitual tão presente nesse campo de
estudo. Mapeando as diferentes tentativas de definição da automutilação, Favazza e Rosenthal
(1993) encontraram os seguintes termos: autoagressão, lesões intencionais, malformação, ferimento
simbólico, masoquismo, síndrome de Munchausen, autodestruição deliberada, autodestruição local,
auto corte delicado, comportamento auto lesivo, agressão contra si próprio, pára-suicídio, tentativa
de suicídio e suicídio focal.

Mas, Gratz (2001) ao se referir ao comportamento da automutilação sugere que os termos


que remetem ao suicídio precisam ser evitados, dado ao caráter não letal da mesma. Igualmente,
devem ser evitados aqueles que se referem a comportamentos que danificam apenas indiretamente o
tecido do corpo, pois a conduta autolesiva visa sempre a uma violência direta contra si. Assim,
procurando prevenir novas confusões conceituais, vale ressaltar que dentre todos os termos e
definições utilizadas, empregar-se-á neste estudo as expressões autolesão e automutilação enquanto
sinônimos, designando o comportamento habitual do indivíduo em causar lesões ou danos físicos
no corpo, sem intenção suicida.

Favazza e Rosenthal (1993) entendem a automutilação como síndrome repetitiva que


satisfaz todas as características de um transtorno de impulso: desejo de desempenhar um ato
prejudicial, inabilidade em resistir a um impulso de prejudicar a si mesmo sem intenção suicida
consciente, aumento crescente de sensação de tensão anterior ao ato e, no momento do ato vivência
de prazer, liberação ou gratificação. Além disso, após a realização imediata do ato, não há culpa,
arrependimento ou autorreprovação.

Deve-se destacar que os comportamentos automutilativos são diferentes tanto na quantidade


de danos causados nos tecidos quanto na gravidade destas lesões e no número de eventos. Por isso,
é comum que estes sejam classificados em três tipos: superficial ou moderada, estereotipada e
maior.

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A automutilação maior refere-se aos atos mais infrequentes, em que uma parte significativa
do tecido corporal é destruída, tal como nos casos de amputação de membros, castração e enucleção
ocular, por exemplo. A automutilação estereotipada abarca os comportamentos de padrão
predominantemente fixo, aludindo à pobreza de simbolismo, e são em sua maioria marcados por um
ritimismo, como os comportamentos de bater a cabeça, morder o dedo e pressionar o globo ocular.
Já a automutilação moderada ou superficial tem caráter mais variado e mostra maior frequência na
clínica psiquiátrica, aludindo-se aos atos que possuem baixa letalidade, ou seja, baixo dano ao
tecido corporal e, caracterizada pela repetição e frequência esporádica. É o caso dos
comportamentos de cortar a pele, interferir na cicatrização de feridas, arranhar-se ou queimar-se por
exemplo. Vale ressaltar que esses tipos de automutilação podem se sobrepor, mas é provável que
cada um esteja associado a um quadro psicopatológico específico. Mas de qualquer forma, a
utilização dessas classificações mostra-se frequente e útil para a elaboração de um diagnóstico
diferencial, já que fornecem dados de uma estrutura inicial (Favazza & Rosenthal, 1993).

São vários os objetos empregados na prática da autolesão por adolescentes. Os citados com
mais frequência são navalhas, giletes, facas, estiletes, vidros, cachecol, canetas, pedras, grampos,
dentes e até mesmo as mãos e unhas (Dinamarco, 2011; Vieira, Pires & Pires, 2016). É comum que
as lesões incidam não somente em uma parte do corpo, mas em várias. Contudo, algumas são
atingidas com mais regularidade que outras, principalmente os braços, as pernas, a barriga, o peito e
outras áreas na parte frontal do corpo, em razão da facilidade de alcançá-las (Giusti, 2013; Matos et
al., 2012; Vieira, Pires & Pires, 2016).

Acerca da prevalência da automutilação, alguns estudos, principalmente, internacionais,


buscaram determina-la em amostras clínicas e não clínicas. Os resultados dos estudos com
adolescentes em internação psiquiátrica nos Estados Unidos elaborados por Di Clemente et al.
(1991) e Nock e Prinstein (2005), mostram que as prevalências são de 61,20% e 60%
respectivamente. Favaro et al. (2007), em uma pesquisa na Itália com a população em geral,
destacam a alta prevalência em adolescentes, situando-se entre 4% a 45%.

