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neuropsicólogo e pesquisa
Sobre o professor
• Pós-doutorando em psiquiatria e psicologia médica (EPM-Unifesp)
• Doutor em psicologia experimental (IP-USP)
• Psicólogo (IP-USP)
• Prof. Adjunto UNINOVE
• Prof. Titular e Chefe de Pesquisa IBN
• Coordenador de pesquisa nacional – Arte de Viver – Brasil
• Membro da equipe de formação e conteúdo – Ame Sua Mente
• Pesquisador do LiNC – EPM-Unifesp
Estrutura da aula
• A neuropsicologia e os neuropsicólogos
• Áreas de atuação da neuropsicologia
• Pesquisa
• Avaliação
• Reabilitação
O campo da neuropsicologia
• Disciplina científica que estuda as relações cérebro-funções cognitivas
(Rodrigues,1993).
• Ciência interdisciplinar, utilizando conhecimentos das neurociências e
da psicologia (Seron, 1982)
• Ciência dedicada a estudar a expressão comportamental, emocional e
social das disfunções cerebrais (Lezak et al., 2004), os déficits em
funções superiores produzidos por alterações cerebrais (Barbizet &
Duizabo, 1985), as inter-relações entre cérebro e comportamento,
cérebro e funções cognitivas (Luria, 1966) e, de forma mais ampla, as
relações entre cérebro e comportamento humano (Benton, 1971)
Funções neuropsicológicas
• Atenção • Aprendizagem
• Percepção • Funções motoras
• Orientação auto-psíquica, • Praxias
temporal e espacial • Raciocínio
• Linguagem oral e escrita • Cálculos
• Memória • Funções executivas.
Campo interdisciplinar
Integra conhecimentos, instrumentos, métodos e modelos teóricos
• Psicologia • Fonoaudiologia
• Neurologia • Farmacologia
• Psiquiatria • Fisioterapia
• Linguística • Terapia Ocupacional
• Psicolingüística • Educação
• Neurolinguística • Biologia
• Inteligência Artificial • Etc
Pressupostos teóricos
Áreas de
atuação
Reabilitação Pesquisa
Pesquisa
Objetivo amplo
CÉREBRO MENTE
COMPORTAMENTO
Perguntas
• Onde (quais áreas do cérebro estão implicadas em determinado
processo?)
• Como (que tipo de correlações neurofuncionais esse processo
estabelece? Em que tipo de circuito neural ou rede determinado
processo acontece?)
• Quando (em que sequência?)
• Por quê (em que bases se estabelece o suporte neural de processos
específicos?)
Métodos e técnicas de pesquisa
Mensuração dos
Manipulação direta parâmetros do
do sistema nervoso sistema nervoso ou
comportamento
Manipulação direta do sistema nervoso
• Estimulação elétrica
• Estimulação química
• Inibição temporária/reversível
• Inibição permanente/irreversível
• Neuromodulação (TMS e tDCS)
Métodos de mensuração
• Testes e baterias de avaliação neuropsicológica
• Registros eletromagnéticos (MEG,EEG,ERP, ECOG)
• Registros neuroquímicos (in vivo e post mortem)
• Registros por neuroimagem (PET, SPECT, RMF)
Principais métodos em neuropsicologia clínica
Técnica ou método Procedimento Perguntas
Técnicas de registro elétrico ou Consistem na mensuração da atividade Como se dá a atividade cortical sob
eletromagnético de neurônios. Envolvem a estimulação condições normais ou patológicas?
por breves pulsos de corrente elétrica ou
Eletrencefalograma (EEG) Potenciais estimulação magnética por meio de
relacionados a eventos (ERP) macroeletrodos de superfície
Magnetoeletrencefalografia (MEG
Técnicas de imagem
Tomografia computadorizada (TC) TC e CAT SCAN: Consistem em imageamento por Quais as possíveis áreas cerebrais
Tomografia axial computadorizada computador que permite a reconstrução que apresentam
(CAT scan – raios X) bidimensional do cérebro. comprometimento?
Escalas de
avaliação Testes
Avaliação
de cognitivos
sintomas
Observação
do
comportamento
Sobre testes cognitivos
• Devem ser encarados como um meio, jamais como fim em si mesmos
• Deve-se ter claro quais os seus objetivos
• Devem ser escolhidos com base em hipóteses aventadas na entrevista
• Devem ser coerentes com a observação comportamental
• Podem ter seus resultados potencializados com escalas de avaliação
de sintomas
A prática do exame neuropsicológico
• “Exame clínico armado” (Mattos, 2014)
• Boas armas são aquelas capazes de reproduzir, no contexto do
consultório, em situação controlada, vários dos processos presentes
na rotina natural de quem está sendo avaliado.
