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Farmacologia aplicada a saúde

“O que difere veneno de remédio é a dose”.

Tema 1
Introdução a farmacologia
DEFINIÇÃO
Histórico da Farmacologia. Conceitos essenciais da
Farmacologia. Aplicações da Farmacologia. Fases da pesquisa
clínica: desenvolvimentos de fármacos. Princípios gerais da
ação medicamentosa.
PROPÓSITO
Conhecer a evolução histórica dos principais conceitos da
Farmacologia, o que é fundamental para a atuação das
substâncias químicas nos sistemas biológicos e suas
aplicações no que tange à promoção de melhoria na
qualidade de vida individual e da sociedade. Quando estudamos a história dos medicamentos, nós nos
INTRODUÇÃO confrontamos com um único profissional que era capaz de
Para começarmos o estudo da Farmacologia, precisamos compreender os sintomas, diagnosticar as enfermidades e
compreender conceitos fundamentais, como: O que é preparar formulações medicamentosas a fim de tratar o
saúde? O que é doença? O que são medicamentos? doente. Este profissional era médico e farmacêutico ao
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o conceito mesmo tempo.
de saúde é amplo, pois não está ligado apenas à ausência de A história da farmácia e dos medicamentos é bem descrita
doença, e sim a uma relação perfeita entre o bem-estar por Cláudio Galeno, médico e filósofo nascido em Pérgamo,
físico, mental e social. Esta definição, descrita em 1947, foi antiga cidade grega, hoje território da Turquia.
bastante criticada, já que aponta para algo “inalcançável”. Galeno criou uma coletânea (Corpus Galenus), na qual
Cabe destacar que essa definição é válida até os dias de abrange o campo da Medicina, Filosofia, Matemática,
hoje, porém ainda é alvo de críticas e reflexões de muitos Gramática e do Direito. Uma de suas principais obras é o De
pesquisadores. methodo medendi, escritos em 14 volumes, abordando a
Atenção parte terapêutica. O médico ressaltava que a doença se
O termo doença pode ser descrito como estado causado iniciava a partir de uma desordem humoral ou até mesmo a
por uma afecção em um organismo, alterando seu bem- partir de lesões do corpo. Ao compreender os sintomas do
estar. O Ministério da Saúde traz esse conceito como uma paciente, seria possível traçar um prognóstico e iniciar a
alteração ou um desvio do estado de equilíbrio de um terapêutica adequada para o quadro, objetivando o equilíbrio
indivíduo com o meio ambiente, conceito este adotado em humoral.
1987. A base terapêutica de Galeno era pautada em alguns
O estudo dos medicamentos é importante para obter uma fatores, como: personalidade do paciente, idade, raça e até
melhor compreensão da atuação das drogas dentro do mesmo o clima em que ele vivia. Ele acreditava que esse
organismo humano. Historicamente, os medicamentos foram conjunto de fatores interferiam de alguma forma nos
originados de elementos da natureza e, até hoje, são humores no corpo. Diante dessas respostas, era traçado qual
recursos fundamentais na melhoria da qualidade de vida do medicamento seria ministrado ao paciente.
indivíduo, seja trazendo a cura, seja amenizando a dor, seja Saiba mais
para fins diagnósticos. Podemos dizer que o medicamento é O termo farmacologia vem do grego fármacon, que significa
uma das “pontes” que leva o nosso organismo da doença droga e logia, derivado de lógus, que significa estudo. Desta
para a saúde. forma, a Farmacologia é um ramo da Farmácia que estuda
Módulo 1 como as substâncias químicas interagem com os sistemas
Descrever o histórico e a evolução da Farmacologia como biológicos.
ciência No começo do século XIX, boa parte dos medicamentos
HISTÓRICO DA FARMACOLOGIA eram de origem natural, independentemente de ser extraído
Séculos atrás, as doenças eram usualmente consideradas de um vegetal, mineral ou animal, e, muitas vezes, de
como possessões demoníacas ou resultantes da raiva dos estrutura química e natureza desconhecidas, como a
deuses. Muitas vezes, para ajudar no combate aos sintomas, obtenção de morfina, derivada do ópio retirado do leite da
a população utilizava rituais religiosos e poções à base de papoula. Anos depois, com a descoberta da química orgânica,
ervas. O uso de substâncias químicas esteve, desde então, muitas drogas foram isoladas e identificadas, favorecendo a
presente na sociedade, no intuito de aliviar a dor e o evolução da farmacologia moderna.
sofrimento físico. No século XX, novos fármacos foram desenvolvidos, muitos
de origem sintética, e introduzidos no mercado,
proporcionando aos pacientes uma possibilidade de cura para
Segundo a fala do famoso médico, alquimista, físico e doenças ditas fatais e, frequentemente, de natureza
astrólogo Paracelso, do século XVI: infecciosa, como tuberculose, varíola e gripe espanhola.
ganhou destaque foi a da Bahia, pois se tornou um centro de
distribuição.
A partir da primeira metade do século XIX, devido à
necessidade crescente de medicamentos para os enfermos,
a botica – onde eram pesquisadas e manipuladas fórmulas
extemporâneas – deu lugar a outros dois novos tipos de
estabelecimentos: a Farmácia e o Laboratório Industrial
Farmacêutico. A partir daí, as preparações passaram a ser
manipuladas em maiores quantidades e com melhores
critérios de qualidade, já que as boticas não conseguiam
abastecer os hospitais com regularidade.
REMÉDIO X MEDICAMENTO: DEFINIÇÕES E
CLASSIFICAÇÃO

Figura 1: Da papoula à morfina


Atualmente, boa parte dos medicamentos são produzidos
Conceitos:
em escala industrial, respeitando as boas práticas de
Remédios
fabricação e, desta forma, conseguiram alcançar um papel
Remédios são todos os métodos ou cuidados terapêuticos
central na terapêutica.
que ajudam a aliviar desconfortos. Um remédio para a fadiga,
Com o avanço da expectativa de vida e a necessidade no
por exemplo, é o repouso. Outros recursos terapêuticos,
aumento da prevenção de doenças, os medicamentos se
como fisioterapia, acupuntura, psicoterapia, massagens e
apresentam como um dos maiores responsáveis pelos
compressas locais, também são considerados remédios.
gastos com saúde pública.
Medicamentos
FARMACOLOGIA NO BRASIL
Já o termo medicamento se refere a um produto
Fontes históricas relatam que, em 1549, partindo de Portugal,
farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com
chegou ao Brasil o primeiro governador geral, Tomé de
finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de
Souza, acompanhado de uma comitiva de, aproximadamente,
diagnóstico, na qual são produzidos com rigoroso controle
mil pessoas. Nesse grupo, estava Diogo de Castro, um
técnico para atender às especificações determinadas pelos
boticário, profissional responsável por manipular e produzir
órgãos reguladores (ANVISA, 2010).
medicamentos na frente dos pacientes, de acordo com a
Todo medicamento possui valores agregados, são eles:
farmacopeia e prescrição médica.
• Valor terapêutico;
Ao chegar ao Brasil, Diogo de Castro encontrou uma
• Valor preventivo;
comunidade indígena que utilizava raízes, folhas, flores e
• Ganhos em saúde, como melhoria da qualidade de
sementes para tratar seus doentes. Os portugueses vieram
vida; e
com o intuito de criar missões junto aos índios, mas, através
• Redução dos custos da doença.
desse trabalho, acabaram se dedicando ao aprendizado da
Os medicamentos são produtos acabados que contêm o
manipulação de matérias-primas extraídas da natureza para a
componente responsável pelo principal efeito, conhecido
produção de remédios, como mostra a figura a seguir:
como princípio ativo ou fármaco, e seus adjuvantes
farmacêuticos necessários para facilitar a administração.
Podem ser manipulados no intuito de atender a um indivíduo.
Seu preparado ocorre de maneira personalizada, para
atender suas necessidades em formulações nas mais variadas
formas farmacêuticas. Esses medicamentos são classificados
em oficinais ou magistrais.
Embora os significados sejam bem próximos, os
termos medicamento oficinal e magistral possuem definições
distintas. Veja os conceitos:
Figura: O Clique nas setas para ver o conteúdo.
contato com os índios fez dos jesuítas conhecedores de Medicamentos oficinais: são aqueles preparados diretamente
métodos curativos de origem indígena. Coleção Hariberto de em uma farmácia de manipulação de forma individualizada, e
Miranda Jordão não pela indústria farmacêutica. Essa preparação é realizada
Com o avançar dos anos, várias boticas foram fundadas. a partir de formulações descritas no Formulário Nacional ou
Foram instaladas na Bahia, em Pernambuco (Olinda e Recife), em Formulários Internacionais reconhecidos por órgãos
no Maranhão, Rio de Janeiro e em São Paulo. A botica que fiscalizadores, como, por exemplo, a manipulação de uma
solução de álcool iodado.
Medicamentos magistrais: são obtidos a partir de uma vezes, baixo investimento em tecnologia. Na década de 1990,
prescrição feita por um profissional habilitado. Neste caso, o com a abertura do comércio pela diminuição das tarifas de
prescritor deverá fornecer informações quanto à dosagem, importação e a assinatura do governo do Trade-Related
composição, forma farmacêutica, posologia e ao modo de Aspects of Intellectual Property Rights (TRIPS), muitas
uso. A grande vantagem deste tipo de medicamento é que indústrias nacionais saíram do mercado, gerando um
poderemos obter formulações que conservem o princípio aumento exponencial das importações e,
ativo e resolva problemas de administração realizando consequentemente, queda da indústria de medicamentos no
alterações da formulação original. Podemos exemplificar Brasil.
como medicamentos magistrais as formulações Diante do exposto, o governo pretendia reequilibrar este
polivitamínicas prescritas de forma individualizada por um setor, e logo veio a criação da Lei nº. 9.787, de 1999,
endocrinologista. também conhecida como “Lei dos Genéricos”. Esta lei leva
Saiba mais: um chá caseiro de plantas medicinais é um ao término da concessão das patentes por mais de 20 anos,
remédio ou um medicamento? além de autorizar a produção de medicamentos genéricos.
Diante do que discutimos, podemos afirmar que um chá é Os medicamentos genéricos têm como características o
um remédio, e não medicamento, já que o chá não é uma mesmo princípio ativo, na mesma dose e forma
preparação elaborada que segue determinações de farmacêutica do medicamento de referência, além de
qualidade e segurança. compartilhar a mesma via, com a mesma posologia e
Classificação dos medicamentos indicação terapêutica. Para ganhar essa denominação,
Todos os medicamentos têm como garantia a segurança, necessita passar por testes que comprovem sua eficácia e
eficácia e qualidade, colaborando com o acesso da população segurança.
àqueles considerados essenciais. Os medicamentos que são Os medicamentos são intercambiáveis, ou seja, após
produzidos pelas indústrias farmacêuticas apresentam realização dos testes, é possível assegurar a substituição do
distintas classificações de acordo com a RESOLUÇÃO-RDC medicamento de referência pelo medicamento genérico.
Nº 16, de 2 de março de 2007: Essa possibilidade é certificada por meio de ensaios que
Clique nas barras para ver as informações. avaliam a bioequivalência entre eles.
MEDICAMENTO INOVADOR Os testes de bioequivalência são avaliações comparativas
São medicamentos comercializados em âmbito nacional, que entre medicamentos de referência e genéricos, onde se
apresentam como princípio ativo pelo menos um fármaco busca comprovar que os genéricos e os de referência
patenteado, caracterizando, desta forma, uma nova molécula apresentam biodisponibilidade igual no organismo. O teste de
que agregue ganhos terapêuticos. De modo geral, os biodisponibilidade evidencia a quantidade de fármaco que é
medicamentos inovadores podem ser reconhecidos como absorvido e a velocidade deste processo por unidade de
medicamentos de referência. tempo. Desta forma, quando dois fármacos apresentam a
MEDICAMENTOS DE REFERÊNCIA mesma biodisponibilidade, poderemos dizer que são
A indústria farmacêutica, muitas vezes, investe em pesquisas compatíveis e, portanto, intercambiáveis.
clínicas no intuito de descobrir novos fármacos. A partir A fim de identificar os medicamentos genéricos, os
dessas substâncias, são elaborados medicamentos fabricantes devem seguir algumas normas pré-estabelecidas.
inovadores, que podem ser chamados de medicamentos de Estes não possuem marca, e sim o princípio ativo indicado
referência, ou seja, o produto inovador com marca na caixa. Apresenta uma tarja amarela com o
registrada. termo Medicamento Genérico descrito, além do número e
Um medicamento de referência não precisa, nome da lei impressos na embalagem: “Medicamento
necessariamente, conter uma molécula nova. Por exemplo, o Genérico Lei nº 9.787, de 1999”.
Buscopan é um medicamento de referência e tem como
princípio ativo a escopolamina. O Buscopan Composto tem,
em sua fórmula, a associação da escopolamina com dipirona
e faz parte do rol de medicamentos de referência.
É importante frisar que o medicamento de referência
precisa ter qualidade, eficácia e segurança, o que só pode Figura: Medicamentos
ser comprovadas depois de muitos investimentos em anos genéricos
de pesquisa. Esses medicamentos, como já discutimos Os genéricos chegaram com o intuito de trazer mais acesso
anteriormente, poder ser patenteados; desta forma, a aos medicamentos de qualidade, a fim de minimizar o
indústria terá a exclusividade na comercialização da fórmula domínio da produção por parte das grandes multinacionais. O
durante o período de patente, que varia entre 10 e 20 anos. preço dos medicamentos genéricos geralmente é menor do
Cabe ressaltar que esta comercialização só ocorrerá que os medicamentos de referência.
mediante autorização concedida por órgãos fiscalizadores, MEDICAMENTOS SIMILARES
como a Anvisa. Após a expiração da patente, outras Os medicamentos similares contêm mesmo princípio ativo,
indústrias poderão produzir e comercializar o produto. mesma concentração, forma farmacêutica, via de
MEDICAMENTOS GENÉRICOS administração, posologia e indicação terapêutica dos
No início do século XX, a indústria brasileira de medicamentos de referência, mas podem ser diferentes no
medicamentos tinha total domínio sobre o comércio nacional, tamanho e na forma do produto, no prazo de validade, na
sem competição, exercendo, assim, preços elevados e, por embalagem, rotulagem, em excipientes e no veículo e
devem sempre ser identificados pelo nome comercial • Medicamento biológico similar: os produtos
(marca). Testes de eficácia e segurança se fazem biossimilares são os produtos biológicos registrados
necessários para qualquer medicamento. Porém, os estudos pela via de desenvolvimento por comparabilidade,
de biodisponibilidade relativa e bioequivalência são que é a via regulatória utilizada por um produto
obrigatórios no caso dos medicamentos classificados biológico para obtenção de registro, em que foi
como tarjados. utilizado o exercício de comparabilidade em termos
O teste de bioequivalência para os similares tarjados só veio de qualidade, eficácia e segurança entre o produto
a ser obrigatório a partir de 2003, com a Resolução RDC desenvolvido para ser comparável e o produto
134/2003, ou seja, são exigidos os mesmos testes que os biológico comparador;
genéricos para a comprovação de que estes medicamentos • Via de desenvolvimento por comparabilidade: é a via
apresentam o mesmo comportamento no organismo regulatória que poderá ser utilizada por um produto
quando comparado aos de referência. Essa modificação foi biológico para obtenção de registro junto à
importante para garantir a utilização dos medicamentos autoridade regulatória, em que foi utilizado o
similares de forma segura. exercício de comparabilidade em termos de
Contudo, com os medicamentos de referência, os similares qualidade, eficácia e segurança entre o produto
tarjados acabaram se tornando intercambiáveis. Como base desenvolvido para ser comparável e o produto
para este tipo de substituição, a Anvisa disponibiliza, em seu biológico comparador;
portal, uma lista para consulta chamada Lista de • Via de desenvolvimento individual: é a via regulatória
medicamentos similares e seus respectivos medicamentos que poderá ser utilizada por um produto biológico
de referência, conforme RDC 58/2014. Figura 4. para obtenção de registro junto à autoridade
regulatória, em que é preciso apresentar dados
totais sobre desenvolvimento, produção, controle
de qualidade e dados não clínicos e clínicos para
demonstração da qualidade, eficácia e segurança do
produto.
Como são obtidos por processos distintos dos demais tipos
Figura: Medicamento de referência X genérico X similar. de medicamento, não é possível comparar os processos
MEDICAMENTOS BIOSSIMILARES (PRODUTOS produtivos, e, portanto, a comparação (via da
BIOLÓGICOS) comparabilidade) se dá pelos resultados clínicos que não
Esse tipo de medicamentos engloba aqueles que foram podem ser inferiores àqueles esperados pelo medicamento
obtidos a partir de um processo biológico, diferentemente que perdeu sua patente.
das outras classes de medicamentos, que são obtidas por A incorporação de medicamentos biológicos é, hoje, a maior
síntese, extração ou purificação basicamente. estratégia para dar acesso a produtos de biotecnologia aos
Estas moléculas são geralmente maiores e mais complexas, pacientes e garantir a saúde financeira das instituições.
o que dificulta sua obtenção e purificação, uma vez que são Estima-se que o uso desses medicamentos pode levar à
produtos do metabolismo de um organismo. Seu registro redução de 80% do custo total do tratamento. Foi essa
também não segue aquele fundamentado na lei dos tecnologia a responsável, por exemplo, pela incorporação do
genéricos e é regulado pela Resolução RDC nº 55, de 16 de anticorpo monoclonal Trastuzumabe no SUS, o que mudou
dezembro de 2010. Nela, estão descritos alguns conceitos o panorama do tratamento de câncer de mama no Brasil.
importantes, como: Módulo 2
• Produto biológico: é o medicamento biológico que Identificar os principais conceitos da Farmacologia, suas
não é novo ou conhecido que contém molécula aplicações associadas e a ação medicamentosa dos fármacos.
com atividade biológica conhecida, já registrado no CONCEITOS DA FARMACOLOGIA E SUAS APLICAÇÕES
Brasil e que tenha passado por todas as etapas de
fabricação (formulação, envase, liofilização,
rotulagem, embalagem, armazenamento, controle
de qualidade e liberação do lote do produto para
uso);
• Produto biológico novo: é o medicamento biológico
que contém molécula com atividade biológica Para melhor compreensão da Farmacologia, precisamos
conhecida, ainda não registrado no Brasil, e que conhecer conceitos que são de extrema importância no
tenha passado por todas as etapas de fabricação estudo dos fármacos. A Farmacologia pode ser dividida em
(formulação, envase, liofilização, rotulagem, dois grandes grupos: Farmacocinética e Farmacodinâmica.
embalagem, armazenamento, controle de qualidade
e liberação do lote de medicamento biológico novo
para uso);
• Produto biológico comparador: é o produto biológico
já registrado na Anvisa com base na submissão de
um dossiê completo e que já tenha sido
comercializado no país;
A Farmacocinética estuda o destino do fármaco ao atingir o curativas, paliativas ou para fins de diagnóstico. Os fármacos
organismo. É de extrema importância, pois fornecerá podem ser classificados de acordo com sua origem: natural,
parâmetros fundamentais para traçar a posologia ideal. Ou animal, vegetal ou sintética.
seja, ajuda a compreender qual é a dose do medicamento Sua ação no organismo poderá ser discutida em três fases:
capaz de provocar uma resposta terapêutica desejada no Clique nas informações a seguir.
paciente, além de trazer informações sobre variação de Fase farmacêutica Responsável pela desintegração, ou seja,
respostas entre grupos diferentes de indivíduos. liberação da forma de dosagem, seguida da dissolução da
substância ativa. Esta etapa agrega valor à formulação, pois
determina a liberação do fármaco a partir da forma
farmacêutica. Estuda o modo como as propriedades físico-
químicas do fármaco, a forma farmacêutica e a via de
administração afetam a velocidade e a extensão de
absorção do princípio ativo.
A Farmacodinâmica estuda o efeito dos fármacos no Fase farmacocinética Está relacionada ao movimento dos
organismo descrevendo seu mecanismo de ação, bem fármacos, ou seja, discute desde o momento em que o
como a relação entre a dose e seus efeitos obtidos. fármaco é absorvido até sua excreção. Consiste na
A Farmacologia pode, ainda, ser dividida quanto ao tipo de identificação e quantificação da passagem do fármaco pelo
estudo: Farmacognosia, Farmacotécnica, Farmacogenética e sistema biológico.
Toxicologia. Conheça cada um desses ramos da Fase farmacodinâmica Estuda a interação dos fármacos
Farmacologia: diretamente com o local de ação, ou seja, sua afinidade com
Clique nas barras para ver as informações. seu receptor, que podem ser proteínas, enzimas ou
FARMACOGNOSIA receptores-alvo, e, consequentemente, a sua ação
É o ramo da Farmacologia que tem como alvo de estudo os farmacológica.
princípios ativos naturais sob todos os aspectos. Ação farmacológica
FARMACOTÉCNICA Quando discutimos a ação farmacológica, precisamos
É considerada uma ciência de aplicação, ou seja, é o estudo compreender a interação dos fármacos com seu alvo
das formas farmacêuticas sob os aspectos relacionados à terapêutico.
constituição, ao planejamento, à formulação e preparação, O alvo terapêutico ou farmacológico permite interação entre
bem como ao acondicionamento, à conservação e correção o fármaco e o receptor, formando um complexo estável
de sabor, odor e cor. Sua grande importância é garantir uma capaz de permitir determinado efeito. Ainda neste contexto,
forma farmacêutica ideal para maior absorção do princípio podemos discutir seletividade, que traduz a afinidade do
ativo, conforme tratamento. fármaco com determinado sítio de ação, em vez de outros
FARMACOGENÉTICA locais. Desta forma, podemos dizer que, quanto mais seletivo
É o ramo da Farmacologia que tem por objetivo estudar a for o fármaco, mais seguro este será para o paciente.
variabilidade genética dos pacientes com relação a um Considera-se um fármaco seguro quando conhecemos
tratamento específico. Muitas vezes, a genética ditará o todos os efeitos colaterais por ele apresentados, já que
desempenho ou até mesmo a tolerância de um todos os medicamentos podem acarretar efeitos não
medicamento. farmacológicos em decorrência do seu mecanismo de ação.
TOXICOLOGIA Atenção
É a ciência que estuda tanto a composição de substâncias Apesar de muitas pessoas confundirem ou acharem que se
químicas quanto suas respostas no organismo, observando trata do mesmo fenômeno, efeito colateral e efeito adverso
seus danos e benefícios a curto e longo prazos. Essa ciência são eventos diferentes!
ajuda a estabelecer o uso seguro dessas substâncias, já que Efeito colateral
nem todos os organismos respondem da mesma maneira na O efeito colateral é a decorrência causada pelo uso do
presença de um composto químico. Apresenta como o medicamento em doses habituais, gerando efeitos não
principal objetivo evitar que efeitos nocivos afetem a saúde intencionais. Esses efeitos geram uma resposta adversa ao
de um ser. medicamento previsível.
Outro conceito de fundamental importância na Farmacologia Efeito adverso
é o perfil farmacoterapêutico. Já o efeito adverso corresponde ao evento indesejado
Destaca-se por ser um registro cronológico das informações causado pelo uso do medicamento, e, muitas vezes, não
diretamente relacionadas ao consumo de medicamentos por possui relação causal com o tratamento.
um paciente. Essa informação auxilia o profissional de saúde A ação farmacológica estará diretamente relacionada à dose
a acompanhar o tratamento do paciente, objetivando ganhos que se é administrada de um medicamento para o paciente,
terapêuticos. independentemente da via de administração escolhida. A
Princípios gerais de ação dos fármacos: dose é a quantidade de medicamento capaz de gerar uma
Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, fármaco resposta terapêutica no organismo de um paciente,
é a principal substância encontrada dentro de uma preferencialmente sem gerar efeitos colaterais.
formulação farmacêutica. Ele é responsável pela ação Após administração do fármaco, sua concentração
farmacológica, trazendo como resultados ações profiláticas, plasmática aumenta à medida que o fármaco é absorvido. A
concentração máxima é alcançada e, em seguida, esse valor
decai de acordo com a eliminação do fármaco no organismo. pesquisa de universidade. Existem ainda empresas
A duração do efeito do fármaco está diretamente especializadas no planejamento e na síntese de novos
relacionada à dose, como mostra a figura a seguir: fármacos que trabalham por demanda das grandes
corporações para inclusão de novos produtos no mercado,
uma vez que estas etapas podem levar mais de dez anos de
pesquisa e investimento.
A primeira etapa de desenvolvimento de novos fármacos
está diretamente relacionada à pesquisa. Essa etapa consiste
na busca de moléculas promissoras que sejam candidatas a
uma nova droga. Neste momento, são feitos ensaios de
otimização química visando sua efetividade e segurança.
Para agilizar esse processo, a indústria passou a utilizar os
recursos da química combinatória e a realizar testes
totalmente controlados por robôs de alta capacidade,
Figura: duração do efeito na dependência da dose. capazes de testar mais de 1 milhão de amostras a cada ano.
Quando administramos um medicamento a um paciente, Esse fato, ao mesmo tempo em que reduziu, em parte, o
devemos respeitar a janela terapêutica e a posologia. Veja os tempo da descoberta de novas drogas, fez com que os
conceitos: custos de desenvolvimento de um novo medicamento
• O termo janela terapêutica, também conhecido aumentassem expressivamente (DIMASI et al., 2003).
como índice terapêutico, é utilizado para determinar Assim, de cada 30.000 moléculas sintetizadas:
as concentrações mínima e máxima de um • 20.000 (66,7%) entram na fase de estudos pré-
fármaco que poderá ser administrado a um clínicos;
paciente. Essa faixa de valores determinará o • 200 (0,67%) entram na fase I de estudos clínicos;
equilíbrio entre a eficácia e a toxicidade do fármaco • 40 (0,13%) passam para a fase I ;
no organismo. A compreensão dessas faixas agrega • 12 (0,04%) entram na fase I I;
valores ao tratamento, já que podem ser evitados • Somente 9 (0,027%) são aprovadas pelos órgãos
os quadros de submedicação e de toxicidade. regulatórios.
• Posologia é o estudo das doses. Ela determinará Atenção
como o medicamento será administrado com É importante mencionar ainda que apenas um medicamento
relação ao espaço de tempo e a concentração aprovado (0,003%) satisfaz o mercado, e, em função disso,
ideal, sempre respeitando a janela terapêutica. Pode traz retorno para a indústria que o desenvolveu.
haver variação da posologia de paciente para A compreensão do receptor farmacológico é fundamental
paciente, da doença que está sendo tratada e do quando se estuda ou se desenvolve uma nova molécula
tipo de medicamento administrado. candidata a fármaco. Quando pesquisamos uma molécula, ela
Agora que você já compreende esses conceitos, vamos pode ter afinidade com o receptor de forma
entender um ramo da Farmacologia importantíssimo na a aumentar ou diminuir uma função celular.
Farmacoterapia, a Farmacocinética Clínica. Este ramo da Uma mesma molécula poderá agir em vários receptores
Farmacologia estuda os processos cinéticos dos fármacos e simultaneamente, gerando respostas distintas. Dizemos,
possui uma relação direta com a Farmacodinâmica, nestes casos, que a molécula possui pouca seletividade. A
analisando de forma quantitativa e cronológica os processos resposta farmacológica pode ser determinada pelo tempo de
de administração, absorção, distribuição, biotransformação e permanência do complexo fármaco-receptor.
eliminação das drogas no organismo do paciente. Atenção
A abordagem da Farmacocinética Clínica auxilia na Processos farmacodinâmicos e farmacocinéticos podem
determinação da posologia e de seus possíveis ajustes, na alterar o tempo de vida deste complexo, ou seja, quanto
interpretação de respostas inesperadas aos medicamentos, maior o tempo de ligação, mais prolongado será o efeito
na compreensão da ação das drogas e na pesquisa de farmacológico exercido. É importante destacar que o
novos medicamentos. período de ocupação pode levar tanto a efeitos desejados
Módulo 3 quanto a efeitos tóxicos.
Reconhecer os processos de desenvolvimentos dos CONCEITO DE PESQUISA/ESTUDO CLÍNICO
fármacos e a importância de cada fase A pesquisa pode ser classificada como:
PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DOS FÁRMACOS

O desenvolvimento de novos fármacos, desde a descoberta


Clique nas setas para ver o conteúdo.
até sua real comercialização, requer fases cruciais que
devem ser cumpridas. Muitas vezes, essas etapas são
realizadas em parcerias das indústrias com centros de
Exploratória: objetiva a caracterização inicial do problema a Está ligada a um maior número de pacientes; são chamados
ser estudado. Esta etapa constitui a primeira etapa de toda a de estudos multicêntricos, normalmente com milhares de
pesquisa científica. pacientes. Nesta fase, os sujeitos do estudo apresentam a
Teórica: tem por objetivo a ampliação dos fundamentos patologia em que o medicamento está sendo pesquisado, e
teóricos, estruturação de modelos de pesquisa. o período de duração deste estudo é superior aos
Aplicada: tem como objetivo investigar, confirmar e recusar anteriores, aproximadamente quatro anos.
hipóteses apontadas pela pesquisa teórica. São realizados em cenários bem similares daqueles previstos
De campo: pesquisa observacional dos fatos. Neste tipo de para o uso final. Geralmente, os medicamentos são
pesquisa, não se consegue controlar as variáveis. comparados a outros já existentes e recomendados para o
Experimental: tem por objetivo determinar o objeto de mesmo problema. Ainda nesta fase, são obtidas maiores
estudo. Neste tipo de pesquisa, é possível controlar as informações sobre a segurança e eficácia do fármaco e, até
variáveis que poderá influenciar na pesquisa. mesmo, as possíveis interações com outros fármacos. Os
Bibliográfica: compila todo conhecimento científico sobre o pacientes envolvidos são divididos em dois grupos: um deles
tema abordado. recebe o novo tratamento, e o outro recebe aquele que já
Atenção é habitual.
Existem várias formas de classificar uma pesquisa, porém a Cabe ressaltar que o paciente e o pesquisador desconhecem
maioria destes estudos apresentam em comum o método qual medicamento está sendo administrado. Essa prática
aplicado. Exemplo: na área da saúde, é muito comum que as também é conhecida como ensaio duplo cego.
pesquisas sejam divididas em experimental e epidemiológica. Desta forma, serão comparados os tratamentos e será
A pesquisa experimental é mais cautelosa, pois, muitas analisada a superioridade de um sobre o outro. As
vezes, são utilizados animais. A vantagem desse tipo de informações obtidas nessa etapa são de extrema relevância
pesquisa é que conseguimos controlar as variáveis, reduzindo e irão compor a bula do medicamento. É a mais trabalhosa,
os graus de subjetividade. devido às dificuldades de planejamento e execução frente a
A pesquisa epidemiológica investiga a saúde da população e grandes quantidades de dados gerados. É também a mais
os fatores diretamente relacionados para agravo da saúde custosa, visto que o número de pacientes presentes na
pública. Esse estudo se baseia na observação dos fatos e em pesquisa é bem maior quando comparada às fases
suas variações. anteriores. Após a fase I I, poderá ser solicitada a patente.
FASES DE ESTUDOS CLÍNICOS Finalmente, ao passar por todas as três fases iniciais, a
As etapas de desenvolvimento de novos fármacos passam indústria solicita às autoridades sanitárias o registro e a
pelas etapas pré-clínicas e clínicas. aprovação para a comercialização do medicamento. Para
A etapa pré-clínica compreende teste in vitro e in vivo, isso, deverá apresentar todos os resultados envolvendo as
muitas vezes em células e animais. A etapa clínica tem por fases pré-clínica e clínica juntamente ao processo de
objetivo teste de segurança e eficácia em humanos e é produção. A agência reguladora, estando de acordo com a
dividida em quatro fases: informações fornecidas, concederá a autorização para
Clique nas informações a seguir. lançamento e comercialização do novo medicamento.
Fase I Fase IV
Está relacionada à administração do medicamento pela Está relacionada ao monitoramento do medicamento após
primeira vez em seres humanos. São testados um número comercialização. Testes de acompanhamento de uso são
pequeno de pacientes, de 20 a 100 voluntários. Nesta etapa, elaborados e implementados no intuito de obter informações
os indivíduos sujeitos do estudo são saudáveis. Serão adicionais quanto à segurança e eficácia destes fármacos.
avaliadas diferentes vias de administração e diferentes doses, Neste passo, poderão ser obtidas novas informações de
a fim de determinar os prováveis limites da variação da efeitos colaterais até então desconhecidos. Esta etapa é
dosagem clinicamente segura. Haverá exceção quando se também conhecida como farmacovigilância, mostrada na
espera que o fármaco apresente toxicidade, como os figura a seguir:
antineoplásicos. Neste caso, são usados pacientes voluntários
com a doença, em vez de voluntários sadios.
Fase I
Está relacionada à obtenção de mais dados quanto à
segurança do fármaco e à avaliação de sua eficácia. Nesta
fase, os pacientes têm a doença para qual o fármaco está
sendo testado. Um número ainda relativamente pequeno de
pacientes são estudados detalhadamente, em torno de 100 a
200 voluntários. É nesta fase que normalmente são
detectadas as falhas, como a ausência do resultado esperado.
Apenas uma pequena quantidade de fármacos em
desenvolvimento consegue passar por esta etapa e avançar
para a próxima. VIAS DE COMPARAÇÃO/COMPARABILIDADE
Fase I I Alguns fatores podem levar ao comprometimento do estudo
clínico. A história natural da doença influenciará no
andamento dos estudos, já que muitas patologias sofrem
flutuações, ou seja, as doenças tendem a aumentar e a
diminuir em gravidade. Por isso, em muitos ensaios, faz-se
necessário adotar esquemas para os indivíduos avaliados.
É comum que o mesmo paciente receba doses do
medicamento que está sendo testado e, em outro
momento, receba placebo (no intuito do controle) e
tratamento padrão, que é o controle positivo.

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A DCB é a denominação do fármaco ou princípio
farmacologicamente ativo aprovado pelo órgão federal
responsável pela vigilância sanitária e surgiu no início da
década de 1970. Ainda hoje, a DCB sofre constantes
atualizações. Esta denominação ajuda a uniformizar a
nomenclatura dos fármacos, trazendo mais clareza e
A presença de outra doença ou quando o paciente precisão quanto aos nomes dos princípios ativos, facilitando
apresenta algum fator de risco também pode impactar no as práticas de saúde e evitando a ocorrência de danos
andamento da pesquisa, já que muitas patologias podem relacionados ao erro de medicação.
alterar a farmacocinética dos fármacos. A administração A DCI permite que as autoridades de saúde de diversos
concomitante de fármacos ou até mesmo alimentos pode países possam elaborar formulários internacionais de
levar à alteração significativa dos parâmetros medicamentos, sempre com o intuito de uniformizar as
farmacocinéticos e farmacodinâmicos. informações sobre os fármacos, em que os nomes ali
Para minimizar tais situações, o que, muitas vezes, pode ser listados são de recomendação da Organização Mundial da
feito é uma técnica chamada de estudo cruzado e selecionar Saúde (OMS).
os pacientes que serão alocadas a cada grupo. Para isso, é
preciso um bom conhecimento sobre histórias médicas e Tema 2
farmacológicas, diagnósticos acurados e métodos de Processos farmacocinéticos
randomização. DEFINIÇÃO
Não podemos deixar de destacar que alguns fatores, como Processos farmacocinéticos e suas principais características.
idade avançada e gravidez, influenciam a farmacocinética de Significado deste ramo da Farmacologia, os principais fatores
alguns medicamentos. Por restrições legais, indivíduos que capazes de alterá-los e a aplicação clínica.
apresentem essas características não podem participar dos PROPÓSITO
ensaios. Compreender os processos farmacocinéticos para gerar
Atenção decisões acertadas acerca da terapia e dos esquemas
Outro fator importante é a adesão ao uso do medicamento terapêuticos, evidenciando como o organismo é capaz de
durante o estudo pelos pacientes. A não adesão impactará reagir na presença dos fármacos em relação à absorção,
diretamente nos resultados obtidos, o que, por vezes, pode distribuição, eliminação e ao metabolismo.
estar relacionado às reações adversas. INTRODUÇÃO
LIBERAÇÃO DE NOVOS FÁRMACOS PARA Moléculas estranhas ao organismo precisam ultrapassar
COMERCIALIZAÇÃO diferentes barreiras para que tenham acesso à circulação e,
O princípio ativo, também conhecido como fármaco, é uma posteriormente, aos tecidos. Dependendo do local de
substância presente na composição do medicamento, em introdução, os agentes externos (farmacológicos ou não)
que é responsável pelo efeito farmacológico no organismo. precisam ultrapassar membranas celulares e, na maioria das
No Brasil, os fármacos recebem denominação em âmbito vezes, alcançar tecidos via vasos sanguíneos e circulação
nacional, conhecida como DCB (Denominação Comum linfática.
Brasileira), e em nível internacional, denominadas DCI Portanto, seguida a administração, um agente farmacológico
(Denominação Comum Internacional). precisa ser absorvido e distribuído para o tecido alvo, a fim
Veja os conceitos: de gerar seu efeito. Em conjunto com os métodos citados, é
preciso superar o constante trabalho do fígado no processo
de metabolismo e, em alguns casos, eliminação.
Neste tema, veremos que os processos farmacocinéticos
compreendem absorção, distribuição, metabolismo e
eliminação dos fármacos (ADME). Para todos os processos,
há um fator em comum: para que eles sejam realizados,
precisam da passagem do fármaco através das membranas • Fator limitante mais significativo na permeação dos
plasmáticas que compõem as células. fármacos, uma vez que são inúmeras as barreiras
Poucas são as situações em que o fármaco poderá ser lipídicas que separam os compartimentos corporais.
administrado no local previsto para sua ação, a exemplo de Nesse sentido, entende-se que, para cada fármaco, o
um anti-inflamatório tópico na pele ou na mucosa inflamada. coeficiente de partição lipídeo/água é que definirá quão fácil
Com muito mais frequência, um agente será administrado será o deslocamento entre os ambientes aquosos e lipídicos.
em um compartimento corporal (como o trato Ainda de forma passiva, os fármacos podem utilizar
gastrointestinal) e deverá se deslocar até o seu sítio de ação componentes facilitadores, quando sua estrutura química é
(por exemplo, o coração). Isso exige a absorção do fármaco grande demais para atravessar membranas, como as
no trato gastrointestinal; depois, o sangue irá distribuí-lo para proteínas transmembranares. Da mesma forma, o transporte
o coração, passando pelo metabolismo hepático. Por fim, ativo de fármacos é possível, mas é realizado por
será eliminado a uma taxa que possibilite uma concentração transportadores que atuam contra o gradiente de
plasmática eficaz, sem o risco elevado de efeitos adversos concentração e despendem energia para alimentar esse
ou tóxicos. processo. A endocitose também é possível.
O estudo da farmacocinética, portanto, é importante para a Todos esses processos estão ilustrados na imagem a seguir.
identificação das características que favorecem a passagem
dos fármacos pelos diferentes compartimentos e por suas
barreiras, como também para entendimento do quão
afetado é o sistema fisiológico na presença dos fármacos.

Modulo 1
OS PROCESSOS FARMACOCINÉTICOS
A farmacocinética é o estudo do percurso dos fármacos no
organismo. Nesse ramo da Farmacologia, os processos
farmacocinéticos se preocupam em descrever as
características de cada processo e, dessa forma, definir os Fármacos se movem através das barreiras das membranas
fatores capazes de alterá-los. e da célula por diferentes vias. BRUNTON et al., 2018.
Como descrito na introdução, a passagem dos fármacos por Nesse contexto, pode-se dizer que alguns fatores definem a
diferentes barreiras celulares é um processo importante para taxa e penetração dos fármacos nos tecidos, sendo eles: o
assegurar sua chegada ao tecido-alvo. Para tanto, algumas coeficiente de partição (lipossolubilidade x hidrossolubilidade);
características precisam ser consideradas: permeação e grau tamanho da molécula e espessura (da área de contato).
de ionização. Esses fatores são utilizados para previsão do fluxo passivo de
moléculas ao longo de um gradiente de concentração, a
conhecida Lei de difusão de Fick:
𝑎𝑟𝑒𝑎 × 𝑐𝑜𝑒𝑓𝑖𝑐𝑖𝑒𝑛𝑡𝑒 𝑑𝑒 𝑝𝑒𝑟𝑚𝑒𝑎𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒
𝑓𝑙𝑢𝑥𝑜 (𝑚𝑜𝑙𝑒𝑐𝑢𝑙𝑎𝑠 𝑝𝑜𝑟 𝑢𝑛𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑒 𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜) = (𝐶1 − 𝐶2) ×
𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑠𝑠𝑢𝑟𝑎

Grau de ionização
Principalmente importante para ácidos e bases fracas, a
carga eletrostática de uma molécula definirá a atração por
dipolos de água e, dessa forma, sua hidrossolubilidade. Como
visto anteriormente, a lipossolubilidade é uma característica
que facilita a difusão dos fármacos pelas membranas, sendo,
portanto, a ionização do fármaco um fator que compromete
essa difusão. De maneira geral, o pH do meio onde os
Permeação fármacos são disponibilizados definirá quão ionizados eles
A permeação dos fármacos pode ser realizada através de estarão, favorecendo ou não sua difusão pelas membranas.
dois mecanismos: A forma não ionizada sempre será a mais lipossolúvel, e
Mecanismos passivos assim:
• Sem necessidade de gasto de energia.
Em pH ácido (pH<7): os fármacos ácidos ficam mais
• Difusão simples, aquosa e lipídica.
lipossolúveis, pois a maior parte de suas moléculas estão na
• Configuração do transporte dos fármacos pelos
forma não ionizada.
compartimentos aquosos (espaço intersticial, citosol, Em pH básico (pH>7): os fármacos básicos ficam mais
poros aquosos presentes na parede dos vasos lipossolúveis, pois a maior parte suas moléculas estão na
sanguíneos). forma não ionizada.
Em urina ácida, drogas de caráter básico são mais bem
Mecanismos ativos eliminadas, e o contrário também é verdadeiro. Se a droga,
• Necessidade de gasto de energia.
ainda que filtrada pelo rim, estiver na sua forma não ionizada
• Configuração do transporte dos fármacos pelas
membranas plasmáticas.
e, portanto, lipossolúvel, ao alcançar o túbulo renal, poderá Etapa biofarmacêutica necessária para disponibilizar o
ser reabsorvida, e, assim, não será eliminada. fármaco administrado na forma sólida ao TGI, para que haja
o processo de absorção.
É definida como o movimento do fármaco de seu sítio de
administração para a circulação sistêmica. Sabe-se que
fármacos sólidos administrados pela via oral, antes de
sofrerem absorção, necessitam se libertar da formulação,
que deve se desintegrar nos fluidos luminais, liberando o
fármaco. A absorção dos fármacos pode ser quantificada
pela biodisponibilidade, que é definida como a fração da dose
administrada que efetivamente alcança o sítio de ação, ou a
Exemplo circulação sistêmica, que levará o fármaco até seu sítio.
A utilidade desse conceito pode ser exemplificada no A formulação é um dos fatores que afetam a absorção,
processo de eliminação renal dos fármacos. A eliminação de como mencionado acima. Fármacos sólidos precisam passar
uma droga é um processo que, por vezes, deve ser por uma etapa chamada de biofarmacêutica, onde se tem a
favorecido na clínica, em quadros de intoxicação. desintegração, desagregação e dissolução do fármaco antes
A estratégia de alcalinizar a urina para favorecer a eliminação que ele esteja disponível para absorver. Tal etapa já não é
de um agente de caráter ácido, por exemplo, justifica-se necessária para formulações líquidas, conforme esquema ao
pelo fato de se aumentar, em ambiente alcalino, a porção da lado.
droga ácida na sua forma ionizada, impedindo sua
reabsorção e, consequentemente, garantindo a permanência
no túbulo renal e sua eliminação na urina, como ilustrado a
seguir:

Dessa forma, parte do que é administrado pode não estar


disponível para absorção e ser eliminado nas fezes. Além
disso, as propriedades físico-químicas do fármaco (já
discutidas acima), o metabolismo de ataque no próprio
intestino e a passagem pelo fígado podem reduzir
significativamente a porção do fármaco que alcançará a
circulação sistêmica.
O que é retirado do lúmen do TGI é inicialmente levado para
a circulação porta. Chegando ao fígado, onde o metabolismo
e a excreção biliar ocorrem, parte dos fármacos já pode ser
eliminada.
Portanto, se a capacidade metabólica e excretória do fígado
e do intestino para o fármaco forem altas, a biodisponibilidade
é reduzida substancialmente, é o que chamamos de efeito
de primeira passagem. Para tanto, a biodisponibilidade pode
Retenção de uma base fraca na urina quando a urina ser calculada na forma de um fator (F), como a seguir:
é mais ácida do que o sangue.
concentração total da droga na urina é sete vezes maior 𝑞𝑢𝑎𝑛𝑡𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑎 𝑑𝑟𝑜𝑔𝑎 𝑞𝑢𝑒 𝑎𝑙𝑐𝑎𝑛ç𝑎 𝑎 𝑐𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎çã𝑜 𝑠𝑖𝑠𝑡𝑒𝑚𝑖𝑐𝑎
𝐹=
que no sangue. (KATZUNG, 2010). 𝑞𝑢𝑎𝑛𝑡𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑎 𝑑𝑟𝑜𝑔𝑎 𝑎𝑑𝑚𝑖𝑛𝑖𝑠𝑡𝑟𝑎𝑑𝑎
ABSORÇÃO E VIAS DE ADMINISTRAÇÃO DE FÁRMACOS 𝑜𝑛𝑑𝑒 0 < 𝐹 ≤ 1

É importante ressaltar que a via intravenosa, diferente da via


oral, não submete o fármaco a todas essas interferências
citadas, sendo, portanto, uma via cujo fator de
biodisponibilidade é = 1. Para as outras vias de administração,
mesmo parenterais, o fator de biodisponibilidade pode se
aproximar de 1, ou ficar bem abaixo disso. É preciso
considerar as características de cada via.
Objeto com interação.
VIA PADRÃO UTILIDADE LIMITAÇÕES E
DE ESPECIAL PRECAUÇÕES
ABSORÇÃO
Intravenosa A absorção Valiosa para Aumenta o risco
F= 1 por é evitada. uso em de efeitos
definição emergências. adversos.
Subcutânea Imediata, no Adequada Inadequada para
0,75 < 𝐹 caso de para grandes volumes.
<1 soluções algumas
aquosas. suspensões O fármaco manifesta sua concentração plasmática máxima
Intramuscular Imediata, no Adequada Contraindicada pouco tempo depois de sua administração, e, a partir daí, as
0,75 < 𝐹 caso das para durante o amostras que se seguem revelam concentrações cada vez
<1 soluções volumes tratamento menores com o tempo.
aquosas. moderados. anticoagulante.
Ingestão oral Variável. Conveniente Depende da No gráfico da concentração de fármaco versus tempo,
0,05 < 𝐹 Depende e adesão do a area under the curve (AUC) representa a quantidade total
<1 de muitos econômica. paciente. de fármaco absorvido na circulação sistêmica, e, portanto, o
fatores. fator de biodisponibilidade (F) pode ser calculado pela razão
entre a AUC da formulação com o fármaco na qual se
Fonte: Adaptado de BRUNTON et al., 2018. pretende identificar a biodisponibilidade e a AUC para a
forma intravenosa desse mesmo fármaco (que por definição
Além da biodisponibilidade, outro conceito importante a ser é de 100%; F=1).
tratado em farmacocinética é a bioequivalência. Clique para 𝐴𝑈𝐶(𝑜𝑏𝑡𝑖𝑑𝑎 𝑑𝑎 𝑓𝑜𝑟𝑚𝑎 𝑒𝑚 𝑒𝑠𝑡𝑢𝑑𝑜)
𝐹=
conhecer o conceito. 𝐴𝑈𝐶 𝑑𝑎 𝑓𝑜𝑟𝑚𝑎 𝑖𝑛𝑡𝑟𝑎𝑣𝑒𝑛𝑜𝑠𝑎
BIOEQUIVALÊNCIA VIA ORAL (VO)
Dois medicamentos são considerados equivalentes É o método mais comum, mais seguro e mais conveniente.
farmacêuticos se eles tiverem os mesmos ingredientes Apesar disso, possuiu desvantagens. A absorção dos
ativos, na mesma concentração ou dose e via de fármacos pode ser prejudicada por suas características
administração. Serão considerados bioequivalentes quando físico-químicas (baixa lipossolubilidade e permeabilidade pelas
tiverem a mesma biodisponibilidade, alcançando a mesma membranas), êmese (por irritação da mucosa gástrica),
concentração plasmática máxima no mesmo tempo. destruição do fármaco pelo pH ácido estomacal e interação
Quando bioequivalentes, as duas formulações com alimentos (quimicamente ou fisicamente, onde a
serão intercambiáveis. Tais estudos são realizados presença do alimento por si só impede o contato do
observando-se as concentrações plasmáticas alcançadas a fármaco com a parede do TGI). Além disso, o metabolismo
partir de amostras de sangue recolhidas dos indivíduos em hepático, dependendo da intensidade, pode reduzir
intervalos de tempo específicos. Os dados são apresentados drasticamente a absorção do fármaco, como já visto
graficamente, onde são apresentadas, no eixo vertical, as anteriormente.
concentrações plasmáticas do fármaco e, no eixo horizontal, A absorção no TGI é ainda direcionada pelos seguintes
os tempos relacionados à evidenciação dessas fatores: área de superfície de contato, fluxo sanguíneo no
concentrações (tempo em que a amostra foi coletada), sítio de absorção e concentração do fármaco nesses sítios.
sendo o tempo zero o momento em que o fármaco foi A maior parte da absorção é por difusão passiva, que é
administrado. favorecida quando o fármaco é lipossolúvel e está em maior
parte na forma não ionizada. Apesar de entendermos que
Para administração via oral fármacos ácidos fracos estarão menos ionizados no
estômago, pelo fato de o intestino ser um compartimento
com extensa área de superfície de contato (~200m2_ por
conta das microvilosidades), a absorção de fármacos será
maior no intestino, mesmo que o fármaco esteja
predominantemente ionizado nessa região. Dessa forma,
quanto mais rápido o fármaco chegar ao i ntestino, melhor
será a absorção, ou seja, quanto maior for o esvaziamento
O fármaco deve passar pelo estômago e/ou intestino, ser gástrico, mais rápido o fármaco será absorvido (com raras
libertado da sua forma de dosagem (formulação), dissolver-se exceções). Por vezes, quando um fármaco gera irritação
totalmente ou parcialmente e ser absorvido. As amostras de gástrica ou é extensamente degradado nesse
sangue revelam concentrações aumentadas de fármaco até compartimento, estratégias como formas farmacêuticas com
atingirem um pico máximo de concentração (Cmáx), revestimento entérico são preconizadas.
declinando após alcançar o pico, e, se não administradas VIA SUBLINGUAL (SL)
novas doses, esse declínio chega a zero. A absorção se dá pela mucosa oral e por vasos drenados
para a veia cava superior. O fármaco é protegido do
Para administração intravenosa metabolismo de primeira passagem e alcança rapidamente
tanto a circulação sistêmica como seu sítio de ação. A
exemplo, tem-se a nitroglicerina, um vasodilatador de via, a exemplo dos adesivos de nicotina, para tratar
urgência usado em pacientes com angina de peito. abstinência de tabaco, e estrogênio, para terapia de
VIA RETAL (VR) reposição.
Por essa via, há menor submissão dos fármacos ao
metabolismo de primeira passagem. A mucosa do reto é Modulo 2
extensamente vascularizada, permitindo absorção de PROCESSO FARMACOCINÉTICO DE DISTRIBUIÇÃO
fármacos administrados nesse compartimento. Alguns fatores Após a absorção ou a inserção do fármaco diretamente na
implicam em desvantagens; trata-se de uma via circulação sistêmica, é necessário que ele seja entregue ao
desconfortável para o paciente, e alguns fármacos podem tecido-alvo para que exerça sua ação. O processo de saída
gerar irritação local. Em geral, a absorção é boa, mas do fármaco da circulação sistêmica para os diferentes
incerta. tecidos é denominado de distribuição.
VIA SUBCUTÂNEA (SC) Dependendo de suas propriedades físico-químicas, o
Administração no tecido subcutâneo. É possível quando o fármaco pode ser distribuído para o espaço intersticial ou
fármaco não gera irritação ou necrose no tecido. fluido intracelular. A chegada do fármaco aos órgãos e
Normalmente, a absorção nesse local é constante e gera um tecidos é determinada por alguns fatores,
efeito sustentado do fármaco. A insulina, por exemplo, principalmente: fluxo sanguíneo e permeabilidade dos
possuiu diferentes preparações (usando complexos proteicos capilares que irrigam o órgão/tecido.
e variação de pH), que permite sua liberação sustentada, o
que é um benefício para a insulinoterapia.
VIA INTRAMUSCULAR (IM)
A absorção de fármacos por essa via dependerá da
formulação e do fluxo sanguíneo local. Formulações mais
oleosas retardam a absorção dos fármacos administrados
por essa via, gerando um mecanismo de depósito no
músculo com liberação lenificada para a circulação sistêmica.
Dependendo do local, e tendo ele melhor perfusão
sanguínea, a absorção também é melhorada. Em geral, é
mais rápida a absorção quando a injeção é feita no deltoide
(ombro), quando comparado ao glúteo máximo. Além do fluxo sanguíneo e da permeabilidade dos capilares
VIA INTRAVENOSA (IV) que irrigam os tecidos, outros eventos devem ser
Como já descrito anteriormente, para essa via, a considerados no processo de distribuição dos fármacos.
biodisponibilidade é completa (F=1). É de grande valia quando Clique nos eventos que listamos a seguir.
há necessidade de efeito imediato. Trata-se, portanto, de Objeto com interação.
uma via que requer cuidados redobrados, pois reações LIGAÇÃO A PROTEÍNAS PLASMÁTICAS
desfavoráveis podem acontecer. A dose a ser administrada Muitos fármacos circulam na corrente sanguínea ligados a
precisa estar rigorosamente acertada, pois não pode haver proteínas plasmáticas. Albumina é a principal carreadora de
contaminação microbiológica nem de partículas sólidas na fármacos ácidos, e a α1- glicoproteína ácida, a principal
preparação. Além disso, fármacos em veículos oleosos e que carreadora de fármacos básicos. Ocorre que a fração do
tenham partículas que precipitem no sangue não podem ser fármaco ligada a proteínas plasmáticas se torna, nesse
administrados, afinal, uma vez administrados, não há recuo. momento, uma fração, apesar de existente,
VIA PULMONAR farmacologicamente inativa, enquanto a fração livre (não
Algumas drogas podem ser inaladas e absorvidas através do ligada) é a farmacologicamente ativa, capaz de sair do vaso,
epitélio pulmonar. O acesso à circulação é rápido e, dessa alcançar o tecido alvo e gerar ação.
forma, a chegada ao sítio de ação também, com a vantagem A ligação é geralmente reversível, de forma que a retirada
de evitar o metabolismo de primeira passagem. Por essa via, do fármaco da circulação (por eliminação ou distribuição
pode-se administrar fármacos com intenção de ação para o tecido) gere redução de fármaco livre. Na mesma
sistêmica e local. Quando se deseja uma ação no próprio medida, o fármaco antes ligado se desliga da proteína
compartimento pulmonar, é preciso pensar em retê-lo nesse circulante, restaurando o equilíbrio entre as porções de
compartimento; isso, em geral, é ajustado pela preparação fármacos ligados e desligados das proteínas.
que se utiliza ou por fármacos da classe com menor Entende-se, portanto, que as frações livres e ligadas se
lipossolubilidade, que tendem a permanecer no pulmão, em mantêm constantes em função desse equilíbrio dinâmico
vez de ir para a circulação sistêmica. que é formado. A alta ligação às proteínas circulantes infere
VIA TRANSDÉRMICA em maior risco de efeitos adversos e tóxicos.
A pele representa um órgão protetor bastante eficiente. A primeira consideração sobre esse evento é a redução da
Quando há a pretensão de absorção pela via transdérmica, velocidade de eliminação dos fármacos, uma vez que, ligados
deve-se considerar fármacos com lipossolubilidade capazes às proteínas circulantes, o processo de filtração renal é
de atravessar as diferentes camadas celulares que formam impedido. Isso aumenta o tempo de permanência do
os tecidos. A absorção pode ser aumentada quando o fármaco no organismo como veremos no esquema,
fármaco é colocado em suspensão em veículos oleosos e
sob fricção. Patches tópicos são muito interessantes nessa
necessariamente sua eliminação. Após o efeito primário, no
tecido-alvo, alguns fármacos podem se redistribuir para
outros tecidos, o que, muitas vezes, contribui para encerrar
rapidamente seu efeito, a exemplo do tiopental.
TAMANHO DOS FÁRMACOS
Outro fator que pode afetar a distribuição é o tamanho dos
fármacos. Fármacos demasiadamente grandes tendem a
ficar retidos no espaço intravascular pois não conseguem
difundir pela parede dos vasos.
Um exemplo claro desse evento é a heparina que fica
contida ao espaço intravascular por conta de seu alto peso
molecular.
Demonstração da ligação de fármacos às proteínas No caso específico da heparina, que é um anticoagulante,
plasmáticas, atentando para o fato de que fármacos mais isso não gera prejuízos em sua ação, todavia, para os
ligados sofrem menor depuração (clearance), ou seja, fármacos cujo receptor se encontra nos diferentes tecidos é
eliminação renal, gerando concentração total do fármaco a presença do fármaco no espaço intersticial, que garante o
maior na circulação sistêmica, apesar de mantidas as efeito farmacológico.
porcentagens livres. Adaptado de Smith, Di e Kerns, 2010. O volume aparente de distribuição
Além disso, é preciso considerar que muitos fatores podem Uma das medidas em farmacocinética utilizadas para
alterar a ligação do fármaco a essas proteínas: mensurar, ainda que de forma pouco realística, a distribuição
hipoalbuminemia; condições que resultem em respostas do fármaco administrado após uma dose é o volume de
de fase aguda; alterações nos níveis hormonais. Qualquer distribuição (Vd). O volume aparente de distribuição, Vd, é
fator que gere competição pela mesma proteína na qual definido como o volume de líquido necessário para conter a
está ligado o fármaco pode, de forma repentina, aumentar quantidade total da substância no corpo, na mesma
sua porção livre e, dessa forma, gerar um aumento de efeito. concentração presente no plasma. Dessa forma, o Vd pode
Observe abaixo. ser medido a partir da seguinte equação:
𝑞𝑢𝑎𝑛𝑡𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑜 𝑓𝑎𝑟𝑚𝑎𝑐𝑜 𝑛𝑜 𝑐𝑜𝑟𝑝𝑜
𝑉𝑑 =
𝑐𝑜𝑛𝑐𝑒𝑛𝑡𝑟𝑎çã𝑜 𝑝𝑙𝑎𝑠𝑚𝑎𝑡𝑖𝑐𝑎
Observa-se que:
Fármacos muito ligados às proteínas plasmáticas ou de
grande tamanho possuem um Vd aparente menor (heparina
Vd=0,05L/Kg);
Fármacos polares, que conseguem sair do espaço
intravascular, mas tendem a ficar no espaço extracelular,
Demonstração da competição entre dois fármacos pela possuem um Vd mediano (Vd=0,2L/Kg);
mesma proteína plasmática. Percebe-se que o fármaco Fármacos mais lipossolúveis, que conseguem se difundir
deslocado da proteína (fármaco A) passa a ter maior porção pelas membranas celulares, possuem Vd mais alto (morfina
livre e, dessa forma, maior capacidade de ação no tecido- Vd=2L/Kg).
alvo. Fonte: Adaptado de Portal da Educação. METABOLISMO/BIOTRANSFORMAÇÃO DE FÁRMACOS
LIGAÇÃO A TECIDOS O metabolismo dos fármacos é outro processo
Alguns fármacos tendem a acumular-se em tecidos, farmacocinético que contribui para a retirada do fármaco da
adquirindo concentrações até maiores do que as que circulação sistêmica. Entretanto, ele faz isso auxiliando na
atingem no sangue e no espaço extracelular. A ligação nos eliminação desses fármacos.
tecidos normalmente ocorre por afinidade a constituintes Muitos agentes lipofílicos não passam rapidamente para o
celulares, como proteínas, fosfolipídeos, e é um processo ambiente aquoso da urina, diminuindo a gerência do rim sob
reversível. sua eliminação. O metabolismo dos fármacos contribui nesse
Quando grande parte do fármaco se encontra ligado ao sentido, pois os produtos formados (metabólitos) são mais
tecido, o mesmo serve de reservatório, o que prolonga a hidrossolúveis e, portanto, mais bem eliminados pela via renal.
ação do fármaco no organismo. Além disso, o acúmulo no Há casos ainda que tais metabólitos formados são inativos, o
tecido pode gerar toxicidade local (a exemplo da que pode contribuir para o término da ação farmacológica.
ototoxicidade produzida pelos aminoglicosídeos). Muitos Em outros casos, o metabólito gerado, apesar de mais polar
fármacos lipossolúveis se acumulam no tecido adiposo. O e hidrossolúvel, possuiu atividade biológica e até atividade
percentual desse tecido em alguns indivíduos, como em tóxica.
pessoas obesas, pode contribuir para acúmulo de fármacos,
aumentando o risco de gerar reservatório.
Ainda nesse contexto, é importante ressaltar que alguns
fármacos se ligam a tecidos em um evento chamado de
redistribuição. Muitas vezes, a redução da concentração
plasmática do fármaco é observada, mas não
saturado, incapacitando o fígado de concluir a
biotransformação do fármaco.