Embora este fenômeno tenha afetado a muitos e se tornado um grave problema de saúde
pública, ele não tem sido objeto de investigação de pesquisadores brasileiros. No país, não se
identificam estudos detalhados a respeito deste fenômeno. Entretanto, recentemente, foi realizada
uma pesquisa de corte transversal em uma cidade do Vale do Paraíba, interior do estado de São
Paulo. A investigação foi conduzida a partir da aplicação de um questionário, que foi respondido
por vinte pacientes de um ambulatório de psiquiatria desta região. Por meio deste estudo foi
possível concluir que o fenômeno da autolesão foi mais prevalente em adolescentes femininas e

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portadoras de algum transtorno psiquiátrico (Vieira, Pires, & Pires, 2016). Embora este não seja um
estudo amplo, pois contempla uma população muito específica, sua existência sugere que este tipo
de pesquisa tende a crescer no Brasil e por isso demanda o investimento em investigações,
principalmente de base epidemiológica, para se compreender e mapear a frequência e prevalência
da automutilação na população brasileira.

Deve-se destacar que, de acordo com Favazza e Rosenthal (1993), a automutilação é um


comportamento que não pode ser compreendido sem considerar os componentes biológicos,
psicológicos, sociais e culturais. Especificamente no que se refere aos aspectos psicológicos e
emocionais, que são foco desse projeto de iniciação científica, alguns autores associam a
automutilação a alguns transtornos, tais como os de personalidade borderline, o de estresse pós-
traumático, o transtorno de personalidade múltipla (Favazza & Rosenthal, 1993), ou a alguns
problemas psicológicos, como depressão, suicídio e ansiedade (Klonsky, 2011).

Assim, a automutilação pode ser compreendida como uma estratégia de regulação da


emoção não adaptativa, pois o sujeito pode buscá-la como artifício para diminuir a tensão e aliviar
as emoções mais opressivas de seu psiquismo (Klonsky, 2003; Gratz, 2001). Assim, quando a dor
psíquica é demasiadamente incontrolável o adolescente pode lesionar seu corpo como um
mecanismo de regulação, reduzindo seus problemas emocionais através do controle da dor física,
que diferente da dor psíquica, é palpável e passível de ser administrada.

A partir do exposto, verifica-se que a automutilação em adolescentes pode cumprir muitas


funções, tais como: pedir ajuda, aliviar emoções negativas, autopunir-se, liberar raiva, tensão ou dor
emocional, ter sensação de controle ou segurança, aliviar sensação de vazio para relaxar (Guiust,
2013). Dessa forma, torna-se fundamental o investimento em pesquisas na área da Avaliação
Psicológica com instrumentos que mapeiem os aspectos emocionais e a estrutura egóica e de
personalidade dos adolescentes que se auto lesionam, pois com tais informações é possível o
desenvolvimento de estratégias interventivas e terapêuticas mais eficientes para cada caso.

É importante ressaltar que a Avaliação Psicológica é definida pelo Conselho Federal de


Psicologia (CFP) como um processo de coleta, investigação e interpretação de dados, no qual se
conhece o avaliado e sua demanda, com o objetivo de programar a tomada de decisão mais
apropriada do psicólogo (CFP, 2013). Deve-se também destacar que esse processo envolve
diferentes técnicas e procedimentos, tais como a entrevista, anamnese e os testes psicológicos. Esses
últimos são tradicionalmente classificados e diferenciados de acordo com sua objetividade e
padronização, considerando, principalmente, duas categorias: os testes psicométricos e os
projetivos. Os testes psicométricos buscam mensurar por meio de critérios objetivos o atributo ou
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construto que estão avaliando (p. ex., quociente de inteligência, escalas e inventários de
personalidade). Já nos testes projetivos os critérios para interpretar determinado construto
(geralmente características psicodinâmicas da personalidade) são subjetivos e envolvem tarefas
pouco estruturadas (Serafini, Budzyn & Fonseca, 2017).

Dentre os testes psicométricos de personalidade, especialmente desenvolvidos para


adolescentes, destaca-se o Questionário de Personalidade para Crianças e Adolescentes (EPQ-J),
que condensa os resultados dos estudos do psicólogo inglês Hans Eysenck (Eysenck e Eysenck,
2013) e está baseado em seu modelo PEN de personalidade, que compreende três grandes fatores –
Psicoticismo, Neuroticismo e Extroversão. Esse questionário foi desenvolvido para ser usado em
jovens. A versão brasileira, traduzida e adaptada por Flores-Mendoza (2013) tem 60 itens, sendo 18
de Neuroticismo, 12 de Extroversão e 14 de Psicoticismo, e ainda uma quarta escala denominada
Sinceridade (elaborada a fim de avaliar participantes que podem ser menos sinceros em suas
respostas ao questionário).