• Como escolher boas armas? -> profundo conhecimento do caso
avaliado
A prática do exame neuropsicológico
Conceitualização Testagem de
clínica hipóteses
• Entrevista • Testes
• Observação do • Escalas de
comportamento avaliação
sintomática
Conceitualização clínica - entrevista
• Entrevista abrangente (paciente e familiares)
• Ao fim da entrevista devem estar claras as seguintes questões:
• Por que o paciente foi encaminhado/qual o objetivo do exame?
Exercícios nascem de atividades e tarefas, mas devem ser graduados e ter um objetivo específico
Expressões usadas em reabilitação
• Ocupações são quaisquer atividades humanas ou tarefas organizadas para preencher
uma função particular
• Ocupação é uma necessidade humana básica e um determinante de saúde
Ocupação
Tarefa e/ou
exercício
Atividade
Sistemática da reabilitação
6.Estabelecimento 7. Implantação das
1. encaminhamento de um plano de intervenções de
ações reabilitação
4. Seleção de
3.Identificação e
abordagens e
negociação dos 9. Encaminhamento
métodos de
objetivos
intervenção
Identificação e negociação de objetivos
• Objetivos devem ser funcionais e priorizados de acordo com o modelo
centrado no cliente (altamente individuais, funcionais, sociais e
contextualmente e relevantes )
• Metas a curto, médio e longo prazo, favorecendo a adesão
• Um cliente motivado tem um índice bem maior de sucesso
• O alvo da intervenção seja realista (de acordo com as condições
individuais) e significativo para o paciente.
• A identificação e a especificação da meta são consideradas o ponto de
partida da intervenção, possibilitando a medição da eficácia do tratamento
• Podem ser alterados e modificados se outras intercorrências acontecerem
Objetivos dos programas de RC
1. Restaurar a função perdida
2. Encorajar a reorganização anatômica
3. Ajudar o paciente a usar suas habilidades residuais de forma mais
eficiente
4. Ajudá-lo a encontrar meios alternativos para sua adaptação funcional
5. Modificar o ambiente para contornar os problemas, ou usar uma
combinação dessas abordagens
6. Auxiliar no retorno ao contexto ocupacional ou laboral
7. Dar suporte no ajuste psicossocial e emocional
8. Favorecer a integração social e outras condições em benefício de sua
qualidade de vida
Principais abordagens
1. Baseada em 2. Fundamentada em
retreinamento modelos da
cognitivo através de neuropsicologia
treinos e exercícios cognitiva
4. Abordagem holística
3. Abordagem
que considera além da
combinada de modelos
cognição outros
da psicologia cognitiva
modelos para entender
e comportamental
aspectos não cognitivos
Treino cognitivo
• Modelo teórico semelhante ao da reabilitação motora: exercícios
levam à melhora (neuroplasticidade)
• De acordo com essa premissa, o TC estaria dirigido a restaurar a
função, já que considera que o déficit cognitivo pode melhorar
mediante o treino repetido e a prática estruturada das tarefas.
• Exemplos: evocação espaçada, retirada gradual de pistas
• Técnica do aprendizado sem erros, na qual se evita, na medida do
possível, que as pessoas cometam erros enquanto estão aprendendo
uma nova habilidade ou adquirindo novas informações.
Treino cognitivo
• Desvantagens segundo Wilson (1997):
• Ausência de provas seguras do efeito/eficácia do tratamento;
2.Use e restabeleça Plasticidade pode ser induzida dentro de regiões específicas do cérebro, podendo levar a um
aperfeiçoamento dessa função
3. Especificidade A natureza da experiência de treino determina a natureza da plasticidade
4. Questão de repetição Indução de plasticidade requer repetição suficiente
5. Questão de intensidade Indução de plasticidade requer intensidade de treinamento suficiente
6. Questão de tempo Diferentes Diferentes formas de plasticidade podem ocorrer em momentos diferentes durante o
treinamento
7. Questão de saliência A experiência deve ser suficientemente saliente para induzir plasticidade
8. A questão da idade Plasticidade induzida por treinamento ocorre mais facilmente em cérebros mais jovens
• Avaliando a linguagem de nomear e compreender oralmente, assim como os testes de fluência verbal para
avaliar memória de trabalho, velocidade de processamento e funcionamento executivo.