A biotransformação dos fármacos é majoritariamente


realizada pelo fígado e ocorre por reações de fase 1
(oxidação, redução, hidrólise, e por ação das enzimas
citocromo P450) e reações de fase 2 (conjugação). Como já
relatado anteriormente, o TGI pode metabolizar fármacos,
além de outros tecidos, como o pulmão, o rim e até mesmo
as enzimas presentes no sangue; por isso, são chamadas de
vias secundárias.

Ciclo da reação catalisada pela enzima da família CYP 450,


onde DH é o fármaco, e DOH, o produto (metabólito)
oxidado. Fonte: Adaptado de Rang et al., 2003.

Esquema 2

As enzimas do citocromo P450 (enzimas da reação de fase


1) são proteínas do heme, que formam uma grande família;
cada uma é designada pela abreviatura CYP, seguida de um
conjunto de números e letras. Já foram descritas mais de 74
famílias de genes CYP, das quais as três principais são CYP1,
CYP2 e CYP3, e elas estão envolvidas no metabolismo das
substâncias no fígado.

A formação de glicuronídio, por exemplo, envolve a


Esquema 1 constituição de um composto de fosfato, a uridina difosfato,
a partir do qual o ácido glicurônico é transferido para um
As enzimas de fase 1 levam à introdução de grupos átomo rico em elétrons no substrato, formando uma ligação
funcionais como –OH, –COOH, –SH, –O– e NH2, o que amida, éster ou tiol. A UDP-glicuronil transferase catalisa essas
aumenta a solubilidade em água e altera a atividade biológica reações.
do fármaco, inclusive gerando inativação. Várias substâncias endógenas importantes, como a bilirrubina
Em algumas situações, porém, a reação de fase 1 pode ser e os corticosteroides suprarrenais, também são conjugadas
benéfica, principalmente as reações de hidrólise, que podem pelo mesmo sistema, conforme esquema ao lado.
favorecer a ativação de pró-fármacos. Pró-fármacos são
compostos inativos que, ao serem biotransformados, são
convertidos em seus compostos ativos.
Essa estratégia pode favorecer a absorção de fármacos
pouco lipossolúveis, melhorando a disponibilidade do fármaco
para o seu sítio de ação.
As reações de fase 2 são realizadas através da conjugação
de componentes biológicos que elevam significativamente a
hidrossolubilidade dos seus produtos.
Alguns exemplos são os aminoácidos (glicina), derivados de
carboidratos (ácido glicurônico), sulfato, metil, acetil e
glutationa. Esse processo é limitado, pois depende da
presença desses substratos, necessitando de quantidades
Uma vez que algumas reações de fase 1 são realizadas por
maiores de substratos para a fazer as reações de fase 2.
meio de enzimas, alguns fatores podem interferir na
Um exemplo é quando um fármaco é administrado em
capacidade delas. Em seres humanos, já são descritas
sobredose, pois, com isso, é possível que o processo fique
variações interindividuais nas enzimas P450. O polimorfismo
genético de algumas enzimas gera em determinados A erva de São João e o suco de grapefruit e inibem o
indivíduos aumento ou redução da capacidade catalítica metabolismo de alguns fármacos.
dessas enzimas, predispondo esses indivíduos a um risco
maior de efeitos adversos ou tóxicos. Uma variante do gene
CYP2D6, por exemplo, resulta em hidroxilação deficiente ou
extensa da debrisoquina.
Algumas consequências clínicas importantes relacionadas ao
polimorfismo genético da CYP estão disponíveis no quadro a
seguir. É possível observar os defeitos na biotransformação
de fármacos devido a polimorfismo na enzima CYP450,
responsável pelo processo e por suas consequências
clínicas.
Defeito Droga e Uso terapêutico Consequências
clínicas* INDUTORES
Oxidação Bufuralol (bloqueador dos Exacerbação E a couve-de-bruxelas e o tabaco induzem as enzimas
receptores β-adrenérgicos) do bloqueio β, P450.
náusea FÁRMACOS INIBIDORES
Oxidação Debrisoquina (anti- Hipotensão Alguns agentes farmacológicos atuam como inibidores, e
hipertensiva) ortostática fazem isso competindo pelo sítio ativo da enzima, apesar de
Oxidação Etanol Rubor facial, não serem substratos (quinidina é um potente inibidor
sintomas competitivo da CYP2D6).
cardiovasculares Outras inibem de forma não competitiva (cetoconazol forma
N- Hidralazina (anti-hipertensiva) Síndrome complexo estável com a forma Fe 3+ do ferro hêmico da
Acetilação semelhante ao CYP3A4).
lúpus FÁRMACOS INDUTORES
eritematoso No grupo dos indutores, temos as substâncias rifampicina,
N- Isoniazida (antituberculosa) Neuropatia etanol e carbamazepina, que aumentam a atividade das
Acetilação periférica enzimas CYP450 e da conjugação, quando administradas
Oxidação Mefenitoína (antiepilético) Toxicidade por cronicamente. A indução enzimática pode aumentar ou
superdosagem diminuir a toxicidade de substâncias.
Oxidação Esparteína Sintomas O paracetamol possui metabólitos (produto do metabolismo)
oxitócicos de fase 1 que geram toxicidade; portanto, a toxicidade
Hidrólise Succinilcolina (bloqueador Apneia aumenta após indução enzimática.
de éster neuromuscular) prolongada Para os pró-fármacos, a indução enzimática por alimentos, os
Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a fatores ambientais ou outros fármacos favorecem a
rolagem horizontal biotransformação e, por conseguinte, a produção da
Fonte: Adaptado de BRUNTON et al., 2018 substância ativa. Alguns exemplos estão organizados abaixo.
Alguns fatores, inclusive os ambientais, podem induzir ou
inibir as enzimas. Existem inibidores e indutores enzimáticos
tanto na dieta quanto no ambiente.
Alguns agentes farmacológicos atuam como inibidores, e
fazem isso competindo pelo sítio ativo da enzima, apesar de
não serem substratos (quinidina é um potente inibidor
competitivo da CYP2D6). Outras inibem de forma não
competitiva (cetoconazol forma complexo estável com a
forma Fe3+ do ferro hêmico da CYP3A4).
Objeto com interação.

Fármacos que produzem metabólitos ativos ou tóxicos após


o processo de biotransformação. Fonte: Adaptado de
Rang et al., 2003

Modulo 3
OS PROCESSOS FARMACOCINÉTICOS DE ELIMINAÇÃO
A saída dos fármacos do organismo pode ser realizada por
diferentes vias. Sabe-se que os processos de eliminação
renal e hepático biliar são muito importantes e que outras
INIBIDORES vias secundárias também são utilizadas.
suor
lágrimas estar na sua forma livre e ser menor que 20 mil dáltons para
leite materno conseguir se difundir pelos capilares glomerulares.
via pulmonar Ainda que não tenha sido filtrado, é possível que o fármaco
OBSERVAÇÕES IMPORTANTES seja secretado ativamente no túbulo renal por carreadores
• O fármaco pode ser eliminado na sua forma não de ácidos ou de bases existentes nessa região.
alterada ou na forma de metabólito. O processo de secreção tubular representa grande parte da
• Com exceção do pulmão, os órgãos excretórios eliminação de substâncias ligadas a proteínas plasmáticas. Ao
eliminam melhor compostos polares do que alcançar o lúmen do túbulo, existe a possibilidade de o
altamente lipofílicos. fármaco permanecer e, assim, ser excretado na urina ou
• Para que a eliminação seja eficiente, os que são retornar à circulação sistêmica pelo processo de
lipossolúveis, em geral, dependem de conversão a reabsorção.
seus metabólitos mais hidrossolúveis. As células tubulares são pouco permeáveis às formas
• A eliminação de fármacos no leite materno deve ionizadas, e a reabsorção passiva dessas substâncias
ser identificada, pois isso é possível para alguns depende do pH.
fármacos; dessa forma, o recém-nascido, ao ser Como observado, o pH da urina pode interferir na eliminação
amamentado, fica vulnerável aos efeitos do de fármacos. Alimentos e/ou compostos que alterem o pH
fármaco. É importante ressaltar que O pH do leite é da urina podem favorecer ou desfavorecer a eliminação de
mais ácido do que o pH do plasma; assim, um fármaco pela via renal, pois, ao favorecer sua forma
compostos básicos poderão concentrar-se nesse ionizada, a permanência no túbulo é garantida, mas, ao
fluido favorecer a forma não ionizada, há risco de reabsorção.
• Em algumas situações, quando administrado pela via Alguns outros fatores devem ser considerados como
oral, boa parte do fármaco sequer alcança a interferentes na eliminação de fármacos:
circulação, pois é eliminada nas fezes antes de ser Escolha uma das Etapas a seguir.
absorvida. Fator 1 Idade (neonatos e idosos possuem menor taxa de
• O rim é o órgão mais comprometido com a filtração glomerular).
eliminação dos fármacos, porém apenas 30% deles Fator 2 Quadros patológicos (insuficiência renal e hepática –
são eliminados na sua forma não modificada. O que este segundo pelo fato de reduzir a capacidade do fígado de
quer dizer que o fígado precisa auxiliar o rim gerar os metabólitos hidrossolúveis, que são mais bem
metabolizando os fármacos, para que consigam ser eliminados).
eliminados. Além disso, alguns alcançam o sistema Fator 3 Ligação a proteínas plasmáticas (quanto maior a
porta e o fígado, que retorna o fármaco para o TGI ligação, menor será a filtração no glomérulo).
lançando-o diretamente no intestino ou pela bile, Para fármacos que dependem da secreção tubular, devemos
eliminando-o. considerar as interações medicamentosas possíveis quanto à
• competição pelos carreadores tubulares. Quando dois
fármacos competem pelo mesmo carreador, isso implica em
menor secreção de um deles – a administração de
probenecida acompanhada de penicilina é um exemplo
positivo dessa interação (a probenecida reduz a eliminação
da penicilina, fazendo-a permanecer mais tempo em
circulação). Entretanto, para outras interações, há o risco de
efeitos tóxicos.
De forma geral, pode-se pensar que a redução da
concentração plasmática do fármaco se deve à sua
distribuição, redistribuição e eliminação.
Em farmacocinética, a eliminação dos fármacos é descrita
como depuração ou clearance (CL).
No nível mais simples, a depuração de um fármaco é um
evento que prevê sua taxa de eliminação em relação à sua
concentração (C). Por sua vez, um fármaco se retira do
espaço intravascular, seja por distribui-se ao tecido, seja por
eliminação, a concentração plasmática decresce. Observe
atentamente as etapas nas imagens a seguir, que ilustram
modelos de distribuição e eliminação dos fármacos.
• Clique nas figuras abaixo para ver as informações.

Estando presente na circulação sistêmica e ao passar pelo


glomérulo, o fármaco, ou seu metabólito, pode ser filtrado.
Isso dependerá da taxa de filtração glomerular, de o fármaco
FIGURA D
Esta figura ilustra a representação mais condizente com o
FIGURA A mecanismo de eliminação e equilíbrio extravascular. No
Podemos comparar a injeção intravenosa de um fármaco gráfico, perceba que há uma fase precoce de distribuição e
com a adição dele dentro de uma proveta. Quando não posteriormente uma fase de eliminação mais lenta.
movimento de fármaco para fora da proveta, o gráfico
mostra apenas aumento na concentração até um máximo e Ao administrar por via intravenosa uma quantidade específica
depois um platô. do fármaco, o mesmo se dispersa pela circulação sistêmica
e para os compartimentos extravaculares. A eliminação e a
distribuição definem a redução progressiva da quantidade do
fármaco na circulação sistêmica.
A depuração é um evento que soma a eliminação do
fármaco por todas as vias. A eliminação do fármaco, como
assinalado anteriormente, envolve processos realizados no
rim, no fígado, nos pulmões, no suor, no leite materno, entre
outros.
A depuração total é o somatório da depuração em todas
essas vias e expressa o volume de fluido biológico, como o
sangue ou plasma, do qual o fármaco se livra por unidade de
tempo.
FIGURA B
Neste caso, existe uma via de eliminação (representada pela
torneira) e por isso o gráfico apresenta um declínio após
atingir a concentração máxima. A inclinação da curva diminui
porque a redução do material na proveta faz com que a
eliminação também diminua, exponencialmente.

É expressa em volume por tempo sobre por peso (ex:


mL/min por Kg), onde CL é depuração ou taxa de
eliminação.

FIGURA C
O fármaco é colocado em um compartimento (sangue) e se
distribui para um segundo compartimento (volume
extravascular). Neste caso, o gráfico mostra um aumento
íngreme (referente ao momento em que o fármaco é
adicionado), depois há um decaimento exponencial até um
novo platô (quando a quantidade de fármaco fica em
quantidades equilibradas nos dois compartimentos).

Para a maioria dos fármacos, a depuração é constante na


faixa de concentração plasmática aferida em situações
clínicas. Assim, a velocidade de eliminação é proporcional à distribuição (V), calculado a partir da Cp0 medida, foi de 31,3
concentração, logo: Taxa de eliminação = CL X C L, e o clearance, de 90 mL/min.
Objeto com interação.
OBSERVAÇÕES IMPORTANTES
• Esse tipo de eliminação é denominado eliminação
de primeira ordem e pode ser calculada pela razão
entre a dose e a ASC (CL=DOSE/ASC). Para
poucos fármacos, ou quando a dose é excessiva Curva de Cp x tempo seguida de uma administração de
para os que realizam a eliminação de primeira fármaco IV (500mg) para um paciente de 70Kg.
ordem, a eliminação é ou torna-se saturada, Neste painel a amostragem antes de 2 horas indicou uma
denominando-se eliminação passível de saturação. cinética multiexponencial. O t1/2 não modificou (4 h),
Caso o fluxo sanguíneo não limite a eliminação, a entretanto o clearance foi de 84 mL/min, e Vd, de 26,8 L.
relação entre a velocidade de eliminação e a Houve um erro de 10% na estimativa do clearance quando as
concentração será: duas horas iniciais foram ignoradas.
𝑉𝑚𝑎𝑥 × 𝐶
𝑡𝑎𝑥𝑎 𝑑𝑒 𝑒𝑙𝑖𝑚𝑖𝑛𝑎çã𝑜 = FARMACOCINÉTICA CLÍNICA
𝐾𝑚 + 𝐶 Efeito de esquema de doses repetidas
• A equação é semelhante a de Michaelis-Menten,
A administração de doses repetidas de um fármaco é um
que expressa cinética enzimática, onde Vmáx é a
evento mais comum do que a administração de uma única
capacidade máxima de eliminação do fármaco, e dose. A infusão contínua é um esquema de doses repetidas
Km é a concentração do fármaco em que a
mais extremo.
velocidade é 50% da máxima. Substâncias como o
Entende-se que a concentração plasmática aumenta até
etanol e a aspirina obedecem a esse perfil de atingir uma concentração em estado de equilíbrio dinâmico,
eliminação. Ao saturar a capacidade de eliminação, a
onde a velocidade de administração torna-se igual à
concentração continua crescendo com o aumento
velocidade de eliminação.
da administração da droga. Não se pode utilizar a
ASC no cálculo da depuração nesse perfil.
• Outro parâmetro farmacocinético importante a ser
considerado na eliminação dos fármacos é o tempo
de meia-vida (t1/2), que se refere ao tempo
necessário para se reduzir à metade a quantidade
do fármaco no organismo. É definido através da
seguinte equação:
0,693 × 𝑉𝑑
𝑇𝑒𝑚𝑝𝑜 𝑑𝑒 𝑚𝑒𝑖𝑎 − 𝑣𝑖𝑑𝑎 (𝑡1 ) =
2 𝐶𝐿
Existem dois principais modelos para definir a distribuição e o
decaimento da quantidade do fármaco na circulação. O
modelo de um compartimento é mais simples e estabelece
que o fármaco se distribui igualmente para os
compartimentos corporais, como se todos fossem um só,
comparado a um compartimento central.
Sendo assim, a verdadeira meia-vida terminal será maior do
que a calculada pela equação, ou outros parâmetros podem
se mostrar diferentes. Um exemplo de como considerar o
modelo certo faz diferença, como mostramos a seguir.
Objeto com interação.

Perfil de variação da concentração plasmática esperada para


um esquema de infusão contínua (A), injeções repetidas
mais frequentes (B), injeções repetidas menos frequentes
(C).Fonte: Adaptado de RANG et al., 2003
Curva de Cp x tempo seguida de uma administração de
fármaco IV (500mg) para um paciente de 70Kg. A velocidade de eliminação, como já descrito acima, é igual
Neste painel a concentração foi medida após e em intervalos ao CL (clearance) x C (concentração – nesse caso, a
de 2 horas após a administração. Ao extrapolar a curva para concentração no estado de equilíbrio dinâmico), logo:
concentração plasmática no tempo zero (Cp0), o gráfico 𝑇𝑎𝑥𝑎 𝑑𝑒 𝑒𝑙𝑖𝑚𝑖𝑛𝑎çã𝑜
sugere que o fármaco é eliminado a partir de um 𝐶=
𝐶𝐿
compartimento com um t1/2 de 4 horas. O volume de Um esquema de injeções repetidas possuiu um padrão mais
oscilante, mas o princípio é o mesmo. De forma geral,
quanto menores e mais frequentes as doses, mais próximo o A taxa de administração para doses repetidas representa a
perfil se parecerá com o da infusão contínua, e as oscilações dose de manutenção a ser administrada em relação ao
serão menores, conforme o gráfico ao lado. intervalo entre essas doses:
O equilíbrio dinâmico é alcançado após quatro ou cinco
tempos de meia-vida.
Saiba mais
O alcance da concentração plasmática de equilíbrio é
possível quando o fármaco apresenta uma cinética de
eliminação de primeira ordem, o que gera uma taxa de Em algumas situações, antes de gerar um esquema de
eliminação proporcional à taxa de absorção, possibilitando o manutenção, é preciso alcançar rapidamente a concentração
alcance desse equilíbrio. plasmática alvo. Nesses casos, é possível administrar uma
Para fármacos com cinética de eliminação de ordem zero ou dose de ataque, que é capaz de elevar imediatamente a
cinética de saturação, quando a taxa de eliminação não é concentração ao nível-alvo. Essa dose pode ser calculada da
proporcional ao aumento da concentração plasmática, o seguinte forma:
perfil de curva observado é diferente. 𝐷𝑜𝑠𝑒 𝑑𝑒 𝑎𝑡𝑎𝑞𝑢𝑒 = 𝑉𝑑 × 𝑎𝑙𝑣𝑜

Tema 3
Processos farmacodinâmicos
DEFINIÇÃO
Apresentação dos processos farmacodinâmicos,
Na cinética linear, a concentração plasmática no estado de caracterização dos receptores farmacológicos e suas vias de
equilíbrio dinâmico é diretamente proporcional à dose. sinalização e dos parâmetros importantes para a avaliação da
Comparação do perfil da curva de fármacos administradas segurança dos fármacos.
via oral a cada 12 horas com cinética de primeira ordem PROPÓSITO
(linear), onde o equilíbrio dinâmico é alcançado. Compreender o conceito e as características
farmacodinâmicas para definir a ação dos fármacos em seus
receptores, prevendo as ações terapêuticas e as adversas.
Compreender a forma como essas substâncias se
comportam no organismo e como alteram as funções
bioquímicas celulares ou extracelulares, com vistas à análise
do risco-benefício da terapia.
Na cinética de saturação, um pequeno incremento na dose INTRODUÇÃO
resulta em um efeito desproporcional sobre a concentração A Farmacodinâmica é o estudo dos efeitos fisiológicos,
plasmática. bioquímicos e celulares dos fármacos e seus mecanismos de
Comparação do perfil da curva de fármacos administradas ação. Esses efeitos resultam da interação dos fármacos com
via oral a cada 12 horas na cinética de saturação, onde o seus componentes macromoleculares (receptores), a fim de
equilíbrio dinâmico é imprevisível. que uma resposta terapêutica seja produzida. A maioria dos
SOBRE DOSAGENS REPETIDAS fármacos precisa se ligar a um receptor para desencadear
Para um esquema de doses repetidas, tem-se, portanto, que seu efeito, e essa ligação instaura a primeira parte de uma
os fármacos devem ser administrados de modo a manter série de eventos que ocorrerão em cascata.
uma concentração plasmática de equilíbrio, que gere o A maioria dos receptores dos fármacos está localizada nas
efeito esperado e seja segura. Cada dose deve ser suficiente membranas das células, mas também pode estar em
para repor o fármaco eliminado na dose anterior. A dose a compartimentos intracelulares específicos, como o núcleo, e
ser administrada a cada tomada, para manter essa compartimentos extracelulares, como os fármacos que
concentração-alvo, é chamada de dose de manutenção. Uma interagem com os fatores da coagulação e mediadores
vez que, no estado de equilíbrio, a taxa de “entrada” inflamatórios.
(administração) iguala-se à taxa de “saída” (eliminação) do Alguns fármacos mais recentes têm propriedades bem
fármaco no organismo, substituindo-se a concentração (C) diferentes das dos fármacos tradicionais. A engenharia
pela concentração-alvo (C alvo) (que se espera ter) na genética permitiu a utilização de enzimas geneticamente
equação da taxa de eliminação, temos que: modificadas e de anticorpos monoclonais, configurando um
grupo novo de fármacos – os biológicos terapêuticos. O
vírus vivo do herpes (geneticamente modificado) foi
recentemente aprovado para o tratamento do melanoma,
sendo injetado em tumores que não podem ser
completamente removidos por cirurgia.
Para vias de administração, onde a biodisponibilidade não é De modo geral, pode-se dizer que, no ramo da
100%, ou seja, F<1, como no caso da via oral, a taxa de Farmacodinâmica, é de extremo interesse a avaliação da
administração deve ser ajustada pelo fator de ação das drogas, biológicas ou químicas, sintéticas ou
biodisponibilidade. Logo, usaremos Taxa de administração x F naturais, nos seus devidos receptores, além da identificação
na equação.
e da descrição das cascatas intracelular ou extracelular Muitas vezes, as proteínas efetoras não são o alvo final, em
originadas dessa interação. Isso porque, a descrição desse vez disso, uma enzima ou proteína transportadora que
fenômeno permite prever o comportamento ativador ou modula, degrada ou sintetiza componentes chamados
inibidor de uma droga, a intensidade do efeito e a de segundos mensageiros. Estes podem se difundir pela
aplicabilidade em condições profiláticas e patológicas. célula e modular outros componentes e, dessa forma,
Módulo 1 promover diversos estímulos inerentes à ativação de um
Definir os princípios farmacodinâmicos com base mesmo receptor.
no conceitode receptores farmacológicos Conforme a ação dos ligantes endógenos nos receptores,
RELAÇÃO DOS FÁRMACOS COM classifica-se a ação dos fármacos nos mesmos receptores
OS DIFERENTES RECEPTORES como: agonistas ou antagonistas.
Objeto com interação.
FÁRMACOS AGONISTAS
Exercem uma ação similar à exercida pelo ligante endógeno
no receptor. Ligando-se na mesma região que os ligantes
endógenos são descritos como agonistas primários; caso a
Muitos receptores farmacológicos possuem estrutura ligação seja em outra região do receptor, diferente da
proteica. Em geral, esses receptores têm uma função região de ligação do ligante endógeno, são definidos
fisiológica específica, atendendo às necessidades já como agonistas alostéricos.
existentes nas células e nos tecidos. Em grande parte, eles Alguns agonistas têm capacidade parcial na ativação dos
são proteínas que atuam como receptores para ligantes receptores e são definidos como agonistas parciais; outros
endógenos. Apesar de serem a maioria, é preciso considerar são plenos em relação à sua atividade agonista, sendo
receptores de outras naturezas, como fármacos os agonistas totais ou plenos. Muitos receptores possuem
antimicrobianos e antitumorais que interagem diretamente atividade constitutiva na ausência doa ligantes reguladores.
com o DNA, e os biofármacos, que incluem ácidos nucleicos, Alguns fármacos estabilizam o receptor na forma inativa e
proteínas e anticorpos. são denominados agonistas inversos.
A ligação dos fármacos aos receptores envolve diferentes
tipos de interações:
Iônicas
Pontes de hidrogênio
Van der Waals
Covalentes
Ligações covalentes
As ligações covalentes garantem uma duração mais
prolongada.
Ligações não-covalentes FÁRMACOS ANTAGONISTAS
As não covalentes, se forem de alta afinidade, também Bloqueiam ou inibem a ação de receptores fisiológicos.
poderão exercer ação irreversível. Normalmente, a ação antagonista deriva de uma competição
Saiba mais entre o fármaco antagonista e o agonista endógeno pelo
Além da duração da ligação, outro fator que determina a mesmo sítio no receptor (antagonismo competitivo). Outras
ação dos fármacos nos receptores é a localização destes. vezes, por ligação em um sítio diferente, em que a ligação
Se um fármaco age em um receptor amplamente do antagonista gera uma modificação no receptor que
distribuído em diferentes tecidos, seus efeitos serão diminui a ligação do agonista (antagonismo alostérico). Pode-
disseminados. se, portanto, resumir o conceito de agonista e antagonista
Se for uma função vital, modular, tais receptores em tantos como:
tecidos diferentes pode ser arriscado e gerar toxicidade • Drogas agonistas – ligam-se de algum modo ao receptor e
disseminada. o ativam, produzindo o efeito, que pode ser total (agonista
Se o fármaco interagir com receptores exclusivos a apenas pleno) ou parcial (agonista parcial).
algumas células, seus efeitos serão mais específicos, e os • Drogas antagonistas – ligam-se ao receptor e impedem a
efeitos colaterais serão minimizados. ligação de outras moléculas, em geral, do agonista endógeno.
Fisiologicamente, os receptores exercem a função de
ligação ao ligante e propagação da mensagem. Para tanto,
dois domínios funcionais são necessários,
Domínio de ligação ao ligante
Domínio efetor
As ações esperadas pela ativação dos receptores podem
ser exercidas diretamente em seus alvos, as proteínas
efetoras, ou podem ser conduzidas por componentes
intermediários denominados transdutores. Figura 1 – Regulação da atividade do receptor por fármacos.
Na regulação da atividade do receptor por fármacos, diferencia dos agonistas (de eficácia positiva) e dos
podemos observar a forma ativa do receptor (Ra), a forma antagonistas (de eficácia zero). Em tese, um agonista inverso,
inativa (Ri) e o ligante (L), que pode ser um agonista total ( full por silenciar receptores constitutivamente ativos, é mais
agonist); um agonista parcial (partial agonist); um antagonista eficaz que um antagonista em doenças associadas a
(antagonist) ou um agonista inverso (inverse agonist). mutações no receptor que resultem em aumento da
No gráfico apresentado, é preconizado que o receptor atividade constitutiva. São exemplos de situações patológicas
exista nas formas ativa e inativa. O ligante, que pode ser como essa certos tipos de hipertireoidismo e puberdade
endógeno, ou o fármaco propriamente dito, quando é um precoce.
agonista total, liga-se à forma ativa do receptor, gerando um A força da interação entre o fármaco e o receptor medida
máximo de efeito neste. O agonista parcial se liga a ambas as pela constante de dissociação é definida como afinidade entre
formas, com maior afinidade na forma ativa – por isso, o o fármaco e o receptor. A afinidade depende, portanto, da
efeito gerado no receptor não é máximo, mas parcial. O estrutura química do fármaco. Além da afinidade, a estrutura
antagonista se liga a ambas as formas com igual afinidade, química também definirá a especificidade.
não gerando efeito no receptor. O agonista inverso se liga à Um fármaco capaz de interagir com um único tipo de
forma inativa, estabilizando-o nessa conformação, gerando receptor expresso em uma quantidade limitada de células
inativação do receptor. exibirá alta especificidade.
De modo geral, pode-se dizer que o receptor tende a Fármacos que atuem em receptores expressos em diversos
manter suas conformações ativas e inativas em equilíbrio. tecidos exibirão efeitos generalizados.
Atenção A ação em diferentes tecidos pode ser um fator benéfico
A extensão em que o equilíbrio é alterado em direção à ao aumentar o espectro de ação do fármaco e pode ser
forma ativa do receptor é definida pela afinidade relativa do um fator deletério ao passo que aumenta demasiadamente o
fármaco, pelas duas conformações. risco de efeitos adversos.
Assim, um fármaco com maior afinidade pela conformação Resumindo
ativa irá direcionar o equilíbrio para o estado ativo e ativar o De modo geral, os fármacos fazem duas coisas com os
receptor. Será dessa forma um agonista. Sendo um agonista receptores: Ligam-se a eles e alteram seu comportamento
total, ele terá seletividade suficiente para direcionar, de modo na célula.
integral, o receptor para o estado ativo. A ligação do fármaco no receptor é governada pela
Embora o modelo descrito mostre que os receptores são afinidade e regida pela força química que promove a união
ativados apenas quando a molécula de um agonista se liga a de ambos.
eles, há situações em que pode ocorrer um nível apreciável A alteração do comportamento é governada pela eficácia,
de ativação, mesmo na ausência de ligantes. Para esses que é a informação codificada na estrutura química do
casos, há uma ativação constitutiva, ou seja, uma atividade fármaco capaz de promover a alteração na estrutura do
em repouso, mesmo sem ativação do receptor por um receptor.
ligante. O término da ação dos fármacos nos receptores depende
A observação da atividade constitutiva tornou-se a melhor de muitos fatores. Em alguns casos, a ação dura até o
forma de compreender a ação dos agonistas inversos. Essa fármaco se desligar do receptor. Assim, quando há
atividade pode ser baixa demais para gerar qualquer efeito dissociação, há também o término do efeito. Em outros
sob condições normais, mas pode tornar-se evidente quando casos, o efeito pode durar além da dissociação, quando, por
há receptores expressos em excesso. exemplo, moléculas acopladoras intracelulares permanecem
ativadas gerando efeito mesmo que o fármaco não esteja
mais ligado ao receptor.
A dissociação entre o fármaco e o receptor confere uma
ligação reversível entre os dois.
Há casos em que a ligação é realizada de forma covalente, e
o efeito pode persistir, sendo interrompido apenas quando o
complexo droga-receptor é destruído e um novo receptor
é sintetizado pela célula. Essa ligação é
denominada irreversível.
Exemplo
Suponhamos que, em uma célula, 1% dos receptores estão
ativos na ausência de qualquer agonista. Em uma situação
normal que expressa 10.000 receptores, apenas 100 estarão
ativos. Em uma situação patológica em que haja um Há também mecanismos de dessensibilização dos receptores
aumento de dez vezes no nível de expressão, 1.000 para impedir a ativação excessiva destes, quando a molécula
receptores estarão ativos, produzindo, dessa forma, um do fármaco permanece muito tempo ligada. A
efeito significativo. Nessas condições, é possível reduzir o dessensibilização é um dos fatores que contribui para um
nível de ativação constitutiva lançando mão de fármacos evento conhecido como taquifilaxia. Esse evento ocorre
agonistas inversos. Assim, esses agonistas podem ser quando a resposta ao fármaco diminui por causa da
considerados fármacos com eficácia negativa, o que os
administração de doses repetidas e, em geral, requer ajuste Na clínica, as mutações dos receptores podem alterar a
da dose administrada para a manutenção do efeito. resposta ao tratamento farmacológico, como exemplo
A estimulação contínua das células pelo agonista geralmente vemos a mutação de receptores beta-adrenérgicos (que
leva à dessensibilização. Esse efeito é também chamado modulam o relaxamento da musculatura lisa das vias
de estado refratário ou modulação negativa. A inibição da respiratórias) acelerando a dessensibilização. Assim, reduzindo
sinalização pode se limitar ao estímulo de apenas um a responsividade aos agonistas beta-adrenérgicos utilizados
receptor, conhecido como dessensibilização homóloga. no tratamento da asma.
Saiba mais QUANTIFICAÇÃO DO AGONISMO
Quando estendida a todos os receptores que participam da
via de sinalização comum é chamada de dessensibilização
heteróloga.
A primeira é dirigida para a própria molécula do receptor,
alguns mecanismos como fosforilação ou diminuição da
síntese do receptor podem ser realizados pela célula para
reduzir sua atividade. Relacionar a dose do fármaco com o nível de resposta
A segunda envolve perda de uma ou mais proteínas que clínica é um processo complexo, pois muitos fatores
participam da via de sinalização, ou seja, não são interferem no nível de resposta, fatores individuais inclusive.
modificações sofridas pelo receptor, mas por componentes Entretanto, relacionar a concentração de um fármaco e seu
que atuam na sua via. efeito em um sistema experimental (in vitro) bem controlado
A ação do fármaco também pode ser finalizada devido à é possível. Nesses sistemas, a relação entre a concentração
resistência a ele. Alguns mecanismos farmacocinéticos e o efeito de um fármaco agonista é descrita por uma curva
podem estar envolvidos com o metabolismo mais acelerado, hiperbólica (figura 2A).
caso dos barbitúricos cuja administração repetida da mesma Essa relação está pautada na teoria de ocupação dos
dose leva a uma redução progressiva da concentração receptores e na lei de ação das massas (figura 2B), que diz
plasmática do fármaco, por causa do aumento de sua que a resposta de um fármaco é proporcional à ocupação
degradação metabólica. dos receptores por ele.
O termo “resistência a um fármaco”, entretanto, é utilizado Atenção
mais comumente para descrever a perda de eficácia dos Em certa concentração do fármaco, atinge-se o nível
fármacos antimicrobianos ou antineoplásicos. Muitos máximo de resposta, de forma que incrementos maiores de
mecanismos diferentes podem dar origem a esse tipo de concentração não elevam esse nível.
fenômeno, como: Por vezes, o acoplamento ocupação-resposta não é linear, o
Alteração em receptores que significa que, mesmo com ocupação menor que a
máxima dos receptores, a resposta pode ser máxima. Um
Depleção de mediadores conceito útil para justificar isso é o de receptor de reserva.
Aumento da degradação metabólica do fármaco Objeto com interação.
Adaptação fisiológica RELAÇÃO ENTRE A CONCENTRAÇÃO E O EFEITO DO
Extrusão ativa do fármaco das células (relevante FÁRMACO (A) E A CONCENTRAÇÃO E A OCUPAÇÃO DO
principalmente na quimioterapia antineoplásica) RECEPTOR (B)
Mecanismo de resistência celular (aumento de expressão de
proteínas de efluxo em bactérias)
A perda de um receptor ou de sua responsividade em um
sistema de sinalização também pode gerar efeitos bastante
drásticos. Algumas doenças atualmente conhecidas estão
relacionadas a deficiências em receptores ou em seus
sistemas de sinalização.
Exemplo
A miastenia gravis é um exemplo de doença que resulta da
depleção autoimune dos receptores colinérgicos nicotínicos,
e algumas formas de diabetes mellitus, que resultam da
depleção de receptores insulínicos. Figura 2 –
Observamos também que receptores podem responder de Relação entre a concentração e o efeito do fármaco (A) e a
forma anormal aos ligantes quando sua expressão ou a de concentração e a ocupação do receptor (B).
seus efetores é aberrante. Entre os eventos mais Observe a concentração em que são alcançadas a metade
significativos está o aparecimento de receptores aberrantes do efeito máximo e a metade da ocupação dos receptores,
como produtos de oncogenes, transformando células definidas como EC50 e K0, respectivamente. Emáx é o efeito
normais em células malignas. Os produtos dos máximo e Bmáx, a ocupação máxima.
oncogenes ros e erbB, formas ativadas e descontroladas de Os componentes básicos da resposta ao fármaco mediados
receptores de insulina e fator de crescimento epidérmico por receptores podem ser definidos como a afinidade
aumentando a proliferação celular são exemplos. (mediada pela constante de dissociação – K0), a fração de
receptores ocupados pelo fármaco (determinada pela
concentração do fármaco e pela K0) e a eficácia que define
o poder de indução de resposta do fármaco.
A relação mostrada anteriormente, apesar de alcançada em
estudos in vitro, configura a base de relações mais
complexas entre dose e efeito que ocorrem quando
administramos fármacos a pacientes. A representação
gráfica dos dados de dose x efeito é aprimorada ao
Figura 4 – Quantificação do agonismo.
plotarmos a dose ou a concentração em escala logarítmica
Veja que, em A, dois agonistas apresentam o mesmo nível
(abscissa). Isso transforma a hipérbole em uma sigmoide e a
de reposta no mesmo tecido, mas demandam
visualização da EC50 é facilitada (veja a seguir).
concentrações diferentes para atingi-la. O mais potente será
RELAÇÃO CONCENTRAÇÃO X RESPOSTA
o de menor EC50. Em B, no mesmo tecido, dois agonistas
apresentam diferentes níveis de resposta e eficácias distintas.
DIFERENTES EFICIÊNCIAS NO PROCESSAMENTO DO
ESTÍMULO DO RECEPTOR PRODUZEM NÍVEIS DE
RESPOSTA DIFERENTES PARA FÁRMACOS (A, B E C)
COM EFICÁCIAS DISTINTAS

Figura 3 – Relação concentração x resposta.


Veja que, em A, o nível de resposta (eixo y) está
relacionado à concentração do fármaco A (eixo x),
formando uma curva em hipérbole. Em B, o nível de
resposta (eixo y) está relacionado ao logaritmo da
concentração do fármaco A (eixo x), formando uma curva
sigmoide.
No sistema biológico, os fármacos possuem duas
propriedades importantes e observáveis: Potência e
amplitude de efeito. A potência é regida por quatro fatores.
Dois deles são fatores biológicos, a quantidade de receptores Figura 5 – Diferentes eficiências no processamento do
no tecido e a eficiência do mecanismo de estímulo
estímulo do receptor produzem níveis de resposta
(informação mais claramente discutida na figura 5). E dois são diferentes para fármacos (A, B e C) com eficácias distintas.
fatores relacionados à interação do fármaco com o Ao analisar o que é mostrado anteriormente, podemos
receptor, a afinidade e a eficácia. concluir que, na célula I, que amplifica o estímulo de modo
Quando dois fármacos produzem respostas equivalentes em mais fraco, o fármaco A produz resposta máxima se
um mesmo tecido é possível comparar suas curvas. A comportando, portanto, como agonista total. O fármaco B
análise das curvas dose x resposta de fármacos distintos é produz resposta tecidual parcial ou submáxima,
importante critério para a definição da potência. O fármaco comportando-se como agonista parcial. O fármaco C não
que possuir a curva deslocada para a esquerda é produz resposta, entretanto, é capaz de ocupar o receptor
considerado com maior potência, pois é evidenciada uma comportando-se como antagonista dos efeitos de A e B.
menor concentração necessária para produzir 50% da Os mesmos fármacos, quando testados na célula I , que
resposta máxima (menor EC50) (figura 4A). possuiu mecanismo de estímulo derivado do acoplamento
Há ainda a possibilidade de dois agonistas produzirem níveis mais eficiente, se comportam de forma diferente. O fármaco
de resposta distintos no mesmo tecido. Nessa situação, B é capaz de exibir uma resposta mais pronunciada,
observamos uma diferença de eficácia (figura 4B). É preciso comportando-se como agonista total. O fármaco A
atentar que, por vezes, o nível de resposta do agonista pode permanece como agonista total e o fármaco C, que
mudar, dependendo do tecido no qual a resposta foi apresentava eficácia insuficiente para causar resposta na
quantificada. célula I, exibe uma resposta parcial, comportando-se como
A ação dos fármacos depende do receptor e de suas agonista parcial.
proteínas de sinalização associadas, e essa logística muda da Os fármacos individualmente não sofreram nenhuma
célula de um tecido para outro. Dessa forma, um agonista alteração em suas propriedades, a eficiência do sistema de
com menor eficácia em um sistema celular pode ter maior sinalização é que mudou de uma célula para outra e isso
eficácia em outro (figura 5). Isso ocorre porque a ativação modificou completamente a resposta esperada.
de um receptor pelo fármaco pode ser realizada com um QUANTIFICAÇÃO DO ANTAGONISMO
sinal inicial que é amplificado a seguir. A capacidade de
amplificação das células é diferente e isso impacta o
resultado observado a partir da interação fármaco-receptor.
QUANTIFICAÇÃO DO AGONISMO
A ação antagonista dos fármacos pode ser quantificada da
mesma forma que o agonismo. Os antagonistas dos
receptores ligam-se a eles, mas não o ativam.
Objeto com interação.
ANTAGONISTAS COMPETITIVOS SIMPLES
Os antagonistas competitivos simples têm afinidade com o
receptor, mas não possuem eficácia intrínseca; dessa forma,
a redução da atividade no receptor é dada simplesmente
pela ocupação deste pelo antagonista impedindo a ligação do
agonista endógeno, havendo competição pelo mesmo sítio.
Quando adicionado em quantidades suficientes, o agonista
consegue superar o antagonista e se ligar ao sítio receptor, Figura 6 – Caracterização dos diferentes antagonistas a
ativando-o novamente. A curva dose x resposta do agonista partir da interferência na curva dose x resposta do agonista.
na presença desse tipo de antagonista é deslocada para a Como mostrado, as curvas verdes representam o
direita (como na figura 6A). Nota-se que a resposta máxima comportamento do agonista (A). As curvas vermelhas, o
é alcançada pelo agonista, entretanto, isso exige comportamento do agonista na presença do antagonista (I).
concentrações maiores. A afinidade de um antagonista Em A, o antagonismo competitivo ocorre quando o
competitivo pelo receptor pode ser determinada pela sua antagonista (I) impede a ligação do agonista no sítio receptor
capacidade de desviar para a direita a curva dose x resposta competindo por este. Há deslocamento da curva para a
do agonista. direita, com manutenção da resposta máxima. Em B, há
ANTAGONISTAS IRREVERSÍVEIS ligação do antagonista no mesmo sítio do agonista, mas de
Antagonistas competitivos que exercem forte ligação com o forma irreversível ou pseudoirreversível (dissociação lenta). A
sítio receptor podem, ainda que, na presença de curva desloca-se para a direita, com redução da resposta
concentrações significativas do agonista, permanecer ligados, máxima. Em C, o antagonismo alostérico ocorre quando o
impossibilitando o agonista de retornar o estímulo no antagonista (I) se liga em um sítio diferente do sítio do
receptor. Esses são os antagonistas irreversíveis. Nessa agonista (A). A curva é deslocada para a direita com redução
situação, a resposta máxima não será alcançada pelo da resposta máxima.
agonista, mesmo em concentrações elevadas. O padrão de ANTAGONISMO QUÍMICO
curva dose x resposta se assemelha ao dos antagonistas não Outras formas de antagonismo também podem ocorrer.
competitivos, como observado a seguir. O antagonismo químico, por exemplo, acontece quando duas
ANTAGONISTA NÃO COMPETITIVO substâncias se combinam em uma solução e, dessa forma, o
O antagonista não competitivo (alostérico) gera sua inibição efeito do fármaco ativo é perdido. Um exemplo é a
ao se ligar em um sítio diferente daquele do agonista no protamina, uma proteína que tem carga positiva em pH
receptor. A ligação do antagonista alostérico modifica a fisiológico e pode ser usada clinicamente para antagonizar os
afinidade do receptor pelo agonista, dificultando a ativação do efeitos da heparina, um anticoagulante que tem carga
receptor. De modo geral, a afinidade do receptor pelo negativa.
agonista é diminuída pela ligação do antagonista no sítio ANTAGONISMO FARMACOCINÉTICO
alostérico (veja a seguir em C). O antagonismo farmacocinético descreve a situação em que
um agente reduz de fato a concentração do fármaco ativo
em seu sítio de ação. Um exemplo é a redução do efeito
anticoagulante da varfarina quando se administra um agente
que acelera seu metabolismo hepático, como a fenitoína.
Há ainda o bloqueio da relação receptor-resposta quando o
antagonismo ocorre não no receptor, mas em algum ponto
adiante do local de ligação no receptor como na cadeia de
eventos intracelulares que leva à produção de uma resposta
pelo agonista. O verapamil e o nifedipino, por impedirem o
influxo de Ca2+ através da membrana celular, antagonizam de
forma não seletiva a ação de contração do músculo liso
produzida por outros fármacos, atuando em qualquer
receptor que se acople a esses canais de cálcio.
ANTAGONISMO FISIOLÓGICO
O antagonismo fisiológico é uma expressão livremente a abertura ou o fechamento do canal.
utilizada para descrever a interação entre dois fármacos Agentes atuando em receptores transmembrana que
cujas ações opostas no organismo tendem a se anular estimulam
mutuamente. Isso pode ocorrer entre vias reguladoras a proteína G,
endógenas mediadas por receptores diferentes. São modulando a produção de um segundo mensageiro.
exemplos os hormônios glicocorticoides, elevando
potencialmente a glicemia, e a ação antagônica da insulina,
que atua como um opositor fisiológico. Embora
glicocorticoides e insulina atuem em sistemas receptor-efetor
diferentes, é possível administrar esta última para se opor
aos efeitos hiperglicemiantes do glicocorticoide.
Assista ao vídeo para melhor compreensão sobre a
discussão de potência e eficácia.
Módulo 2
Descrever os mecanismos de sinalização das diferentes Figura 7 – Os cinco mecanismos de sinalização intracelular
famílias de receptores desencadeados por fármacos ao se ligarem aos receptores.
e os critérios de segurança de um fármaco e suas variações Escolha uma das Etapas a seguir.
individuais 1. O fármaco lipossolúvel atravessa a membrana plasmática
MECANISMOS DE SINALIZAÇÃO DAS DIFERENTES e age sobre um receptor intracelular.
FAMÍLIAS DE RECEPTORES 2. Ele se liga ao domínio extracelular do receptor
transmembrana acionando uma atividade enzimática.
3. Ele se liga ao domínio extracelular do receptor
transmembrana ligado a uma proteína tirosina-cinase.
4. Ele se liga a um canal iônico, regulando-o.
5. Ele se liga ao receptor transmembrana acoplado a uma
proteína G. (A, C, substratos; B, D, produtos; R,
receptor; G, proteína G; E, efetor [enzima ou canal
Até agora consideramos a forma como os fármacos
iônico]; Y, tirosina; P, fosfato.).
interagem com os seus receptores com base na
quantificação de suas ações pela análise da curva dose x
RECEPTORES INTRACELULARES
resposta. Tão importante quanto isso é entender como eles
alteram molecularmente as células ou os tecidos com os
quais interagem.
A maior parte da sinalização transmembrana é realizada por
apenas alguns mecanismos moleculares e cada um se
adaptou à transdução de muitos e diferentes sinais ao longo
da evolução. Alguns fármacos, por possuírem razoável lipossolubilidade,
As famílias de receptores são caracterizadas por conseguem transpor a membrana plasmática fosfolipídica e
componentes presentes na superfície celular, no interior da atuar em receptores intracelulares. Agentes endógenos com
célula, enzimas, moléculas transportadoras e outros o mesmo perfil atuam nesses receptores fisiologicamente, é
componentes que geram, amplificam ou interrompem a o caso de corticosteroides, mineralocorticoides, esteroides
sinalização pós-receptor. sexuais e hormônio tireoidiano.
De modo geral, o termo receptor, para os fármacos, define Os receptores intracelulares, ao serem ativados por seus
qualquer componente que seja alvo deles. No contexto ligantes (fármacos ou agentes endógenos), estimulam a
fisiológico, percebe-se que os receptores têm duas funções: transcrição de genes por ligação a sequências específicas de
Ligar o ligante DNA (chamadas de elementos de resposta) próximas ao
Propagar sua resposta gene cuja expressão é regulada.
Atualmente, os agentes farmacológicos são descritos por Exemplo
atuar por meio de cinco mecanismos de sinalização Agentes atuantes nesse tipo de receptor são os
transmembrana diferentes (figura 7), são eles: glicocorticoides.
Agentes lipossolúveis atuando em receptores A ligação do glicocorticoide ao domínio de ligação
intracelulares. desencadeia a liberação de hsp90, que possibilita os domínios
Agentes atuando em receptores transmembrana com de ligação de DNA ficarem disponíveis, ativando a transcrição
atividade de genes-alvo (mostrado a seguir). A consequência
enzimática intracelular. terapêutica negativa desse mecanismo de ação é que os
Agentes atuando em receptores transmembrana que efeitos iniciam em horas, que é o tempo necessário para a
estimulam síntese das novas proteínas. Assim, fármacos que atuem por
a proteína tirosina-cinase. esse mecanismo não são preconizados para efeitos
Agentes atuando em canais iônicos transmembrana imediatos. Os efeitos desses agentes também podem
induzindo persistir por horas ou dias após a retirada do fármaco. As
proteínas expressas permanecerão atuantes na célula, ainda receptores, o número total deles é reduzido e a resposta da
que não haja estímulo para expressão e síntese de novas célula ao agente é diminuída de modo correspondente.
proteínas.

Figura 9 – Receptores de tirosina-cinase (A) e de citocinas


após ativação (B).
Em A, o receptor do fator de crescimento endotelial (EGF),
um receptor de tirosina-cinase. Ele e seus domínios
extracelulares e citoplasmáticos. O EGF, ao se ligar, converte
o receptor ao estado ativo (direita). Os domínios
intracelulares se tornam fosforilados (P) sobre resíduos
específicos de tirosina (Y) e suas ações enzimáticas são
ativadas, catalisando a fosforilação do substrato (S).
Em B, o receptor de citocinas, após ativação. As proteínas
JAK são acionadas, fosforilando transdutores de sinais que
ativam STAT. Os dímeros de STAT viajam para o núcleo,
no qual regulam a transcrição.
Há ainda receptores nessa família que ativam outras enzimas
que não as tirosinas-cinase intrínsecas, é o caso dos
receptores de citocinas, por exemplo.
Esses receptores, quando ligados às citocinas, formam
dímeros permitindo que as Janus-cinase (JAK) se tornem
ativas e fosforilem resíduos de tirosina no receptor.
Esses resíduos fosforilados iniciam uma cascata de sinalização
Figura 8 por ligação a outro grupo de proteínas, as STAT
– Atuação do glicocorticoide em seu receptor intracelular. (transdutoras de sinal e ativadoras de transcrição).
Observe que, na ausência do hormônio, o receptor liga-se à As STAT ligadas são fosforiladas pelas JAK. Elas dimerizam
hsp90. A ligação do glicocorticoide libera a hsp90, (duas STAT juntas) e se dissociam do receptor indo ao
possibilitando a ativação do receptor que inicia a transcrição núcleo, regulando a transcrição de genes específicos (como
de genes-alvo. mostrado em B, anteriormente).
RECEPTORES TRANSMEMBRANARES QUE REGULAM RECEPTORES QUE MODULAM CANAIS IÔNICOS
ENZIMAS (INCLUSIVE TIROSINAS-CINASE)
Os receptores que atuam por esse mecanismo possuem
um domínio extracelular de ligação dos agentes e um
domínio citoplasmático enzimático, que pode ser uma
proteína tirosina-cinase, uma serina-cinase ou uma
guanililciclase.
No caso dos receptores tirosina-cinase, após a ligação do
agente endógeno (fator de crescimento, por exemplo) ou
do fármaco (insulina biossintética) ao domínio extracelular, há Os canais iônicos atuam nas células como portões que, de
junção de domínios da tirosina-cinase que se tornam ativos e modo seletivo, permitem a passagem de determinados íons.
fosforilam um ao outro e ainda fosforilam outras proteínas Existem os canais controlados por ligantes, que se abrem
intracelulares. O receptor ativado catalisa a fosforilação de quando agonistas se ligam e, por isso, são propriamente
resíduos de tirosina em proteínas-alvo de sinalização, classificados como receptores; e os canais controlados por
permitindo que um só tipo de receptor ativado module voltagem, que são regulados, não por ligação de um
vários processos bioquímicos (figura 9A). agonista, mas por alterações no potencial transmembrana.
Há ainda fármacos que inibem esses receptores ou Alguns fármacos podem agir modulando as ações dos canais
diminuem a sinalização intracelular. Os inibidores de iônicos responsáveis por regular o fluxo de íons para dentro
receptores tirosinas-cinase podem ser utilizados em ou fora da célula. Na realidade, esses fármacos ativam ou
distúrbios neoplásicos, nos quais a sinalização excessiva de bloqueiam esses canais, que fisiologicamente são modulados
fator do crescimento com frequência está envolvida (por por transmissores sinápticos, como os ligantes endógenos
exemplo, trastuzumabe e cetuximabe). acetilcolina (figura 10A), serotonina, GABA (figura 10B) e
Os receptores, quando ativados, têm ação curta, pois sofrem glutamato.
downregulation com facilidade. A ativação costuma induzir a Os receptores em questão enviam seu sinal através da
endocitose dos receptores seguida pela degradação deles. membrana plasmática, cada receptor, quando ativado,
Se isso ocorrer mais rápido do que a síntese de novos aumenta a condutância de um íon específico pelo canal
iônico, alterando assim o potencial elétrico por meio da
membrana.
Exemplo
Fármacos que atuam por esse mecanismo são os
benzodiazepínicos sedativos que se ligam a uma região do
complexo receptor-cloreto GABA A (um canal ativado por
ligante) que é diferente do local de ligação de GABA,
facilitando a abertura do canal por meio do neurotransmissor
inibitório GABA (veja a seguir em B).

Figura 11 – A proteína G ativada e o segundo mensageiro


com a concentração intracelular aumentada.
Figura 10 – Os receptores nicótico de acetilcolina – Ach (A) A proteína G possuiu três subunidades (α, β, γ) ancoradas à
e GABA (B). membrana. Quando o agonista se liga no receptor, há
Em A, o receptor ACh, que possuiu cinco subunidades (duas acoplamento da subunidade α e, assim, há troca do GDP ligado
α, uma β, uma γ e uma δ) e um canal iônico central pelo GTP intracelular; os complexos α-GTP e βγ se dissociam
permeável ao Na+. O ACh, ao se ligar no domínio do receptor, interagindo com a proteína-alvo.
extracelular, ativa a abertura do canal. A resposta, portanto, estará relacionada à proteína G ativada e
Em B, o receptor para GABA, que é alvo dos fármacos ao segundo mensageiro cuja concentração intracelular foi
benzodiazepínicos. Esses fármacos se ligam em um sítio aumentada. A proteína Gs, por exemplo, estimula a adenililciclase.
alostérico (diferente do GABA) e facilitam a abertura do canal Essa enzima efetora converte trifosfato de adenosina (ATP) em
de cloreto (Cl-). A ação dos benzodiazepínicos depende da AMPc, que é o segundo mensageiro. Dependendo da célula na
presença do ligante endógeno (GABA). De forma geral, o qual o receptor está, esse aumento de AMPc reflete em
fármaco atua no receptor potencializando a ação do ligante diferentes respostas.
endógeno. O estímulo de receptores β-adrenérgicos por aminas
RECEPTORES QUE ESTIMULAM A PROTEÍNA G catecolaminérgicas, por exemplo, leva ao aumento de AMPc.
Os receptores que sinalizam por meio de proteínas G são Este medeia a mobilização de energia armazenada, a quebra de
chamados de receptores acoplados à proteína G (GPCR), carboidratos no fígado, ou de triglicerídeos em adipócitos.
receptores “sete-transmembrana” ou receptores “tipo A vasopressina, ao ativar receptores acoplados à Gs, promove a
serpentina”, pois a cadeia de polipeptídeos cruza a conservação de água pelo rim. O AMPc também regula a
membrana plasmática sete vezes. produção de esteroides suprarrenais e sexuais (em resposta à
Esses receptores atuam alterando as concentrações corticotrofina), o relaxamento de músculos lisos e o aumento da
intracelulares de segundos mensageiros como força de contração no músculo cardíaco.
3ʹ,5ʹmonofosfato de adenosina cíclico (AMPc), íon cálcio, e O AMPc exerce a maioria de seus efeitos por estimulação de
fosfoinositídeos (como o inositol trifosfato). proteínas-cinase dependentes de AMPc. Essas cinases são
No estado de “repouso” a proteína G permanece como um compostas de uma porção reguladora (R) que liga AMPc e duas
trímero αβγ que pode, ou não, estar acoplado ao receptor, cadeias catalíticas (C).
com o GDP ocupando o local na subunidade α. Quando o AMPc se liga a R, as cadeias catalíticas são liberadas
Quando o GPCR é ativado por um agonista, o domínio para se difundir no citoplasma e no núcleo, onde transferem
citoplasmático do receptor é modificado gerando interação fosfato do ATP para substrato específicos, frequentemente
entre αβγ e o receptor. Essa interação dissocia o GDP enzimas.
ligado, que é substituído por GTP. Quando o estímulo no receptor cessa, as ações intracelulares do
Isso leva à separação das subunidades α-GTP e βγ, as AMPc são finalizadas por fosfatases que o degradam (figura 12A).
formas “ativas” da proteína G que se associam a enzimas e A proteína Gi, ao contrário da Gs, gera inibição da adenililciclase;
canais iônicos. espera-se, portanto, que toda a cascata de sinalização gerada
O sistema de sinalização transmembrana inicia-se, portanto, por essa enzima esteja inibida por ativação de receptores
com a ligação do agente na porção extracelular do receptor, acoplados a Gi (figura 13).
o qual desencadeia a ativação da proteína G. Ativada, esta Uma outra proteína G passível de estar acoplada a
atua sobre seu elemento efetor (uma enzima ou canal receptores é a proteína Gq. Alguns neurotransmissores e
iônico). Esse elemento modifica a concentração do segundo fármacos desencadeiam essa via. Seguida à estimulação do
mensageiro intracelular (veja a seguir). receptor, ocorre a estimulação da enzima fosfolipase C
(PLC). Ela cliva um fosfolipídico da membrana plasmática,
bifosfato de fosfatidilinositol-4,5 (PIP2), em dois segundos
mensageiros, diacilglicerol (DAG) e trifosfato de inositol 1,4,5 Todos os mecanismos discutidos, associados à ação das
(IP3). diferentes famílias de receptores, estão sinteticamente
O diacilglicerol ativa uma proteína-cinase sensível a ilustrados a seguir. Nota-se que os receptores que modulam
fosfolipídeos e cálcio, a proteína-cinase C. IP3 vai ao canais iônicos também podem ser denominados ionotrópicos,
citoplasma e estimula a liberação de Ca2+ pelos canais de e os GPCRs, metabotrópicos. Ainda nesse contexto, pelas
cálcio presentes nas estruturas de armazenamento (retículo diferenças nas etapas da sinalização intracelular, o tempo de
sarcoendoplasmático, por exemplo). O aumento de Ca2+ resposta esperado modifica imensamente, desde
favorece a ligação dele à proteína calmodulina, que regula a milissegundos a horas após a ativação do receptor, como
atividade de outras enzimas, inclusive proteínas-cinase mostrado a seguir.
dependentes de cálcio (veja a seguir em B).