No que se refere às técnicas projetivas, essas constituem em importante procedimento, pois


permitem a análise da área afetivo-emocional do indivíduo. São técnicas extremamente ricas e que
auxiliam o aprofundamento no estudo da personalidade em seus vários aspectos. Segundo Grassano
(1997), as técnicas projetivas caracterizam-se pela apresentação de uma tarefa relativamente não
estruturada, solicitando ao sujeito que interprete ou estruture o estímulo apresentado, a partir do
mecanismo de projeção, revelando aspectos fundamentais de seu funcionamento psicológico.

Dentre as técnicas projetivas utilizadas na avaliação do funcionamento psicológico e


estruturação do ego, pode-se citar o Questionário Desiderativo. De acordo com Pinto Junior e
Tardivo (2015), esse é um instrumento que estuda o grau de estruturação do Ego por meio de
expressão verbal, mobilizando ansiedades e defesas2.

Essa técnica projetiva foi, segundo Bunchaft e Vasconcelos (2001), apresentada originalmente
pelos psiquiatras Pigem e Córdoba em 1946, em Barcelona. O teste consistia basicamente em duas
questões: o que gostaria de ser se tivesse de voltar ao mundo não sendo uma pessoa? Por que você
fez essa escolha? A resposta escolhida corresponde ao símbolo desiderativo e o porquê da resposta
representa a expressão desiderativa. Em 1948, Bernstein reelaborou e ampliou a técnica, solicitando
três escolhas e três rejeições com as respectivas explicações (Ninjamkim & Braude, 2000).

2
Deve-se ressaltar que esse teste projetivo ainda não possui a certificação do Conselho Federal de Psicologia (CFP),
demandando estudos de validade junto à população brasileira. Dessa forma, a presente investigação irá colaborar
com os estudos de padronização e validação que vem sendo conduzidos pelo proponente responsável desse projeto
de iniciação científica.
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As escolhas e as rejeições são classificadas como pertencendo a três categorias: animal, vegetal
e reino inanimado. Desta forma, ao responder a questão: “Se não fosse uma pessoa, o que mais
gostaria de ser? Por quê?”, o examinador elimina a categoria escolhida e formula nova questão,
obtendo uma nova resposta e procede, assim, também na terceira escolha. No que se refere às
rejeições o procedimento é o mesmo. Na primeira rejeição, a partir da questão: “O que você não
gostaria de ser se não fosse uma pessoa? Por quê?”, o sujeito responde com uma categoria (animal,
vegetal, reino animado) e elimina, assim, esta mesma categoria e, então, o examinador parte para a
segunda e terceira categorias. Quando o participante não consegue dar as respostas
espontaneamente, pode-se induzir a resposta, ou seja, na pergunta sugere os reinos cujas respostas
anteriores não foram incluídos. Essa condição demonstra a possibilidade de dar conta da tarefa que
o teste exige, mas com a necessidade de apoio. Se mesmo após induzir as escolhas e ou rejeições, o
sujeito não consegue responder a todas as questões do teste, o material parcial obtido é analisado e o
teste pode ser, assim, considerado incompleto (Ninjamkim & Braude, 2000).

Grassano (1997) afirma que o Questionário Desiderativo permite que se estude a força do Ego e
os mecanismos de defesa, a partir de uma exploração e categorização do material obtido face às
instruções do instrumento. Da mesma forma, Ninjamkim e Braude (2000) pontuam que este teste
revela-se bastante sensível para a avaliação das identificações e defesas predominantes em cada
sujeito. Também Sneiderman (2012) considera o Questionário Desiderativo uma técnica simples em
termos de administração, rápida, econômica e, sobretudo, rica em seus alcances exploratórios,
propiciando a investigação de alguns traços de personalidade do paciente, podendo ser aplicada em
crianças, adolescentes e adultos e em diferentes contextos e situações clínicas.

2. Objetivos

Geral: Realizar um estudo descritivo da estrutura de personalidade e do funcionamento psicológico


de adolescentes que se automutilam por meio da aplicação do Questionário Desiderativo e do
Questionário de Personalidade para Crianças e Adolescentes (EPQ-J).