Resultados
Os prejuízos encontrados foram em funções executivas, especificamente nos componentes de controle inibitório
e flexibilidade cognitiva verbal e visuoespacial.
Ainda, apresentou prejuízos em memória episódica tardia e aprendizagem de novas informações auditivo-verbal
e alerta para prejuízos em memória episódica recente e reconhecimento de informações.
A análise estatística indicou prejuízos nas funções executivas (velocidade de processamento, flexibilidade
cognitiva e controle inibitório), aprendizagem auditivo-verbal e interferência retroativa que foram melhores
explicados pelos sintomas de CCL do que pelos sintomas do TDM.
Assim, as alterações em funções executivas e memória episódica podem estar associadas ao quadro de CCL.
Contudo, a partir da avaliação de sintomas neuropsiquiátricos, a paciente apresentou sintomas compatíveis ao
diagnóstico de TDM leve e recorrente.
Hipotetiza-se que o TDM ao longo do tempo pode levar a prejuízos cognitivos que não revertem para a
normalidade cognitiva mesmo em períodos de eutimia, dado que indica um quadro de CCL com sintomas
neuropsiquiátricos recorrentes.
Relato de caso
CGP, hoje com 73 anos, sexo feminino, viúva e aposentada há mais de 12 anos. Ela vive com uma cuidadora,
tem nível superior completo e trabalhou muitos anos como secretária bilíngüe, além de ter sido professora de
piano. A paciente tem duas filhas casadas e dois netos.
Seu primeiro atendimento na clínica de memória do Projeto Terceira Idade (PROTER) do Hospital das Clínicas
da Universidade de São Paulo foi em março de 1999. Ela chegou ao hospital com queixa de esque- cimentos
freqüentes que vinham ocorrendo havia dois anos, além de sintomas depressivos sem remissão, mesmo após
medicação. CGP foi diagnosticada com DA inicial, após ter realizado exames de sangue, EEG, RM e avaliação
neuropsicológica. Iniciou tratamento com rivastigmina 6,0 mg e risperidona 1,0 mg. O uso da risperidona deu-
se em decorrência de agitação noturna.
Iniciou grupo de RN no segundo semestre do ano de 1999. Esse grupo era formado por seis pacientes com DA
leve e teve duração de 4 meses, com sessões semanais de 90 minutos. No segundo semestre de 2000, participou
novamente de grupo RN, nos mesmos moldes do anterior.
Relato de caso
Paralelamente ao grupo de pacientes, havia o grupo informativo e de apoio para familiares e cuidadores. Esses
grupos foram realizados no PROTER. As sessões com os pacientes foram conduzidas por uma neuropsicóloga e
uma fonoaudióloga, e os grupos com os familiares por uma psicóloga e uma psiquiatra. As avaliações foram
realizadas por profissionais (psiquiatra e psicóloga) independentes do grupo de terapeutas envolvidos com o
trabalho de reabilitação. Em março de 2001, CGP iniciou RN individual em sua casa com uma neuropsicóloga,
constando de sessões semanais com duração de 1 hora cada, e as informações eram passadas para a cuidadora
e para os familiares sempre que necessário.
O objetivo dos dois grupos de RN nos quais CGP participou foi o de trabalhar aspectos relacionados aos
principais prejuízos cognitivos verificados na DA leve: a memória e a linguagem. Este trabalho foi realizado
por meio de mecanismos compensatórios e de treinos específicos para melhorar a performance de algumas
funções cognitivas, objetivando minimizar dificuldades em AVD e, dessa maneira, melhorar também a QV
desses pacientes
Avaliação
Os treinamentos de RN possuem avaliação antes e após o tratamento que serão aqui comparadas.
A avaliação de eficácia foi feita por meio do Miniexame do Estado Mental (MEEM) (Burns et al., 1999), e a
bateria neuropsicológica foi formada pelos seguintes testes:
• cubos, dígitos e vocabulário (WAIS-R) (Wechsler, 1999);
• Boston Naming Test (Spreene, Strauss, 1998); leitura, escrita e compreensão;
• Fuld Object Memory Evaluation (FOME) (Lesak, 1995);
• Trail Making Test A e B (Wechsler, 1999);
• fluência verbal – categoria animal (Spreen e Strauss, 1998),
• desenho do relógio (Strub e Black, 1988)
• cubo de Necker (Strub e Black, 1988).