Figura 12 – Via do segundo mensageiro AMPc (A); via de


sinalização do segundo mensageiro Ca2+-fosfoinositídeo (B).
Observe, em A, o receptor acoplado a Gs (Rec), ao ser
ativado, ativa a adenililciclase (AC), que produz AMPc. Este ativa
cinases dependentes de AMPc, que possuem subunidades
reguladoras (R) e catalíticas (C). C promove fosforilação do
substrato de proteína (S) das cinases e das fosfatases (P’ase),
Figura 14 – Resumo das principais famílias de receptores,
que geram a resposta na célula. As fosfodiesterases (PDE)
alvos de ação de fármacos.
hidrolisam AMPc, reduzindo sua concentração e interrompendo
Observe que os receptores ionotrópicos exibem um menor
o efeito.
tempo de resposta após o estímulo do receptor, pois de sua
Já em B, o receptor é acoplado a Gq (R), que, uma vez ação derivam principalmente a abertura de canais iônicos. Os
ativado, ativa a fosfolipase C (PLC), que cliva o fosfolipídio de receptores que modulam a expressão gênica exibem o
membrana (PIP2) em diacilglicerol (DAG) e trifosfato de inositol maior tempo de resposta em função da necessidade da
(IP3). O DAG ativa a proteína cinase C (PKC), que fosforila seu expressão de genes e da produção de proteínas para que a
substrato (S). O IP3 promove a liberação de Ca2+, que, com a ação se torne evidente na célula.
calmodulina (CaM), ativam a enzima calmodulina cinase (CaM – CRITÉRIOS QUE DEFINEM A SEGURANÇA DE UM
E), gerando a resposta na célula. FÁRMACO E VARIAÇÕES INDIVIDUAIS
Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a
rolagem horizontal

Figura 13 – Modulação da enzima-alvo por Gs e Gi. As curvas dose x resposta descritas anteriormente implicam
limitações quanto à tomada de decisão clínica. Como
Observe que, na modulação da enzima-alvo (a adenililciclase,
observado, essas curvas são construídas para prever uma
por exemplo) por Gs e Gi, a heterogeneidade das proteínas G
resposta farmacológica específica em relação ao aumento
permite que os diferentes receptores exerçam efeitos opostos
de dose (ou concentração) do fármaco. Dessa forma, se a
em uma mesma enzima-alvo.
resposta farmacológica for um evento de dois tipos, fica
Outro segundo mensageiro importante que pode estar impossível contemplar na mesma curva.
envolvido na ativação de receptores acoplados à proteína Gt é Além disso, a relação dose x resposta quantitativa em um só
o GMPc (monofosfato de guanosina cíclico). paciente, mesmo precisamente definida, pode ser limitada
Os receptores acoplados à proteína Gt, quando ativados, em aplicação a outros pacientes, devido à variabilidade entre
estimulam a guanililciclase ligada à membrana a produzir GMPc. indivíduos quanto à gravidade de doenças e resposta a
Este atua estimulando proteínas-cinase dependentes de GMPc. fármacos.
Uma ação muito evidente da concentração aumentada do Em geral, a dose a ser utilizada de um fármaco é definida
GMPc é a desempenhada no relaxamento do músculo liso pela magnitude de efeito em um número grande de
vascular, por meio de um mecanismo mediado por cinases, pacientes individuais, ou em animais experimentais pela
resultando em desfosforilação das cadeias leves de miosina. construção de um gráfico de percentual de resposta
(quantos por cento respondem) versus o log da dose. A Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a
resposta (ou efeito) utilizada para construir o gráfico é rolagem horizontal
escolhida pela relevância clínica (por exemplo, alívio da dor, Em seres humanos, a precisão do índice terapêutico não é
redução da pressão arterial), ou pode ser um evento possível, pois seria necessária a evolução da dose
específico (morte do animal experimental). administrada até que se alcançasse a letalidade em indivíduos
Na curva de dose x efeito baseada no percentual dos que humanos. Em vez disso, ensaios farmacológicos e experiência
exibem a resposta é possível observarmos a dose efetiva clínica revelam uma variação das doses efetivas e das doses
mediana (ED50), que é a dose na qual 50% dos indivíduos tóxicas. A variação entre a dose tóxica mínima e a dose
exibem o efeito. Em estudos experimentais em animais, é terapêutica mínima, evidenciada na verdade pela
possível prever a dose necessária para que 50% da amostra concentração plasmática alcançada uma vez administradas as
apresentem um efeito tóxico em particular (TD50) ou até doses, é chamada de janela terapêutica e tem valor prático
mesmo a dose necessária para gerar letalidade em 50% da maior na escolha da dose para um paciente.
amostra (LD50) (figura 15). A janela terapêutica informa a concentração do fármaco
Atenção necessária para gerar o efeito com o mínimo de
É possível utilizar o conceito e a potência já trabalhados manifestações tóxicas (como mostrado a seguir). Na prática,
anteriormente também para a análise dessas curvas. Assim, administra-se a dose de um fármaco capaz de gerar
entre dois fármacos A e B, que apresentem ED50 de 5 mg concentração plasmática eficaz, mesmo que venha agregada
e 500 mg, por exemplo, o mais potente será o A, que com de efeitos adversos, desde que o risco-benefício compense.
uma dose 100 vezes menor (5mg) gera efeito em 50% dos Exemplo
indivíduos, algo que o B só consegue em uma dose 100 O risco de toxicidade aceitável depende da gravidade da
vezes maior (500mg). doença tratada. Doses de um fármaco que fornecem alívio
As medidas descritas são importantes para o cálculo dos para uma dor de cabeça comum na maioria dos pacientes
parâmetros de segurança dos fármacos. O índice precisam ser muito mais baixas do que as doses que
terapêutico é um desses parâmetros, pois correlaciona a produzem toxicidade séria. Para tratamento de uma doença
dose de um fármaco necessária à produção de um efeito letal como o linfoma de Hodgkin, a diferença aceitável entre
desejado com aquela que produz um efeito indesejado. Em as doses terapêuticas e as tóxicas pode ser menor, uma vez
estudos com animais, o índice terapêutico é definido como a que o benefício nessa situação compensa o risco.
razão da LD50 e a ED50 (como mostrado a seguir).

Figura 16 – A curva ilustra a janela terapêutica de um


fármaco, apontando sua concentração plasmática terapêutica
e a concentração plasmática mínima necessária para gerar
efeitos adversos na população.

Figura 15 – Curvas de frequência de distribuição e curvas de


concentração x efeito e dose x efeito.
Observe em A que a curva ilustra um experimento realizado
com humanos cuja concentração plasmática efetiva foi
determinada individualmente. O número de sujeitos que Os seres humanos variam bastante sua resposta a um
respondeu em cada dose foi plotado na curva roxa, dando a fármaco. Inclusive, o mesmo indivíduo pode responder de
frequência de distribuição. Somados, produzem a curva modo diferente ao mesmo fármaco em ocasiões distintas
vermelha. Observa-se que a concentração plasmática durante o curso do tratamento. As respostas incomuns
necessária para gerar efeito em 50% dos indivíduos é de 10 ou idiossincrásicas podem ser causadas por diferenças
mg/L. genéticas no metabolismo do fármaco, ou por mecanismos
imunológicos, inclusive, reações alérgicas. Um paciente com
Já em B, a curva dose x resposta ilustra um experimento feito
essas características individuais pode ser hiporreativo ou
em animais em que foram injetadas variadas doses do fármaco,
hiper-reativo a um fármaco que, na maioria dos indivíduos,
e o percentual de animais que obteve as respostas (hipnose e
manifesta resposta comum.
morte) nas respectivas doses administradas foi plotado.
Considerando-se a hipnose como o efeito terapêutico, o índice
terapêutico pode ser evidenciado com a razão entre a LD50 e
a ED50.
nervos que estava intimamente ligada às regiões centrais, o
sistema nervoso periférico.
Foi também nesse período que os cientistas demonstraram
que os músculos poderiam ser movimentados após a
estimulação dos nervos através de correntes elétricas e que
o próprio encéfalo também produzia sinais elétricos enviados
para a periferia. Essas descobertas esclareceram que os
nervos eram como fios que conduzem sinais elétricos para o
Outra situação observada é a capacidade de um indivíduo encéfalo, e vice-versa.
reduzir a intensidade da resposta a uma dada dose do Seguindo as investigações, os cientistas visualizaram que
fármaco durante o curso da terapia. Essa redução de estimulações do sistema nervoso regulava diretamente o
resposta ocorre por administração continuada do fármaco, funcionamento de outros órgãos, como o coração, os
produzindo um estado de tolerância aos efeitos, que, se pulmões, intestinos, rins.
manifestada muito rapidamente após a administração do Eles perceberam que essa interação entre o sistema
fármaco, é denominada taquifilaxia. nervoso central e esses reflexos apresentados no sistema
Saiba mais nervoso periférico ocorria de forma autônoma, ou seja, sem
Ao administrar a primeira dose de um fármaco, é preciso o controle direto das vontades apresentadas pelo indivíduo,
considerar fatores que aumentem a propensão de um sendo chamado de sistema nervoso autônomo.
indivíduo apresentar tolerância ou taquifilaxia. Além disso, é Também foi reconhecido que os estímulos elétricos
preciso ponderar fatores que influenciem na responsividade, incidentes nas células musculares esqueléticas promoviam
como idade, sexo, tamanho corporal, estado mórbido, fatores ações contráteis e mediavam respostas motoras, sendo os
genéticos e administração simultânea de outros fármacos. estímulos independentes das vias autonômicas e de controle
Assista ao vídeo para saber mais sobre a descrição das vias através da consciência do indivíduo. Assim, denominaram-
de sinalização das principais famílias de receptores no sistema nervoso motor somático, ou somente sistema
farmacológicos. nervoso somático.
Tema 4
Farmacologia do Sistema Nervoso Autônomo e Motor
Somático
DEFINIÇÃO
Conceito de sistema nervoso autônomo e motor somático.
Farmacologia do sistema nervoso simpático, parassimpático
e somático. Conhecimento da farmacocinética,
farmacodinâmica, usos clínicos e efeitos adversos de cada
grupo farmacológico.
PROPÓSITO Atualmente, há uma série de fármacos com funções
Compreender as diferenças entre sistema nervoso moduladoras das repostas associadas ao sistema nervoso
autônomo e sistema nervoso motor somático, bem como as autônomo e motor somático. A regulação farmacológica
características farmacológicas que afetam o funcionamento e desses sistemas vem apresentando efeitos terapêuticos
as respostas mediadas por cada sistema. importantes na promoção da saúde, no controle de doenças
APRESENTAÇÃO e na realização de procedimentos médicos. Desta forma,
Sabe-se que a natureza humana busca desbravar o mundo dedicamos nossa viagem neste tema para conhecer as
particularidades do sistema nervoso autônomo e motor
através da percepção de gostos, cheiros, sons, luzes e
toques, que correspondem a estímulos que despertam no somático, a ação dos fármacos na modulação das respostas
ser humano respostas de fuga ou luta para sentimentos adrenérgicas e no controle colinérgico autonômico e motor
somático promovido por agentes farmacológicos.
aversivos ou de busca e apreço quando falamos de sentidos
Módulo 1
mais tenros.
Descrever componentes e aspectos morfofuncionais do
Nossas decisões dependem de estímulos interpretados pelo
sistema nervoso, sistema
nosso encéfalo através de sinais recebidos de partes mais
nervoso autônomo e motor somático e dos receptores
extremas de nosso corpo, que acarretam nas mais variadas
colinérgicos e adrenérgicos
respostas no organismo, como salivar ao visualizar um
INTRODUÇÃO
alimento saboroso ou se deparar com uma experiência que
O sistema nervoso de todos os mamíferos apresenta duas
cause grande medo, desencadeando a resposta de sair
divisões: o sistema nervoso central (SNC) e o sistema
correndo em fuga. Todos esses sentidos são dependentes
nervoso periférico (SNP). Neste módulo, identificaremos
de uma conversa entre diferentes regiões do sistema
fatores importantes da excitabilidade de membrana e
nervoso, que promovem importantes respostas de nosso
transmissão do impulso elétrico, vias de síntese e liberação
corpo ao longo da vida.
de neurotransmissores. Conheceremos importantes
Em torno do século XVII , o sistema nervoso estava
componentes do sistema nervoso periférico, discutiremos as
completamente dissecado. Reconheceu-se a existência de
diferenças entre o sistema nervoso autônomo (SNA) e
uma região mais central, constituída de encéfalo e medula
sistema nervoso motor somático (SNMS).
espinhal, bem como de uma região periférica constituída por
A troca de informações entre o SNP e o SNC é regulada de As bicamadas lipídicas são altamente impermeáveis para a
acordo com as informações captadas e coletadas em maioria das moléculas polares. Para transportar pequenas
diferentes regiões do corpo. Dividimos os axônios do SNP de moléculas hidrossolúveis para o interior ou o exterior celular
acordo com o envio das informações até ou a partir de um ou para compartimentos intracelulares envoltos por
ponto do corpo: membrana, as membranas contam com várias proteínas de
transporte, cada qual responsável pela transferência de um
soluto ou uma classe de solutos em particular através da
membrana.
Existem duas classes de proteínas de transporte através da
membrana:
Clique para visualizar as informações.
Carreadoras As proteínas carreadoras ligam solutos (íons)
específicos e os transferem através da bicamada lipídica,
alterando sua conformação e promovendo a permeabilidade
aos íons através da membrana. Algumas proteínas
carreadoras transportam um único soluto a favor do seu
gradiente eletroquímico, enquanto outras atuam como
bombas, carreando os íons contra o gradiente eletroquímico
e utilizando energia pela hidrólise de ATP na promoção do
transporte, como, por exemplo, a bomba de sódio/potássio
Axônios aferentes (do latim “que leva”) ou Na+/K+ ATPase.
Os axônios do SNA ou SNMS que levam as informações
para o SNC são classificados como aferentes.

Axônios eferentes (do latim “que traz”)


Os axônios que trazem a informação do SNC para músculos
e glândulas são denominados eferentes.
A transmissão das informações se dá através de impulsos
elétricos enviados através dos axônios e determinados por
mudanças nos potenciais da membrana plasmática. Proteína carreadora
EXCITABILIDADE DE MEMBRANA E TRANSMISSÃO DO Canais A maioria das proteínas de canal na membrana
IMPULSO ELÉTRICO plasmática de células animais e vegetais, que conectam o
Neurônios e células musculares esqueléticas têm citosol ao exterior celular, possui poros estreitos fortemente
características excitáveis, ou seja, respondem a estímulos seletivos que podem abrir e fechar. Uma vez que essas
elétricos recebidos através de comunicações celulares proteínas estão envolvidas de modo específicos com
chamadas de sinapses. Por gerarem diferença na transporte de íons orgânicos, são chamadas de canais
concentração iônica através da bicamada lipídica, as iônicos. Para a eficiência desse transporte, esses canais
membranas celulares podem armazenar energia na forma possuem uma vantagem sobre as proteínas carreadoras,
de gradiente eletroquímico, os quais são importantes para pois a permeabilidade de íons através dos canais é muito
gerar impulsos elétricos voltados para a comunicação celular. superior em relação aos carreadores, alterando rapidamente
o potencial de membrana celular.

Anatomia
Proteína de canal
de um neurônio
Ambas formam caminhos proteicos contínuos na bicamada
lipídica, comunicando o meio extracelular com o citosol.
Enquanto o transporte por proteínas carreadoras pode ser
passivo ou ativo, o transporte por canais é sempre passivo.
O potencial de membrana tem origem quando existe uma
diferença na carga elétrica nos dois lados de uma membrana
devido a uma divergência na distribuição de íons positivos e
negativos em suas duas faces. Essas diferenças podem
ocorrer por um bombeamento eletrogênico ativo e por um
transporte passivo de íons, sendo os últimos de movimentos
de maior contribuição para a manutenção do potencial
elétrico de membrana. Desenvolvimento de um potencial de ação em uma célula
A bomba de sódio/potássio auxilia na manutenção do nervosa através da ação de um canal de sódio dependente
equilíbrio osmótico através da membrana celular por baixar a de voltagem no corpo celular
concentração intracelular de sódio (Na+), enquanto a O potencial de ação é uma consequência direta das
manutenção do repouso da membrana se dá pelo propriedades dos canais iônicos controlados por voltagem.
bombeamento de potássio para dentro da célula através da Ele é desencadeado por uma despolarização da membrana
Na+/K+ ATPase e também pelos canais de vazamento de plasmática em células neuronais e musculoesqueléticas. Um
potássio (K+), que promovem a permeabilidade dos íons estímulo que gere suficiente despolarização prontamente
livremente do citosol para o meio extracelular. Essas causa a abertura de canais de Na+ controlados por voltagem,
diferenças geradas entre a permeabilidade do Na+, o permitindo a entrada de uma quantidade de Na+ a favor do
vazamento do K+ para o meio extracelular e o seu seu gradiente eletroquímico e alterando bruscamente o
bombeamento de volta ao citosol geram uma força elétrica estado de repouso da membrana para a propagação do
importante para a determinação do equilíbrio iônico e potencial de ação ao longo axônio.
geração do potencial de repouso de membrana. Na maioria das células nervosas, os canais de
A condição de equilíbrio, na qual não existe fluxo de líquido K+ dependentes de voltagem fornecem um mecanismo
de íons através da membrana plasmática, define o potencial importante no retorno do potencial de membrana para o
de repouso de membrana. repouso após a propagação de um potencial de ação,
Atenção preparando-o para o desencadeamento de um possível
Embora o gradiente de K+ tenha sempre uma influência segundo estímulo. Esses canais se abrem, de modo que o
principal nesse potencial, os gradientes de outros íons influxo de Na+ seja rapidamente superado pelo efluxo de K+,
também têm um papel importante: quanto mais permeável o qual retorna a membrana, rapidamente, para o seu estado
for a membrana a um íon, maior será a tendência de o de equilíbrio.
potencial de membrana ser próximo ao valor de equilíbrio de Nesse processo, é interessante entendermos o papel dos
tal íon. Como consequência, mudanças na permeabilidade de seguintes canais:
membrana podem acarretar mudanças em seu potencial. Canais permeáveis seletivos a K+ Apresentam um papel
Apesar dos diferentes sinais transmitidos pelas células importante para a determinação do potencial de repouso da
neuronais, a forma do sinal é sempre a mesma, consistindo membrana através da membrana plasmática na maioria das
em mudanças no potencial elétrico através da membrana células animais.
plasmática do neurônio. A comunicação acontece porque Canais iônicos controlados por voltagem São responsáveis
uma alteração elétrica em uma região celular se propaga pela geração dos potenciais de ação nas células
para outra região, podendo tornar-se mais forte ou fraca eletricamente excitáveis, como os neurônios e as células
dependendo da trajetória, amplificação e força do sinal musculoesqueléticas.
recebido. Canais controlados por transmissores convertem sinais
Os neurônios utilizam um mecanismo de sinalização ativa, químicos em sinais elétricos nas sinapses químicas. Os
que é uma das características mais marcantes da neurotransmissores excitatórios, como a acetilcolina, abrem
comunicação celular. Um estímulo elétrico que excede certa canais iônicos e despolarizam a membrana até um limiar
força de limiar desencadeia uma explosão de atividade gerador do potencial de ação.
elétrica, que é propagada rapidamente ao longo da VIAS DE SÍNTESE E LIBERAÇÃO DE
membrana plasmática axonal e é mantida por amplificação NEUROTRANSMISSORES: SISTEMAS COLINÉRGICO E
automática por todo o caminho. ADRENÉRGICO
Essa onda de excitação elétrica é chamada de potencial de Os sinais neuronais são transmitidos de célula para célula em
ação ou impulso nervoso, que pode carregar uma sítios especializados de contato conhecidos como sinapses. O
mensagem de uma extremidade a outra do neurônio em mecanismo normal de transmissão é indireto. As células são
velocidade muito alta. isoladas eletricamente, isto é, a célula pré-sináptica é
separada da célula pós-sináptica por uma fenda sináptica
estreita.
Veja as etapas evolvidas nesse processo:
Clique nas barras para ver as informações. A farmacologia de cada sistema será tratada mais adiante,
ETAPA 1 destacando o impacto dos fármacos sobre o sistema
Uma mudança de potencial elétrico na célula pré-sináptica nervoso periférico e suas divisões.
desencadeia a liberação de pequenas moléculas sinalizadoras, SISTEMA COLINÉRGICO
conhecidas como neurotransmissores, que estão No sistema colinérgico, a molécula neurotransmissora é a
armazenadas em vesículas sinápticas, envoltas por acetilcolina (Ach), que foi a primeira substância identificada
membrana e liberadas por exocitose. como neurotransmissor através de suas funções de
ETAPA 2 diminuição da frequência de batimento cardíaco nas sinapses
O neurotransmissor difunde-se rapidamente através da fenda neuromusculares entre o nervo vago e as células musculares
sináptica e provoca uma mudança elétrica na célula pós- cardíacas. Posteriormente, a Ach foi associada às funções
sináptica por ligação nos canais iônicos controlados por musculoesqueléticos nas sinapses entre o neurônio motor
transmissor. Após a liberação do neurotransmissor, ele é somático e fibra muscular esquelética e, finalmente, nas
rapidamente removido, degradado por enzimas específicas sinapses dos gânglios viscerais, atuando na regulação das vias
na fenda sináptica, ou é captado novamente pelas autonômicas.
terminações nervosas que o liberaram ou pelas células gliais
presentes na sinapse.
ETAPA 3
A recaptação é mediada por uma variedade de proteínas Estrutura química da
carreadoras de neurotransmissores dependentes de Na+, acetilcolina
desencadeando a reciclagem dos neurotransmissores e A síntese de Ach se dá através da acetilação da colina com
permitindo que os neurônios mantenham a taxa de liberação a acetil co-enzima, através de uma reação catalisada pela
dessas moléculas. enzima colina acetiltranferase. A colina está presente no
A remoção rápida dos neurotransmissores da fenda sináptica plasma em altas concentrações, sendo captada pelos
garante precisão espacial e temporal de sinalização sináptica. neurônios colinérgicos devido à atuação do transportador de
Esse mecanismo diminui as chances de um transmissor colina de alta afinidade. Após a síntese de Ach no citosol do
influenciar as células vizinhas e limpar a fenda sináptica antes terminal pré-sináptico neuronal, a Ach é transportada para o
de o próximo pulso de neurotransmissor ser liberado, de tal interior das vesículas pré-sinápticas pela ação do
forma que o tempo de repetidos eventos de sinalização transportador vesicular de acetilcolina. Uma vez na fenda
possa ser comunicado de maneira precisa entre as células. sináptica, a Ach pode sofrer a ação da enzima
Esse tipo de sinapses, envolvendo neurotransmissores, é acetilconesterase e ser hidrolisada em acetato e colina,
chamado de sinapses químicas, que são muito mais versáteis fazendo com que as concentrações da Ach sejam reguladas
e adaptáveis, pois utilizam gama de moléculas e diminuídas rapidamente.
neurotransmissoras, vias de síntese e degradação específicas Muitas ações pós-sinápticas da Ach são mediadas pelos
para cada sistema de transmissores, bem como os receptores nicotínicos de acetilcolina. Esses receptores são
receptores iônicos e não iônicos associados a cada molécula canais iônicos que promovem sinais excitatórios nas células
neurotransmissora. pós-sinápticas após a ligação de duas moléculas de Ach em
seus sítios de ligação específicos.
A íntima associação entre a ligação da Ach nos sítios
específicos promove a abertura de poros e a permeabilidade
de cátions através desses canais, permitindo a rápida
resposta excitatória característica desses receptores. Tais
receptores são encontrados no SNC, associados a ações
estimulantes relacionadas ao consumo de nicotina e
mimetizados na presença de Ach, mas também são os
receptores da junção neuromuscular responsáveis pelo
potencial excitatório na fibra muscular esquelética na indução
do movimento.
A segunda classe de receptores colinérgicos são
os receptores muscarínicos, membros da classe dos
receptores metabotrópicos e mediadores de respostas no
SNC e SNA.
Sinapse Química
Vamos tratar especificamente do sistema nervoso autônomo
simpático, parassimpático e do sistema nervoso motor
somático. Para tal, há duas grandes famílias de
neurotransmissores envolvidos. Quando tratarmos do sistema
nervoso autônomo simpático, conheceremos as vias
adrenérgicas. Ao passo que, no sistema nervoso autônomo
parassimpático e motor somático, veremos as vias
colinérgicas de neurotransmissão.
o que pode ser um alvo terapêutico de antagonistas de
receptores dopaminérgicos para indução de vômito no caso
de pacientes em overdose de drogas.
A noradrenalina e a adrenalina são catecolaminas sintetizadas
a partir da dopamina pela ação da dopamina hidroxilase e da
feniletanolamina N-metiltransferase, respectivamente. São
transportadas para as vesículas pela VMAT e removidas da
fenda sináptica pelo transportador de noradrenalina, podendo
ser metabolizada pela ação da MAO e COMT. A
noradrenalina e a adrenalina agem em receptores
metabotrópicos alfa e beta adrenérgicos, sendo muito
importantes na promoção de funções de diversos órgãos
Estrutura química das associados às respostas simpáticas no sistema nervoso
catecolaminas periférico.
SISTEMA ADRENÉRGICO – CATECOLAMINAS SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO
Membro da família das aminas biogênicas, os Todas as partes do sistema nervoso, com exceção do
neurotransmissores adrenérgicos desempenham muitas encéfalo e da medula espinhal, fazem parte do sistema
funções no SNC, mas também realizam importantes ações nervoso periférico (SNP). O SNP pode ser dividido em duas
no SNP. As aminas biogênicas que compõem o sistema grandes partes: sistema nervoso autônomo (SNA) e o
adrenérgico são as catecolaminas (dopamina, noradrenalina e sistema nervoso motor somático (SNMS).
adrenalina). Todas as catecolaminas são sintetizadas a partir Sistema nervoso autônomo
de um aminoácido precursor: tirosina. O primeiro passo na O SNA é composto por uma grande rede de conexão
síntese das catecolaminas é catalisado pela enzima tirosina neuronal distribuída ao longo de nosso organismo. Também
hidroxilase, que sintetizará, a partir da tirosina, a é conhecido como sistema nervoso involuntário, visceral ou
dihidroxifenilalanina (DOPA), molécula precursora da dopamina. vegetativo, uma vez que as funções viscerais são
A dopamina é produzida a partir da ação da descarboxilase normalmente executadas de forma automática, sem controle
sobre a DOPA e conversão na molécula de dopamina. Uma voluntário.
vez sintetizada, a dopamina é transportada para o interior das Para facilitar o entendimento, veja um exemplo.
vesículas pré-sinápticas pela ação do transportador vesicular Clique no botão para ver as informações.
de monoaminas (VMAT). Já na fenda sináptica, a dopamina Como funciona o sistema nervoso autônomo?
pode ser captada novamente para o interior do neurônio Atenção
pré-sináptico pelo transportador de dopamina, sofrendo Apesar de agirem de forma autônoma, o SNA recebe
novamente a ação do VMAT, ou ser catabolizada pelas comandos diretamente do SNC, e suas funções são
enzimas monoamino oxidase (MAO) e catecol O- orquestradas de acordo com as trocas de informações entre
metiltranferase (COMT). esses sistemas. Os neurônios que compõem o SNA
possuem uma via diferente por serem bissinápticos, ou seja,
realizam duas sinapses para enviar seus comandos até os
tecidos ou órgãos-alvo.
Alguns corpos celulares dos neurônios autônomos localizam-
se fora do SNC, em grupamentos celulares chamados
de gânglios. Nesses gânglios, encontramos corpos celulares
de neurônios chamados pós-ganglionares. Neurônios pós-
ganglionares são controlados por neurônios pré-ganglionares,
cujos corpos celulares situam-se no SNC, mais precisamente
na medula espinhal ou no tronco encefálico, dependendo da
divisão em simpático ou parassimpático.
As divisões simpática e parassimpática operam em paralelo,
mas utilizam vias distintas, com diferentes estruturas e
sistemas de neurotransmissores. Os axônios pré-ganglionares
do ramo simpático emergem somente da região torácica e
lombar da medula espinhal. Os axônios do ramo
parassimpático, por sua vez, emergem do tronco encefálico
Dopamina e da porção sacral da medula espinhal. Desta forma, os dois
A dopamina age exclusivamente através de receptores sistemas se complementam anatomicamente. A figura a
metabotrópicos, ativando ou inibindo a adenilato ciclase. A seguir demonstra a organização anatômica das divisões
ativação desses receptores geralmente contribui para simpáticas e parassimpáticas.
comportamentos complexos como hiperatividade e
comportamentos estereotipados. Também age na medula,
inibindo regiões responsáveis por zonas de gatilho do vômito,
Em uma situação como a apresentada no exemplo do aluno
que vimos anteriormente, as duas divisões respondem de
formas distintas:
Divisão simpática
Mobiliza frequentemente o organismo em situações de
emergência a curto prazo, mesmo que essas alterações
possam acarretar problemas a longo prazo.
Divisão parassimpática
Age de forma oposta ao mediado pela simpática. O SNA
parassimpático aumenta respostas digestórias, crescimento,
resposta imunitária e estocagem de energia
(reestabelecendo as alterações mediadas pelo estresse
causado pelo convite do professor). Essa divisão trabalha
calmamente, promovendo o bem-estar fisiológico a longo
prazo.
As duas divisões não conseguem ser mobilizadas
concomitantemente, pois normalmente têm efeitos opostos.
O SNA simpático e parassimpático inervam basicamente três
tipos de tecidos corpóreos: músculo liso, músculo estriado
cardíaco e glândulas. O balanço entre as divisões simpáticas e
parassimpáticas controla função de diversos órgãos, como
demonstrado na imagem.
Veja alguns exemplos da dualidade da ação desses sistemas:
Região do marca-passo cardíaco
Organização anatômica das divisões simpáticas e Divisão simpática
parassimpáticas do SNA Aumenta a frequência e força de batimento cardíaco.
Diferenças nas aferências pré-ganglionares de ambas divisões Divisão parassimpática
e a utilização de acetilcolina como neurotransmissor. A Reduz a frequência cardíaca.
inervação pós-ganglionar parassimpática de órgãos viscerais Músculos lisos do sistema gastrintestinal
também utiliza a acetilcolina, mas a inervação pós-ganglionar Divisão simpática
simpática usa a noradrenalina. A glândula adrenal recebe Causaria o relaxamento da musculatura e redução da
inervação pré-ganglionar simpática e, quando ativada, secreta motilidade intestinal.
adrenalina e noradrenalina na corrente sanguínea. Observe o Divisão parassimpática
padrão de inervação da divisão simpática: os órgãos-alvo na Estimularia a musculatura e motilidade intestinal.
cavidade torácica são conectados por neurônios pós- Sistema reprodutor masculino
ganglionares originários da cadeia simpática e os órgãos-alvo Divisão simpática
da cavidade abdominal são contactados por neurônios pós- Responsável pelas respostas ejaculatórias.
ganglionares originários dos gânglios colaterais (BEAR, 2008, Divisão parassimpática
p. 493). Responsável pela ereção peniana.
Os neurônios pré-ganglionares simpáticos enviam seus O balanço entre as divisões é um processo de difícil
axônios através das raízes ventrais para realizarem sinapses orquestração pelo SNA. Ansiedades e preocupações têm
com neurônios ganglionares da cadeia simpática, localizada grande participação das vias simpáticas, tendendo inibir a
próxima à coluna vertebral ou em gânglios dentro da ereção e induzir a ejaculação precoce, sendo muito comuns
cavidade abdominal. Os neurônios pré-ganglionares da divisão em homens estressados ou com distúrbios de
parassimpática encontram-se em núcleos do tronco comportamento sexual.
encefálico, e seus axônios passam por nervos cranianos. Na Podemos perceber que as ações do SNA ocorrem
porção sacral da medula espinhal, encontramos outros tipicamente em múltiplos órgãos e são bem distribuídas pelo
núcleos de neurônios parassimpáticos. Os axônios pré- organismo e relativamente lentas. De modo distinto, o
ganglionares parassimpáticos possuem axônios longos, em sistema nervoso motor somático, cujos neurônios motores
comparação aos simpáticos, uma vez que os gânglios alfa podem rapidamente ativar músculos esqueléticos com
encontram-se próximos aos órgãos-alvo, como demonstrado alta precisão espacial, promove contração muscular e efeitos
na imagem. motores.
Atenção Sistema nervoso motor somático (SNMS)
Normalmente, o SNA simpático e parassimpático apresenta O sistema motor somático consiste na comunicação entre
influências fisiológicas opostas umas das outras. Enquanto a os músculos e os neurônios que os comandam. Os músculos
divisão simpática apresenta-se mais ativa em situações de corporais podem ser divididos em três tipos:
estresse reais ou imaginários (como ser chamado pelo Clique nas barras para ver as informações.
professor para ir à frente da turma enquanto checava as LISOS
redes sociais), sua resposta é sempre semelhante à reação
de luta ou de fuga.
Revestem o tubo digestivo e as artérias, onde vimos em receptores nicotínicos de placa motora e nicotínicos
anteriormente que podem regular o peristaltismo e a ganglionares.
pressão arterial. É inervado e influenciado pela ação do SNA. Clique nas palavras em destaque.
ESTRIADO CARDÍACO Receptores colinérgicos
É o músculo do coração com contração rítmica, mesmo Muscarínicos Nicotínicos
sem inervações, pela presença do sistema de marca-passo.
M1 M2 M3 Receptoresnicotínicos de Nicotínicosganglionares
É inervado e influenciado pela ação do SNA.
placamotora
MÚSCULO ESTRIADO ESQUELÉTICO
Corresponde à maior parte do tecido muscular corpóreo. Os receptores colinérgicos medeiam importantes efeitos que
Esses músculos promovem movimentação esquelética, podem ser modulados pela ação de agentes farmacológicos.
ocular, controla a respiração e as expressões faciais. Dentro AGONISTAS DE RECEPTORES MUSCARÍNICOS
de cada músculo esquelético, há centenas de fibras Agonistas de receptores muscarínicos colinérgicos podem
musculares – as células do músculo esquelético –, e cada ser divididos em dois grupos:
fibra é inervada por uma ramificação proveniente do SNC. Clique nas barras para ver as informações.
Essas células são provenientes do corno ventral da medula ÉSTERES DE COLINA, ACH E VÁRIOS ÉSTERES
espinhal e denominadas neurônios motores inferiores. A SINTÉTICOS
parte dos músculos e as fibras nervosas que os controlam De várias centenas de derivados sintéticos de colina
formam o sistema motor somático, regulando o controle investigados, apenas a metacolina, carbacol e betanecol
voluntário responsável por gerar o comportamento. Os tiveram aplicações clínicas. Metacolina é um éster de colina
axônios dos neurônios motores inferiores se agrupam e sintético que difere de Ach principalmente em sua maior
formam as raízes ventrais, as quais juntam-se com as raízes duração e seletividade de ação. Sua seletividade se reflete
dorsais e formam os nervos espinhais. Importantes para a em predominância de respostas muscarínicas, com maior
promoção da força de contração muscular, os neurônios manifestação no sistema cardiovascular, sobre pequenas
motores alfa e as fibras musculares formam a unidade ações nicotínicas.
motora, responsável pelas respostas individuais dos
grupamentos musculares. Carbacol e seu análogo betanecol são quase completamente
É extremamente importante haver regulação da intensidade resistentes à hidrólise por colinesterases. Suas meia-vidas são
de força utilizada na contração muscular. Imagine-se suficientemente longas para que se sejam distribuídas para
quebrando um ovo: caso você exerça grande força, áreas de baixo fluxo sanguíneo. O carbacol tem atividade
quebrará a casca do ovo de forma bruta e espalhará gema nicotínica particularmente em gânglios autônomos. Betanecol
e clara por todos os lados, além de desperdiçar energia tem principalmente ações muscarínicas, com efeitos
metabólica na realização de uma atividade simples. Se for proeminentes sobre a motilidade do TGI e bexiga urinária.
uma força muito pequena, a casca de ovo se tornará muito ALCALOIDES COLINOMIMÉTICOS DE OCORRÊNCIA
rígida para um estímulo abaixo do necessário, e a casca não NATURAL E SEUS CONGÊNERES SINTÉTICOS
se quebrará. Os principais agonistas alcaloides naturais (particularmente
Na grande maioria das atividades diárias, utilizamos pilocarpina, muscarina e arecolina), muscarina, pilocarina e
contrações musculares fracas. Reservamos grandes forças arecolina, têm os mesmos sítios de ação que os ésteres da
de contração para atividades pontuais, como corridas, colina. A muscarina atua em receptores muscarínicos, e a
levantamento de peso ou outros estímulos muito intensos. classificação desses receptores deriva das ações deste
O controle das atividades musculares deve-se a disparos alcaloide.
oriundos do SNC destinados ao SNP para controle de
eventos de contração muscular. Os neurônios motores A pilocarina tem uma ação muscarínica sobre as glândulas
comunicam-se com as fibras musculares através da liberação sudoríparas. Arecolina também age em receptores
do neurotransmissor acetilcolina na junção neuromuscular, nicotínicos. Embora esses alcaloides de ocorrência natural
sinapse entre o neurônio motor e a fibra muscular, causando sejam de grande valor, o uso clínico presente é restrito em
como respostas a contração muscular esquelética. grande parte ao emprego da pilocarpina como agente
Módulo 2 miótico (que faz a contração da pupila).

Reconhecer os fármacos anticolinesterásicos, antagonistas


muscarínicos naturais
e sintéticos e bloqueadores neuromusculares, seus efeitos
farmacológicos
e sua utilização terapêutica
INTRODUÇÃO
As drogas ativadoras e inibidoras dos receptores colinérgicos
são aquelas que atuam no SNA parassimpático. Existem dois Usos terapêuticos
tipos de receptores colinérgicos (receptores de acetilcolina), Agonistas muscarínicos são atualmente usados no
os muscarínicos e os nicotínicos. Dentro desses dois tipos, há tratamento de distúrbios da bexiga urinária, xerostomia e no
os subtipos, sendo que, nas ações no SNA, os muscarínicos diagnóstico de hiperatividade brônquica. Também são
se subdividem em M1, M2 e M3, e os nicotínicos dividem-se
utilizados na oftalmologia como agentes mióticos e para o FÁRMACOS ANTAGONISTAS DO RECEPTOR
tratamento de glaucoma. MUSCARÍNICO
Os antagonistas do receptor muscarínico incluem:
Há um crescente interesse no papel dos receptores 1. Os alcaloides naturais, atropina e escopolamina;
muscarínicos na cognição. A utilidade potencial dos 2. Derivados semissintéticos desses alcaloides;
receptores M1 no tratamento do prejuízo cognitivo associado 3. Derivados sintéticos, alguns dos quais mostram
à doença de Alzheimer tem sido considerada há muito seleção para subtipos de receptores muscarínicos.
tempo. Outros subtipos receptores, incluindo M2 e M5, Antagonistas muscarínicos impedem os efeitos da Ach,
também parecem estar envolvidos na regulação da função bloqueando sua ligação a receptores muscarínicos em
cognitiva, pelo menos em modelos animais. células eficazes em junções neuroefetoras parassimpáticas
Fármacos agonistas do receptor muscarínico (e simpáticas) e em gânglios periféricos no SNC.
Embora raramente administrada sistemicamente, a Ach é Em geral, antagonistas muscarínicos causam pouco bloqueio
usada topicamente para a indução de miose (contração da de receptores nicotínicos. No entanto, os antagonistas
pupila) durante a cirurgia oftalmológica; é incutida no olho quaternários de amônio geralmente exibem maior grau de
como uma solução oftálmica de 1%. atividade de bloqueio nicotínico e são mais propensos a
interferir com a transmissão ganglionar ou neuromuscular.
A maioria dos antagonistas muscarínicos clinicamente
disponíveis são não seletivos, e suas ações diferem pouco
das da atropina, o protótipo do grupo. Nenhum antagonista
seletivo é completamente seletivo (ou seja, pode ser usado
para definir um subtipo de receptor único em relação a
todos os outros subtipos receptores). De fato, a eficácia
clínica de alguns agentes pode surgir de um equilíbrio de
ações antagônicas em dois ou mais subtipos receptores.

Miose
Veja como os fármacos agonistas do receptor muscarínico
reagem no organismo:
Clique para visualizar as informações.
Metacolina É administrada por inalação para o diagnóstico de
hiperatividade das vias aéreas brônquicas em pacientes que Estrutura química
não têm asma clinicamente aparente. Enquanto agonistas da Atropina
muscarínicos podem causar broncoconstrição e aumento de Efeitos farmacológicos de antagonistas muscarínicos
secreções traqueobrônquicas em todos os indivíduos, Os efeitos de outros antagonistas muscarínicos serão
pacientes asmáticos respondem com intensa restrição mencionados somente quando diferirem significantemente da
brônquica e redução da capacidade vital. atropina. Os principais efeitos farmacológicos do aumento das
Betanecol Inicialmente, afeta os tratos urinário e doses de atropina oferecem um guia geral para os
gastrointestinais. No trato urinário, o betanecol tem utilidade problemas associados à administração desta classe de
no tratamento da retenção urinária e esvaziamento agentes.
inadequado da bexiga, quando a obstrução orgânica está
ausente, como na retenção urinária pós-operatória,
neuropatia autônoma diabética e em certos casos de bexiga
hipotônica crônica, miogênica ou neurogênica; assim, o
cateterismo pode ser evitado. No TGI, o betanecol estimula a
peristalse (movimentos naturais do intestino) e aumenta a
motilidade e o repouso no esôfago inferior.
Carbachol É usado topicamente na Oftalmologia para o
tratamento de glaucoma e a indução de miose durante a
cirurgia; é incutido no olho através de colírios.
Cloridrato de pilocarpina É usado para o tratamento da
xerostomia, que segue procedimentos de radiação da
cabeça e pescoço, ou que está associada à síndrome de Coração humano
Sjögren, uma doença autoimune que ocorre principalmente O principal efeito da atropina no coração é alterar a taxa de
em mulheres nas quais secreções, particularmente salivares batimento cardíaco. Embora a resposta dominante seja a
e lacrimais, são comprometidas. É também usada em taquicardia, a frequência cardíaca muitas vezes diminui
Oftalmologia para o tratamento de glaucoma e como agente transitoriamente com doses clínicas médias. A lentidão é
miótico. modesta (4-8 batidas por minuto) e, geralmente, está
ausente após rápida injeção intravenosa. Não há alterações
na pressão arterial ou no débito cardíaca. Este efeito
inesperado foi atribuído aos receptores muscarínicos pré-
sinápticos M1 em terminais nervosos pós-ganglionares
parassimpáticos no nó sinoatrial, que normalmente inibem a
liberação de Ach.
A atropina frequentemente produz arritmias cardíacas, mas
sem sintomas cardiovasculares.
Em doses clínicas, a atropina neutraliza completamente a
vasodilatação periférica e a queda acentuada da pressão
arterial causada por ésteres de colina. Em contraste, quando
administrada sozinha, seu efeito sobre os vasos sanguíneos e
a pressão arterial não é marcante. Esse resultado é Comparação
esperado porque a maioria dos leitos vasculares não tem entre miose e midríase
inervação colinérgica significativa. Em doses tóxicas e O conhecimento das ações dos agonistas dos receptores
ocasionalmente terapêuticas, a atropina pode dilatar vasos muscarínicos no estômago e intestino levou ao uso desses
sanguíneos cutâneos, especialmente aqueles na área de fármacos como agentes antiespasmódicos para distúrbios de
“blush” (rubor de atropina). Esta pode ser uma reação gastrointestinais e no tratamento da doença da úlcera
compensatória, permitindo a produção de calor para péptica. Embora a atropina possa completamente abolir os
compensar o aumento da temperatura induzida pela efeitos da Ach (e outras drogas parassimpatomiméticas) na
atropina, que pode acompanhar a inibição da sudorese. motilidade e secreção gastrointestinais, inibe
Atenção incompletamente as respostas gastrointestinais à estimulação
Embora a atropina possa causar alguma broncodilatação e vagal.
diminuição da secreção traqueobrônquica em indivíduos Atenção
normais, bloqueando o tônus parassimpático (vagal) para os A secreção salivar é particularmente sensível à inibição por
pulmões, seus efeitos sobre o sistema respiratório é mais antagonistas receptores muscarínicos, que pode abolir
significativo em pacientes com doenças respiratórias. completamente a secreção abundante de saliva. A boca fica
A atropina pode inibir a broncoconstrição causada pela seca, e pode ficar difícil engolir e falar. Em contraste, a fase
histamina, bradicinina e os eicosanoides, o que intestinal da secreção gástrica é apenas parcialmente inibida.
presumivelmente reflete na atividade parassimpático reflexo Os nervos parassimpáticos aumentam o tônus e a motilidade
(vagal) na broncoconstrição provocada por esses agentes. A e relaxam os esfíncteres, favorecendo a passagem do
capacidade de bloquear os efeitos broncoconstritivos conteúdo ao longo gastrointestinal. Tanto em indivíduos
indiretos desses mediadores forma a base para o uso de normais quanto em pacientes com doença gastrointestinal,
antagonistas de receptores muscarínicos, juntamente aos os antagonistas muscarínicos produzem efeitos inibitórios
agonistas do receptor β adrenérgico no tratamento da asma. prolongados sobre a atividade motora do estômago,
Os antagonistas muscarínicos também têm um papel duodeno, jejuno, íleo e cólon, caracterizados por uma
importante no tratamento da doença pulmonar obstrutiva redução no tônus e na amplitude e frequência de
crônica (DPOC). contrações peristálticas.
Antagonistas do receptor muscarínico bloqueiam as Os efeitos podem variar entre os medicamentos:
respostas colinérgicas do músculo esfíncter pupilar da íris e Clique para visualizar as informações.
da curvatura da lente controladora do músculo ciliar (bloco Atropina A atropina tem efeitos mínimos no SNC em doses
de reflexo de acomodação com foco resultante à visão terapêuticas, embora possa ocorrer leve estimulação dos
próxima). Assim, dilatam a pupila (midríase) e paralisam a centros medulares parassimpáticos. Com doses tóxicas de
acomodação visual (cicloplegia). A ampla dilatação pupilar atropina, a excitação central se torna mais proeminente,
resulta em fotofobia; a lente é fixa para visão distante, levando à inquietação, irritabilidade, desorientação, às
objetos próximos são borrados, e objetos podem parecer alucinações ou ao delírio. Com doses ainda maiores, a
menores do que são. A constrição normal do reflexo pupilar estimulação é seguida pela depressão, levando ao colapso
à luz ou à convergência dos olhos é abolida. Esses efeitos circulatório e à insuficiência respiratória após um período de
podem ocorrer após a administração local ou sistêmica dos paralisia e coma.
alcaloides. Escopolamina Ao contrário da atropina, a escopolamina tem
efeitos centrais proeminentes em baixas doses terapêuticas.
Especificamente, a escopolamina em doses terapêuticas
normalmente causa depressão do SNC, manifestada como
sonolência, amnésia, fadiga e sono sem sonhos, com uma
redução no sono de movimento rápido dos olhos (REM).
A atropina é, portanto, preferida à escopolamina para muitos
propósitos. A base dessa diferença é provavelmente a maior
permeação de escopolamina através da barreira
hematoencefálica.
Ipratrópio e Tiotrópio
Os compostos quaternários de amônio ipratrópio e tiotrópio e, portanto, são potencialmente capazes de produzir efeitos
são usados exclusivamente para seus efeitos no trato equivalentes à estimulação excessiva de receptores
respiratório. Quando inalados, sua ação é voltada para a boca colinérgicos em todo o sistema nervoso central e periférico.
e as vias aéreas. Boca seca é o único efeito colateral Em geral, os compostos que contêm um grupo quaternário
frequentemente relatado. de amônio não penetram facilmente nas membranas
Acredita-se que o grau de broncodilatação alcançado por celulares; portanto, os agentes anti-ChE desta categoria são
esses agentes reflita o nível de tônus parassimpático basal, mal absorvidos pelo TGI ou através da pele e são excluídos
complementado pela ativação reflexa das vias colinérgicas do SNC pela barreira hematoencefálica. Por outro lado, tais
provocadas por diversos estímulos. Uma propriedade fármacos atuam preferencialmente nas junções
terapeuticamente importante de ipratrópio e tiotrópio é seu neuromusculares do músculo esquelético, exercendo sua
efeito inibitório mínimo na liberação mucociliária em relação ação tanto como agentes anti-ChE como agonistas diretos.
à atropina. Assim, a escolha desses agentes para uso em Os locais de ação dos agentes anti-ChE de importância
pacientes com doença das vias aéreas minimiza o aumento terapêutica são:
da acumulação de secreções mais baixas das vias aéreas
encontradas com atropina.

Olhos

Intestino
Usos terapêuticos de antagonistas de receptores
muscarínicos
Antagonistas do receptor muscarínico têm sido usados no
tratamento de grande variedade de condições clínicas,
predominantemente para inibir efeitos de atividade
parassimpático no trato respiratório, trato urinário, trato
gastrointestinal, olho e coração. A maior limitação no uso de
drogas não seletivas é muitas vezes a não obtenção de
respostas terapêuticas desejadas sem efeitos colaterais Junção neuromuscular do músculo esquelético
concomitantes. Quando aplicados localmente à conjuntiva, os agentes anti-
ChE causam hiperemia conjuntiva e constrição do músculo
Embora estes últimos não sejam graves, podem ser esfíncter pupilar ao redor da margem pupilar da íris (miose)
suficientemente perturbadores para diminuir a adesão dos e do músculo ciliar. Miose é aparente em poucos minutos e
pacientes, particularmente durante a administração de longo pode durar várias horas por dia. A pressão intraocular,
prazo. Esses agentes são frequentemente usados com quando elevada, usualmente cai como resultado da facilitação
agonistas de receptores adrenérgicos inalados, embora haja da saída do humor aquoso.
pouca evidência de verdadeiro sinergismo. Em humanos, a neostigmina aumenta as contrações
ANTICOLINÉRGICOS gástricas e a secreção do ácido gástrico. Após a vagotomia
A função da acetilcolinesterase (AChE) no terminal sináptico bilateral, os efeitos da neostigmina na motilidade gástrica são
colinérgico (Ach) nas junções das várias terminações muito reduzidos. A porção inferior do esôfago é estimulada
nervosas colinérgicas com seus órgãos-alvo ou sítios pós- pela neostigmina.
sinápticos foi descrita quando abordamos o sistema nervoso
periférico.
Drogas que inibem AChE são chamadas de
agentes anticolinesterásicos. Eles fazem com que a Ach se
acumule nas proximidades dos terminais do nervo colinérgico
Receptores nicotínicos de acetilcolina
Estrutura A ligação de Ach no receptor nicotínico de Ach inicia sinais
química de Neostigmina despolarizantes, que se direcionam ao potencial da placa
A maioria dos efeitos de potentes drogas anti-ChE no motora (EPM) na muscular esquelética ou um potencial
músculo esquelético pode ser explicada adequadamente com excitatório pós-sináptico (EPSP) nos gânglios periféricos.
base em sua inibição de AChE em junções neuromusculares. Trata-se dos locais clássicos da ação dos curares e da
No entanto, há boa evidência para uma ação direta da nicotina e definiram o conceito de receptor nicotínico de
neostigmina e outros agentes quaternários no Ach há mais de um século e fizeram deste o receptor
musculoesquelético. farmacológico prototípico dos efeitos da Ach nesses locais.
Toxicologia Aproveitando-se de estruturas especializadas que evoluíram
Os aspectos toxicológicos dos agentes anti-ChE são de para mediar a neurotransmissão colinérgica e de toxinas
grande importância na prática médica. Além dos casos de naturais que bloqueiam a atividade motora, receptores
intoxicação acidental do uso de compostos nicotínicos periféricos e, em seguida, centrais foram isolados,
organofosforados, como inseticidas agrícolas, esses agentes caracterizados, e representam marcos no desenvolvimento
têm sido usados com frequência para fins homicidas e da farmacologia molecular.
suicidas. Organofosfatos representam até 80% das Agentes de bloqueio neuromuscular
internações relacionadas a pesticidas. O bloqueador neuromuscular clássico, o curare, foi a
Organização Mundial da Saúde classifica a toxicidade dos ferramenta que Claude Bernard usou em meados do século
pesticidas como um problema global generalizado associado XIX para demonstrar um local de ação medicamentosa na
a mais de 200 mil mortes por ano. A exposição ocupacional junção neuromuscular. Os agentes de bloqueio
ocorre mais comumente pelas vias dérmicas e pulmonares, neuromuscular modernos geralmente caem em duas classes,
enquanto a ingestão oral é mais comum em casos de despolarizantes e competitivos/não despolarizantes.
intoxicação não ocupacional. Atualmente, apenas um único agente despolarizante,
Os efeitos da intoxicação aguda por agentes anti-ChE succinilcolina, está em uso clínico geral, enquanto múltiplos
manifestam-se por sinais e sintomas muscarínicos e agentes competitivos ou não despolarizadores estão
nicotínicos, e, com exceção de compostos de solubilidade disponíveis, mas sem grande utilização clínica.
lipídica extremamente baixa, por sinais referenciados ao CNS. Vejamos as propriedades farmacológicas desses agentes:
Os efeitos sistêmicos aparecem em poucos minutos após a Clique nas barras para ver as informações.
inalação de vapores ou aerossóis. O início dos sintomas é AGENTE DESPOLARIZANTE
adiado após a absorção percutânea. Os agentes despolarizadores, como a succinilcolina, agem por
Atenção um mecanismo diferente. Sua ação inicial é despolarizar a
A atropina efetivamente antagoniza as ações dos receptores membrana, abrindo canais iônicos da mesma forma que a
muscarínicos, incluindo aumento da secreção Ach. No entanto, eles persistem por efeitos mais duradouros
traqueobrônquica e salivar, bradicardia nas ações centrais. O na junção neuromuscular, principalmente por causa de sua
efeito da atropina no comprometimento neuromuscular resistência ao AChE. Essa despolarização inicial é seguida
periférico pode ser revertido por pralidoxima, um reativador pelo bloqueio da transmissão neuromuscular e da paralisia
de colinterase, sendo essas duas drogas as mais utilizadas no flácida; isto posto, essa sequência é influenciada por alguns
combate das intoxicações por organofosforados. fatores, como os agentes anestésicos usados
FÁRMACOS QUE AGEM NA JUNÇÃO NEUROMUSCULAR E simultaneamente aos bloqueadores musculares.
GÂNGLIOS AUTONÔMICOS
O receptor nicotínico de acetilcolina medeia a A succinilcolina em doses que produzem relaxamento
neurotransmissão pós-sináptica na junção neuromuscular e neuromuscular raramente causam efeitos atribuíveis ao
nos gânglios autônomos periféricos; no SNC, controla em bloqueio ganglionar. No entanto, os efeitos cardiovasculares,
grande parte da liberação de neurotransmissores de locais às vezes, são observados, provavelmente devido à
pré-sinápticos. estimulação sucessiva de gânglios vagais e gânglios
O receptor é chamado de receptor nicotínico de simpáticos.
acetilcolina porque tanto a nicotina quanto o AGENTES COMPETITIVOS
neurotransmissor Ach podem estimular este receptor. A tubocurarina e outros agentes de bloqueio neuromuscular
Existem subtipos distintos de receptores nicotínicos na são desprovidos de efeitos centrais após doses clínicas
junção neuromuscular e nos gânglios sinápticos, e vários comuns devido à sua incapacidade de penetrar a barreira
agentes farmacológicos discriminam entre estes subtipos de hematoencefálica.
receptores.
Agentes de bloqueio neuromuscular mostram potências
variáveis na produção de bloqueio ganglionar. Assim como
na placa motora, o bloqueio ganglionar por tubocurarina e
outras drogas estabilizadoras é invertido ou antagonizado por
agentes anti-ChE.

Nas doses de tubocurarina utilizadas clinicamente, o bloqueio


parcial provavelmente é produzido tanto em gânglios
autônomos quanto na medula adrenal, o que resulta em uma
queda na pressão arterial e taquicardia. O pancurônio mostra
menos bloqueio ganglionar em doses clínicas
comuns. Atracurium, vecurônio, doxacurium, pipecuronium, mi
vacurium e rocurônita são ainda mais seletivos. O pancurôrio
tem uma ação vagolítica, presumivelmente pelo bloqueio de Ampola de adrenalina
receptores muscarínicos, o que leva à taquicardia. SIMPATOMIMÉTICOS ENDÓGENOS
O principal uso clínico dos agentes de bloqueio Adrenalina
neuromuscular é como adjuvante na anestesia cirúrgica para A ação vascular principal da adrenalina é exercida sobre as
obter relaxamento do músculo esquelético, particularmente artérias menores e esfíncteres capilares, embora veias e
da parede abdominal, para facilitar manipulações operatórias. grandes artérias também respondam à droga. A adrenalina
Como o relaxamento muscular não depende da injetada diminui significativamente o fluxo sanguíneo cutâneo,
profundidade da anestesia geral, basta um nível muito mais a constrição de vasos pré-capilares e as vênulas pequenas.
leve de anestesia para que o procedimento seja realizado. Adrenalina é um poderoso estimulante cardíaco; atua
Assim, o risco de depressão respiratória e cardiovascular é diretamente nos receptores β1 predominantes do miocárdio
minimizado, e a recuperação pós-anestésica é reduzida. e das células do marca-passo e dos tecidos condutores.
O interesse recente se concentrou no papel dos receptores
β1 e β2 no coração humano, especialmente na insuficiência
cardíaca. A frequência cardíaca aumenta, e o ritmo muitas
vezes é alterado.
As respostas diretas à adrenalina incluem aumento da força
de contração, aumento da excitabilidade e aceleração da
taxa de batimentos cardíacos.
Os efeitos sobre o músculo liso vascular são de grande
importância fisiológica, enquanto aqueles no músculo liso do
trato gastrointestinal são relativamente menores. O músculo
liso do TGI é, em geral, relaxado pela adrenalina. Este efeito
Atenção é devido à ativação de receptores α e β. No tônus intestinal,
Esses agentes de bloqueio neuromuscular não podem ser a frequência e amplitude das contrações espontâneas são
usados para substituir a profundidade inadequada da reduzidos. O estômago geralmente é relaxado, e os
anestesia. Caso contrário, pode ocorrer um risco de esfíncteres pilóricos e ileocecal são contraídos.
respostas reflexas a estímulos dolorosos e recordação
A adrenalina tem uma poderosa ação broncodilatadora, mais
consciente do procedimento cirúrgico.
evidente quando o músculo brônquico está contraído em
O relaxamento muscular também é de valor em diversos decorrência da asma brônquica, por exemplo. Em tais
procedimentos ortopédicos, como a correção de situações, a adrenalina tem um efeito terapêutico marcante,
desalinhamentos e a realização do alinhamento das fraturas. como um antagonista fisiológico a substâncias que causam
Agentes de bloqueio neuromuscular de curta duração são broncoconstrição.
usados frequentemente para facilitar a intubação Atenção
endotraqueal e têm sido usados para facilitar a laringoscopia, Devido à incapacidade deste composto bastante polar de
broncoscopia e endoscopia em combinação com um agente entrar no CNS, a adrenalina em doses terapêuticas
anestésico geral. Pacientes sob efeito da tubocurarina convencionais não é um poderoso estimulante. Embora a
necessitam de assistência respiratória em decorrência do droga possa causar inquietação, apreensão, dor de cabeça e
relaxamento dos músculos intercostais e diafragma. tremores em muitas pessoas, esses efeitos em parte podem
Módulo 3
ser secundários aos efeitos da adrenalina no sistema
cardiovascular, musculoesquelético, ou seja, podem ser o
INTRODUÇÃO
resultado de manifestações somáticas de ansiedade.
Veremos, em nosso último módulo, que catecolaminas e
Toxicidade, efeitos adversos e contraindicações
drogas simpatomiméticas são classificadas como
A adrenalina pode causar reações perturbadoras, como
simpatomiméticos de ação direta, indireta ou de ação mista.
inquietação, dor de cabeça latejante, tremores e palpitações.
As drogas simpaticomiméticas de ação direta agem em um
Reações mais graves incluem hemorragia cerebral e arritmias
ou mais dos receptores adrenérgicos. Drogas de ação
cardíacas.
indireta aumentam a disponibilidade de noradrenalina ou
Angina pode ser induzida por adrenalina em pacientes com
adrenalina para estimular os receptores adrenérgicos.
doença arterial coronariana. O uso de adrenalina geralmente
é contraindicado em pacientes que estão recebendo
antagonistas não seletivos do receptor β, uma vez que suas
ações não colocadas em receptor vascular α1 podem levar à A dopamina é o precursor metabólico imediato da
hipertensão grave e hemorragia cerebral. noradrenalina e da adrenalina; é um neurotransmissor central
particularmente importante na regulação do movimento e
possui importantes propriedades farmacológicas intrínsecas.
Na periferia, é sintetizada em células epiteliais do túbulo
proximal, onde exerce efeitos diuréticos e natriuréticos locais.
A dopamina é um dos substratos da MAO e COMT e,
portanto, é ineficiente quando administrada oralmente.