Específicos

 Compreender a estruturação do Ego de adolescentes que se automutilam por meio do


Questionário Desiderativo
 Identificar os mecanismos de defesa utilizados pelos adolescentes que se automutilam por
meio do Questionário Desiderativo.

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 Identificar as ansiedades inconscientes predominantes na personalidade de adolescentes que
se automutilam por meio do Questionário Desiderativo.
 Avaliar e descrever a estrutura de personalidade de adolescentes que se automutilam no que
se refere aos fatores Psicoticismo, Neuroticismo, Extroversão e Sinceridade, por meio do EPQ-J.
 Realizar estudo comparativo entre os resultados do Questionário Desiderativo e do EPQ-J
aplicados em adolescentes que se automutilam para verificar a validade convergente3 entre os dois
instrumentos.

3. Método

3.1. Participantes

Participarão da pesquisa 50 adolescentes, de ambos os sexos, entre 12 a 16 anos de idade,


notificados ou diagnosticados pela prática de automutilação e atendidos por uma instituição de
assistência social da cidade de Volta Redonda/RJ (CREAS).

3.2 Instrumentos

Após os contatos e autorizações dos responsáveis e dos adolescentes serão aplicados os


instrumentos:

a) Entrevistas Individuais: Nessas entrevistas individuais serão explicados os objetivos da


investigação, e o adolescente, após um “rapport”, será convidado a responder aos instrumentos de
pesquisa.

b) Questionário Desiderativo: Técnica projetiva que estuda o grau de estruturação do Ego por meio
de expressão verbal, mobilizando ansiedades e defesas (Pinto Junior e Tardivo, 2015). O
instrumento foi descrito em item anterior.

c) Questionário de Personalidade para Crianças e Adolescentes (EPQ-J): Para o estudo das


associações entre traços de personalidade e para os estudos de validade convergente, em função das
possíveis relações com dados do Questionário Desiderativo, será empregado o Questionário de
Personalidade para Crianças e Adolescentes (EPQ-J). O instrumento foi descrito com detalhes na
introdução desse projeto.

3.4. Procedimentos

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Em avaliação psicológica, a validade convergente pode ser definida como a relação significativa entre duas ou mais
medidas de um mesmo construto ou de construtos teoricamente relacionados, utilizando-se diferentes métodos ou
instrumentos de avaliação (Pasquali, 2003).
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Inicialmente e ao longo de todo o desenvolvimento desse projeto será realizada uma revisão
da literatura científica na área da automutilação em adolescentes. Essa pesquisa bibliográfica busca
identificar os estudos mais atuais na área, focando os aspectos emocionais e de personalidade
associados a tal conduta.

Para a aplicação dos instrumentos de pesquisa, os participantes serão selecionados no Centro


de Referência Especializada de Assistência Social (CREAS) da cidade de Volta Redonda. Para a
seleção dos sujeitos, deverá ser feita uma entrevista com os profissionais do CREAS para o
levantamento dos adolescentes que, segundo eles, se enquadram nos critérios de conduta de
automutilação. Posteriormente, será realizada uma reunião com pais e/ou responsáveis, para
explicar os objetivos da pesquisa e para a assinatura do termo de Consentimento Livre e
Esclarecido.

Após a coleta dos Termos de Consentimento assinados pelos responsáveis dos participantes,
serão realizadas as entrevistas individuais com os adolescentes, quando serão explicados os
objetivos da pesquisa e solicitada a assinatura do Termo de Assentimento Livre e Esclarecido.
Assim, após a entrevista de “rapport”, o Questionário Desiderativo será aplicado, individualmente,
aos participantes do estudo, seguindo as instruções apresentadas por Ninjamkim e Braude (2000).
As aplicações do Questionário Desiderativo serão gravadas e posteriormente transcritas para análise
dos dados coletados.

O EPQ-J deverá ser aplicado logo após o Questionário Desiderativo e deverá também seguir
as orientações e instruções de Flores-Mendoza (2013). Vale lembrar que será garantido o anonimato
e o sigilo dos participantes, bem como o respeito à privacidade e à intimidade, e ainda garantindo-
lhes a liberdade de participar ou declinar desse processo no momento em que desejarem,
respeitando as recomendações do Conselho Nacional de Saúde, conforme resolução 196/96.