Reabilitação
Os dois atendimentos em grupo foram estruturados e planejados da mesma maneira. As sessões sempre
iniciavam com atividades de orientação temporo-espacial e treino dos nomes das pessoas do grupo. As
atividades eram divididas em: treino de funções cognitivas abrangendo atenção, linguagem e memória
(implícita e explícita), exercícios de socialização em que os pacientes dividiam experiência e fatos significativos
de suas vidas, além de treinos de AVD. Entre eles: anotar e transmitir um recado, dar e receber um telefonema,
e ler uma reportagem no jornal ou revista. Exercícios que visavam ampliar a capacidade de manter a atenção
em um ou mais estímulos foram feitos em associação a exercícios específicos de linguagem como resgate verbal,
fluência verbal, manutenção do discurso, fala espontânea e escrita. Esses treinos também visavam trabalhar a
memória semântica e episódica. Para trabalhar a memória recente, eram feitos treinos de associações verbais e
visoverbais, que facilitam tanto a codificação como o posterior resgate. É importante fornecer as mesmas pistas
para o paciente nesses dois momentos.
Reabilitação
O atendimento individual teve duração de 22 meses. Neste período foram realizados treinos de uso de auxílios
externos, como usar agenda e calendário e bloco para anotar recados. Foram trabalhadas atividades que usam
memória implícita, já que esta permanece relativamente intacta até a fase grave da doença, com o uso do
computador. Para tanto, todos os passos foram anotados e fixados ao lado do computador, e as principais teclas
foram numeradas e suas funções foram explicadas em uma legenda, também fixada ao lado dele. É importante
ressaltar que CGP datilografava na época em que trabalhava, assim, essa tarefa tornou-se menos complexa
para ela, conseguindo ainda hoje digitar com rapidez e sem erros.
Reabilitação
A memória remota, que também está praticamente preservada na DA leve, também foi trabalhada, já que a
reminiscência é uma atividade prazerosa, em que o diálogo fica sem quebras, pois o paciente recorda bem de
fases anteriores de sua vida. Com esta paciente foi iniciado um livro autobiográfico, que contém todas as etapas
de sua vida e os principais acontecimentos. Além da memória, também foram treinadas outras funções
cognitivas, como função executiva e linguagem. Para o treino de atenção foram utilizados muitos estímulos
visuais, em que a paciente tinha que descrever com detalhes certas figuras, ou encontrar determinados objetos
pertencentes a uma categoria específica ou começando com determinada letra. Esses exercícios também
trabalhavam nomeação e fluência verbal. Treinos de nomeação foram feitos com objetos da vida diária da
paciente, e com jogos em que eram dadas pistas para ela acertar que objeto estava sendo descrito. As pistas
eram lidas até a paciente dizer que já sabia o que era.
Para a memória de trabalho foram realizados jogos tanto com o computador como com lápis e papel, em que a
paciente tinha que formar o máximo de palavras que conseguisse com as letras dadas. Além disso, foram feitos
exercícios de cálculos, sempre relacionados com situações de vida diária, como pagar uma conta, receber e
conferir o troco.
Reabilitação
Outra atividade muito realizada foi a de leitura e compreensão de textos curtos, e de pequenas crônicas, em que
sua capacidade de abstração também foi trabalhada. Foram feitas leituras em português e inglês, já que a
paciente referia seu medo de esquecer o que sabia de inglês. Todos os treinos realizados se basearam no
princípio da “aprendizagem sem erro”, em que era dito e freqüentemente relembrado à paciente que era
proibido adivinhar quando tinha dúvidas e que deveria pedir pistas até saber a resposta correta. À medida que
a paciente ia acertando, o número de pistas ia sendo diminuído. Além do treino das principais funções
cognitivas prejudicadas em função da DA, e com o aprimoramento das funções não prejudicadas, também
foram trabalhadas queixas e inseguranças da paciente, em que geral- mente se enfocava a necessidade de ela
valorizar suas habilidades preservadas e tudo que ainda poderia fazer, aprender e aproveitar na vida. Além
disso, atividades externas de lazer e de interesse da paciente eram feitas a cada dois meses. Para tanto, a
psicóloga e a paciente procuravam no jornal o que havia na cidade, eram selecionadas algumas opções e a
paciente escolhia o que mais lhe interessava. Ao final de cada atividade externa era solicitado que a paciente
escrevesse sua impressão sobre o passeio.