Usos terapêuticos
A dopamina é usada no tratamento de insuficiência cardíaca
congestiva grave, particularmente em pacientes com oligúria
de baixa ou normal resistência vascular periférica. A droga
também pode melhorar parâmetros fisiológicos no
Usos terapêuticos tratamento de choque cardiogênico e séptico. Embora a
Um grande uso é fornecer alívio rápido e emergencial de dopamina possa melhorar agudamente a função cardíaca e
reações de hipersensibilidade, incluindo anafilaxia, para drogas renal em pacientes gravemente doentes com doença
e outros alérgenos. A adrenalina também é usada para cardíaca crônica ou insuficiência renal, há relativamente
prolongar a ação dos anestésicos locais, diminuindo o fluxo pouca evidência de apoio a longo prazo no resultado clínico.
sanguíneo local. Seus efeitos cardíacos podem ser de uso na
AGONISTAS DOS RECEPTORES � ADRENÉRGICOS
restauração do ritmo cardíaco em pacientes com parada
Agonistas dos receptores β adrenérgicos têm sido utilizados
cardíaca devido a diversas origens.
em muitos cenários clínicos, mas agora desempenham um
Noradrenalina
papel importante apenas no tratamento da broncoconstrição
A noradrenalina é um grande mediador químico liberado por
em pacientes com asma (obstrução reversível das vias
neurônios pós-sinápticos. Difere apenas da adrenalina pela
aéreas) ou doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).
ausência da substituição de metila no grupo amino. A
Os β agonistas podem ser usados para estimular a taxa e a
noradrenalina constitui 10-20% do teor de catecolaminas da
força da contração cardíaca. O efeito cronotrópico é útil no
adrenal humana e até 97% em alguns feocromocitomas
tratamento emergencial de arritmias, bradicardias ou bloqueio
(tumores de adrenal).
cardíaco, enquanto o efeito ionotrópico é usado quando é
desejável aumentar a contratilidade do miocárdio.
Isoproterenol
Isoproterenol é um potente agonista não seletivo de
receptores β com baixa afinidade para α receptores.

Estrutura
química da noradrenalina

Usos terapêuticos
A pressões sistólicas, diastólicas e, geralmente, a pressão de
pulso é aumentada com o uso de noradrenalina. A ativação
do reflexo vagal compensatório retarda o coração, Estrutura química do isoproterenol
superando uma ação direta de aceleração cardíaca, e o
volume de pós-carga é aumentado. A resistência vascular
periférica aumenta na maioria dos leitos vasculares, e o fluxo
sanguíneo renal é reduzido. Noradrenalina promove a
constrição dos vasos mesentéricos e reduz o fluxo
sanguíneo esplâncnico e hepático. O fluxo coronário
geralmente é aumentado, devido à dilatação coronariana
indiretamente induzida, e a pressão arterial acaba sendo
elevada.
Ao contrário da adrenalina, pequenas doses de noradrenalina
não causam vasodilatação ou hipotensão, uma vez que os
vasos sanguíneos do músculo esquelético contraiam em vez
de dilatar-se. A noradrenalina é usada como vasoconstritor
para aumentar ou apoiar a pressão arterial sob certas
condições de cuidados intensificados. Ações Farmacológicas
Dopamina A infusão intravenosa de isoproterenol reduz a resistência
vascular periférica, principalmente no músculo esquelético,
mas também em leitos vasculares renais e mesentéricos. A
pressão diastólica cai. A pressão arterial sistólica pode
permanecer inalterada ou subir, embora a pressão arterial
média tipicamente caia. A produção cardíaca é aumentada
devido aos efeitos positivos inotrópicos e cronotrópicos da
droga em face da diminuição da resistência vascular AGONISTAS �1 SELETIVOS DE RECEPTORES
periférica. Os efeitos cardíacos do isoproterenol podem levar ADRENÉRGICOS
a palpitações, taquicardia sinusal e arritmias mais graves. Os principais efeitos clínicos de uma série de drogas
Isoproterenol relaxa quase todas as variedades de músculo simpatomiméticas ocorrem devido à ativação de receptores
liso quando o tônus está alto, mas esta ação é mais α adrenérgicos no músculo liso vascular. Como resultado, a
pronunciada em músculo brônquico e gastrointestinal. Previne resistência vascular é aumentada, e a pressão arterial é
ou alivia a broncoconstrição. mantida ou elevada. Embora a utilidade clínica dessas drogas
Dobutamina seja limitada, elas podem ser úteis no tratamento de alguns
A dobutamina se assemelha estruturalmente à dopamina, pacientes com hipotensão, incluindo hipotensão ortostática,
mas possui um substitutivo aromático volumoso no grupo ou choque. A fenilefrina e a metoxamina são vasoconstritores
amino. Os efeitos farmacológicos da dobutamina são de ação direta e são ativadores seletivos de receptores α1.
decorrentes de interações diretas com receptores α e β; Fenilefrina é um agonista α1-seletivo; ativa os receptores β
suas ações não parecem resultar da liberação de apenas em concentrações elevadas. Os efeitos
noradrenalina de terminações nervosas simpáticas, nem são farmacológicos da fenilefrina são semelhantes aos da
exercidas por receptores dopaminérgicos. metoxamina. A droga causa vasoconstrição arterial marcada
durante a infusão intravenosa. A fenilefrina também é usada
Usos terapêuticos como descongestionante nasal e como agente midriático em
A dobutamina é indicada para o tratamento a curto prazo da várias formulações nasais e oftálmicas.
descompensação cardíaca, que pode ocorrer após cirurgia
cardíaca ou em pacientes com insuficiência cardíaca
AGONISTAS SELETIVOS �2 DE RECEPTORES
congestiva ou infarto agudo do miocárdio. A dobutamina
ADRENÉRGICOS
aumenta a produção cardíaca e o volume de ejeção em tais
Agonistas adrenérgicos α2-seletivos são usados
pacientes, geralmente sem aumento acentuado na
principalmente para o tratamento da hipertensão sistêmica.
frequência cardíaca. Alterações na pressão arterial ou
Sua eficácia como agentes anti-hipertensivos é um tanto
resistência periférica usualmente são menores, embora
surpreendente, uma vez que muitos vasos sanguíneos
alguns pacientes possam ter acentuado aumento na pressão
contêm receptores adrenérgicos α2-sinápticos, que
arterial ou na frequência cardíaca.
promovem a vasoconstrição. De fato, a clonidina, o
AGONISTAS �2 - SELETIVO DE RECEPTORES
prototípico agonista α2, foi inicialmente desenvolvida como
ADRENÉRGICOS
um vasoconstritor descongestionante nasal. Sua capacidade
Alguns dos principais efeitos adversos dos agonistas β no
de diminuir a pressão arterial resulta da ativação de
tratamento de asma ou DPOC são causados pela
receptores α2 nos centros de controle cardiovascular do
estimulação de receptores β1 no coração. Assim, foram
SNC; tal ativação suprime o fluxo de atividade do sistema
desenvolvidas drogas com afinidade preferencial para
nervoso simpático do cérebro.
receptores β2 em comparação com os receptores β1. No
O principal uso terapêutico da clonidina está no tratamento
entanto, essa seletividade é relativa, não absoluta, e se perde
da hipertensão arterial. A estimulação de receptores α2 no
em altas concentrações dessas drogas. Além disso, até 40%
TGI pode aumentar a absorção de cloreto de sódio e fluidos,
dos receptores β no coração humano são receptores β2,
além de inibir a secreção de bicarbonato.
que podem causar estimulação cardíaca.
Uma segunda estratégia que aumentou a utilidade de vários
agonistas β2-seletivos no tratamento da asma e DPOC tem
sido a modificação estrutural que resulta em menores taxas
de metabolismo e maior biodisponibilidade oral (em
comparação com catecolaminas).
O metaproterenol é um exemplo de agonistas β2-seletivos.
É um fármaco resistente à COMT, e 40% é absorvido em
forma ativa após administração oral. Metaproterenol é Estrutura química da
considerado um fármaco β2-seletivo, embora clonidina
provavelmente seja menos seletivo que o albuterol ou Saiba mais
terbutalina e, portanto, é mais propenso a causar Clonidina também é útil no tratamento e na preparação de
estimulação cardíaca; como observado anteriormente, até sujeitos viciados para retirada de narcóticos, álcool e tabaco.
40% dos receptores β no coração humano são do subtipo Essa droga pode ajudar a amenizar parte da atividade
β2; assim, mesmo β-agentes seletivos têm o potencial de nervosa simpática adversa associada à retirada desses
causar estimulação cardíaca. agentes, bem como diminuir o desejo pela droga. Os
Outros fármacos que compõem essa classe são: benefícios a longo prazo da clonidina nesses ambientes e em
distúrbios neuropsiquiátricos continuam a ser determinados.
OUTROS AGONISTAS SIMPATOMIMÉTICOS drogas são importantes na medicina clínica, particularmente
Anfetaminas para o tratamento de doenças cardiovasculares.
As anfetaminas têm poderosas ações estimulantes do SNC, Antagonistas seletivos de β1 bloqueiam a maioria das ações
além das ações periféricas α e β comuns a drogas da adrenalina e noradrenalina no coração, enquanto têm
simpatomiméticas de ação indireta. Ao contrário da menos efeito sobre receptores β2 no músculo liso
adrenalina, é eficaz após a administração oral, e seus efeitos brônquico e nenhum efeito sobre as respostas mediadas por
duram várias horas. receptores α1 ou α2. O conhecimento detalhado do sistema
No sistema cardiovascular, as anfetaminas administradas nervoso autônomo e os locais de ação das drogas que
oralmente aumentam a pressão arterial sistólica e diastólica. A atuam nos receptores adrenérgicos é essencial para a
frequência cardíaca, muitas vezes, é reflexivamente lenta, e, compreensão das propriedades farmacológicas e dos usos
com grandes doses, podem ocorrer arritmias cardíacas. terapêuticos dessa importante classe de fármacos.

Antagonistas dos receptores α adrenérgicos


Os receptores α adrenérgicos medeiam ações importantes
de catecolaminas endógenas. As respostas de relevância
clínica incluem a contração no músculo arterial, venoso e
visceral liso. Os receptores α2 estão envolvidos no aumento
do tônus vagal, facilitando a agregação plaquetária, inibindo a
Estrutura química da anfetamina liberação de noradrenalina e Ach das terminações nervosas,
As anfetaminas são uma das mais potentes aminas e regulando efeitos metabólicos. Estes efeitos incluem a
simpatomiméticas em estimulantes do SNC. Estimulam o supressão da secreção de insulina e a inibição da lipólise.
centro respiratório medular, diminuem o grau de depressão Os antagonistas dos receptores α têm um amplo espectro
central causada por várias drogas e produzem outros sinais de especificidades farmacológicas e são quimicamente
de estimulação do SNC. Acredita-se que esses efeitos sejam heterogêneos. Algumas dessas drogas têm afinidades
decorrentes da estimulação cortical e, possivelmente, da diferentes para receptores α1 e α2. Por exemplo:
estimulação do sistema ativador reticular.
Toxicidade e efeitos adversos
Os efeitos tóxicos agudos da anfetamina geralmente são
extensões de suas ações terapêuticas, e, como regra,
resultam da superdosagem.
Os efeitos do SNC geralmente incluem inquietação, tontura,
Usos terapêuticos
tremor, reflexos hiperativos, tensão, irritabilidade, fraqueza,
A prazosina tem sido usada com sucesso no tratamento da
insônia, febre e, às vezes, euforia. Confusão, agressividade,
hipertensão essencial. O interesse considerável também se
mudanças na libido, ansiedade, delírio, alucinações paranoicas,
concentrou na tendência desse fármaco de melhorar em
estados de pânico e tendências suicidas ou homicidas
vez de piorar os perfis lipídicos e o metabolismo de glicose-
ocorrem, especialmente, em doentes mentais.
insulina em pacientes com hipertensão que estão em risco
No entanto, esses efeitos psicóticos podem ser provocados
de doença aterosclerótica.
em qualquer indivíduo se quantidades suficientes de
Na insuficiência cardíaca congestiva, os antagonistas de
anfetamina forem ingeridas por um período prolongado.
receptores α têm sido usados como outras drogas
Fadiga e depressão geralmente ocorrem após a estimulação
vasodilatadoras. Os efeitos a curto prazo da prazosina para
central. Efeitos cardiovasculares são comuns e incluem dor
esses pacientes são decorrentes da dilatação das artérias e
de cabeça, frieza, palidez ou rubor, palpitação, arritmias
veias, resultando em uma redução da pré-carga e pós-carga
cardíacas, dor anginal, hipertensão ou hipotensão e colapso
cardíaca e redução do congestionamento pulmonar. Tem
circulatório.
pronunciada ação na reversão dos sinais adrenérgicos
Atenção
vasculares em pacientes com quadro de sobredosagem de
Os sintomas gastrointestinais incluem: boca seca, gosto
anfetaminas e cocaína.
metálico, anorexia, náusea, vômito, diarreia e cólicas
A hiperplasia prostática benigna produz obstrução uretral
abdominais. Envenenamento fatal geralmente termina em
sintomática, que leva a fluxo fraco, frequência urinária e
convulsões e coma, e hemorragias cerebrais são os
nocturia. Esses sintomas são devido a uma combinação de
principais achados patológicos.
pressão mecânica na uretra em razão do aumento da
ANTAGONISTAS DE RECEPTORES ADRENÉRGICOS
massa muscular lisa e do receptor α1, mediando um
Muitos tipos de drogas interferem na função do sistema
crescimento no tônus muscular liso na próstata e bexiga,
nervoso simpático e, portanto, têm efeitos profundos na
sendo esses sintomas e sinais revertidos e controlados pelo
fisiologia de órgãos simpaticamente inervados. Várias dessas
uso da prazosina.
Antagonistas seletivos-α2 dos receptores adrenérgicos antagonistas β1-seletivos, embora a seletividade não seja
Os receptores α2 têm um papel importante na regulação absoluta. O propranolol é um antagonista puro, e não tem
da atividade do sistema nervoso simpático, tanto periférica capacidade de ativar receptores β.
quanto centralmente. Como mencionado, a ativação dos Vários bloqueadores β (por exemplo, pindolol e acebutolol)
receptores α2 pré-sinápticos inibem a liberação de ativam receptores β parcialmente na ausência de
noradrenalina e outros transmissores periféricos de catecolaminas; no entanto, as atividades intrínsecas dessas
terminações nervosas simpáticos. drogas são menores do que a de um agonista completo,
O bloqueio dos receptores α2 com antagonistas seletivos, como o isoproterenol. Dizem que esses agonistas parciais
como a ioimbina, podem aumentar o fluxo simpático e têm uma atividade intrínseca.
potencializar a liberação de noradrenalina a partir de A atividade simpática substancial seria contraproducente à
terminações nervosas, levando à ativação de receptores α1 resposta desejada por um antagonista β; no entanto, uma
e β1 no coração e na vasculatura periférica, com ligeira atividade residual pode, por exemplo, prevenir
consequente aumento da pressão arterial. bradicardia profunda ou inotrópica negativa em um coração
Usos terapêuticos em repouso. A vantagem clínica potencial desta propriedade,
A fenoxibenzamina é utilizada no tratamento do no entanto, não é clara e pode ser desvantajosa no
feocromocitoma. Feocromocitomas são tumores da medula contexto de prevenção secundária do infarto do miocárdio.
adrenal, onde o resultado habitual é a hipertensão, que pode Além disso, outros antagonistas do receptor β têm a
ser episódica e grave. A grande maioria dos propriedade do agonismo (agonista) inverso. Estas drogas
feocromocitomas são tratados cirurgicamente; no entanto, podem diminuir a atividade basal do receptor β, deslocando
fenoxibenzamina é usado com frequência na preparação do o equilíbrio de receptores espontaneamente ativos para o
paciente para a cirurgia. A droga controla episódios de estado inativo.
hipertensão grave e minimiza outros efeitos adversos das Vários antagonistas do receptor β também têm atividade
catecolaminas, como contração do volume plasmático e anestésica local ou estabilizadora de membrana, semelhante
lesão do miocárdio. à lidocaína, que é independente do bloqueio β. Tais drogas
Antagonistas dos receptores β adrenégicos incluem:
Antagonistas competitivos de receptores β adrenérgicos, ou
β bloqueadores, têm recebido enorme atenção clínica
devido à sua eficácia no tratamento da hipertensão arterial,
doença isquêmica do coração, insuficiência cardíaca
congestiva e certas arritmias. Os seguintes medicamentos têm leves efeitos estabilizadores
De forma geral, o propranolol é um antagonista não seletivo de membrana:
competitivo dos receptores β adrenérgicos e continua
sendo o protótipo com o qual outros antagonistas β são
comparados.

Embora a maioria dos receptores β antagonistas não


bloqueiem receptores α adrenérgicos, são exemplos de
agentes que bloqueiam receptores α1 e β adrenérgicos:

Estrutura química do propranolol Além do carvedilol, labetalol e bucindolol, muitos outros


Antagonistas β podem ser diferenciados pelas seguintes antagonistas do receptor β têm propriedades vasodilatadoras.
propriedades: Estes
1. Afinidade relativa para receptores β1 e β2; incluem celiprolol, nebivolol, nipradilol, carteolol, betaxolol, bopin
2. Atividade simpática intrínseca; dolol e bevantolol.
3. Bloqueio dos receptores β;
4. Diferenças na solubilidade lipídica; Usos terapêuticos
5. Capacidade de induzir vasodilatação; Os principais efeitos terapêuticos dos antagonistas do
6. Parâmetros farmacocinéticos. receptor β estão no sistema cardiovascular. É importante
Algumas dessas características distintas têm significância distinguir esses efeitos em indivíduos normais daqueles em
clínica e ajudam a orientar a escolha adequada de um indivíduos com doença cardiovascular, como hipertensão ou
antagonista do receptor β para um paciente individual. isquemia miocárdica. Como as catecolaminas têm ações
O propranolol tem afinidade igual para receptores β1 e β2 cronotrópicas positivas e inotrópicas, os antagonistas do
adrenérgicos; assim, é um antagonista não seletivo β receptor β retardam a frequência cardíaca e diminuem a
adrenérgico. Agentes como metoprolol, atenolol, acebutolol, contratilidade do miocárdio.
bisoprolol e esmolol têm alguma afinidade maior para β1 do
que para receptores β2; estes são exemplos de
Quando a estimulação tônica dos receptores β é baixa, este A IC é uma síndrome clínica complexa, na qual o coração é
efeito é mediado modestamente. No entanto, quando o incapaz de bombear sangue, de forma a atender às
sistema nervoso simpático é ativado, como durante o necessidades metabólicas tissulares, ou pode fazê-lo somente
exercício ou estresse, os antagonistas do receptor β com elevadas pressões de enchimento. Esta síndrome pode
atenuam o aumento esperado na frequência cardíaca. ser causada por alterações na estrutura ou na função
A administração de curto prazo dos antagonistas β, como cardíaca e tem como características sinais e sintomas típicos,
propranolol, diminui o problema cardíaco. A resistência que resultam da redução no débito cardíaco (DC) e/ou das
periférica aumenta proporcionalmente para manter a elevadas pressões de enchimento no repouso ou no esforço.
pressão arterial como resultado do bloqueio de receptores O termo insuficiência cardíaca crônica reflete a natureza
vasculares β2 e reflexos compensatórios, como o aumento progressiva e persistente da doença, enquanto o
da atividade do sistema nervoso simpático, levando à termo insuficiência cardíaca aguda fica reservado para
ativação de receptores α vasculares. No entanto, com o uso alterações rápidas ou graduais de sinais e sintomas,
a longo prazo de antagonistas β, a resistência periférica total resultando em necessidade de terapia urgente.
retorna aos valores iniciais ou diminui em pacientes com O paciente com insuficiência cardíaca crônica em geral
hipertensão. Com antagonistas β, que também são permanece assintomático durante muitos anos devido aos
antagonistas do receptor α1, a produção cardíaca é mantida mecanismos adaptativos que vamos descrever a seguir,
com maior queda na resistência periférica. São exemplos: mantendo o DC normal ou próximo do normal, pelo menos
no estado de repouso. Porém, após algum período (que é
imprevisível), surgem os primeiros sintomas. Os sintomas
podem ser consequência do baixo débito ou da síndrome
congestiva.
Antagonistas β não seletivos, tais como propranolol, agem na O tratamento da IC requer a avaliação médica periódica,
musculatura lisa dos brônquios. Isso geralmente tem pouco modificação de esquemas de múltiplos fármacos e controle
efeito sobre a função pulmonar em indivíduos normais. No de imprudências alimentares e da adesão do paciente aos
entanto, em pacientes com DPOC, esse bloqueio pode levar medicamentos prescritos.
Módulo 1
à broncoconstrição e risco de morte.
Descrever a importância clínica dos principais fármacos
Embora antagonistas β1-seletivos ou antagonistas com
utilizados no tratamento da insuficiência cardíaca
atividade simpatomimética intrínseca sejam menos propensas
FISIOPATOLOGIA DA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
do que propranolol para aumentar a resistência das vias
O coração é um órgão muscular, encarregado de bombear
aéreas em pacientes com asma, essas drogas devem ser
o sangue. A mecânica cardíaca é dependente da função dos
usadas apenas com grande cautela.
Tema 5 ventrículos e em menor grau, dos átrios. Toda bomba
Fármacos Que Atuam no Sistema Cardiovascular hidráulica precisa se encher de líquido para depois ejetá-lo,
DEFINIÇÃO gerando assim um fluxo. Assim, é o coração (Figura 1).
A fisiopatologia da insuficiência cardíaca. Conceito de trabalho Denominamos diástole, a fase de enchimento ventricular; e
cardíaco. Classificação clínica da insuficiência cardíaca. sístole, a fase de ejeção ventricular. Logo, uma boa função
Mecanismos compensatórios da insuficiência cardíaca. cardíaca exige que tanto a sístole quanto a diástole estejam
Tratamento farmacológico da insuficiência cardíaca. A normais. Podemos, então, dividir a bomba cardíaca em
importância clínica dos fármacos anti-hipertensivos. Fármacos função sistólica e função diastólica.
que interferem na coagulação sanguínea, na função das
plaquetas e fibrinólise.
PROPÓSITO
Compreender o conceito da fisiopatologia da insuficiência
cardíaca, da hipertensão arterial e do sistema de coagulação
e os mecanismos de ação dos fármacos empregados para o
seu tratamento é fundamental para se obter um resultado
terapêutico desejado.
INTRODUÇÃO
A insuficiência cardíaca (IC) é uma patologia de prognóstico
grave, que afeta no mundo mais de 23 milhões de pessoas.
A mortalidade após 5 anos do diagnóstico aproxima-se de
50%. O Brasil apresenta uma das mais elevadas taxas no Figura 1: Caminho do fluxo de sangue através do coração.
mundo ocidental. Por trás da IC, estão entidades comuns na Clique nas barras para ver as informações.
população, como: hipertensão arterial, diabetes, doenças FUNÇÃO SISTÓLICA
ateroscleróticas e disfunções valvares e infecções. A A função sistólica é a capacidade que o ventrículo possui de
persistência de doenças negligenciadas está entre causas ejetar o sangue nas grandes artérias. Pode ser estimada
frequentes da IC. Esta síndrome não tem cura, mas pode ter calculando-se a fração de ejeção (FE), definida como
diagnóstico precoce e levar a mudança de hábitos percentual do volume diastólico final (VDF) que é ejetado, ou
alimentares e de atividade física. seja:
FE=DS (débito sistólico) / VDFx100
FUNÇÃO DIASTÓLICA da doença a perda de outros miócitos, mantendo assim o
A função diastólica é a capacidade que o ventrículo possui de débito sistólico.
se encher com o sangue que chega das veias, sem FREQUÊNCIA CARDÍACA
aumentar muito a pressão no interior da cavidade ventricular. A frequência cardíaca FC: Se tivermos em mente que o DC
Como a medida da pressão de enchimento requer métodos é o produto da FC pelo volume sistólico, podemos concluir
invasivos, na prática ambulatorial, podemos aferir a função que na IC, se o volume sistólico for reduzido, a FC poderá
diastólica de forma indireta pelo eletrocardiograma, ao medir aumentar para compensar e manter o débito constante.
a velocidade do fluxo que passa pela válvula mitral. Nesse caso, o sistema adrenérgico se encarrega de
Atenção aumentar o cronotropismo cardíaco (aumento da FC), agindo
É implícito na definição de IC o conceito de que a ela possa sobre os receptores β1 e α1 no nodo sinusal. Este é o
ser causada por anormalidade na função sistólica, produzindo primeiro mecanismo compensatório que entra em ação
redução do volume sistólico (IC sistólica) ou anormalidade na quando o coração precisa compensar a redução do DC.
função diastólica, levando ao defeito no enchimento Esses eventos estão resumidos e evidenciados na Figura 2.
ventricular (IC diastólica), que também determina sintomas
típicos de IC. No entanto, é importante salientar que, em
muitos pacientes, coexistem as disfunções sistólica e a
diastólica. Assim, convencionou-se definir os pacientes com IC
de acordo com a FE do ventrículo esquerdo.
Para compreender a IC e as abordagens terapêuticas, vamos
conhecer os determinantes do empenho cardíaco e as
condições fisiopatológicas que afetam esses parâmetros.
Os fatores que determinam o desempenho cardíaco, que se
traduz pelo DC(DC), são: a pré-carga, a pós-carga, a
contratilidade cardíaca e a frequência cardíaca.
Clique nas barras para ver as informações.
PRÉ-CARGA
A pré-carga representa o grau de enchimento do ventrículo
esquerdo (VE) durante a diástole que irá determinar o
volume sistólico ejetado. No coração normal, a relação entre
a pré-carga e o volume sistólico é a Lei de Frank-Starling, Figura 2:
que define que “quanto maior o volume diastólico final, maior Influência da frequência cardíaca, da pré-carga e da pós-
será o débito sistólico e a fração de ejeção”. Em resumo, carga no agravamento da insuficiência cardíaca.
podemos entender que o volume diastólico aumentando, TIPOS DE INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
aumenta o comprimento da fibra miocárdica. No coração Agora que já entendemos quais são os fatores que
com IC, a pré-carga em geral está aumentada em razão do determinam o bom funcionamento cardíaco e as condições
aumento no volume sanguíneo e no retorno venoso. que o afetam, podemos conhecer quais os tipos de
PÓS-CARGA insuficiência cardíaca que acometem os pacientes:
A pós-carga representa a impedância à ejeção ventricular Clique nas barras para ver as informações.
esquerda. Em outras palavras, para ejetar sangue do INSUFICIÊNCIA CARDÍACA SISTÓLICA
ventrículo, o coração deve gerar força para deslocar o A insuficiência cardíaca sistólica constitui 50-60% dos casos
sangue para a aorta, empurrando-o ainda mais adiante. A de insuficiência cardíaca e o problema central está na perda
carga combinada do sangue no ventrículo e da resistência da capacidade contrátil do miocárdio. Na maioria das vezes, a
durante a contração ventricular é chamada de pós-carga. À disfunção sistólica provoca a dilatação ventricular, conhecida
medida que ela aumenta, o volume sistólico do ventrículo cai. por cardiopatia dilatada e tem como marco laboratorial a
Esta resistência contra qual o coração deve bombear o redução significativa da FE ≤ 45%.
sangue se dá pela impedância aórtica e pela resistência Existem 2 consequências fisiopatológicas: baixo
vascular sistêmica (RVS). Na IC, com o ventrículo em falência, DC e aumento do volume de enchimento ventricular e,
à medida que o DC diminui, há o aumento reflexo na RVS, portanto, da pressão de enchimento ventricular que aumenta
principalmente, pela ativação do sistema nervoso simpático e a pressão aos átrios e congestão venosa pulmonar. Esta
do sistema renina-angiotensina-aldosterona. disfunção é típica na IC aguda, em especial, aquela
CONTRABILIDADE decorrente do infarto agudo do miocárdio (IAM) e na fase
A contratilidade: A capacidade de contração da fibra cardíaca dilatada da cardiopatia hipertensiva.
ou inotropismo é modulada pelo sistema adrenérgico através INSUFICIÊNCIA CARDÍACA DIASTÓLICA
da ação da noradrenalina e adrenalina principalmente sobre A Insuficiência cardíaca diastólica constitui 40-50% casos de
os receptores β1 cardíacos. Na IC, o baixo débito estimula os insuficiência cardíaca. Nesse caso, a contração miocárdica
barorreceptores arteriais, ativando o sistema nervoso está normal com FE > 45%, mas existe uma restrição
simpático que, agindo sobre esses receptores, promove o patológica ao enchimento diastólico, causando aumento da
aumento da contratilidade dos miócitos que ainda não foram pressão venocapilar. Nessa situação, o relaxamento
lesados gravemente. Esses podem compensar na fase inicial ventricular está prejudicado (“ventrículo duro”). Esse evento
tem como consequência o extravasamento de líquido para
dentro do tecido pulmonar e alvéolos, comprometendo a aumento da espessura da parede ventricular sem aumentar
troca gasosa. a cavidade.
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CONGESTIVA (ICC) • Na sobrecarga de volume, ocorre uma hipertrofia
A insuficiência cardíaca congestiva (ICC) refere-se a excêntrica isto é aumento da cavidade acompanhando o
importante e conceitual consequência fisiopatológica e clínica aumento da espessura da parede ventricular.
da insuficiência cardíaca: o fenômeno da congestão A hipertrofia, além de aumentar o número de sarcômeros e,
venocapilar. É claro que, se o coração não bombeia o portanto, a capacidade contrátil total, também reduz a
sangue adequadamente, uma parte dele fica estagnada no tensão da parede ventricular, melhorando a performance
leito venoso-capilar. O consequente aumento da pressão cardíaca.
venocapilar provoca distensão venosa e extravasamento de Quando o processo inicial é a perda de miócitos, a hipertrofia
líquido para o interstício determinando um acúmulo de fluido compensatória pode ocorrer nos miócitos remanescentes,
(edema). A congestão explica boa parte dos sinais e estes ficam maiores e mais espessos contendo o maior
sintomas decorrentes da IC. número de fibrilas. A angiotensina I é um dos principais
agentes indutores de hipertrofia ventricular na insuficiência
cardíaca.
No entanto, embora possa parecer um fenômeno eficaz
para compensar a redução do DC, a hipertrofia ventricular
esquerda traz sérios problemas arritmogênicos e piora da
função diastólica, além de ser um fator de risco
independente para eventos cardiovasculares.
ATIVAÇÃO NEURO-HUMORAL
Com a incapacidade do coração de produzir um DC
adequado, a pressão arterial diminui. Esta alteração
hemodinâmica ativa o reflexo barorrecepto, estimulando a
Figura 3: Insuficiência cardíaca sistólica e diastólica. liberação de catecolaminas que produzem taquicardia via
Mecanismos compensatórios na insuficiência cardíaca ativação de receptores β1 e vaso constrição via ativação de
Relembrando receptores α1 periféricos (essa ativação causa um efeito
Já vimos anteriormente que o aumento da frequência miocardiotóxico, em que o miócito evolui para a apoptose).
cardíaca é o primeiro mecanismo compensatório ativado na Isto causa o aumento da pós-carga que já descrevemos
tentativa de restabelecer o débito na IC. Quando a anteriormente. A pós-carga aumentada cria maior pressão
capacidade do miocárdio em manter o DC normal falha, contra a qual o coração deve contrair-se, portanto aumenta
mecanismos compensatórios são ativados para preservar a a necessidade de O2 pelo miocárdio. Ao longo dos anos, o
função circulatória. coração doente tem a infrarregulação desses receptores.
O mecanismo de Frank Starling significa que, quanto maior o Se entendermos que o sistema cardiovascular tem como
comprimento da fibra muscular quando ela começa a principal objetivo garantir a perfusão sanguínea para todos
contrair, maior a força de contração. A lei de Frank-Starling os tecidos e que na IC o débito cardíaco está
do coração diz que um aumento no volume diastólico final comprometido, será fácil imaginar que todos os mecanismos
(VDF) resulta em um maior volume sistólico, aumenta em existentes para aumentar a volemia e a pressão arterial são
resposta ao aumento da pré-carga. ativados nessa doença.
Quando esse mecanismo não consegue compensar esse ESTIMULAÇÃO ADRENÉRGICA
estresse hemodinâmico, então, sistemas de sinalização dão A estimulação adrenérgica dos receptores β1 nas células
início a alterações estruturais em nível celular, um processo justaglomerulares renais promove a liberação de renina, que
conhecido como remodelamento do miocárdio. também é estimulada pela redução da perfusão renal
A progressão da doença miocárdica leva ao seguinte decorrente da redução do DC. A renina liberada cliva o
paradoxo: os mesmos mediadores neuro-humorais que, angiotensinogênio circulante em angiotensina I que é
inicialmente, mantém o paciente compensado (sistema convertida pela enzima conversora de angiotensina (ECA)
renina-angiotensina-aldosterona; sistema adrenérgico) passam à angiotensina I (AngII). Este hormônio ativo tem ação
a exercer um efeito deletério na função miocárdica. Este é o vasoconstritora, ação hipertrófica sobre vasos e
fenômeno do remodelamento cardíaco. cardiomiócitos, e estimula as glândulas suprarrenais a
Vejamos abaixo os três tipos de remodelamento cardíaco: liberarem aldosterona. Nesse momento, temos um
Clique nas barras para ver as informações. mecanismo extremamente potente de vasoconstrição
A HIPERTROFIA VENTRICULAR ESQUERDA arterial e retenção hídrica com aumento do volume
A hipertrofia ventricular esquerda é definida como o intravascular.
aumento da massa de miocárdio ventricular. Este é o Tomados em conjunto todos esses eventos pré-carga e
principal mecanismo compensatório inicial nos casos de pós-carga aumentadas, taquicardia e ativação dos
sobrecarga de pressão ou volume ventricular. mecanismos neuro-humorais ajudam a manter o DC e a
• Na sobrecarga de pressão (hipertensão arterial ou perfusão tecidual. No entanto, a longo prazo, aumentam a
estenose aórtica), ocorre uma hipertrofia concêntrica, isto é, demanda de O2 que, no coração comprometido, agrava a IC.
Logo, o objetivo central do tratamento farmacológico da IC
consiste em modular a ação desses fatores neuro-humorais,
aumentando a sobrevida dos pacientes com IC, como vemos
na Figura 4.

Figura 5: Locais de ação dos diuréticos no sistema renal.


Clique nas barras para ver as informações.
DIURÉTICOS DE ALÇA
Os diuréticos de alça são os agentes diuréticos mais utilizados
como a furosemida e bumetanida. O mecanismo de ação
desses fármacos consiste na inibição do cotransportador de
Na+-K+-2Cl- (NKCC2) no ramo ascendente da alça de Henle
nos néfrons, resultando em aumento da excreção de sódio,
potássio e água. Os efeitos desse fármaco são a redução da
volemia e, portanto, o retorno venoso, reduzindo a distensão
venosa e a formação de edema em membros inferiores.

Figura 4:
Modulação farmacológica dos efeitos neuro-humorais da
insuficiência cardíaca.

IMPORTÂNCIA CLÍNICA DOS FÁRMACOS NO


TRATAMENTO DA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA

A otimização da terapêutica do paciente com IC exige uma


especial atenção em relação aos fatores de
descompensação da IC. Podemos citar o abuso do sal na
dieta, hipertensão arterial não controlada, uso de drogas
retentoras de sódio como corticoides, IAM ou isquemia e a
má aderência ao tratamento. Embora alguns deles sejam de
fácil diagnóstico, outros podem passar despercebidos, mas o
fator descompensador mais comum é a má aderência à
terapêutica. A estratégia terapêutica baseia-se em três metas
hemodinâmicas: redução da pré-carga, redução da pós-
carga e aumento da contratilidade cardíaca. Figura 6:
Drogas que agem reduzindo a pré-carga Mecanismo de ação dos diuréticos de alça.
Neste tópico, abordaremos os diuréticos e os DIURÉTICOS TIAZÍDICOS
venodilatadores Os diuréticos tiazídicos, como a hidroclorotiazida, clortalidona
Diuréticos e indapamida também são utilizados para tratamento dos
Os diuréticos têm sido há muito tempo a base do sintomas congestivos, particularmente, em pacientes
tratamento farmacológico de pacientes com suficiência hipertensos e com disfunção sistólica do VE. No entanto,
ventricular esquerda e continuam integrando o tratamento como são menos potentes que os diuréticos de alça, com
de pacientes com os sintomas congestivos. Apesar da frequência, essas duas classes de fármacos são
eficácia, não há evidência de benefício sobre a mortalidade coadministradas a pacientes com IC, nos quais os diuréticos
no tratamento com diuréticos de alça ou tiazídicos. de alça não produzem a diurese esperada. O mecanismo de
ação desses fármacos consiste na inibição do
cotransportador de Na+-Cl- (NCC) no túbulo contorcido distal
nos néfrons.
Por isso, a monitorização dos eletrólitos se faz obrigatória na
terapia diurética.
Venodilatadores
Os representantes desses fármacos são a nitroglicerina,
mononitrato de isossorbida ou dinitrato de isossorbida.
O emprego de nitratos fundamenta-se em seu mecanismo
de ação de doadores de óxido nítrico e relaxamento do
músculo liso vascular. O seu efeito venodilatador, diminuindo
o retorno venoso ao coração e o volume diastólico final do
ventrículo esquerdo reduz o consumo de oxigênio pelo
miocárdio. Adicionalmente, observam-se efeitos de
vasodilatação de artérias coronárias, normais ou
ateroscleróticas, aumento da circulação colateral coronariana
e inibição da agregação plaquetária.
Podem ser usados por via oral, sublingual, intravenosa e
transdérmica. As vias sublingual e intravenosa são as mais
utilizadas para o tratamento dos casos agudos pela facilidade
de seu ajuste.
Figura 7: Atenção
Mecanismo de ação dos diuréticos tiazídicos. É comum o aparecimento de tolerância aos efeitos
DIURÉTICOS POUPADORES DE POTÁSSIO hemodinâmicos do medicamento após 24h de uso. O
Os diuréticos poupadores de potássio compõem o fenômeno de tolerância tem sido atribuído à depleção dos
tratamento com outros diuréticos que causam a perda de radicais sulfidrila existentes na parede arterial. Esses radicais
sódio e, consequentemente, a perda secundária de potássio. são responsáveis pela conversão dos nitratos orgânicos em
A hipopotassemia pode e deve ser tratada com reposição de óxido nítrico.
potássio ou diuréticos poupadores de potássio, como a A taquicardia reflexa, cefaleia, tonteira e lúpus podem
espironolactona ou a eplerenona. Essas drogas são ocorrer especialmente nas doses mais altas, o dinitrato de
antagonistas dos receptores de aldosterona, reduzindo a isossorbida.
troca de sódio-potássio no túbulo distal e ducto coletor do
néfron. Com frequência, essas drogas são administradas com
inibidores da ECA (veremos adiante) e bloqueadores do
receptor de Angiotensina I .

Figura 9:
Figura 8: Mecanismo de ação dos diuréticos poupadores de Estrutura química da issorbida: 2,5-dinitrato de 1,4:3,6-
potássio. dianidro-D-glucitol (dinitrato).
Espironolactona e eplerenona devem ser consideradas em Drogas que agem reduzindo a pós-carga
todos os pacientes com IC moderada ou grave, pois Na sequência, veremos as principais classes de drogas que
parecem reduzir a morbidade e mortalidade dos pacientes. atuam na redução da pós-carga:
O uso dos diuréticos está indicado sempre que houver Clique nas barras para ver as informações.
síndrome congestiva, ou seja, quando há excesso de volume VASODILATADORES DE AÇÃO DIRETA
para o trabalho cardíaco. Com o seu uso, a volemia deve ser A hidralazina é um vasodilatador que tem como mecanismo
reduzida para níveis normais. Para isso, não se deve fazer de ação a dilatação arteriolar direta. Ao dilatar as arteríolas,
doses excessivas de diurético, de modo a baixar muito a reduz a RVS sistêmica e, portanto, a pós-carga. A associação
volemia, pois, nesse caso, o DC se reduzirá hidralazina + dinitrato de isossorbida tem um importante
significativamente, levando a uma síndrome de baixo débito. efeito venodilatador reduzindo também a pré-carga,
Atenção facilitando o trabalho ventricular. Tipicamente, dessa
• Alguns efeitos adversos gerais dos diuréticos: hipovolemia, associação é reservada para pacientes que não podem
insuficiência renal, hipopotassemia. tolerar os inibidores da ECA.
• Efeitos adversos dos tiazídicos: hiponatremia, hipercalcemia. INIBIDORES DA ENZIMA CONVERSORA DE ANGIOTENSINA
• Efeitos adversos diuréticos de alça: ototoxicidade, (IECA)
hipocalcemia, hipercalciúria.
Os iECA como o captopril e o enalapril entre outros inibem meio de mecanismos distintos e apresentam toxicidade
irreversivelmente a enzima conversora da angiotensina. Ao distinta e não se superpõem. Portanto, a administração
inibirem a formação da AngII, essas drogas possuem 3 concomitante é recomendada em pacientes com IC. É
propriedades importantes na IC: recomendado o tratamento com uma dose inicial mínima,
1) Vasodilatação arteriolar, reduzindo a pós-carga. sendo aumentada gradativamente, a cada semana, até a
2) Venodilatação, reduzindo a pré-carga. dose plena.
3) Redução dos efeitos deletérios da AngII sobre o miocárdio Existem diferenças entre essas drogas quanto à seletividade
e sobre os vasos. pelos receptores β1 ou β2 adrenérgicos. Drogas seletivas para
A administração de iECA reverte a vasoconstrição e a os receptores β1 como o atenolol, metoprolol, bisoprolol
retenção de volume que caracterizam a ativação do sistema apresentam vantagens para o tratamento dos pacientes
renina-angiotensina-aldosterona. A redução da pós-carga asmáticos. Os betabloqueadores β1 -seletivos bloqueiam
diminui a impedância à ejeção ventricular esquerda e, apenas os receptores β1 adrenérgicos, presentes em maior
portanto, aumenta o volume sistólico ventricular esquerdo. A parte no coração, no sistema nervoso e nos rins e, portanto,
redução de AngII circulante, diminui a produção de sem os efeitos de bloqueio dos receptores β2 periféricos
aldosterona e, portanto, induz menor retenção de volume. presentes nos pulmões, causando contração da musculatura
Além disso, os iECA aumentam os níveis de bradicinina, lisa brônquica e agravando o quadro de asma do paciente.
substância vasodilatadora endógena, que aumentam a
capacitância venosa e contribuem para a redução da pré-
carga.
Os iECA apresentam impacto significativo na sobrevida de
pacientes com IC. O principal efeito adverso dos iECA é a
tosse seca, presente em 5% dos casos. Esse efeito é
dependente do aumento da bradicinina. A hipercalemia pode
ocorrer, especialmente, quando essas drogas estão
associadas a diuréticos poupadores de potássio.
BLOQUEADORES DOS RECEPTORES AT1 DA ANGII
Essas drogas, representadas pela losartana, candesartana,
valsartana, entre outras, agem inibindo a ação da AngII sobre
Tabela 1: Diferenças das drogas betabloqueadoras, quanto à
os receptores AT1. Esses estão presentes na musculatura lisa
seletividade pelos receptores beta-adrenérgicos.
vascular, na suprarrenal, no miocárdio e no sistema nervoso
AGENTES INOTRÓPICOS: GLICOSÍDEOS CARDÍACOS OU
central.
DIGITÁLICOS
Os bloqueadores dos receptores AT1 produzem efeitos
Os digitálicos ou glicosídeos cardíacos são substâncias que
hemodinâmicos benéficos semelhantes aos iECA. Estudos
derivam de plantas da família da dedaleira (Digitalis sp.). Classe
clínicos recentes demonstraram o benefício dos
de fármacos como a digoxina tem efeito inotrópico positivo,
bloqueadores de AT1 sobre a mortalidade em pacientes com
ou seja, aumenta a força de contração do coração
IC sistólica grave (FE < 40%) incapazes de tomar iECA. Em
insuficiente. Este efeito se dá pela inibição da Na+-
paciente já em uso de iECA, o acréscimo de bloqueadores
K+ ATPase do sarcolema dos miócitos cardíacos. Quando
de AT1 diminui a quantidade de internações por IC, porém
essa Na+- K+ ATPase é inibida, o Na+ começa a se acumular,
não reduz a mortalidade.
aumentando o seu efluxo por um trocador Na+/Ca+, em
A principal vantagem sobre os iECA é a ausência da tosse
troca da entrada de Ca2+ citossólico, principal determinante
como efeito adverso, uma vez que este efeito é
do inotropismo cardíaco. O cálcio é armazenado no retículo
dependente da elevação da bradicinina pelos iECA.
sarcoplasmático do cardiomiócito, aumentando a sua
ANTAGONISTA DOS RECEPTORES Β-ADRENÉRGICOS
disponibilidade para a contração na sístole, garantindo maior
Durante muitos anos β-bloqueadores como o propranolol
força contrátil.
eram drogas não indicadas para pacientes com insuficiência
Além da ação inotrópica positiva, os digitálicos também
cardíaca sistólica, devido ao seu reconhecido efeito inotrópico
apresentam duas ações importantes: a redução do tônus
negativo. Embora possa parecer paradoxal, observou-se que
simpático, levando à vasodilatação arterial e ao aumento da
esses fármacos aumentam a sobrevida de pacientes com IC.
atividade do sistema parassimpático, com ação colinérgica
A ação das catecolaminas sobre os receptores β-
caracterizada pelo aumento do tônus vagal, redução do
adrenérgicos exerce um efeito compensatório na IC,
automatismo do nódulo sinusal e diminuição da velocidade de
aumentando a contratilidade dos miócitos viáveis e
condução do nódulo AV. Logo, esse fármaco também reduz
acelerando a frequência cardíaca. Seus benefícios foram
a pré- e a pós-carga. Esses feitos justificam o uso dos
atribuídos à inibição da liberação de renina, atenuação da
digitálicos nas taquiarritmias supraventriculares, pois reduzem
ação e dos efeitos citotóxicos das catecolaminas circulantes,
a resposta ventricular na fibrilação atrial.
reduzindo o consumo de O2 pelo miocárdio e, de um modo
Embora pacientes com IC, frequentemente, tenham alívio
geral, a prevenção da isquemia do miocárdio.
dos sintomas congestivos durante o tratamento com
Logo, essas drogas podem atenuar os efeitos adversos dos
glicosídeos cardíacos, estes fármacos não demonstraram
reguladores neuro-humorais em pacientes com IC. Além
diminuir a mortalidade. Portanto, são drogas de segunda linha
disso, os antagonistas β1 e os inibidores da ECA atuam por
na IC sistólica, importantes para garantir alívio dos sintomas
de alguns pacientes, e mantê-los no estado compensado.
Apesar dos benefícios limitados, o digitálico ainda é bastante
empregado e a intoxicação é comum. Alterações visuais ou
distúrbios gastrointestinais característicos de intoxicação
podem ser tratados com a redução da dose do fármaco. Em
caso de intoxicação grave, o tratamento pode ser feito com
a administração de anticorpos para digitálicos.
AMINAS SIMPATOMIMÉTICAS
A dobutamina é uma amina simpaticomimética parenteral
geralmente utilizada no tratamento dá IC sistólica
descompensada, com congestão pulmonar acompanhada de
redução do DC anterógrado. Esta droga é um congênere
sintético da epinefrina que estimula os receptores β1 e em
menor grau os β2. A estimulação dos receptores
β1 predomina, com taxas de infusão terapêuticas ocasionando
aumento da contratilidade dos miócitos cardíacos. A ação nos
Tabela 2: Diferentes classes farmacológicas utilizadas no
receptores β2 vasculares provoca vasodilatação arterial e
tratamento da Insuficiência cardíaca.
redução da pós-carga. Ambos efeitos, de aumento da
Esquemas múltiplos na terapia da IC
contratilidade e diminuição da pós-carga, produzem melhora
Os fármacos que vimos neste módulo mostram algumas
no desempenho cardíaco global. A dobutamina é usada em
abordagens para a farmacoterapia da IC. Alguns agentes
situações agudas na UTI com início imediato e curta duração.
como os iECA e antagonistas dos receptores β-adrenérgicos
A dopamina é um precursor imediato da norepinefrina de
demonstraram um benefício significativo sobre mortalidade e
ocorrência natural. O seu mecanismo de ação é complexo e
são considerados como a base da terapia da IC.
tem efeitos dependentes da dose. Ou seja, quando
Outros fármacos como a digoxina e diuréticos têm sido a
administrada por infusão venosa em doses baixas, ocorre
base do tratamento para o alívio sintomático apesar da
ativação direta dos receptores D2 no músculo liso vascular,
ausência de benefício da mortalidade. O uso de terapia de
levando à vasodilatação relativamente seletiva das artérias
combinação deve ser conduzido com cautela em pacientes
esplâncnica e renal. Quando em doses intermediárias, já
com IC, a fim de evitar efeitos adversos como hipotensão,
ocorre ativação dos receptores β1 adrenérgicos cardíacos,
arritmias, desequilíbrio eletrolítico e insuficiência renal.
levando ao aumento da contratilidade cardíaca. Em doses
Todavia, esses pacientes, normalmente, necessitam de
elevadas, ocorre ativação dos receptores α- adrenérgicos
esquemas com múltiplos fármacos para otimizar seu estado
levando à vasoconstrição arterial e venosa periférica que
funcional.
podem ser eficazes na IC aguda quando se necessita
Veja na Figura 10 o exemplo do manejo da IC com
aumentar a pressão arterial.
diferentes tratamentos farmacológicos, tendo como base a
INIBIDORES DA FOSFODIESTERASE
Lei de Frank-Starling.
Essa classe de fármacos como a milrinona inibe a
degradação de AMPc nos miócitos cardíacos, portanto
aumenta a concentração e Ca+ intracelular e
consequentemente a contratilidade (inotropismo). São
considerados agentes inodilatadores, pois provocam ao
mesmo tempo inotropismo, dilatação em vasos de
resistência, como as arteríolas, e em vasos de capacitância,
como as veias. Logo, entendemos que essas drogas causam
a redução de pós e de pré-carga, respectivamente.
Todos os agentes farmacológicos utilizados na insuficiência
cardíaca estão citados na tabela abaixo.

Figura 10: Respostas hemodinâmicas às intervenções


farmacológicas na IC:
I) agentes inotrópicos positivos;
V) Vasodilatadores;
D) Diuréticos;
I+V) Inodilatadores ou inotrópicos + vasodilatadores.
Módulo 2
Entender a aplicabilidade clínica dos fármacos anti- atividade do sistema nervoso central, o VS depende das
hipertensivos, diuréticos condições de carga (pré e pós-carga) e da contratilidade. A
e antitrombóticos RVS reflete o estado contrátil dos vasos da circulação
Por trás da insuficiência cardíaca que vimos no módulo sistêmica. Outro componente importante deste sistema é a
anterior, está uma doença extremamente comum na função renal, que controla os níveis de Na+ e água no
população, a hipertensão arterial sistêmica (HAS). A sangue e, portanto, o volume intravascular.
hipertensão arterial é uma doença multifatorial, constituindo A abordagem farmacológica adequada exige a compreensão
um importante fator de risco para eventos cardiovasculares dos mecanismos de regulação normal da pressão arterial.
adversos, como acidente vascular encefálico, doença arterial MECANISMOS DE REGULAÇÃO NORMAL DA PRESSÃO
coronariana, doença vascular periférica, insuficiência cardíaca ARTERIAL
e doença renal crônica. Sistemas envolvidos no controle da PA que são alvos para o
Ao tratar um paciente hipertenso, deve-se ter sempre em tratamento da hipertensão arterial são: sistema barorreflexo
mente o objetivo primordial, que não é simplesmente baixar e sistema renina-angiotensina-aldosterona.
os níveis pressóricos, mas, sim, reduzir os riscos de O sistema barorreflexo representa a regulação da pressão
morbidade e mortalidade cardiovascular no paciente. arterial através de ajustes rápidos, como a transição de
A hipertensão é definida por uma elevação sustentada da postura em decúbito para a ereta, como quando mudamos
pressão arterial de 140/90 mmHg ou mais, critério que da posição deitada para a posição de pé.
caracteriza um grupo de pacientes cujo risco de doença Os barorreceptores aórticos e carotídeos são
cardiovascular é alta. No entanto, existe uma classificação do constantemente ativados pelo estiramento das paredes
estadiamento da hipertensão de acordo com os valores arteriais em resposta à pressão interna vascular, a pressão
pressóricos. arterial. Com o aumento a pressão arterial a cada batimento,
Em 95% dos casos, a HAS é de causa desconhecida e as terminações nervosas aórticas e carotídeas se projetam
chamada de hipertensão primária ou hipertensão essencial. através dos nervos vago e glossofaríngeo, respectivamente,
Os outros 5% constituem um grupo de hipertensos, cuja e convergem para a região do núcleo do trato solitário
causa da hipertensão arterial é conhecida e então chamada (NTS) no sistema nervoso central (SNC). A partir do NTS, os
de hipertensão secundária. neurônios ativam a via parassimpática e inibem a via
simpática para retornar os níveis normais de pressão arterial.
As causas mais comuns de hipertensão secundária são a Na via parassimpática, há o aumento da atividade vagal e
doença parenquimatosa renal, a estenose de artéria renal e queda da FC. Na via simpática, os neurônios do RVLM
o uso de anticoncepcionais orais. Outras causas menos projetam-se para os neurônios pré-ganglionares do sistema
comuns são: coartação da aorta, Síndrome de Cushing, nervoso simpático, localizados na coluna intermediolateral da
feocromocitoma, hiperaldosteronismo primário, medula espinhal que reduz a atividade simpática central e a
hipertireoidismo e uso de drogas estimulantes. contrátil dos vasos e ventrículo esquerdo (Figura 11).

IMPORTÂNCIA CLÍNICA DOS FÁRMACOS ANTI-


HIPERTENSIVOS
A primeira recomendação para um paciente hipertenso é a
mudança de hábitos de vida e alteração na dieta. Essas
mudanças incluem: restrição de sódio, correção da
obesidade, exercícios físicos regulares, parar de fumar e
reduzir o consumo de bebidas alcoólicas, cafeína ou uso de 11: Representação esquemática do sistema barorreflexo.
drogas estimulantes. Essas medidas podem ser o único Quando há uma queda da pressão arterial e, portanto,
tratamento requisitado para pacientes com hipertensão leve diminuição da ativação dos barorreceptores, ocorre um
e com baixo risco cardiovascular e devem ser sempre aumento da atividade simpática com aumento da RVS (pela
associadas, mesmo se o paciente fizer uso de terapia constrição arteriolar) e aumento do DC, restaurando assim a
medicamentosa com anti-hipertensivos. pressão arterial. Ao mesmo tempo, ocorre inibição da
Sabemos que a Pressão Arterial é dada pela fórmula: atividade parassimpática, com redução do reflexo vagal no
PA = DC X RVS coração e aumento da FC.
Em que o DC é composto pela FC e volume sistólico (VS). O sistema de controle dos barorreceptores tem,
A pressão arterial é determinada pelo produto da frequência provavelmente, pouca ou nenhuma importância na
cardíaca, volume sistólico e RVS. A FC é determinada, regulação a longo prazo da pressão arterial por uma razão
principalmente, pela atividade simpática proveniente da muito simples: os próprios barorreceptores reajustam-se em
1 a 2 dias, a qualquer nível de pressão a que sejam expostos.
No entanto, no paciente hipertenso, esse mecanismo parece
estar comprometido, há a disfunção dos barorreceptores,
atenuação da sensibilidade barorreflexa e hiperatividade
simpática.
O sistema renina-angiotensina-aldosterona representa o
controle da pressão arterial a longo prazo.
Esse controle se dá, principalmente, pela função renal. A
renina é uma enzima liberada pelo aparelho justaglomerular
das arteríolas aferentes renais em resposta a diversos
estímulos, entre eles a redução da pressão arterial e da
atividade simpática. Sua função é converter o
angiotensinogênio em AngI no plasma. Esta, por sua vez,
será convertida em AngII pela ECA presente no plasma e
em vários tecidos, incluindo os pulmões, a parede vascular e
sistema nervoso central. A AngII tem uma série de efeitos
como estímulo da produção de aldosterona pelo córtex da
glândula suprarrenal, aumentando da retenção de sódio e
água, vasoconstrição arterial e venosa, aumentando a RVS,
além de efeito trófico sobre os cardiomiócitos e músculo liso Figura 13: Ilustração da estenose das artérias renais.
vascular, contribuindo para o remodelamento ventricular e Anormalidades na função renal, como doença
vascular (Figura 12). parenquimatosa renal e estenose das artérias renais (Figura
13) por exemplo, também contribuem para o
desenvolvimento da hipertensão arterial, onde a retenção
excessiva de sódio e água pelos rins é responsável pelo
aumento do volume intravascular. Além disso, a vasopressina,
um neuropeptídio produzido pelas neuro-hipófise, com ação
antidiurética, parece ter seus níveis aumentados nos
pacientes hipertensos, contribuindo para o aumento da
pressão arterial.
Para o tratamento da hipertensão arterial, faz-se necessário
que os medicamentos exerçam seus efeitos sobre a
pressão arterial por meio do DC e/ou da RVS.
Atualmente, existe um arsenal de fármacos que tem como
estratégia farmacológica:
Figura 12: Sistema renina-angiotensina-aldosterona. a) Redução do volume intravascular (Diuréticos).
No paciente hipertenso, esse sistema também está b) Infrarregulação do tônus simpático (antagonistas β,
desregulado, onde tanto a função vascular quanto a renal antagonistas α1, simpaticolíticos centrais).
estão comprometidas. Os vasos estão mais responsivos à c) Modulação do tônus do músculo liso vascular
estimulação simpática, a fatores reguladores do tônus (bloqueadores dos canais de Ca+2 e inibidores do sistema
vascular. Isso pode ser mediado, em parte, pela disfunção neuro-humoral (inibidores da renina, inibidores da ECA,
endotelial, onde há um desequilíbrio entre os fatores antagonistas de AT1) (Tabela 3).
vasodilatadores e vasoconstritores endoteliais, como óxido DIURÉTICOS SIMPATICOLÍTICOS VASODILATADORES BLOQUEADORES
nítrico e endotelina, respectivamente, contribuindo então DO SISTEMA
RENINA-
para o aumento da RVS e a elevação da pressão arterial. ANGIOTENSINA

Diuréticos Bloqueadores de Bloqueadores dos Inibidores da ECA


tiazídicos efluxo simpático do canais de cálcio
SNC

Diuréticos Bloqueadores Minoxidil Antagonistas AT1


de alça ganglionares
Diuréticos Antagonistas das Hidralazina
poupadores terminações
de K+ nervosas
adrenérgicas pós-
ganglionres

Antagonistas α1- Nitroprussiato de


adrenérgicos sódio
Antagonistas β1-
adrenérgicos
Antagonistas α- ação de longa duração. Esses fármacos diminuem o volume
adrenérgicos/β-
adrenérgicos mistos intravascular, que tem por efeito reduzir a pressão arterial ao
Tabela 3: Principais classes de anti-hipertensivos. Fonte: reduzir o DC, entretanto, sabe-se que a diminuição do DC
Golan, 2016. estimula o sistema renina-angiotensina, levando à retenção
de volume.
Comentário
Isso parece paradoxal?