3.5. Análise dos Dados

3.5.1. Avaliação do Questionário Desiderativo

As respostas de cada participante ao Questionário Desiderativo serão analisadas de acordo


com as categorias propostas por Nijamkin & Braude, (2000). Esse referencial contempla aspectos
objetivos, que têm relação com as experiências emocionais vivenciadas, desenvolvimento e força de
ego da pessoa que responde ao teste, que são: a). Adequação à consigna; b) as Escolhas mais
frequentes por reino; c) a Sequência dos reinos; d) o Tempo de Reação.

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O referencial de análises é composto, ainda, por quatro itens que permitem uma análise
aprofundada de aspecto relevantes da personalidade do participante, os mecanismos de defesa e os
tipos de vínculos, que são:

e) Dissociação: capacidade de discriminar os aspectos valorizados dos aspectos desvalorizados e


indica a possibilidade de reconhecer situações que geram ansiedade e de identificar os recursos para
controlá-la (Nijamkin & Braude, 2000)

f) Identificação Projetiva: é o mecanismo pelo qual o Ego deposita um aspecto de si num símbolo
com o qual se identifica. No Questionário Desiderativo, a identificação projetiva é reconhecida
através da capacidade do sujeito em escolher símbolo adequadamente estruturado e com
consistência (Nijamkin & Braude, 2000).

g. Racionalização: procedimento pelo qual o sujeito tenta oferecer uma explicação coerente do
ponto de vista lógico ou aceito socialmente para uma atitude, ato, ideia ou sentimento. No
Questionário Desiderativo, a racionalização se evidencia quando o indivíduo justifica sua escolha e
pode fazê-lo dentro da lógica formal (Nijamkin & Braude, 2000).

h. Perspectiva vincular da resposta: refere-se ao tipo de respostas ao Questionário Desiderativo,


determinado pela capacidade ou não do sujeito em estabelecer vínculo ou relação com o outro.
Respostas narcisistas incluem racionalizações com ausência de objeto e de relações objetais, e
respostas que incluem o outro indicam racionalizações que aludem à presença do outro e de
relações objetais (Nijamkin & Braude, 2000).

Após a analise todos os protocolos, os dados serão transportados em planilha para proceder
ao tratamento estatístico e verificar a existência de eventuais diferenças estatisticamente
significativas (adotando-se p≤0,05) entre as respostas fornecidas pelos adolescentes em função do
sexo e nível escolar. Assim, será realizado o trabalho de estatística analítica das categorias
avaliadas, recorrendo-se ao teste de Mann-Whitney para comparar as distribuições nas variáveis
numéricas (como por ex. tempo de reação), e ao teste Qui-quadrado ou Exato de Fisher para
comparar as distribuições nas variáveis categóricas nominais (como por ex. sequência das escolhas,
racionalização etc.).

3.5.2. Avaliação do EPQ-J

Para o EPQ-J serão feitas as correções segundo o manual apresentado por Flores-Mendoza
(2013) para as quatro escalas avaliadas por esse instrumento. Os resultados serão expressos em
dados numéricos e inseridos em planilhas para permitir as análises estatísticas por meio do teste de

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Mann-Whitney e posteriormente as devidas comparações com as categorias do Questionário
Desiderativo.

3.5.3. Comparação entre os dados do Questionário Desiderativo e do EPQ-J.

Como última etapa da pesquisa, será realizado um estudo comparativo entre os resultados do
Questionário Desiderativo e do EPQ-J dos adolescentes que se automutilam para verificar a
validade convergente entre os dois instrumentos. O exame estatístico a ser utilizado para investigar
as correlações entre as categorias dos dois testes empregados será o coeficiente de correção de
Pearson (p≤0,05). Por fim, os resultados serão discutidos e confrontados com os aportes da
literatura pertinente com vistas a contemplar as possíveis contribuições dessa avaliação psicológica
para a compreensão dos aspectos emocionais de adolescentes que se automutilam. Além disso,
espera-se que, com os dados analisados, esses resultados possam colaborar para certificação do
Questionário Desiderativo para o uso profissional no contexto brasileiro pelo CFP.

4. Plano de Trabalho e Cronograma:

Na tabela abaixo são apresentadas todas as atividades a serem executadas para a condução
desse projeto de pesquisa.

Atividades/ meses 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Contatos com o CREAS para


composição do grupo de pesquisa X
(adolescentes que se automutilam)

Entrevistas com os pais (TCLE) e


os adolescentes selecionados (T.A. X X X X X X
e aplicações dos instrumentos)

Avaliação dos instrumentos X X X

Tratamento Estatístico dos dados X X

Redação do relatório final X

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5. Referências

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