Conclusão
Na RN foram trabalhados principalmente déficits de memória, linguagem e treinos de atividades de vida diária.
Neste período de tratamento, verificou-se alteração positiva de seu escore no MEEM, além de nenhuma função
cognitiva ter apresentado deterioração. Este estudo de caso corroborou pesquisas anteriores que apontam
efeitos positivos da RN com pacientes com DA leve.
A relação entre funções executivas e a
sintomatologia dos transtornos do espectro do
autismo: caso clínico
Relato de caso
A primeira preocupação dos pais de Renato ocorreu no primeiro aniversário do filho, quando este chorou o tempo todo e
ficou extremamente agitado com o barulho e o movimento. Nada em volta parecia interessá-lo ou diverti-lo.
Os meses foram passando, e a mãe reparou as reações do filho no parque próximo a sua casa. Renato ficava muito tempo
fazendo a areia escorrer de suas mãos, ou então no balanço. Nada mais parecia atrair sua atenção, pelo menos do modo
entusiasmado que ela notava nas demais crianças. Mais do que isso: ele parecia ignorar as outras crianças. De fato, até as
evitava quando elas insistiam em se aproximar, com exceção de quando ele desejava algum brinquedo que elas possuíam.
Renato tinha crises de choro quando a mãe tentava retirá-lo da caixa de areia. O mesmo ocorria quando ele parava em frente
à máquina de lavar, fascinado pelos movimentos da roupa girando em seu interior. Ora paralisava-se, diante da cena, ora
pulava sem parar, girando em círculos em seguida. Nada o distraía nesses momentos, e novas crises ocorriam quando se
tentava afastá-lo. A mãe notou que ele tinha parado de falar as poucas palavrinhas que haviam emergido.
Na escola de educação infantil onde foi matriculado, a adaptação foi um processo longo e difícil. Não interagia com as outras
crianças e não mostrava interesse por atividades como jogos de construção e atividades com papel, canetinhas e tinta. Um
fato curioso é que ele insistia em retirar as canetinhas da caixa e alinhá-las, cuidadosamente. Repetia essa ação inúmeras
vezes, gritando quando alguém tentava mudá-las de lugar. Contudo, aceitava encaixar peças em tabuleiros de madeira,
folhear livros de histórias (sem se deter às figuras) e brincar com o jogo de boliche. Quando a fala emergiu, na maior parte do
tempo reproduzia frases e mesmo pequenos trechos de diálogos de seus desenhos animados preferidos, porém fora de
contextos de brincadeira.
Relato de caso
Ocorreram tanto atrasos quanto peculiaridades na interação social e na qualidade da brincadeira. A interação social era
caracterizada pela ausência de reciprocidade, espontaneidade e iniciativas para engajar o parceiro na interação e na
brincadeira. Foram identificados atrasos no uso de gestos, no contexto social (apontar, abanar, bater palmas, mostrar/dar
objetos espontaneamente). Contudo, os gestos e algumas frases eram utilizados para buscar auxílio, havendo também
algumas respostas quando o parceiro tentava interagir com ele. Essas respostas eram, em geral, restritas a situações que
fossem o foco de seu interesse repetitivo (p. ex., segurar lápis que eram oferecidos, empurrar carrinhos, sem outros
indicativos de brincadeira de faz de conta), sendo também raramente coordenadas com contato ocular com o parceiro. A
qualidade da brincadeira era estereotipada, carecendo de criatividade (p. ex., enfileirar lápis, carrinhos e outros materiais).
Entretanto, utilizava adequadamente alguns brinquedos sonoros e mecânicos, acionando-os corretamente, tanto do ponto
de vista de sua função quanto da coordenação visuomotora. A expressão das emoções também apresentava peculiaridades,
com pouca variação na expressão facial e vocal, sorrisos descontextualizados e intensa flutuação do humor.
As avaliações laboratoriais, genéticas e neurológicas não revelaram nenhuma patologia orgânica que justificasse a
sintomatologia. A família foi, então, comunicada que Renato apresentava TEA, mais especificamente transtorno autista, e ele
foi encaminhado para tratamento multidisciplinar.