Hoje em dia, existe a hipótese de que esses agentes


exercem efeito vasodilatador que complementa a depleção
de volume, acarretando redução sustentada da pressão
arterial. Essa hipótese é sustentada pela observação de que
os efeitos anti-hipertensivos dos tiazídicos são
FÁRMACOS QUE AGEM NA REDUÇÃO DO VOLUME frequentemente obtidos em doses mais baixas do que as
INTRAVASCULAR: DIURÉTICOS necessárias para produzir efeito diurético máximo, sendo
O mecanismo de ação anti-hipertensivo principal dos assim são drogas que causam a redução do DC e da RVS.
diuréticos é reduzir em torno de 10% a volemia, de modo a Todos os tiazídicos são bem absorvidos por via oral, mas
estabelecer um novo estado de equilíbrio entre gestão de apresentam algumas diferenças no seu metabolismo. A
sal e água (ver também no módulo anterior). clorotiazida não é muito lipossolúvel e necessita de doses
Escolha uma das Etapas a seguir. mais altas, e a única tiazida disponível para administração
Diuréticos tiazídicos Os tiazídicos exercem o efeito diurético parenteral. A hidroclorotiazida é mais potente que as demais.
através da inibição da reabsorção de NaCl no túbulo A clortalidona apresenta absorção mais lenta e ação mais
contorcido distal, responsável pela reabsorção de 5 a 8% do prolongada. Todos os tiazídicos são secretados pelo sistema
NaCl filtrado. secretor de ácidos orgânicos no túbulo proximal, e
Diuréticos de alça Os diuréticos de alça inibem a reabsorção completem com a secreção de ácido úrico para esse
de NaCl na porção ascendente espessa da alça de Henle, sistema. Logo, o uso de tiazídicos pode reduzir a secreção
responsável por 35 a 40% da reabsorção do NaCl filtrado, de ácido úrico e elevar seus níveis séricos.
daí a sua maior potência diurética, mas não anti-hipertensiva. Efeitos adversos e contraindicações:
Diuréticos poupadores de potássio Os Diuréticos poupadores Clique nas barras para ver as informações.
de potássio inibem, direta ou indiretamente, a reabsorção de DIURÉTICOS TIAZÍDICOS
sódio no túbulo coletor, reduzindo o principal estímulo para a Os principais efeitos adversos dos diuréticos tiazídicos são
secreção de K+ e H+, conforme citado no módulo anterior doses dependentes, ocorrendo de forma mais comum com
na Figura 8. doses elevadas. São categorizados nos “famosos 4 HIPO e 3
HIPER” como na tabela 4. De todos esses efeitos, a
hipocalemia é o mais comum, ocorrendo em 5 a 10% dos
casos, especialmente, com a clortalidona. A hipocalemia pode
desencadear taquicardia atriais ou ventriculares e
a hipomagnesemia pode contribuir para este evento. Apesar
dos possíveis efeitos metabólicos deletérios, os tiazídicos são
drogas bastante seguras em diabéticos e dislipidêmicos. As
contraindicações dos tiazídicos são em pacientes
com hiperuricemia com histórico de gota, com nefrolitíase
por hipercalciúria idiopática (esse efeito pode beneficiar
pacientes com osteoporose, reduzindo a chance de fraturas).
DIURÉTICOS DE ALÇA
Os diuréticos de alça, como a furosemida, bumetanina, não
são indicados para tratamento de hipertensão arterial crônica,
exceto em três situações: na crise hipertensiva, por agirem
Figura 8: Mecanismo de ação dos diuréticos mais rápido, já que são muito potentes e têm meia vida
poupadores de potássio. curta; na insuficiência cardíaca descompensada (como vimos
Os tiazídicos como a hidroclorotiazida, clorotiazida, clortalidona no módulo anterior); na insuficiência renal com creatinina
e indapamina são os diuréticos mais indicados para o maior que 2,5 mL/dL, quando os tiazídicos não têm efeito.
tratamento crônico da hipertensão arterial, pois reduzem a Os efeitos adversos desses diuréticos são semelhantes aos
cota certa de volemia para um adequado controle pressórico. citados pelos tiazídicos, exceto o efeito sobre o cálcio, além
É considerado o anti-hipertensivo de escolha em de aumentar os riscos de trombose, já que a furosemida
praticamente todos os tipos de hipertenso, tanto para causa depleção grave de fluidos, conforme citado no módulo
monoterapia quanto para os estágios iniciais, e como terapia anterior (Figura 7).
combinada em fases mais avançadas de hipertensão. DIURÉTICOS POUPADORES DE POTÁSSIO
São agentes especialmente úteis no tratamento da Os diuréticos poupadores de potássio, como a
hipertensão crônica, apresentam alta disponibilidade oral e espironolactona e a amilorida, são fármacos que, no
tratamento da hipertensão, têm como principal função a As principais indicações dos betabloqueadores são: pós IAM,
prevenção ou reversão da hipocalemia e a hipomagnesemia. doença coronariana sintomática (angina), insuficiência cardíaca
Normalmente, são combinados com tiazídicos, sistólica, diabetes tipo 2, enxaqueca, tremor essencial,
principalmente, com a hidroclorotiazida. A espironolactona em hipertiroidismo e taquiarritmias (Figura 14).
altas doses é a droga de escolha no hiperaldosteronismo
primário, conforme citado no módulo anterior (Figura 8).
FÁRMACOS QUE MODULAM A REGULAÇÃO DO TÔNUS
SIMPÁTICO: BETABLOQUEADORES, ANTAGONISTAS α1-
ADRENÉRGICOS, SIMPATICOLÍTICOS CENTRAIS
Betabloqueadores
Os betabloqueadores, como o propranolol, metoprolol,
atenolol, nebivolol, exercem seu efeito anti-hipertensivo
basicamente pela redução do DC, consequente à inibição do
inotropismo e do cronotropismo cardíacos, como já
estudamos no módulo 1.
Essas drogas atuam como antagonistas das catecolaminas
endógenas (adrenalina e noradrenalina) nos receptores beta-
adrenérgicos e sua ação é proporcional aos níveis de Figura 14: Tipos de betabloqueadores.
catecolaminas circulantes e à atividade do sistema nervoso Efeitos adversos e contraindicações:
simpático. Além disso, o antagonismo beta-adrenérgico reduz Clique nas barras para ver as informações.
a produção renal de renina e, consequentemente, os níveis BETABLOQUEADORES
de angiotensina e aldosterona. Logo, na hipertensão, os O principal efeito adverso dos betabloqueadores é o
betabloqueadores têm efeitos protetores cardíacos, por broncoespasmo, mas a bradicardia, bloqueio atrioventricular,
reduzirem o consumo de oxigênio pelo miocárdio, além de redução da capacidade física e impotência também devem
efeito antiarrítmico, prevenindo a morte súbita pós IAM. ser considerados. As contraindicações clássicas são para
Ainda, no uso prolongado, o tratamento com pacientes com claudicação intermitente, insuficiência cardíaca
betabloqueadores parece diminuir o tônus vasomotor, com sistólica descompensada, glaucoma e resistência à insulina.
consequente, redução da RVS. Um cuidado que se deve alertar ao paciente após longo
Veja abaixo algumas das características dos período de tratamento com betabloqueadores é de não
betabloqueadores: interromper o tratamento de forma abrupta, pois pode
Clique nas barras para ver as informações. ocorrer aumento rebote da pressão arterial, pelo fenômeno
SELETIVIDADE de suprarregulação dos receptores.
Esses fármacos podem apresentar seletividade pelos Antagonistas α1-adrenérgicos
receptores beta-adrenérgicos: a seletividade pelos Os antagonistas α1-adrenérgicos como a prasozina, terazosina
receptores β1 cardíacos garantem o efeito anti-hipertensivo, e doxazosina são exemplos de fármacos anti-hipertensivos,
enquanto os não seletivos agem nos receptores β2 dos que agem bloqueando seletivamente os receptores
brônquios, vasos periféricos e hepatócitos, podendo causar, antagonistas α1-adrenérgicos sem afetar os receptores
respectivamente, os seguintes efeitos antagonistas α2-adrenérgicos (pois o bloqueio destes
adversos: broncoespasmo, claudicação intermitente e receptores causaria aumento da disponibilidade da
tendência à hipoglicemia. Em doses altas, os noradrenalina no SNC e aumento da hiperatividade
betabloqueadores seletivos perdem a seletividade. adrenérgica).
LIPOSSOLUBILIDADE O bloqueio dos receptores α1 pós-sinápticos inibe o tônus da
Os betabloqueadores também podem apresentar diferenças musculatura arterial e venosa, que está constantemente
quanto à lipossolubilidade. Aqueles que são mais lipossolúveis ativado pelas catecolaminas circulantes. A consequência disso
apresentam maior metabolismo hepático, tendo meia vida é a redução da RVS pela vasodilatação arterial e do retorno
mais curta, além de passarem a barreira hematoencefálica, venoso pela venodilatação.
levando a efeitos adversos no SNC, como: insônia, pesadelos Essa classe de fármacos não é recomendada como
e depressão. monoterapia para pacientes hipertensos e, normalmente, são
ATIVIDADE SIMPATICOMIMÉTICA INTRÍNSECA (ASI) utilizados em associação a diuréticos betabloqueadores ou
Alguns os betabloqueadores possuem atividade outros agentes anti-hipertensivos. Os α1-bloqueadores são
simpaticomimética intrínseca (ASI), agindo como agonistas reservados apenas para pacientes com sintomas
parciais das catecolaminas nos receptores beta-adrenérgicos. de hiperplasia prostática benigna comum em idosos. No
Este efeito, por um lado, tem o menor efeito adverso entanto, os α1-bloqueadores têm efeito benéfico no perfil
cardíaco e, por outro, sua ação anti-hipertensiva depende da lipídico, reduzindo o LDL-colesterol e os triglicerídeos,
hiperatividade adrenérgica basal. provavelmente, por meio da ativação da lipoproteína lipase e
Atenção da lecitina-colesterol-acetiltransferase (LCAT), assim como,
Os betabloqueadores são mais eficazes em hipertensos pela inibição da oxidação da LDL. Esses efeitos podem
jovens e brancos, principalmente, aqueles com síndrome contribuir para a redução do risco cardiovascular.
hipercinética, taquiarritmia e aumento do DC, porém Efeitos adversos:
possuem baixa resposta em negros. Clique nas barras para ver as informações.
ANTAGONISTAS α1-ADRENÉRGICOS
A hipotensão postural é o efeito mais comum,
principalmente, com o prazosin, devido ao seu efeito mais
rápido e em pacientes hipovolêmicos, ou em associação
com diuréticos. Outro efeito adverso descrito é incontinência
urinária em mulheres.
Simpaticolíticos de ação central
Os simpaticolíticos de ação central como a α-metildopa,
clonidina e guanabenzo reduzem a pressão arterial por
ativarem os receptores α2 -adrenérgicos centrais e
imidazolínicos (rilmenidina e moxonidina) centrais, reduzindo a
atividade simpática eferente do SNC, tendo como
consequência a redução da RVS e do DC.
Esses fármacos foram muito utilizados no passado, mas
deram lugar a novas drogas e uso de múltiplos agentes que
possibilitam o uso de doses submáximas, com poucos efeitos
adversos. Outros fármacos simpaticolíticos, como a reserpina,
induzem a depleção de noradrenalina, causando queda
importante da pressão arterial já foram também utilizados no
passado, mas por seus efeitos adversos significativos, como:
depressão grave, hipotensão postural e disfunção sexual,
foram descontinuados. Contudo, a rilmenidina e a moxonidina,
apesar de pouco prescritas atualmente, apresentam fraco
efeito α2 -adrenérgico e são mais bem toleradas com efeitos
anti-hipertensivos comparáveis as outras classes
medicamentosas. A α-metildopa é a droga de escolha na
pré-eclâmpsia, por ter efeito vasodilatador preferencial na
placenta e ter eficácia e segurança.
Efeitos adversos:
Clique nas barras para ver as informações. Os bloqueadores de canais de cálcio vasosseletivos reduzem
SIMPATICOLÍTICOS DE AÇÃO CENTRAL a pressão arterial pela vasodilatação periférica e redução da
Os adversos mais comuns são boca seca, sedação e RVS. Já as drogas cardiosseletivas causam redução do DC,
hipotensão postural, fazendo com que essas drogas não juntamente com a vasodilatação periférica. Um efeito renal
sejam de primeira escolha para o tratamento da hipertensão também está presente, já que a vasodilatação das arteríolas
arterial. A suspensão dessas drogas deve ser feita de aferentes renais melhora o fluxo renal e a filtração
maneira gradual, para evitar efeito rebote e aumento rápido glomerular. Outro efeito benéfico é a vasodilatação
da pressão arterial. coronariana, conferindo propriedade antianginosa para esse
fármaco.
Atenção
FÁRMACOS QUE AGEM NA MODULAÇÃO DO TÔNUS DO Os bloqueadores de canais de cálcio têm ótima ação anti-
MÚSCULO LISO VASCULAR: BLOQUEADORES DOS hipertensiva na população da raça negra e sua eficácia é
CANAIS DE Ca2+ E INIBIDORES DO SISTEMA RENINA- superior aos betabloqueadores e aos iECA.
ANGIOTENSINA Os adversos e contraindicações:
Bloqueadores dos canais de Ca2+ Clique nas barras para ver as informações.
Os bloqueadores dos canais de Ca2+ são classificados em dois DIIDROPIRIDINAS
grupos de acordo com sua estrutura química: i) diidropiridinas As diidropiridinas possuem curta (nifedipina) ou longa ação
e ii) não diidropiridinas (benzotiazepinas e fenilalquilaminas). (amlodipina). A nifedipina tem a desvantagem de provocar
Todos bloqueiam os canais de cálcio tipo L da membrana rápida vasodilatação arterial, desencadeando taquicardia
celular, reduzindo o influxo de cálcio. reflexa. A formulação prolongada da nifedipina (retard) pode
As diidropiridinas como a nifedipina (Figura 15) e a amlodipina ser útil para prevenir tal efeito adverso. São contraindicadas
(Figura 16) apresentam seletividade para receptores da na angina, no IAM e no acidente vascular encefálico.
musculatura lisa vascular, principalmente, em artérias e NÃO DIIDROPIRIDINAS
arteríolas e são vasosseletivas. As não diidropiridinas, como o A nifedipina tem a desvantagem de provocar rápida
diltiazem e a verapamil possuem seletividade pelos vasodilatação arterial, desencadeando taquicardia reflexa. A
receptores presentes nos cardiomiócitos, são formulação prolongada da nifedipina (retard) pode ser útil
cardiosseletivos. Reduzem o inotropismo, o cronotropismo e para prevenir tal efeito adverso. São contraindicadas na
a condução atrioventricular, pela inibição dos canais de cálcio angina, no IAM e no acidente vascular encefático.
dos miócitos, das células do nodo sinusal e do nódulo Inibidores do sistema renina-angiotensina
atrioventricular, respectivamente. A ação anti-hipertensiva dos inibidores da enzima conversora
de angiotensina (iECA) como o captopril e enalapril é
consequência do seu efeito vasodilatador arterial, reduzindo a efeito vasoconstritor. Patologias como a insuficiência cardíaca
RVS e venodilatador, reduzindo o retorno venoso e o DC. aguda e hiponatremia, frequentemente, estão associadas a
Este efeito se dá pela redução significativa dos níveis de concentrações elevadas de vasopressina. Por outro lado, a
AngII do plasma e seus efeitos sobre a parede vascular. Com deficiência desse hormônio causa o diabetes insípido.
menos concentração de AngII, menos formação de A vasopressina age sobre os receptores V1 acoplados à
aldosterona, justificando seu efeito diurético leve. A resposta proteína G, presentes nas células do musculo liso vascular,
adrenérgica reflexa à vasodilatação é inibida, não acarretando causando vasoconstrição por meio de ativação da fosfolipase
a taquicardia reflexa. C. Os receptores V2 estão presentes nas células tubulares
Uma das principais vantagens do uso de iECA é a prevenção renais e reduzem a diurese por aumento da reabsorção de
dos efeitos tróficos da AngII sobre o remodelamento água nos túbulos coletores.
cardíaco e vascular, melhorando ainda a função endotelial. Clique nas barras para ver as informações.
Além disso, o iECA tem efeito nefroprotetor, pela redução DESMOPRESSINA
da hiperfiltração glomerular devido à vasodilatação Agonistas dos receptores da vasopressina, como a
preferencial das arteríolas eferentes renais (Figura 13). desmopressina, são seletivos para os receptores V2, são
As principais indicações dos iECA é o paciente hipertenso indicados para o tratamento do diabetes insipido hipofisário,
que apresenta insuficiência cardíaca sistólica, IAM, FE < 40% enurese noturna primária pediátrica, hemofilia A e doença de
e nefropata. Willebrand. São administradas por via oral, intravenosa,
Efeitos adversos e contraindicações: subcutânea ou intranasal.
Clique nas barras para ver as informações. Efeitos adversos: distúrbios gastrintestinais, cefaleia,
IECA hiponatremia e reações alérgicas.
Os principais efeitos adversos são hipotensão de primeira CONIVAPTANA E TOLVAPTANA
dose (pacientes hipovolêmicos), tosse seca, hipercalemia. O Antagonistas dos receptores da vasopressina, como a
captopril pode levar ao agioedema, anaflaxia, rash cutâneo. conivaptana e tolvaptana agem nos receptores V1 e V2,
Os iECA são contraindicados são hipercalemia, estenosa da causam redução da excreção renal de água em condições
artéria renal, broncoespasmo e gravidez. associadas a um aumento da vasopressina. São indicados
Antagonistas dos receptores AT1 da Ang I para tratamento intravenoso da hiponatremia em pacientes
Os antagonistas dos receptores AT1 da Ang I como hospitalizados. Os efeitos adversos são as reações no local da
a losartana, candesartana, valsartana e olmesartana são injeção.
agentes anti-hipertensivos orais que antagonizam os efeitos
da AngII sobre os receptores AT1 presentes na musculatura
vascular periférica, causando vasodilatação arterial e venosa, FARMACOLOGIA DA HEMOSTASIA E DA TROMBOSE
semelhante aos efeitos dos iECA. A vantagem dessas drogas Função das plaquetas, coagulação sanguínea e fibrinólise
é que não aumentam os níveis de bradicinina, responsáveis Para uma boa nutrição tecidual e fluxo sanguíneo vascular
pelos efeitos de tosse seca e broncoespasmo. Além de adequado, existe um sistema bem regulado de hemostasia
reduzir a pressão arterial, esses fármacos podem reduzir a para manter o sangue fluido e livre de coágulos nos vasos.
proliferação da camada intima vascular. São semelhantes aos Por outro lado, esse mesmo sistema está pronto para
iECA, mas podem substitui-los quando o paciente não tolera formar um tampão, caso algum vaso seja lesionado. Quando
a tosse induzida por tais medicamentos (Figura 13). ocorre uma ativação inapropriada desse sistema, temos um
Os efeitos adversos e contraindicações: estado patológico chamado de trombose. O coágulo
Clique nas barras para ver as informações. patológico é denominado trombo. Três fatores principais
ANTAGONISTAS DOS RECEPTORES AT1 DA ANG I predispõem à formação de um trombo — lesão endotelial,
São os mesmos dos iECA, exceto a tosse seca e fluxo sanguíneo anormal e hipercoagulabilidade. Esses três
broncoespasmo. fatores, que se influenciam mutuamente, são conhecidos, em
O inibidor direto da renina, como o alisquireno, é um fármaco seu conjunto, como tríade de Virchow.
anti-hipertensivo, mas que não foi estudado o suficiente para A hemostasia é definida como mecanismo que garante o
ser prescrito em monoterapia para a hipertensão. Evidências equilíbrio entre a trombose e a hemorragia, que dependente
de associação com iECA ou antagonista dos receptores das atividades realizadas em entidades como o endotélio
AT1 mostraram que o bloqueio completo do SRA traz mais vascular, as plaquetas do sistema de coagulação e da
prejuízo do que benefícios ao paciente. Tendo em vista a fibrinólise, que vamos discutir a seguir.
eficácia e segurança ainda indefinida, a relevância deste Primeiro, vamos entender a fisiologia da hemostasia e quais
medicamento ainda é incerta. os fatores determinantes para esse processo que ocorre
em três estágios quase simultâneos: vasoconstrição,
FISIOLOGIA DA VASOPRESSINA: AGONISTA E hemostasia primária, hemostasia secundária e resolução ou
ANTAGONISTAS DA VASOPRESSINA fibrinólise.
A vasopressina (arginina, vasopressina) é o hormônio a. Vasoconstrição
antidiurético (ADH) liberado pela neuro-hipófise em resposta Quando o vaso é lesado ocorre em primeiro lugar a
à tonicidade crescente do plasma ou a queda de pressão vasoconstrição localizada, em resposta a um mecanismo
arterial. Esse hormônio tem importante função sobre neurogênico e à secreção de mediadores vasoconstritores
controle a longo prazo da pressão arterial, já que é derivados do endotélio vascular lesado, como a endotelina.
responsável pela reabsorção de água nos rins, além de ter
Essa fase é transitória e para que não haja o sangramento, a quando esta é ativada. Ela tem um importante papel nesse
fase seguinte é então ativada. processo, pois é esta que possibilita a agregação de
b. Hemostasia primária: papel das plaquetas plaquetas com outras plaquetas, através da de ligações
Após a vasoconstrição, inicia-se a formação de um tampão cruzadas com fibrinogênio (Figura 18).
plaquetário. Existem três entidades envolvidas nesse
processo: o endotélio vascular, o subendotélio vascular e as
plaquetas. As plaquetas são fragmentos de megacariócitos
que surgem por brotamento na medula óssea e têm um
papel central na hemostasia primária.
O endotélio vascular em estado normal tem a tendência de
repulsar as plaquetas, através de liberação de oxido nítrico,
prostaglandinas e pela carga elétrica que ele apresenta. No
entanto, quando há lesão vascular, há o desnudamento do
endotélio e exposição da camada subendotelial que
proporciona um substrato rico em fibras de colágeno para a
adesão plaquetária.
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ADESÃO PLAQUETÁRIA
As plaquetas possuem em suas membranas a glicoproteína
GPIb, que se liga ao fator von Willebrand (FvW), uma
proteína multimérica que é secretada, tanto pelas plaquetas
ativadas quanto pelo endotélio lesionado, que medeia a
adesão das plaquetas ao colágeno subendotelial exposto
(Figura 17).

Figura 18: Adesão e agregação plaquetária.


c. Hemostasia secundária: cascata de coagulação
A hemostasia secundária, também chamada de cascata de
coagulação, é uma sequência de eventos enzimáticos que
tem como resultado, a formação de um coágulo de fibrina
estável no local da lesão vascular.
Após a agregação plaquetária que vimos acima, existem dois
caminhos para ocorrer a formação da malha de fibrina: as
vias intrínseca e extrínseca. Essas vias convergem no ponto
de ativação do fator X (Figura 7).
Escolha uma das Etapas a seguir.
Via extrínseca A via extrínseca inicia-se com a ativação do
fator VII pelo fator tecidual III, que é liberado pelo endotélio e
camadas musculares do vaso, quando há lesão vascular.
Juntos, o fator VII e o fator I I ativam o fator X. Esse fator,
por sua vez, ativa o fator V, conferindo atividade
protrombinase, clivando proteoliticamente a protrombina
em trombina (fator I a). A trombina atua fortemente nessa
Figura 17: Adesão e agregação plaquetária. cascata de coagulação, através da conversão do fibrinogênio
ATIVAÇÃO PLAQUETÁRIA em fibrina; ativa fator XIII que forma ligações cruzadas entre
As plaquetas, quando ativadas, secretam grânulos alfa e as fibrinas; amplifica a cascata por catalisar outros fatores
grânulos densos. Esses últimos possuem ADP, Ca+ e TXA2, pro-coagulantes e ativa plaquetas provocando a liberação de
que são potentes ativadores de outras plaquetas adjacentes seus grânulos.
que, quando ativadas, apresentam mudança conformacional e Via intrínseca A via intrínseca é ativada pelo contato do
são recrutadas ao local de adesão. O ADP é, particularmente, sangue com o colágeno subendotelial da parede endotelial
importante, pois confere viscosidade às plaquetas, para que vascular traumatizada. Logo, inicia-se a ativação do fator XII,
elas possam aderir umas às outras. Além disso, o ADP ativa a que ativa na sequência o fatore XI, que ativa o fator IX, que,
fosfolipase A2 que cliva fosfolipídios de membrana liberando na presença do Ca+ e do fator plaquetário I I, leva à
ácido araquidônico que será convertido em TXA2 pela finalização desta via, mediante a ativação do fator VIII,
enzima cicloxiogenase plaquetária. formando o fator X.
AGREGAÇÃO PLAQUETÁRIA O fator X ativado é comum às duas vias e se liga ao fator V,
Existe outra glicoproteína, a GPIIb/IIIa que se localiza no juntamente, com o cálcio, formando a protrombinase, que
interior da plaqueta, mas que é exposta à membrana celular transforma, finalmente, a protrombina em trombina. Esta que
já foi descrita anteriormente, é fundamental para a ativação
dos fatores V, VII, VIII, XI, além de ser responsável pela produtos de degradação da fibrina. Esses são pequenos
formação do fibrinogênio em fibrina polimerizada, fragmentos liberados do coágulo e que são eliminados por
responsável por terminar a malha de coagulação. macrófagos.
Essas vias têm cinéticas distintas. Alguns fatores da via Na fibrinólise, também ocorre a reparação do vaso
extrínseca, que é mais rápida, auxiliam na formação da via sanguíneo. É importante lembrar que esta etapa se ativa
intrínseca, como o fator X que induz à amplificação do fator simultaneamente com a hemostasia secundária, mantendo
IX da via intrínseca, além da trombina da que induz a um equilíbrio entre a coagulação e a degradação do coágulo.
ativação dos fatores V. VIII, X, XI da via intrínseca (Figura 19). Já que a plasmina vai atuar localmente, degradando a malha
de fibrina.
e. Fatores anticoagulantes
Para que não haja coagulação exacerbada, em situação
normal, mecanismos anticoagulantes estão continuamente
ativados. Vamos compreender esses mecanismos, pois
diversos fármacos utilizam dessas vias para ter o seu efeito
farmacológico.
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PROSTACICLINA (PGI2)
Produzida pelo endotélio vascular intacto, se liga a receptores
de prostaciclinas e aumenta a ativação da proteína Gs, que
aumenta os níveis de AMPc que inibe a ativação plaquetária
e a liberação do conteúdo dos seus grânulos.
ANTITROMBINA I I
Esta molécula tem como função formar um complexo com
a heparina liberada pelas células endoteliais intactas e sofrer
uma mudança conformacional que lhe confere capacidade
de ligação com fatores de coagulação, formando o
complexo heparina-antitrombina I I + fator de coagulação.
Figura 19: Vias da coagulação.
Dessa forma, a Antitrombina I I retira de circulação alguns
Atenção
fatores de coagulação, impedindo que a coagulação
A importância da vitamina K e do Cálcio
aconteça. A heparina livre é inativa, ela precisa estar
formando este complexo para ser ativada.
É importante ressaltar que a cascata de coagulação
PROTEÍNA C
necessita de vitamina K, que é fundamental para a formação
Outro fator anticoagulante que se liga em seu receptor
e ativação dos fatores de coagulação dependentes dessa.
específico e, em seguida, recruta importantes fatores de
Como são o fator IX, fator VII, fator X e fator I , os quais
coagulação, como os fatores V e fator VIII, impedindo a
estão nas três vias da coagulação. O cálcio é fundamental
coagulação.
para a formação de todos os complexos.
INIBIDOR DA VIA DO FATOR TECIDUAL (TFPI)
Esta molécula tem como função inibir a formação do
Podemos ressaltar alguns pontos importantes:
complexo formado pelo fator VII ativado + fator tecidual,
i) Na cascata de coagulação, todos os fatores são produzidos
essencial na via extrínseca a ativar o fator X.
de forma inativa e ativados de acordo com a necessidade de
ATIVADOR DO PLASMINOGÊNIO TECIDUAL
formação de coágulos. Ou seja, não há necessidade de
Tem efeito anticoagulante em ativar o plasminogênio que
haver esses eventos indiscriminadamente, pois haveria
será convertido em plasmina, que, por sua vez, degrada os
coagulação intravascular disseminada.
polímeros de fibrina, desfazendo a malha de fibrina formada
durante a coagulação. Esse processo se for exacerbado,
ii) Os complexos de ativação formados precisam se ancorar
pode acontecer hemorragia. Esse complexo também é
na membrana celular, e essa ligação se dá por meio da
inibido pelo inativador de plasminogênio.
ligação com a fosfatidilserina, considerado um fator pro-
Agentes farmacológicos utilizados na terapia antitrombótica
coagulante na cascata de coagulação.
Após todo esse processo de coagulação, quando o tecido
d. Fibrinólise ou hemostasia terciária
vascular já estiver regenerado, a fibrinólise encarrega-se de
Após todo esse processo de coagulação, quando o tecido
normalizar a homeostase, degradando enDiversas doenças
vascular já estiver regenerado, a fibrinólise encarrega-se de
cardiovasculares, como infarto do miocárdio, trombose
normalizar a homeostase, degradando enzimaticamente a
venosa profunda e acidente vascular encefálico, podem ser
fibrina, eliminando o coágulo formado na hemostasia
causadas ou acompanhadas de processos trombóticos, logo
secundária, com a formação dos produtos de degradação da
existem agentes farmacológicos que podem ser utilizados
fibrina.
para impedir ou reverter esse quadro.
A fibrinólise acontece em três etapas: primeiro, ocorre a
Os antiagregantes e anticoagulantes são fármacos que agem
formação dos ativadores do plasminogênio, em seguida, a
na prevenção da formação de trombos, e os fibrinolíticos
transformação do plasminogênio em plasmina e, por fim, a
são usados como tratamento de intervenção em trombos já
lise da fibrina pela ação da plasmina, com a formação dos
formados - essas classes de fármacos iremos estudar aqui O AAS em baixas doses é utilizado para a profilaxia e
(Figura 7). manejo de doença coronariana aguda, acidente vascular
Antiagregantes plaquetários: São fármacos que impedem a encefálico e infarto agudo do miocárdio.
adesão e ativação de plaquetas (Figura 20). Efeitos adversos:
O tratamento a longo prazo com AAS pode levar a
distúrbios gástricos pela eliminação da citoproteção na
mucosa gástrica, que seria conferida por eicosanoides
(prostaglandinas) produzidos pela COX-1. São eles: dispepsia,
lesão e ulceração da mucosa gástrica.
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B. INIBIDORES DA FOSFODIESTERASE
São fármacos que impedem a degradação do AMPc através
da inibição da enzima que o degrada, a fosfodiesterase.
Logo, ocorre o aumento das concentrações de AMPc
dentro da plaqueta que reduz a ativação plaquetária. O
dipiridamol exerce esses efeitos, porém tem efeito fraco
quando administrado sozinho. Por isso, usa-se dipiridamol
associado com varfarina, a fim de reduzir a formação de
trombos em próteses valvares cardíacas, enquanto a
associação do dipiridamol com ácido acetilsalicílico é indicada
para reduzir a probabilidade de trombose em pacientes.
Efeitos adversos
Esses agentes podem induzir angina em pacientes com
doença arterial coronariana, pois causam vasodilatação e,
apesar de parecer paradoxal, causam um fenômeno
chamado de sequestro coronariano, fazendo com que haja
um desvio do fluxo para as artérias coronárias.
C. INIBIDORES DA VIA DO RECEPTOR ADP
Fármacos como o clopidogrel apresentam dois mecanismos
de ação: inibição de forma irreversível da ligação do
Figura 20: Farmacologia dos antiplaquetários. receptor do ADP, impedindo uma das vias responsáveis pela
Clique nas barras para ver as informações. ativação plaquetária; a inibição do fibrinogênio ao complexo
A. INIBIDORES DA COX GP I b/IIIa. A ticlopidina apresenta os mesmos mecanismos
Esses fármacos inibem a cicloxiogenase (COX), enzima que que o clopidogrel, além de interferir com a ligação do FvW
converte o ácido araquidônico em prostaglandina H2 e, ao receptor membranar GPIb. Esses fármacos não
posteriormente, em TXA2. Este mediador é essencial para a interferem na via da cicloxiogenase, no entanto apresentam
ativação plaquetária, evento fundamental para a agregação efeitos irreversíveis e sinérgicos com AAS, ou com
das plaquetas. O TXA2 liberado pelas plaquetas ativadas age antagonistas do receptor GPIIb/IIIa. São drogas bem
em um receptor acoplado à proteína Gq nas membranas absorvidas por via oral, mas o efeito inibitório sobre as
das plaquetas, essa proteína Gq, ativa a fosfolipase C (PLC), plaquetas só é observado ao final de 4 dias, pois esse é o
enzima que age sobre alguns fosfolipídios de membrana que tempo que leva para toda a cascata de coagulação ser
tem como efeito final a ativação da PLA2 e da GPIIb-II a que inibida. Ou se usa uma dose de ataque, para obter um efeito
é fundamental para o evento de agregação plaquetária que rápido. São indicadas na prevenção secundária de acidentes
foi citado anteriormente. A COX-1 é a isoforma predominante vasculares encefálicos trombóticos em pacientes intolerantes
das plaquetas, enquanto as células endoteliais parecem ao AAS ou em associação com o AAS para prevenir
expressar tanto a COX-1 quanto a COX-2 em condições trombose do stent coronariano.
fisiológicas. Efeitos adversos
Os fármacos dessa classe são todos os anti-inflamatórios não As principais limitações são o efeito antiplaquetário
estereoidais (AINES) e o representante desta classe é irreversível e a variabilidade desse efeito entre os indivíduos.
o ácido acetilsalicílico (AAS), a aspirina. Esta droga difere dos D. ANTAGONISTAS DO GPIIB/IIIA
demais AINES, pois inibe de forma irreversível a COX Essa classe de antiplaquetários inibe a ligação das plaquetas
plaquetária. O efeito do AAS é duradouro, já que as umas com as outras pelo receptor GPIIb/IIIa através da ponte
plaquetas carecem da capacidade de sintetizar novas formada pelo fibrinogênio (como descrito acima). Existem
moléculas de enzima. estratégias farmacológicas para inibir esse receptor. Uma
Como o AAS age tanto na COX-1 quanto na COX-2, de delas é o uso de anticorpo monoclonal humano dirigidos ao
modo não seletivo, essa droga atua como agente não receptor, como o abciximab. Causa a inibição de 50% dos
plaquetário efetivo. Por outro lado, os inibidores seletivos da receptores e causam inibição significativa da coagulação.
COX-2 não podem ser usados como agentes Efeitos adversos
antiplaquetários. Hemorragia, trombocitopenia indução de imunogenicidade.
A tirobifana, é indicada em pacientes de alto risco e no pré- A diferença do mecanismo de ação entre a heparina não
operatório a angioplastia. Uma segunda estratégia é o uso de fracionada e a heparina de baixo peso molecular se dá pela
um análogo de tirosina não peptídico, usado por via oral e ligação à trombina e ao fator X, onde a heparina não
que antagoniza reversivelmente a ligação do fibrinogênio ao fracionada tem tamanho suficiente para se ligar a esses dos
receptor plaquetário GPIIb/IIIa e foi aprovada para pacientes fatores ao mesmo tempo inativando a trombina e o fator X.
com síndromes coronarianas agudas e na angina estável. Já a heparina de baixo peso molecular, só interage é capaz
Anticoagulantes: São fármacos que impedem a formação de de interagir e inativar o fator X (Figura 22).
trombina e a da fibrina. Assim como os antiplaquetários, são
utilizados tanto para prevenção quanto para o tratamento de
doenças trombóticas.
Vamos conhecer os principais representantes desta classe.
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A. VARFARINA
SÉ um anticoagulante oral, um composto derivado da 4-
hidroxicumarina que tem como mecanismos de ação o
antagonismo da vitamina K. Esta vitamina é de extrema
importância para a formação de fatores de coagulação
sanguínea, como o fator I , VII, IX e X, além de cofatores,
como a proteína C e S. A vitamina K é determinante para
que ocorra a carboxilação de resíduos de glutamato nos Figura 22: Efeitos da heparina não fracionada e a heparina
fatores de coagulação descritos acima. Sendo assim, a de baixo peso molecular sobre a trombina e o fator X.
varfarina causa a formação de moléculas incompletas e São fármacos que apresentam algumas diferenças na sua
biologicamente inativas na cascata de coagulação. farmacocinética, na reposta coagulante e na forma de
administração.
Este fármaco é indicado para profilaxia e tratamento da As heparinas são indicadas para o tratamento de trombose
embolia pulmonar, trombose venosa profunda, cardiopatia aguda e na prevenção de trombose venosa profunda,
valvar e no uso de próteses valvares. É administrado por via embolia pulmonar e trombose de válvulas cardíacas.
oral na forma sódica, com meia vida plasmática longa de 36 Efeitos adversos: Trombocitopenia induzida por heparina pela
horas com lenta metabolização e eliminação. Seu efeito formação de anticorpos contra heparina, causando
depende do tempo de protrombina do paciente. extravasamento vascular e acúmulo de sangue no tecido
Efeitos adversos subendotelial.
Hemorragia, hepatite, síndrome de embolização do colesterol Agentes fibrinolíticos: São fármacos que estimulam a
e reação de hipersensibilidade. O antídoto para a hemorragia formação de plasmina e, portanto, a fibrinólise para dissolver
é a administração de vitamina K. um trombo plaquetário. São fármacos que promovem uma
B. HEPARINA NÃO FRACIONADA E BAIXO PESO fluidificação do sangue e utilizados no tratamento da
MOLECULAR trombose venosa profunda, embolia pulmonar e na oclusão
A heparina é uma anticoagulante parenteral, uma mistura vascular periférica aguda. São contraindicados na pericardite
heterogênea de mucopolissacarídeos sulfatados aguda, hemorragia interna, acidente vascular cerebral
(glicosaminoglicano) encontrados na superfície das células recente, feridas profundas, câncer em metástase.
endoteliais. Possui a função de impedir constantemente a Clique nas barras para ver as informações.
coagulação intravascular, impedindo a formação da cascata A. ESTREPTOQUINASE
de coagulação. A heparina interage com a antitrombina, É uma proteína derivada de estreptococos β-hemolíticos
inibindo o fator X e a trombina (Figura 21). como um componente do mecanismo de destruição tecidual
desses microrganismos. Esse fármaco deve ser utilizado por
via IV. Liga-se ao plasminogênio, formando um complexo 1:1
não covalente e estável com o plasminogênio, facilitando a
conversão do plasminogênio a plasmina. Esta última, por sua
vez degrada os polímeros de fibrina, desfazendo a malha de
fibrina formada durante a coagulação.
Efeitos adversos
Muito antigênica, por ser derivada dos estreptococos. O uso
Figura 21: Mecanismos de ação das heparinas não fracionadas prévio é uma contraindicação, pois pode causar anafilaxia.
(A) e de baixo peso molecular (B). B. ATIVADOR DO PLASMINOGÊNIO TECIDUAL
A heparina não fracionada (heparina integral) é preparada a RECOMBINANTE (RT-PA)
partir do pulmão bovino e da mucosa intestinal suína, A alteplase, tenecteplase e reteplase são fármacos
apresenta alto peso molecular de 5 a 30KDa. Já a heparina produzidos pela tecnologia do DNA recombinante. Estas
de baixo peso molecular (BPM) é preparada por moléculas causam fibrinólise dependente da presença de
cromatografia, a partir da heparina não fracionada e seu fibrina, se ligando apenas no local de um trombo. Possui
peso molecular pode variar de 1 a 5KDa, são exemplos os atividade enzimática semelhante à molécula endógena o
fármacos enoxaparina, dalteparina. ativador de plasminogênio, que tem por efeito final a
degradação da fibrina. Acredita-se que essas drogas Esses sinais são resultantes da resposta inflamatória, que se
apresentem menos riscos de hemorragia. inicia após o estímulo lesivo celular. Para entendermos este
processo, abordaremos agora as alterações celulares e
Tema 6 moleculares que ocorrem durante a inflamação.
Fármacos que atuam no metabolismo osteoarticular Inicialmente, os vasos lesionados promovem a liberação de
INTRODUÇÃO diversas substâncias e proteínas plasmáticas, que induzem
O metabolismo osteoarticular compreende uma complexa um aumento da vasodilatação e da permeabilidade vascular.
regulação de diversos componentes em nosso organismo. Logo, este maior fluxo sanguíneo resulta em aumento da
Alterações em sinalizações e respostas celulares neste temperatura (calor) e vermelhidão local (rubor), além de
metabolismo podem promover inúmeros processos permitir o extravasamento de líquido dos vasos sanguíneos
patológicos, que resultam em dores articulares, limitações no para o tecido lesionado, resultando em um
funcionamento das articulações, diminuição da massa óssea, intumescimento (edema).
fratura óssea e, frequentemente, muita dor. A imagem a seguir apresenta os cinco sinais cardinais da
Dentre as indicações clínicas mais frequentes que inflamação:
abordaremos neste material, que envolvem o metabolismo
osteoarticular, estão a osteoporose e a artrite reumatoide. No
entanto, ao longo dos módulos, falaremos de indicações
menos frequentes. Condições que estão associadas ao
processo inflamatório, alterações no remodelamento ósseo e
perda da massa óssea. Neste material, entenderemos quais
respostas celulares podem estar alteradas, ou até mesmo
acentuadas, e, assim, compreender em que situações os Sinais cardinais
diferentes fármacos são utilizados. da reação inflamatória.
A definição destes sinais cardinais ocorreu na Antiguidade,
por médicos gregos, e baseou-se apenas em observações
de processos inflamatórios agudos em órgãos como pele,
cavidade bucal e garganta. Desde então, estes sinais foram
caracterizados como efeitos do processo inflamatório.
Associado a este extravasamento, ocorre também a atração
de leucócitos, que são responsáveis por induzir a liberação
de mediadores solúveis, como citocinas pró-inflamatórias,
histamina, prostaglandinas e leucotrienos. Na prática, ao
examinarmos um paciente com um processo inflamatório
ativo em sua articulação, conseguimos identificar todos esses
O processo inflamatório, que tem por finalidade eliminar o sinais discutidos acima. As articulações ficam edemaciadas,
estímulo lesivo celular, pode não ser resolvido e continuar a quentes e vermelhas.
ocorrer de forma contínua, o que acontece frequentemente Além destes sinais, a liberação de algumas prostaglandinas é
entre as doenças artríticas, caracterizadas por serem os responsável pelo aumento da sensibilidade das terminações
distúrbios inflamatórios crônicos mais comuns nos países nervosas que percebem a dor (nociceptores), denominado
desenvolvidos. Os fármacos anti-inflamatórios são importantes de hiperalgesia. Por fim, como resultado de todos estes sinais,
na modulação ou redução deste processo. o paciente com inflamação em seu joelho, por exemplo,
Abordaremos também as alterações fisiológicas mais tem dificuldade de realizar suas atividades diárias
frequentes relacionadas ao metabolismo ósseo. Dentre elas, a normalmente e, muitas vezes, possui algum tipo de limitação
osteoporose, caracterizada por uma redução na densidade para andar, o que caracteriza a perda de função do membro.
óssea, que leva ao aumento da fragilidade do osso e à maior
incidência de fraturas. Neste cenário, surge a terapia
farmacológica, que atua diretamente no metabolismo ósseo
para prevenir e frear essa perda da matriz óssea.
MÓDULO 1

Identificar a resposta inflamatória e a farmacologia dos anti-


inflamatórios Já entendemos que a resposta inflamatória é desencadeada
não esteroidais utilizados para os distúrbios articulares por um estímulo lesivo. Para que ela ocorra, faz-se
INFLAMAÇÃO necessária a liberação de mediadores solúveis, também
A inflamação é uma importante reação relacionada a denominados de eicosanoides.
inúmeras alterações no metabolismo osteoarticular. Porém, como eles são produzidos e liberados? O que
Entretanto, antes de estudarmos o mecanismo de ação dos acontece ao inibirmos a produção destes mediadores?
principais fármacos anti-inflamatórios, precisamos O principal precursor dos eicosanoides é o ácido
compreender como ocorre essa resposta inflamatória. araquidônico (AA), liberado a partir da hidrólise dos
Você já ouviu falar dos cinco sinais cardinais da inflamação?
fosfolipídeos teciduais pela ação da enzima fosfolipase A2, São induzidas pelo processo inflamatório, por meio das
que é ativada após a lesão celular. citocinas pró-inflamatórias, pelo estresse de cisalhamento e
O AA liberado pode ser metabolizado a partir de duas vias pelos promotores de tumor. Logo, as prostaglandinas
principais: produzidas pela COX-2 têm sua expressão aumentada em
Clique para visualizar as informações decorrência do processo inflamatório.
Via da lipoxigenase
Responsável por dar origem aos leucotrienos, que possuem Em algumas condições patológicas, como na artrite
ação de quimioatração de leucócitos e aumentam a reumatoide, uma doença autoimune, as células do sistema
permeabilidade vascular. imune, que deveriam atacar somente bactérias e elementos
externos, atacam o próprio corpo, invadindo as articulações.
Via das enzimas ciclo-oxigenases (COX) Este estímulo lesivo libera mediadores solúveis de forma
Produz diversas prostaglandinas. Nas células endoteliais, há a permanente. Assim, a lesão não consegue ser resolvida.
produção da prostaciclina (PGI2), capaz de promover a Neste contexto, os fármacos anti-inflamatórios são
vasodilatação e inibir a agregação plaquetária. Nas plaquetas, importantes para frear este processo crônico. Portanto, após
há a produção de tromboxano (TxA2), que promove a definirmos os principais protagonistas do processo
vasoconstrição e a agregação plaquetária. Em leucócitos e inflamatório, é possível entender como e por que utilizamos
células imunes, há a produção de Prostaglandina D2 (PGD2) os medicamentos anti-inflamatórios, que podem ser
e Prostaglandina E2 (PGE2), que promovem vasodilatação, classificados em esteroidais e não esteroidais.
permeabilidade vascular, hiperalgesia e febre (elas elevam o ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDAIS (AINE)
ponto de ajuste hipotalâmico para o controle da Inicialmente, começaremos a discutir sobre os anti-
temperatura). inflamatórios não esteroidais (AINEs), que são importantes
medicamentos devido à grande utilização clínica e aos seus
A imagem a seguir apresenta esse processo de liberação e efeitos analgésicos, antitérmicos e anti-inflamatórios.
metabolismo do ácido araquidônico (AA). Atualmente, existem mais de 50 AINEs diferentes disponíveis
no mercado mundial, que compartilham do mesmo
mecanismo de ação.
A partir do entendimento da resposta inflamatória,
conseguimos compreender o mecanismo de ação dos
AINEs. A maioria deles são inibidores competitivos das
enzimas COX, competindo estruturalmente com o AA, e,
portanto, interrompem a formação das prostaglandinas.
Assim, os AINEs reduzem o edema, a vasodilatação, a
quimiotaxia de leucócitos, a febre e a dor. Porém, apesar de
reduzirem a resposta inflamatória, os AINEs não apresentam
efetividade sobre a doença crônica de base, como, por
exemplo, liberação de enzimas lisossômicas, que contribuem
para o dano tecidual presente na artrite reumatoide.

Vias de liberação e metabolismo do ácido araquidônico (AA)


e síntese dos eicosanoides.
Existem duas isoformas da enzima COX:
Clique para visualizar as informações.
COX-1
Expressa na maioria das células e dos tecidos, é
caracterizada como constitutiva, ou seja, a sua expressão
não é induzida pela resposta inflamatória. A COX-1 é muito
importante, pois as prostaglandinas produzidas por ela
contribuem com diversas funções fisiológicas, como a
citoproteção gástrica, autorregulação do fluxo sanguíneo
renal e no início do parto. Por outro lado, por possuírem
importantes contribuições homeostáticas, de “manutenção”, a
Atenção
inibição de COX-1 geralmente está associada a inúmeros
É importante salientarmos que a maioria dos AINEs inibe de
efeitos deletérios ao organismo, como lesões às mucosas
forma não seletiva a COX-1 e a COX-2. Este conceito é
gastrointestinais, náuseas, vômitos, distúrbio da função renal,
importante, pois os AINEs que inibem preferencialmente a
alterações hemodinâmicas e distúrbios da função uterina.
COX-2 apresentam maior potencial anti-inflamatório do que a
COX-2
inibição da COX-1, enquanto os principais efeitos indesejáveis
estão relacionados à inibição da COX-1. Quando os AINEs não Quando utilizado em baixas dosagem, o AAS inibe
seletivos são utilizados em doenças articulares, em altas preferencialmente a COX-1 plaquetária (ligação irreversível),
doses e de uso contínuo, há aumento destes efeitos reduzindo a formação de TxA2, e, consequentemente a
adversos – sobretudo os que afetam o trato gastrointestinal. agregação plaquetária. O uso crônico deste fármaco
De acordo com esses conceitos, para facilitar o assegura essa inibição durante toda a vida útil das plaquetas
entendimento, começaremos agora a estudar as principais (10 dias); por serem anucleadas, não são capazes de produzir
propriedades farmacológicas dos AINEs. Eles possuem novas enzimas COX. Este efeito antiplaquetário, apesar de
diversas particularidades que abordaremos ao longo deste ser minimamente encontrado em todos os AINEs não
módulo, como a estrutura química, seletividade para as seletivos, não é clinicamente detectado de forma tão intensa
isoformas da COX, as indicações clínicas, os efeitos colaterais como acontece com o AAS.
e as contraindicações. Para obtenção do efeito anti-inflamatório, faz-se necessária
uma dose muito alta, o que, na prática clínica, não acontece
com frequência devido à presença de muitos efeitos
colaterais e a disponibilidade de outros AINEs com maior
potência anti-inflamatória no mercado.

As principais indicações clínicas de baixa dose do AAS são


Classificação dos AINEs com base na sua semelhança voltadas ao seu efeito antiagregante para pacientes com
química e seletividade das isoformas da COX. risco de infarto agudo do miocárdio (IAM), acidente vascular
De forma geral, a maioria dos AINEs é bem absorvida por via encefálico (AVE), cardiopatas, angina instável e trombose.
oral, com boa disponibilidade. Ligam-se extensamente às Além disso, possui indicação antipirética e analgésica no
proteínas plasmáticas e distribuem-se amplamente por todo tratamento de dores leves a moderadas (cefaleia,
o corpo, inclusive nas articulações, proporcionando maior dismenorreia, mialgias, artralgias, pós-parto, cirurgias
efeito local anti-inflamatório. Sofrem biotransformação odontológicas e procedimentos ortopédicos).
hepática e possuem excreção renal. Por este motivo, muitas Entretanto, mesmo com a utilização destes fármacos em
vezes, são contraindicados em pacientes que possuem doses baixas, pode estar associada à irritação na mucosa
insuficiência hepática e renal. A maioria dos fármacos são gástrica e até mesmo ao sangramento. Por isso, o AAS é
biotransformados por enzimas do complexo do citocromo contraindicado em pacientes com úlcera péptica, gastrite ou
P450, e, portanto, é importante orientar o paciente no com sangramento gastrointestinal. Os pacientes também
sentido de evitar a automedicação durante a terapia com os podem desenvolver hemorragias devido aos seus efeitos
AINEs, devido à possiblidade de interações medicamentosas. antiplaquetários. Desta forma, o AAS também é
PRINCIPAIS PROPRIEDADES FARMACOLÓGICAS DOS AINES contraindicado para pacientes que já utilizam outra terapia
Ácido acetilsalicílico (AAS) anticoagulante ou que possuem alterações na coagulação.
O AAS foi o primeiro AINE sintetizado, derivado dos Neste sentido, por que o AAS é contraindicado em
salicilatos, e é um dos AINEs mais consumidos em todo o pacientes com dengue?
mundo. Seu mecanismo de ação é uma exceção dentro dos Como o AAS reduz a formação de Tromboxina A2 (TxA2)
AINEs, pois atua como inibidor irreversível da COX-1, além de plaquetário e a agregação plaquetária, considerando que o
inibir de forma reversível a COX-2. paciente já se encontra em um quadro
O AAS é administrado por via oral, absorvido rapidamente e de trombocitopenia (dengue), o risco deste paciente
sofre rápida hidrólise, produzindo salicilato. Apresenta um apresentar quadro hemorrágico pode aumentar
tempo de meia-vida (T1/2) de 15 minutos, mas um tempo de consideravelmente.
ação entre 6 e 12 horas. Possui ampla distribuição e Também se recomenda a interrupção do tratamento com
encontra-se em 80-90% na sua forma ligada à proteína AAS antes de procedimentos cirúrgicos (risco de
plasmática. É capaz de atravessar a barreira hemorragias) e durante a gravidez (promovem a inibição do
hematoencefálica, placentária, líquido sinovial, peritoneal, saliva, trabalho de parto).
fezes, leite e suor. EFEITOS ADVERSOS
Alguns indivíduos podem apresentar efeitos pulmonares, anorexia, dispepsia, náusea, úlcera péptica, sangramento
como o broncoespasmo, efeito relacionado ao aumento da gastrointestinal, e estão relacionados aos pacientes que
síntese dos leucotrienos (promovem a broncoconstrição). O utilizam este fármaco (de 35 a 50%). Outros efeitos
uso do AAS também pode promover alterações renais e colaterais são decorrentes ao efeito do fármaco no SNC,
hepáticas por onde são metabolizados e eliminados. Outro como cefaleia, tonturas, confusão mental. Por isso, não são
efeito adverso raro, mas grave, é denominado síndrome de indicados para idosos, pacientes com epilepsia, transtornos
Reye, em que foi encontrada uma associação entre o uso de psiquiátricos ou doença de Parkinson. Outros efeitos
AAS em indivíduos diagnosticados com Influenza e o colaterais mais raros também podem ocorrer, como a
aumento do risco de encefalite associado ao quadro de neutropenia, trombocitopenia, anemia aplástica, erupções
degeneração gordurosa hepática. Este mecanismo ainda cutâneas, prurido, urticária e crises agudas de asma. Devem
permanece desconhecido. ser utilizados somente depois que outros anti-inflamatórios
Atenção menos tóxicos forem ineficazes.
Uma importante interação medicamentosa acontece com a
administração do AAS e da varfarina. O AAS pode promover
o aumento do efeito da varfarina por induzir o seu
deslocamento das proteínas plasmáticas, além de alterar os
mecanismos hemostáticos sobre as plaquetas.
Diclofenaco
Embora seja classificado como inibidor não seletivo, o
diclofenaco apresenta maior seletividade à COX-2 em
relação à COX-1. Dessa forma, apresenta uma potente ação
anti-inflamatória, associada aos efeitos antipiréticos e
analgésicos.
Pode ser administrado pela via oral, retal, solução oftálmica
ou em adesivo tópico. É rapidamente absorvido após
administrado oralmente e encontra-se 99% ligado a
proteínas plasmáticas. Possui T1/2 curto de aproximadamente
1-2 horas. Sofre intenso efeito de primeira passagem e possui Ibuprofeno
50% de biodisponibilidade. São metabolizados principalmente O ibuprofeno, derivado do ácido propiônico, compartilha
pelo fígado e excretados via renal (65%) e biliar (35%). diversas características com os outros derivados, como o
naproxeno e o cetoprofeno. É inibidor não seletivo da COX,
Embora possua um T1/2 plasmática curto, ele se acumula no mas apresenta redução das funções leucocitárias em doses
líquido sinovial, aumentando seu efeito terapêutico. Por isso, mais altas e, consequentemente, possui potente efeito anti-
muitas vezes, são indicados para o tratamento em longo inflamatório.
prazo da artrite reumatoide, osteoartrite e a espondilite São administrados via oral, possuem um T1/2 de
anquilosante. Em decorrência de seus efeitos analgésicos, são aproximadamente 2 horas (naproxeno possui T1/2 mais longo,
indicados para a dismenorreia primária e enxaqueca. entre 9 e 25 horas). Após a sua absorção, o ibuprofeno é
EFEITOS ADVERSOS distribuído lentamente nos espaços sinoviais e, mesmo
Da mesma forma que a maioria dos AINEs, os principais quando há a queda na concentração plasmática do fármaco,
efeitos adversos do diclofenaco são relacionados ao trato o efeito antiartrítico se mantém. O ibuprofeno é
gastrointestinal (TGI), como sangramentos e ulcerações, além metabolizado no fígado e eliminado na urina.
da hepatotoxicidade, com o aumento das transaminases. Para Estes fármacos possuem indicação clínica para o tratamento
diminuir estes efeitos, atualmente tem-se realizado a sua da artrite reumatoide, artrite juvenil, osteoartrite, tendinite,
associação com o misoprostol (derivado sintético da dor de dente e dismenorreia primária.
prostaglandina PGE1) para proteção do TGI. O misoprostol EFEITOS ADVERSOS
reduz a secreção de ácido gástrico e estimula a produção Os principais efeitos adversos estão relacionados ao TGI,
de muco e bicarbonato. O diclofenaco não é recomendado mas também podem apresentar trombocitopenia,
para crianças, gestantes e lactantes. agranulocitose, erupções cutâneas, cefaleia, tonturas e
Indometacina prolongamento do tempo de sangramento. São
Apresenta potência anti-inflamatória de 10 a 40 vezes maior contraindicados em pacientes com hipersensibilidade cruzada,
que o AAS, embora seja um inibidor não seletivo da COX. doenças gastrointestinais e insuficiência hepática e renal.
São administrados por via oral, possuem um T1/2 de Ácido mefenâmico e meclofenamato
aproximadamente 2 horas e se ligam a 99% das proteínas O ácido mefenâmico e meclofenamato são derivados dos
plasmáticas. É metabolizado no fígado. Possui indicação clínica fenamatos. Eles são inibidores não seletivos da COX, com
para o tratamento da artrite reumatoide, artrite gotosa eficácia semelhante ao AAS. São indicados para o
aguda, osteoartrite e espondilite moderada, além de poder tratamento de curta duração da dor em tecidos moles, além
ser utilizado para acelerar o fechamento do canal arterial. dos casos de artrite reumatoide, osteoartrite e dismenorreia.
EFEITOS ADVERSOS EFEITOS ADVERSOS
Os efeitos colaterais mais comuns da indometacina também Os efeitos adversos mais frequentes são a elevação das
estão relacionados ao TGI, como pancreatite, dor epigástrica, transaminases hepáticas e as alterações no TGI (diarreia e
desconforto gástrico). A anemia hemolítica autoimune pode Esse medicamento é absorvido por via oral, metabolizado no
acontecer, mas não é frequente. São contraindicados para fígado e eliminado no rim. Por apresentar um T1/2 mais longo
crianças, grávidas e pacientes com patologias no TGI e renal. e demorar alguns dias para alcançar o estado de equilíbrio
Acetaminofeno ou paracetamol dinâmico, não é indicado para o controle da dor e febre
O acetaminofeno também atua como inibidor não seletivo da aguda, mas é muito recomendado para o tratamento crônico
COX, embora possua maior afinidade pela COX presente no de artrite reumatoide e osteoartrite.
SNC. Desta forma, é capaz de promover os efeitos EFEITOS ADVERSOS
analgésicos e antipiréticos, mas não é capaz de se ligar às Aproximadamente 20% dos pacientes apresentam efeitos
COX periféricas e promover os efeitos anti-inflamatórios. adversos, como alterações no TGI, cefaleia, zumbidos,
Assim, o acetaminofeno é classificado dentro dos AINEs, mas edema, prurido, erupções cutâneas, aumento das
não possui ação anti-inflamatória. transaminases, anemias, dentre outros. O piroxicam é
É rapidamente absorvido por via oral, mas, em comparação contraindicado para lactantes.
aos outros AINEs, possui ligação fraca às proteínas Nimesulida
plasmáticas (20-50%). É indicado para o alívio da febre e dor A nimesulida é um importante inibidor não seletivo, mas
de intensidade leve a moderada (dores dentárias, mialgia e preferencial da COX-2, e, desse modo, apresenta potente
cefaleias). É menos eficiente nas dores inflamatórias e efeito anti-inflamatório, associado aos efeitos analgésicos e
viscerais. antipirético. Possui um T1/2 de aproximadamente 6 horas, é
EFEITOS ADVERSOS metabolizada no fígado e excretada principalmente na urina.
Não possui efeitos adversos intensos em doses terapêuticas. É indicada para o tratamento de estados febris, nos
Entretanto, a sua metabolização em altas doses está processos inflamatórios e dolorosos das vias aéreas
relacionada com a geração de um metabólito tóxico (NAPQI), superiores, cefaleia, mialgias, reações pós-imunização e dor
que necessariamente deve ser conjugado e excretado no pós-operatória. Seu uso na Europa é limitado a, no máximo,
rim. Caso contrário, pode culminar em quadros de 15 dias, devido ao risco de hepatotoxicidade.
hepatotoxicidade e necrose hepática. É contraindicado em Celecoxibe
pacientes com insuficiência hepática e renal. O paracetamol é Os inibidores seletivos da COX-2, também denominados de
um dos principais causadores de intoxicação medicamentosa, coxibes, foram desenvolvidos na tentativa de inibir a síntese
principalmente em crianças. Entretanto, em casos de das prostaglandinas pela COX-2 induzida em locais de
intoxicação, podemos utilizar a N-Acetilcisteína e a vitamina K inflamação (produzindo potente efeito anti-inflamatório), sem
para diminuir a absorção e reverter o risco de sangramento afetar a ação da COX-1 de “manutenção”. O desenvolvimento
destes pacientes. de fármacos mais seletivos só foi possível devido a pequenas
diferenças na estrutura da enzima da COX.
Dipirona A seletividade dos coxibes proporcionou uma redução dos
Derivada dos pirazolônicos, possui efeito analgésico e casos de sangramentos gástricos. No entanto,
antipirético, mas sem efeito anti-inflamatório nas doses usuais surpreendentemente, surgiram diversas evidências entre o
pela mesma diferença de afinidade pela COX descrita para o uso dessa classe de fármacos e o aumento de eventos
paracetamol. Possuem inúmeras formas de administração, cardiovasculares, como IAM e o AVE – complicações
dentre elas, comprimido, supositório e injetável. É relacionadas à inibição da produção das prostaglandinas
metabolizada no fígado e excretada no rim. Dentre as cardioprotetoras derivadas da COX-2 e acúmulo de
inúmeras indicações, é recomendada para o tratamento da TxA2 derivados da COX-1 plaquetária.
febre, enxaqueca e dismenorreia. Dentre os fármacos sintetizados e liberados no Brasil, o
EFEITOS ADVERSOS celecoxibe é um inibidor seletivo da COX-2 maior (entre 10 e
Os principais efeitos adversos também são relacionados ao 20 vezes) quando comparado a COX-1. Administrado por via
TGI, mas apresentam uma reação adversa muito rara, oral, é bem absorvido e encontra-se ligado 97% a proteínas
porém muito grave, que promove a depressão da medula plasmáticas e possui um T1/2 de aproximadamente 11 horas. É
óssea, acompanhada de agranulocitose, púrpura, metabolizado no fígado e, em casos de disfunção hepática,
trombocitopenia, anemia aplástica; por isso, a sua utilização é este T1/2 pode aumentar. Podem apresentar interações
abolida em diversos países. Assim, não são indicadas aos medicamentosas, pois sofre biotransformação pelas enzimas
indivíduos com alterações no TGI e com discrasias do citocromo P450 (CYP2C9). Diversos medicamentos
sanguíneas. podem aumentar seus níveis séricos.
Piroxicam Atualmente, está aprovado no Brasil para o tratamento de
Derivado dos oxicam, compartilha características com o artrite reumatoide, osteoartrite, dismenorreia primária e para
meloxicam. É potente inibidor não seletivo da COX em dores de intensidade de leve a moderada. No tratamento da
comparação aos outros AINEs. Embora o meloxicam iniba dor, a eficácia do celecoxibe é similar à dos AINEs.
preferencialmente a COX-2 em comparação a COX-1, não é
considerado inibidor seletivo. Em altas concentrações, o
piroxicam também inibe a ativação de neutrófilos
independentemente de COX, diminui a produção de radicais
de oxigênio, inibe a função dos linfócitos e a colagenase na
cartilagem, característica de quadros de artrite.
Estrutura química do
celecoxibe. Artrite reumatoide
EFEITOS ADVERSOS
Os principais efeitos adversos da utilização do celecoxibe são
os eventos cardiovasculares, hipertensão, alterações
gastrointestinais e renais. Também foi observado que o uso
crônico deste medicamento reduz a densidade óssea e
retarda a cicatrização e a consolidação óssea. Ele é
contraindicado em pacientes com alto risco cardiológico.

Atenção
Após pontuarmos as principais propriedades farmacológicas
dos AINEs, podemos observar que existem inúmeros AINEs
com diferentes características. Portanto, não existe um AINE
que seja o melhor para todos os pacientes e para
determinada condição clínica exclusiva. Entretanto, pode
Trânsplante de órgãos
haver um ou dois AINEs mais apropriados para determinado
indivíduo, e este deve ser escolhido baseado em suas
condições clínicas.
ESTUDO DE CASO
Neste vídeo, o Professor Pedro Azevedo apresenta um
estudo de caso sobre o uso de anti-inflamatórios não
esteroidais em distúrbios articulares.
MÓDULO 2

Identificar as propriedades farmacológicas dos


Asma
glicocorticoides, anti-histamínicos e fármacos antirreumáticos,
No entanto, antes de detalharmos o seu mecanismo de
os mecanismos de ação, as principais indicações clínicas, os
ação, precisamos entender a regulação de sua síntese e
efeitos colaterais e as contraindicações
liberação na corrente sanguínea.
GLICOCORTICOIDES
Além dos glicocorticoides, o córtex da supra renal também
Os glicocorticoides possuem potente efeito anti-inflamatório,
produz os mineralocorticoides e os androgênios. Dentre os
mas também imunossupressor. Diferentemente dos AINEs,
glicocorticoides, o cortisol ou hidrocortisona é o mais
são hormônios esteroides produzidos no córtex da medula
importante, pois é essencial para a vida e capaz de regular
suprarrenal, e seus análogos sintéticos estão entre os
grande variedade de funções cardiovasculares, metabólicas,
fármacos prescritos com maior frequência. A utilização dos
imunológicas e homeostáticas. A síntese do cortisol é
glicocorticoides contém importantes implicações para
coordenada a partir da ativação do eixo hipotálamo-hipófise-
diversas condições clínicas, como:
suprarrenal (HHA), que funciona em resposta a ritmos
circadianos centrais, além de poder ser ativado em resposta
a estresse físico, emocional, lesões, dor, frio e hipoglicemia.
A regulação do eixo segue as seguintes etapas:
Clique nas informações a seguir.
Primeira etapa
Segunda etapa
Terceira etapa
Como este eixo é regulado pelo ritmo circadiano, a terapia
com os glicocorticoides deve mimetizar o ciclo fisiológico.
Pela manhã, temos um pico do ACTH e, em resposta a este
aumento, ocorre maior liberação de cortisol. Desta forma,
sugere-se fracionar a medicação em uma dose maior pela
manhã e o restante ao longo do dia.
Conforme já exposto, este eixo HHA é extremamente
importante para a produção do cortisol. Entretanto, por meio
da regulação por retroalimentação negativa, muitas vezes,
esse eixo é suprimido devido à presença constante e em
altas doses de glicocorticoide, comum em terapias
farmacológicas crônicas, e, consequentemente, promove a
supressão da liberação de CRH e ACTH. Essa supressão do
eixo HHA está associada à atrofia do suprarrenal e à
ausência de todas as substâncias produzidas por ela.
Uma vez liberado, o cortisol é capaz de induzir inúmeros
efeitos metabólicos e anti-inflamatórios. Porém, como ele é
capaz de promover estes efeitos?
A indução destes efeitos ocorre através da alteração da
expressão de RNAm de diversos genes e proteínas. Essa
alteração ocorre devido à interação do complexo esteroide
(cortisol) e o seu receptor intracelular, em regiões
especificas do DNA (elementos de resposta aos
glicocorticoides), que culmina em alterações da transcrição
gênica.
Os efeitos metabólicos estão associados a alterações
principalmente no fígado, no músculo e no tecido adiposo. Síndrome de Cushing. Síndrome provocada pela exposição
EFEITOS ADVERSOS excessiva a glicocorticoides. Os efeitos menos frequentes
Muitos pacientes que fazem uso crônico de glicocorticoides estão descritos entre parênteses.
apresentam elevação dos níveis plasmáticos de glicose Os efeitos metabólicos, especificamente em um momento
(aumento da gliconeogênese), resistência à insulina, que pode de estresse, são benéficos. No entanto, como a terapia com
resultar em diabetes melito. Os pacientes também podem os glicocorticoides mimetiza e os induz cronicamente, muitas
apresentar inibição da absorção de cálcio mediada pela vezes os principais efeitos adversos encontrados durante a
vitamina D e redução direta da função dos osteoblastos, utilização destes medicamentos estão relacionados com a
mecanismos que contribuem para a perda óssea. intensificação destas alterações metabólicas.
Frequentemente, a terapia prolongada com os Além destes efeitos metabólicos, conforme citado acima, o
glicocorticoides leva ao desenvolvimento de osteoporose e à cortisol também apresenta múltiplas ações anti-inflamatórias,
diminuição da velocidade de crescimento linear do osso em que são amplamente implicadas na clínica.
crianças, que pode culminar no retardo do crescimento. O cortisol promove a redução da expressão de diversas
Os glicocorticoides também podem induzir atrofia das fibras citocinas inflamatórias (IL-1, IL-2, IL-6 e TNF-α), reduz a
musculares, resultado do catabolismo de proteínas e produção e ativação de células T, a liberação de histamina,
fraqueza dos músculos. Também induzem à lipólise e dos mediadores da inflamação, como o fator nuclear κB
determinam redistribuição característica da gordura, com (NF-κB), e suprime a ativação dos leucócitos circulantes.
perda periférica das reservas de tecido adiposo e obesidade Porém, de forma contrária, promove o aumento de IL-10
central, com a deposição excessiva de gordura na nuca (giba (citocina anti-inflamatória) e Anexina-1, que é fundamental pela
de búfalo) e na face (fácies de lua cheia). Essas inibição da fosfolipase A2.
características são observadas em pacientes que
apresentam a síndrome de Cushing, em que existe
produção em excesso dos glicocorticoides.

A imagem a seguir apresenta os efeitos provocados pela


síndrome de Cushing.

No módulo 1, falamos sobre a fosfolipase A2. Ela é


responsável pela liberação do AA e, consequentemente,
pela produção das prostaglandinas induzidas durante a
resposta inflamatória. Portanto, de forma diferente dos AINEs,
os glicocorticoides também bloqueiam a indução da resposta
inflamatória.
Baseado na importância dos efeitos que discutimos até
agora, a terapia farmacológica com os glicocorticoides está
indicada para duas finalidades principais. Os glicocorticoides
exógenos podem ser utilizados em doses fisiológicas, como
terapia de reposição nos casos de insuficiência suprarrenal
(Ex.: doença de Addison). Esta terapia de reposição deve ser
feita com muita cautela, para não haver super
disponibilização do cortisol, indução à síndrome de Cushing e
supressão do eixo HHA. Além desta indicação clínica, com
maior frequência, os glicocorticoides podem ser
administrados em doses farmacológicas para suprimir a
inflamação e as respostas imunes associadas a certos
distúrbios, como a artrite reumatoide.
Atenção
A terapia farmacológica com os glicocorticoides também não
corrige a etiologia da doença subjacente, assim como os Relação entre a duração da ação, potência anti-inflamatória e
AINEs. Eles apenas limitam os efeitos da inflamação. Por esse atividade retentora de sal dos glicocorticoides naturais e
motivo, a interrupção da terapia crônica com glicocorticoides sintéticos mais utilizados. As atividades são todas relativas ao
frequentemente resulta no reaparecimento dos sintomas cortisol (hidrocortisona), que é considerado como 1.
inflamatórios, a menos que o distúrbio tenha sofrido remissão Os glicocorticoides ainda podem ser classificados de acordo
espontânea ou tenha sido tratado por outros fármacos que com o tempo de ação, que pode ser curto, intermediário ou
discutir adiante. longo. Os agentes de ação curta apresentam T1/2 tecidual de
Existem inúmeros análogos de glicocorticoides desenvolvidos menos de 12h, enquanto os de ação longa possuem T1/2 de
a partir de alterações na estrutura química do cortisol. mais de 48h. Em geral, os glicocorticoides com maior
potência anti-inflamatória apresentam maior duração de ação.
Diferentes métodos de administração possibilitam o
direcionamento mais seletivo dos glicocorticoides para
determinado tecido, podendo ser inalados, aplicados
topicamente, administrados por via oral, parenteral e
intramuscular. Pensando na terapia específica para o
tratamento de inflamações na articulação, uma das opções é
administrar os glicocorticoides localmente (intra-articular),
atingindo concentrações muitas vezes mais altas que a
concentração plasmática normal, minimizando os efeitos
adversos sistêmicos.
Estrutura química de análogos dos glicocorticoides. Os Os glicocorticoides sofrem biotransformação hepática e renal.
diferentes análogos foram sintetizados a partir de alterações Neste contexto, a cortisona e a prednisona são pró-
na estrutura química comum do cortisol, destacadas em azul. fármacos inativos, que precisam ser convertidos pelo fígado
Essas modificações são responsáveis pelas diferentes ao fármaco ativo. Por isso, devem ser evitados em pacientes
potências anti-inflamatórias encontradas. Além disso, algumas com insuficiência hepática e, por serem metabolizados pelas
destas alterações podem aumentar a afinidade ao receptor enzimas do citocromo P450, também podem promover
mineralocorticoide, que promove a síntese da aldosterona e interações farmacológicas.
a regulação hidroeletrolítica (induz ao aumento da retenção Dentre as principais indicações clínicas para redução da
de sódio, à hipopotassemia, expansão do volume e inflamação, encontram-se a utilização para:
hipertensão). Doenças pulmonares
O efeito terapêutico ideal de um glicocorticoide é a máxima Asma brônquica
atividade anti-inflamatória e mínima atividade Doenças vasculares e do colágeno
mineralocorticoide. Porém, muitas vezes, é difícil separar Artrite reumatoide, lúpus eritematoso
estes efeitos, e muitos indivíduos, durante a terapia com os Processos alérgicos
glicocorticoides, apresentam retenção de líquido e edema Dermatite de contato, rinite alérgica
característicos. Doenças hematológicas
Ao compararmos a potência anti-inflamatória entre os Leucemias, anemias
diferentes análogos, a prednisolona e a metilprednisolona são Doenças gastrointestinais
até cinco vezes mais potentes em relação ao cortisol, Doença inflamatória do intestino – doença de Crohn
embora ambas possuam menor potência mineralocorticoide. Doenças infecciosas
A dexametasona apresenta potência anti-inflamatória 30 Sepse
vezes superior ao cortisol, mas praticamente nenhuma Doenças neurológicas
atividade mineralocorticoide. Por outro lado, a fludrocortisona Redução do edema cerebral
possui intensa potência mineralocorticoide (125 vezes maior) Transplante de órgãos
e potência anti-inflamatória dez vezes maior em comparação Diminui a resposta imune e previne a rejeição
ao cortisol. As diferentes potências anti-inflamatórias e Processos inflamatórios osteoarticulares
mineralocorticoides (atividade retentora de sal) estão Artrites e bursites
descritas na figura a seguir.
A hidrocortisona é o fármaco de escolha na terapia de prostaglandinas. Ela promove o aumento do fluxo sanguíneo,
reposição. A prednisolona é o fármaco de escolha para da permeabilidade vascular e a formação de edema. O
efeitos anti-inflamatórios e imunossupressores sistêmicos. Em conhecimento dessas diversas ações da histamina levou ao
comparação, a betametasona e a dexametasona também desenvolvimento de vários fármacos largamente utilizados,
possuem estes mesmos efeitos anti-inflamatórios e que regulam estes efeitos, denominados anti-histamínicos.
imunossupressores, mas são usadas especialmente em ANTI-HISTAMÍNICOS
situações em que a retenção hídrica precisa ser evitada. Os fármacos denominados anti-histamínicos são antagonistas
A terapia crônica com os glicocorticoides deve ser específicos ao receptor de histamina (H1) e divididos em duas
constantemente monitorada por causa da possibilidade da categorias:
supressão do eixo HHA e a não produção fisiológica do
cortisol. Assim, a interrupção abrupta da terapia crônica com
glicocorticoides está associada à redução drástica do cortisol
no organismo, resultando em uma “crise adrenal aguda”,
associada a diversos efeitos colaterais, como hipotensão,
choque, desidratação, taquicardia, náusea, vômito, anorexia,
fraqueza e confusão mental.

Primeira geração
Difenidramina, hidroxizina, clorfeniramina e prometazina.

Atenção
A interrupção do tratamento crônico associada à supressão
do eixo HHA pode promover agravamento da doença
inflamatória em curso devido à desinibição do sistema imune.
Portanto, é inquestionável o fato de que o tratamento
crônico com os glicocorticoides deve ser reduzido
progressivamente, possibilitando a recuperação gradual da
função normal do eixo HHA. Podem ser necessários muitos
meses para o retorno da função normal após a suspensão Segunda geração
dos fármacos. Loratadina, cetirizina, fexofenadina, levocetirizina e
Para o uso sistêmico agudo (duração inferior a sete dias), desloratadina.
qualquer representante pode ser administrado, pois não se São bem absorvidos pelo trato gastrintestinal após
observam efeitos indesejáveis ou a supressão do eixo HHA. administração oral e alcançam concentrações plasmáticas
A partir de sete dias, dependendo da dose utilizada, já existe máximas entre duas e três horas. Também podem
a possibilidade da supressão do eixo HHA. Quando se faz ser administrados topicamente. Sofrem metabolização
necessário o prolongamento da terapia com glicocorticoides, hepática e devem ter suas doses ajustadas para pacientes
a utilização em dias alternados pode reduzir a supressão do com insuficiência hepática. Como são inibidores das enzimas
eixo HHA ou o surgimento dos efeitos adversos. hepáticas do citocromo P450, os anti-histamínicos também
EFEITOS ADVERSOS podem afetar o metabolismo de outros fármacos que
Como pontuado ao longo deste tópico, os efeitos adversos utilizam o mesmo sistema. São eliminados na urina.
dos glicocorticoides frequentemente ocorrem com doses Os anti-histamínicos de primeira geração atravessam a
elevadas ou durante a terapia prolongada. Efeitos que estão barreira hematoencefálica, onde bloqueiam as ações dos
associados principalmente às alterações do metabolismo. A neurônios histaminérgicos no SNC. Enquanto os de segunda
terapia com os glicocorticoides é contraindicada em inúmeras geração não a atravessam. Além disso, os de primeira
situações, como em pacientes com úlcera péptica, geração são menos seletivos, e, além de se ligarem ao
tuberculose, doença cardíaca, diabetes, osteoporose, receptor H1, ligam-se aos receptores colinérgicos, α-
glaucoma e durante a gravidez. adrenérgicos e serotoninérgicos. Essas diferenças refletem
os principais efeitos adversos gerados por eles.
Você lembra dos cinco cardinais da inflamação apresentados EFEITOS ADVERSOS
no módulo 1? E como eles são gerados? Depressão do SNC (sonolência), cardiotoxicidade, visão
A histamina, encontrada em muitos tecidos e liberada pelos embaçada, constipação e, principalmente, boca seca.
mastócitos, também é um importante mediador destes Também foram desenvolvidos fármacos antagonistas
processos inflamatórios e alérgicos, associados às competitivos e agonistas inversos contra os receptores H2,
H3 e H4, como a cimetidina e a ranitidina. Ambos são O metotrexato é antagonista do ácido fólico (inibe a
antagonistas dos receptores H2 seletivos e inibem a produção de citocinas), possui atividade citotóxica,
secreção de ácido gástrico induzida por histamina, indicadas imunossupressora e potente efeito antirreumático.
para tratar o refluxo e a úlcera péptica. Os efeitos adversos Atualmente, tornou-se a base do tratamento de pacientes
destes fármacos são insignificantes. com artrite reumatoide. Foi observado que ele retarda o
Embora a liberação de histamina seja evidentemente capaz aparecimento de novas erosões nas articulações envolvidas.
de produzir muitos dos sinais e sintomas inflamatórios, os Em comparação a outros ARMD, possui um início de ação
antagonistas da histamina não têm muita utilidade clínica mais rápido (3 a 6 semanas). Em muitos casos, ele é utilizado
sobre a resposta inflamatória em si, pois outros mediadores, em associação com diferentes ARMD e moduladores de
como as prostaglandinas, são mais importantes. Ainda assim, citocinas. Sua administração ocorre uma vez por semana,
os anti-histamínicos possuem indicação clínica para tratar em baixa dosagem, minimizando os efeitos adversos. Dentre
condições como alergia, prurido, náuseas, vômitos, cinetose eles, os mais comuns estão a ulceração das mucosas e
e insônia. Preparações tópicas podem ser utilizadas para náusea. Se usado cronicamente, podem ocorrer discrasias
picadas de insetos. sanguíneas e cirrose hepática, e, por isso, o tratamento deve
Portanto, ainda que os anti-histamínicos possuam inúmeras ser monitorado atentamente.
aplicações clínicas, não existem indicações da sua utilização SULFASSALAZINA
para o tratamento das inflamações osteoarticulares. A sulfassalazina produz remissão na artrite reumatoide ativa.
Entretanto, atualmente, o receptor H4 constitui um alvo Ela também é usada para doença inflamatória intestinal
molecular de estudos para o desenvolvimento de novos crônica. Pode atuar removendo metabólitos tóxicos do
fármacos, com o objetivo de bloquear respostas inflamatórias oxigênio produzidos por neutrófilos, mas o seu mecanismo
induzidas pelos mastócitos e eosinófilos, e, assim, novos de ação no tratamento da artrite reumatoide permanece
fármacos no futuro poderão ser utilizados no tratamento da desconhecido. Embora seja administrada por via oral, possui
artrite reumatoide e outras patologias. reduzida biodisponibilidade. O início de sua atividade pode
demorar de 1 a 3 meses. Distúrbios gastrointestinais, mal-estar
e cefaleia são os efeitos adversos mais comuns, mas
também podem ocorrer reações cutâneas, leucopenia e
depressão da medula óssea, fazendo-se necessário a
monitorização hematológica durante a terapia. Podem ser
utilizados comprimidos revestidos gastrorresistentes para
reduzir estes efeitos.
Até aqui, estudamos os principais fármacos utilizados para o PENICILAMINA
controle da resposta inflamatória que possuem indicação Acredita-se que sua ação em modificar a doença reumática
para o tratamento das patologias articulares. Entretanto, tanto está associada à redução da síntese da citocina IL-1 e à
os AINEs quanto os glicocorticoides não corrigem a etiologia inibição da síntese do colágeno. No entanto, este mecanismo
da doença, como a artrite reumatoide. Desta forma, ainda não está estabelecido. Após administrada por via oral,
iniciaremos agora a descrição dos fármacos que podem ser somente 50% da dose é absorvida e alcança concentrações
utilizados para esta indicação. plasmáticas máximas em 1-2 horas. É preferencialmente
FÁRMACOS ANTIRREUMÁTICOS eliminada na urina. A ocorrência de efeitos adversos é
As alterações articulares são, muitas vezes, causadas por frequente, muitas vezes determinando a suspensão do
uma reação autoimune, que envolvem inflamação, além da tratamento. Dentre eles, rashes e estomatites são os mais
proliferação do líquido sinovial e erosão da cartilagem e do comuns, mas podem apresentar anorexia, febre, náuseas,
osso. Desta forma, alguns fármacos atuam regulando estes vômitos e proteinúria. O monitoramento hematológico
processos. também é necessário no início da terapia. São
Os fármacos mais frequentemente utilizados para reduzir a contraindicados em pacientes com leucopenia ou anemia
progressão da doença de base são denominados falciforme.
antirreumáticos modificadores da doença (ARMD) e os HIDROXICLOROQUINA E CLOROQUINA
imunossupressores. Os AINEs e os glicocorticoides utilizados São fármacos utilizados na prevenção e no tratamento da
para artrite reumatoide possuem efeito mínimo ou ausente malária. Eles são indicados para patologias articulares. No
relacionado à progressão da deformidade articular, mas, se entanto, o mecanismo de ação para esta indicação
necessário, são associados aos ARMD para aliviar os sintomas. permanece desconhecido. Na artrite reumatoide, são
Mas será que todos os ARMD atuam com um único utilizados somente quando outros tratamentos citados
mecanismo de ação? anteriormente tenham falhado. Os efeitos antirreumáticos
Não! Os ARMD compreendem um grupo heterogêneo de são tardios (6 semanas a 6 meses após o início do
fármacos, com estrutura química não relacionada e tratamento), e somente metade dos pacientes respondem
diferentes mecanismos de ação. ao tratamento. Podem apresentar efeitos adversos, como
Estão incluídos nesta categoria, além de vários fármacos náusea, vômito, tonturas, turvação da visão e sintomas de
imunossupressores, os seguintes medicamentos: urticária.
Objeto com interação. Além dos ARMD, são comumente utilizados para as
METOTREXATO patologias articulares os fármacos imunossupressores, que,
em sua grande maioria, atuam durante a fase de indução da
resposta imunológica. Eles inibem a produção ou ação da IL- recombinante. Atualmente, uma das principais limitações em
2, que reduz a indução e proliferação de linfócitos T relação a sua utilização é o seu elevado custo, e, muitas
(Ciclosporina, Tacrolimo), inibem a expressão de genes de vezes, só são utilizados por aqueles pacientes que não
citocinas, a síntese de purinas ou pirimidinas (Azatioprina) e responderam adequadamente a nenhuma das terapias
a Leflunomida, que possui efeito inibitório específico sobre os discutidas anteriormente.
linfócitos T ativados. Nenhum destes fármacos pode ser administrado por via oral,
CICLOSPORINA E TACROLIMO e, portanto, a administração geralmente é realizada
A ciclosporina pode ser administrada por via oral ou subcutânea ou por infusão intravenosa. Dependendo dos
intravenosa, apresenta T1/2 plasmático de aproximadamente fármacos, podem ser administrados a cada duas semanas ou
24 horas, é metabolizada no fígado, e seus metabólitos são mensalmente. A resposta clínica geralmente é observada
eliminados na bile. Ocorre intensa distribuição no tecido duas semanas depois do início do tratamento, mas alguns
linfomieloide e em tecido adiposo, onde se concentram por pacientes podem não responder a esta terapia em razão de
algum tempo após realizada a suspensão do tratamento. mecanismos ainda desconhecidos.
Apresentam a nefrotoxicidade como efeito adverso comum. EFEITOS ADVERSOS
O tacrolimo compreende as mesmas características Os principais efeitos adversos estão relacionados à
farmacocinéticas da ciclosporina, mas seus efeitos adversos precipitação de uma doença latente, como a tuberculose, ou
são mais pronunciados, como nefrotoxicidade e
neurotoxicidade. ao surgimento de infecções oportunistas
AZATIOPRINA E LEFLUNOMIDA USO CLÍNICO DOS FÁRMACOS ANTIRREUMÁTICOS
A azatioprina é amplamente utilizada para imunossupressão, Um homem de 48 anos procura atendimento médico com
particularmente na artrite reumatoide. O principal efeito queixas de rigidez bilateral matinal nos punhos e nos joelhos,
indesejável é a depressão da medula óssea, além de além de dor nessas articulações em razão de exercício físico.
náuseas, vômitos, erupções cutâneas e a hepatotoxicidade. Na avaliação física, observa-se discreta tumefação das
A leflunomida promove inibição dos linfócitos. É ativa por via articulações. O resto do exame é inespecífico. Os achados
oral e bem absorvida pelo trato gastrointestinal. Apresenta laboratoriais também são negativos, exceto pela presença de
T1/2 plasmática prolongada, e o metabólito ativo sofre anemia discreta, elevação da velocidade de
circulação entero-hepática. Possui aprovação para o hemossedimentação e fator reumatoide positivo. Com o
tratamento da artrite reumatoide, mas faz-se necessária a diagnóstico de artrite reumatoide, o paciente começa um
monitorização do paciente durante o tratamento. Os esquema de naproxeno, em uma dose de 220mg, duas
principais efeitos adversos incluem cefaleia, náusea, diarreia, vezes ao dia. Depois de uma semana, aumenta-se a dose
alopecia e elevação das enzimas hepáticas. Por isso, não é para 440mg duas vezes ao dia. Os sintomas diminuem com
recomendada a pacientes com insuficiência hepática. essa dose, porém o paciente queixa-se de pirose (dor
Atenção epigástrica) significativa, que não é controlada com antiácidos.
Geralmente, os ARMD são denominados como fármacos de O medicamento é, então, substituído por celecoxibe, em
segunda linha, pois são indicados apenas quando outras uma dose de 200mg, duas vezes ao dia. Com esse
terapias, como os AINEs, falham. Entretanto, na clínica, a esquema, ocorre resolução dos sintomas articulares e da
terapia com os ARMD é iniciada imediatamente ou até três pirose. Dois anos depois, o paciente retorna com aumento
meses após o diagnóstico, embora os efeitos clínicos iniciais dos sintomas articulares. Nesse momento, as mãos, os
sejam mais lentos. O tratamento deve ser ajustado punhos, os cotovelos, os pés e os joelhos estão acometidos
individualmente para cada paciente, considerando os efeitos e inchados, quentes e dolorosos à palpação.
adversos potencialmente graves. A maioria desses fármacos Módulo 3
é contraindicado para gestantes.
Por fim, podemos utilizar nas patologias articulares, como a Reconhecer os principais componentes reguladores do
artrite reumatoide, os moduladores de citocinas metabolismo e do remodelamento ósseo e as propriedades
(adalimumabe, etanercepte, infliximabe) que possuem como farmacológicas dos fármacos utilizados para as diferentes
alvo o TNF-α, além do rituximabe e o abatacepte, que têm doenças ósseas, os mecanismos de ação, as principais
como alvo receptores nos leucócitos, interferindo na indicações clínicas, os efeitos colaterais e as contraindicações.
sinalização destas células. TNF-α é uma citocina pró- Agora que já conhecemos a terapia farmacológica das
inflamatória essencial durante a patogênese da artrite alterações articulares, descreveremos os principais
reumatoide. Quando secretado no líquido sinovial, estimula a mecanismos celulares, moleculares e hormonais responsáveis
síntese de colagenase, causando a degradação da cartilagem, pela manutenção do metabolismo ósseo e da homeostasia
além de promover o estímulo da reabsorção óssea (que mineral. Em seguida, revisaremos as alterações ósseas mais
será discutida no módulo 3). Em casos de doença reumática frequentes e, posteriormente, poderemos descrever as
e outros tipos de artrite, como espondilite anquilosante e terapias farmacológicas disponíveis voltadas para estas
artrite juvenil, estes fármacos podem ser utilizados em alterações.
associação ao metotrexato. METABOLISMO E REMODELAMENTO ÓSSEO
Estes fármacos representam os últimos avanços no Todos sabemos que os ossos participam de diversas
tratamento da inflamação crônica grave. De forma geral, são funções, além do suporte estrutural e da proteção aos
denominados biofármacos, ou seja, são anticorpos ou órgãos internos, incluindo hematopoese e armazenamento
proteínas que foram sintetizados através da engenharia de minerais, desempenhando um papel crítico na
homeostasia mineral. Em primeiro lugar, precisamos entender Os osteoblastos, então, começam a sintetizar e secretar o
que os ossos possuem estrutura dinâmica, ou seja, sofrem osteoide, além dos fatores IGF-1 e o TGF-β. Enquanto o
contínuo remodelamento durante toda a vida, devido à osteoide é secretado, há a liberação da fosfatase alcalina, que
constante substituição do osso. hidrolisa ésteres de fosfato, incluindo o pirofosfato, o qual
No entanto, o que seria esse remodelamento? É um fino aumenta a concentração local de fosfato inorgânico. De
equilíbrio entre a reabsorção de determinadas partes ósseas forma conjunta, essas ações promovem a cristalização de
e a formação de outras. O seu propósito é remover e sais de fosfato de cálcio e a mineralização da matriz óssea,
substituir os ossos danificados, mantendo a homeostasia do essenciais para a resistência do osso. Ao mesmo tempo em
cálcio, que discutiremos adiante. que os osteoblastos continuam a depositar matriz óssea,
O esqueleto humano possui um componente orgânico alguns acabam envoltos e “presos” por ela e passam a ser
presente em células especializadas responsáveis pelo chamados de osteócitos. Os osteócitos possuem papel
remodelamento ósseo (osteoblastos, osteoclastos e importante no equilíbrio do remodelamento, secretando
osteócitos) ilustradas na Figura 7, além de uma matriz esclerostina, que reduz a formação óssea.
orgânica, denominada osteoide. Há também um componente É importante salientarmos que a ativação dos osteoclastos é
inorgânico constituído basicamente pelo sal de fosfato de dependente da ativação do ligante RANKL ao seu receptor
cálcio, a hidroxiapatita, e por outros íons, incluindo Na +, K+, RANK. De forma antagônica, os osteoblastos liberam a
Mg2+ e F-. osteoprotegerina (OPG) – molécula idêntica ao RANK, que
inibe esta ligação e a ativação dos osteoclastos. Atualmente,
existem fármacos específicos que atuam nessa interação
essencial para o equilíbrio no remodelamento ósseo.

Formação de osteoclastos.
A conversão dos precursores dos osteoclastos aos
osteoclastos maduros é dependente da ligação do ligante
Remodelamento ósseo.
RANKL (produzido pelos osteoblastos) ao seu receptor
O processo de remodelagem óssea consiste em um
RANK presente em sua superfície. Após a ativação dos
equilíbrio entre a atividade catabólica dos osteoclastos e a
osteoclastos, há a indução da reabsorção da matriz óssea. A
atividade anabólica dos osteoblastos. São encontrados em
OPG, que também é produzida pelos osteoblastos, ligam-se
todas as superfícies ósseas, incluindo o endósteo, que
ao RANKL, reduzindo a sua interação com o RANK e
reveste o osso cortical, bem como nas várias superfícies do
inibindo, assim, a diferenciação dos osteoclastos.
osso trabecular, onde o remodelamento ósseo é mais
O remodelamento ósseo consiste em um equilíbrio dinâmico
intenso.
entre a atividade catabólica dos osteoclastos (reabsorção
O ciclo de remodelagem tem início com o recrutamento e a
óssea) e a atividade anabólica dos osteoblastos (produção da
diferenciação dos osteoclastos maduros, induzidos por
matriz óssea), como vimos na figura Remodelamento ósseo.
citocinas e hormônios. Os osteoclastos maduros aderem a
A perda óssea é caracterizada quando a reabsorção excede
uma região do osso trabecular e promovem a secreção de
a formação óssea.
íons hidrogênio e de enzimas proteolíticas, principalmente a
A regulação do remodelamento ósseo ocorre somente
catepsina K, responsáveis pela dissolução da hidroxiapatita,
através destes dois componentes celulares?
reabsorção de cálcio e a desmineralização da matriz óssea.
Não! Nos últimos anos, foi observado o envolvimento de
Além disso, esse processo gradualmente libera citocinas,
várias citocinas, dos minerais ósseos e das ações de várias
como o fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-1) e
substâncias, como o paratormônio (PTH), a vitamina D e o
o fator transformador de crescimento-β (TGF-β). As
fator de crescimento dos fibroblastos 23 (FGF23) durante
citocinas liberadas são responsáveis pela ativação e pelo
todo este processo. Estes hormônios interagem para regular
acúmulo local dos osteoblastos, em substituição aos
o equilíbrio dos minerais ósseos por meio de seus efeitos
osteoclastos.
sobre o rim, intestino e o osso. Ao longo deste módulo, funcionam como hormônios e são capazes de regular
abordaremos essas regulações. diferentes atividades celulares. Em humanos, encontramos
Como já descrevemos inicialmente, dentre os minerais duas fontes de vitamina D:
ósseos, a reciclagem do cálcio e do fosfato é a mais Ergocalciferol ou vitamina D2
importante para a função celular geral. Derivado do ergosterol na plantas e nos fungos.
O cálcio, além de desempenhar importante papel no Colecalciferol ou vitamina D3
remodelamento ósseo, é um mineral essencial para inúmeras Gerado na pele a partir da absorção de fóton de um luz
funções biológicas, incluindo a liberação de ultravioleta (UVB) pelo 7-desidrocolesterol.
neurotransmissores, contração muscular, sinalização Você sabia
intracelular e na coagulação sanguínea. Aproximadamente As vitaminas D2 e D3 são comumente adicionadas a
99% do cálcio presente no nosso corpo está integrado aos produtos derivados do leite e outros alimentos, como
nossos ossos e dentes. Portanto, a sua liberação para a suplementos dietéticos, além dos fármacos em doses muito
corrente sanguínea precisa ser controlada com grande mais altas. O termo vitamina D refere-se a ambas as formas,
precisão, e qualquer mudança em sua disponibilização pode pois apresentam atividade biológica semelhantes.
ser deletéria ao organismo. O cálcio é absorvido no intestino A metabolização ocorre a partir da hidroxilação no fígado,
e eliminado pela urina. A eficiência da absorção intestinal é onde a vitamina D é transformada em calcifediol, que é
inversamente relacionada à concentração plasmática. Se o convertido nos rins em metabólito ativo denominado calcitriol.
organismo apresentar altos teores de cálcio, há redução da Essa conversão é regulada pelo PTH, FGF23, e influenciada
sua absorção; porém, se houver baixos níveis, há aumento pela concentração de cálcio no plasma. Ou seja, uma
compensatório da sua absorção. Relação inversa que redução do nível sérico de cálcio promove a síntese e
também ocorre com a sua eliminação renal. liberação do PTH e o aumento da síntese de calcitriol
(metabólito ativo da vitamina D). Entretanto, através de um
mecanismo de feedback negativo, em elevados níveis
séricos de calcitriol, há inibição da síntese de PTH, e,
consequentemente, redução da síntese de calcitriol.
Em relação ao mecanismo de ação do calcitriol, o que ele
promove?
Quando o organismo se encontra com redução da
concentração de cálcio ou fosfato no plasma, o cCalcitriol
atua na tentativa de reverter este desbalanço. Sua síntese é
induzida, e ele promove o aumento de absorção de cálcio e
fosfato no intestino, mobilizando o cálcio a partir do osso e
diminuindo a eliminação renal de cálcio. No osso, o calcitriol
Como ocorre essa regulação?
promove a maturação e a estimulação dos osteoclastos,
Ela é dependente da vitamina D no intestino e do PTH nos
resultando em aumento da reabsorção óssea e na
rins. O cálcio também pode ser reabsorvido pelo osso
mobilização de cálcio. Trata-se de ações que culminam na
através da ação da vitamina D. Abordaremos com mais
elevação da concentração de cálcio plasmático.
detalhes como ocorrem essas e outras regulações ao longo
No entanto, o efeito do calcitriol é complexo e não está
deste módulo.
limitado à mobilização de cálcio e ao aumento da reabsorção
Os íons fosfatos também desempenham ações críticas no
óssea. Afinal, em casos onde há deficiência de vitamina D e
metabolismo relacionadas a diversas atividades celulares e
mineralização óssea alterada, a suplementação de vitamina D
enzimáticas. Em nosso organismo, mais de 80% são
é capaz de restaurar a formação óssea. Ou seja, por algum
encontrados nos ossos. Sua absorção é regulada pela
mecanismo, os osteoblastos podem estar sendo ativados. A
vitamina D, e a sua deposição no osso, em associação com
hipótese é que a vitamina D possa estimular a síntese de
o cálcio, é regulada pelo PTH e pela vitamina D no intestino.
osteocalcina, proteína secretada por osteoblastos, importante
O PTH e o FGF23 também são capazes de regular a sua
na mineralização da matriz óssea.
eliminação renal. Detalharemos esta regulação a seguir. A
concentração plasmática de fosfato deve ser monitorada,
pois ela também altera os níveis plasmáticos de cálcio, e,
assim, pode desencadear inúmeras alterações na
homeostasia.
Conforme acabamos de descrever, a vitamina D é um
importante componente envolvido na manutenção do
metabolismo ósseo, pois é capaz de regular a concentração
plasmática de cálcio e fosfato. Porém, qual seria o seu
mecanismo de ação?
Antes de entendermos como ela induz seus efeitos,
precisamos identificar as suas principais propriedades.
A vitamina D consiste em um grupo de moléculas que são
convertidas em metabólitos biologicamente ativos, que
Além disso, o PTH induz à conversão de calcitriol, que,
então, estimula a absorção intestinal de cálcio e fosfato, além
de induzir a liberação de FGF23. No osso, o PTH aumenta a
atividade osteoclástica, ampliando a reabsorção óssea, que
culmina no aumento de cálcio e fosfato no plasma. Observe
que o efeito do PTH sobre o intestino é indireto, por meio
da síntese renal aumentada de calcitriol. Em uma alça de
retroalimentação negativa, o aumento da concentração
plasmática de cálcio inibe a secreção subsequente de PTH
pelas paratireoides, bem como promove redução de
calcitriol. O FGF23 liberado pelo osso diminui a reabsorção
de fosfato, inibe a síntese de calcitriol e a liberação de PTH
pelas glândulas paratireoides.
Atenção
Estrutura química do Curiosamente, embora a secreção patológica excessiva do
calcitriol. PTH (hiperparatireoidismo) seja capaz de induzir a atividade
A partir de agora, começaremos a integrar os mecanismos osteoclástica com maior reabsorção óssea, foi observado
de ação dos hormônios já descritos, como o calcitriol, com que uma injeção diária de PTH (administração terapêutica
os outros reguladores do metabolismo ósseo. em baixa dosagem intermitente) é capaz de estimular a
A síntese e liberação do calcitriol elevam a concentração de atividade dos osteoblastos e acelerar a formação óssea –
cálcio plasmático, que inibe diretamente a síntese e liberação efeito que pode estar relacionado à inibição da secreção de
do paratormônio (PTH), hormônio que é regulado esclerostina pelos osteócitos, molécula que bloqueia a
diretamente em resposta aos níveis plasmáticos de cálcio. proliferação dos osteoblastos (promove um efeito anti-
O PTH é um importante regulador fisiológico da homeostasia apoptótico), e, assim, os osteoblastos podem atuar
do cálcio, sintetizado pelas glândulas paratireoides, que promovendo a formação óssea.
possuem sensores de cálcio em sua superfície capazes de Outro importante hormônio para a homeostasia do cálcio é
controlar sua concentração. Portanto, quando o cálcio a calcitonina, cujas ações são opostas ao PTH. Ela é
plasmático está reduzido, há o estímulo da secreção de produzida e liberada pela glândula tireoide. Sua principal ação
PTH. Em alguns casos, foi observado que a hipocalcemia é sobre o osso. Ela se liga a um receptor específico nos
induz hipertrofia e hiperplasia das paratireoides, devido à osteoclastos, inibindo-os e reduzindo a reabsorção óssea e
intensa produção de PTH. os níveis plasmáticos de cálcio (efeito hipocalcêmico). Nos
Quando o PTH é liberado, quais são os seus mecanismos de rins, ela reduz a reabsorção de cálcio e do fosfato. Sua
ação? secreção é determinada principalmente pela concentração
Em baixas concentrações de cálcio, o PTH liberado estimula de cálcio no plasma. Observa-se aumento de calcitonina
a reabsorção óssea e renal de cálcio, além de promover a durante a fase de crescimento, na gravidez e na lactação,
conversão enzimática renal da vitamina D, que culmina com quando os níveis de cálcio estão aumentados. Embora a
a síntese do calcitriol, e, indiretamente, aumenta a absorção calcitonina endógena tenha menos importância, a calcitonina
intestinal de cálcio. Assim, podemos observar que o PTH e o exógena mostra-se útil no tratamento de emergência de
calcitriol atuam de forma integrada, promovendo os ajustes certas formas de hipercalcemia, conforme discutiremos
necessários de acordo com a concentração plasmática de adiante neste mesmo módulo.
cálcio. Porém, de forma contrária ao calcitriol, o PTH Ao analisarmos de forma integrada essas regulações,
promove a diminuição da reabsorção de fosfato, reduzindo a podemos observar que:
sua concentração plasmática. Os efeitos finais do PTH e do
calcitriol estão ilustrados a seguir.

Regulação dos minerais cálcio e fosfato através do


paratormônio (PTH), calcitriol (vitamina D) e FGF23.
A redução da concentração plasmática de cálcio constitui o À medida em que ocorre o aumento das concentrações
principal estímulo para a secreção de paratormônio (PTH) séricas de cálcio, há diminuição da secreção de PTH e
pelas glândulas paratireoides (seta verde). No rim, o PTH aumento de calcitonina.
aumenta a reabsorção de cálcio, mas diminui a de fosfato.
que serão abordados ainda neste módulo. Antes disso,
precisamos entender quais são as doenças ósseas mais
frequentes em que estes fármacos serão utilizados.
DOENÇAS ÓSSEAS
Considerando essa complexa regulação do metabolismo
ósseo que discutimos anteriormente, qualquer desbalanço ou
alteração pode ser responsável por promover distúrbios nos
ossos, necessitando, assim, de terapias farmacológicas
específicas.
À medida em que ocorre redução das concetrações séricas Objeto com interação.
de cálcio, a elevação de PTH e diminuição de calcitonina. OSTEOPOROSE
O fator de crescimento do fibroblasto 23 (FGF23) que Dentre esses distúrbios, a osteoporose é o mais comum,
citamos neste módulo é expresso em muitas células, caracterizada pela diminuição da massa óssea e do conteúdo
inclusive nos osteócitos e nos osteoblastos. O FGF23 é mineral com perda da arquitetura interna do osso, de modo
secretado pelo osso em resposta a um aumento sérico de que a reabsorção exceda a formação óssea. Na
fosfato. Neste sentido, este fator possui importante papel na osteoporose, os ossos tornam-se frágeis, e os pacientes têm
redução da concentração plasmática de fosfato, através da maior risco de fraturas após mínimos traumas.
diminuição de sua reabsorção nos rins. Ele também é capaz As causas mais frequentes da osteoporose são a deficiência
de inibir a produção de calcitriol e de PTH, resultando em de estrógeno na pós-menopausa e a deterioração da
baixos níveis circulantes de cálcio. Sua interação com o homeostasia óssea relacionada à idade, presente em ambos
calcitriol e o PTH está ilustrada na figura Regulação dos os sexos. A osteoporose também pode ocorrer
minerais cálcio e fosfato através do paratormônio (PTH), secundariamente a diversas condições, como artrite
calcitriol (vitamina D) e FGF23. reumatoide, hiperparatireoidismo, glicocorticoides em altas
Os estrógenos produzidos e liberados na corrente sanguínea doses, heparina, tabagismo, uso excessivo de álcool, má
também possuem papel importante na manutenção da absorção intestinal, cirrose e anormalidades da medula óssea.
integridade óssea, principalmente nas mulheres. Durante a OSTEOMALÁCIA E RAQUITISMO
vida reprodutiva, enquanto são produzidos, eles inibem as Outras doenças ósseas que necessitam de terapia
citocinas que recrutam os osteoclastos, inibem a produção farmacológica incluem a osteomalacia e o raquitismo (forma
de RANKL, opõem-se à reabsorção óssea e à ação de juvenil da osteomalacia), atribuídos à deficiência de vitamina
mobilização de cálcio pelo PTH. Os estrógenos também D, mineralização insuficiente da matriz óssea, que resulta no
estão relacionados ao aumento da proliferação e à redução amolecimento dos ossos.
da apoptose de osteoblastos, à produção de TGF-β e de DOENÇA DE PAGET
proteínas morfogênicas ósseas. Em conjunto, a redução A doença de Paget apresenta distorção dos processos de
desses estrógenos pode induzir a reabsorção óssea e reabsorção e remodelamento ósseo, que resulta na
promover o aumento de alterações ósseas e da formação de um osso desorganizado, aumentado ou
osteoporose. deformado, mas diferente da osteoporose, limita-se a um ou
Atenção poucos ossos.
Embora concentrações fisiológicas de glicocorticoides sejam OUTRAS CONDIÇÕES METABÓLICAS QUE CAUSAM
necessárias para a diferenciação dos osteoblastos, ALTERAÇÕES ÓSSEAS
concentrações excessivas, presentes durante terapias Na doença renal crônica, o comprometimento da função
prolongadas de glicocorticoides, são capazes de inibir a renal promove inúmeros efeitos, como a redução da síntese
formação óssea, ao promoverem a apoptose e a inibição da de calcitriol e redução da concentração de cálcio, excreção
diferenciação dos osteoblastos. Em altas doses, também são diminuída de fosfato, indução da secreção de PTH (comum
capazes de estimular a ação dos osteoclastos. Além disso, os no hiperparatireoidismo) e a indução da reabsorção óssea.
glicocorticoides podem diminuir a absorção intestinal de Outras alterações que podem culminar na hipercalcemia
cálcio e sua reabsorção renal. Conforme discutido no módulo também são prejudiciais; são frequentes em pacientes com
2, o seu uso crônico constitui causa comum de perda óssea neoplasia maligna sistêmica ou metástases ósseas. O
e osteoporose. hipoparatireoidismo também constitui uma patologia
O hormônio tireoidiano (tiroxina) em excesso estimula ação frequentemente encontrada após a retirada cirúrgica da
dos osteoclastos e aumenta a reabsorção óssea, reduzindo a tireoide.
densidade óssea e liberando o cálcio. A tireotoxicose, Neste contexto, fármacos que possam ser utilizados na
incluindo hipertireoidismo, ocorre em associação à prevenção e no tratamento dessas alterações são
osteoporose, devido à perda óssea. extremamente importantes, pois, em muitos casos, estes
Diversos desses hormônios discutidos até aqui, como o PTH pacientes, a longo prazo, podem sentir dor óssea e ter
e a vitamina D, já foram descritos como essenciais durante o ossos deformados ou fraturados. A partir de agora,
processo de regulação da homeostasia óssea. Entretanto, discutiremos as propriedades farmacológicas dos fármacos
muitas vezes, o impacto fisiológico dessa regulação é de disponíveis para o tratamento das principais doenças ósseas
menor importância, como a calcitonina. Quando estão apresentadas.
presentes em quantidades farmacológicas, vários desses FÁRMACOS UTILIZADOS NO TRATAMENTO DE
hormônios têm ações passíveis de exploração terapêutica, DOENÇAS ÓSSEAS
Nos últimos anos, ocorreram avanços significativos no
tratamento das doenças ósseas. A maioria das intervenções
farmacológicas estão direcionadas para a fisiologia do
remodelamento ósseo e pode ser dividida em duas
categorias principais:
Objeto com interação.
FÁRMACOS ANTIRREABSORTIVOS
São fármacos que reduzem a perda óssea, como
bisfosfonatos, calcitonina, moduladores seletivos do receptor
de estrógeno (SERMs), antagonistas do RANKL.
FÁRMACO ANABÓLICO
É o fármaco que aumenta a formação óssea: teripatida.
Para pacientes que já apresentam elevada perda de massa
óssea ou já sofreram fraturas por fragilidade osteoporótica,
os agentes antirreabsortivos não constituem a terapia ideal.
Aumento da densidade mineral óssea observada durante o
Essa situação levou ao desenvolvimento de agentes
tratamento com o alendronato.
anabólicos ósseos, ou seja, fármacos que realmente
Os bisfosfonatos ingeridos oralmente possuem baixa
aumentam a massa óssea e a resistência do osso, e não
biodisponibilidade e são pouco absorvidos. Sua absorção é
apenas impedem a sua perda. Entretanto, como os
prejudicada por alimentos e outros medicamentos. Orienta-se
processos de reabsorção e formação óssea são
o paciente a ingerir os bisfosfonatos com o estômago vazio,
estreitamente integrados, a redução em um deles
de preferência pela manhã, após o jejum noturno. O
geralmente leva à redução do outro por meio de
paciente também não deve ingerir nenhum alimento durante
mecanismos ainda desconhecidos.
os 60 minutos posteriores à administração do medicamento.
Além desses fármacos, a suplementação de cálcio e vitamina
D também desempenha importante papel no tratamento das
doenças ósseas.
Analisaremos agora os principais fármacos antirreabsortivos,
suas indicações clínicas, os efeitos adversos e suas
contraindicações. A abordagem dos medicamentos será
realizada de forma individual e pontual para facilitar o
entendimento, mas, muitas vezes, eles podem ser utilizados
em associação, o que, quando pertinente, destacaremos ao Após a absorção e distribuição do fármaco,
longo do texto. aproximadamente 50% de uma dose acumula-se
Bisfosfonatos rapidamente em locais de mineralização óssea, onde podem
Dentre os fármacos antirreabsortivos, os fármacos permanecer por meses ou anos, até que o osso seja
bisfosfonatos atualmente constituem a classe mais utilizada. reabsorvido e todo o medicamento seja liberado. Entretanto,
São análogos estáveis do pirofosfato, os quais são a interrupção do tratamento resulta na perda gradual dos
incorporados no osso durante a remodelagem óssea. Os efeitos. O fármaco livre é eliminado na forma inalterada pelos
bisfosfonatos formam complexos com o cálcio da matriz rins, e, portanto, são contraindicados em casos de
óssea e são liberados lentamente conforme o osso é insuficiência renal grave.
reabsorvido pelos osteoclastos. Após serem liberados, Suas principais indicações clínicas (tratamento de primeira
expõem os osteoclastos a elevadas concentrações tóxicas escolha) incluem o tratamento da osteoporose e a doença de
do fármaco. Paget. Entretanto, cada bisfosfonato possui outras indicações
Quais os efeitos gerados por esta exposição? clínicas específicas, discutidas a seguir.
Os bisfosfonatos são capazes de se incorporar aos análogos Objeto com interação.
do ATP e promover a apoptose dos osteoclastos, ALENDRONATO
principalmente o etidronato (raramente utilizado). Já os O alendronato por via oral é o bisfosfonato de escolha para a
compostos de segunda geração, que, hoje em dia, são profilaxia e o tratamento da osteoporose, administrado
frequentemente utilizados por serem mais potentes, diariamente ou semanalmente, associados ao cálcio e à
denominados aminobifosfonatos (aldendronato, risedronato, vitamina D.
ibandronato, pamidronato e ácido zoledrônico), atuam por RISEDRONATO
meio da inibição do ancoramento das proteínas de superfície É uma alternativa para a prevenção e o tratamento da
à membrana dos osteoclastos, que são necessárias para a osteoporose pós-menopausa.
ligação ao osso. Ambos os mecanismos resultam na ÁCIDO ZOLEDRÔNICO
diminuição da reabsorção óssea e em um aumento da Também é uma opção terapêutica para tratar a
densidade mineral óssea, conforme observado na figura a osteoporose; pode ser administrado anualmente por infusão
seguir. intravenosa, mas possui elevado custo.
CLODRONATO, IBANDRONATO E ÁCIDO ZOLEDRÔNICO
Podem ser utilizados em pacientes com câncer de mama Conforme já discutimos neste módulo, os estrógenos
metastático e para reduzir a lesão do mieloma múltiplo, além possuem importante papel na indução da formação óssea. O
de tratar a dor óssea e a hipercalcemia em alguns pacientes. declínio dos níveis de estrógeno está relacionado
PAMIDRONATO principalmente à osteoporose pós-menopausa. Dessa forma,
Pode ser utilizado por infusão intravenosa na doença de houve, por muito tempo, a indicação da terapia de reposição
Paget e na hipercalcemia associada a neoplasias malignas. hormonal (TRH). Porém, como as TRHs possuem ações em
EFEITOS ADVERSOS inúmeros sistemas e são responsáveis por muitos efeitos
Os principais efeitos adversos incluem alterações adversos, dentre eles o aumento da incidência de câncer de
gastrointestinais, úlcera péptica e esofagite local e, por esse mama, AVE e tromboembolismo venoso, não são mais
motivo, os pacientes são aconselhados a degluti-los com pelo recomendadas como tratamento preventivo da osteoporose,
menos 250ml de água e a permanecer na posição sendo descontinuada.
ortostática (em pé) durante os primeiros 60 minutos após a No sentido de mimetizar os efeitos destes estrógenos na
administração. São contraindicados para pacientes com remodelagem óssea, foram desenvolvidos fármacos não
esvaziamento esofágico tardio ou com alterações no trato hormonais, denominados moduladores seletivos de
gastrointestinal. Ocasionalmente, pode ocorrer dor nos ossos receptores de estrógenos (SERM). Dentre eles, o mais
e diarreia. Embora ocorra raramente, a administração importante é o raloxifeno, que possui efeitos semelhantes
intravenosa de zoledronato pode causar osteonecrose na aos do estrogênio nos ossos (estimula os osteoblastos e
mandíbula, insuficiência renal aguda ou hepatite. inibe os osteoclastos), porém tem efeito antagonista no
Para os pacientes que não toleram os efeitos endométrio e na mama. Portanto, ele aumenta a densidade
gastrointestinais adversos ou a administração oral, podemos óssea, sem aumentar o risco dos efeitos adversos induzidos
utilizar os bisfosfonatos por via intravenosa (ácido pela TRH.
zoledrônico), até mesmo para reduzir a frequência de
administração e aumentar a adesão ao tratamento.

Calcitonina
Nós já vimos que a calcitonina inibe a ação dos osteoclastos
e, consequentemente, reduz a reabsorção óssea,
produzindo efeitos hipocalcêmico e hipofosfatêmico.
A principal preparação disponível para uso clínico é
a calcitonina sintética de salmão, que apresenta uma T1/2 mais
longa e maior afinidade pelo receptor de calcitonina humano. Estrutura química do 17β-estradiol e do raloxifeno.
Ela é capaz de reduzir a reabsorção óssea, mas é menos O raloxifeno possui semelhança conformacional ao 17β-
eficaz do que os bisfosfonatos. A administração do estradiol, hormônio esteroide, é bem absorvido no trato
medicamente varia de acordo com o tratamento. gastrointestinal e sofre intenso metabolismo de primeira
Injeção subcutânea ou intramuscular passagem pelo fígado, resultando em apenas 2% de
Para doença de Paget e hipercalcemia. biodisponibilidade. O raloxifeno é amplamente distribuído nos
Intranasal tecidos, apresenta T1/2 de 32 horas e é eliminado
Para a osteoporose pós-menopausa. principalmente nas fezes. Seu uso foi aprovado para o
Apresenta T1/2 plasmático de 4-12 minutos, mas sua ação se tratamento de osteoporose, especialmente como alternativa
mantém por várias horas. O processo de depuração ocorre para mulheres na pós-menopausa, que não conseguem
principalmente nos rins. tolerar os bisfosfonatos (fármacos de primeira escolha).
É indicada para o tratamento de doenças caracterizadas por EFEITOS ADVERSOS
atividade osteoclástica elevada (hipercalcemia), associada à Os efeitos colaterais incluem ondas de calor, câimbras nas
neoplasia, doença de Paget, osteoporose pós-menopausa e pernas e edema periférico. De forma semelhante ao
induzida por glicocorticoides. Além de ser útil para o alívio da estrógeno, o raloxifeno aumenta o risco de
dor associada à fratura osteoporótica e para a redução de tromboembolismo e, assim, é contraindicado para adultos
complicações neurológicas. com histórico de tromboembolismo. Além disso, diminui
EFEITOS ADVERSOS ligeiramente os níveis de colesterol das lipoproteínas de baixa
Os principais efeitos adversos incluem náusea e vômito. densidade (LDL), porém não aumenta nem reduz a
Podem ocorrer rubor facial, sensação de formigamento nas incidência de doença cardíaca em mulheres na pós-
mãos e gosto desagradável na boca. Efeitos adversos da menopausa.
administração nasal incluem rinite e outros sintomas nasais.
Uma importante desvantagem da administração prolongada Antagonistas do RANKL
de calcitonina é a taquifilaxia, que pode resultar na Inicialmente, precisamos relembrar que a ativação inicial dos
dessensibilização do receptor. Seu uso pode aumentar o osteoclastos é dependente da ligação do RANKL ao seu
risco de malignidades; desta forma, deve ser reservado receptor RANK. O fármaco denosumabe é um anticorpo
somente aos pacientes que forem intolerantes a outras monoclonal inibidor do RANKL, portanto é capaz de inibir a
terapias mais seguras. formação e função dos osteoclastos e interromper a perda
óssea.
Estrógenos e compostos relacionados (raloxifeno)
O denosumabe é administrado por injeção subcutânea a
cada seis meses e possui indicação clínica para a redução de
fraturas em mulheres com osteoporose pós-menopausa e
reabsorção óssea excessiva. Ele reduz fraturas vertebrais em
homens com hipogonadismo consequente do tratamento
para câncer de próstata e diminui a reabsorção óssea em
pacientes com artrite reumatoide.
EFEITOS ADVERSOS
Sua utilização foi associada ao aumento do risco de
infecções, reações dermatológicas, hipocalcemia,
osteonecrose da mandíbula e fraturas atípicas. Por isso, só é
indicada para pacientes que não toleram ou não respondem
a outros tratamentos.