Mais tarde, Renato ingressou no ensino fundamental, em uma escola de ensino comum. Houve evolução na área social e na
linguagem, e o garoto foi alfabetizado. Socialmente, no entanto, era bastante imaturo, e sua tendência era a de isolar-se dos
colegas e a de não acompanhar as brincadeiras em grupo. Recusava-se a participar das aulas de educação física ou de
atividades extras, com exceção da natação. Entretanto, aceitava jogar videogame, em dupla. De fato, era bastante rápido
nesses jogos e vencia sem dificuldades.
Relato de caso
A compreensão da linguagem era bastante literal; não compreendia ironias, piadas ou metáforas. Apesar de responder a perguntas
que lhe eram feitas, raramente produzia narrativas. Não contava como fora seu dia na escola ou como haviam sido suas férias. A fala
era monótona e com problemas na prosódia. A compreensão de histórias, mesmo as mais simples, era um grande desafio. As
dificuldades para fazer inferências ficavam evidentes, já que ele não usava seu conhecimento de mundo para preencher lacunas
informativas de um texto ou de uma história contada. Em contrapartida, não apresentava dificuldades para efetuar cálculos de soma
ou subtração, o que fazia com rapidez.
A discrepância entre a área da linguagem e a de cálculo acentuava-se cada vez mais. A produção textual era empobrecida e
contrastava com a habilidade em cálculos. Tornou-se cada vez mais ansioso e agitado, com dificuldade para concentrar a atenção,
sendo iniciada medicação para esses sintomas.
A sociabilidade era cada vez mais desafiadora. Era extremamente ingênuo para a idade e imaturo. Os colegas reclamavam que ele, às
vezes, era muito “tolo” e que insistia em falar em um mesmo assunto, mesmo quando os colegas não estavam interessados. Seu
tópico predileto era descrever as linhas de ônibus intermunicipais. Era extremamente dependente para a idade; necessitava de
instruções para realizar uma tarefa, mesmo que fosse algo que ele desejasse. A rotina do dia a dia era executada de forma lenta,
principalmente em tarefas que exigiam múltiplas etapas ou sequências relativamente complexas, como organizar sua agenda, por
exemplo. A ansiedade aumentava em situações novas e imprevistas ou em contato com os colegas em situações de recreação.
A dúvida dos pais e dos professores era se as dificuldades de Renato decorriam do TEA ou do fato de ele ser um menino
“preguiçoso”. Aliás, o pai considerava que ele era muito superprotegido pela mãe e, desse modo, castigava-o quando ele esquecia a
maior parte dos materiais escolares em casa ou na escola e gastava muito tempo em atividades como tomar banho (sem lavar-se
adequadamente), escolher a roupa para vestir ou mesmo fazer um sanduíche. A professora compartilhava essas dúvidas, que se
estendiam ao terreno da aprendizagem. Qual seria a real potencialidade e as limitações de Renato, em termos cognitivos? Essa
resposta seria importante, uma vez que a 5ª série (6o ano do ensino fundamental) imporia um desafio ainda maior, e seu currículo
seria planejado de acordo com esses fatores. Renato foi, então, encaminhado para avaliação neuropsicológica, aos 11 anos de idade.
Avaliação Neuropsicológica
No teste Figuras Complexas de Rey (Rey, 2010; figura A, cópia e memória imediata), Renato atingiu percentil de cópia e memória igual
a 10 e 40, respectivamente, com desempenho indicando prejuízo significativo nas capacidades de percepção visual, praxia construtiva
e planejamento e na memória de trabalho, expresso por distorções na forma e localização da figura e em omissões de elementos da
figura. Quanto ao tipo de cópia, Renato apresentou o tipo II, no qual os detalhes da figura são incluídos em seu retângulo de base.
No Teste de Trilhas (Capovilla et al., 2007), Renato necessitou o dobro de tempo para cumprir a parte B, que demanda capacidade de
flexibilidade cognitiva na alternância entre letras e números. No Teste Stroop (Golden, 1978), apresentou maior dificuldade na
execução da parte 3, que requer inibição de respostas, apresentando incongruência palavra-cor. No NEUPSILIN-Inf (Salles et al., 2011),
no subteste Span de Dígitos ordem indireta, Renato acertou 24 itens de um total de 28. Na tarefa Span de Pseudopalavras, acertou 11
itens de um total de 20, e no subteste Memória de Trabalho Visuoespacial, recordou 21 itens de um total de 28. Nas tarefas de
fluência verbal, Renato evocou 13 palavras quando houve critério ortográfico e 23 palavras quando houve critério semântico. Esses
resultados indicam que o uso de categoria semântica (animais) facilitou a evocação de palavras para o garoto. No subteste Go/no-
go auditivo, acertou 56 itens de um total de 60, tendo cometido erros de omissão de elementos, os quais podem estar relacionados a
dificuldades de inibição. Em suma, Renato apresentou maior dificuldade nas tarefas que envolveram planejamento, flexibilidade
cognitiva e controle inibitório.