Ranelato de estrôncio
O ranelato de estrôncio atua inibindo a reabsorção óssea e Teriparatida
estimulando a formação óssea, mas o seu mecanismo de Como já abordado neste módulo, concentrações plasmáticas
ação ainda permanece desconhecido. Ele parece bloquear a constantemente elevadas de PTH (hiperparatireoidismo)
diferenciação dos osteoclastos, induzindo-os a apoptose. É induzem a desmineralização óssea e a osteopenia. Por outro
absorvido pelo intestino e, após ser distribuído, o estrôncio é lado, a exposição intermitente (baixas doses) das células
incorporado pela hidroxiapatita, permanecendo nos ossos por ósseas ao PTH promove o aumento da formação óssea,
muitos anos. Eventualmente, podem ser trocados pelo cálcio efeito que é induzido pelos derivados do PTH.
nos ossos. É eliminado pelos rins. Eficaz na prevenção de Atualmente, o principal composto em uso é a teriparatida,
fraturas em mulheres idosas, foi aprovado como alternativa um fragmento peptídico recombinante do PTH. Ela possui
aos bisfosfonatos para prevenção de fraturas osteoporóticas. biodisponibilidade próxima de zero quando administrada por
O fármaco é bem tolerado; relata-se baixa incidência de via oral e, desta forma, é administrada diariamente de forma
náusea e diarreia. Alguns autores consideram o estrôncio subcutânea, mantendo a exposição intermitente da droga. A
como fármaco de primeira escolha para o tratamento da concentração plasmática de cálcio alcança um valor máximo
osteoporose devido à sua melhor relação risco/benefício. em 6 horas após a administração. Outras formas de
Analisaremos agora o principal fármaco com efeito anabólico, administração (p. ex., transcutânea) estão em fase avançada
que promove o aumento da formação óssea. de desenvolvimento clínico. Sofre um processo de
depuração no fígado, seguida de excreção renal.
A teriparatida promove o aumento da massa óssea, através
do aumento do número e ativação de osteoblastos e
redução da apoptose dos osteoblastos. Possui indicação
clínica para ser utilizada no tratamento de pacientes
portadores de osteoporose e em pacientes com alto risco
de fraturas. Sua eficácia na prevenção de fraturas é
comparável à dos bisfosfonatos.
EFEITOS ADVERSOS
Possui boa tolerância e reduzidos efeitos adversos graves.
Dentre os mais comuns, estão náusea, vertigem, cefaleia,
artralgia, hipercalcemia, hipotensão e câimbras nas pernas.
Devido a uma possível associação entre o uso da teriparatida
e o desenvolvimento de osteossarcoma, o seu uso deve ser
limitado a, no máximo, dois anos de tratamento. Orienta-se
Estrutura química do administrar bisfosfonatos ao final da terapia para prevenir a
ranelato de estrôncio. perda óssea devido à retirada da teriparatida.

Até este momento, descrevemos os fármacos


antirreabsortivos e anabólicos, entretanto existem outras
terapias voltadas principalmente para a homeostasia dos
minerais ósseos. Porém, muitas vezes, de forma indireta,
estes fármacos também atuam sobre o remodelamento
ósseo. Iniciaremos agora a descrição dos principais exemplos
desta classe.
Preparações de vitamina D
A principal preparação de vitamina D utilizada clinicamente é
o ergocalciferol. Outras preparações incluem
o alfacalcidol, colecalciferol e o calcitriol. Todos podem ser
administrados oralmente e são bem absorvidos no intestino. má absorção. O gluconato de cálcio também pode ser
As preparações de vitamina D são lipossolúveis, e os sais utilizado em injeção intravenosa no tratamento de
biliares são necessários para a sua absorção. Também estão emergência da hipocalemia.
disponíveis formas injetáveis para a administração. Após
ministração oral, apresentam um T1/2 plasmático de 20 a 30 Frequentemente, é prescrito o carbonato de cálcio, que
horas, e são amplamente distribuídas no tecido adiposo deve ser administrado oralmente com as refeições para
(encontrada na gordura por muito meses). A principal via de facilitar a sua dissolução e absorção. Também é indicado
eliminação da vitamina D é pelas fezes. para os sintomas hipocalcêmico mais leves em combinação
com a vitamina D. Além disso, por se ligar ao fosfato da dieta
no intestino e controlar os seus níveis plasmáticos, ele
também é utilizado para tratar hiperfosfatemia.
EFEITOS ADVERSOS
Dentre os principais efeitos colaterais, encontram-se as
alterações gastrointestinais, mas, de forma geral, são bem
tolerados.

Compostos calcimiméticos
Conforme abordado neste módulo, a vitamina D promove o Estes compostos simulam o efeito de estímulo do cálcio
aumento de absorção de cálcio e fosfato no intestino, sobre o receptor de cálcio presente nas glândulas
mobiliza o cálcio a partir do osso e diminui a eliminação renal paratireoides, responsáveis por regular a secreção de PTH.
de cálcio, além de diminuir a síntese do PTH. Foi observado Ou seja, seu efeito é diminuir a secreção do PTH e reduzir a
que a suplementação de vitamina D aumenta a densidade concentração de cálcio sérico.
óssea mineral e diminui a incidência de fraturas ósseas. O composto cinacalcete foi o primeiro calcimimético
As preparações de vitamina D são indicadas clinicamente aprovado. Ele é atualmente utilizado como terapia alternativa
para o tratamento de estados de deficiência dietética, na à cirurgia no tratamento do hiperparatireoidismo em
prevenção de raquitismo, osteomalacia, deficiência causada situações de hipercalcemia e em pacientes com insuficiência
pela má absorção e doenças hepáticas. A associação de renal. Inesperadamente, por motivos ainda não esclarecidos,
vitamina D e suplementos dietéticos de cálcio é o cinacalcete não altera a perda óssea durante a terapia.
frequentemente utilizada para prevenção e tratamento da Os efeitos máximos sobre o nível sérico de PTH são
osteoporose, principalmente em indivíduos idosos. observados de 2 a 4 horas após a administração oral.
Além disso, é indicada para o tratamento da hipocalcemia, Apresenta intensa metabolização hepática pelas enzimas do
causada pelo hipoparatireoidismo, e de doença renal crônica. citocromo P450 (atenção para as interações
No caso de hipoparatireoidismo agudo, é necessário o uso medicamentosas), e seus metabólitos são eliminados na urina.
de cálcio intravenoso e preparações de vitamina D injetável, Possui um T1/2 de eliminação de 30 a 40 horas.
além de associar um diurético tiazídico. Também foram Você sabia
aprovados para tratamento do hiperparatireoidismo Atualmente, estão sendo desenvolvidos outros fármacos
secundário, com a supressão da secreção de PTH pelas antagonistas ao mesmo receptor sensível de cálcio da
células das glândulas paratireoides. paratireoide para o tratamento da osteoporose.
EFEITOS ADVERSOS EFEITOS ADVERSOS
Como a vitamina D aumenta tanto o cálcio quanto o fosfato A hipocalcemia e as náuseas são os principais efeitos
do plasma, é preciso monitorar cuidadosamente os níveis colaterais. As concentrações de cálcio, fosfato e PTH devem
plasmáticos desses minerais durante o tratamento. Portanto, ser monitoradas durante o tratamento.
a ingestão excessiva de vitamina D pode desenvolver
hipercalemia e, se ela persistir, os sais de cálcio podem ser Fosfato inorgânico
depositados nos rins, promovendo calculose renal e O fosfato inorgânico é administrado como terapia para a
insuficiência renal. O paricalcitol, análogo da vitamina D, possui hipofosfatemia causada por perda renal de fosfato, má
menor potencial para causar hipercalcemia. absorção intestinal, remodelamento ósseo rápido, sepse e
outros distúrbios. As preparações de uso comum consistem
Sais de cálcio em fosfato de potássio e fosfato de sódio. Se a
Não podemos esquecer que, além de inúmeras funções hipofosfatemia for grave, pode-se administrar o fosfato por
fisiológicas reguladas pelo cálcio, eles são essenciais durante via intravenosa, com monitoramento do nível sanguíneo de
a mineralização da matriz óssea. Neste sentido, umas das cálcio.
principais indicações clínicas dos sais de cálcio inclui a
reposição oral de cálcio durante a deficiência na dieta
(estado de hipocalcemia), incluindo o uso do gluconato de
cálcio e do lactato de cálcio. Além disso, podem ser utilizados
em associação com os bisfosfonatos, a vitamina D ou
calcitonina para prevenção e tratamento da osteoporose,
hipoparatireoidismo, raquitismo dependente de vitamina D ou
Neste cenário de agressão à mucosa gástrica, faz-se
necessário o tratamento com fármacos que levem à
EFEITOS ADVERSOS diminuição da acidez e fortaleçam as defesas desta mucosa
A superdosagem de fosfato oral provoca diarreia, enquanto tão importante para o funcionamento pleno do organismo
a superdosagem do fosfato intravenoso pode causar humano.
hipocalcemia. Para entender melhor como esses fármacos atuam,
precisamos retornar brevemente ao mecanismo fisiológico
Sevelamer que leva à produção de secreção gástrica ácida.
Este fármaco é uma resina trocadora de íons catiônicos não AFINAL, O QUE É SECREÇÃO ÁCIDA?
absorvível e liga-se ao fosfato intestinal, diminuindo, assim, a
absorção do fosfato dietético. Liga-se também aos ácidos A secreção ácida é um processo complexo que envolve a
biliares, levando à interrupção da circulação entero-hepática liberação neuronal de acetilcolina, a liberação parácrina de
e redução da absorção de colesterol. Sua principal utilização histamina e endócrina de gastrina, que, em conjunto, regulam
clínica é para o tratamento da hiperfosfatemia em pacientes a secreção de prótons (íons H+) pelas células parietais no
com doença renal crônica submetidos a hemodiálise. Ele é estômago. A concentração de H+ é responsável pela
capaz de diminuir a incidência de episódios de hipercalcemia, regulação do pH, sendo uma solução dita ácida aquela que
que pode resultar em calcificação. Não possui efeito possui alta concentração deste íon em dispersão.
consistente e clinicamente significativo sobre o PTH. QUAIS SÃO OS BENEFÍCIOS DA SECREÇÃO ÁCIDA NO
EFEITOS ADVERSOS ESTÔMAGO?
As principais reações adversas encontradas são vômito,
náusea, dispepsia, diarreia e acidose metabólica. É importante para a digestão de macromoléculas, como as
NOVAS TERAPIAS EM POTENCIAL proteínas, além de auxiliar na absorção de ferro, cálcio e
Diversos estudos têm ampliado o conhecimento sobre os vitamina B12. Além dessa questão, podemos destacar
mecanismos moleculares e celulares do processo de também suas ações protetivas contra microrganismos
remodelamento ósseo. A partir deste conhecimento e com advindos da alimentação, que, por ora, possam tentar
o desenvolvimento de novas tecnologias, atualmente, têm colonizar nosso tubo gastrointestinal, como a conhecida
surgido novos medicamentos que podem ser incorporados à bactéria Helicobacter pylori, bastante associada a problemas
clínica em breve. Dentre eles, há os inibidores de catepsina K gástricos.
(odanacatibe), da esclerostina e da OPG recombinante para o O QUE PODE SER CAUSADO POR DESCOMPENSAÇÕES
tratamento da doença de Paget. NOS NÍVEIS DE ACIDEZ?
Tema 7 De forma geral, descompensações nos níveis de acidez
Fármacos Que Modificam a Função Gastrointestinal e podem causar ulcerações quando exacerbadas, ou até
Metabólica mesmo impactar na absorção de nutrientes e reduzir
Modulo 1 defesas, quando diminuídas.
FÁRMACOS QUE MODULAM A SECREÇÃO ÁCIDA Agora, veremos como acontece o processo de regulação
ESTOMACAL fisiológica e farmacológica da secreção gástrica.
Pensando no estômago, nós nos lembramos da fisiologia Como observaremos na imagem mais adiante, a célula
básica que nos orienta sobre a acidez local, necessária para parietal apresenta três receptores estimuladores em sua
o processo de digestão. Em condições fisiológicas normais, o membrana basolateral:
ácido gástrico e a pepsina produzidos não estão relacionados Receptores muscarínicos do tipo M3
à produção de danos ou sintomas de doenças pépticas Histamínicos H2
ácidas, devido aos mecanismos naturais de defesa. Receptores de gastrina (do tipo colecistocinina B ou 2 –
Entretanto, em condições patológicas, a mucosa gástrica CCK2)
pode perder sua capacidade de se defender frente tamanha Os receptores muscarínicos, quando estimulados pela
acidez e iniciar processo inflamatório, que nós conhecemos acetilcolina, levam ao aumento de cálcio intracelular,
como gastrite e úlceras. semelhante aos receptores de gastrina, os quais levam ao
mesmo evento intracelular. Quanto à origem dos estímulos, a
acetilcolina vem do estímulo das fibras dos nervos
parassimpáticos, e a gastrina é produzida pelas células G,
presentes na mucosa antral gástrica e, em pequena
proporção, na mucosa do duodeno.
Devemos destacar também a ação da gastrina sobre as Esomeprazol
células enterocromoafins (ECL), célula produtora de Lansoprazol
histamina, que modula, de forma parácrina, os receptores H2 Dexlansoprazol
na célula parietal, levando ao aumento do AMP cíclico Rabeprazol
(cAMP) intracelular. A ação em conjuntos destes receptores, Pantoprazol
via os eventos intracelulares mencionados, resulta em As modificações estruturais apresentadas por esses
estímulo à bomba de próton potássio ATPase fármacos são importantes e garantem modificações da
(H+/K+/ATPase) , levando à liberação de prótons (H+) no farmacocinética, com pequenas diferenças no tempo de
lúmen estomacal, que promove a acidificação da secreção meia-vida, que promove melhores condições posológicas
gástrica. para os pacientes que os utilizem. Os principais parâmetros
Esse processo está ilustrado a seguir: farmacocinéticos estão descritos na tabela a seguir:
Objeto com interação.
Parâmetros farmacocinéticos
Fármaco Biodisponibilidade Meia- Tempo para
oral (%) vida (h) pico
plasmático (h)
Omeprazol 30 – 40 0,5 - 1 0,5 – 3,5
Esomeprazol 64 – 90 1 – 1,5 1,5
Lansoprazol 80 – 85 1,6 1,7
Dexlansoprazol - 1–2 1–2
Pantoprazol 77 1 – 1,9 2–3
Rebeprazol 52 1–2 2–5
Fonte: Traduzido de STRAND et al. (2017)
Regulação fisiológica e farmacológica da secreção Esses medicamentos são pró-fármacos, que, após absorção
gástrica. Fonte: GOODMAN & GILMAN, 2012. sistêmica, devem chegar intactos às células parietais, onde se
O conhecimento da fisiologia envolvida na secreção gástrica difundem e são ativados por secreção ácida nas membranas
ácida, com a elucidação dos receptores e seus ligantes dos canalículos secretores. Essa ativação promove
estimulantes, são a base das abordagens farmacológicas que modificação no fármaco que impede sua saída do local de
temos disponíveis no momento para o tratamento de ação. O fármaco ativo se liga covalentemente à bomba de
distúrbios relacionados à acidez em excesso. Os fármacos H+/K+/ATPase, inativando-a de forma irreversível. Porém, o
utilizados pertencem a classes diferentes de acordo os estômago renova a secreção ácida produzindo novas
receptores ou com a via fisiológica que inibem, como moléculas de bomba H+/K+/ATPase, que serão inseridas na
os antagonistas H2 (receptores de histamina), os inibidores de membrana luminal para reestabelecer esse processo
bomba de próton potássio ATPase (H+/K+/ATPase) , os fisiológico, levando de 24 a 48 horas para reversão.
fármacos antiácidos e os protetores de mucosa. Veremos à Independentemente do curto tempo de meia-vida, esses
frente seus principais representantes e suas características medicamentos apresentam seus efeitos terapêuticos em
farmacológicas. razão da irreversibilidade de ligação com seu alvo.
No entanto, antes de entrarmos na farmacodinâmica dos SE OS FÁRMACOS CHEGAREM AO ESTÔMAGO, APÓS
fármacos utilizados na diminuição da secreção ácida, UTILIZAÇÃO POR VIA ORAL E ENCONTRAREM AMBIENTE
precisamos dar destaque ao intenso trabalho do estômago e ÁCIDO SEM A DEVIDA PROTEÇÃO PELOS EXCIPIENTES
do esôfago para se proteger dessa acidez. Sabemos quão DA FORMULAÇÃO, TERÍAMOS O EFEITO
importante ela é para os processos fisiológicos, mas FARMACOLÓGICO ESPERADO?
precisamos nos atentar para o fato de que possui potencial Não. Eles precisam estar vinculados a formulações
para lesar os epitélios destes órgãos. O esôfago, via seu gastrorresistentes, a fim de que driblem a acidez estomacal e
esfíncter esofágico inferior, evita o refluxo do conteúdo ganhem o intestino para que sejam absorvidos, como, por
ácido estomacal. Já o estômago se protege do seu próprio exemplo, as cápsulas gelatinosas de revestimento entérico
conteúdo ácido via produção de uma camada de muco, que (para omeprazol, esomeprazol e lansoprazol), comprimidos
mantida próximo das células epiteliais gástricas, secretam de revestimento entérico (omeprazol, pantoprazol e
bicarbonato, para proteger este grupo de células. Além disso, rabeprazol) e a combinação de omeprazol com bicarbonato,
o muco se torna importante barreira contra a difusão de em cápsulas ou suspensões.
íons e demais lesões do epitélio gástrico. Quanto à alimentação, o raciocínio é o mesmo. Sabemos
Esse cenário nos leva à compreensão da importância de que a ingestão de alimentos estimula fisiologicamente a
utilização de fármacos protetores da mucosa gástrica, que secreção gástrica para recebê-los e iniciar o processo
também serão discutidos. digestivo. Por esta razão, é necessário um intervalo de pelo
FÁRMACOS INIBIDORES DE BOMBAS DE PRÓTON menos 30 minutos entre a utilização dos medicamentos e a
Os inibidores de bomba de próton são atualmente os alimentação, para que não haja exacerbação da acidez
fármacos mais importantes e utilizados como supressores estomacal, capaz de comprometer o tratamento e reduzir a
(diminuidores) da secreção ácida gástrica, sendo o biodisponibilidade oral dos fármacos.
omeprazol pioneiro nesta classe. São outros inibidores de
bombas de próton:
Esses medicamentos estão disponíveis em formulações orais
e parenterais, que reduzem em aproximadamente 70% a
secreção de ácido gástrico durante 24 horas.
Semelhante aos inibidores de bombas de próton discutidos
anteriormente, os antagonistas H2 também são absorvidos
rapidamente após administração oral, atingindo máximas
Atenção
concentrações plasmáticas entre 1-3 horas. Como principais
Para os pacientes que necessitam de ação imediata,
diferenças, esses fármacos podem ter:
encontram-se disponíveis para administração intravenosa os
fármacos omeprazol, esomeprazol, lansoprazol e pantoprazol.
Esses fármacos sofrem rápida absorção no intestino após
uso oral, ligam-se a proteínas e são metabolizados no fígado
por enzimas do Citocromo P450. Por serem
biotransformados dessa forma, uma gama de interações
medicamentosas pode ser observada, resultando em
alterações na farmacocinética de outros fármacos que
competem por essa forma de metabolização.
Fica também ressaltada a importância especial aos pacientes Absorção beneficiada pela presença de alimentos.
que apresentam doença hepática, com recomendação de
redução de doses. Além das questões de biotransformação,
outro grupo de interações medicamentosas que pode ser
observado são aqueles oriundos do efeito terapêutico. Após
redução da acidez do conteúdo gástrico, outros fármacos e
substâncias podem ter sua absorção debilitadas, como o
cetoconazol (antifúngico), a ampicilina (antibiótico), alguns sais
de ferro e a vitamina B12.
Absorção diminuída em virtude do uso de antiácidos locais.
Os fármacos antagonistas H2 ainda apresentam diferença na
metabolização, onde ocorre pouca ligação com as proteínas,
com pequena biotransformação hepática, e isso não culmina
na necessidade de ajuste em vigência de doença hepática
prévia. Além disso, poucas interações medicamentosas são
esperadas com o uso dos antagonistas H2, sendo os poucos
relatos associados ao uso da cimetidina e ranitidina.
Neste aspecto, a nizatidina e famotidina são consideradas
mais seguras. Por se tratar de um fármaco de eliminação na
O uso clínico dos inibidores das bombas de próton mais
urina, paciente nefropatas demandam reduções de doses
importantes objetivam promover benefícios no tratamento
desses antagonistas.
de gastrites, úlceras gástricas e duodenais, doença do refluxo
Esses fármacos são utilizados no tratamento de ulcerações
gastroesofágico, azias, doença de Zollinger-Ellison (distúrbio
gástricas e duodenais, doença do refluxo gastroesofágico e
hipersecretor patológico).
para evitar a ocorrência de úlceras relacionadas ao estresse.
EFEITOS ADVERSOS
EFEITOS ADVERSOS
Dentre os principais efeitos adversos desta classe, podemos
Trata-se de fármacos com poucos efeitos adversos e bem
destacar náusea, dor abdominal, aumento do risco de
tolerados pelos usuários. Dentre os relatos mais comuns,
fraturas ósseas e a hipergastrinemia (secreção aumentada
estão diarreia, cefaleia, sonolência, fadiga e dor muscular e
de gastrina para tentar compensar a redução da secreção
constipação.
ácida estomacal) e aumento da possibilidade de
desenvolvimento de tumores gástricos.
Saiba mais
Uma questão especial, que demanda atenção dos
FÁRMACOS ANTAGONISTAS H2
prescritores e demais profissionais é a utilização destes
Outra classe importante de fármacos que modulam a acidez
medicamentos por grávidas e lactentes. Estes fármacos são
estomacal são os antagonistas seletivos dos receptores de
capazes de ultrapassar a barreira placentária e ser
histamina H2, que atuam competindo de forma reversível
excretados pelo leite materno, entretanto até o momento
com a histamina pela ligação em seu receptor na membrana
não foi relatado pela literatura científica teratogenicidade para
basolateral das células parietais. Dentre os fármacos
esta classe. Um fato interessante sobre estes fármacos é a
representantes deste grupo, estão:
inibição predominantemente da secreção ácida basal, mais
Ranitidina
bem evidenciada durante a noite. Por esta razão, para
Cimetidina
úlceras duodenais o tratamento indicado consiste em
Famotidina
administração noturna de antagonistas H2 como principal
Nizatidina
abordagem farmacoterapêutica.
Com a diminuição da acidez gástrica, é possível ser capaz de atuar tanto em células parietais quanto nas células
evidenciada também com esta classe de fármacos a enterocromoafins, inibindo a secreção basal ácida, bem
hipergastrinemia, que estimula as células enterocromoafins a como estimulando a circulação sanguínea local, aumentando
liberarem histamina, o agonista natural dos receptores H2. a secreção de muco e bicarbonato. Após absorção oral, o
Com isso, ajustes de dose podem ser necessários para fármaco é transformado em seu metabólito ativo nas células
compensar possíveis falhas terapêuticas. Também é preciso parietais.
atenção ao descontinuar o tratamento, pela possibilidade Seu uso no tratamento de úlceras gástricas tem sido
de efeito rebote. descontinuado ao longo dos anos em razão da sua
toxicidade. O misoprostol está associado a quadros diarreicos
e dores abdominais em 30% dos pacientes, além de ser
contraindicado para indivíduos com doenças inflamatórias
intestinais e, principalmente, para gestantes, em razão de seu
estímulo a contratilidade da musculatura uterina. Atualmente,
existem disponíveis protocolos de utilização do medicamento
na indução de partos, sobretudo com administração de
preparações para uso intravaginal.
Hipergastrinemia:
distúrbio endócrino caracterizado por níveis aumentados do
hormônio gastrina, fazendo com que o estômago produza
ácido gástrico em excesso.
FÁRMACOS PROTETORES DE MUCOSAS
Visto que a produção de acidez, em determinadas ocasiões,
é prejudicial às mucosas gástricas e esofagianas, alguns
fármacos podem ser utilizados para aumentar os
mecanismos fisiológicos de proteção da mucosa ou agir
como barreira física sobre a superfície lesionada pelo Misoprostol
excesso de acidez. Sucralfato
A mucosa gástrica sintetiza as prostaglandinas E2 (PGE2) e a Em lesões causadas pela acidez, algumas proteínas da
prostaciclina (PGI2) que atuam nos receptores EP3 das mucosa gástrica são hidrolisadas por estímulo da pepsina,
células parietais, reduzindo a concentração de cAMP ocasionando erosão e ulcerações dessa mucosa. O sucralfato,
intracelular, que levaria ao aumento da secreção ácida, outro fármaco de enorme importância clínica, é capaz de
realizando, dessa forma, um efeito protetor frente à acidez. atuar como protetor gástrico neste aspecto. Seu efeito
Objeto com interação. gastroprotetor é extenso e envolve, em primeiro plano, a
formação de um polímero complexo com o muco
produzido pelas células em um ambiente ácido, o que
dificulta a sua degradação e impede a dispersão dos íons
H+ nesse novo fluido. Em segundo plano, estimula a
produção de muco, bicarbonato e prostaglandinas
estomacais, além de inibir a ação da pepsina.
Estrutura molecular da prostaglandinas E2 (PGE2) Para ser utilizado, é preciso que o paciente o faça uma hora
antes da alimentação, a fim de que o ambiente ácido seja
propício para sua interação e polimerização, como o muco.
Quanto aos efeitos adversos, o perfil de segurança do
fármaco é favorável, representando apenas risco de
constipação intestinal e diminuição da absorção de outros
fármacos, o que pode ser atenuado com a ingestão do
sucralfato cerca de duas horas após a administração dessa
medicação.
Estrutura molecular da prostaciclina (PGI2)
Atenção
Fármacos como os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs)
diminuem a síntese de prostaglandinas pela inibição das
enzimas ciclo-oxigenases, trazendo como efeito adverso o
aumento da acidez estomacal, que pode levar ao
desenvolvimento de quadros ulcerosos.
Misoprostol
O fármaco misoprostol é um análogo sintético da
prostaglandina E1, que, quando administrado por via oral, é
Além de sua utilização frente à desregulação da secreção Preparações como a hidrotalcita, contêm misturas de sais de
ácida estomacal, esse fármaco também é utilizado por alumínio e magnésio, e tendem a manter capacidade de
pacientes com síndromes de esofagite ou gastrite biliar, por neutralização mais prolongada e efetiva, além de atenuar a
também se conjugar a ácidos biliares. possiblidade de efeitos adversos individuais, uma vez que a
FÁRMACOS ANTIÁCIDOS utilização medicamentosa de alumínio tende a propiciar
Você deve conhecer uma gama de produtos constipação e o uso de magnésio pode causar diarreia.
comercializados como antiácidos, o que sugere,
anteriormente ao estudo da farmacologia, que o controle da
acidez estomacal é fundamental para combate ao
desconforto gástrico.

Bicarbonato de sódio e carbonato de cálcio


Outros sais que podem ser utilizados são o bicarbonato de
sódio e o carbonato de cálcio, que auxiliam na neutralização
do pH gástrico, embora estejam associados a quadros de
eructações, náusea, desconforto abdominal e flatulências,
O uso de antiácidos é a forma mais simples de tratamento mediante formação de CO2 (gás carbônico) no estômago e
da secreção ácida excessiva. Entretanto, podemos dizer que nos intestinos.
é a maneira menos eficiente de tratar úlceras gástricas, Para paciente com insuficiência renal, é necessário
tendo maior utilização no tratamento das duodenais. acompanhamento minucioso do uso desses medicamentos,
A maioria dos antiácidos disponíveis corresponde aos sais de em razão da possibilidade de acúmulo prejudicial de alumínio
magnésio e alumínio. e magnésio, que pode propiciar alguns agravos clínicos,
como osteoporose, encefalopatia e miopatia. Com relação ao
cálcio, aquele absorvido por via oral após o uso de
bicarbonato de cálcio e carbonato de cálcio, pode causar
hipercalcemia transitória, condição problemática em
pacientes renais crônicos, pela possibilidade de precipitação
de sais de cálcio nos rins, podendo levar à insuficiência renal.

Hidróxido de magnésio
Reage com a acidez estomacal, formando cloreto de
magnésio no estômago.

Em geral, os antiácidos devem ser administrados em forma


de suspensão ou em outra forma farmacêutica capaz de
acelerar a sua ação neutralizante, como em comprimidos
mastigáveis, por exemplo.
ESTUDO DE CASO
Veja o estudo de caso envolvendo os fármacos abordados
neste módulo.
Modulo 2
FÁRMACOS ANTIEMÉTICOS
Esta classe de fármacos é fundamental no manejo de
náuseas e vômitos que possam acometer diferentes tipos de
pacientes e condições, como aqueles que passam por
Hidróxido de alumínio tratamento quimioterápico e apresentam náuseas e vômitos
Reage formando cloreto de alumínio. como efeito adverso, ou aqueles com algum tipo de
Estes sais exercem seu efeito gastroprotetor ao elevar o pH distúrbio fisiológico capaz de induzir essa sintomatologia tão
estomacal e adsorver a pepsina, resultando em breve desagradável. Entretanto, é preciso sinalizar que o vômito é a
atenuação do desconforto causado pela acidez do conteúdo ejeção abrupta do conteúdo estomacal, que pode
gástrico. exercer efeito protetivo ao auxiliar na eliminação de toxinas e
Hidrotalcita impedir sua ingestão subsequente. Porém, antes de
apresentarmos os fármacos, é preciso conhecer o
mecanismo fisiológico que leva a esses processos.
Você já sentiu aquele popular “frio na barriga” durante um
movimento brusco ou susto?

Via sistema vestibular


O sistema vestibular é um sistema complexo localizado no
ouvido interno, onde temos o labirinto, canais semicirculares
Lembra-se de já ter apresentado náusea após alimentação permeados pela endolinfa. Este sistema faz comunicação
em excesso ou depois de comer algum alimento de com o cerebelo, órgão do SNC que garante o equilíbrio.
procedência duvidosa? Processos inflamatórios ou outras alterações neste sistema
estimulam o cerebelo a enviar sinal ao centro emético, que,
em linhas gerais, pode estimular o processo de vômito.
Doenças neste sistema, como a labirintite, além de
dificuldades motoras relacionadas ao equilíbrio, podem gerar
náusea e vômito. O mesmo quadro podemos esperar de
movimentos bruscos ou movimentos suaves repetitivos,
como uma montanha-russa ou um passeio de barco,
respectivamente. Muitos indivíduos traduzem essas
Todos esses quadros podem ter sido traduzidos em náusea
alterações do sistema vestibular em estímulos eméticos.
ou levado ao ápice da sensação de desconforto, o vômito.
Chamamos esse processo de distúrbios vestibulares de
Fisiologicamente, podemos explicar náusea e vômito a partir
cinetose, e os fármacos relacionados ao controle desta
de duas estruturas distintas:
sintomatologia são os pró-cinéticos.
Precisamos destacar que estímulos visuais, dores, odores
repulsivos e fatores emocionais também são capazes de
estimular o centro emético, o que explica muitas situações
cotidianas que levam os indivíduos ao vômito, sem que haja
relação com os órgãos da periferia.
Os fármacos em especial, após serem absorvidos na
corrente sanguínea, são capazes de ser detectados na ZGQ,
uma vez que essa região da barreira hematoencefálica
apresenta certa facilidade de permeabilidade. Tal evento
Via estimulação do centro emético ou centro do vômito fisiológico explica o fato de a ZGQ ser o local de ação dos
O centro do vômito (localizado no sistema nervoso central) é fármacos que induzem o vômito, mas também ser o local de
a região que, quando estimulada, leva ao processo emético, ação da maioria dos fármacos antieméticos.
via resposta eferente aos órgãos da periferia do organismo Para compreensão do quadro geral, observe a imagem a
– os do sistema gastrointestinal. Trata-se de uma estrutura seguir.
localizada na medula que recebe comunicação de outras
estruturas próximas, como a zona de gatilho
quimiorreceptora (ZGQ), região que recebe estímulos do
sistema vestibular e dos nervos aferentes vagais, aqueles que
transmitem os sinais vindos do intestino para o tronco
cerebral.
Pensemos agora na forma aferente, ou seja, o envio de
respostas do sistema gastrointestinal para o sistema nervoso
central – muitas condições podem levar à resposta emética.
As alterações do trânsito intestinal, a plenitude gástrica, as
perdas de motilidade, os estímulos do álcool e alguns
fármacos (os quimioterápicos, por exemplo) são capazes de
estimular o centro emético, desencadeando o vômito.
Legenda: Regulação fisiológica do vômito. Fonte: RANG;
DALE; RITTER 2016.
Esse processo de comunicação com o centro do vômito se
dá via neurotransmissores, como a acetilcolina, histamina,
serotonina, dopamina, substância P, além das encefalinas e
dos endocanabinoides. Neste contexto, o uso de fármacos A bromoprida e domperidona são destaques como pró-
antagonistas dos receptores desses neurotransmissores cinético, pelo fato de atuarem como antagonistas de
constitui a atividade antiemética esperada para os fármacos receptores D2, com menores efeitos sobre o SNC. Já outro
que veremos a seguir. pró-cinético conhecido, a metoclopramida, atua na ZGQ e
Antagonistas dos receptores H1 sobre a motilidade do esôfago, estômago e intestino, sendo
Os fármacos antagonistas dos receptores H1 exercem seu inclusive utilizada no tratamento de algumas doenças, como
efeito através da competição de ligação pela histamina. o refluxo. Em razão de seus efeitos a nível de SNC, são
Fazem parte dessa classe os fármacos: esperados para este fármaco consequências adversas, como
Ciclizina distúrbios do movimento, cansaço e síndrome extrapiramidal.
Hidroxizina Objeto com interação.
Prometazina
Difenidramina
Cinarizina
São eficazes no controle de náuseas e vômitos de
diferentes origens, incluindo quadros de cinetose e náuseas
da gravidez e do viajante.
EFEITOS ADVERSOS
Em geral, são fármacos bem tolerados, mas seu uso está
associado a efeitos sedativos, como sonolência, e deve ser
monitorado a fim de evitar complicações.
Antagonistas dos receptores muscarínicos Molécula da bromoprida
Nesta classe terapêutica, destacamos o uso
da escopolamina (ou hioscina), fármaco utilizado
principalmente em quadros de cinetose, mas com pouca
atividade frente ao uso de substâncias irritantes ao sistema
gastrointestinal, como os quimioterápicos, por exemplo.
EFEITOS ADVERSOS
Dentre os efeitos adversos mais comuns, destacam-se
aqueles sabidamente oriundos do bloqueio colinérgico, como
boca seca, visão embaçada, constipação, entre outros.

Antagonistas dos receptores D2


Grande parte da utilização de antagonistas de receptores de Molécula da domperidona
dopamina se dá pela gastroparesia, ou seja, a redução
acentuada da motilidade gastrointestinal, por redução da
sinalização colinérgica. Essa redução colinérgica se dá por um
freio efetuado por neurônios dopaminérgicos, que
apresentam receptores D2 responsivos à dopamina.
Em quadros de gastroparesia, os enterócitos liberam
dopamina em excesso, que é inibitória para as fibras
colinérgicas, diminuindo o tônus colinérgico. Este sinal é
enviado ao centro do vômito, que acentua a possibilidade de
ocorrência de náusea e o vômito. Os fármacos utilizados Molécula da metoclopramida.
como antagonistas dopaminérgicos, sem que haja intento Antagonistas dos receptores 5-HT3
antipsicótico, não atuam diretamente no centro do vômito, A serotonina, nosso famoso neurotransmissor relacionado às
sendo o seu efeito antiemético esperado com o emoções e à felicidade, é também um neurotransmissor
reestabelecimento da motilidade, sendo assim chamados de liberado pelas células enterocromoafins (ECL) do intestino
pró-cinéticos. delgado, em resposta às substâncias potencialmente tóxicas,
Saiba mais como os quimioterápicos e algumas toxinas, por exemplo. Os
Fármacos antipsicóticos como os fenotiazínicos seus receptores do tipo 5-HT3 estão localizados tanto na
(clorpromazina, perfenazina, proclorperazina) já tiveram seus periferia do organismo (nos nervos aferentes vagais) quanto
efeitos antieméticos descritos, mas também apresentam no SNC (na zona de gatilho quimiorreceptora e no núcleo do
efeito de bloqueio sobre os receptores de histamina e trato solitário), onde se encontram em concentrações mais
muscarínicos. Como efeitos adversos principais, apresentam altas. Essa classe terapêutica compreende os fármacos:
sedação, hipotensão, sintomas extrapiramidais, além de Ondansetrona
distonias (ao afetarem contrações musculares) e discinesias Granisetrona
(distúrbios da atividade motora). Outros fármacos Tropisetrona
antipsicóticos, como Dolasetrona
o haloperidol, droperidol e levomepromazina, também já Palonosetrona
foram utilizados para esta finalidade.
Esses fármacos são bem absorvidos pelo tubo
gastrointestinal (TGI), e seus efeitos persistem, mesmo após
desaparecimento da circulação, o que sugere intensa
interação com seus receptores.
São fármacos eficazes no tratamento de náuseas e vômitos
induzidos por quimioterapia (NVIQ) e náuseas secundárias à
irradiação do abdome superior, bem como nas náuseas
gestacionais e pós-operatórias. Sua utilização no tratamento
de náuseas tardias está relacionada aos diferentes
parâmetros farmacocinéticos, como demonstrado na tabela a
seguir.
Objeto com interação. Aspectos
Fármaco Via de Meia-vida (h) Aprovação fisiopatológicos das náuseas e vômitos induzidos pela
administração para uso quimioterapia. Fonte: NAVARI; SCHWARTZBERG (2018)
Dolasetrona VO 7,3 1997 Muitas substâncias tóxicas, principalmente os fármacos
Granisetrona IV 9 1993 quimioterápicos utilizados no tratamento contra o câncer,
Granisetrona VO 6,26 2001 estimulam a liberação da substância P. Esses
Granisetrona SC LP 26,15 – 28,8 2016 neuromoduladores neuropeptídios (substância P) são
moléculas liberadas pelos nervos aferentes vagais
Granisetrona TD - 2008 gastrointestinais e pelo próprio centro do vômito, os quais
Ondansetrona IV 3,5 – 3,5 1991 interagem com receptores do tipo NK1, encontrados no
Ondansetrona VO 3,1 – 6,2 1992 centro do vômito e na ZGQ. Quando esses receptores são
Palonosetrona IV 40 2003 ativados por seu ligante endógeno, o processo emético é
Palonosetrona/ VO 90 2017 deflagrado, estimulando o vômito.
Netupitanto Os fármacos pertencentes a essa classe, como
Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a o aprepitanto, fosaprepitanto, netupitanto e rolapitanto, são
rolagem horizontal fármacos utilizados no tratamento de náusea tardia, o que
Legenda: IV (intravenoso), SC LP (subcutâneo de liberação lhes confere superioridade no tratamento de NVIQ quando
prolongada), TD (transdérmico), VO (via oral). Fonte: comparados com os antagonistas dos receptores 5-HT3, que
Traduzido de GILMORE et al. (2018) discutimos anteriormente. Sua utilização no tratamento de
EFEITOS ADVERSOS náuseas tardias se deve ao extenso tempo de meia-vida que
Em geral, poucos efeitos adversos são esperados com a esses fármacos apresentam, com taxa de ocupação dos
utilização desses fármacos, sendo as mais comuns receptores de cerca de 24h. Os dados farmacocinéticos dos
constipações (principal queixa dos usuários), diarreia, cefaleia fármacos dessa classe estão descritos na tabela a seguir.
e tontura. Fármaco Via de Meia- Tempo Aprovação
administração vida (h) para pico para uso
Antagonistas do receptor NK1 plasmático
O tratamento da NVIQ é complexo e de extrema (h)
importância clínica. Os fármacos quimioterápicos, em geral, Aprepitanto VO 9,13 4 2003
irritam as células intestinais e causam intenso quadro Aprepitanto IV 9,13 0,5 2017
emético, o que sugere abordagem farmacológica ampla com Fosaprepitanto IV 9,13 < 0,5 2008
a utilização combinada de fármacos de diferentes classes,
Netupitanto / VO 96 5 2014
como os fármacos apresentados anteriormente, e pelos
Palonosetrona
inibidores de substância P, que veremos a seguir (NAVARI;
AAPRO, 2016). Netupitanto / IV 144 0,5 2018
Palonosetrona
Rolapitanto VO 169 – 3 – 4 2015
183
Rolapitanto IV 169 – 0,5 2017
183
Legenda: IV (intravenoso), VO (via oral). Fonte: Traduzido de
NAVARI; SCHWARTZBERG (2018)
EFEITOS ADVERSOS
Em geral, os antagonistas de receptores NK1 são bem
tolerados e não estão associados a efeitos adversos. Poucos
relatos sugerem fadiga, cefaleia e constipação.
Canabinoides
Receptores canabinoides, do tipo CB1, são encontrados nas
vias eméticas tanto centrais quanto periféricas, sendo
majoritariamente achados nas proximidades do centro do
vômito e na ZGQ. Quando estimulados por canabinoides
endógenos, promovem a supressão do estímulo emético
por suprimir a liberação de serotonina pelas células
enterocromoafins e diminuir a liberação de substância P. O
uso de canabinoides como antieméticos vem demonstrado
benefícios em estudos clínicos com pacientes em
tratamento quimioterápico, entretanto outra indicação do uso
destes fármacos é como estimulante do apetite em
A constipação pode ser definida, em linhas gerais, como a
pacientes com quadros de caquexia ou síndromes do tipo
redução do número de evacuações para menos de três
anorexígeno.
vezes por semana, pela dificuldade em iniciar o processo de
Como antiemético, os canabinoides são efetivos contra
evacuar e a eliminação incompleta das fezes. Neste
náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia (NVIQ),
momento, nosso foco é a abordagem farmacológica dessa
isolados ou em combinação com outros fármacos.
condição, mas é preciso ter em mente que a alimentação e
Destacam-se nesta classe os
a ingestão hídrica também exercem enorme importância.
fármacos dronabinol (canabinoide
Para facilitar a compreensão, dividiremos didaticamente os
natural), levonantradol, nabiximols e derivados de extratos de
fármacos laxativos em grupos, como a seguir:
Cannabis sativa. A nabilona é um derivado sintético que age
Objeto com interação.
de forma semelhante aos demais fármacos.
MODULADORES DA MOTILIDADE INTESTINAL
Trata-se de fármacos altamente lipossolúveis, com extensa
A motilidade do intestino grosso é fundamental para
metabolização e ligação com as proteínas plasmáticas, o que
absorção de água e propulsão do bolo fecal dos segmentos
lhes confere intensa distribuição e duração de efeito
proximais aos segmentos distais. A motilidade reduzida ou a
terapêutico. Seu uso clínico ainda depende de aprovação por
motilidade intensa, mas não propulsora, dificultam a
legislação em virtude de ser derivado de substância
eliminação das fezes. Neste cenário, é necessário a utilização
proscrita, e em razão de seus efeitos adversos. Atualmente,
de fármacos laxantes que promovam a inibição de
esses fármacos são prescritos para pacientes que não
contrações segmentares (não propulsoras) e estimulem as
responderam a nenhuma das opções terapêuticas
contrações propulsoras.
disponíveis para controle de náusea e vômito.
Fármacos pró-cinéticos (discutidos anteriormente) podem ser
O uso desses fármacos pode induzir em alguns pacientes a
utilizados por atuarem justamente na regulação da motilidade
síndrome da hiperêmese canabinoide, após uso diário ou
gastrointestinal, além do misoprostol. Outros fármacos
abusivo, por mecanismos ainda não muito bem esclarecidos.
recém-utilizados são os agonistas seletivos de receptores
Destaca-se também a possibilidade de desordens
serotoninérgicos 5-HT4, como a prucaloprida. Este fármaco,
neuropsiquiátricas, como alucinações, uso abusivo do
medicamento, síndromes de ansiedade, além de sonolência e após se ligar ao seu receptor, induz a motilidade
gastrointestinal, sendo eficaz no tratamento da constipação,
boca seca.
apresentando poucos efeitos adversos, como diarreia e
FÁRMACOS LAXATIVOS cefaleia em número reduzido de pacientes (BLACK; FORD,
2018).
Os fármacos antidiarreicos e os laxativos são classes de
fármacos muito importantes na prevenção de agravos e na AGENTES OSMÓTICOS
restauração da qualidade de vida dos pacientes que, Uma grande estratégia para atenuar processos de
porventura, faça uso deles. É sabido que o constipação é a utilização de laxantes osmóticos, aqueles que
promovem o aumento de líquidos no intestino. Chamamos
perfeito funcionamento do trânsito intestinal, com eliminações
de laxantes salinos aqueles sais que, por osmose, promovem
frequentes e dentro de condições de normalidade, implica
a retenção de água no intestino grosso, e isso estimula a
em acréscimo de qualidade de vida.
peristalse (movimentos naturais do intestino).
A perfeita absorção dos nutrientes e da água ingerida
depende, dentre muitos fatores, do tempo de permanência Como destaques para esse grupo, temos os sais sulfato de
dos alimentos nos intestinos delgado e grosso. Problemas magnésio, hidróxido de alumínio, citrato de magnésio e fosfato
relacionados às alterações do trânsito intestinal podem gerar de sódio. Seu uso farmacológico deve ser controlado, em
carência de nutrientes, desidratação, doenças inflamatórias, razão da possibilidade de efeitos adversos. Destacam-se a
perda da microbiota intestinal, desconforto e dores indução da liberação de mediadores inflamatórios e de
abdominais, flatulências, inflamações, sangramentos, além de náuseas, em razão de baixa palatabilidade. Além disso, a
favorecer o surgimento de tumores. disposição de íons destes sais pode gerar descompensações
renais e da pressão arterial.
Outro grupo de fármacos osmóticos envolve os açúcares e
álcoois indigeríveis. Esses açúcares são hidrolisados no
intestino grosso em ácidos graxos de cadeia curta, que
atraem água por osmose para o lúmen do intestino e
estimulam a motilidade propulsora do cólon. São exemplos
desta classe a lactulose, o sorbitol e manitol.
Neste mesmo racional de tratamento, destaca-se o uso de desnutrição, o que pode acelerar processos de caquexia,
soluções eletrolíticas de polietilenoglicol (PEG) de cadeia longa, especialmente importante em pacientes idosos e pediátricos.
como o macrogol, que não são bem absorvidas e ficam Uma ação importante não farmacológica no controle dos
retidas no lúmen intestinal e atuam estimulando a peristalse. processos diarreicos é a reidratação oral.
Esses fármacos são, em geral, bem tolerados por serem Já o tratamento farmacológico deve ser indicado aos
pouco absorvidos. Entretanto, o uso em excesso pode gerar pacientes que apresentam quadros mais intensos,
flatulência, diarreia, cólicas abdominais e distúrbios persistentes e não autolimitados. Seu principal objetivo é
eletrolíticos. promover alívio sintomático nos quadros de diarreia aguda,
FÁRMACOS UMECTANTES E EMOLIENTES FECAIS principalmente por diminuição da motilidade intestinal. Vale
Fármacos como o docusato sódico ou o docusato cálcico são ressaltar que é muito importante avaliar criticamente a
surfactantes iônicos e agem de forma semelhante a um utilização de um fármaco antidiarreico, sobretudo quando a
detergente tensoativo, facilitando a mistura de substâncias diarreia é originada de um processo infeccioso. Neste caso, o
aquosas e gordurosas no lúmen do intestino. Essas estímulo à evacuação é importante na eliminação de
substâncias atuam fazendo com que as fezes assumam possíveis microrganismos potencialmente patogênicos.
forma amolecida, promovendo a evacuação mais facilmente.
Também nesta classe estão os laxativos óleo mineral (mistura Veja algumas estratégias para controle da diarreia:
de hidrocarbonetos alifáticos) e óleo de amendoim, que são Coloides ou polímeros hidrofílicos
indigeríveis e quase não são absorvidos. Apesar de bastante Uma estratégia eficiente é o uso de coloides ou polímeros
seguros, seu uso pode levar ao desenvolvimento de reações hidrofílicos, como a carboximetilcelulose. Esta substância
inflamatórias por parte das células intestinais (pelo fato de absorve água e aumenta o volume, a viscosidade e
serem substâncias atípicas), além de distúrbios na absorção consistência do bolo fecal, diminuindo a fluidez das fezes.
de vitaminas e eletrólitos. Fármacos que se ligam a ácidos biliares e a toxinas
FÁRMACOS LAXANTES ESTIMULANTES OU IRRITANTES bacterianas
Ainda no estímulo à evacuação, encontramos os fármacos O excesso de sais biliares no intestino grosso e a presença
estimulantes e/ou irritantes, que levam ao aumento da de toxinas podem elevar a osmolaridade no lúmen,
secreção de eletrólitos e água pela mucosa, além de favorecendo quadros diarreicos. Seu uso deve ser utilizado
aumentarem a peristalse. É sabido que esses fármacos com critério, em razão da possibilidade de redução da
exercem seus efeitos diretamente nos enterócitos, nos eliminação de patógenos, caso haja infecção.
neurônios intestinais e na musculatura lisa do TGI. Seu Ex.: colestiramina, colestipol e o colesevalam
principal representante, o bisacodil, pode ser utilizado por via Fármacos opioides
oral ou retal, além de outros fármacos derivados Quando o tratamento da diarreia requer abordagem mais
das antraquinonas (sene, cáscara-sagrada, aloé) e o ácido incisiva, são utilizados fármacos opioides, que atuam por
ricinoleico (óleo de rícino). diferentes mecanismos através dos receptores opioides do
Dentre os principais efeitos adversos, destacam-se as cólicas tipo µ (relacionados à motilidade intestinal e absorção) e
abdominais e os distúrbios eletrolíticos, além do risco de receptores δ (secreção intestinal e absorção).
lesão das mucosas e respostas inflamatórias sustentadas e Estes receptores estão localizados nos nervos entéricos, nas
duradouras. Tais fármacos não devem ser utilizados em células epiteliais e nos músculos, favorecendo sua utilização
quadros de obstrução intestinal, de quaisquer origens, diante como antidiarreicos. São representantes desta classe os
dos riscos de sangramentos ou rompimento de estruturas. fármacos que atuam principalmente nos receptores opioides
Seu uso exagerado pode causar atonia do cólon e gerar µ: difenoxilato e difenoxina – derivados da petidina – e
dependência, o que sugere a necessidade de doses cada a loperamida, principal fármaco utilizado desta classe, que,
vez maiores para manutenção do efeito esperado. além de excelente antidiarreico, oferece pouca ação no SNC.
FÁRMACOS ANTIDIARREICOS A loperamida age aumentando o tempo de trânsito ao longo
Semelhante ao que estudamos para os fármacos laxativos, de todo o TGI, além de aumentar o tônus do esfíncter anal,
chegamos agora ao estudo dos distúrbios da absorção de o que facilita o controle sobre a evacuação. Outros opioides
água e de eletrólitos, que podem ocasionar a perda abrupta também podem ser utilizados, como a codeína e os
desses elementos e estimular a evacuação em excesso, seja compostos que possam conter opioides, como o elixir
em número de eventos, seja na quantidade deles – o que paregórico.
conhecemos como diarreia. As encefalinas são opioides endógenos que atuam como
Processo diarreico Esse fenômeno é complexo e possui neurotransmissores entéricos; suas ações envolvem a
muitas etiologias, e o entendimento desses processos facilita inibição da secreção intestinal sem alterações da motilidade.
o racional de tratamento eficaz. Inicialmente, a sobrecarga O uso do racecadotrila, fármaco inibidor da encefalinase
osmótica, tão objetivada pelos fármacos laxativos, pode ser (enzima que degrada esses neurotransmissores), reforça o
exagerada e ocasionar a aceleração do trânsito intestinal, efeito das encefalinas endógenas e reduz a secreção
levando à eliminação das fezes antes que estas sejam intestinal em excesso, exercendo, assim, efeito antidiarreico.
moldadas, favorecendo quadros diarreicos. Em geral, esses Modulo 3
quadros são autolimitados e se resolvem sem a necessidade
de intervenção medicamentosa. Entretanto, casos mais FÁRMACOS QUE ALTERAM A ATIVIDADE METABÓLICA
graves requerem atenção em virtude das complicações que Antes de entrarmos no mundo dos fármacos utilizados para
podem ser evidenciadas, como risco de desidratação e redução da glicemia, precisamos resumir um fenômeno
fisiológico supercomplexo, que é a homeostase da glicose.
Trata-se de um processo altamente estruturado que
necessita do envolvimento de diferentes órgãos e de suas
comunicações. Temos aqui um enorme destaque
da insulina (hormônio produzido nas células β-pancreáticas),
que tem a sua secreção milimetricamente organizada para
promover o balanço de glicose no organismo, seja após as
refeições, seja nos períodos de jejum prolongado.
Vale ressaltar que o organismo em jejum é capaz de adquirir
glicose por outras vias, como a glicogenólise, a β-oxidação
de ácidos graxos e a gliconeogênese, com destaque para o
metabolismo hepático, estimulado por outro hormônio, o
glucagon, que tende a manter os níveis de glicose no
sangue nos períodos de jejum. Observe esse processo
fisiológico, a seguir.
Estado de jejum
Nos seres humanos sadios, o nível plasmático de glicose é
mantido em uma faixa de 4,4-5 mM, enquanto os ácidos Regulação da glicemia via insulina - Estado prandial. Fonte:
graxos são mantidos em níveis próximos de 400 µM. Na GOODMAN & GILMAN, 2012.
ausência de absorção de nutrientes pelo trato GI, a glicose é Estado prandial
suprida principalmente pelo fígado, e os ácidos graxos, pelo Durante a alimentação, a absorção de nutrientes produz
tecido adiposo. Durante o jejum, os níveis plasmáticos de uma elevação da glicose plasmática, resultando na liberação
insulina estão baixos, enquanto os de glucagon estão intestinal de incretinas e em estímulos neurais que
elevados, contribuindo para o aumento de glicogenólise e da promovem a secreção de insulina. Sob o controle da insulina,
gliconeogênese hepáticas; a insulina em baixos níveis o fígado, o músculo esquelético e o tecido adiposo captam
também libera os adipócitos de sua inibição, permitindo um ativamente a glicose. Tanto a produção de glicose hepática
aumento da lipogênese. A maioria dos tecidos oxida, quanto a lipólise são inibidas, e a oxidação corporal total da
principalmente, ácidos graxos durante o jejum, preservando glicose. O encéfalo detecta as concentrações plasmáticas de
a glicose para uso pelo SNC (GOODMAN & GILMAN, 2012). glicose e fornece impulsos aferentes reguladores que
contribuem para a homeostasia energética. A espessura das
setas reflete a intensidade relativa de ação, enquanto as
linhas tracejadas indicam pouca ou nenhuma atividade
(GOODMAN & GILMAN, 2012).
Você sabia
Muitas vezes, nós nos alimentamos e ingerimos uma
quantidade de carboidratos muito maior que a necessária
para o nosso balanço energético. Este processo é um
desafio para o organismo regular a homeostase de glicose,
uma vez que parte dessa glicose deve ser consumida dentro
das células (via glicólise), parte deve ser biotransformada em
glicogênio e outra parte, eliminada. Quem promove a
regulação desse processo é a insulina, hormônio que tem
sua secreção estimulada pela ingestão de alimentos,
absorção de nutrientes e aumento da glicemia. O aumento
exagerado da glicemia, processo que chamamos de diabetes,
está associado às anormalidades na secreção deste
Regulação da glicemia via insulina - Estado de jejum. Fonte: hormônio.
GOODMAN & GILMAN, 2012. A célula β-pancreática é estimulada a disponibilizar insulina
durante todo o processo de digestão, até que a glicemia seja
normalizada. Existem também estímulos neurais que
promovem a liberação de insulina, além da liberação de
peptídeos insulinotrópicos por células intestinais mediante a
chegada do alimento. Esses peptídeos, que podem ser
chamados de amplificadores da secreção de insulina
ou incretinas (guarde este nome!), são secretados em
quantidades variadas de acordo com a porção de alimento
ingerida e enviam respostas à célula β-pancreática, para
estimular a produção de insulina. Aqui, está o principal desafio
da insulinoterapia: fazer o papel da insulina natural, hormônio estimula a captação da glicose ingerida, através
mimetizando o complexo fenômeno natural. dos músculos e do tecido adiposo, via expressão de
Veja a figura a seguir para melhor compreensão desses receptores próprios (GLUT).
processos. Então, depois de toda explicação fisiológica, chamamos de
diabetes o quadro clínico onde há hiperglicemia associada à
deficiência de insulina. Essa deficiência pode ser:
Diabetes tipo 1
Ausência de produção
Diabetes gestacional
Glicose elevada no sangue durante a gravidez
Diabetes tipo 2
Ação equivocada (diminuída) do hormônio
O diagnóstico da diabetes depende de exames clínicos e
laboratoriais (glicemia de jejum, hemoglobina glicada e
glicemia pós-prandial).
É sabido que essa condição pode ter origens genéticas,
Regulação da glicemia via insulina - Estado prandial. Fonte: hereditárias, relação com hábitos e estilos de vida, doenças
GOODMAN & GILMAN, 2012. que acometam o pâncreas endócrino (como o câncer),
A célula β do pâncreas no estado de repouso (nível de infecções e até a utilização de fármacos capazes de
glicemia em jejum) encontra-se hiperpolarizada. A glicose, aumentar a glicemia. Para os pacientes que apresentam o
que entra por intermédio dos transportadores GLUT diabetes tipo I, o tratamento farmacoterapêutico é baseado
(principalmente o GLUT1 nos seres humanos e o GLUT2 em na insulinoterapia (administração de insulina exógena), com a
roedores), é metabolizada e eleva o nível de ATP, que inibe intenção de mimetizar o processo natural que o organismo
a entrada do K+ através do canal de KATP. A condutância não é capaz de produzir. Já para os pacientes que
diminuída do K+ resulta em despolarização, levando à apresentam o diabetes tipo I , o racional farmacológico é
exocitose da insulina armazenada dependente de Ca2+. O auxiliar o controle da glicemia diante da incapacidade do
canal de KATP, que na realidade é um hetero-octâmero organismo de liberar insulina corretamente. Vamos começar
composto das subunidades SUR1 e Kir 6.2, constitui o local de nosso estudo farmacológico pela utilização da insulina como
ação de várias classes de fármacos: fármaco, a insulinoterapia.
● O ATP liga-se ao Kir 6.2 e o inibe;
● A sulfonilureias e meglitinidas ligam-se ao SUR1 e o inibem.
Por conseguinte, todos os três agentes promovem a
secreção de insulina. O diazóxido ao ADP-Mg2+ (baixo nível
de ATP) ligam-se ao SUR1 e o ativam, inibindo
consequentemente a secreção de insulina. As incretinas
intensificam a secreção de insulina (GOODMAN & GILMAN,
2012).
O que é insulina? Para entendermos a insulinoterapia,
precisamos compreender brevemente o hormônio natural. A
insulina é produzida e liberada pelas ilhotas pancreáticas, que
representam cerca de 2% do pâncreas. Essas ilhotas Insulinoterapia
possuem função endócrina, sendo responsáveis pela A insulina humana é um hormônio peptídeo formado por
liberação de diferentes hormônios, como glucagon (células duas cadeias (A e B) interligadas por ligações de sulfeto.
α), insulina (células β), somatostatina (células δ) e a grelina Inicialmente, a insulina exógena era extraída do pâncreas de
(células ε). A insulina que será exocitada pelas células β- porcos e bovinos; portanto, imagine a série de reações
pancreáticas passa por uma série de modificações no seu alérgicas que isso causava. Porém, os avanços da biologia
local de produção e, ao ser liberada, possui curto tempo de molecular permitiram modificações estruturais, trazendo
meia-vida, de 5-6 minutos. Como já mencionamos, esse ganhos de farmacocinética e muitas melhorias para os
processo de liberação é um evento fisiológico coordenado pacientes que não produzem o hormônio e precisam utilizá-
por nutrientes (destaque para a glicose), hormônios lo.
gastrointestinais e pancreáticos e neurotransmissores. A O principal objetivo das diferentes formulações disponíveis
glicose é o principal secretagogo (aquele que estimula a no mercado farmacêutico é simular a ação do hormônio
liberação) de insulina. Mais à frente, discutiremos sobre humano, após administração por via subcutânea.
fármacos secretagogos, ou seja, aqueles que estimulam a É exatamente a via subcutânea que possibilita formulações
secreção de insulina para controlar a glicemia. de insulina com tempos de ação diferentes, ditando o quanto
De forma bem resumida e simplória, altas concentrações de da insulina é absorvida e quão rápido esse processo será. As
insulina reduzem a glicemia, ao inibir a produção de glicose diferenças de absorção e formulação das variadas
pelo fígado, a degradação de gorduras e a degradação de apresentações das insulinas exógenas podem ser vistas a
músculos, que levaria à oferta de glicose. Além disso, o seguir.
O uso de insulinas exógenas está associado ao risco de
hipoglicemia, lipodistrofia e incômodos relacionados à
administração parenteral, e, por isso, deve ser prescrito de
forma racional por profissional endocrinologista, e o paciente
deve manter acompanhamento com outros profissionais
constantemente.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO DA HIPERGLICEMIA


Agora que conhecemos as diferentes preparações de
insulina utilizadas de forma endógena, vamos nos aprofundar
Panorama resumido das insulinas exógenas Fonte: Traduzido sobre a farmacologia dos fármacos euglicemiantes e
e adaptado de MATHIEU et al. (2017) dos fármacos secretagogos da insulina. Esses fármacos são
A insulina humana é produzida em estruturas complexas excelentes alternativas farmacológicas no tratamento do
(dímeros, trímeros e tetrâmeros) coordenadas por átomos diabetes mellitus tipo I , com ótimos perfis de segurança e
de zinco. Entretanto, quando liberadas na corrente sanguínea, eficácia. Para melhor compreensão, vamos dividir os
elas adquirem formas monoméricas, sendo capazes de fármacos de acordo com suas classes terapêuticas:
sinalizar os receptores. O conhecimento da insulina humana SULFONILUREIAS MODULADORES DOS CANAIS DE K/ATP
possibilitou o desenho de moléculas novas, com outras Estes fármacos hipoglicemiantes têm como principais
formas de agregação e diferentes perfis de dissociação. representantes a glibenclamida, glipizida e glimepirida e agem
Neste sentido, as insulinas monoméricas agem mais rápido, estimulando a liberação de insulina pela sua ligação inibitória
comparadas àquelas mais estruturadas, por não necessitarem do canal de K/ATP da célula β-pancreática. Como já
se dissociar. discutimos, essa inibição leva à liberação de insulina por esse
Você sabia tipo celular. Esses fármacos também inibem a eliminação da
Em geral, as insulinas de ação rápida são eficientes após a insulina pelo fígado, o que a deixa mais disponível para
alimentação, mas não conferem ação prolongada. Para reduzir a glicemia. São fármacos bem absorvidos pelo tubo
longas ações, a primeira insulina exógena utilizada foi a gastrointestinal, embora esse processo possa ser dificultado
insulina NPH, conjugada com a protamina, uma proteína que pela presença de alimento.
a mantém em estrutura hexamérica complexa, tornando ua Seus efeitos terapêuticos ficam evidentes entre 12-24h,
absorção e o início de ação mais prolongados. fazendo com que sejam utilizados uma vez ao dia. Após
Veja a seguir, de forma esquemática, os picos de metabolização pelo fígado, são eliminados pela urina.
concentração plasmática e a duração do efeito. Assim como outros fármacos utilizados para a mesma
finalidade, eles podem causar hipoglicemia, ganho de peso e,
em menor frequência, náuseas, vômitos, icterícia, anemias e
reações de hipersensibilidade. Seu uso não é indicado no
tratamento de diabetes tipo I, na gravidez e lactação, e deve
ser monitorado em pacientes com doença renal crônica e
com algum grau de insuficiência hepática.
NÃO SULFONILUREIAS MODULADORES DOS CANAIS DE
K/ATP
Aqui, vamos falar dos fármacos repaglinida, nateglinida,
fármacos pertencentes à classe da meglitinida. Assim como
Níveis plasmáticos de diferentes tipos de insulina Fonte: as sulfonilureias que acabamos de estudar, tais fármacos
Traduzido de MATHIEU et al. (2017) exercem os seus efeitos pela inibição dos mesmos canais de
As insulinas de ação rápida atingem seu pico plasmático mais K/ATP, mas a sua farmacocinética (meia-vida de
rapidamente, entretanto seus efeitos são mais curtos. Já as aproximadamente 1h) faz com que sejam utilizados apenas
insulinas de ação mais lenta demoram mais tempo para antes da alimentação.
atingir seu pico plasmático, ou não o atingem, mantendo seu São metabolizados pelo fígado e pelos rins e compartilham
tempo de ação mais duradouro. Esse fato explica o racional com as sulfonilureias a contraindicação de uso pelos
de uso das insulinas atualmente, uma combinação entre as pacientes renais crônicos e doença hepática. Essas duas
duas modalidades, sendo as insulinas de ação rápida utilizadas classes de medicamentos se ligam a proteínas plasmáticas, o
após mensuração da glicemia capilar (verificação doméstica), que sugere um risco aumentado de interações
com dose proporcional ao resultado do teste. medicamentosas.
Atenção BIGUANIDAS
Chegamos ao fármaco que a grande maioria das pessoas chamados de sensibilizadores. Por esta razão, podem ser
deve conhecer: a metformina, único fármaco desta classe utilizados em quadros de resistência à insulina.
utilizado atualmente. Porém, engana-se quem acha que este As tiazolidinedionas necessitam da insulina para sua atividade,
fármaco é simples. Inúmeros mecanismos já foram descritos, sendo utilizada exclusivamente dessa forma no tratamento
e este se enquadra como fármaco euglicemiante ou anti- de pacientes com diabetes tipo I , geralmente associados a
hiperglicemiante, já que não tem ação sobre a secreção de metformina. Seu uso está relacionado a efeitos adversos, e o
insulina pelas células β-pancreáticas. Seu efeito farmacológico ganho de peso (por estímulo a lipogênese e inibição da
pode ser resumido em redução da gliconeogênese hepática lipólise) é o mais evidente. Além deste, alguns pacientes
e renal, ou seja, formação de novas moléculas de glicose. Tal cursam com edema de mácula, insuficiência cardíaca e
processo acontece pelo estímulo à oxidação de ácidos demais riscos cardiovasculares (mais preocupantes).
graxos, captação da glicose e a seu metabolismo não AGONISTAS DE RECEPTOR GLP-1
oxidativo. Como mencionamos anteriormente, as incretinas são
A metformina leva ao aumento da captação da glicose pelo peptídeos liberados após as refeições, sendo o GLP-1 seu
músculo esquelético, principalmente por induzir o aumento principal representante. Esse peptídeo estimula a liberação
da quantidade de receptores de glicose (do tipo GLUT-4), de insulina, inibe a liberação de glucagon, retarda o
diminuindo a oferta deste nutriente na circulação sanguínea. esvaziamento do conteúdo estomacal e promove a redução
Quanto ao metabolismo, é também atribuído ao fármaco o da glicemia. O peptídeo GLP-1 pode ser administrado por via
aumento da expressão de enzimas da via glicolítica (faz com intravenosa, mas é rapidamente inativado pela enzima DDP-4
que a glicose seja consumida para obtenção de energia). (dipeptidil peptidase IV), não sendo eficiente para ser utilizado
Destaca-se também efeito na inibição da secreção do como fármaco. Sendo assim, duas estratégias são uteis no
hormônio glucagon e redução do apetite (fazendo com que tratamento do diabetes tipo I : o uso de agonistas do
muitos pacientes utilizem esse fármaco para este fim). receptor GLP-1 resistentes à inativação e inibidores da DDP-
Olhando pelo lado molecular, ele interfere na respiração 4, que discutiremos no próximo tópico.
celular mitocondrial e causa diminuição do ATP intracelular e Atualmente, temos disponíveis os
aumento de AMP. Esse fenômeno ocasiona o aumento da fármacos exenatida, liraglutida, albiglutida, dulaglutida, lixisenatida.
atividade da proteína quinase dependente de AMP (AMPK), Todos eles são agonistas dos receptores GLP-1, que
enzima responsável por grande parte dos efeitos felizmente não são inibidos pela DDP-4, e utilizados por via
farmacológicos desta molécula. subcutânea (já que peptídeos seriam facilmente destruídos
Esse fármaco é eliminado de forma inalterada pela urina, e por via oral). Esses fármacos estimulam a síntese e a
não se liga a proteínas plasmáticas. É utilizado como primeira liberação (exocitose) da insulina produzida pela célula β-
linha de tratamento do diabetes tipo 2, ou em sua profilaxia pancreática após a alimentação. A ativação desses
(evitar que ela aconteça). Pode ser utilizado em monoterapia receptores no sistema nervoso central leva os pacientes a
ou conjugado com outros fármacos (em especial, os apresentar náuseas e vômitos, sendo essa a principal queixa,
secretagogos). Seus efeitos adversos mais observados além dos riscos de hipoglicemia.
incluem descompensações gastrointestinais, náuseas, cólicas INIBIDORES DA ENZIMA DDP-4
e perda abrupta do apetite. A DDP-4 é uma enzima distribuída em todo o organismo,
TIAZOLIDINEDIONAS OU GLITAZONAS com múltiplas utilizações, incluindo a inibição do GLP-1. Neste
Vamos falar agora de um grupo de fármacos que são sentido, o bloqueio dessa enzima aumenta a disponibilidade
ligantes do PPAR γ (receptor gama ativado por proliferação do GLP-1 após a alimentação e, com isso, estimula a
peroxissomal), um tipo de receptor hormonal nuclear liberação de insulina. Destacam-se, nesta classe,
relacionado ao metabolismo de glicose e de lipídios. São a sitagliptina, saxagliptina, linagliptina, alogliptina e vildagliptina,
representantes desta classe a rosiglitazona, pioglitazona e que inibem de diferentes formas a enzima DDP-4 por cerca
a troglitazona (uso questionável em razão dos efeitos de 12h, elevando consideravelmente a disponibilidade do GLP-
adversos). Esses receptores estão expressos principalmente 1.
no tecido adiposo, mas também são visualizados no músculo Não estão associadas a esses fármacos as alterações do
cardíaco, esquelético e liso, nos macrófagos, nas células do apetite e as motilidades gastrointestinal e de peso. São
endotélio vascular e nas células β-pancreáticas. fármacos facilmente absorvidos por via oral, sendo
Quando ativados pelos ligantes endógenos, eles formam metabolizados pelo fígado, aumentando os riscos de
duplas e estimulam a diferenciação do adipócito, a captação interações medicamentosas. São em geral fármacos bem
dos ácidos graxos circulantes no tecido adiposo e o aumento tolerados, não associados a efeitos adversos.
da sensibilidade dos tecidos pela insulina, sendo essa a INIBIDORES DA Α-GLICOSIDADE
principal ação farmacológica esperada para esses fármacos. Constitui abordagem interessante na redução da glicemia a
Além disso, estimulam a inserção do transportador de glicose inibição da enzima intestinal α-glicosidase, envolvida no
(GLUT-4) no tecido adiposo e no músculo esquelético, processo de absorção de monossacarídeos. Representam
aumentando a captação de glicose, estimulando seu essa classe os fármacos acarbose, miglitol e voglibose, que
consumo (via glicolítica) e inibindo a gliconeogênese no impedem a absorção intestinal de glicose após a alimentação.
fígado. Por esta razão, são utilizados no tratamento do diabetes tipo
Esses fármacos promovem ações semelhantes às da insulina I , sem alterar o processo de secreção da insulina.
e são capazes de potencializar a sinalização celular da insulina Seus efeitos adversos mais expressivos são justamente
nos tecidos-alvo (fígado, tecido adiposo e músculos), sendo ocasionados pela presença do açúcar no lúmen intestinal,
como flatulências, desconforto abdominal e diarreia. Alguns (por exemplo β-lactâmicos); seu mecanismo de ação (por
pacientes apresentam reações cutâneas de exemplo, inibidores de síntese proteica); seu espectro de
hipersensibilidade, além de hipoglicemia, quando o uso está atividade (amplo ou baixo espectro); tipo de efeito
conjugado com outros fármacos, como a metformina e (bacteriostático, que inibe a replicação das bactérias, ou
alguns fármacos secretagogos da insulina. Vale mencionar bactericida, que mata as bactérias); fontes de origem (por
que esses fármacos são contraindicados em pacientes com exemplo, derivados de fungos).
insuficiência renal grave. Nenhuma dessas classificações será obrigatoriamente seguida
Sabemos que a hipoglicemia pode se dar tanto pelo neste tema, e utilizaremos diversas delas de acordo com o
tratamento do diabetes como pela presença de tumor uso mais frequente para descrever determinado grupo.
pancreático com hipersecreção de insulina. Em geral, os O sucesso dos antibióticos na prática clínica se deve,
fármacos utilizados no controle da glicemia também basicamente, às diferenças em alvos moleculares e vias
representam risco de hipoglicemia, o que seria o efeito metabólicas bioquímicas entre o hospedeiro (no caso, seres
exagerado deles. Quando relacionada ao tratamento, a humanos) e o organismo infectante. Neste tema,
hipoglicemia é mais expressiva nas insulinoterapias. Dentre os exploraremos os princípios que regem a utilização racional
principais sintomas, destacam-se sudorese, fome, parestesias, de antibióticos visando diminuir a velocidade de aparecimento
palpitações, confusão mental, fraqueza, tontura, visão turva e de resistência a esses agentes e os mecanismos de ação e
perda da consciência, e, em casos mais graves, óbito. aplicações clínicas dos principais membros dessa classe de
Tema 8 fármacos.
Antibióticos Direcionaremos nossas atenções para o caso específico do
INTRODUÇÃO tratamento das infecções causadas por bactérias,
Todos os organismos vivos são suscetíveis a processos microrganismos procariotas (sem núcleo) que são
infecciosos causados por vírus, bactérias, fungos, responsáveis por grande parte das doenças infecciosas que
protozoários e helmintos. No caso dos humanos, o acometem os seres humanos.
tratamento de infecções com agentes farmacológicos Módulo 1
específicos teve início com Ehrlich e com o uso de
arsenicais seletivamente tóxicos para o tratamento da sífilis Reconhecer os princípios básicos do uso de antimicrobianos
no princípio do século XX. Esse avanço relacionou-se, e os alvos celulares e moleculares para ação dos
obviamente, à descoberta dos micróbios como causadores antimicrobianos
de doença na segunda metade de século XIX por Louis
Pasteur e Robert Koch.

O tratamento farmacológico de doenças infecciosas é único.


Na farmacoterapia da maioria das doenças, administramos
medicamentos que têm ação farmacológica em algum
receptor ou proteína no paciente. Ao tratar infecções,
Entretanto, a verdadeira revolução dos antibióticos (também damos antibióticos para que exerçam um efeito
chamada de “época de ouro” da antibioticoterapia) teve início farmacológico desejado no organismo que está causando
com a descoberta da penicilina por Fleming, em 1929, a partir infecção no paciente. Com poucas exceções, efeitos diretos
da cultura de fungos do tipo Penicillium e, posteriormente, dos antibióticos nos pacientes não são desejados e são
com sua síntese e utilização clínica por Chain e Florey em considerados adversos.
1941. Sem dúvida, o desenvolvimento dos agentes USO RACIONAL DE ANTIBIÓTICOS E MECANISMOS DE
antimicrobianos pode ser considerado um dos avanços mais RESISTÊNCIA
importantes na história da medicina. Embora os antibióticos sejam, sem dúvida, uma das
Hoje em dia, a definição mais aceita de antibiótico é a de descobertas mais benéficas da ciência, seu uso traz riscos e,
uma “substância produzida por microrganismos ou sintetizada portanto, precisa ser feito de maneira racional, respeitando
parcial ou totalmente em laboratório, com a capacidade de, alguns princípios básicos. Os antibióticos podem afetar
em baixas doses, inibir a reprodução ou destruir outros adversamente os pacientes, provocando reações alérgicas,
microrganismos (em geral bactérias)”. Muitas vezes, os causando toxicidade direta ou alterando a flora bacteriana,
antibióticos sintetizados em laboratórios são referidos como levando a superinfecções com outros organismos.
quimioterápicos, apesar de, no uso corriqueiro, o termo O uso de antibióticos é a principal força motriz no
antibiótico ser utilizado tanto para substâncias naturais como desenvolvimento da resistência a esses mesmos antibióticos,
sintéticas. que pode afetar não apenas os pacientes tratados, mas
Existem várias formas de classificar antibióticos. Podemos outros acientes, por meio da transmissão de organismos
classificar essas drogas em função de: sua estrutura química resistentes. É importante ter em mente todas essas
potencialidades para consequências adversas ao usar
antibióticos.
O aparecimento de resistência aos antibióticos é, talvez, um
dos problemas que mais assombram infectologistas de todo
o mundo. Hoje, já foram identificadas bactérias que são
resistentes a todos os antibióticos conhecidos, e para as quais
não há tratamento eficaz disponível.
Os múltiplos mecanismos pelos quais a resistência ocorre,
apesar de complexos, podem ser simplificados em quatro
tipos básicos principais:
A. A permeabilidade reduzida da membrana da
bactéria ao antibiótico pode impedir que este O diagnóstico de certeza de uma infecção deve ser buscado
penetre na bactéria, diminuindo a concentração a todo custo para justificar o uso de antibióticos. Muitas das
intracelular do antibiótico. Isso pode ocorrer por vezes, um teste simples ou exame cuidadoso poderia
causa de mudanças na composição da parede distinguir um resfriado comum de uma infecção bacteriana,
celular, perda ou modificações nos canais de porinas evitando o uso de antibióticos em milhões de pessoas e,
ou formação de biofilme por algumas bactérias. com isso, diminuindo a incidência de resistência microbiana e
B. Modificações enzimáticas, como a produção, pela efeitos adversos.
bactéria, de uma enzima que destrói o antibiótico Um segundo princípio básico é a utilização de drogas de
antes de chegar ao local de atividade, são um espectro estreito sempre que possível. Agentes de espectro
segundo mecanismo visto (por exemplo, produção mais amplo multiplicam o número de bactérias afetadas pela
de β-lactamases que destroem os antibióticos β- droga, aumentando as chances de desenvolvimento de
lactâmicos). resistência e superinfecção (uma infecção que aparece
C. Um terceiro mecanismo consiste em alterações no durante o tratamento de uma primeira infecção em função
alvo molecular, levando a uma eliminação ou do efeito do antibiótico selecionando uma bactéria resistente).
modificação do local de atividade do antibiótico, de “Mais amplo” e “mais novo” não são sinônimos de “melhor”.
modo que não funcione (por exemplo, Por exemplo, a boa e velha penicilina mata organismos
modificações ribossomais que diminuem a eficácia suscetíveis mais rapidamente do que quase qualquer droga
de alguns antibióticos inibidores da síntese de no mercado.
proteínas). Um outro princípio básico é a utilização de doses adequadas
do antibiótico. As bactérias expostas a baixas concentrações
de antibióticos são mais passíveis de desenvolver resistência
do que aquelas expostas a doses efetivas. Afinal, bactérias
mortas não sofrem mutação ou outros processos que
levem à resistência. Assim, a observação rigorosa da
farmacodinâmica e farmacocinética do antibiótico em uso
leva a uma menor probabilidade de que a resistência se
desenvolva.
Por fim, é importante mencionar que, sempre que
antibióticos são utilizados, devemos buscar a menor duração
Figura 1: Mecanismo de resistência antimicrobiana possível de tratamento que seja capaz de controlar
D. O efluxo ativo bombeando antibióticos de dentro definitivamente a infecção. Infelizmente, a duração da terapia
para fora da bactéria também pode ocorrer, é uma das áreas menos estudadas das doenças infecciosas.
diminuindo as concentrações intracelulares da droga. As durações são geralmente de 5, 7, 10 ou 14 dias, mais
O exemplo de bombeamento de tetraciclina para alinhadas com nosso sistema decimal e os dias em uma
fora da bactéria em patógenos resistentes a esse semana do que com qualquer outra coisa estudada com
antibiótico é bastante conhecido (figura 1). precisão.
O primeiro princípio básico para uso de antibióticos é o de
administrar esses medicamentos quando o paciente
realmente apresenta uma infecção (neste momento,
focamos apenas as infecções bacterianas).
Uma porcentagem substancial de todo o uso de antibióticos
é direcionada a pacientes que não são verdadeiramente
infectados, mas em quem os organismos são isolados a partir
de um procedimento de cultura.
O isolamento de Staphylococcus epidermidis de uma única
hemocultura ou de espécies de cândida de uma cultura
urinária em um paciente cateterizado é uma situação Figura 2 – Como acontece a resistência a antibióticos
comum na qual o paciente devem ser examinados para Novos estudos estão mostrando que durações mais curtas
determinar se há realmente uma infecção. da terapia geralmente são tão eficazes como cursos
prolongados e possivelmente menos propensas a selecionar Nessa fase, é prudente escolher agentes antimicrobianos que
resistência. À medida que os estudos progridem e sejam seguros, eficazes, com espectro estreito e econômico.
determinam fatores adicionais que indicam quando as Isso ajuda a evitar toxicidade desnecessária, falhas no
infecções são suficientemente tratadas, deve ser possível tratamento e possível surgimento de resistência
definir com mais precisão a duração da terapia paciente a antimicrobiana, além de ajudar a gerenciar custos. Em geral,
paciente. A figura 2 ilustra como ocorre a resistência depois da troca da terapia empírica para a definitiva, ocorre
bacteriana à antibióticos. uma diminuição da cobertura, porque não precisamos atingir
REGIMES ANTIBIOTICOTERÁPICOS organismos que não causam infecção no paciente em
Existem três categorias principais de regimes questão.
antibioticoterápicos. São elas: O médico que está tratando um paciente infectado deve
Terapia profilática sempre se esforçar para realizar a transição para a terapia
O tratamento é dado para prevenir uma infecção que ainda definitiva. Embora pareça óbvio, isso nem sempre ocorre. Se
não se desenvolveu. O uso de terapia profilática deve ser o paciente melhora com o tratamento empírico, os médicos
limitado a pacientes com alto risco de desenvolver infecção, muitas vezes ficam relutantes em fazer a transição para uma
como aqueles em terapia imunossupressora, aqueles com terapia de espectro mais estreito. É bem verdade que
câncer ou pacientes que passam por alguns tipos de cirurgia. muitos médicos, agindo em nível ambulatorial,
A probabilidade de infecção por alguns tipos de organismos frequentemente pulam a etapa de coleta da cultura iniciando
nesses pacientes é alta e as consequências da infecção são a terapia empírica e aguardando seu desfecho. Isso ocorre
muito graves, assim os benefícios superam os riscos e a devido a pressões no tempo ou ao custo e ao inconveniente
profilaxia com antibióticos é indicada. de se obter culturas em pacientes com infecções de baixa
A chave para entender a profilaxia com antimicrobianos é gravidade. O uso frequente de antibióticos de amplo
lembrar que os pacientes que a recebem não têm uma espectro empiricamente é um fator importante e, em
infecção, mas estão em risco de desenvolvê-la. Um exemplo grande parte, responsável pela crise de aumento de
prático seria a utilização de trimetoprim/sulfametoxazol para resistência aos antimicrobianos. Como exemplo, podemos
prevenir pneumonia por Pneumocystis jirovecii em pacientes citar a transição de piperacilina/tazobactam para ampicilina
em uso de ciclosporina e prednisona após transplante em um paciente com infecção de ferida causada
hepático por Enterococcus faecalis, suscetível a ambas as drogas.
Terapia empírica
Diferentemente da terapia profilática, a terapia empírica é
administrada a pacientes que têm uma infecção comprovada
ou fortemente suspeitada, mas o organismo responsável
ainda não foi identificado. É o tipo de terapia mais comum no
dia a dia da prática médica.
Após o médico clínico avaliar a probabilidade de uma
infecção baseada em exame físico, resultados laboratoriais e
outros sinais e sintomas, ele geralmente deve coletar
amostras para cultura e coloração Gram. Os resultados para
coloração Gram podem ser obtidos de maneira rápida,
ALVOS CELULARES E MOLECULARES PARA AÇÃO DOS
entretanto os resultados da cultura para identificar o
ANTIMICROBIANOS
microrganismo e o antibiograma, que testa a suscetibilidade
Praticamente todos os seres vivos apresentam a mesma
dele a vários antibióticos, podem demorar vários dias. Dessa
estrutura conformacional básica (ácidos nucléicos — DNA e
forma, a terapia empírica é geralmente iniciada antes que o
RNA —, proteínas, glicídios e lipídeos). Para encontrarmos
clínico saiba a identidade exata e as susceptibilidades do
agentes terapêuticos que afetem os patógenos, mas não as
organismo causador (por isso é chamada empírica). A terapia
células humanas, é necessário encontrar diferenças
empírica é o nosso melhor palpite sobre qual antimicrobiano
bioquímicas relevantes entre eles.
deve ser mais ativo contra a provável causa de infecção. Às
Entre essas diferenças, está a parede celular, uma estrutura
vezes, estamos certos, e, às vezes, estamos errados.
rica em peptideogliganos que circunda a membrana
Lembre-se de que a terapia empírica não deve ser
plasmática presente apenas nas bactérias. A síntese do seu
direcionada contra todos os microrganismos na natureza —
principal componente, o peptideoglicano, é um alvo para
apenas àqueles com maior probabilidade de causar a
ação de diversos antibióticos da classe dos β-lactâmicos,
infecção em questão. Um exemplo comum seria a utilização
como a penicilina, e de glicopeptídeos, como
de levofloxacina para um paciente com pneumonia
a vancomicina — muito útil no tratamento de infecções por
comunitária presumida.
MRSA e responsável por levar à liberação de histamina após
Tratamento definitivo
infusão rápida, causando a famosa síndrome do homem
Depois que os resultados de cultura e antibiograma são
vermelho.
conhecidos, a fase definitiva do tratamento pode começar.
Conheça mais alguns pontos entre as diferenças bioquímicas,
Ao contrário da terapia empírica, com a terapia definitiva
a seguir:
sabemos em qual organismo basear nosso tratamento e qual
1. A membrana plasmática das bactérias é bastante
medicamento deve funcionar.
semelhante à das células humanas, porém pode ser
mais facilmente alterada em algumas bactérias por INIBEM A INIBEM A INIBEM A
SÍNTESE DE SÍNTESE REPLICAÇÃO
antibióticos, como a polimixina, que agem como PAREDE PROTEICA DO DNA
detergentes destruindo as bactérias. No caso de fungos, CELULAR
a presença de grandes quantidades de ergosterol na Penicilinas Tetraciclinas (30S) Quinolonas (DNA
Cefalosporinas Aminoglicosídeos (30S) girase)
membrana os torna alvos para drogas antifúngicas como Carbopenêmicos Macrolídeos (50S)
a nistatina e anfotericina Monobactâmicos Cloranfenicol (50S)
Vancomicina Clindamicina (505)
2. Algumas reações e vias sintéticas metabólicas são Linezolida (50S)
também alvos diferenciáveis entre bactérias e células BLOQUEIA A INIBEM INIBEM A
humanas. Por exemplo, a via sintética dos folatos é TRANSCRIÇÃO METABOLISMO FUNÇÃO DA
DO RNA DO ÁCIDO MEMBRANA
encontrada em bactérias, mas não nos humanos. Os FÓLICO CELULAR
humanos obtêm o folato, necessário para síntese de Rifampicina (RNA Sulfonamidas Daptomicina
DNA, a partir da dieta, enquanto as bactérias precisam polimerase) Trimetoprima Polimixina
sintetizá-lo de novo.
3. Alguns antibióticos agem exatamente nesse ponto,
Módulo 2
impedindo a síntese do folato por meio da inibição de
algumas enzimas desta via, como a di-
Descrever o uso clínico e o mecanismo de ação dos
hidropteroatosintetase (exemplo das sulfamidas) e a di-
antibióticos β-lactâmicos, macrolídeos e seus efeitos
hidrofolato redutase (exemplo do trimetoprim). Uma
adversos
outra via sintética frequentemente alvo da ação de
antibióticos, que já foi mencionada anteriormente, é a via
ANTIBIÓTICOS Β-LACTÂMICOS
de síntese do peptideoglicano, alvo dos antibióticos β-
Os antibióticos β-lactâmicos incluem uma grande variedade
lactâmicos.
de medicamentos que, por muitas vezes, causam dúvidas e
4. A síntese proteica é também um alvo comum para
confusão em estudantes e profissionais de saúde de todas as
ação de antibióticos. Podemos citar como exemplos os
áreas. Penicilinas, cefalosporinas e carbapenêmicos são todos
aminoglicosídeos (gentamicina), as tetraciclinas e os
β-lactâmicos.
macrolídeos (eritromicina) A diferença estrutural básica
Os monobactâmicos (aztreonam) são estruturalmente
acontece nos ribossomos, estruturas absolutamente
semelhantes (têm o anel β−lactâmico), mas não apresentam
fundamentais para leitura da fita de RNA e síntese das
um dos dois anéis que outros β-lactâmicos têm e
proteínas. Enquanto os ribossomos eucariotas têm duas
apresentam pouca ou nenhuma alergenicidade cruzada
subunidades, uma 60S e a outra 40S, as bactérias
(figura 4).
apresentam ribossomos com subunidades 50S e 30S,
A melhor abordagem para compreender as diferenças é
portanto diferentes.
agrupar os β-lactâmicos em classes e aprender as
5. Alguns antibióticos inibem também a síntese dos ácidos
características de cada uma delas.
nucleicos. É possível interferir com a síntese de ácidos
nucleicos de diversas maneiras, como por meio da
inibição da síntese de nucleotídeos, da inibição das
polimerases de DNA ou RNA, alterando as propriedades
de pareamento das bases ou inibindo a DNA girase ou
topoisomerase. Nesse grupo podemos incluir a
rifamicina, a rifampicina e as fluoroquinolonas (como
norfloxacino e ciprofloxacino).

Observe a figura 3 que ilustra os principais alvos moleculares


dos antibióticos mais utilizados, resumindo o exposto antes.
Uma descrição mais detalhada do mecanismo de ação de
cada uma destas drogas, juntamente com suas aplicações e
efeitos adversos, será fornecida no próximo módulo. Figura 4 – Estrutura química dos β-lactâmicos
Entretanto, para tornar as coisas menos complexas, todos os
β-lactâmicos têm algumas coisas em comum:
1. Todos os β-lactâmicos compartilham um mesmo
mecanismo de ação — a inibição de transpeptidases
(isto é, proteínas de ligação à penicilina — PBP) na
parede celular bacteriana. Assim, administrar dois β-
lactâmicos em combinação para a mesma infecção
geralmente não é útil.
2. Nenhum β-lactâmico tem atividade contra organismos
Figura 3 – Principais alvos moleculares dos antibióticos mais atípicos, como Mycoplasma pneumoniae e Chlamydophila
utilizados no tratamento de infecções bacterianas. pneumoniae. Portanto, em terapia empírica, é preciso
Antimicrobianos adicionar outro medicamento ao seu regime se você
estiver preocupado com esses patógenos, como às
vezes acontece nos casos de pneumonia adquirida na
comunidade.
3. Praticamente nenhum β-lactâmico disponível atualmente
tem atividade contra as cepas de Staphylococcus
aureus resistente à meticilina (MRSA). No caso de
suspeita, deve ser adicionado à vancomicina ou linezolida.

Conheça agora os efeitos adversos que todos os β-


lactâmicos tem em comum:
A. Todos os β-lactâmicos podem causar reações de Figura 5: Penicilina-
hipersensibilidade (devido à presença do anel β- Estrutura Química
lactâmico), variando de erupções cutâneas a febre e de MECANISMO DE AÇÃO
nefrite intersticial aguda (NIA) a anafilaxia. Todas as penicilinas inibem a etapa sintética em que ocorre
B. Existe alguma sensibilidade cruzada entre as classes, mas a ligação cruzada do peptidoglicano na parede celular,
não há como prever exatamente com que frequência levando a autólise e morte celular. Tal ação é mediada pela
isso ocorrerá. ligação da droga às transpeptidases ou proteínas ligadoras de
C. As convulsões ou outras manifestações neurológicas penicilinas (PBP).
podem resultar de doses muito altas de qualquer β- Penicilinas naturais
lactâmico, e pode ocorrer acumulação a níveis tóxicos Exemplos: Penicilina G, penicilina V.
quando a dose de um β-lactâmico não é ajustada Depois que a penicilina foi produzida em quantidades
adequadamente para o paciente com função renal medicinalmente úteis, teve um grande impacto na sociedade,
comprometida, uma vez que esses antibióticos são particularmente no tratamento de feridas infectadas. A
excretados principalmente por via urinária. importância dessa descoberta tornou-se aparente durante a
Agora que conhecemos as semelhanças entre os β- Segunda Guerra Mundial, quando os Aliados tiveram acesso à
lactâmicos, vamos passar a estudar cada um dos grupos e penicilina, que salvou inúmeras vidas, enquanto os
aprender as diferenças entre eles. membros do Eixo, não.
Infelizmente, os estafilococos tornaram-se rapidamente
resistentes à penicilina por meio da produção de β-
lactamases ativas contra penicilinas, levando à necessidade de
desenvolvimento de novos antibióticos. O desenvolvimento
de resistência reduziu consideravelmente o espectro de
PENICILINAS eficácia das penicilinas naturais nos últimos sessenta anos, de
As penicilinas (figura 5) são uma das maiores e mais antigas modo que os estafilococos são quase universalmente
classes de agentes antimicrobianos. Desde o resistente a elas.
desenvolvimento das penicilinas naturais, na década de 1930, ESPECTRO
novas penicilinas têm sido desenvolvidas para contrapor o Boa ação: Treponema pallidum, a maioria dos estreptococos,
aumento de resistência antimicrobiana. incluindo Streptococcus pneumoniae.
As penicilinas têm várias coisas em comum: Elas têm meias- Ação moderada: enterococos.
vidas muito curtas (<2 horas) e devem ser administradas Ação fraca: quase todo o resto (exemplos: Mycoplasma
várias vezes por dia. As meias-vidas da maioria delas são pneumoniae e Chlamydophila pneumoniae).
prolongadas na presença de disfunção renal. EFEITOS ADVERSOS
Como outros β-lactâmicos, as penicilinas podem causar Semelhantes aos de outros β-lactâmicos. Reações de
reações de hipersensibilidade. No caso de um paciente ter hipersensibilidade são sempre uma preocupação. Todos os
uma reação de hipersensibilidade mediada por IgE a uma β-lactâmicos podem causar reações de hipersensibilidade
penicilina, outras penicilinas devem ser evitadas, mesmo que (devido à presença do anel β-lactâmico), variando de
sejam de diferentes subclasses. Se a reação não for grave, erupções cutâneas a febre e de nefrite intersticial aguda
cefalosporinas ou carbapenêmicos podem ser úteis. (NIA) a anafilaxia.
Muitas penicilinas são relativamente pouco absorvidas, PARA QUE SERVEM?
mesmo as disponíveis como formulações orais, o que pode Sífilis, particularmente neurossífilis, gonorreia, difteria, tétano e
levar à diarreia quando é necessária terapia oral. leptospirose. A penicilina também é usada em infecções
estreptocócicas, como faringite ou endocardite.
Penicilinas antiestafilocócicas
Exemplos: nafcilina, oxacilina, dicloxacilina, meticilina, cloxacilina.
A estrutura básica da penicilina foi modificada para resistir ao
ataque das β-lactamases, levando às penicilinas
antiestafilocócicas. Essa modificação deu atividade a esses
medicamentos contra estafilococos que produzem
penicilinases, mas não melhoraram os efeitos contra Exemplos: ampicilina/sulbactam, amoxicilina/clavulanato,
bactérias gram-negativas. piperacilina/tazobactam.
ESPECTRO A β−lactamase é uma enzima capaz de quebrar o anel
Boa ação: estafilococo sensível à meticilina (MSSA), β−lactâmico presente em todas as penicilinas e
estreptococos. cefalosporinas e, ao fazê-lo, é capaz de inativar esses
Ação fraca: gram-negativos, enterococos, anaeróbios, MRSA. antibióticos. Em poucas palavras, sabemos como fazer uma
EFEITOS ADVERSOS penicilina resistente a β−lactamase ou, ainda, como torná-la
Semelhantes aos de outros β-lactâmicos, com uma mais ativa contra os gram-negativos, mas não as duas coisas.
incidência possivelmente maior de nefrite intersticial. As drogas inibidoras das β-lactamases imitam a estrutura de
PARA QUE SERVEM? β-lactâmicos, mas têm pouca atividade antimicrobiana por si
Infecções causadas por MSSA, como endocardite e só. Elas se ligam as β-lactamases irreversivelmente,
infecções de pele e tecidos moles. impedindo a destruição do antibiótico. Assim, é importante
Aminopenicilinas entender que a combinação de inibidor de β-lactamase com
Exemplos: amoxicilina, ampicilina. β-lactâmico apenas libera o β-lactâmico para matar o
As aminopenicilinas são mais solúveis em água e passam organismo — não melhora a atividade.
através de canais de porina na parede celular de alguns Objeto com interação.
organismos gram-negativos. No entanto, são suscetíveis a β- MECANISMO DE AÇÃO
lactamases, e a resistência se tornou bastante comum. As Os inibidores de β-lactamase se assemelham estruturalmente
aminopenicilinas raramente são ativas contra estafilococos a β-lactâmicos e se ligam às β-lactamases, tornando-as
ou Pseudomonas aeruginosa. De uma maneira geral, incapazes de inativar o antibiótico β-lactâmico coadministrado.
devemos usar ampicilina para terapia IV e amoxicilina para ESPECTRO
terapia oral. Boa ação: MSSA, estreptococos, enterococos, muitos
ESPECTRO anaeróbios, bastonetes gram-negativos entéricos, P.
Boa ação: estreptococos, enterococos. aeruginosa (apenas piperacilina/tazobactam).
Ação moderada: gram-negativos entéricos, Haemophilus. Ação fraca: MRSA, gram-negativos produzindo β-lactamase
Ação fraca: estafilococos, anaeróbios, Pseudomonas. de espectro estendido (ESBL).
EFEITOS ADVERSOS EFEITOS ADVERSOS
Semelhantes aos de outros β-lactâmicos. As aminopenicilinas Semelhantes aos de outros β-lactâmicos.
têm uma alta incidência de diarreia quando administradas por CEFALOSPORINAS
via oral. As cefalosporinas são provavelmente o grupo mais confuso
PARA QUE SERVEM? de antibióticos. As cefalosporinas são agrupadas em
Infecções causadas por enterococos (em combinação com “gerações”, que se baseiam no espectro de ação, com
aminoglicosídeos) e estreptococos. A amoxicilina é algumas exceções. Aqui vamos aprender as características
frequentemente prescrita para infecções do trato de cada geração e mencionar brevemente as peculiaridades
respiratório superior, incluindo faringite estreptocócica dos agentes individuais. A figura 6 mostra as gerações de
(garganta inflamada) e otite média (infecção no ouvido). cefalosporinas e seus espectros antimicrobianos de ação.
Penicilinas antipseudomonais
Exemplos: piperacilina, ticarcilina.
Esses agentes são ativos contra P. aeruginosa e outros
bastonetes gram-negativos. No entanto, são tão suscetíveis a
β-lactamases quanto a penicilina e a ampicilina. Eles têm
atividade contra estreptococos e enterococos. Nenhuma
dessas penicilinas antipseudomonais é comumente usada,
exceto em combinação com um inibidor de β-lactamase
(ver um pouco mais adiante).
ESPECTRO
Boa ação: P. aeruginosa, estreptococos, enterococos.
Ação moderada: bastonetes gram-negativos
entéricos, Haemophilus.
Ação fraca: estafilococos, anaeróbios.
EFEITOS ADVERSOS
Semelhantes aos de outros β-lactâmicos.

Figura 6 – Relação entre espectro de ação e gerações das


cefalosporinas
As cefalosporinas têm vários elementos em comum:
COMBINAÇÕES DE PENICILINA/INIBIDOR DE β-LACTAMASE
Acredita-se que todas tenham alguma alergenicidade cruzada Cefamandol, cefmetazol e cefotetan – podem inibir a
com penicilinas, embora existam diferenças entre gerações. produção de vitamina K e prolongar o sangramento.
Estimativas sobre a probabilidade de reatividade cruzada Também podem causar uma reação do tipo dissulfiram
giram entre 5% e 10%, mas números mais baixos são (desconforto abdominal, rubor, vômitos e cefaleia) quando
apontados para representantes de última geração. coadministrados com etanol.
As cefalosporinas são geralmente mais resistentes a β- PARA QUE SERVEM?
lactamases do que as penicilinas. β−lactamases que inativam Infecções do trato respiratório superior, pneumonia adquirida
especificamente cefalosporinas (cefalosporinases) também na comunidade, gonorreia, profilaxia cirúrgica (cefotetan,
existem e estão aumentando em prevalência. cefoxitina, cefuroxima).
Cefalosporinas de primeira geração: Cefalosporinas de terceira geração:
Exemplos: cefazolina, cefalexina, cefadroxil, cefalotina. Exemplos: ceftriaxona, cefotaxima, ceftazidima, cefdinir,
As cefalosporinas de primeira geração são a classe de cefpodoxime, cefixime, ceftibuten.
antibióticos mais utilizada no hospital, pois são muito As cefalosporinas de terceira geração têm maior atividade
empregadas para prevenir infecções em cirurgia. Seu Gram-negativa que medicamentos de primeira e segunda
espectro de atividade, baixo custo e baixa incidência de geração. A maioria delas também tem boa atividade
efeitos adversos as tornam ideais para esse fim. Pelas estreptocócica e apresenta menos efeito contra estafilococo
mesmas razões, são úteis no tratamento de infecções da que as gerações anteriores. Estes são antibióticos de amplo
pele e tecidos moles. As cefalosporinas de primeira geração espectro. Ceftriaxona, cefotaxima e ceftazidima atravessam a
são boas alternativas para penicilinas antiestafilocócicas. barreira hematoencefálica efetivamente e são úteis para o
MECANISMO DE AÇÃO tratamento de infecções do SNC.
Todas as cefalosporinas inibem a etapa sintética na qual ESPECTRO
ocorre a ligação cruzada do peptidoglicano na parede celular, Boa ação: estreptococos (exceto ceftazidima, que é ruim),
levando à autólise e à morte celular. Tal ação é mediada pela bastonetes gram-negativos entéricos, Pseudomonas (apenas
ligação da droga às transpeptidases ou proteínas ligadoras de ceftazidima).
penicilinas (PBP). Ou seja, o mecanismo é igual aos descritos Ação Moderada: MSSA (exceto ceftazidima, que é ruim).
para as penicilinas, como vimos anteriormente. Ação fraca: enterococos, Pseudomonas (exceto ceftazidima),
ESPECTRO anaeróbios, MRSA.
Boa ação: MSSA, estreptococos. EFEITOS ADVERSOS
Ação moderada: alguns bastonetes gram-negativos entéricos. As cefalosporinas de terceira geração são uma das classes
Ação fraca: enterococos, anaeróbios, MRSA, Pseudomonas. de antibióticos com a mais forte associação com diarreia
EFEITOS ADVERSOS associada ao Clostridium difficile. Cefpodoxime pode inibir a
Semelhantes aos de outros β-lactâmicos. produção de vitamina K.
PARA QUE SERVEM? PARA QUE SERVEM?
Infecções da pele e tecidos moles, profilaxia cirúrgica, Infecções do trato respiratório inferior, pielonefrite, infecções
infecções estafilocócicas da corrente sanguínea, osteomielite nosocomiais (ceftazidima), doença de Lyme (ceftriaxona),
e endocardite (MSSA). meningite, gonorreia, infecções de pele.
Cefalosporinas de segunda geração: Cefalosporinas de quarta geração:
Exemplos: cefuroxima, cefoxitina, cefotetan, cefprozil, Exemplos: cefepime, cefpiroma.
cefmetazol, cefonicid, cefamandole, cefaclor. São as cefalosporinas de espectro mais amplo, com atividade
Em comparação com as cefalosporinas de primeira geração, contra gram-negativos, incluindo Pseudomonas e organismos
as drogas de segunda geração têm melhor atividade gram- gram-positivos. São uma boa escolha empírica para muitas
negativa infecções hospitalares, mas um exagero para a maioria das
(exemplos: Escherichia, Helicobcater, Hemophilus, Neisseria, Kl infecções, uma vez que, como explicado, devemos buscar o
ebsiella, Enterobacter, Chlamydia, Pseudomonas, Salmonella, Sh uso de antibióticos de espectro estreito para infecções
igella) e, um pouco mais fraca, gram-positiva comunitárias e pouco graves para diminuir a probabilidade de
(Nocardia, Clostridium, Propionibacterium, Actinomyces, Entero selecionar resistência bacteriana.
coccus, Cornyebacterium, Listria, Lactobacillus, Gardnerella, ESPECTRO
Mycoplasma, Staphylococcus, Streptomyces, Streptococcus). Boa ação: MSSA, estreptococos, Pseudomonas, gram-
Elas são mais estáveis contra β-lactamases e são negativos entéricos.
particularmente ativas contra Haemophilus Ação moderada: Acinetobacter.
influenzae e Neisseria gonorrhoeae. Ação fraca: enterococos, anaeróbios, MRSA.
ESPECTRO EFEITOS ADVERSOS
Boa ação: alguns bastonetes gram-negativos A cefepime pode ser associada a neurotoxicidade mais do
entéricos, Haemophilus, Neisseria. que outros agentes.
Ação moderada: estreptococos, estafilococos, anaeróbios PARA QUE SERVEM?
(apenas cefotetan, cefoxitina, cefmetazol). Neutropenia febril, pneumonia nosocomial, meningite pós-
Ação fraca: enterococos, MRSA, Pseudomonas. neurocirurgia, outras infecções hospitalares.
EFEITOS ADVERSOS Cefalosporinas anti-MRSA:
Exemplos: cefepime, cefpiroma.
A ceftarolina é uma cefalosporina que tem características PARA QUE SERVEM?
únicas, sendo designada “cefalosporina anti-MRSA". Foi Infecções do trato respiratório superior e inferior, clamídia,
projetada para se ligar à PBP2a do MRSA, que apresenta infecções por micobactérias e diarreia do viajante
baixa afinidade com outros β-lactâmicos. (azitromicina). A claritromicina é um componente-chave no
MECANISMO DE AÇÃO tratamento da infecção gastrointestinal induzida por H. pylori.
Ao contrário de outros β-lactâmicos, a ceftarolina pode se Módulo 3
ligar a PBP2a, um tipo que é expresso pelo MRSA. Essa
característica é responsável por sua atividade anti-MRSA. Descrever o uso clínico e o mecanismo de ação do
ESPECTRO cloranfenicol, das tetraciclinas, dos aminoglicosídeos, das
Boa ação: MSSA, MRSA, estreptococos, bastonetes gram- polimixinas sulfonamidas e do trimetoprim e seus efeitos
negativos entéricos. adversos.
Ação moderada: E. Faecalis. CLORANFENICOL
Ação fraca: P. aeruginosa, E. faecium, Acinetobacter, O cloranfenicol foi originalmente isolado de culturas de
anaeróbios. estreptomices encontradas na Venezuela e mostrou ser um
EFEITOS ADVERSOS antibiótico potente, inibidor da síntese de proteínas.
Semelhantes aos de outros β-lactâmicos. Pode ser administrado por via oral ou parenteral. É
PARA QUE SERVE? bacteriostático para a maioria das bactérias.
A ceftarolina é aprovada para tratamento de infecções de 1. Mecanismo de ação
pele complicadas e pneumonia adquirida na comunidade. O cloranfenicol inibe a síntese de proteínas ligando-se
reversivelmente à subunidade 50S do ribossomo bacteriano
e impedindo a formação da ligação peptídica na cadeia de
aminoácidos.
2. Espectro
Boa ação: tem amplo espectro. Haemophilus influenzae,
gram-positivos e gram-negativos.
3. Efeitos adversos
MACROLÍDEOS Depressão da medula óssea, gerando pancitopenia grave.
Exemplos: claritromicina, azitromicina e eritromicina. Contudo, esse efeito é raro. Tem que ser utilizado com
Os macrolídeos estão entre os antibióticos mais utilizados no muito cuidado em recém-nascidos por que não é bem
ambulatório devido a sua ampla cobertura de patógenos excretado e causa síndrome do bebê cinzento (40% de
respiratórios. Apesar sua cobertura ser ampla, há aumento mortalidade).
da resistência a esses agentes (especialmente 4. Para que serve?
no Streptococcus Pneumoniae). Embora a eritromicina seja o Febre tifoide, meningite bacteriana, rickettsiose e brucelose.
representante mais conhecido da classe, hoje em dia é
pouco utilizada por causa de seus efeitos adversos,
interações medicamentosas e doses frequentes. Os
macrolídeos são drogas bacteriostáticas e não são
apropriados para infecções como meningite e endocardite.
MECANISMO DE AÇÃO TETRACICLINAS
Os macrolídeos são inibidores da síntese de proteínas. Exemplos: doxiciclina, minociclina e tetraciclina.
Ligam-se à subunidade 50S dos ribossomos bacterianos, Uma vez consideradas antibióticos de amplo espectro, o
impedindo que os ribossomos deslizem sobre a fita de RNA, avanço da resistência bacteriana reduziu o uso de
promovendo a leitura dos códons e adicionando um novo tetraciclinas para indicações específicas. A doxiciclina é a
aminoácido à cadeia proteica em formação. preferida na maioria das situações em relação à tetraciclina e
ESPECTRO à minociclina. O uso concomitante de suplementos minerais
Boa ação: Haemophilus influenzae, Moraxella catarrhalis, (como cálcio e ferro – ou leite) pode interferir na absorção
Helicobacter pylori, Mycobacterium avium. dessas drogas.
Ação moderada: S. pneumoniae, Streptococcus pyogenes. 1. Mecanismo de ação
Ação fraca: estafilococos, bastonetes gram-negativos As tetraciclinas se ligam à subunidade 30S do ribossomo
entéricos, anaeróbios, enterococos. bacteriano, impedindo o encaixe do RNA de transferência
EFEITOS ADVERSOS que transporta novos aminoácidos para adição à cadeia
Efeitos adversos no trato gastrointestinal significativos peptídica (figura 7).
(náusea, vômito, diarreia). Também foram observados
eventos hepáticos adversos raros, mas graves, com os
macrolídeos. O prolongamento do intervalo QT (no
eletrocardiograma) foi observado com a azitromicina e a
eritromicina. Essa classe de medicamentos (com exceção da
azitromicina) é inibidora potente das enzimas do citocromo
P450, que metabolizam medicamentos.
resistência aos medicamentos mais benignos. Também são
excelentes em sinergia com os β-lactâmicos, melhorando a
eficiência do tratamento.
Gentamicina e tobramicina são os medicamentos mais
utilizados. Geralmente a amicacina é reservada a patógenos
resistentes aos dois primeiros, e a estreptomicina tem usos
limitados (enterococos, tuberculose e peste).
1. Mecanismo de ação
Os aminoglicosídeos se ligam ao ribossomo bacteriano (a
subunidade 30S), causando leitura incorreta do código
genético, levando à formação de proteínas incorretas e
também à interrupção na síntese (figura 8).

Figura 7 – Mecanismo de ação das tetraciclinas. As


tetraciclinas ligam-se a subunidade 30S impedindo o encaixe
do RNAt.
2. Espectro
Boa ação: rickettsias, espiroquetas (por exemplo, Borrelia
burgdorferi, Helicobacter pylori), espécies
de Plasmodium (malária).
Ação moderada: estafilococos (incluindo
MRSA), Streptococcus pneumoniae.
Ação fraca: a maioria dos bastonetes gram-negativos,
anaeróbios, enterococos.
3. Efeitos adversos
Gastrointestinal: as tetraciclinas podem causar irritação Figura 8 – Mecanismo de ação dos aminoglicosídeos. Esses
esofágica e os pacientes devem tomar o medicamento com antibióticos se ligam à subunidade 30S e causam um erro na
água. leitura do RNA.
Dermatológico: a fotossensibilidade é frequentemente vista. 2. Espectro
Os pacientes devem evitar de tomar sol ou usar protetor Boa ação: gram-negativos (Escherichia coli, Klebsiella,
solar enquanto estiverem tomando tetraciclinas. Pseudomonas, Acinetobacter, a maioria dos outros).
Sensorial: a minociclina pode causar tonturas e vertigens. Ação moderada: em combinação com um β-lactâmico ou
Desenvolvimento: todas as tetraciclinas podem causar glicopeptídeo: estafilococos (incluindo MRSA), Streptococcus
descoloração dos dentes e são contraindicadas para viridans, enterococos.
mulheres grávidas e crianças menores de oito anos de idade. Ação fraca: anaeróbios, organismos gram-positivos (em
4. Para que serve? monoterapia).
Infecções não complicadas do trato respiratório, sinusite e 3. Efeitos adversos
pneumonia adquirida na comunidade. São drogas de escolha Nefrotoxicidade: insuficiência renal aguda é relacionada à
para muitas doenças transmitidas por carrapatos. Também dose de aminoglicosídeos.
são ativas contra antraz, peste e tularemia. Ototoxicidade: os aminoglicosídeos causam toxicidade coclear
e vestibular relacionada à dose que não é reversível e pode
afetar significativamente a qualidade de vida.
Neurológico: pode ocorrer bloqueio neuromuscular quando
os aminoglicosídeos são administrados a pacientes que
recebem bloqueio neuromuscular.
4. Para que serve?
Em combinação com um agente β-lactâmico, são utilizados
para o tratamento de infecções graves com patógenos
gram-negativos documentados incluindo sepse, osteomielite,
AMINOGLICOSÍDEOS
exacerbações de fibrose cística e pneumonia associada à
Exemplos: gentamicina, tobramicina, amicacina,
ventilação mecânica.
estreptomicina, espectinomicina.
Os aminoglicosídeos têm uma janela terapêutica estreita e a
dosagem inadequada leva ao risco de toxicidade significativa
(principalmente nefro-ototoxicidade) nos pacientes. Por esse
motivo, houve uma redução no uso dessa classe como
terapia primária para a maioria das infecções.
Dito isso, eles apresentam boa atividade contra muitos
patógenos problemáticos
(como Pseudomonas e Acinetobacter) que desenvolveram
POLIMIXINAS consideravelmente de acordo com a região geográfica. Daí a
importância de sempre obter o antibiograma para confirmar
Exemplos: colistina (colistimetato de sódio) e polimixina B. a terapia empírica com sulfametoxazol/trimetoprim. Os
As polimixinas são uma classe bastante antiga de antibióticos outros agentes são usados contra infecções
que quase deixou de ser usada sistemicamente em função parasitárias/fúngicas.
do desenvolvimento dos aminoglicosídeos “mais seguros”. 1. Mecanismo de ação
Infelizmente, a evolução contínua da resistência bacteriana Esses fármacos inibem etapas da via da biossíntese do folato,
forçou a comunidade médica a revisitar o uso de colistina e esgotando o conjunto de nucleosídeos e, finalmente, levando
polimixina B no tratamento de infecções gram-negativas à inibição da síntese de DNA em organismos suscetíveis.
resistentes, uma vez que são consideradas eficazes no Enquanto o sulfametoxazol inibe a dihidropteroato sintetase,
tratamento de infecções causadas por organismos gram- impedindo a formação do ácido dihidropteróico (primeira
negativos altamente resistentes, como Acinetobacter etapa da via sintética do folato), o trimetoprim inibe a
baumannii, Pseudomonas aeruginosa, enterobactérias dihidrofolato redutase, impedindo a formação do ácido
resistentes a carbapeno, como a Klebsiella pneumoniae. tetrahidrofólico (última etapa da via).
É importante o monitoramento da função renal em 2. Espectro
pacientes que recebem polimixinas. Boa ação: Staphylococcus aureus (incluindo muitas cepas de
1. Mecanismo de ação MRSA), Haemophilus influenzae, Stenotrophomonas
As polimixinas se ligam à membrana externa das bactérias maltophilia, Listeria, Pneumocystis jirovecii, Toxoplasma
gram-negativas, levando à ruptura da estabilidade da gondii (pirimetamina e sulfadiazina).
membrana e ao vazamento do conteúdo celular. Ação moderada: bastonetes gram-negativos
2. Espectro entéricos, Streptococcus pneumoniae, Salmonella, Shigella,
Boa ação: muitos gram-negativos, incluindo A. baumannii, P. Nocardia, Streptococcus pyogenes.
aeruginosa e K. Pneumoniae. Ação fraca: Pseudomonas, enterococos, anaeróbios.
Ação moderada: Stenotrophomonas maltophilia. 3. Efeitos adversos
Ação fraca: todos os organismos gram-positivos, Dermatológico: a associação sulfametoxazol/trimetoprim,
anaeróbios, Proteus, Providencia, Burkholderia, Serratia e frequentemente, causa erupção cutânea, em geral por
cocos gram-negativos. causa do componente sulfametoxazol. Embora essas
3. Efeitos adversos erupções cutâneas geralmente não sejam graves, as
Renal: o efeito adverso mais comum é a nefrotoxicidade doenças como necrólise epidérmica tóxica e síndrome de
devido à necrose tubular. Stevens-Johnson também ocorrem.
Neurológico: neurotoxicidade é menos comum. Pode se Hematológico: uma supressão da medula óssea dependente
manifestar como tontura, fraqueza, parestesias ou alterações da dose pode também ocorrer com a associação
no estado mental. Também pode ocorrer o bloqueio sulfametoxazol/trimetoprim.
neuromuscular, que pode levar a parada respiratória fatal. Renal: pode causar um aumento da creatinina sérica e
4. Para que serve? hipercalemia.
As polimixinas são úteis no tratamento de infecções por Alergias: pacientes alérgicos à associação
gram-negativos multirresistentes incluindo pneumonia, sepse sulfametoxazol/trimetoprim podem ter reações cruzadas
e infecções urinárias complicadas. com outros medicamentos que contenham porções
sulfonamida, como furosemida, sulfadiazina, acetazolamida,
hidroclorotiazida e glipizida.
4. Para que serve?
Tratamento de infecções urinárias inferiores sem
complicações (empiricamente em áreas com baixa
resistência, definitivamente sempre que suscetível),
tratamento da meningite por Listeria, tratamento e profilaxia
para pneumonia por P. Jirovecii em pacientes
ANTAGONISTAS DO FOLATO imunossuprimidos e tratamento da encefalite por toxoplasma.
Exemplos: trimetoprim, sulfametoxazol, dapsona, A sulfadiazina é usada no tratamento de toxoplasmose.
pirimetamina, sulfadiazina, sulfadoxina.
A combinação sulfametoxazol/trimetoprim é, na verdade, o
exemplo mais utilizado nessa classe. Tal associação já foi,
uma vez, considerada um medicamento antibacteriano de
amplo espectro.
Durante anos, a associação sulfametoxazol/trimetoprim foi a
terapia de primeira linha para o tratamento de cistite não
complicada aguda em mulheres. Entretanto, esse “status”
caiu, vítima da marcha implacável da resistência a antibióticos.
Apesar disso, ainda é um medicamento de escolha para
várias indicações, uma vez que o perfil de resistência varia

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