De modo complementar, os pais de Renato responderam a um questionário sobre o funcionamento executivo do filho no dia a dia,
o Behavioral Rating Inventory of Executive Function (Gioia et al., 2000). De acordo com os resultados desse instrumento, as principais
dificuldades percebidas pelos pais de Renato envolvem o planejamento e a iniciativa. Essas dificuldades são observadas quando o
garoto é solicitado a iniciar e a terminar tarefas escolares e domésticas (distrai-se facilmente com detalhes, sem perceber a ideia
central) e a manter o quarto e o material escolar organizados, e também ao pôr em prática suas ideias, mesmo que esteja bastante
motivado, e ao buscar, de forma espontânea, a interação com outras crianças de mesma idade.
Relato de caso
Mulher, 65 anos, ensino superior completo, com história de internações em clínicas
psiquiátricas por depressão, tendo a última ocorrido há um ano. No momento, está em
tratamento; sem queixas de humor; refere ter retomado sua rotina, bem como a administração
da casa e das finanças. Suas filhas alegam que, desde a última internação, a paciente não
apresenta condições de administrar e gerir os próprios bens e solicitam a curatela por interdição
total. Os resultados da avaliação neuropsicológica indicaram desempenho geral acima da
média esperada para faixa etária e escolaridade. Observou-se menor eficiência, sem configurar
prejuízo significativo, em tarefas de controle inibitório. Ainda que a paciente apresente história
de depressão, hoje tal quadro clínico se mostra controlado, e não há queixas de impacto nas
tarefas e atividades do dia a dia, corroborando os achados da avaliação atual. Do ponto de
vista neuropsicológico, a paciente apresenta condições plenas de reger e administrar suas
atividades cotidianas, não havendo sinais que comprometam seu discernimento e/ ou sua
capacidade para os atos da vida civil
Conclusão
No caso relatado, as filhas da pericianda solicitaram a interdição
alegando que a genitora não estava em posse de suas faculdades
mentais e apresentava importante comprometimento funcional, fatos
que a impediam de realizar atividades e tarefas básicas do dia a dia. A
avaliação neuropsicológica mostrou que, ao contrário do alegado, a
paciente operava, naquele momento, em níveis adequados ou mesmo
superiores ao esperado para sua faixa etária, refutando, assim, a
alegação dos familiares
Relato de caso
• O Sr. C. tem 35 anos, formação em direito e é aposentado por incapacidade, em novembro de 2008. Ele
relata que em 2006 deixou o cargo de promotor público devido a queixas cognitivas (dificuldade de
concentração e memória) resultante de depressão. Na entrevista clínica apresentou um nível adequado l de
consciência e capacidade de vigilância. Atenção foi espontânea e voluntária mantida e memória de longo
prazo também foi preservado. Ele era capaz de se orientar no tempo e no espaço, e mostrou consciência
intacta de si mesmo e outros. Ele apresentou pensamento concreto preservado e raciocínio abstrato, sem
mudanças de curso ou velocidade de ideias de apresentação de conteúdo delirante, e mostrou leve humor
deprimido. Sem percepção ou alterações psicomotoras. Linguagem apropriada com amplo vocabulário.
• Depois de quatro anos afastado, ele agora percebe que ele pode retornar às suas atividades e solicitar a
reversão de sua aposentadoria, sendo encaminhado para a Unidade Médico Legal da USP Clínica Hospital.
Durante o período de avaliação, ele relatou que ele não estava tomando remédio.
Relato de caso
• O Sr. C. relatou que sempre foi uma criança tímida, que gostava de ler. Sua mãe tinha um histórico de
depressão desde sua infância. Na adolescência ele era uma pessoa popular, mas de vez em Procedimentos:
entrevista clínica como participante em questão e assinatura do consentimento informado; avaliação do
nível intelectual através do Wechsler Adult Intelligence Scale-III (WAIS-III) e cópia e reprodução teste de
memória (Rey Complex Figures) e medição de flexibilidade mental e funções executivas através do
Wisconsin Teste de cartão (WCST).